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PRESIDENTE DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO
CONVOCAÇÃO DE ASSEMBLEIAS GERAIS
ANULABILIDADE DE DELIBERAÇÃO SOCIAL
Sumário
I– O Conselho de Administração não pode delegar no respectivo presidente os poderes para efectuar o pedido de convocação de assembleias gerais, por tal contrariar o disposto nos artigos 406.º e 407.º do Código das Sociedades Comerciais.
II– Porém, apesar da irregularidade ocorrida, por violação de tais normas, tendo sido aceite o pedido de convocação da assembleia geral, por parte da presidente da mesa da assembleia geral que procedeu à respectiva convocatória, ficou sanado o vício em causa.
III– Para a procedência do fundamento de anulabilidade da deliberação social, com base no disposto no art.º 58.º n.º1 b) do Código das Sociedades Comerciais, é necessário que se provem factos reveladores do carácter abusivo e prejudicial do exercício do voto pela maioria que aprovou a mesma deliberação.
IV– O pedido formulado pelo administrador destituído, de declaração da não verificação de justa causa de destituição e da consequente fixação de indemnização decorrente da destituição sem justa causa, está incluída no elenco de questões que, nos termos da legislação da organização judiciária em vigor e das regras de competência, devem ser resolvidas pelos juízos de comércio, por se incluir no exercício de direitos sociais.
SUMÁRIO: (elaborado pelo relator)
Texto Integral
Acordam na 6.ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa.
I–RELATÓRIO:
AP, residente no Caminho do Areeiro de Baixo n.º 30, São Martinho, 9000-243 São Martinho, instaurou o presente processo comum de declaração contra:
AE, SA doravante AE, SA, pessoa colectiva n.º 511 023 235, com sede no RS, Funchal
Alega, em suma, que é accionista e vogal do conselho de administração da sociedade A. SGPS, SA; sendo ambas accionistas da sociedade R. AE, SA. A Autora detém duas acções, com o valor nominal de 10,00€, correspondendo a 0,0010% do seu capital social. A sociedade A. SGPS, SA detentora de 153143 acções, com o valor nominal de 594.280,00€, correspondendo a 59,4280%. São ainda acciconistas AT, detentor de 34284 acções, com o valor nominal de 171.420,00, correspondendo a 17.1420% do capital social e MT, detentor de uma acção, com o valor nominal de 5,00€, correspondendo a 0,005% do capital social.
Por deliberação datada de 29 de Setembro de 2014, foram designados para exercerem funções como administradores da sociedade Ré AE, SA para o triénio 2014/2016: JR (presidente), AP (vogal) e AT (vogal). Por deliberação datada igualmente de 29 de Setembro de 2014, foram designados para exercerem funções como administradores da sociedade A. SGPS, SA para o triénio 2014/2016: JR (presidente), AP (vogal) e AT (vogal).
No dia 30 de Setembro de 2014, AT renunciou ao cargo de vogal do conselho de administração da sociedade A. SGPS, SA, pelo que, no dia 07 de Outubro de 2014, o conselho de administração da sociedade A. SGPS, SA deliberou sobre a substituição do vogal AT por cooptação de MT, tendo recolhido um voto favorável por parte de JR (presidente) e um voto desfavorável de AP (vogal), ora A.
Pelo facto de o conselho de administração da sociedade A. SGPS, SA ser composto por um número ímpar de membros e por o pacto social da mesma não atribuir voto de qualidade ao presidente, a deliberação referida não foi aprovada. Essa deliberação é nula, nos termos do do artigo 411.º, n.º 1, alínea c), do Código das Sociedades Comerciais e anulável nos termos do artigo 411.º, n.º 3, do mesmo Código, por violar o pacto social da sociedade.
No dia 09 de Dezembro de 2014, o conselho de administração da sociedade A. SGPS, SA deliberou no sentido de delegar no presidente do conselho de administração o poder de requerer a convocação de assembleias gerais nas sociedades participadas da A. SGPS, SA.
Essa deliberação é nula por violar o disposto no artigo 407.º, n.º 2, do Código das Sociedades Comerciais (cfr. artigo 411.º, n.º 1, alínea c), do Código das Sociedades Comerciais).
No dia 10 de Dezembro de 2014, o presidente do conselho de administração da sociedade A. SGPS, SA requereu à presidente da mesa da assembleia geral da sociedade AE, SA a convocação de uma assembleia geral.
Por carta datada de 11 de Dezembro de 2014, a A. foi convocada para uma assembleia geral de accionistas a realizar no dia 15 de Janeiro de 2015, tendo como ordem de trabalhos, entre outros pontos:
“a destituição, com justa causa de AP, do cargo de administradora”.
E a assembleia geral da sociedade AE, SA deliberou destitui-la do cargo de administradora com fundamento em justa causa. Porém, tal justa causa não existe. O exercício do direito de voto foi abusivo, por visar a prossecução de interesses próprios dos accionistas que votaram a favor da destituição da A. (cfr. artigo 58.º, n.º 1, alínea b), do Código das Sociedades Comerciais); por isso, as deliberações tomadas em assembleia são anuláveis, nos termos do artigo 58.º, n.º 1, do Código das Sociedades Comerciais, por a presidente da mesa da assembleia da sociedade AE, SA ter convocado a assembleia geral na sequência de um pedido de quem não tinha legitimidade para o fazer.
Em todo o caso, as deliberações aprovadas em assembleia geral serão sempre anuláveis pelo uso abusivo dos direitos de voto que sustentaram a aprovação das deliberações.
Mais alega que, no caso de o pedido de anulação não proceder, terá o direito de ser indemnizada pela destituição do cargo de administradora sem justa causa. Auferia, a título de remuneração pelo cargo de administradora, a quantia mensal bruta de 5.030,24€ x 14 por ano. Desde Janeiro de 2015, tal remuneração deixou de lhe ser paga pela Ré- Multiplicando o número das remunerações entre Janeiro de 2015 e Dezembro de 2016, teremos o total de 28 meses que deixarão de ser pagos em resultado da destituição injustificada, o que representa um prejuízo global de 140.846,72€, tendo ainda sofrido danos morais no valor global de 55.000,00€.
Finaliza, peticionando, que:
1.– As deliberações tomadas na assembleia geral de accionistas, datada de 15 de Janeiro de 2015, sejam anuladas e, consequentemente, se ordene o cancelamento da inscrição no registo comercial da destituição da A. AP do cargo da administradora da R. AE, SA;
2.– Subsidiariamente, caso o pedido 1. não venha a ser julgado procedente, seja declarada não verificada a justa causa de destituição da A. do cargo de administradora da R. AE, SA e, consequentemente, que seja R. AE, SA condenada a pagar à A. AP a quantia de 140.857,92€, a título de indemnização pelos danos patrimoniais sofridos, acrescidos de 55.000,00€, a título de danos morais sofridos com a sua destituição sem justa causa.
A Ré devidamente citada não deduziu contestação.
O Tribunal deu cumprimento ao disposto no artigo 567.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, e em consequência, a A. alegou por escrito (cfr. fls. 485 a 508).
Seguidamente foi proferida sentença que considerou o JUÍZO DE COMÉRCIO DO FUNCHAL – J2 materialmente incompetente para apreciar o pedido subsidiário, sendo a sua dedução ilegal, nos termos dos artigos 554.º, n.º 2, 37.º, n.º 1 e 96.º, alínea a), todos do Código de Processo Civil, e, por consequência absolveu a Ré da instância relativamente a tal pedido.
Quanto ao pedido principal, julgou-o improcedente e absolveu a Ré do pedido.
Inconformada com a decisão, a Autora vem interpor recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões:
I– As questões a decidir nos presentes autos e nesta sede recursiva – e que correspondem ao objecto do recurso – são as seguintes: i) saber se o pedido subsidiário formulado pela A./Recorrente – de verificação da justa causa de destituição do cargo de vogal do conselho de administração da Recorrida e consequente atribuição de indemnização por destituição ad nutum – se encontra incluído no elenco de matérias a resolver pelos juízos de comércio, nos termos do artigo 128.º, n.º 1, alínea d), da Lei 62/2013, de 26/08 (LOSJ), e ii) saber se as deliberações sociais tomadas na assembleia geral de accionistas da Ré, ocorrida em 15/01/2015, e nos presentes autos impugnadas, estão viciadas de anulabilidade, em consequência da irregularidade da convocatória e do abuso de direito (ou abuso de maioria) dos accionistas que aprovaram as referidas deliberações.
Da (in)competência absoluta – em razão da matéria – do Juízo de Comércio do Funchal para conhecer do pedido subsidiário formulado pela ora Recorrente:
II.– Na opinião da Recorrente – e salvo o devido respeito pelo entendimento contrário propugnado na douta sentença recorrida – mal andou a Mma. Juiza do Tribunal a quo ao concluir que o juízo de comércio do Funchal é materialmente incompetente para apreciar o pedido subsidiário, e, em consequência, ao absolver a Ré da instância, o que se vem a traduzir num erro de julgamento.
III.– A Recorrente defende, pelo contrário, que a verificação da existência de justa causa de destituição dos membros de órgãos sociais, designadamente do conselho de administração, e, em caso da destituição ad nutum, o direito a ser indemnizado pelos prejuízos decorrentes da destituição, constituem questões que se incluem, sem margem para qualquer dúvida, no âmbito de competência material dos juízos de comércio.
IV.– O artigo 128.º, n.º 1, alínea c), da Lei 62/2013, de 26/08 (Lei de Organização do Sistema Judiciário) deve ser objecto de uma interpretação actualista – de que é exemplo Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 22/09/2015, proferido no processo n.º 5542/13.5TBLRA.C1, supra citado – por forma a incluir na supra referida alínea a questão que a Recorrente pretendia fosse resolvida pelo Tribunal a quo.
V.– Os tribunais de comércio – hoje designados por juízos de comércio – foram criados sob a égide de uma política judiciária assente em objetivos de especialização jurisdicional, assim como de desconcentração e descompressão dos processos pendentes nos tribunais e a necessidade de lhes atribuir matérias que exigem uma especial preparação e sensibilidade por parte do julgador.
VI.– Saber se um membro do conselho de administração de uma sociedade anónima foi, ou não, destituído com ou sem justa causa é uma das matérias que exige especial preparação e sensibilidade do julgador e que fundamentaram a opção legislativa de criação destes tribunais, e diz respeito a direitos sociais.
VII.– Na verdade, trata-se de matéria de direito societário por excelência a avaliação do desempenho dos gerentes ou administradores das sociedades comerciais à luz dos parâmetros estabelecidos no artigo 64.º do CSC, sobre o qual existe extensa doutrina comercialista. E como é evidente, só se pode concluir pela existência de uma justa causa de destituição caso se venha a concretizar uma violação dos deveres consagrados no citado artigo 64.º do CSC.
VIII.– Se o direito a ser designado para os órgãos de administração da sociedade é um direito social – nos termos do artigo 21.º, n.º 1, al. d), do CSC, e sendo a Recorrente accionista da sociedade Recorrida, não se vê como afastar a verificação da justa causa de destituição e da petição de uma indemnização por uma accionista e administradora destituída do elenco de matérias a resolver pelos Juízos de Comércio.
IX.– Ao declarar-se incompetente para julgar o pedido subsidiário formulado pela Recorrente, violou o Tribunal recorrido o disposto no artigo 128.º, n.º 1, alínea c), da Lei 62/2013, de 26/08 (Lei de Organização do Sistema Judiciário).
Da irregularidade da convocatória da assembleia geral de accionistas da Ré
X.– Na douta sentença recorrida a Mma. Juíza julgou improcedentes a argumentação expendida pela ora Recorrente, e considerou que a assembleia geral de accionistas da Ré foi regularmente convocada, não lhe reconhecendo a existência de qualquer vício, o que está inclusivamente em contradição com os factos dados com provados a dada altura na decisão sob censura.
XI.– A sentença é nula, pois dá como provado o conteúdo da acta de reunião do conselho de administração da A. SGPS, SASGPS, SA e, depois, afirma desconhecer se a actuação de JRteve ou não por base a mesmíssima deliberação, nulidade essa que se argui nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea c) e n.º 4 do CPC.
XII.– A convocatória para a sobredita assembleia é irregular, por ter sido convocada por iniciativa de quem não tinha poderes nem competência para o fazer, por a lei não o permitir, o que por sua vez determinaria, necessariamente, a anulação das deliberações sociais tomadas naquela assembleia e que a Recorrente veio nos presentes autos impugnar.
XIII.– Resulta do artigo 407.º, n.º 2, e 406.º, do CSC que está absolutamente vedado aos conselhos de administração das sociedades anónimas delegar poderes de gestão em algum ou alguns administradores, sempre que tais poderes impliquem as matérias previstas nas alíneas a) a m) do artigo 406.º (de onde avulta, para o que nestes autos interessa relevar, o pedido de convocação de assembleias gerais).
XIV.– Desta forma, ao decidir como decidiu, incorreu a Mma. Juíza num evidente erro de julgamento, ao fazer tábua rasa dos factos carreados para o processo e ao enveredar por uma errada interpretação e aplicação das normas que ao caso cumpre aplicar, designadamente, os artigos 407.º, n.º 1 e 2; 506.º, e 375.º, n.ºs 1 e 2, todos do CSC.
XV.– Em resumo, a douta sentença recorrida incorreu num erro de julgamento através de uma errada interpretação e aplicação da lei, nomeadamente dos artigos 406.º e 407.º, n.ºs 1 e 2 da CSC; termos em que deverá ser julgado procedente o presente recurso, revogando-se a sentença recorrida, que deverá ser substituída por outra que anule as deliberações sociais tomadas na assembleia geral de accionistas da Ré ocorrida em 15/01/2015.
Da anulação das deliberações sociais tomadas em 15/01/2015 por abuso de direito de voto ou abuso de maioria
XVI.– Na opinião da ora Recorrente é manifesto o abuso de direito ou abuso de maioria com que agiram os restantes accionistas da sociedade Ré, manifestado nas deliberações sociais tomadas na assembleia geral de accionistas ocorrida em 15/01/2015.
XVII.– Contrariamente ao entendimento sufragado na douta sentença recorrida – e salvo o devido respeito por tal opinião – estão verificados todos os pressupostos de que a lei faz depender a anulabilidade das deliberações sociais no caso concreto.
XVIII.– O uso abusivo do direito de voto existe sempre que se verifiquem – cumulativamente – os pressupostos objectivos (adequação da deliberação ao propósito ilegítimo dos associados), e subjectivos (intenção de obter uma vantagem especial para os sócios que votaram a deliberação ou para terceiros ou de causar prejuízos à sociedade ou aos restantes sócios).
XIX.– Com efeito, não só deliberação social impugnada de destituição da ora Recorrente é formal e materialmente adequada a servir o propósito dos accionistas votantes, como é evidente que o objectivo velado dos mesmo accionistas foi o de afastar a Recorrente do cargo de vogal do conselho de administração para o qual fora eleita, uma vez que as acusações que lhe foram imputadas não passam de um repertório de alegações e factos sem qualquer fundamento.
XX.– A encenação montada pelos accionistas que votaram a destituição ad nutum da Recorrente não passou de uma cortina de fumo lançada como subterfúgio para dessa forma criarem a aparência de causas justificativas da destituição; a falta de fundamentação dos factos imputados à Recorrente é ela própria indiciadora do abuso de direito com que agiram os accionistas da Ré.
XXI.– A douta sentença recorrida incorreu num erro de julgamento através da errada interpretação e aplicação da lei aos factos carreados para o processo, nomeadamente do artigo 58.º, n.º 1, alínea b), do CSC; termos em que deverá ser julgado procedente o presente recurso, revogando-se a sentença recorrida, devendo ser proferido Acórdão que anule as deliberações sociais tomadas na assembleia geral de accionistas da Ré, ocorrida em 15/01/2015, por terem sido aprovadas em abuso de direito de voto.
Nestes termos – e nos mais de Direito – deve o presente recurso ser julgado procedente, e, consequentemente, ser proferido Acórdão que revogue a sentença recorrida e:
i)- Anule as deliberações sociais tomadas na assembleia geral de accionistas da Recorrida, nos termos do artigo 58.º, n.º 1, alínea a), do CSC, por violação dos artigos 406.º, 407.º, n.º 1 e 2, e 375.º, n.º 2, do mesmo diploma legal,
ii)- Anule as deliberações sociais tomadas na assembleia geral de accionistas da Recorrida, nos termos do artigo 58.º, n.º 1, alínea b), do CSC, por terem sido aprovadas em abuso de direito dos accionistas votantes.
Subsidiariamente, para o caso de improcedência dos pedidos anteriores, deverá ser proferido Acórdão que revogue o despacho saneador, na parte em que foi declarada a incompetência do Tribunal a quo, ordene a remessa dos autos a este Tribunal para que o mesmo conheça do pedido subsidiário formulado pela Recorrente, de verificação da sua destituição ad nutum do cargo de vogal do conselho de administração da Recorrida, e decorrente atribuição de indemnização pelos prejuízos causados em virtude da referida destituição, com o que se farão V. Exas. a devida e costumada JUSTIÇA!
A Apelada apresentou contra alegações pugnando pela improcedência do recurso e consequente confirmação da sentença recorrida.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir:
II-OS FACTOS
Na 1.ª instância foram dados como provados os seguintes factos:
1.– A sociedade A. SGPS, SA foi constituída em 19 de Setembro de
1993, como sociedade gestora de participações sociais, conforme escritura pública outorgada no então 3.º cartório notarial do Funchal;
2.– AP subscreveu 10% do capital social da sociedade A. SGPS, SA, tendo JR por sua vez, à data casado com MC, subscrito uma participação de 60%, conforme declaração emitida pelo BCP em 16 de Março de 1993, e guia de depósito no mesmo Banco de 17 de Março de 1993;
3.– A participação da A. como accionista fundadora da A. SGPS, SA foi o culminar do trabalho que desenvolveu no seio das empresas que vieram a fazer parte do GRUPO A
4.– O trabalho da A. iniciou-se, em 01 de Fevereiro de 1990, como responsável do Departamento Financeiro da sociedade R. AE, SA;
5.– Desde essa data que a A. faz parte da direcção do grupo de empresas que desde 1993 se apresenta no mercado como constituindo o GRUPO A, acompanhando o seu desenvolvimento e crescimento, o que acontece até à presente data;
6.– Até ao dia 29 de Setembro de 2014, a A. era responsável por toda a área financeira, fiscal e jurídica do GRUPO A
7.– Na presente data, o GRUPO Aé constituído pelo menos por 13 (treze) sociedades comerciais, entre as quais a ora R. AE, SA;
8.– Desde a constituição da sociedade A. SGPS, SA, a A. tem vindo a fazer parte do respectivo conselho de administração;
9.– JR exerceu as funções de presidente do conselho de administração da sociedade A. SGPS, SA, durantes os triénios 2002/2004, 2005/2007 e 2008/2010 (cfr. certidão de registo comercial de fls. 244 a 247);
10.– Entre o dia 15 de Novembro de 2011 e o dia 29 de Setembro de 2014, a A. AP exerceu, na qualidade de administrador único, o cargo de Presidente do Conselho de Administração da sociedade A. SGPS, SA (certidão de registo comercial de fl. 245 verso a 246);
11.– JR exerceu as funções de presidente do conselho de administração da sociedade AE, SA, durante os triénios 2002/ 2004, 2005/2007 e 2008/2010 (cfr. certidão de registo comercial de fls. 390 a 493);
12.– Entre o dia 15 de Novembro de 2011 e o dia 29 de Setembro de 2014, a A. AP exerceu, na qualidade de administrador único, o cargo de Presidente do Conselho de Administração da sociedade AE, SA (certidão de registo comercial de fls. 491 e verso);
13.– Não obstante PN ter sido administradora única das sociedades A. SGPS, SA e AE, SA, o A., JR e a sua mulher, acordaram que PN cumpriria com as instruções deste;
14.– MR (que outorgou por
si e na qualidade de procuradora de JR) e AP assinaram um contrato designado por “contrato de compra e venda de acções, datado de 26 de Novembro de 2010”, mediante o qual os primeiros declaram vender à segunda 332.380 acções que detém na sociedade A. SGPS, SA, pelo preço de 1.656.900,00€ (cfr. prova documental de fls. 129 a 130 verso);
15.– MR (que outorgou por
si e na qualidade de procuradora de JR) e AP assinaram um contrato designado por “contrato de compra e venda de acções, datado de 26 de Novembro de 2010”, mediante o qual os primeiros declaram vender à segunda 250.000 acções que detém na sociedade A. SGPS, SA, pelo preço de 1.250.000,00€ (cfr. prova documental de fls. 131 a 132);
16.– MR (que outorgou por
si e na qualidade de procuradora de JR) e AP (na qualidade de administradora única de A. SGPS, SA) assinaram um contrato designado por “contrato de compra e venda de acções, datado de 02 de Julho de 2010”, mediante o qual os primeiros declaram vender à segunda 46.857 acções que detém na sociedade AE, SApelo preço de 873.982,91€ (cfr. prova documental de fls. 133 a 134);
17.– Não obstante JR e a então mulher terem perdido formalmente a titularidade das participações sociais das sociedades A. SGPS, SA e AE, SA – EQUIPAMENTOS HOTELEIROS, S.A. e terem renunciado aos respectivos cargos de administradores, estes foram sempre os únicos donos dessas participações sociais, que só formalmente mudaram de titularidade, o que ficou acautelado em documentos que ficaram na posse da então mulher de JR. MR
18.– Os títulos das acções objecto dos contratos de compra e venda referidos em 14., 15. e 16., sempre permaneceram na posse da então mulher de JR, MR
19.– JR sempre se manteve à frente da administração e gestão das empresas do GRUPO A, usando livremente as instalações das empresas, contactando e dando ordens aos funcionários, definindo estratégias, dirigindo reuniões, elaborando planeamentos semestrais, dando directrizes, conduzindo os negócios, contactando com fornecedores e clientes;
20.– JR só não assinava os documentos de vinculação externa (jurídica) das sociedades do GRUPO A;
21.– A A. AP, por seu lado, continuou a exercer as funções que já exercia anteriormente à sua nomeação para presidente do conselho e administração da A. SGPS, SA e da R. AE, SA, dirigindo o departamento financeiro do GRUPO A, e executando todo o demais necessário de acordo com as instruções e a orientação de JR;
22.– Do pacto social da sociedade A. SGPS, SA consta o seguinte com interesse para a boa decisão da causa (cfr. fls. 170 verso a 176):
“DÉCIMO TERCEIRO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO OU ADMINISTRADOR ÚNICO
1.– A sociedade é administrada por um Conselho de Administração composto por um número impar de membros; num mínimo de três e num máximo de nove, eleitos pela Assembleia Geral por um período de três anos, e reelegíveis uma ou mais vezes; ou por um Administrador único, eleito pela Assembleia Geral por um período de três anos, e reelegível uma ou mais vezes.
2.– (…).
DÉCIMO QUARTO REUNIÕES DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO
1.– (…).
2.– (…).
3.– (…).
4.– (…).
5.– (…).
6.– O Conselho de Administração não poderá deliberar sem que para o efeito esteja presente ou devidamente representado a maioria simples dos administradores em exercício, entre os quais o Presidente ou quem o substitui.
7.– As deliberações do Conselho serão tomadas pela maioria simples de votos emitidos pelos Administradores, salvo as que recaiam sobre os assuntos indicados nas alíneas b) e c), do número um do artigo décimo quinto dos presentes estatutos, que, embora tomadas por maioria simples de votos emitidos, terão que contar com o voto do Presidente do Conselho de Administração.
8.– Do mesmo modo, depende do voto favorável do Presidente do Conselho de Administração a validade das deliberações que incidam sobre a delegação de poderes num ou mais Administradores e na Comissão Executiva ou a sua alteração ou revogação.
DÉCIMO QUINTO COMPETÊNCIA
1.– Ao conselho de Administração compete, em especial, sem prejuízo das atribuições que lhe são conferidas pela lei e por estes estatutos:
a)- (…);
b)- (…);
c)- (…);
d)- Constituir mandatários ou procuradores para a prática de actos ou categorias;
e)- (…);
f)- (…).
DÉCIMO SEXTO VINCULAÇÃO DA SOCIEDADE
1.– A sociedade obriga-se pela assinatura:
a)- Do Administrador único ou do Presidente do Conselho de Administração.
b)- (…);
c)- (…);
d)- (…).”
23.– Por deliberação datada de 29 de Setembro de 2014, foram designados os seguintes membros para o conselho de administração da sociedade A. SGPS, SA (cfr. certidão de registo comercial de fl. 246):
JR Presidente
AP Vogal
AT Vogal
24.– No dia 30 de Setembro de 2014, AT renunciou ao cargo
de vogal (cfr. certidão de registo comercial de fl. 246);
25.– Da “Acta de Reunião do Conselho de Administração” da sociedade A. SGPS, SA
SGPS, S.A. datada de 07 de Outubro de 2014, consta o seguinte com interesse para a boa decisão da causa (cfr. Fl. 254 verso a 255):
“Aos sete dias de Outubro de 2014, pelas onze e trinta horas, na sede da A –SGPS,SA (…), em Ribeiro Seco, São martinho, no Funchal reuniu o Conselho de Administração estando presentes:
JR na qualidade de Presidente do Conselho de Administração;
AP, na qualidade de vogal do Conselho de Administração.
O Presidente do Conselho de Administração, Senhor JR tomando conhecimento da falta definitiva do administrador AT, por renúncia deste ao cargo para o qual foi eleito em Assembleia Geral, no dia 29.9.2014, propôs, à luz da alínea b) do n.º3 do art.º 393.º do Código das Sociedades Comerciais, a substituição por cooptação do acima referido administrador por M...P...R...T..., residente em (…).
A referida proposta foi aprovada com o voto favorável do senhor Presidente do Conselho de Administração, por ter voto de qualidade.”
26.– Na reunião referida em 25., JR não permitiu a presença de SMAdvogada da Sociedade, e Presidente da Mesa da Assembleia Geral da sociedade AE, SA;
27.– Para além de já levar a acta pronta a assinar, JR não permitiu qualquer tipo de discussão sobre o objecto da deliberação;
28.– JR não permitiu que AP saísse da sala sem assinar a acta referida em 25., revelando um comportamento ameaçador e agressivo;
29.– AP não queria assinar a acta referida em 25.;
30.– AP queria consignar a sua posição sobre a referida cooptação na acta mencionada em 25., o que não lhe foi permitido;
31.– Em virtude dos factos referidos em 28., AP acabou por assinar a acta referida em 25.;
31.-A- No dia 30 de Outubro de 2014, com vista a suspender a deliberação social referida em 25., AP instaurou uma providência cautelar contra a sociedade A. SGPS, SA que correu termos sob o n.º 3138/14.3T8FNC na Comarca da Madeira – Instância Central do Funchal – Secção de Comércio – J2 (cfr. prova documental de fls. 517 a 206);
31.-B- Por sentença datada de 10 de Abril de 2015, o Tribunal homologou a desistência do pedido formulado no âmbito do processo n.º 3138/14.3T8FNC (cfr. prova documental de fl. 206);
32.– Da “Acta de Reunião do Conselho de Administração” da sociedade A. SGPS, SA datada de 09 de Dezembro de 2014, consta o seguinte com interesse para a boa decisão da causa (cfr. fls. 253 a 254):
“ ACTA CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO”
Aos nove dias do mês de Dezembro de dois mil e catorze, pelas dez horas, na sede da sociedade no sítio do Ribeiro Seco (…) com a presença dos administradores JR (presidente) e AN (vogal), tendo o administrador MT (vogal) participado na reunião via skype, a fim de deliberar sobre o seguinte ponto da ordem de trabalhos:
Delegação de poderes para requerer a convocação de assembleias gerais das sociedades em que a Sociedade detém participações sociais e para participar nas mesmas.
(…) Após breve discussão entre os presentes, o administrador MT propôs que tais poderes fossem delegados no próprio presidente do conselho de administração.
Colocada tal proposta a votação, foi a mesma aprovada com os votos favoráveis dos administradores JRe MT (…)”
33.– Do pacto social da sociedade AE, SA – EQUIPAMENTOS HOTELEIROS, S.A. consta o seguinte com interesse para a boa decisão da causa (cfr. fls. 30 verso a 37:
“Artigo 12.º
1.- (…).
2.- (…).
3.- Compete à Assembleia Geral a fixação das remunerações dos órgãos sociais,
competência esta que pode ser delegada numa comissão de vencimento.
“Artigo 15.º
1.- (…)..
2.- Além disso, a Assembleia Geral será convocada sempre que a lei o determine ou o
requeiram o Conselho de Administração, o Conselho Fiscal, ou os accionistas , (…) que
representem pelo menos cinco por cento do capital social.
3.- (…).
Artigo 22.º
1.- (…);
2.- (…);
3.- (…);
4.- O Presidente terá voto de qualidade em caso de empate.
34.– Por deliberação datada de 29 de Setembro de 2014, foram designados os seguintes membros para o conselho de administração da sociedade AE, SA (cfr. certidão de registo comercial de fl. 491 verso):
JR- Presidente
AP- Vogal
AT- Vogal
35.– No dia 30 de Setembro de 2014, AT renunciou ao cargo de vogal (cfr. certidão de registo comercial de fl. 491 verso);
35.– A Da “Acta de Reunião do Conselho de Administração” da sociedade AE, SA, datada de 07 de Outubro de 2014, consta o seguinte com interesse para a boa decisão da causa:
“Aos sete dias de Outubro de 2014, pelas doze horas, na sede da AE, SA-Equipamentos Hoteleiros, SA (…), em Ribeiro Seco, São Martinho, no Funchal reuniu o Conselho de Administração estando presentes:
JR na qualidade de Presidente do Conselho de Administração;
AP, na qualidade de vogal do Conselho de Administração.
O Presidente do Conselho de Administração, Senhor JR tomando conhecimento da falta definitiva do administrador AT, por renúncia deste ao cargo para o qual foi eleito em Assembleia Geral, no dia 29.9.2014, propôs, à luz da alínea b) do n.º3 do art.º 393.º do Código das Sociedades Comerciais, a substituição por cooptação do acima referido administrador por Marco Paulo Rodrigues Teixeira, residente em (…).
A referida proposta foi aprovada com o voto favorável do senhor Presidente do Conselho de Administração, por ter voto de qualidade, nos termos da lei e com o voto contra da Vogal AP.”
36.– A A. AP é accionista da R. AE, SA, sendo detentora de 2 (duas) acções, com o valor nominal de 10,00€ (dez euros), correspondentes a 0.001 % do seu capital social, conforme cópias dos títulos de acções números 264 e 265;
37.– A sociedade A. SGPS, SA é accionista da R. AE, SA, sendo detentora de 153143 acções, com o valor nominal de 594.280,00€, correspondentes a 59.4280% do capital social;
38.– AT é accionista da R. AE, SA, sendo detentor
de 34284 acções, com o valor nominal de 171.420,00€, correspondentes a 17.1420% do capital social;
39.– MT, é accionista da R. AE, SA, sendo detentor de 1 (uma) acção, com o valor nominal de 5,00€, correspondentes a 0.005% do capital social;
40.– Por carta datada de 10 de Dezembro de 2014, o Presidente do Conselho de Administração da Sociedade A. SGPS, SA comunicou à Presidente da Messa da Assembleia Geral da sociedade AE, SA o seguinte (cfr. fls. 274 verso a 275 verso):
“Exma.Senhora:
Nos termos do disposto no art.º 375.º , n.º2 e 3 do Código das Sociedades Comerciais, venho, pela presente, em representação da acionista A- SGPA, SA (...) requerer a convocação de uma assembleia geral extraordinária da sociedade AE, SA –Equipamentos Hoteleiros, SA, com a seguinte ordem de trabalhos:
(i)- Destituição com justa causa de NA do cargo de administradora;
(ii)- Ratificação da cooptação/eleição de MT como administrador da sociedade e dispensa de prestação de caução.
A reunião cuja convocação ora se requer justifica-se, essencialmente, pela necessidade de afastar a referida administradora do cargo que vem exercendo, atentos diversos actos que a mesma vem praticando e de que a acionista A teve, entretanto, conhecimento, actos estes que, não só são consentâneos com o cabal desempenho das funções que, naquela qualidade, lhe incumbem, como são susceptíveis de causar danos e prejuízos vários à sociedade.”
41.– Por carta datada de 11 de Dezembro de 2014, a Presidente da Mesa da Assembleia Geral da sociedade AE, SA notificou a A. AP do seguinte (cfr. prova documental de fls. 250 verso e 251):
“ ASSEMBLEIA GERAL ANUAL CONVOCATÓRIA
Convocam-se os Senhores Accionistas da sociedade “AE, SA –EQUIPAMENTOS HOTELEIROS,SA, nos termos e para os efeitos do art.º 377.º do CSC para reunir em assembleia geral, na sede sita no Ribeiro Seco(…) no dia 15 de janeiro de 2015, pelas nove horas, com a seguinte ORDEM DE TRABALHOS:
(i)- Destituição com justa causa de NA do cargo de administradora;
(ii)- Ratificação da cooptação/eleição de MT como administrador da sociedade e dispensa de prestação de caução.
(…)”
42.– Por carta datada de 31 de Dezembro de 2014, a Presidente da Mesa da Assembleia Geral da sociedade AE, SA notificou a A. AP do seguinte (cfr. fls. 252 a 253):
“ADITAMENTO À CONVOCATÓRIA
Assembleia Geral Extraordinária
AE, SA-EQUIPAMENTOS HOTELEIROS SA
Inclusão de assuntos na Ordem do Dia
(…)
Em consequência, a ordem de trabalhos da referida Assembleia passa a incluir mais dois pontos – o ponto três e quatro – passando a ser a seguinte a ordem de trabalhos:
PONTO TRÊS– Propositura pela sociedade “AE, SA – Equipamentos Hoteleiros, SA”, de acção de responsabilidade civil contra AP, por prejuízos causados decorrentes de actos praticados na qualidade de administradora da sociedade PONTO QUATRO– Constituição de uma comissão de vencimentos e nomeação dos respectivos membros.”
43.– Da “ACTA DE REUNIÃO DA ASSEMBLEIA GERAL – AE, SA – EQUIPAMENTOS HOTELEIROS, S.A.”, datada de 15 de Janeiro de 2015, consta o seguinte com interesse para a boa decisão da causa (cfr. fls. 222 a 238):
“ ATA DE REUNIÃO DA ASSEMBLEIA GERAL
AE, SA –EQUIPAMENTOS HOTELEIROS SA
No dia 15 de Janeiro de dois mil e quinze, pelas nove horas e quinze minutos (..) reuniu a Assembleia Geral da Sociedade anónima «AE, SA –EQUIPAMENTOS HOTELEIROS; SA (…) com o capital social de um milhão de euros, representado por duzentas mil acções nominativas, do valor nomimal de cinco euros cada, pertencentes a:
Cento e dezoito mil oitocentos e cinquenta e seis (118856) acções, à “Aquirem-SGPS SA”
Duas acções a AP
Trinta e quatro mil duzentos e oitenta e quatro (34284) acções a AT;
Uma (1) acção a M...P... R...T...–(…)
Rreferida Presidente da Mesa , de imediato, leu a convocatória com a seguinte ordem de trabalhos:
“1.- Destituição, com justa causa de AP, do cargo de administradora;
(…) Passando agora à votação:
Foi aprovado por unanimidade [ ponto 1] pelos votos favoráveis da A, AT e MT, não podendo a acionista Ana paul Biscoito neves votar nos termos do disposto no n.º6 do art.º 384.º do CSC, ou seja aprovado por unanimidade das acções sem impedimento de voto.
(…)”, dando-se o restante aqui por integralmente reproduzido.
44.– Da proposta de destituição datada de 30 de Dezembro de 2014, consta o seguinte com interesse para a boa decisão da causa (cfr. fls. 275 e verso):
(dá-se aqui por reproduzido o teor do documento juntos aos autos).
44.-A- Da proposta de ratificação de cooptação, consta o seguinte com interesse para a boa decisão da causa (cfr. fls. 294 verso e 295 verso):
(dá-se aqui por reproduzido o documento junto aos autos).
44.-B- Da proposta relativamente ao ponto três, consta o seguinte com interesse para a boa decisão da causa (cfr. fls. 296 e verso):
(dá-se aqui por reproduzido o documento junto aos autos).
44.-C- Da proposta relativamente ao ponto 4. consta o seguinte com interesse para a boa decisão da causa (cfr. fls. 301):
(dá-se aqui por reproduzido o documento junto aos autos)
45.– No dia 30 de Setembro de 2014, ou seja, no dia imediatamente a seguir à sua eleição para o cargo de Administradora da sociedade AE, SA e da A, a A. remeteu a JRe a AT e–mail, no qual solicitou a realização de uma reunião formal do Conselho de Administração, no dia 02 de Outubro de 2014, pelas 9:30horas, para determinar o ponto de situação global das sociedades A e AE, SA à data de Setembro de 2014, e ainda das demais sociedades que integram o Grupo;
46.– Do envio do e-mail referido em 45. resultaram várias trocas de e-mails com JRpraticamente com o mesmo teor, uns respeitando a A e outros a AE, SA;
47.– Por e-mail datado de 01 de Outubro de 2014, JRcomunica a A. que se encontra impedido de comparecer à reunião convocada pela mesma (A.) e agendou, por sua vez, com carácter de urgência, reuniões dos Conselhos de Administração das sociedades AE, SA e A para o dia 03 de Outubro de 2014 nas instalações da sociedade H- Lda, em Odivelas, com a seguinte ordem de trabalhos: (i) cooptação de novo administrador, por renúncia do Administrador AT;
48.– A este e-mail respondeu a A. no dia 02 de Outubro de 2014, dizendo que as reuniões tinham que ser realizadas na sede das respectivas empresas e não em Odivelas, e requereu o envio da cópia da carta de renúncia do Administrador AT, bem como a indicação de pessoa a considerar para a referida cooptação, de modo a concertar de pontos de vista;
49.– Nesse mesmo dia, JR agendou as reuniões de cooptação para o dia 07 de Outubro de 2014, ao que a A. acedeu por respostas de 03 de Outubro de 2014, tendo insistido pela resposta às questões que colocou nos e-mails anteriores, mas em vão;
50.– No dia 07 de Outubro de 2014 têm lugar as acima referidas reuniões, nas quais JR coage a A. a assinar as actas, previamente elaboradas;
51.– Devido ao facto de o pedido de convocação de reuniões para análise da situação global das sociedades AE, SA e da A e demais empresas do grupo não ter tido qualquer andamento, a A. remeteu no dia 10 de Outubro de 2014 a JR e a AT, por e-mail, os dossiers que tinha preparado para as reuniões que convocou;
52.– No dia 17 de Outubro de 2014, também por e-mail, a A. remeteu ainda a JR e a AT a análise operacional a 30 de Setembro de 2014 da AE, SA e da M, conforme havia ficado prometido no referido e-mail de 10 de Outubro de 2014;
53.– Não obstante as supra referidas solicitações, não se realizaram as reuniões requeridas pela A. para fazer a transição entre a anterior Administração e a nova;
54.– Realizando-se novas reuniões, já com a presença de MT, nas quais foram feitas distribuições de pelouros de forma totalmente discricionária por parte de JR e MT, e nas quais foram aprovadas contratações: em causa as deliberações de 22 de Outubro de 2014, a que se reportam as actas em Anexo 6B e 7B da acta da Assembleia Geral de 15 de Janeiro de 2015;
55.– A A. se opôs às contratações referidas em 54., por a mesma entender que as contratações são prejudiciais;
56.– Sobre as deliberações/actas resultantes das referidas reuniões, a A. remeteu no dia 28 de Outubro 2014 a JRe a MT e-mail, Anexo 8B da acta, no qual deixou consignadas as razões da sua discordância;
57.– Entre as razões referidas em 56., expôs a desnecessidade de contratar uma empresa externa para desempenhar as funções que (entre outras) a A. sempre desempenhou nas sociedades A e AE, SA e demais empresas do Grupo, ou seja, a gestão das áreas financeiras, contabilística e fiscal, criando na A e na AE, SA um encargo mensal na ordem dos 12.000,00€ (doze mil euros), aos quais acrescentam-se despesas de deslocação/estadia;
58.– As sociedades A e AE, SA não precisam dos referidos serviços externos;
59.– Ainda nesse mesmo e-mail de 28 de Outubro de 2014, a A. aponta o facto de a administração das sociedade ser feita à distância, sem que os administradores se desloquem à Madeira, deixando cheques da sociedade R. assinados em branco nas mãos de um não Administrador;
60.– Desde que a A. foi eleita Administradora da accionista A, JRe MT vêm dando indicações para que os colaboradores da AE, SA e da A deixem de fornecer à A. informações sobre os assuntos das empresas;
61.– JRe MT fomentam o tratamento de questões societárias à
revelia do conhecimento da A., que nada discute e nada debate;
62.– JRe MT decidem sozinhos e ignoram a posição de A. enquanto Administradora;
63.– A A., por de nada ter conhecimento, nada decide, nem a nada se pode opor formalmente, excepto nas situações que vai tendo conhecimento no exercer das suas funções no dia-a-dia, como aconteceu, ainda no final de 2014, quando MT decidiu não renovar o contrato com um importante fornecedor do Grupo, respeitante ao programa informático PHC
64.– A decisão referida em 63. não passou pelo Conselho de Administração, sendo que à A. nada foi perguntado e, por conseguinte, nada decidiu;
65.– A A. apenas ficou a saber do facto referido em 63. por mero acaso;
66.– Muitas outras situações houve em que tudo foi tratado sem o conhecimento e/ou intervenção de A., não obstante no final do processo ter sido sempre exigida a sua assinatura;
67.– Por fax datado de 20 de Novembro de 2014, A. remeteu a JRe a MT duas comunicações, uma relativa à administração da sociedade A e outra relativa à administração da sociedade AE, SA;
68.– Não há mais reuniões porque JRe MT não querem, sendo que os mesmos recusam qualquer proposta de reunião feita pela A., alegando indisponibilidade;
69.– JRe MT não comparecem na empresa;
70.– MT não veio uma única vez á empresa e trata dos assuntos da sociedade Ré AE, SA (e da A) através de um endereço de e-mail que não pertence ao grupo A.
71.– Confrontado com a situação referida em 70., MT apresentou, por carta enviada a A. em 29 de Janeiro de 2015 a justificação de que ninguém no âmbito da sociedade lhe forneceu um endereço de e-mail interno;
72.– MT é o Administrador responsável pelo pelouro da informática;
73.– O accionista AT sempre esteve a par de tudo o que se passava no GRUPO A, e por isso tudo o que se passava na sociedade R. AE, SA;
74.– Para além da sua intervenção como accionista que acompanhava o dia-a-dia dos negócios da sociedade R. AE, SA, AT chegou inclusivamente a ser membro do conselho fiscal da R., nos anos de 1984 a 2011;
75.– A A. sempre respondeu a todos os pedidos efectuados pelo accionista AT, de forma completa e elucidativa;
76.– Desde o seu início, a prática da sociedade sempre foi a de que as remunerações auferidas pelos titulares dos órgãos sociais nunca fossem sujeitas a qualquer deliberação, sem que até hoje tivesse existido qualquer manifestação em contrário por parte de qualquer um dos accionistas;
77.– Entre o ano de 2007 e 2009, por iniciativa da própria A., reduziu, em mais de 4.000,00€, a sua remuneração auferida no âmbito das sociedades do grupo;
78.– À A. nunca coube zelar pela conservação do livro de registos;
79.– A função referida em 78. sempre esteve a cargo da Advogada da sociedade e presidente da mesa da assembleia geral das várias sociedades do grupo, a Dra. SM a qual também sempre zelou pelos demais livros sociais das várias sociedades do GRUPO A
80.– AT tem conhecimento do facto referido em 79.;
81.– A não cobrança de inúmeras facturas em dívida à sociedade R. por sociedades relacionadas comercialmente com o GRUPO A se deve ao facto de tais facturas se encontrarem emitidas a empresas no exterior e sob influência e interesse directo de JR que vem obstaculizando à sua cobrança;
82.– Caso a A. não tivesse sido destituída, o seu mandato terminaria em 29 de Setembro de 2016;
83.– A A. auferia uma remuneração mensal bruta pelo seu cargo no valor de 5.030,24€, recebendo 14 remunerações em cada ano, sendo que desde Janeiro de 2015 tal remuneração deixou de lhe ser paga pela R. AE, SA;
84.– A A. é conhecida no seu meio profissional e pessoal como sendo uma profissional e gestora competente e idónea;
85.– A destituição de A., nos termos supra descritos, afastou potenciais negócios e a possibilidade de inserção profissional noutros grupos ou empresas.
III– O DIREITO.
Tendo em conta as conclusões de recurso que delimitam o respectivo âmbito de cognição deste Tribunal, conforme decorre do disposto nos artigos 635.º n.º4, 637.º n.º2 e 639.º n.º1 e 2 do CPC, as questões que importa apreciar são as seguintes:
1-Irregularidade da convocatória da assembleia geral de accionistas da Ré;
2-Anulabilidade das deliberações sociais tomadas em 15/01/2015 por abuso de direito de voto ou abuso de maioria
3-Incompetência absoluta – em razão da matéria – do Juízo de Comércio do Funchal para conhecer do pedido subsidiário formulado pela ora Recorrente;
1– Alega a apelante que o conselho de administração da sociedade comercial A. SGPS, SASGPS, SA delegou no respectivo presidente, JR por deliberação tomada em 09/12/2014, a competência em certas matérias da administração, designadamente, a convocação de assembleia geral –. E foi no âmbito dessa assembleia geral convocada por quem, no entender da Apelante não tinha poderes para tanto que a mesma Apelante foi destituída do cargo de administradora. Conclui, por isso, pela irregularidade da convocatória da assembleia geral.
Vejamos se terá razão:
Nos termos do art.º 375.º n.º2 do Código das Sociedades Comerciais (CSC), “a assembleia geral deve ser convocada quando o requererem um ou mais accionistas que possuam acções correspondentes a, pelo menos, 5% do capital social”.
No caso em apreço, a A é accionista da R. AE, SA, sendo detentora de 153143 acções, com o valor nominal de 594.280,00€, correspondentes a 59.4280% do capital social.[1]
Podia, portanto, ao abrigo desta norma legal pedir a convocação da assembleia geral.
Porém, nos termos do art.º 406.º c) do CSC “compete ao Conselho de administração deliberar qualquer assunto de administração da sociedade nomeadamente sobre: (…) Pedido de convocação de assembleias gerais”.
E, nos termos do art.º 407.º n.º 1 e n.º2 do CSC a delegação de poderes não pode abranger as matérias previstas nas alíneas a) a m) do art.º 406.º.
Verificou-se, realmente uma irregularidade, na medida em que o Conselho de Administração não podia delegar no respectivo presidente os poderes para efectuar o pedido de convocação de assembleias gerais.
Porém, a verdade é que o pedido de convocação de assembleia geral foi aceite pela presidente da mesa da assembleia geral que procedeu à respectiva convocatória.
Cremos assim, tal como entendeu a primeira instância, que “, o vício em causa sanou-se no momento em que a Assembleia Geral foi convocada pelo órgão competente para o efeito, ou seja, pelo PRESIDENTE DA MESA DA ASSEMBLEIA GERAL da sociedade AE, SA (cfr. FACTO 41.). Efectivamente, a Assembleia Geral realizada no dia 15 de Janeiro de 2015, foi convocada por quem de direito, não se verificando, no caso concreto, nenhum dos vícios elencados no artigo 56.º, números 1, alínea a) e 2, do Código das Sociedades Comerciais.”
Improcedem, pois, as alegações de recurso a este propósito.
2– Importa agora analisar o segundo fundamento invocado de anulabilidade da deliberação social ou seja, o alegado abuso de direito de voto da maioria deliberativa.
Dispõe o artigo 58.º, n.º 1, alínea b) do CSC:
“São anuláveis as deliberações que sejam apropriadas para satisfazer o propósito de um dos sócios de conseguir, através do exercício do direito de voto, vantagens especiais para si ou para terceiros, em prejuízo da sociedade ou de outros sócios ou simplesmente de prejudicar aquela ou estes, a menos que se prove que as deliberações teriam sido tomadas mesmo sem os votos abusivos.”
Ora, a questão está em saber se da matéria de facto provada, designadamente dos pontos 45.º a 81.º se pode concluir que, na base da deliberação de destituir a Autora do cargo de administradora, esteja o propósito por parte dos accionistas votantes de conseguir, através do direito de voto, vantagens especiais para si ou para terceiros, em prejuízo da sociedade ou da ora Apelante ou com o propósito de prejudicar esta. Na verdade, para a procedência do fundamento de anulabilidade da deliberação social invocada pela Apelante seria necessário que a mesma tivesse provado factos reveladores do carácter abusivo e prejudicial do exercício do voto pela maioria que aprovou a mesma deliberação, preenchendo a previsão do art.º 58.º n.º 1 b) do CSC.
Contudo, apesar da situação de evidente conflito entre os accionistas, espelhado na factualidade já referida, dali não se pode, com segurança, extrair o mencionado carácter abusivo do sentido de voto.
Acompanhamos o raciocínio da sentença recorrida quando refere o seguinte:
“É inevitável que, sendo a sociedade gerida por quatro accionistas, um dos quais detentor de mais de 50% do capital social da sociedade, se verifique, em caso de grave dissidência na condução dos destinos societários, um acantonamento de posições e interesses em redor de cada uma delas. É da natureza da vida e resulta, no fundo, da concreta opção que esteve subjacente à constituição do ente societário e à composição das respectivas participações sociais.
Daqui não decorre, porém, que o sentido das votações – legítimo e inerente ao desequilíbrio de forças estabelecido – tenha necessariamente que ver com a obtenção de vantagens especiais
para uns e iníquos prejuízos para outros.”
Não podemos, de resto, perder de vista que nos termos do art.º 403.º n.º1 do CSC, “qualquer membro do conselho de administração pode ser destituído por deliberação da assembleia geral, em qualquer momento”.
“A destituição, correspondendo a uma prerrogativa dos accionistas ou dos membros do conselho geral, pode ocorrer assim ad nutum, isto é, sem que tenha de ser invocado um motivo (uma causa) para o efeito”[2].
Contudo, como também refere e bem a sentença recorrida, “não se baseando a destituição em justa causa, ocorrendo, pura e simplesmente, sem justificação ou se é indevidamente fundamentada em justa causa, sem que esta se verifique [para o efeito, chama-se à colação a circunstância de que cabe à sociedade o ónus de provar a existência de justa causa], a mesma (destituição) poderá dar lugar à obrigação de indemnização pelos prejuízos sofridos”.
As razões ora explanadas para a deliberação de destituição de administradora, aplicam-se às restantes deliberações tomadas na Assembleia Geral realizada no dia 15 de Janeiro de 2015.
Aqui chegados, conclui-se igualmente pela improcedência das
conclusões de recurso referente a este invocado fundamento de anulabilidade das deliberações sociais em causa, pelo que, necessariamente, teria de improceder, como improcedeu o pedido principal formulado pela Autora.
Porém, a Autora, ora Apelante formulou um pedido subsidiário no sentido de ser declarada não verificada a justa causa de
destituição da A. do cargo de administradora da R. AE, SA e, consequentemente, ser a AE, SA condenada a pagar à A. AP a quantia de 140.857,92€, a título de indemnização pelos danos patrimoniais sofridos e ainda danos não patrimoniais.
Tendo sido julgada a excepção dilatória da incompetência absoluta do Tribunal para julgar este pedido e incidindo o recurso também sobre essa decisão, segue-se a apreciação dessa questão.
3-Quanto à terceira questão importa, pois, analisar se o Tribunal de Comércio é materialmente competente para apreciar o pedido de indemnização da Autora, por danos sofridos em virtude de ter sido destituída, sem justa causa, do cargo de administradora da Ré.
O Tribunal a quo entendeu que o Tribunal de Comércio é materialmente incompetente para conhecer tal questão, argumentando designadamente que:
« (…), “(…) sempre que ocorrer ad nutum (sem causa), a destituição faz incorrer a sociedade em responsabilidade, sendo os tribunais cíveis os competentes para o efeito, visto não estar em causa a deliberação social de destituição, mas sim os respectivos efeitos” (negrito nosso) (cfr. PAULO OLAVO CUNHA – Direito das Sociedades Comerciais, 5.ª Edição, ALMEDINA, página 754). Para o efeito, cabe salientar que a acção que visa desencadear a responsabilidade civil da sociedade não é reconduzível às acções previstas no artigo 128.º, n.º 1, alínea c), da Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto, por a mesma não consubstanciar uma acção relativa ao exercício de direitos sociais [a saber: direitos sociais são todos aqueles que os sócios de uma determinada sociedade têm, pelo facto de serem, enquanto titulares dessa mesma qualidade jurídica, dirigidos à protecção dos seus interesses sociais; são direitos que nascem na esfera jurídica do sócio, enquanto tal, por força do contrato da sociedade, baseados nessa particular titularidade – Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, processo n.º 612/08.4TVPRT.P1.S1, datado de 07 de Junho de 2011, in www.dgsi.pt].»
Recordemos o que a respeito regula o art.º 128.º n.º1 da Lei 62/2013 de 26 de Agosto – Lei da Organização do Sistema Judiciário (LOSJ):
“1–Compete aos juízos de comércio preparar e julgar:
a)- Os processos de insolvência e os processos especiais de revitalização;
b)- As ações de declaração de inexistência, nulidade e anulação do
contrato de sociedade;
c)-As ações relativas ao exercício de direitos sociais;
d)-As ações de suspensão e de anulação de deliberações sociais;
e)-As ações de liquidação judicial de sociedades;
f)-As ações de dissolução de sociedade anónima europeia;
g)-As ações de dissolução de sociedades gestoras de participações sociais;
h)-As ações a que se refere o Código do Registo Comercial;
i)-As ações de liquidação de instituição de crédito e sociedades financeiras.
2– Compete ainda aos juízos de comércio julgar as impugnações dos despachos dos conservadores do registo comercial, bem como as impugnações das decisões proferidas pelos conservadores no âmbito dos procedimentos administrativos de dissolução e de liquidação de sociedades comerciais.
3–A competência a que se refere o n.º 1 abrange os respetivos incidentes e apensos, bem como a execução das decisões.”
Não se integrando em qualquer outra das alíneas supra mencionadas, importa averiguar se a petição, pelo administrador destituído, de declaração da não verificação de justa causa de destituição e da consequente indemnização decorrente da destituição sem justa causa, está incluída no elenco de questões que, nos termos da legislação da organização judiciária em vigor e das regras de competência, devem ser resolvidas pelos tribunais de comércio, por se incluir no exercício de direitos sociais.
Antes de mais, importará saber o que são direitos sociais, já que a lei os não define.
Porém, a Jurisprudência e a Doutrina ajudam a esclarecer: Vejamos o que a este respeito diz o Supremo Tribunal de Justiça[3]:
“Devem incluir-se neste conceito, naturalmente, os direitos dos sócios previstos no art. 21 do Código das Sociedades Comerciais, como seja: quinhoar nos lucros, participar nas deliberações dos sócios, obter informação sobre a vida da sociedade e ser designado para os órgãos de administraçãoe fiscalização da sociedade,[4] sempre nos termos do contrato e da lei. Também, seguramente, se incluem nos direitos sociais: o direito de acção de anulação de deliberações sociais, de requerer inquérito judicial por falta de apresentação de contas e de deliberação sobre elas, de propor acção judicial de responsabilidade contra membros da administração, de preferência nos aumentos de capital por novas entradas em dinheiro, e o direito à quota de liquidação – arts 59, 67, 77, 156, 266 e 458 do C.S.C.”.
Cremos inteiramente pertinente e por isso a subscrevemos, a argumentação da Recorrente ao referir que “a criação dos tribunais de comércio pela Lei n.º 3/99, de 18/01, obedeceu a uma orientação de política judiciária fundada em critérios de especialização jurisdicional, mas não deixou de demonstrar a preocupação do legislador em conseguir uma desconcentração e descompressão dos processos pendentes. Importa, de facto, reconhecer que a própria ratio legis subjacente à criação de tribunais de comércio (rectius, juízos de comércio) está intimamente ligada à necessidade de atribuir a estes tribunais todas as matérias relacionadas com a vida societária, com a vastidão de problemas e vicissitudes que lhe é característica, e com complexidade e diversidade especiais que se lhe reconhece, e que não estão por isso acometidas aos tribunais comuns”.
E nesta linha de pensamento, à qual aderimos inteiramente e transcrevemos infra porque melhor não diríamos, escreve eloquentemente o Supremo Tribunal de Justiça[5], quanto ao âmbito da competência material dos tribunais do comércio, embora no âmbito da LOFTJ anterior à vigente LOSJ, mas aqui aplicável uma vez que o teor da norma é equivalente:
“A lei prescreve competir aos tribunais de comércio preparar e julgar, além do mais, as acções relativas ao exercício de direitos sociais (artigo 89º, nº 1, alínea c), da LOFTJ).Conforme resulta da lei, a determinação do seu sentido e alcance não se cinge à sua letra, porque também envolve a chamada mens legis, isto é, além do mais, a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada (artigo 9º, n.º 1, do Código Civil).
O limite é o de que não pode ser considerado um pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso (artigo 9º, n.º 2, do Código Civil).
Nessa operação deve, porém, o intérprete presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e expressou o seu pensamento em termos adequados (artigo 9º, n.º 3, do Código Civil).
Dir-se-á, em síntese, dever a lei ser interpretada, não apenas em função das palavras usadas pelo legislador, mas também na envolvência de todo o condicionalismo envolvente do processo de criação e subsequente vigência, ou seja, à luz dos elementos extra-literais, entre os quais se contam os antecedentes históricos e as circunstâncias relacionadas com a sua elaboração e publicação, designadamente o exórdio dos diplomas em que é consubstanciada. Estes elementos extra-literais exercem, por um lado, a função confirmativa da interpretação literal da lei em razão da presunção de que o legislador soube exprimir o seu
pensamento em termos adequados.
E, por outro, a função correctiva, se houver de se concluir que o legislador disse menos ou mais do que pretendia, a implicar, respectivamente, uma interpretação extensiva ou restritiva.
As soluções mais acertadas presumivelmente consagradas pelo legislador são as mais conformes com os valores inspiradores do sistema jurídico, captáveis no quadro da sua unidade.
A letra da lei deverá, pois, harmonizar-se, além do mais, com a motivação do legislador para a criação dos tribunais do comércio, designadamente a de não reatamento do modelo dos antigos tribunais dessa espécie, mas a de lhes atribuir competência em questões para que se requer especial preparação técnica e sensibilidade, designadamente as do contencioso das sociedades comerciais.”[6]
Ora, nesta ordem de ideias, e como referido supra, sendo um direito social o previsto na alínea d) do art.º 21.º n.º1 do Código das Sociedades Comerciais (CSC)- “ser designado para os órgãos de administração e de fiscalização da sociedade”, cremos que não pode deixar de se concluir que a acção que visa apreciar uma destituição desse órgão de administração e a falta de justa causa e indemnização por danos causados, tem necessariamente de considerar-se incluída no âmbito do exercício de um direito social.
Tal como a Apelante alega e bem “não faz sentido sonegar ao elenco de matérias a resolver pelos juízos de comércio a questão da verificação, por estes tribunais especializados, da existência ou inexistência de justa causa para a destituição de gerente ou administradores de sociedades comerciais – independentemente da forma que estas revistam – apenas porque essa questão vem desembocar na indemnização de que o gerente ou administrador é titular caso essa destituição tenha sido realizada sem justa causa.
Saber se há justa causa, ou não, para a destituição de um administrador de uma sociedade anónima diz inequivocamente respeito à vida da sociedade: trata-se de averiguar se o desempenho do administrador justifica a sua destituição, ou se esta teve lugar ad nutum, como é também expressamente admitido pela lei.
E para tanto haverá que sindicar a actividade do gerente/administrador, à luz do regime especial constante do artigo 64.º do CSC.”
Por conseguinte, não podem deixar de ser os Juízos de Comércio os competentes para apreciar tais matérias, atenta a já referida motivação do legislador que aponta no sentido de que a competência desses tribunais se prende com questões relacionadas com a actividade das sociedades comerciais e as normas específicas que a regulam.
Concluindo, pois, pela competência do Juízo de Comércio para julgar o pedido subsidiário em causa, importa revogar a decisão da primeira instância que decidiu absolver a Ré da instância relativamente a esse pedido.
IV– DECISÃO
Em face do exposto, acordamos neste Tribunal da Relação de Lisboa, em julgar parcialmente procedente o recurso e, por consequência:
1-Confirmar a decisão que julgou improcedente o pedido principal
2-Revogar a decisão que julgou o juízo de Comércio do Funchal materialmente incompetente para apreciar o pedido subsidiário, devendo, por conseguinte prosseguirem os autos, com vista à apreciação de tal pedido.
Custas pela Apelante e Apelada na proporção de ½ para cada.
Lisboa, 8 de Fevereiro de 2018
Maria de Deus Correia
Nuno Sampaio
Maria Teresa Pardal
[1]Vide ponto 37.º da matéria provada. [2]Paulo Olavo Cunha, Direito das Sociedades Comerciais, 5.ª edição, Almedina, p. 752. [3]Acórdão de 07-06-2011, Processo 612/08, disponível em www.dgsi.pt. [4]Sublinhado nosso. [5]Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18-12-2008, Processo 08B3907, disponível em www.dgsi.pt. [6]Sublinhado nosso.