INVENTÁRIO
SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DA PARTILHA
TÍTULO EXECUTIVO
CRÉDITO DA HERANÇA
DEVEDOR NÃO INTERESSADO NO INVENTÁRIO
CASO JULGADO
Sumário

I - A sentença homologatória de partilha, após trânsito constitui título executivo.
II - Sendo a verba partilhada no inventário um crédito da herança ou dívida activa litigiosa não se forma caso julgado relativamente ao devedor que não seja interessado no inventário.

Texto Integral

Proc. n.º 221/06.2TJVNF-E.P1 - APELAÇÃO

Relator: Caimoto Jácome(1338)
Adjuntos: Macedo Domingues()
António Eleutério()

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO

1-RELATÓRIO

B…, com os sinais dos autos, veio deduzir oposição à acção executiva que o exequente C…, com os sinais dos autos, por apenso ao processo de inventário em referência (nº 221/06.2TJVNF), lhe move para dele obter o pagamento de € 31.165,70, acrescida de juros legais vincendos.
Alegou, em síntese, que o título executivo dado à execução (sentença homologatória de partilha) não pode considerar-se título executivo contra o ora executado.
Invoca que ao exequente foi adjudicado um crédito litigioso sobre o executado, o qual não é parte interessada no inventário, pelo que a sentença homologatória de partilha não é título executivo contra ele, devendo ter interposto as competentes acções declarativas conforme outros interessados o fizeram.
Impugna, ainda, o oponente os factos que levaram à decisão de reconhecimento, confirmada pelo Tribunal da Relação do Porto, da existência de uma determinada quantia que por si foi levantada e que terá de ser reportada à herança.
O exequente contestou a oposição.

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Conclusos os autos, foi proferido saneador/sentença, no qual se considerou, além do mais, que “(…)os motivos alegados não implicam a incerteza da obrigação ou sua iliquidez da quantia fixada e como tal poderia o exequente intentar directamente acção executiva contra o executado”, pelo que, consequência, decidiu-se (dispositivo):
“Pelo exposto julgando-se improcedente a presente oposição, considera-se válido o título executivo.
Custas pelo oponente.”.
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Inconformado, o executado/opoente apelou daquela decisão, tendo, nas alegações, formulado a seguintes conclusões:
A. A sentença recorrida não tem qualquer suporte na lei, uma vez que embora reconheça que o executado figura como terceiro nos autos, partiu do pressuposto errado de que ao terceiro são aplicáveis as mesmas regras que às partes/interessados!
B. Tal constatação decorre expressamente do texto da douta sentença recorrida, designadamente da doutrina e jurisprudência citada.
C. De facto, quer o acórdão da Relação de Coimbra quer a doutrina citada na sentença recorrida referem-se a situações completamente distintas das dos autos, porquanto quer numa quer noutra o credor é parte/interessado no inventário e não um terceiro como no caso aqui em apreço.
D. Note-se que o Acórdão da Relação de Coimbra citado na sentença, que data de 18/09/07 e não 18/08/07, como certamente por lapso vem referido, refere-se a uma partilha em consequência de divórcio cujo objecto foi a apreciação da possibilidade da interessada mulher poder ou não lançar mão do processo executivo especial previsto no artº 1378º, nº 3 CPC para cobrar coercivamente do interessado marido as tornas em dívida!
E. Ou seja, o citado acórdão reconhece, e bem, que a sentença homologatória de partilha constitui titulo executivo, porém apenas relativamente àqueles que são partes nos autos.
F. Conforme resulta dos autos, ao recorrido foi adjudicado um crédito (litigioso) sobre o recorrente, no montante de (18.332,76 € + 10.245,98 €) 28.578,74 € acrescido de juros.
G. Ora o processo de inventário tem natureza complexa e mista, tanto graciosa como contenciosa - cfr. Ac. RL de 25/06/92, CJ, Tomo III, pág. 216, e D. S. Carvalho de Sá, Do Inventário, 5ª ed., pág. 22 – que, quanto às questões nele decididas, assume o aspecto contencioso, funciona como uma acção, é uma verdadeira causa.
H. Sucede que para haver caso julgado é necessário que haja repetição de uma causa, pressupondo essa repetição, além da identidade de sujeitos, a identidade do pedido e da causa de pedir – artºs 497º, nº 1, e 498º, nº 1 CPC.
I. No que respeita aos limites subjectivos, o caso julgado definido no inventário, abrange o cabeça-de-casal e os demais interessados a que alude o artº 1327º (cujo nº 3, prevê a admissibilidade de intervenção dos credores da herança nas questões relativas à verificação e satisfação dos seus direitos), estendendo-se, por conseguinte, às pessoas que suscitaram a questão decidida ou que sobre ela se pronunciaram.
J. Acontece que o recorrente nunca foi citado para o processo de inventário, pelo que não é parte interessada no inventário nem a sentença homologatória da partilha o condena no que quer que seja.
K. Consequentemente a sentença homologatória de partilha não constitui titulo executivo relativamente a ele.
L. Acresce que, a acção executiva destina-se a obter o cumprimento de uma obrigação, sendo seus protagonistas os sujeitos dessa mesma obrigação. Daí que se diga no artigo 55º, n.º 1, do CPC que a execução deve ser promovida pela pessoa que no título executivo figure como credor, contra a pessoa que nesse mesmo título tenha a posição de devedor.
M. Esta regra geral da legitimidade para a acção executiva conhece apenas as quatro excepções previstas no n.º 2 do art.º 55º (título ao portador), nos nºs 1 e 2 do art.º 56º (sucessão no direito ou na obrigação e dívida provida de garantia real sobre bens de terceiro) e no art.º 57º (eficácia subjectiva do caso julgado, do lado passivo, em relação a terceiros) do CPC.
N. É certo que quando o titulo é uma sentença, a legitimidade passiva para a acção executiva é alargada às pessoas que, não tendo sido por ela condenadas, são no entanto abrangidas pelo caso julgado (art.º 57º CPC) porém, esta extensão da eficácia subjectiva do caso julgado, dá-se apenas no caso de transmissão da situação jurídica do réu, por acto entre vivos, sem subsequente intervenção do adquirente no processo ou no caso de chamamento à intervenção principal de terceiro titular de situação susceptível de gerar litisconsórcio passivo que não intervém na causa (art.º 271º n.º 3 e 328º n.º 2 CPC) – neste sentido vide Fernando Amâncio Ferreira, in Curso de Processo de Execução, 11ª edição, pag. 85, Joel Timóteo Ramos Pereira, in Prontuário de Formulários e Tramites, vol. IV, Processo Executivo, pag. 169 e José Lebre de Freitas, em “A acção executiva”, 5º ed., Coimbra Editora, pag. 127 e seguintes.
O. Ora, no caso concreto, não se verifica qualquer uma destas situações.
P. Perante o que se expôs quanto à natureza do processo de inventário e ao caso julgado da sentença nele proferida, que pressupõe a identidade de sujeitos (que não se verifica já que o recorrente não é nele interessado directo), resulta claro que não constitui caso julgado a sentença homologatória de partilha que se pretende executar.
Q. Note-se que fosse certo o entendimento do tribunal recorrido, seria coarctada ao recorrente a possibilidade de se defender, pois em sede de execução de sentença o recorrente apenas se pode opor com os fundamentos taxativamente enumerados no art.º 814º CPC.
R. Acresce que este entendimento permitiria que num inventário as partes se conluiassem e engendrassem um crédito a favor de um terceiro, que inesperadamente e sem qualquer hipótese de defesa seria surpreendido com a propositura de uma execução!!!
S. Pelo exposto, andou mal o tribunal recorrido ao decidir que a sentença homologatória de partilha constituiu titulo executivo relativamente ao recorrente, já que não sendo este parte no inventário, todas as decisões aí tomadas não fazem caso julgado relativamente a si.
Termos em que deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando a douta sentença recorrida, substituindo-a por outra que, considerando que a sentença homologatória de partilha não é titulo executivo relativamente ao recorrente julgue a oposição à execução totalmente procedente.

Na resposta às alegações a exequente defende o decidido.
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

2- FUNDAMENTAÇÃO

2.1- OS FACTOS E O DIREITO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - arts. 684º, nº 3, e 685º-A, nºs 1, 2 e 2, do C.P.Civil.
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Os factos a considerar são os descritos no relatório, devendo considerar-se, ainda, o seguinte (ver certidão de fls. 97-163, pedida à 1ª instância):
- Nos autos de inventário a que se procedeu por óbito de D…, a cabeça-de-casal E…, na relação de bens que apresentou, indicou como verba nº 1 “A quantia de 29.403.115$50 (vinte e nove milhões quatrocentos e três mil e cento e quinze escudos e cinquenta centavos), hoje correspondente a €146.662,12 (cento e quarenta e seis mil e seiscentos e sessenta e dois euros e dois cêntimos), acrescida de juros vencidos, que se encontrava depositado a prazo na conta nº ……..-.., do F…, estabelecimento nº …, titulada unicamente pelo inventariado e levantada no Balcão de …, por B…, sobrinho do inventariado, já após óbito do inventariado, e, no uso de poderes que este lhe tinha outorgado em vida, quantia esta que se encontra em poder do mesmo (docs 1 e 2. Valor € 146.662,12.”.
- B…, ora recorrido, sobrinho do falecido D… (inventariado), foi ouvido, na qualidade de alegado devedor, conforme o disposto nos artºs 1351° e 1348°, do CPC, vindo a negar que tenha procedido a esse levantamento, acrescentando que nada devia à dita herança;
- No acórdão do Tribunal da Relação, de 20/04/2009 (ver certidão), confirmando-se o decidido na 1ª instância, decidiu-se manter o relacionamento da aludida verba nº 1 (dívida activa ou crédito da herança).
Nesse acórdão ponderou-se, além do mais, que:
“(…)Claro que: "a decisão de qualquer questão em processo de inventário deve revestir-se com um grau de elevada certeza sobre a existência ou inexistência dos bens reclamados, com conclusão segura e consciente, não discricionária, que não se compadece, a maior parte das vezes, com uma averiguação sumária” (vg. Ac. RP, de 27/1/2003, JTRP00035456).
Ora, o que resulta dos elementos bancários carreados para os autos, sem sombra de dúvida razoável (embora nem todas as questões, eventualmente colocadas, hajam sido respondidas) é que o falecido tinha, à data da sua morte, tais valores depositados em conta bancária de que era titular e que podia ser movimentada por B…, a quem aquele tinha passado procuração, para esse fim (devidamente arquivada na referida instituição bancária).
Acontece que, em data posterior ao falecimento do inventariado, mais precisamente no dia que imediatamente se lhe seguiu - 26/12/1995, foram movimentadas importâncias dessa mesma conta, por parte de (P.P.) procurador.
Logo, por parte da pessoa acima referida.
Assim, tudo aponta para que, tal verba, existente à data do óbito de D…, se encontre em poder ou à disposição de terceiro; o que, como já dissemos, não invalida que deva ser devidamente relacionada, como o foi, por ser parte integrante do acervo da herança e, como tal, deverá ser incluída no inventário (…).”;
- No aludido processo de inventário, foi proferida (fls. 715) a seguinte decisão (sentença homologatória), transitada em julgado: “Nestes autos de inventário, a que se procedeu pelo falecimento de D…, falecido em 25.12.1995 em que desempenhou as funções de cabeça-de-casal, E…, homologo por sentença a partilha a que se reporta o mapa de fls. 629 a 636, adjudicando aos interessados os respectivos quinhões.
Custas pelos interessados, na proporção do que cada um recebeu -artigo 1383º do Código de Processo Civil.”;
- Para preenchimento do quinhão hereditário do interessado C…, ora exequente/apelado, foi-lhe adjudicado, nomeadamente, o valor de € 18.332,76 (dezoito mil trezentos trinta dois euros e setenta seis cêntimos), com referência à verba nº 1 da relação de bens, mais os juros vencidos valor de € 10.245,98 (dez mil duzentos quarenta e cinco euros e noventa e oito cêntimos), num total de € 28.578,74 (vinte oito mil quinhentos setenta e oito euros e setenta e quatro cêntimos), até 02/11/2009 acrescendo juros vincendos desde então.
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O inventário é um processo com uma peculiar natureza, a um tempo gracioso e contencioso, que visa, em última análise, uma partilha global do património hereditário, visando a salvaguarda da universalidade e unidade da herança ou do património comum (artº 1326º, do CPC, J. Oliveira Ascensão, Sucessões, 5ª ed., p. 509 e segs., J. A. Lopes Cardoso, Partilhas Judiciais, I, 3ª ed., p. 16 e Ac. STJ de 26-10-76, BMJ, 260º/113).
“O processo de inventário, ainda que de natureza contenciosa, apresenta uma feição particular, muito diferente das acções declarativas, o que em alguns aspectos o aproxima mesmo dos processos de jurisdição voluntária. Na regulação de interesses a partilhar, o processo de inventário é, essencialmente, uma medida de protecção para evitar prejuízos, interessando que a partilha seja efectuada com igualdade e justiça” (ver acórdão do STJ, de 9 de Julho de 1992, no proc. nº 082441, disponível em www.dgsi.pt/jstj).
O processo de inventário é um caminho em direcção a uma partilha justa e equilibrada de um património cujo titular desapareceu e que se radicou em vários sucessores. Um caminho que se desenvolve até à fase de julgamento (que no dizer do acórdão do STJ, na revista nº04B1169, de 15 de Abril de 2004, publicado também em www.dgsi.pt/jstj, «é constituída pelo conjunto do despacho determinativo da partilha, mapa informativo que haja, mapa de partilha e sentença homologatória da partilha») e no decurso do qual várias decisões, de natureza processual ou substantiva, vão sendo tomadas e se vão consolidando, à medida que transitam os despachos que as assumem. Tudo para que, no momento desse julgamento, as questões suscitadas pelos interessados estejam enfrentadas e decididas, e o caminho aplanado para uma decisão final ... justa e equilibrada.
As decisões que vão sendo tomadas constituem (Lopes Cardoso, Partilhas Judiciais, II, 1970, pág. 251) “verdadeiros julgamentos contenciosos que não podem deixar de impor-se às partes”.
Toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva (artº 45º, nº 1, do CPC).
Como ensina J. Lebre de Freitas (A Acção Executiva, 2ª ed., p. 31), o acertamento é o ponto de partida da acção executiva, pois a realização coactiva da prestação pressupõe a anterior definição dos elementos (subjectivos e objectivos) da relação jurídica de que ela é objecto. O título executivo contém esse acertamento.
Os requisitos de exequibilidade da sentença estão definidos no artº 47º, do CPC.
A sentença homologatória da partilha (artº 1382º, do CPC), uma vez transitada em julgado, constitui título executivo, podendo os interessados servirem-se da mesma para intentarem a correspondente execução contra quem se recusar a entregar os bens, a pagar as tornas ou a cumprir os legados (Lebre de Freitas, A Acção Executiva, 4ª ed, pag 49, e Miguel Teixeira de Sousa, Acção Executiva Singular, pag 74).
O conceito e requisitos do caso julgado constam dos artºs 497º e 498º, do CPC.
Como se sabe, a regra geral em matéria de eficácia subjectiva do caso julgado é que este apenas vincula as partes na acção (arts. 671º e 498º, nº 2, do CPC).
No caso do processo de inventário, apenas os interessados estão vinculados ao caso julgado, sem prejuízo do estatuído nos artºs. 1327º e 1336º do CPC, devendo-se ter presente a revogação do artº 1397º pelo DL nº 227/94, de 08/09.
No referenciado processo de inventário, tendo sido deduzida reclamação, nos termos do artº 1348º, do CPC, seguiu-se a tramitação do incidente próprio, decidindo-se (na 1ª e 2ª instâncias) manter o relacionamento da verba nº 1, a qual constitui uma dívida activa da herança (artº 1345º, nº 1, e 1351º, do CPC). O artº 1351º prevê o regime de negação das dívidas activas. O nº 1 estabelece uma equiparação de regime entre a negação da dívida pelo próprio devedor e a reclamação pelos interessados, aplicando-se em ambos os casos, o disposto no artigo 1348º, do CPC. O nº 2 preceitua que “Sendo mantido o relacionamento do débito, a dívida reputa-se litigiosa; sendo eliminada, entende-se que fica salvo aos interessados o direito de exigir o pagamento pelos meios competentes”.
A aludida verba nº 1, proporcionalmente adjudicada ao interessado C… (exequente) constitui, pois, uma dívida litigiosa.
A execução tem de ser promovida pela pessoa que no título executivo figure como credor e deve ser instaurada contra a pessoa que no título tenha a posição de devedor (artº 55º, nº 1, do CPC).
No caso, o título dado à execução é uma sentença condenatória, homologatória de partilha (artº 46º, nº 1, al. a), do CPC).
No artº 57º, do CPC, regula-se a exequibilidade da sentença contra terceiros.
Sustenta J. Lebre de Freitas (A acção executiva, 5º edição, p. 127 e seguintes), que a extensão da eficácia subjectiva do caso julgado, do lado passivo, ocorre apenas nos seguintes casos:
- Transmissão da situação jurídica do réu, por acto entre vivos, sem subsequente intervenção do adquirente no processo (art.º 271º, nº 3, do CPC);
- Chamamento à intervenção principal de terceiro titular de situação susceptível de gerar litisconsórcio passivo que não intervém na causa (328º, nº 2, do CPC).
Os fundamentos de oposição à execução baseada em sentença estão especificados no artº 814º, do CPC.
Com efeito, nas situações em que a execução se funda em sentença a oposição só pode ter por fundamento algum dos que vêm enumerados no art. 814, nº 1, do CPC, enumeração esta de carácter taxativo, conforme resulta da utilização do advérbio “só” na redacção deste preceito.
Tais fundamentos são os seguintes: a) inexistência ou inexequibilidade do título; b) falsidade do processo ou do traslado ou infidelidade deste, quando uma ou outra influa nos termos da execução; c) falta de qualquer pressuposto processual de que dependa a regularidade da instância executiva, sem prejuízo do seu suprimento; d) falta ou nulidade da citação para a acção declarativa quando o réu não tenha intervindo no processo; e) incerteza, inexigibilidade ou iliquidez da obrigação exequenda, não supridas na fase introdutória da execução; f) caso julgado anterior à sentença que se executa; g) qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração e se prove por documento (a prescrição do direito ou da obrigação pode ser provada por qualquer meio); h) tratando-se de sentença homologatória de confissão ou transacção, qualquer causa de nulidade ou anulabilidade desses actos.
Estes fundamentos são de agrupar em três categorias: i) oposição por falta de pressupostos processuais gerais da acção; ii) oposição por falta de pressupostos específicos da acção executiva; iii) oposição por motivos substanciais.
A presunção estabelecida pelo título judicial quanto à existência da obrigação só pode ser destruída, em oposição à execução, por prova documental (artº 814º, al. g), do CPC).
O opoente questiona a exequibilidade do título executivo no que toca ao mesmo ou, noutra perspectiva, a legitimidade passiva.
Como se refere na decisão recorrida, o que se discute nestes autos é saber se o exequente teria de utilizar primeiro a acção declarativa, a fim de ver reconhecido o seu crédito contra o executado, ou se podia intentar, imediata ou directamente, a acção executiva, após o trânsito em julgado da sentença de partilha.
Na 1ª instância ajuizou-se no sentido da imediata exequibilidade da mencionada sentença homologatória.
Seguramente, esse juízo é defensável e respeitável, embora não seja aquele por que optamos.
Com efeito, a decisão do incidente previsto nos artºs 1348º e 1351º, do CPC, reporta-se, no essencial, à constatação, com base em prova documental (bancária) da existência de uma determinada quantia na conta bancária do inventariado, à data da sua morte, e à necessidade de esse crédito ser relacionado no inventário, com vista à partilha, por, em princípio, ser parte integrante do acervo da herança a partilhar.
Mais se constatou que “ Assim, tudo aponta que tal verba se encontre em poder ou à disposição de terceiro …” (o executado/opoente). Este, porém, negou a dívida activa, sendo certo que no mencionado acórdão da Relação se ponderou que “o que resulta dos elementos bancários carreados para os autos, sem sombra de dúvida razoável (embora nem todas as questões, eventualmente colocadas, hajam sido respondidas), é que o falecido tinha, à data da sua morte, tais valores depositados em conta bancária de que era titular e que podia ser movimentada por B…, a quem aquele tinha passado procuração, para esse fim” (sublinhado nosso).
Não é, a nosso ver, totalmente seguro que, à face da sentença homologatória da partilha dada à execução, o executado/opoente, que não se apresenta como interessado no inventário, seja devedor da quantia exequenda.
Na verdade, atento o que se deixou exposto, pensamos que, no caso, constituindo a verba nº 1, partilhada no inventário, um crédito da herança ou uma dívida activa litigiosa, não se verifica o caso julgado relativamente ao executado/opoente, estranho ao inventário. Não se justifica, pois, a extensão da eficácia subjectiva do caso julgado, do lado passivo (artº 57º, do CPC). A sentença homologatória da partilha não constitui caso julgado em relação ao alegado devedor (dívida activa da herança), mas apenas produz efeitos em relação aos interessados. O trânsito em julgado da sentença homologatória da partilha apenas produz efeitos internos, não vinculando o devedor que negou o débito, a não ser que este expressamente tivesse aceitado a dívida (ver, no que concerne ao credor hipotecário o acórdão do STJ, de 11/12/2001, em CJ/STJ, III, p.. 143).
Por isso, o opente não é parte legítima na acção executiva, verificando-se o fundamento de oposição invocado pelo executado conducente à extinção da execução ou da instância executiva (artºs 55º, 466º, 493º, nº 2, 494º, al. e), 814º, nº 1, al. c), e 817º, nº 4, do CPC).
A questão da eventual dívida do executado à herança terá, quanto a nós, de ser apreciada, com maior profundidade, na competente acção declarativa, onde aquele, com todas as garantias, poderá exercer, amplamente, o contraditório.
Procede, assim, o concluído na alegação do recurso.
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Sumariando (artº 713º, nº 7, do CPC):
I-A sentença homologatória da partilha (artº 1382º, do CPC), uma vez transitada em julgado, constitui título executivo;
II- Constituindo a verba partilhada no inventário um crédito da herança ou uma dívida activa litigiosa, não se verifica o caso julgado relativamente ao alegado devedor, ora executado/opoente, que não seja interessado no inventário;
III- Não se justifica a extensão da eficácia subjectiva do caso julgado, do lado passivo (artº 57º, do CPC).

3- DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar procedente a apelação, revogando-se a decisão recorrida e, dada a ilegitimidade do opoente, absolve-se o mesmo da instância executiva.
Custas pelo apelado.

Porto, 19/11/2012
Manuel José Caimoto Jácome
Carlos Alberto Macedo Domingues
António Eleutério Brandão Valente de Almeida