I – Ressalvadas as situações excepcionais consagradas na lei – v.g., as previstas nos artºs 456º, nº 3, e 678º, nºs 2 e 3, do CPC -, o recurso ordinário só é admissível nas causas de valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e desde que as decisões impugnadas sejam desfavoráveis para o recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal (artº 678º, nº 1, do CPC).
II – Assim, em regra, carece a admissibilidade de recurso ordinário da verificação cumulativa dos referidos requisitos, um respeitando ao valor da causa, outro ao valor da sucumbência.
III – Este requisito atinente ao valor da sucumbência reporta-se ao montante do prejuízo que a decisão impugnada importa para o recorrente, à utilidade económica que, através do recurso, se pretende alcançar.
IV – Não se computam para o valor da acção, nem relevam para a determinação do decaimento no pedido, os juros, as rendas, bem como outros rendimentos que se vencerem durante a sua pendência nem os que se hão-de vencer durante a sua pendência.
V - A manifesta improcedência a que alude o artº 2º do Regime Anexo ao Dec. Lei nº 269/98, de 1/09, pode reportar-se a uma parte do pedido, designadamente à matéria dos juros remuneratórios exigidos, devendo, em tal caso, restringir-se, em conformidade com o julgado, a força executiva a conferir à petição.
VI – O pedido cujo único suporte legal se estriba em entendimento jurídico ostensivamente contrário àquele que foi acolhido em Acórdão Uniformizador, só pode aspirar à viabilidade se fundado em argumentação que, de forma inovatória, face à fundamentação estruturante desse Acórdão, possibilite, ao julgador que o perfilhe, um juízo de prognose positivo quanto à futura modificação jurisprudencial no sentido desse entendimento.
VII – Assim, em princípio, é de considerar manifestamente improcedente, para efeitos de não ser abarcado pela força executiva a conferir à petição, nos termos do mencionado artº 2º, o pedido – ou parte dele – que se encontre alicerçado em entendimento jurídico contrário àquele que foi acolhido em Acórdão Uniformizador de Jurisprudência.
- Em 02/12/2008, conforme o acordado com a R. mulher e por conta das importâncias que esta lhe devia - os aludidos € 9.801, e os juros sobre ela vencidos desde 20/05/2008 até 02/12/2008, juros estes que totalizavam já € 1.052,14, mais o imposto de selo sobre estes juros, ou seja, mais € 42,09 -, ficou o Autor com a quantia de € 3.759,80, proveniente da venda do veículo que aquela entregara;
- Restando ainda em dívida ao Autor a quantia de € 7.136,03 relativamente às prestações (acrescida dos juros vincendos à taxa de 19,99%, e respectivo imposto de selo até integral pagamento), os juros vencidos sobre essa quantia desde 3/12/2008 e até 19/06/2009, ascendiam a € 773,82.
Regular e pessoalmente citados os RR não contestaram, vindo a ser proferida sentença, em 20/07/2009, na parte dispositiva da qual se consignou:
«(…) confiro força executiva à petição de fls. 1 e seg., com valor de decisão condenatória, nos seguintes termos:
a) a décima quinta prestação de capital em dívida, acrescida dos respectivos juros remuneratórios à taxa de 15,99% e ao pagamento das demais prestações de capital vencidas e não pagas.
b) Em relação a toda a quantia determinada em a) juros de mora, calculados à taxa de 19,99%, desde 20/5/2008 até 2/12/2008.
c) A partir de 2/12/2008 os juros de mora à taxa de 19,99% sobre o capital em dívida de montante € 7.136,03, uma vez que ao capital em dívida terá de ser amortizado o preço de venda do veículo que ascendeu a € 3.759,80 e que a autora recebeu.
d) Ao montante dos referidos juros acresce a taxa de 4% de imposto de selo devida, nos termos da Lei n.º 150/99, de 11/9, tudo a liquidar em sede de execução de sentença (…)».
Desta sentença veio o Autor a interpor recurso que foi recebido como Apelação, com efeito devolutivo.
B) - O Apelante, nas suas Alegações de recurso, formulou as seguintes conclusões:
[…………………………………………………]
II - Por se afigurar que a decisão impugnada, atento o valor da sucumbência do Apelante, não admitiria recurso, não sendo, assim, de conhecer do respectivo objecto, ordenou-se a sua notificação para que se pronunciasse sobre a matéria, querendo (art.º 678º, n.º 1 e 704º, n.º 1, do CPC[1]).
Na sequência disso, o Apelante veio pugnar pelo conhecimento do objecto do recurso, sustentando, essencialmente, que, por estar em causa uma sentença que condena em importância a liquidar em execução de sentença, seria de aplicar o artº 678°, n.° 1, do CPC, na parte que estabelece que, em caso de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, atender-se-á somente ao valor da causa.
III - Decidindo:
A) - No juízo de aferição da admissibilidade de um recurso, não entra, logicamente, a apreciação sobre a bondade da decisão recorrida, já que esta (apreciação) pressupõe, precisamente, que se haja formulado um juízo positivo sobre essa admissibilidade.
Em matéria cível, a alçada dos tribunais de 1.ª instância é de € 5 000 (art. 31º, n.º 1, da Lei n.º 52/2008 (LOFTJ), de 28/8).
Ressalvadas as situações excepcionais consagradas na lei - v.g., as previstas nos art.ºs 456° n.º 3 e 678º, n.ºs 2 e 3, do CPC - o recurso ordinário só é admissível nas causas de valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e desde que as decisões impugnadas sejam desfavoráveis para o recorrente em valor superior a metade da alçada desse Tribunal (art. 678º, nº 1, do CPC).
Assim, em regra, carece, a admissibilidade de recurso ordinário, da verificação cumulativa dos referidos requisitos, um respeitando ao valor da causa, outro ao valor da sucumbência.
Este requisito atinente ao valor da sucumbência - imposto por razões de política legislativa, com o propósito de não sobrecarregar os Tribunais superiores com a eventual apreciação de todas as decisões dos Tribunais inferiores que se não contivessem na respectiva alçada - reporta-se ao montante do prejuízo que a decisão impugnada importa para o recorrente, à utilidade económica que, através do recurso, se pretende alcançar.
Como se vê, da mera leitura da regra estabelecida no art.º 678º, nº 1, resulta que a lei não consente um duplo grau de jurisdição a todos os casos.
Tratando-se de decisão do Tribunal de 1.ª Instância, ainda que o valor da causa seja superior à respectiva alçada (€ 5.000), o recurso não é admissível, em regra, se o valor da sucumbência não exceder € 2500.
No caso “sub judice”, a divergência que se apresenta entre aquilo que foi peticionado e o que foi julgado procedente na sentença impugnada, respeita, essencialmente, aos juros remuneratórios que, estando integrados no montante peticionado como “capital”, a decisão recorrida entendeu só serem devidos com referência à 15ª prestação, incidindo os juros moratórios sobre o montante de capital calculado já sem a inclusão do valor dos juros remuneratórios.
Para assim decidir apelou a Mma. Juiz do Tribunal “a quo” ao Acórdão Uniformizador do Supremo Tribunal de Justiça, nº 7/2009, de 25 de Março de 2009, (DR, I Série, de 05/05/2009) que fixou a seguinte doutrina: “nos contratos de mútuo cujas obrigações sejam pagas em prestações, se o credor exigir do devedor o seu pagamento antecipado, nos termos do artigo 781º do Código Civil, não pode exigir do último o pagamento dos juros remuneratórios originariamente incorporados no montante das prestações objecto de vencimento antecipado.”
Contudo, não tendo o autor discriminado os valores que integravam o montante de cada uma das prestações, designadamente, o valor dos juros remuneratórios, a sentença, de facto, acabou por referir, após a especificação daquilo em que os RR eram condenados, que seria “tudo a liquidar em sede de liquidação de sentença…”.
Esta liquidação, como é óbvio, depende apenas de cálculo aritmético, que caberá ao Autor efectuar.
Não obstante, mesmo com os dados disponíveis, parece que seria de concluir que o decaimento do Autor não ultrapassa o valor correspondente a metade da alçada do Tribunal da 1.ª Instância.
Vejamos.
Se restituído fosse, em 54 prestações mensais, sem qualquer adicional, a totalidade do montante mutuado - € 9146,86 - ficaria, cada uma daquelas, em 169,386 €, pelo que o montante total de 40 dessas prestações ascenderia a 6775,45 €.
Ora, tendo sido de 7940,08 € o montante pedido (englobando já 773,82 € de juros contados até 19/06/2009) acrescido das demais importâncias referidas, designadamente, dos juros vincendos desde 20/06/2009 sobre o montante de 7136,03 €, não se nos afigura que a sucumbência do Autor ultrapasse os 2500 €, correspondentes ao valor da alçada do Tribunal recorrido.
E isto tendo em conta que, ao contrário daquilo que o Autor sustenta e que parece resultar de decisão do Tribunal da Relação de Lisboa que reproduz parcialmente no seu requerimento de fls.59 e ss., não se computam para o valor da acção, nem relevam para determinação do decaimento no pedido, os juros, as rendas, bem como outros rendimentos que se vencerem durante a sua pendência nem os que se hão-de vencer durante a sua pendência.
Foi esse o entendimento do STJ no Acórdão de 10-01-2006 (Revista n.º 2474/05), tendo esse mesmo Tribunal, no Acórdão de 19/03/2002 (Revista n.º 4304/2001)[2], salientando a irrelevância do montante dos juros no valor da sucumbência, considerado: “…A não ser assim, bem podia acontecer que numa acção de valor inferior à alçada da Relação, portanto, sem recurso ordinário para o Supremo, o mesmo viesse, afinal, a ter lugar. Bastaria que em resultado do pedido acessório de juros a contar da citação, a soma destes com o valor da acção, ou com o da sucumbência, suplantasse a referida alçada.”.
Também no Acórdão do STJ de 14/12/2006 (Revista n.º 06S2573) se entendeu que “Os juros de mora vencidos na pendência da acção não relevam para a determinação do valor da causa, nem podem ser tidos em conta para achar o valor da sucumbência com vista a apurar se a decisão é recorrível ou não.”.
Não se nos evidenciando, pois, que o valor da sucumbência do Autor excedesse metade do valor da alçada do Tribunal da 1.ª Instância, seria caso, dada a consequente irrecorribilidade da decisão, de não conhecer do objecto do recurso. Contudo, havendo alguma incerteza no decaimento do Autor, face à apontada iliquidez, a cautela aconselha a que, nos termos da parte final do n.º 1 do art.º 678º do CPC, se atenda ao valor da causa - € 7136,03 (fls. 51) -, e que, consequentemente, se conheça do objecto do recurso.
B) - Com relevância para a apreciação do recurso, haverá que atender circunstancialismo fáctico vertido na petição, que se dá por reproduzido, já que não foi objecto de contestação nem vem posto em causa, bem assim como ao que se descreve em I “supra”.
C) - Em face do disposto nos art.ºs 684º, n.º 3 e 685-Aº, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil (CPC), o objecto dos recursos delimita-se, em princípio, pelas conclusões dos recorrentes, sem prejuízo do conhecimento das questões que cumpra apreciar oficiosamente, por imperativo do art.º 660º, n.º 2, “ex vi” do art.º 713º, n.º 2, do mesmo diploma legal.
Não haverá, contudo, que conhecer de questões cuja decisão se veja prejudicada pela solução que tiver sido dada a outra que antecedentemente se haja apreciado, salientando-se que, com as “questões” a resolver se não confundem os argumentos que as partes esgrimam nas respectivas alegações e que, podendo, para benefício da decisão a tomar, ser abordados pelo Tribunal, não constituem verdadeiras questões que a este cumpra solucionar (Cfr., entre outros, Ac. do STJ de 13/09/2007, proc. n.º 07B2113 e Ac. do STJ de 08/11/2007, proc. n.º 07B3586 [3]).
Assim, o que cumpre solucionar no presente recurso é decidir se foi correcto restringir, do modo definido na sentença, a força executiva conferida à petição, questão esta que passa por saber, se a falta de contestação dos RR vedava à Mma. Juiz do Tribunal “a quo” o conhecimento da matéria que foi decidida em desfavor do Autor.
D) - A decisão ora recorrida foi proferida no âmbito de acção, com processo de especial, destinada a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos, de valor não superior a € 15.000,00, sujeita à disciplina do Regime Anexo ao DL nº 269/98, de 1/9, estabelecendo este, no seu artº 2º que “se o réu, citado pessoalmente, não contestar, o juiz, com valor de decisão condenatória, limitar-se-á a conferir força executiva à petição, a não ser que ocorram, de forma evidente, excepções dilatórias ou que o pedido seja manifestamente improcedente”.
Não definindo, o aludido DL nº 269/98, o que se deve entender por “pedido manifestamente improcedente”, salienta-se, como se fez no Acórdão desta 3.ª Secção Cível de 09/02/2010 (Apelação n.º 4993/09.4T2AGD.C1 - Relator: Des. Isaías Pádua) decorrer das palavras de Abrantes Geraldes (in “Temas da Reforma do Processo Civil, 2ª ed., Almedina, pág. 162”) que a manifesta improcedência reconduzir-se-á “aos casos em que a tese propugnada pelo autor não tenha possibilidades de ser acolhida face à lei em vigor e à interpretação que dela façam a doutrina e a jurisprudência”.
A circunstância de o preceito legal em análise não fazer derivar da falta de contestação a imediata atribuição de força executiva à petição, excepcionando dessa atribuição, além do mais, os casos em que o pedido é manifestamente improcedente, leva a concluir pela necessidade de o juiz indagar sempre da conformidade do pedido com o direito aplicável, para, assim, poder aferir da existência de situação que, moldando-se ao caso de patente improcedência previsto no aludido artº 2º, obste a que confira tal força executiva.
A manifesta improcedência pode respeitar apenas a uma parte do pedido, legitimando o julgador a, nessa parte, não conferir força executiva à petição[4].
O Acórdão uniformizador de jurisprudência, “cujo valor «persuasório» para toda a comunidade jurídica radica na especial natureza e particular autoridade do órgão de que dimana (…)”[5], embora não possua, evidentemente, o valor dos antigos Assentos, apresenta uma componente vinculativa acentuada para as instâncias.[6]
O pedido cujo único suporte legal se estriba em entendimento jurídico ostensivamente contrário àquele que foi acolhido em Acórdão Uniformizador, só pode aspirar à viabilidade se fundado em argumentação que, de forma inovatória, face à fundamentação estruturante desse Acórdão, possibilite, ao julgador que o perfilhe, um juízo de prognose positivo quanto à futura modificação jurisprudencial no sentido desse entendimento. De outro modo, é um pedido manifestamente votado ao insucesso.
Semelhantemente, o STJ, embora que em Acórdão respeitante à rejeição de recurso em matéria crime, por manifesta improcedência (Acórdão de 09/11/2000, processo n.º 00P2697), entendeu que se deve considerar como manifestamente improcedente o recurso quando é clara a sua inviabilidade, como sucede, v.g., quando nele se pugna por uma solução contra jurisprudência fixada ou pacífica e uniforme do STJ e o recorrente não adianta nenhum argumento novo.
Assim, em princípio, é de considerar manifestamente improcedente, para o efeito de não ser abarcado pela força executiva a conferir à petição pelo Juiz, nos termos do mencionado art.º 2º, o pedido que se encontre alicerçado em entendimento jurídico contrário àquele que foi acolhido em Acórdão Uniformizador de Jurisprudência.
Em sentido idêntico, reportando-se ao aludido art.º 2º, entendeu-se no citado Acórdão de 09/02/2010 desta Secção Cível, que «… a bem da unidade da ordem jurídica e perante a autoridade adveniente de quem estabeleceu a esse respeito já um precedente qualificado, que visou dissipar e solucionar dúvidas jurisprudenciais então pendentes - numa interpretação actualista e extensiva daquele citado normativo legal, seja de perfilhar o entendimento de que sempre que a pretensão do autor, no seu todo ou parte, contrarie a jurisprudência uniformizadora fixada, a esse propósito, pelo STJ, não poderá o juiz, quando o réu não tenha contestado a acção, limitar-se a conferir força executiva à petição, estendendo-se, assim, a tais situações o conceito de pedido manifestamente improcedente.».
Não obstante o Autor defender que, no caso “sub judice” entre ele e a Ré mulher, foi expressamente acordado regime diferente daquele que resulta da mera aplicação do disposto no artigo 781.º do Código Civil, não é isso, salvo o devido respeito, que resulta do documento escrito onde se encontram plasmadas as Condições Gerais do contrato, não se podendo surpreender esse acordo no teor Cláusula 4.ª dessas Condições, onde apenas se estabelece (sem discriminação de montantes) o que se tem como incluído no valor das prestações.
Por outro lado, na dita clausula 8º, mais não se estabelece que o regime previsto no art.º 781º do CC, para o caso de faltar o pagamento de alguma das prestações, não havendo nenhuma cláusula que, expressa e claramente, plasme um acordo das partes no sentido de, também no específico caso de vencimento antecipado das prestações, serem devidos os juros remuneratórios incorporados nas prestações vincendas.
Saliente-se, aliás, que cláusulas de teor idêntico a estas que ora se analisam foram consideradas no Acórdão de Uniformização n.º 7/2009, de 25/3, como é enfatizado, versando caso semelhante ao dos presentes autos, no Acórdão da Relação de Lisboa de 02/02/2010 (Apelação nº 1008/08.3TJLSB.L1-1): «10 - As partes no âmbito da sua liberdade contratual podem convencionar, contudo, regime diferente do que resulta da mera aplicação do princípio definido no artº 781º do Código Civil”.
Valendo-se desta parcela da decisão, vem o recorrente dizer que o seu pedido é inteiramente legal, pois com as cláusulas 8ª al. b) e 4ª c) das Condições Gerais as partes acordaram regime diferente do que resulta do artº 781º do Código Civil.
Porém, no mencionado aresto foram analisadas cláusulas de teor igual ao que consta no contrato em causa nestes autos e concluiu-se que não afastam o regime desse normativo. E refere-se aí expressamente que :
“Nos termos do nº 4 al. b) das ditas “Condições Gerais” do contrato, o empréstimo será reembolsado em prestações mensais e sucessivas cujo número, valor e datas de vencimento se encontram estabelecidas nas “Condições Específicas”. No mesmo número mas na al. c) menciona-se que no valor das prestações estão incluídos o capital, os juros do empréstimo, o valor dos impostos devidos, bem como os prémios das apólices de seguro.
Consta, ainda, do nº 8, al. b) das ditas “Condições Gerais” que a falta de pagamento de uma prestação na data do respectivo vencimento, implica o imediato vencimento de todas as restantes.
Ora o artº 781º do Código Civil estabelece que “se a obrigação puder se liquidada em duas ou mais prestações, a falta de pagamento de uma delas, implica o imediato vencimento das demais”.
Não se trata esta de uma norma imperativa, pelo que existindo uma qualquer cláusula estipulada num contrato ainda que de adesão, atribuindo outras consequências à mora do devedor será esta a prevalecer, face ao princípio da liberdade contratual consagrado no art. 405º do Código Civil, regra mínima de funcionamento do mercado.
O que no caso, manifestamente não acontece”.».
Assim, vale aqui, “mutandis mutandis”, o que a propósito de cláusulas com conteúdo idêntico àquelas que analisamos, se entendeu nesse Acórdão da Relação de Lisboa de 02/02/2010, onde se concluiu: «As cláusulas contratuais em que se convencionou que o empréstimo será reembolsado em prestações mensais (nas quais estão incluídos o capital e os juros do empréstimo) e que a falta de pagamento de uma prestação na data do respectivo vencimento implica o imediato vencimento de todas as restantes, não atribuem à mora consequências diferentes das que estão previstas no artº 781º do Código Civil quanto ao montante das prestações.
-Assim, perante cláusulas desse teor, é de aplicar o decidido no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de uniformização de Jurisprudência nº 7/2009 de 25/3.».
Reconduzida a situação, pois, como se entendeu ser de fazer, à previsão deste Acórdão de Uniformização de Jurisprudência nº 7/2009 de 25/3, está visto que, como acima se demonstrou, legítimo era à Mma. Juiz do Tribunal “a quo”, não dar o seu aval aquilo que, sendo peticionado pelo Autor, estivesse arrimado em entendimento jurídico ostensivamente contrário ao direito tal como o entendeu aplicável, ou seja, não conferindo força executiva à petição na parte em que o peticionado era manifestamente improcedente e que se alicerçava em entendimento jurídico antagónico à doutrina do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência nº 7/2009.
A solução a que se chegou na sentença, na parte em que pode ser objecto da nossa apreciação, mostra-se acertada e com correcta fundamentação jurídica, seguindo como entendemos que é de seguir, a doutrina consagrada no aludido Acórdão Uniformizador.
Em síntese, dir-se-á:
I - A manifesta improcedência a que alude o art.º 2 do Regime Anexo ao DL nº 269/98, de 1/9, pode reportar-se a uma parte do pedido, designadamente, à matéria dos juros remuneratórios exigidos, devendo, em tal caso, restringir-se, em conformidade com o julgado, a força executiva a conferir à petição.
II - O pedido cujo único suporte legal se estriba em entendimento jurídico ostensivamente contrário àquele que foi acolhido em Acórdão Uniformizador, só pode aspirar à viabilidade se fundado em argumentação que, de forma inovatória, face à fundamentação estruturante desse Acórdão, possibilite, ao julgador que o perfilhe, um juízo de prognose positivo quanto à futura modificação jurisprudencial no sentido desse entendimento.
III - Assim, em princípio, é de considerar manifestamente improcedente, para efeitos de não ser abarcado pela força executiva a conferir à petição, nos termos do mencionado art.º 2º, o pedido - ou parte dele - que se encontre alicerçado em entendimento jurídico contrário àquele que foi acolhido em Acórdão Uniformizador de Jurisprudência.
Improcede, pois, a Apelação, sendo de confirmar a sentença recorrida.
IV - Decisão:
Em face de tudo o exposto, decidem os Juízes deste Tribunal da Relação, julgar improcedente a Apelação e manter a sentença da 1.ª Instância.
Custas pelo recorrente.
[1] Código de Processo Civil, a considerar na redacção que lhe foi dada pelo DL n.º 303/2007, de 24/8.
[2] Citado no Acórdão do STJ de 05/06/2007 (Revista n.º 07A1207).
[3] Consultáveis na Internet, através do endereço “http://www.dgsi.pt/jstj.nsf?OpenDatabase”, tal como todos os Acórdãos do STJ, ou os respectivos sumários, que adiante forem citados sem referência de publicação.
[4] Acórdão da Relação de Lisboa de 15/12/2009 (Apelação n.º 74/09.9TJLSB.L1-1).
[5] Cons. Lopes do Rego, “A Uniformização da Jurisprudência no Novo Direito Processual Civil”, Lisboa, 1997, p. 19.
[6] Cfr. Ac do STJ de 14/05/2009, Revista n.º 218/09.OYFLSB.