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RECURSO EXTRAORDINÁRIO DE REVISÃO
PRAZO
INÍCIO DA CONTAGEM DE PRAZO
Sumário
I - O prazo de 60 dias previsto rio art. 772.°, n.° 2, al. d) do CPC para a interposição de recurso de revisão relativamente a decisão transitada em julgado quando se verifique nulidade ou anulabilidade de transacção em que a decisão se fundou, baseada em incapacidade da parte que transigiu, apenas deve ser iniciado uma vez obtido o conhecimento seguro e definitivo sobre esse facto. II - Por via de regra, esse conhecimento sobre a ocorrida incapacidade depende da existência de uma decisão judicial que o comprove de modo definitivo. III - Nos casos em que se encontrar pendente acção de interdição desse presumível incapacitado o prazo em causa deve começar a correr uma vez transitada em julgado a decisão relativa a essa interdição, a qual fixou a data de início da incapacidade.
Texto Integral
10993/95.2TVPRT-A.P1
Acordam no Tribunal da Relação do Porto
Recorrente(s): B… e C…, em representação de seu pai D….
Recorrido(s) : E… e F….
2ª Vara Cível do Porto
I - Relatório.
B… e C…, em representação de seu pai D…, vieram interpor recurso extraordinário de revisão de sentença, contra E… e F…, pedindo que se julgue nula a transacção homologada nos referidos autos, uma vez que o recorrente não estava validamente representado já que o mandato havia caducado, e bem assim, se julgue nula a notificação dirigida ao recorrente, com os efeitos previstos na alínea c), do n.º1, do artigo 776.º, do Código Processo Civil.
A fundamentar a sua pretensão alegam, em síntese, que:
- que o requerente, aquando da celebração da transacção judicial, em 29 de Março de 2004, celebrada pelo Exmo Sr. Dr. G… a quem o réu D… conferiu procuração forense em 4 de Janeiro de 1996, já o requerente, D…, se encontrava incapacitado desde 2000, pelo que se encontrava o mandato caducado, o que acarreta a nulidade da transacção.
- mesmo que se entendesse que o mandato não se encontrava caducado, sempre o, então réu, D…, estaria impedido de conhecer ou ratificar a transacção, que constitui grave prejuízo para o mandante e seus herdeiros, face à execução da transacção homologada.
- mais referem que, conforme declaração médica que juntam, o réu sofre de doença psiquiátrica, demência senil, que o incapacita de “reger a sua pessoa e administrar os seus bens”, pelo menos desde 8 de Janeiro de 2000, daí ter sido requerida a sua interdição.
Ao abrigo do disposto no art.772.º, n.º 4, do Cód. Proc. Civil, foi a instância suspensa liminarmente até ser proferida decisão final, com trânsito em julgado, no processo de interdição e, após, transitada em julgado a decisão pendente proferida nesses autos, determinou-se o prosseguimento destes autos, assim admitindo o recurso interposto, e ordenando-se, em consequência, a notificação pessoal dos requeridos para, querendo, responderem no prazo de 20 dias.
Posteriormente, comprovado o óbito do requerente D…, foram habilitados como seus herdeiros, os seus filhos, B…, C… e H…, para com eles prosseguir a instância neste apenso.
Os requeridos/recorridos E… e F…, apresentaram resposta, alegando tratar-se o presente recurso de um manifesto abuso de direito, na vertente de venirem contra factum proprium. Invocam, ainda, que, os Recorrentes na qualidade de filhos do falecido B…, não podiam deixar de conhecer o seu estado de saúde à data da celebração da referida transacção, e muito menos, que só soubessem de tal facto há menos de 60 dias.
Pedem, como tal, a final, que o presente Recurso seja julgado improcedente, e, assim, mantida a decisão recorrida nos seus exactos termos.
O tribunal recorrido veio a proferir decisão nos seguintes termos:
“Nestes termos, julgo procedente a excepção de caducidade arguida, julgando, assim, consequentemente, intempestivos os presentes autos de recurso de revisão.”
Inconformados os autores/recorrentes interpuseram recurso de apelação ora em apreciação cujas conclusões são as seguintes:
i- A sentença recorrida julgou procedente a excepção da caducidade invocada, concluindo que os recorrentes deveriam ter agido quando tiveram conhecimento da situação de seu pai.
ii-Acrescenta a sentença que tal facto foi conhecido há mais de sessenta dias à data da propositura do recurso pelo que nos termos do artigo 772º nº2 alínea d) , o recurso de revisão seria intempestivo.
iii-Acontece que se essa foi a decisão proferida, não foi assim que a Meritíssima começou por configurar a acção quando proferiu o seguinte despacho:
“Ao abrigo do disposto no art.772.º, n.º 4, do Cód. Proc. Civil, suspendo liminarmente a instância até que seja proferida decisão final, com trânsito em julgado, no processo de interdição id. no art. 3.º, do requerimento inicial de recurso.
Notifique, enviando cópia ao referido processo do requerimento inicial de interposição do presente recurso com base na interdição que aí é invocada, para os devidos efeitos, bem como deste despacho, solicitando que, oportunamente, logo que proferida a respectiva sentença, com trânsito em julgado, seja enviada a respectiva certidão”
v-Nesse despacho a Meritíssima estava na posse de todos os factos invocados pelo recorrente e nem por isso deixou de suspender a instancia pois considerou fundamental saber se a interdição viria a ser declarada e se os efeitos da mesma eram fixados em data anterior á transacção
vi-E a verdade é que os autos estiveram suspensos até que a decisão reconheceu que o interdito já se encontrava nessa situação em data anterior à transacção.
v-Ora, se a sentença que declarou a interdição é posterior à própria propositura do recurso de revisão , se é com essa sentença que se conhece o facto que legitima o recurso, então não pode considerar-se que a acção é intempestiva.
vi-É que não está em causa saber quando é que os interessados tiveram noticia que o incapaz releva comportamento que o qualificam como tal, o que está em causa é a sua declaração como tal.
vii-E só há segurança e certeza jurídica quando a declaração surge em forma de sentença.
viii-Por aqui se vê que o recurso de revisão foi interposto em devido tempo.
ix-A questão do prazo nem se deveria colocar já que se se tratava de uma transacção nula o seu conhecimento deve ocorrer a todo o tempo e é invocável por qualquer interessado
x-Nestes autos podia ser interessado um familiar desconhecido , um credor ou até o Estado pelo que o interesse na declaração de nulidade não se circunscreve aos recorrentes pelo que o prazo de sessenta dias referido na sentença também não será aqui aplicável.
xi-Neste sentido, a favor deste entendimento , importa chamar à colação o Acórdão da Relação do Porto , de 24 de Fevereiro de 1994 , in Colectânea de Jurisprudência , tomo I pagina 244 e 245 , e em cujo sumário se pode ler:
“Não ocorre caducidade do direito de interpor recurso de revisão da sentença homologatória de transacção, mesmo que tenha decorrido mais cinco de anos depois de ter sido proferida, quando tal transacção seja absolutamente nula”
xii-Ora, daqui resulta que a nulidade pode ser conhecida a todo o tempo e que a nulidade depende do conhecimento por outro tribunal de facto que determine a revisão.
xiii-O facto que permite a revisão não é o conhecimento pessoal de algum facto por parte de um qualquer recorrente, mas sim o reconhecimento por sentença de que esse facto existe , já que não é por mera declaração de um interessado que se pode concluir que determinada pessoa é incapaz.
xiv- E assim sendo, a propositura do recurso de revisão dependia do conhecimento da interdição e o momento em que a mesma foi fixada.
XV- Do exposto resulta que o pedido de Revisão foi deduzido em tempo pelo que não pode o mesmo ser declarado caduco.
XVI- A sentença recorrida viola as seguintes normas: artigo 772ºnº2 e 4 do Código do Processo civil, artigo 286º do Código Civil, artigo 359º do Código Civil
Não consta dos autos que os réus tenham apresentado contra-alegações.
II – Questão a Apreciar
Nas conclusões das suas alegações que circunscrevem o âmbito do recurso, nos termos do artigo 690,nº1, do CPC na redacção dada pelo D-L nº 329-A/95, de 12-12 aplicável aos autos, os apelantes pretendem, em essência, que este Tribunal aprecie se ocorreu, ou não, a caducidade impeditiva da apreciação do presente recurso de revisão.
III - Factos provados.
Na sentença recorrida foram considerados os seguintes factos:
1. – Com data de 29.3.04, foi celebrada transacção na acção declarativa de condenação, sob a forma ordinária, de que este recurso constitui um apenso, nos termos e de acordo com as cláusulas consignadas em acta lavrada a fls.349, do p.p., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
2 – No acto, ausente o aí Réu D…, esteve presente o Exm.º Sr. Dr. G…, a quem o aí referido demandado havia constituído seu mandatário, por procuração junta aos autos a fls. 55, do p.p., desses autos principais, datada de 4.1.96, conferindo-lhe poderes forenses para o representar em juízo.
3 – Assim, por falta de poderes, foi o aí R. D… notificado nos termos e para os fins do disposto no art. 301.º, n.º 3, do Cód. Proc. Civil, através de carta enviada com data de 8.10.04 – cf. doc. fls. 394, do p.p., dos autos principais, aqui dado por reproduzido.
4. Com data de 5.9.08, foi instaurada acção especial para declaração de interdição contra o referido D…, pedindo a interdição deste, por demência senil, invocando-se, para o efeito, que o mesmo, conforme atestado médico de 8.1.2000, padece de doença psiquiátrica que o torna incapaz de reger a sua pessoa e bens desde, pelo menos, essa data.
5. A 17,2,10, foi proferida sentença, no Proc. Registado com o n.º 4098/08.5TBVFR, que correu termos no 1.º Juízo Cível do Tribunal de Santa Maria da Feira, que decretou a interdição do referido D…, fixando o início da incapacidade em 8.1.2000, aí se tendo nomeado seu tutor o seu filho B… – cf. doc. de fls. 67, do p.p., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
6. Os presentes autos de revisão de sentença foram interpostos a 16.10.09.
IV - Fundamentação de direito Questão Prévia
Uma breve nota prévia apenas para descortinar do regime aplicável ao presente recurso de revisão designadamente quanto à aplicação, ou não, do novo regime de recursos em processo civil, emergente do DL nº 303/2007, de 24/08.
Diga-se, desde já, que entendemos ser este novo regime o aplicável nos autos pese embora a respectiva tramitação ocorra por apenso a um processo instaurado anteriormente a 01/01/2008, data de entrada em vigor do referido Decreto Lei.
Esta opção decorre da interpretação do art.11º, nº1 do DL. 303/2007 que ao definir o critério de aplicação da lei se cingiu, a nosso ver, aos recursos ordinários e não aos extraordinários, como este ora em causa, o qual configura, a nosso ver, um processo não pendente na medida em que a sua natureza intrínseca, muito própria e autónoma, o afasta da que decorre de um recurso ordinário.
Como refere Miguel Teixeira de Sousa: “A teleologia do novo regime dos recursos extraordinários não impede a sua aplicação aos processos pendentes em 1/1/2008 […]. Há que fazer, por isso, uma interpretação restritiva do disposto no artigo 11º, nº 1 do DL 303/2007 e entender que o que nele se dispõe é aplicável apenas aos recursos ordinários.” (“Reflexões sobre a reforma dos recursos em processo civil”, texto da Conferência proferida no Tribunal da Relação de Coimbra no dia 12/02/2007, disponível em http://www.trc.pt/doc/confintmts.pdf; no mesmo sentido Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil. Novo Regime, Almedina, Coimbra, 2010, pp. 17/18).
Note-se ainda que um entendimento contrário do STJ (Ac. de 05.02.2009, relator Custódio Montes) assentou na especificidade dos recursos de uniformização de jurisprudência, o quais não existiam sequer antes do Dec.-Lei n.º 303/2007.
Aplicaremos, pois, o novo regime de recursos nos presentes autos.
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A questão em litígio resume-se em apurar da admissibilidade do recurso de revisão dependente da ocorrência, ou não, de uma caducidade relativamente à sua interposição.
Vejamos o atinente quadro legal:
Dispõe o art. 771.º, al. d), do Cód. Proc. Civil, que “a decisão transitada em julgado só pode ser objecto de revisão quando se verifique nulidade ou anulabilidade de confissão, desistência ou transacção em que a decisão se fundou”.
Por sua vez, preceitua-se no art. 772.º, n.º 2, al. d), do mesmo diploma, que ‘o recurso não pode ser interposto se tiverem decorrido mais de cinco anos sobre o trânsito em julgado da decisão e o prazo para a interposição é de 60 dias, contados desde que o recorrente obteve o documento ou teve conhecimento do facto que serve de base à revisão.”
Dúvidas não restam que o trânsito da sentença que homologou a transacção celebrada entre as partes nos autos declarativos, ocorreu a 29.10.04. Assim, proposto o presente recurso de revisão a 16.10.09, conclui-se não se encontrar decorrido o prazo dos 5 anos aludido no art. 772.º, n.º 2, do Cód. Proc. Civil.
Onde o dissídio existe é no decurso do prazo de 60 dias concomitantemente exigido.
Na sentença recorrida, a argumentação é clara: “como se refere na própria petição inicial do presente recurso de revisão o R. D… encontrava-se incapacitado desde 2000. (...) Quer nessa acção, quer nos presentes autos, remete-se para o atestado médico junto a fls. 19, obtido em 8.1.2000, que declara padecer o então recorrente D… de ‘doença psiquiátrica, demência senil, que determina anomalia permanente da personalidade, encontrando-se incapaz de reger a sua pessoa e administrar os seus bens’, daí o seu internamento antes dessa data (cf. fls. 20, do processo principal). Como tal, os familiares do incapacitado, seus herdeiros, habilitados, que ora o representam, podiam e deviam, aquando da transacção ter dado conhecimento ao tribunal da incapacidade do aí réu, seu pai, para entender e querer o acordo estabelecido pelas partes nos termos das cláusulas que fixaram. (...) Aliás, quer o próprio recorrido, devidamente representado, quer os habilitados, não negam ter conhecimento da incapacidade do então réu, remontado àquela data de 8.1.2000, antes entendem que esse prazo só pode ser contado a partir da sentença que decretou a interdição do recorrente.”
Todavia, o tribunal recorrido entende inaceitável, neste caso específico, essa possibilidade dilatória: “A ser assim, o que não se entende, sempre se teria de considerar verificarem-se os pressupostos do abuso do direito neutralizador do direito que abusivamente ora pretendem exercer. Pois, caso contrário estar-se-ia a premiar a actuação dos RR. na acção principal que omitiram um facto de suma importância para os autos, sonegando-o, por forma a obter, a determinada altura, os efeitos pretendidos com a transacção, vindo, depois, quando os mesmos efeitos deixaram de lhes interessar, invocar a nulidade do acto.”
Dir-se-á, portanto, que para o tribunal recorrido a questão envolve a definição do que deve ser entendido como “o conhecimento do facto que serve de base à revisão”. Uma vez assente esse dado sempre cumpriria aferir da possibilidade de poder considerar-se esse prazo de 60 dias respeitado naquelas situações em que os invocantes conheciam esse facto em data anterior à própria transacção, num eventual abuso de direito.
Por seu turno, o recorrente adenda dois argumentos principais. O primeiro já delineado assenta na concepção segundo a qual esse conhecimento apenas ocorre quando a declaração surge em forma de sentença: o facto que permite a revisão não é o conhecimento pessoal por parte de interessado entendido enquanto mera percepção subjectiva de um facto, mas sim o reconhecimento por sentença judicial de que esse facto efectivamente existe já que não é por mera declaração ou convicção que se pode concluir que uma determinada pessoa é juridicamente incapaz.
O outro fundamento sustenta que a questão do prazo nem se deveria colocar já que, sendo a transacção nula, o seu conhecimento deve ocorrer a todo o tempo.
Pois bem.
Se atentarmos na redacção ao n.º 2 do artigo 301, verifica-se que, estando em causa a anulação de uma transacção homologada por sentença judicial, o interessado tem duas alternativas, para obter um mesmo objectivo: “O trânsito em julgado da sentença proferida sobre a confissão, desistência ou transacção não obsta a que se intente a acção destinada à declaração de nulidade ou à anulação de qualquer delas, ou se peça a revisão da sentença com esse fundamento, sem prejuízo da caducidade do direito à anulação" (nº 2 do mesmo dispositivo).
Assim, em sede de recurso de revisão de sentença homologatória de transacção e como fundamento do mesmo pode ser questionada a verificação de quaisquer vícios substanciais ou formais que gerem a nulidade ou a anulabilidade da confissão, desistência ou transacção, sem necessidade, como sucedia no regime anterior a 2003, de ter de recorrer, previamente, à acção anulatória.
No caso concreto, os recorrentes optaram por desencadear o presente recurso de revisão assente no pressuposto segundo o qual o celebrante da transacção homologada por sentença judicial, seu pai, se encontrava incapacitado de querer e entender no momento em que a transacção foi celebrada.
O facto gerador da invocada nulidade é, pois, a incapacidade do pai dos recorrentes a qual veio a ser considerada demonstrada em acção especial de interdição que decidiu, por sentença transitada em julgado, decretar a interdição total da pessoa em causa, D…, fixando o começo da incapacidade em 8 de Janeiro de 2000 (vide sentença de fls.90).
Julgamos, portanto, salvo melhor opinião, que o facto gerador do presente recurso ocorre com o decretamento da interdição do incapacitado D… a qual, por sua vez, apenas poderia ser decretada judicialmente, tendo-o sido em data posterior à instauração do presente recurso de revisão que data de Outubro de 2009. Aceitar uma solução que se conforme com a mera convicção sobre a existência dessa incapacidade, desvalorizaria um pressuposto essencial da validade operativa dessa situação de facto: o respectivo reconhecimento judicial, decretado em acção própria.
Invoca ainda o Tribunal recorrido que os recorrentes sabiam dessa incapacidade em data anterior por força de um atestado médico que referia a demência senil do seu pai datado já de 2000 existindo, assim, uma prova pericial sobre essa circunstância de facto.
Simplesmente não deve ser esse conhecimento da existência de uma doença legitimadora de uma eventual interdição, o facto que conduz ao preenchimento dos pressupostos de instauração de um recurso de revisão.
A natureza excepcional deste recurso motivada pelos ditames da certeza e segurança jurídica exigem daqueles que a intentam uma certeza clara sobre a respectiva viabilidade. Ora, esse convencimento seguro apenas pode ocorrer uma vez decretada a incapacidade por decisão judicial com eficácia “erga omnes” acompanhada de expressa menção quanto à data de início da incapacidade geradora da interdição; e nem se diga que, deste modo, se permite uma incerteza temporal alargada relativamente ao caso julgado da decisão homologatória da transacção ora posta em crise na medida em que este prazo de sessenta dias contados desde o conhecimento da sentença de interdição terá sempre que surgir delimitado pelo prazo peremptório de cinco anos do art.772º, nº2,al. d).
O que, a nosso ver, não deverá ser possibilitado é que um prazo exíguo de 60 dias seja, na prática, restringido através de um aligeiramento do fundamental requisito de conhecimento da sentença interditória pelo impugnante – não podendo tal prazo iniciar-se sem que ao recorrente/impugnante tenha sido facultada oportunidade para aceder e conhecer tal título judicial (vide, embora relativamente aos casos de simulação processual, a propósito do prazo do art.772º do CPC, a fundamentação análoga no sentido de uma especial exigência quanto ao requisito do “conhecimento” do Ac. do STJ de 15.12.2011, processo 1065/08.2TVPRT-A.P1.S1, relator Lopes do Rego, in dgsi.pt).
Resta apreciar do invocado abuso de direito.
Desde logo, importa referir que foi alegado concomitantemente o conhecimento desta incapacidade, à data da transacção que ora se pretende anular, quer pelos recorrentes quer pelos recorridos (vide art.10º do requerimento inicial relativo ao recurso de revisão) o que, de algum modo, desvaloriza a pretendida invocação.
Mas, em tese geral, deve, a nosso ver, reservar-se a apreciação do comportamento das partes designadamente na modalidade de “venire contra factum proprium” em sede de apreciação substancial dos requisitos exigidos para o decretamento da nulidade da transacção, evitando o condicionamento dessa apreciação através de um indeferimento liminar assente na caducidade do direito que se pretende exercer. E este entendimento seria sempre exigido à luz do expendido sobre a necessidade de apenas se dever concluir pelo efectivo conhecimento do facto relativo à incapacidade uma vez decretada a mesma, através de sentença judicial, transitada em julgado.
Deste modo, em conclusão, irá revogar-se a decisão recorrida a qual deve ser substituída por outra que determine o prosseguimento do presente recurso de revisão, considerando o mesmo interposto em tempo próprio.
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Sumariando o decidido (art.713º, nº7 do Código do Processo Civil):
I - O prazo de 60 dias previsto no art. 772.º, n.º 2, al. d) do CPC para a interposição de recurso de revisão relativamente a decisão transitada em julgado quando se verifique nulidade ou anulabilidade de transacção em que a decisão se fundou, baseada em incapacidade da parte que transigiu, apenas deve ser iniciado uma vez obtido o conhecimento seguro e definitivo sobre esse facto.
II - Por via de regra, esse conhecimento sobre a ocorrida incapacidade depende da existência de uma decisão judicial que o comprove de modo definitivo.
III – Nos casos em que se encontrar pendente acção de interdição desse presumível incapacitado o prazo em causa deve começar a correr uma vez transitada em julgado a decisão relativa a essa interdição, a qual fixou a data de início da incapacidade.
V - Decisão
Nestes termos, decide-se revogar a decisão recorrida, considerando o recurso de revisão em causa nos autos interposto atempadamente.
Custas pelos recorridos.
Porto, 23 de Outubro de 2012
José Manuel Igreja Martins Matos
Rui Manuel Correia Moreira
Henrique Luís de Brito Araújo