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CONTRATO DE TRABALHO A TERMO
DEDUÇÃO DAS RETRIBUIÇÕES AUFERIDAS PELO TRABALHADOR APÓS O DESPEDIMENTO ILÍCITO
COMPENSAÇÃO PELA CADUCIDADE DO CONTRATO A TERMO
Sumário
I – Não é aplicável o disposto no nº 2 do artº 437º do Código do Trabalho (dedução das retribuições auferidas após o despedimento) à cessação, por despedimento ilícito, do contrato de trabalho a termo certo. II – A partir da observação de que o nº 2, al. a), do artº 440º do CT estabelece uma compensação mínima, podemos concluir que o nº 1 do mesmo artigo (ao referir que “ao contrato de trabalho a termo aplicam-se as regras gerais de cessação do contrato, com as alterações constantes do número seguinte”) afasta a aplicabilidade do artº 437º, nº 2. III - Se o trabalhador ilicitamente despedido tem direito no mínimo à importância correspondente às retribuições que deixou de auferir até ao termo do contrato, então não há que deduzir as importâncias a que se refere o artº 437º. IV – Pelas mesmas razões não há também lugar à dedução prevista no artº 437º, nº 4, do CT, ou seja à quantia respeitante ao período decorrido desde a data do despedimento até 30 dias antes da data da propositura da acção. V – As referidas retribuições englobam não só as retribuições salariais propriamente ditas, mas também todas as outras importâncias que o trabalhador teria auferido até final do contrato, nelas se incluindo a compensação que receberia se o contrato tivesse cessado, no seu termo, por caducidade.
Texto Integral
Autor: A...
Ré: B...
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:
I. O autor instaurou contra a ré a presente acção declarativa sob a forma de processo comum pedindo a declaração da ilicitude do despedimento, com a condenação da ré a pagar-lhe as seguintes quantias: todas as retribuições que deixou de auferir, referentes aos meses de Janeiro a Novembro de 2006, acrescidas do subsídio de refeição, no valor global de € 6.091,05; € 52,74, a título de compensação; € 750,00 a título de indemnização de danos morais; juros de mora legais.
Para tanto, alegou em síntese:
Que por contrato de trabalho a termo certo de 12 meses, desempenhou a actividade de vigilante por conta, sob a direcção, fiscalização e autoridade da ré, desde 15 de Novembro de 2005 até 3 de Janeiro de 2006, data em que foi despedido pela ré, invocando esta a denúncia do contrato no período experimental. Porque que já se havia esgotado o período experimental do contrato quando este foi denunciado, ocorreu despedimento ilícito.
Contestou a ré, impugnando a factualidade alegada na petição, sustentando que o autor não tem direito às quantias peticionadas. Concluiu no sentido da improcedência da acção.
Prosseguindo o processo os seus regulares termos veio a final a ser proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, declarando a ilicitude do despedimento do autor e condenando a ré no pagamento ao autor da quantia de € 93,93, acrescida dos respectivos juros de mora, contados desde o dia 3 de Janeiro de 2006 e até integral e efectivo pagamento, computados à taxa legal de 4% ao ano; no mais, foi a ré absolvida.
É desta decisão que, inconformado, o autor vem apelar.
Alegando, conclui: “A. O regime especial do contrato de trabalho a termo, previsto no artigo 440º nº 2 alínea a) do C. do Trabalho, prevê o pagamento de retribuições devidas ao trabalhador por força da declaração de ilicitude do despedimento; B. Sendo que não deverão ser subtraídas as importâncias entretanto recebidas, só porque o trabalhador começou a trabalhar para outra entidade. C. Não foi este o espírito que, em nosso entender, o legislador procurou transmitir. D. Por outro lado, a compensação a pagar ao trabalhador deverá ser calculada como se o contrato de trabalho tivesse permanecido até ao seu termo - artigo 388° nº 2 do C. do Trabalho. E. Caso contrário, seria sempre mais útil ao empregador despedir o seu trabalhador antes do terminus do contrato, porque sairia sempre mais beneficiado, apesar da ilicitude do despedimento. F. A sentença recorrida violou o disposto na alínea c), do nº 1 do artigo 668º.° do C. Processo Civil e artigos 4400 nº 1 al. a) e 388° nº 2 do C. do Trabalho. Nestes termos e nos mais de direito deverá a presente sentença ser revogada e substituída por outra, condenando-se a recorrida a pagar ao recorrente as importâncias devidas pela ilicitude do seu despedimento, nos termos supra expostos.”
A ré apresentou contra-alegações, pugnando pela manutenção do julgado.
Recebido o recurso e colhidos os vistos legais, pronunciou-se o Exmº Procurador-geral Adjunto no sentido de se dar provimento ao recurso interposto pelo autor.
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II- FUNDAMENTAÇÃO 1. De facto
Do despacho que decidiu a matéria de facto é a seguinte a factualidade que vem dada como provada: 1. O autor A.... foi admitido ao serviço da ré “B...” em 15 de Novembro de 2005, mediante a celebração do acordo escrito cuja cópia se encontra junta a fls. 7 a 10, denominado “contrato individual de trabalho a termo certo”, para exercer a actividade de vigilante, correspondente à sua categoria profissional, sob as ordens, direcção e fiscalização da ré; 2. Em contrapartida da prestação da actividade referida no ponto anterior, a ré obrigou-se a pagar ao autor o salário mensal ilíquido de € 575, acrescido da quantia de € 5,10 por cada dia útil de trabalho efectivamente prestado, a título de subsídio de refeição; 3. A ré enviou ao autor a carta cuja cópia consta de fls. 11, datada de 3 de Janeiro de 2006, na qual declara “rescindir o (…) contrato, com efeitos desde 02 de Janeiro de 2006”; 4. A ré entregou ao autor a declaração cuja cópia consta de fls. 12; 5. No período compreendido entre os meses de Fevereiro e Dezembro de 2006, o autor auferiu rendimentos de trabalho dependente, como trabalhador por conta de outrem, ao serviço de “SVA – Serviços de Vigilância e Alarmes, S.A.”, nos montantes constantes da informação de fls. 89.
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2. De direito
É pelas conclusões das alegações que se delimita o âmbito da impugnação, como decorre do estatuído nos artºs 684º nº 3 e 690º nºs 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil.
Decorre do exposto que as questões que importa dilucidar e resolver se podem equacionar da seguinte forma:
- nulidade da sentença, pela verificação da situação enunciada no artigo 668º nº 1, alínea c), do C. P. Civil;
- se, no caso de despedimento ilícito em contrato a termo, devem ou não ser descontados na indemnização do trabalhador os rendimentos que auferiu no trabalho prestado a outro empregador;
- se a compensação a pagar ao trabalhador nos termos do artigo 388º nº 2 do Código do Trabalho deverá ou não ser calculada como se o contrato de trabalho tivesse permanecido até ao seu termo.
Vejamos:
2.1. Como se disse, o autor parece arguir nulidade da sentença, nas conclusões do recurso, na situação enunciada no artigo 668º nº 1, alínea c), do C. P. Civil;
A arguição não teve lugar no requerimento de interposição, nem na motivação do recurso, da forma imposta pelo artigo 77º, nº 1, do CPT – expressa e separadamente (“a arguição de nulidades da sentença é feita expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso”).
A referida norma do CPT encontra a sua razão de ser na circunstância da arguição das nulidades serem, em primeira linha, dirigidas à apreciação pelo juiz pelo tribunal da 1ª instância e para que o possa fazer. Radica no “princípio da economia e celeridade processuais para permitir ao tribunal que proferiu a decisão a possibilidade de suprir a arguida nulidade” (v., por todos, Ac. Relação do Porto de 20-2-2006, in www.dgsi.pt, proc. nº 0515705 e jurisprudência ali citada).
Por conseguinte, o procedimento utilizado pelo autor apelante, para a arguição de nulidade da sentença, não está de acordo com o legalmente exigido em processo de trabalho, não se devendo conhecer da mencionada eventual nulidade uma vez que, não tendo sido dado cumprimento ao estabelecido no art. 77º, nº 1, do CPT, a sua arguição é extemporânea.
E não havendo mesmo qualquer fundamentação para a invocação da nulidade, pode até questionar-se se verdadeiramente foi arguida a nulidade da sentença.
Por tudo isso, improcede tal fundamento do recurso.
2.2. Quanto à segunda questão, ou seja, a que se relaciona com a possibilidade de dedução, na indemnização por despedimento ilícito num contrato a termo, dos rendimentos que o trabalhador auferiu após o despedimento, para outro empregador, entendemos desde já que a razão está do lado do apelante.
Como resulta dos autos, ao contrato de trabalho estabelecido entre autor e ré foi aposto um termo resolutivo certo de 12 meses (cláusula “Segunda” do contrato), com início em 15 de Novembro de 2005 e termo em 14 de Novembro de 2006, e a ré no dia 3 de Janeiro de 2006 dispensou os serviços do autor por carta, configurando um despedimento ilícito tal como foi reconhecido pela 1ª instância e não é colocado em causa no recurso.
A questão, no que respeita aos contratos a termo, tem sido debatida, perante as dúvidas de interpretação da lei, com uma boa parte da doutrina e da jurisprudência a consolidar a posição defendida pelo autor.
Neste sentido se pronunciaram o Acórdão da Relação do Porto de 11-06-2007, in www.dgsi.pt (proc. 0711041), e o bem recente Acórdão da Relação de Lisboa de 16-04-2008, in www.dgsi.pt (proc.283/2008-4), ou seja, no sentido de que não é aplicável o disposto no n.º 2 do art. 437º do Código do Trabalho (dedução das retribuições auferidas após o despedimento) à cessação, por despedimento ilícito, do contrato de trabalho a termo certo.
Trata-se, pois, de saber se a disposição do nº 2 daquele art. 437º é aplicável por força do art. 440º nº 1, ao contrato de trabalho a termo.
O art. 440º do Código do Trabalho estabelece que:
“1- Ao contrato de trabalho a termo aplicam-se as regras gerais de cessação do contrato, com as alterações constantes do número seguinte. 2- Sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado: a) No pagamento da indemnização pelos prejuízos causados, não devendo o trabalhador receber uma compensação inferior à importância correspondente ao valor das retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao termo certo ou incerto do contrato, ou até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal se aquele termo ocorrer posteriormente; (…)” – sublinhado nosso.
Como se escreveu nos Acórdãos referenciados, defendendo a tese oposta à do apelante (que é a da 1ª instância), podemos identificar as posições de Fraústo da Silva, in 30 anos de contrato de trabalho a termo, publicada in A Reforma do Código do trabalho, Coimbra Editora, pag. 274, e Abílio Neto, in Código do Trabalho Anotado, anotação ao art. 440º.
No sentido da posição do apelante, se pronunciou Hélder Quintas, em Código do Trabalho Anotado, 3ª edição, nota 7ª ao art. 440º: “O art. 52º, nº 3, da LCCT previa a dedução do alliunde perceptum, mas já não acolhia a cominação pela propositura tardia da acção de impugnação judicial. O regime actual nada nos diz quanto a tais matérias, o que nos coloca a questão de aferir até que ponto o nº 2 tem aplicação suficiente, delineando nos seus precisos termos os direitos creditórios do trabalhador, ou, se apelando ao nº 1, haverá que o conformar com o regime geral de cessação contratual. Parece-nos que, quer a dedução do alliunde perceptum, quer a dedução dos rendimentos auferidos com a recuperada disponibilidade do trabalhador penalizam gravemente uma indemnização que nunca será muito avultada”. No mesmo sentido se pronuncia Leal Amado, in Temas Laborais 2, Coimbra Editora, pag. 94, quando sustenta que, diversamente dos efeitos da ilicitude nos contratos por tempo indeterminado, prevendo não só o direito às retribuições intercalares, mas também uma indemnização (arts. 396º nº 1, alínea a), 397º, nº 1), nos contratos a termo a lei apenas contempla o direito a indemnização indexada à importância correspondente ao valor das retribuições que o trabalhador deixou de auferir desde o despedimento até ao termo do seu contrato ou até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal, se aquele termo ocorrer posteriormente. Também Albino Mendes Baptista, in Estudos Sobre o Código do Trabalho, págs. 160 e Prontuário de Direito do Trabalho, nº 66, pág. 123, se pronuncia, dizendo que “o segundo segmento da alínea a) do n.º 2 do art.º 440.º estabelece agora um montante compensatório mínimo”.
Ora, é justamente a partir da observação de que o nº 2 al. a) do artº 440º estabelece uma compensação mínima que podemos concluir que o nº 1 do mesmo artigo (ao referir que “ao contrato de trabalho a termo aplicam-se as regras gerais de cessação do contrato, com as alterações constantes do número seguinte”) afasta a aplicabilidade do artigo 437º nº 2. Se o trabalhador ilicitamente despedido tem direito no mínimo à importância correspondente às retribuições que deixou de auferir até ao termo do contrato, então não há que deduzir as importâncias a que se refere o artº 437º.
Doutro modo, como refere o Ac. da Relação do Porto citado, tal poderia levar “a uma inaceitável discriminação dos empregadores, e trabalhadores, enriquecendo aqueles que, de forma ilícita, pusessem termo ao contrato a termo, em virtude de não pagarem as retribuições vincendas e, eventualmente, não terem de pagar qualquer indemnização por via daquela dedução, comparativamente com os empregadores que, mantendo o contrato até ao seu termo, fazendo-o cessar por caducidade, sobre eles recaía a obrigação de pagamento ao trabalhador quer da retribuição quer de uma compensação, nos termos do art. 388º, nº 3. A ser sufragada tal interpretação, o que não se aceita, além de constituir um prémio para a conduta do empregador infractor, seria ainda uma manifestação legislativa, no sector empresarial, de grave distorção das regras de concorrência”.
Pelas mesma razões (questão focada do Ac. da Relação de Lisboa, citado) não há também lugar à dedução prevista no artigo 437º nº 4 do Código do Trabalho, ou seja à quantia respeitante ao período decorrido desde a data do despedimento até 30 dias antes da data da propositura da acção.
Pelo exposto, não havendo lugar no caso à dedução, na indemnização por despedimento ilícito, dos rendimentos que o trabalhador auferiu após o despedimento, para outro empregador, entendemos que procedem nesta parte as conclusões do recurso.
Assim, tendo o autor direito à indemnização de € 6.018,33, como referiu a sentença da 1ª instância (tendo em conta o salário mensal ilíquido de € 575,00), nada havendo a deduzir-lhe é esse o valor, a esse título, em que a ré deverá ser condenada a pagar-lhe.
2.3. Vejamos agora a terceira questão enunciada, ou seja a de saber se a compensação pela caducidade do contrato a termo deverá ser calculada como se o contrato de trabalho tivesse permanecido até ao seu termo.
Trata-se aqui da específica compensação pela caducidade do contrato a termo prevista no artigo 388º nº 2 do Código do Trabalho (“a caducidade do contrato a termo certo que decorra de declaração do empregador confere ao trabalhador o direito a uma compensação correspondente a três ou dois dias de retribuição base e diuturnidades por cada mês de duração do vínculo, consoante o contrato tenha durado por um período que, respectivamente, não exceda ou seja superior a seis meses”).
No recurso, não vem questionado o direito do autor a receber a dita compensação, mas apenas se deve considerar-se todo o tempo do contrato celebrado ou apenas o que foi cumprido até ao despedimento.
Cumpre salientar que neste caso, seguimos os fundamentos e a posição do Ac. da Relação do Porto de 26-01-2004 (Relator: Sousa Peixoto), in www.dgsi.pt, proc. 0316548, traduzida no respectivo sumário:
“I- Nos contratos de trabalho a termo, o trabalhador ilicitamente despedido têm direito às retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao termo do contrato, se este ocorrer antes da sentença. II- Aquelas retribuições englobam não só as retribuições salariais propriamente ditas, mas também todas outras importâncias que o trabalhador teria auferido até final do contrato, nelas se incluindo a compensação que receberia se o contrato tivesse cessado, no seu termo, por caducidade”.
Ou seja, concordamos com a posição defendida pelo apelante.
Todavia, a ré nas suas contra-alegações defende que o autor não suscitou tal questão – que agora coloca no recurso – pelo que este tribunal da Relação dela estaria impedido de a conhecer nos termos do artigo 660º nº 2 do C. P. Civil.
Os limites deste tribunal não são bem esses, já que se trata de questão de direito que foi efectivamente colocada na petição (a da compensação por caducidade), mas antes aos do artigo 661º nº 1 do C. P. Civil (“o tribunal não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir”).
Ora sucede que o autor, na sua petição inicial, alegou ter direito, a este título, “a uma compensação correspondente a 3 dias por cada mês de trabalho efectivo, desde 15 de Novembro de 2005 a 15 de Dezembro de 2005”, concluindo pelo pedido de condenação da ré a pagar-lhe “Euros 52,74, a título de compensação pela cessação do contrato de trabalho, correspondente a 3 dias por cada mês de trabalho”.
Ou seja, não pediu mais do que € 52,74. A sentença, a este título, até foi além do pedido – sem que isso esteja em causa no recurso -, condenando a ré no pagamento de € 93,93.
Assim, por força do assinalado “princípio do pedido” (não estando aqui em causa direitos indisponíveis), não pode este tribunal atender às conclusões do recurso nesta matéria, condenando a ré em quantia superior.
Pelo que improcede o recurso nesta parte.
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III- DECISÃO
Termos em que se delibera conceder parcial provimento à apelação e, consequentemente, mantendo a condenação da ré no pagamento ao autor da quantia de € 93,93, firmada na sentença da 1ª instância, condena-se ainda a mesma ré a pagar ao apelante a quantia de € 6.018,33, acrescida dos respectivos juros de mora, contados desde o dia 3 de Janeiro de 2006 e até integral e efectivo pagamento, tal como se definiu na sentença quanto àquele primeiro crédito do autor.
Custas na acção e no recurso pelas partes na proporção do decaimento.
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Coimbra,
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(Azevedo Mendes)
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(Fernandes da Silva)
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(Serra Leitão)