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CRIME CONTINUADO
ATENUAÇÃO ESPECIAL DA PENA
Sumário
1.- O crime continuado pressupõe a existência de diversas resoluções, tomadas dentro de um quadro exterior que facilita, de forma considerável, o renovar das sucessivas resoluções. 2.- A atenuação especial da pena só pode ter lugar, em casos extraordinários ou excepcionais, isto é, quando é de concluir que a adequação à culpa e às necessidades de prevenção geral e especial não é possível dentro da moldura geral abstracta escolhida pelo legislador para o tipo respectivo. Ou seja, é na acentuada diminuição da ilicitude ou da culpa, ou nas exigências da prevenção, que radica a autêntica ratio da atenuação especial da pena, sendo as circunstâncias enumeradas no n° 2 do artº 72º CP, meramente indicativas.
Texto Integral
I. Relatório: 1. No processo supra identificado, a assistente AL..., deduziu acusação contra o arguido MS..., fiscal …, residente na Rua …, na Guarda
Imputando-lhe a prática, "dos crimes de injúria e ameaça previstos e puníveis nos artigos 181° e 153° do Código Penal", tudo nos termos dos factos constantes da acusação particular de fls. 87 a 89.
Pelos mesmos factos, deduziu ainda um pedido de indemnização civil contra o arguido, peticionando ao tribunal que o condene a pagar-lhe uma compensação, a título de danos morais, no montante de € 1500,00, acrescida dos juros legais (cfr. fls. 89 e 90).
O Ministério Público, arquivando os autos relativamente ao crime de ameaça, a um crime de coacção e a um crime de perturbação da vida privada, não referindo se acompanhava ou não e invocando normas legais referentes à acusação particular, deduziu acusação contra o arguido, imputando-lhe factos que constavam da acusação particular e outros que aí não constavam, concluindo estar em causa um crime de injúria, na forma continuada, previsto e punido pelos artigos 30°/2, 181°/1 e 182° do Código Penal.
***
Realizado o julgamento, o tribunal recorrido decidiu julgar a acusação particular e o pedido de indemnização civil parcialmente procedentes e, em consequência:
a) condena o arguido MS..., como autor material de cinco crimes de injúria, previstos e punidos pelo artigo 181°/1 do Código Penal, por cada um deles, na pena de 50 (cinquenta) dias de multa, à taxa diária de € 6,00 (seis euros); b)operando o cúmulo jurídico entre tais penas, nos termos do artigo 77°/1 do Código Penal, condena o arguido na pena única de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de 6€, o que perfaz o montante global de 900,00€ (novecentos euros);
c) condena o demandado a pagar à demandante, a título de danos não patrimoniais, a quantia € 750,00 (setecentos e cinquenta euros), acrescida dos juros de mora vincendos, à taxa legal em vigor, até efectivo e integral pagamento, absolvendo-o do demais peticionado;
d) condena o arguido e a assistente nas custas do processo, na parte criminal, incluindo o valor dos encargos a que deram causa, fixando-se a taxa de justiça para o arguido em 3 (três) UC e para a assistente em 2 (duas) UC, acrescidas de 1 % a favor do cofre geral dos tribunais (cfr. artigos 513°/1, 514°/1 do Código de Processo Penal, artigos 74°, 85°/1-b), 82°/1 e 95°/1 do Código das Custas Judiciais e artigo 13° do Decreto-Lei n.º 423/91, de 3/10);
e) condena a demandante e o demandado nas custas do pedido de indemnização civil e na proporção do decaimento - cfr. artigos 523° do Código de Processo Penal e 446° do Código de Processo Civil; *** 2. Inconformado, o arguido interpôs o presente recurso, formulando nas respectivas motivações as seguintes (transcritas) conclusões:
“A) Deve entender-se que, in casu, se trata de um só acto de vontade, e um só evento; A unidade do interesse lesado, isto é, a unidade do Evento lesivo, consolida a unidade do próprio facto e daí que se entenda que, no caso vertente a conduta do arguido configura a prática de um só crime e não de cinco crimes distintos, por cuja prática foi condenado.
B) Consequentemente, tendo em conta todo o factualismo considerado provado, deve a douta sentença ser revogada condenando-se o arguido pela prática de um só crime e não pela prática de cinco crimes de injúrias.
C) Sem prejuízo do que se deixa atrás concluído sempre se deve dizer, quanto à pena aplicada ao arguido, que não teve em conta as circunstâncias previstas na parte final da alínea c) do nº 2 do art° 71° do Cód. Penal.
D) Como resulta abundantemente da matéria de facto dada como provada, os factos foram motivados devido à situação de ruptura conjugal do arguido e da assistente, (e dados condicionalismos que a determinaram e rodearam), da situação de incumprimento da regulação das responsabilidades parentais e de todo um clima de conflituosidade que antecedeu os mesmos.
E) Daí que, deva a medida da pena ser reduzida atendendo a esses motivos que determinaram a conduta do arguido, a qual, aliás, foi inusual pela sua parte já que é uma pessoa pacífica, respeitadora e sem qualquer antecedente criminal.
F) Acresce que a pena deve ser especialmente atenuada uma vez que o caso em apreço se enquadra no disposto na alínea b) do nº2 do art° 72° do Cód. Penal, para além de que foram as circunstâncias acima descritas (relacionadas com a ruptura conjugal e com as responsabilidades parentais) que os determinaram.
Concedendo-se provimento ao presente recurso far-se-á, como sempre,
JUSTIÇA ”
***
3.1 O Magistrado do Ministério Público veio oferecer a sua resposta, de fls. 409/411, onde sustenta que a sentença recorrida não merece reparos, devendo manter-se inalterada.
“1. Razões de prevenção - geral e especial - impõem, no que respeita à conduta ilícita em questão, a preferência pela moldura abstracta da pena de prisão.
2. Considerando os factos apurados, a culpa (dolo directo) do arguido e referidas exigências de prevenção geral e especial, compreende-se que estamos perante um caso que justifica a fixação das penas concretas em valor acima do mínimo legal.
3. Afigurando-se-nos justa, adequada e proporcional a pena de 20 meses de prisão, aplicada ao arguido, tanto no que respeita à sua natureza, bem como quanto ao seu quantum.
Porém, Vossas Excelências farão, como sempre
Justiça!” ***
3.2. Por sua vez, veio a assistente oferecer a sua resposta, de fls. 417/427, onde sustenta que a sentença recorrida não merece reparos, devendo manter-se inalterada, apresentando as seguintes (transcritas) conclusões:
“1°
A douta sentença não merece qualquer censura.
2°
As condutas praticadas pelo Recorrente não têm qualquer elemento de conexão que permita a sua unificação.
3°
O Recorrente cometeu várias vezes o mesmo tipo de crime, porquanto quis ofender e enxovalhar a assistente em cada uma das vezes que a insultou e vexou, proferindo as afirmações/expressões acima descritas.
4°
O Recorrente de todas as vezes que injuriou a assistente agiu com dolo e culpa, estando plenamente consciente que estava a ofende-la na sua honra e consideração.
5°
As palavras injuriosas proferidas pelo Recorrente em momentos / dias diferentes, constituem crimes autónomos e não um ou mais crimes continuados de injúrias.
Acresce que,
6°
O Recorrente não demonstrou em sede de julgamento, nem dos factos dados como provados resulta, que a sua conduta foi determinada/motivada devido à situação de ruptura conjugal entre o arguido e a assistente e muito menos a uma situação de incumprimento das responsabilidades parentais.
7°
O Recorrente é que é uma pessoa conflituosa e nada, nem nenhuma circunstância relacionada com o divórcio do arguido e da assistente ou, eventualmente, com uma situação de incumprimento das responsabilidades parentais, como alega o Recorrente, justificam ou atenuam o seu comportamento para com aquela ou diminuem de forma acentuada a ilicitude dos facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena.
8°
A atenuação especial da pena só pode ter lugar em casos extraordinários ou excepcionais, isto é, quando é de concluir que a adequação à culpa e ás necessidades de prevenção geral e especial não é possível dentro da moldura penal abstracta escolhida pelo legislador para o tipo respectivo. Fora destes casos, é dentro da moldura normal que aquela adequação pode e deve ser procurada. (ac. STJ de 10 de Novembro de 1999, proc. 823/99-3ª., AASTJ, nº 35,74).
9°
Os factos supra descritos e que constam da acusação atingiram a assistente na sua honra e consideração, o comportamento do arguido foi premeditado, com intenção de chocar a sensibilidade da assistente.
10°
A utilização pelo arguido daqueles vocábulos verbais, exprimem uma acção volitiva e têm subjacente e inculcada a vontade inequívoca do arguido de ofender e maltratar a assistente.
11°
Não estão, preenchidos os requisitos do artigo 720 do Código Penal, pelo que o arguido não pode beneficiar de uma atenuação especial da pena.
12°
Deve pois, negar-se provimento ao presente recurso, mantendo-se na íntegra, por ser legal e justa, a douta sentença recorrida.
Assim se fará Justiça “
***
4. Admitido o recurso e subidos os autos a este Tribunal da Relação, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta, no douto parecer que emitiu (fls. 440/443), pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso.
Notificado, nos termos e para os efeitos consignados no artº 417.º, n.º 2, do C. P. Penal, o arguido nada disse.
Foram colhidos os vistos legais.
Procedeu-se à conferência, com observância do formalismo legal, cumprindo, agora, apreciar e decidir.
***
II. Fundamentação. 1. Delimitação dos poderes cognitivos do tribunal ad quem e objecto do recurso:
É hoje entendimento pacífico que as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas respectivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar, conforme Prof. Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal” III, 2.ª Ed., pág. 335 e Ac. do STJ de 19/6/1996, in BMJ n.º 458, pág. 98, sem prejuízo das de conhecimento oficioso.
Por isso, temos, como
Questões a decidir: - Apreciar se face aos factos dados como provados, estamos perante um crime continuado ou de cinco crimes de injúrias. - Da medida da pena. - Se é de aplicar ao caso a atenuação especial da pena p. e p. pelo artº 72, nº 2 al. b) do C.P.
*
2. Na sentença recorrida foram dados como provados, não provados, com base na indicada motivação, os seguintes factos (por transcrição):
“A) Factos Provados.
Discutida a causa, com relevo para a boa decisão da causa, o tribunal julga provados os seguintes factos:
1.A assistente e o arguido foram casados um com o outro, tendo os factos em causa nos presentes autos ocorrido no período em que os mesmos se encontravam separados de facto, embora ainda não divorciados, divórcio que veio a ser decretado posteriormente;
2.O relacionamento entre ambos, após a separação do casal, decorreu de forma conflituosa;
3.O arguido, dirigindo-se à assistente, sua mulher, remeteu para o seu telemóvel as mensagens escritas que se encontram reproduzidas a fls. 25 a 29, nomeadamente:
- No dia 3/4/2008: "Manda beijos pró ... eu até tenho nojo de ti por isso não sejas cínica e hipócrita como sempre foste e fazeres o papel de sonsa";
- No dia 7/4/2008: "que é o que toda a gente me diz que tu foste uma traiçoeira e que enganaste lá toda a gente não foi só a mim e não conhecem 1 caso C/ o T/”:
- No dia 1/5/2008: "colegas e funcionários do IPG já comentam coitada esta gaja ta passada da cabeça e fig. ridículas que faz p/isso é uma triste";
- No dia 14/5/2008: "É preciso ser cínica para desejar um bom dia de trabalho mas eu trabalho com humildade agora tu com arrogância que dizem os alunos";
- No dia 19/5/2008: "Nos FDS Q tas sozinha vai e ri voltes numa mais era 1 alívio para todos";
- No dia 3/6/2008: "peneirenta que não vale um peido pernas de alicate celulite estrias pelos pança olheiras é o que todos comentam mas pensa que é boa";
- No dia 5/6/2008: "não passas de uma simplória arrogante e cínica a dizer obrigado eu até tinha nojo de fazer alguma coisa para ti quanto mais para me agradeceres";
- No dia 5/6/2008: "odeio-te maldita hora que te conheci tenho nojo de ter vivido contigo porque não prestas não vales nada és do mais baixo que conheci";
- No dia 11/6/2008: "quem não olha a meios para atingir fins até pessoas do local de trabalho dizem agora perceberem porque em pouco tempo subiu tanto na horizontal";
4. Em data não apurada, mas situada entre Maio e Junho de 2008, pelas 17h00m, junto à residência da assistente, à data na Rua …, na Guarda, o arguido, na presença das filhas de ambos e da testemunha EJ…, vizinha da assistente, dirigindo-se à assistente, apelidou-a de "puta, vaca e porca";
5.No dia 29 de Junho de 2009, pelas 21h00m, nas escadas do prédio onde a assistente residia e à porta do seu apartamento, à data sito na Rua …, na Guarda, na presença das filhas de ambos e de PT..., companheiro da assistente, o arguido apelidou-a de "puta";
6.No dia 16 de Julho de 2008, na Rua …, junto à Casa da Sagrada Família, enquanto a assistente aguardava a chegada da sua filha R... de um passeio, o arguido confrontou-se com a assistente e apelidou-a de "puta";
7.O arguido agiu de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas criminalmente;
Mais se provou que:
8.O demandado, com a sua actuação, causou dor e sofrimento na pessoa da assistente, tendo-a deixado receosa pela prática de novas condutas;
9.O arguido é uma pessoa simples, humilde, respeitado no meio social onde se insere, com um bom trato e é considerado pessoa educada;
10.Trabalha para a …, onde exerce as funções de fiscal e aufere o vencimento mensal de 700,00€;
11.Vive sozinho, pagando a quantia de 200,00€ mensais pela prestação da casa e a quantia de 150,00€ a título de prestação de alimentos;
12.Não tem antecedentes criminais.
*
B) Factos não provados.
O tribunal, com relevo para a boa decisão da causa, delimitada pelo objecto da acusação, julga não provados quaisquer outros factos, bem como a matéria conclusiva alegada, nomeadamente que:
1.O processo de divórcio seja o processo identificado na acusação ou na contestação de fls. 137;
2.Após a separação a assistente tivesse sido objecto de agressões e insultos de forma continuada;
3.O que a levou a participar criminalmente contra o arguido no âmbito do processo n.º 7/07.7SAGRD, o qual terminou com a aceitação por parte do arguido das regras e injunções que lhe foram impostas;
4.Apesar da condescendência da assistente, o arguido não arrepiou caminho, continuando a ofendê-la;
5.O arguido, para além das ocasiões relatadas nos factos provados e nos termos aí assente, se tivesse dirigido à assistente em tons insultuosos, apelidando muitas vezes de "puta, vaca e porca", referindo-lhe "ter mais rodagem do que o próprio carro";
6.Ameaçando tirar-lhe a vida;
7.Condutas que ocorreram de forma repetida, há mais de um ano;
8.O arguido, no dia 29/6/2008, tivesse chamado à assistente de "puta fina, gorda e cínica";
9.A testemunha PT… tivesse presenciado o episódio do dia 15/7/2008;
10.A assistente tivesse receado pela sua vida e integridade física;
11.Os episódios referidos em 5 e 6 tivessem ocorrido, respectivamente, nos dias 30/6 e 15/7;
12.Que as filhas do casal tivessem nascido na data referida no artigo 2° da contestação e que tenham a referida identificação;
13.O poder paternal tivesse sido regulado nos termos referidos no artigo 3° da contestação;
14.O alegado nos artigos 6° a 8° da contestação;
15.O alegado no artigo 17° da contestação;
16.A assistente raramente aceitasse as visitas e que actuasse desse modo contra a vontade das menores;
17.O alegado nos artigos 23°,24°,28° e 29° da contestação.
* C) Convicção do Tribunal.
O tribunal fundamentou a sua convicção na globalidade da prova produzida em julgamento e devidamente ponderada, nomeadamente:
- Nos documentos juntos a fls. 25 a 29, conjugados com os depoimentos prestados pelo arguido (que admitiu o envio de SMS à assistente) e pela assistente, que provam o envio das mensagens pelo arguido para a assistente;
- No depoimento prestado pela testemunha EJ..., que depôs de forma coerente e credível, tendo presenciado o episódio ocorrido na Rua … (em Maio ou Junho de 2008) e confirmado as expressões proferidas pelo arguido, tendo descrito as circunstâncias em que o mesmo as proferiu;
- No depoimento prestado pela assistente, que expôs a sua vivência conjugal com o arguido com clareza, tendo deposto de forma coerente e credível, confirmando a recepção das referidas mensagens, enviadas pelo arguido, bem com o episódio referido em 4) e os episódios ocorridos no dia 29/6 (último domingo de Junho) e 16/7 (quarta-feira), ambos ocorridos no momento da entrega das filhas do casal pelo arguido à assistente, relatando o modo como decorreram os encontros e as expressões proferidas pelo arguido - indo de encontro ao depoimento prestado pela testemunha EJ... no que se refere ao episódio referido em 4) e sendo corroborada pela testemunha PT...no que se reporta ao episódio referido em 5); relativamente ao episódio referido em 6), embora o arguido o tivesse negado, o mesmo mostra-se também coerente com as declarações prestadas pela testemunha CD..., que referiu que o arguido lhe deu conhecimento de um encontro tido com a assistente nessas circunstâncias;
No depoimento prestado pela testemunha PT…, companheiro da assistente, o qual depôs de forma coerente e convincente e, afirmando não ter presenciado os demais episódios, afirmou ter presenciado o episódio ocorrido no dia 29/6, tendo descrito o procedimento do arguido para entrega dos filhas do casal, tendo o mesmo entrado no prédio, subido as escadas em direcção ao 1° andar esquerdo, onde moravam, proferindo, das expressões que constavam da acusação, a expressão "puta".
O depoimento prestado pelo arguido relevou apenas no que refere ao envio das mensagens por telemóvel. Ao negar a demais factualidade, face à prova produzida, não mereceu credibilidade.
O depoimento prestado pela testemunha …, não obstante ter relatado ter assistido a discussões entre o arguido e a assistente, junto ao prédio onde esta residia, na Rua …, por não ter conseguido localizar temporalmente tais factos, nem reproduzir as expressões proferidas, não mereceu relevância.
O depoimento prestado pela testemunha CD... relevou apenas nos termos que ficaram supra expostos, não tendo relevado quanto ao demais, por não ter presenciado os factos.
Os depoimentos prestados pelas testemunhas …, …, …,, por não terem presenciado qualquer episódio, relevaram apenas quanto às condições pessoais do arguido.
Os depoimentos prestados pelas testemunhas, respectivamente, irmão e cunhada do arguido, relativamente ao episódio de 29 de Junho, revelaram-se incoerentes e inverosímeis (ao relatarem que efectuaram um desvio para acompanhar o arguido na entrega das crianças, em carro distinto do do arguido, tendo aguardado pela entrega das crianças afastados deste, sem terem saído do carro, num curto período de tempo, tendo seguido percurso sem mais terem falado, face ao depoimento da assistente e do seu companheiro, que relataram com pormenor os factos praticados pelo arguido, num período temporal distinto, mais abrangente), razão pela qual não mereceram credibilidade.
Os factos não provados ficaram a dever-se à ausência de prova ou à prova de factualidade diversa.
Os factos relativos às condições pessoais do arguido ficaram a dever-se às suas declarações e às declarações prestadas pelas testemunhas acima referidas, tendo relevado, ainda, o CRC junto aos autos. ”
*
3. Apreciando.
Face a tais factos, dados como provados e não provados, na primeira instância, vejamos então, se assiste alguma razão ao recorrente.
Produzida a prova foi o arguido MS..., condenado como autor material de cinco crimes de injúria, previstos e punidos pelo artigo 181 °/1 do Código Penal, por cada um deles, na pena de 50 (cinquenta) dias de multa, à taxa diária de € 6,00 (seis euros);
Em cúmulo jurídico das penas parcelares supra aplicadas foi o arguido condenado na pena única de 150 dias (cento e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de 6€, o que perfaz o montante global de 900,00€ (novecentos euros).
Foi ainda condenado o demandado a pagar à demandante, a título de danos não patrimoniais, a quantia € 750,00 (setecentos e cinquenta euros), acrescida dos juros de mora vincendos, à taxa legal em vigor, até efectivo e integral pagamento, absolvendo-o do demais peticionado;
***
O arguido/recorrente conformou-se com a fixação da matéria de facto provada e não provada efectuada pelo tribunal recorrido.
Igualmente se conformou com a tipificação efectuada pelo tribunal a quo, no sentido em que concorda que praticou o crime de injúrias.
Porém discorda da condenação por cinco crimes de injúrias, defendendo que praticou apenas um só crime continuado.
Defende ainda que a pena deve ser sempre especialmente atenuada, nos termos da al. b) do nº2 do artº 72 do C.P.
Mesmo que assim se não entenda, sempre foi excessiva pelo que deverá ser diminuída.
*** 3.1. Cumpre-nos agora apreciar se estamos perante cinco crimes de injúrias de um crime continuado, como pretende a recorrente?
A primeira questão colocada pelo recorrente é a de saber se estamos perante a ocorrência de cinco crimes ou só de um crime de injúrias.
Vejamos então
Dispõe o art.º 30º, nº 1, do Cód. Penal, que, ““O número de crimes determina-se pelo número de tipos de crime efectivamente cometidos, ou pelo número de vezes que o respectivo tipo de crime foi preenchido pela conduta do agente”, enquanto que o seu nº2 estipula que “constitui um só crime continuado a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada de forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente”.
Como ensina Eduardo Correia, in “Direito Criminal”, II vol., 202, quando diversas condutas violam o mesmo tipo de crime, o número de crimes define-se pelo número de resoluções, sendo o critério temporal fundamental para se apurar se existiu uma ou mais resoluções a presidir aos vários actos.
Porém o crime continuado pressupõe, precisamente, a existência de diversas resoluções, só que todas elas tomadas dentro de um quadro exterior que facilita, de forma considerável, o renovar das sucessivas resoluções.
Talvez convenha ainda reproduzir parcialmente o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de Maio de 1988, publicado no Boletim do Ministério da Justiça nº 377, pág. 431, onde se explicita que:
“No artigo 30º do Código Penal perfilha-se o critério teológico para distinguir entre unidade e pluralidade de infracções, atendendo-se ao número de tipos legais de crime efectivamente preenchidos pela conduta do agente ou ao número de vezes que essa conduta preencheu o mesmo tipo legal de crime”, ou seja, “haverá tantas violações da mesma quantas vezes ela se tomar ineficaz nessa função determinadora da vontade.
E o que indica quantas vezes se verifica essa ineficácia é a resolução. Quantas vezes o indivíduo resolve agir por modo contrário ao imperativo da norma, tantas vezes se verifica a sua ineficácia, ou seja, a sua violação.
E haverá unidade de resolução quando, segundo o senso comum sobre a normalidade dos fenómenos psicológicos, se puder concluir que os vários actos são resultado de um só processo de deliberação, sem serem determinados por nova motivação.
Temos assim que na sua essência o artº 30º do Código Penal adopta o critério teleológico para distinguir entre unidade e pluralidade de infracções, havendo tantas violações da norma quantas as vezes que esta se tornar se tornar ineficaz pelo que se verifica unidade de resolução quando os actos que violam por diversas vezes o mesmo tipo legal são resultado de um único processo de deliberação.”
Depois, e ainda segundo o mesmo Eduardo Correia, in “Teoria do Concurso em Direito Criminal”, Colecção Teses, Almedina – p. 207 “aquilo que na continuação criminosa arrasta o agente para a reiteração é precisamente o facto de, com a primeira conduta, se amolecerem e relaxarem as reacções morais ou jurídicas que o frenavam e inibiam”.
Por outro lado, na procura de critérios padrão objectivos com vista à definição de casos-tipo de situações exteriores subsumíveis ao crime continuado, refere-se precisamente à circunstância de se voltar a verificar a mesma oportunidade que já foi aproveitada com êxito pelo agente. Escreve, mais uma vez, Eduardo Correia, ob. cit. “Concurso”, 246: “quando um delinquente se encontra de novo ante uma determinada situação que, convidando à realização de um certo crime, já uma vez foi por ele aproveitada com êxito, há-de, sem dúvida, sentir-se fortemente solicitado a reiterar a sua conduta criminosa, e só muito dificilmente se manterá no caminho direito”.
Assim, quando se investiga o fundamento desta diminuição da culpa ele deve ir encontrar-se, no momento exógeno das condutas, na disposição exterior das coisas para o facto. Pelo pressuposto da continuação criminosa será, verdadeiramente, a existência de uma relação que, de fora, e de maneira considerável, facilitou a repetição da actividade criminosa, tornando cada vez menos exigível ao agente que se comporte de maneira diferente, isto é, de acordo com o direito.
Socorrendo-nos agora do Ac, deste TRCoimbra de 28-04-2010, Processo: Recurso nº 163/07.4PECBR.C1; Relator: ESTEVES MARQUES, in www.dgsi.pt, “Assim temos que os pressupostos do crime continuado são os seguintes:
1º.- Realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico.
2º.- A execução por forma essencialmente homogénea.
3º.- Que essa execução seja levada a cabo no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente.”
Face a tal e tendo-se em conta a factualidade provada, poderemos concluir que se verificam os dois primeiros pressupostos, mas já o mesmo não acontece relativamente ao terceiro pressuposto - o quadro de solicitação do agente que diminui consideravelmente a sua culpa.
Isto porque para que essa solicitação possa relevar terá de ser de um grau considerável, a ponto que constitua quase que um estímulo, face ao sucesso anterior, para a repetição da actividade criminosa, e tornando por isso cada vez menos exigível ao agente que se comporte de maneira diferente.
Sucede que, face à facticidade provada, leva-nos, necessariamente, a concluir que a cada uma das condutas do arguido correspondeu uma diversa resolução criminosa, mas que nada exteriormente facilitou a repetição da actividade criminosa. Ou seja, essas resoluções foram entre si autónomas e não estiveram numa relação de continuidade e interdependência, pois não se inseriram numa rotina de procedimentos, facilitada pelo mesmo circunstancialismo externo.
No caso concreto, o percurso criminoso do arguido iniciou-se no final de Maio de 2008 e prolongou-se até Junho de 2009, tendo o seu padrão de comportamento consistido em dirigir á ofendida palavras e expressões ofensivas da sua honra e consideração e que são as que constam dos pontos 3, 4 e 5 da factualidade provada. Além disso a actuação do arguido verificou-se em locais diferentes.
Tendo essa actuação ocorrido locais e datas diferentes, o que lhe conferia a possibilidade do arguido poder avaliar a sua anterior conduta, distanciando-se dela e comportando-se de acordo com o Direito, teremos de concluir que a actuação do arguido teve assim subjacente resoluções criminosas distintas.
Tudo isto a revelar, por um lado a inexistência de culpa sensivelmente diminuída e por outro uma personalidade fortemente inclinada para a prática do crime.
Nem se diga, como pretende o recorrente, que os factos foram motivados devido à situação de ruptura conjugal do arguido e da assistente, (e dados condicionalismos que a determinaram e rodearam), da situação de incumprimento da regulação das responsabilidades parentais e de todo um clima de conflituosidade que antecedeu os mesmos. Isto porque a existência de tal situação não legitima a actuação do arguido nem de tal se pode concluir que aquela actuação foi levada a cabo no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente. Antes pelo contrário, manifesta um elevado grau de culpa por parte do mesmo.
Estamos assim, perante uma pluralidade de resoluções criminosas e uma realização plúrima de um tipo de crime que protegem o mesmo bem jurídico, mas os mesmos não foram executados por forma essencialmente homogénea, no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior, pelo que não estão presentes todos pressupostos da tipicidade do crime continuado, tal como vem previsto no nº 2 do artº 30º do C.P. (Neste sentido também se pronunciou este TRC, nomeadamente no Ac. nº 8/06.2IDCTB.C1, de 28/4/2009, em que foi relator o Exmº Desembargador Dr Fernando Ventura e Ac. TRC,nº 128/05.0JAAVR.C1, de 26-11-2008, em que foi relator o Exmº Desembargador Dr Alberto Mira, in www.dgsi.pt)
Face a tal não se pode falar em crime continuado, pelo que, também nesta parte o recurso improcederá. *** 3.2. Da medida e da atenuação especial da pena.
Pretende o recorrente que a pena deve ser sempre especialmente atenuada, nos termos da al. b) do nº2 do artº 72 do C.P e se assim se não entender, sempre foi excessiva pelo que deverá ser diminuída.
Será que lhe assiste a razão?
O arguido vinha acusado da prática, "dos crimes de injúria e ameaça previstos e puníveis nos artigos 181° e 153° do Código Penal", tudo nos termos dos factos constantes da acusação particular de fls. 87 a 89.
Na sentença ora recorrida o mesmo foi condenado como autor material de cinco crimes de injúria, previstos e punidos pelo artigo 181°/1 do Código Penal, por cada um deles, na pena de 50 (cinquenta) dias de multa, à taxa diária de € 6,00 (seis euros); operando o cúmulo jurídico entre tais penas, nos termos do artigo 77°/1 do Código Penal, condena o arguido na pena única de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de 6€, o que perfaz o montante global de 900,00€ (novecentos euros);
Alega este recorrente que o tribunal a quo relativamente às penas aplicadas, quer quanto à determinação da moldura penal, quer na concreta aplicação da pena, praticou um erro de interpretação e/ou aplicação, por isso violando o disposto dos artºs 40º, 50º, 71°, nº 2, 72°, nº 1 e 73°, todos do Código Penal.
Isto porque, no momento da prática dos factos, o arguido, na sua tese, estava numa situação de ruptura conjugal do arguido e da assistente, (e dados condicionalismos que a determinaram e rodearam), verificando-se um clima de conflituosidade entre arguido e ofendida e que tal deve levar a uma pena especialmente atenuada.
Em conclusão pretende o recorrente que tais penas parcelares deverão ser diminuídas e especialmente atenuadas.
Vejamos então. 3.2.1. Em primeiro lugar, há que ver se o conjunto fáctico provado justifica a atenuação especial da pena reclamada pelo arguido/recorrente.
Na verdade, dispõe o art. 72, do Código Penal que: “1 - O tribunal atenua especialmente a pena, para além dos casos expressamente previstos na lei, quando existirem circunstâncias anteriores ou posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena.
2 - Para efeito do disposto no número anterior, são consideradas, entre outras, as circunstâncias seguintes:
a) Ter o agente actuado sob a influência de ameaça grave ou sob ascendente de pessoa de quem dependa ou a quem deva obediência;
b) Ter sido a conduta do agente determinada por motivo honroso, por forte solicitação ou tentação da própria vítima ou por provocação injusta ou ofensa imerecida;
c) Ter havido actos demonstrativos de arrependimento sincero do agente, nomeadamente a reparação, até onde lhe era possível, dos danos causados;
d) Ter decorrido muito tempo sobre a prática do crime, mantendo o agente boa conduta.
3 - Só pode ser tomada em conta uma única vez a circunstância que, por si mesma ou conjuntamente com outras circunstâncias, der lugar simultaneamente a uma atenuação especialmente prevista na lei e à prevista neste artigo.”
Assim, o n.º 2 do mesmo artigo elenca exemplificativamente circunstâncias várias que, correlacionadas com os requisitos contidos no n.º 1, ainda do mesmo normativo, potenciam a atenuação especial da pena.
Com o instituto em causa criou, o legislador, uma válvula de segurança para situações particulares, que o Prof. Figueiredo Dias, As Consequências Jurídicas do Crime, § 444, pág. 302, justifica nos seguintes termos: “Quando, em hipóteses especiais, existam circunstâncias que diminuam por forma acentuada as exigências de punição do facto, deixando aparecer a sua imagem global especialmente atenuada, relativamente ao complexo “normal” de casos que o legislador terá tido ante os olhos quando fixou os limites da moldura penal respectiva, aí teremos mais um caso especial de determinação da pena, conducente à substituição da moldura penal prevista para o facto por outra menos severa. São estas as hipóteses de atenuação especial da pena”.
Ou seja, o artigo 72° do Código Penal, ao prever a atenuação especial da pena, criou uma válvula de segurança para situações particulares em que se verificam circunstâncias que, relativamente aos casos previstos pelo legislador quando fixou os limites da moldura penal respectiva, diminuam por forma acentuada as exigências da punição do facto, por traduzirem uma imagem global especialmente atenuada, que conduz à substituição da moldura penal prevista para o facto por outra menos severa.
As circunstâncias exemplificativamente enumeradas naquele artigo dão ao juiz critérios mais precisos, mais sólidos e mais facilmente apreensíveis de avaliação dos que seriam dados através de uma cláusula geral de avaliação, mas não têm, por si só, na sua existência objectiva, um valor atenuativo especial, tendo de ser relacionados com um determinado efeito que terão de produzir: a diminuição acentuada da ilicitude do facto ou da culpa do agente, (vide Ac. STJ de 18 de Outubro de 2001, proc. n° 2137 01-5ª SASTJ, n° 54, 122).
Assim sendo, a atenuação especial da pena só pode ter lugar, em casos extraordinários ou excepcionais, isto é, quando é de concluir que a adequação à culpa e às necessidades de prevenção geral e especial não é possível dentro da moldura geral abstracta escolhida pelo legislador para o tipo respectivo. Ou seja, é na acentuada diminuição da ilicitude ou da culpa, ou nas exigências da prevenção, que radica a autêntica ratio da atenuação especial da pena, sendo as circunstâncias enumeradas no n° 2 do mesmo artigo meramente indicativas.
Ora nunca poderíamos concluir que, dos factos dados como provados, exista qualquer circunstância contemporânea do crime que diminua por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena.
Na verdade, não se verificou nenhuma das circunstâncias previstas, pois que o não existiram circunstâncias anteriores ou posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuíssem por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena, nem actuou o arguido sob a influência de ameaça grave ou sob ascendente de pessoa de quem dependa ou a quem deva obediência, nem a sua conduta foi determinada por motivo honroso, por forte solicitação ou tentação da própria vítima ou por provocação injusta ou ofensa imerecida. Antes pelo contrário o arguido actuou de forma ofensiva, despropositada e ilógica, aparentando um enorme desprezo pela ofendida, que no caso, era a sua esposa, em processo de separação, e mãe dos seus filhos.
Igualmente se não verificou qualquer acto demonstrativo de arrependimento do mesmo, nem qualquer reparação, dos danos causados.
Pelo exposto, a análise crítica e global da prova produzida em julgamento, sobre os pontos concretamente especificados pelo recorrente, não justifica a formulação de juízo valorativo diferente do assumido pelo tribunal “a quo”.
*** 3.2.2. Cumpre-nos agora apreciar se está ou não correcto o quantitativo da pena aplicada, que o recorrente considera elevadas.
Como já referimos, o arguido e ora recorrente foi condenado, como autor material de cinco crimes de injúria, previstos e punidos pelo artigo 181°/1 do Código Penal, por cada um deles, na pena de 50 (cinquenta) dias de multa, à taxa diária de € 6,00 (seis euros).
Operando o cúmulo jurídico entre tais penas, nos termos do artigo 77°/1 do Código Penal, condena o arguido na pena única de
Em cúmulo jurídico das penas parcelares supra aplicadas foi o arguido condenado na pena única de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de 6€, o que perfaz o montante global de 900,00€ (novecentos euros).
Defende o recorrente que, ter-se-á que considerar que, atentas as circunstâncias do caso, as penas impostas, pelos crimes, são excessivas, bem como o cúmulo, pelo que deverão ser reduzidas.
Vejamos.
Como se sabe, a todo o crime corresponde uma reacção penal, pela qual a comunidade expressa o seu juízo de desvalor sobre os factos e a conduta realizada pelo arguido, partindo-se para o efeito do respectivo tipo legal.
Ora, tendo em conta os critérios da sua determinação, a pena deve ser aferida em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, atendendo ainda, numa segunda fase, a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, rodearam o mesmo, antes ou depois do seu cometimento, quer resultem a favor ou contra o agente.
Assim e retomando os critérios para a determinação concreta da pena, temos, duas regras centrais: a primeira consiste em ter presente que a culpa é o fundamento para a concretização da pena; a segunda, é de que deverá ter-se em conta os efeitos da pena na vida futura do arguido na sociedade e a necessidade desta se defender do mesmo, mantendo a confiança da comunidade na tutela da correspondente norma jurídica que foi violada.
Perante isto, podemos dizer que nesta acção a pena serve primacialmente, por um lado, para a retribuição justa do ilícito e da culpa (função retributiva), contribuindo ainda, por outro lado e ao mesmo nível, para a reinserção social do arguido, procurando não prejudicar a sua situação social mais do que estritamente necessário (função preventiva especial positiva) – como aludia Kohlrausch “Na determinação da pena o tribunal deve considerar principalmente que meios são necessários para que o réu leve de novo uma vida ordenada e conforme a lei” (vide “Mitt IKV Neue Folge”, t. 3, p. 7, citado por H.-H. Jescheck, in “Tratado de Derecho Penal”, Vol. II, p. 1195).
Ou ainda, como refere Figueiredo Dias (Consequências Jurídicas do Crime, pág. 227 e seg) a propósito da questão da medida da pena, a finalidade da aplicação desta reside primordialmente na tutela dos bens jurídicos e, na medida do possível na reinserção do agente na comunidade. A determinação da medida da pena é, assim, a conjugação da expectativa da comunidade na manutenção da vigência da norma infringida que se consubstancia com a ideia de prevenção geral positiva e as exigências derivadas da inserção social e reintegração do agente na comunidade.
Tal conjugação terá como parâmetro a culpa que constitui um limite máximo que não pode ser ultrapassado.
Para a determinação da medida concreta da pena há que fazer apelo aos critérios definidos pelos artigos 71º, 40º e 47º, n.º 1 do Código Penal, nos termos dos quais, tal medida será encontrada dentro da moldura penal abstractamente aplicável, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, atendendo ainda a todas as circunstâncias que não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor ou contra o agente.
Atendendo à materialidade considerada provada, são os seguintes os factores que relevam para a medida da pena:
- Execução do facto
O arguido actuou com consciência da ilicitude do seu acto e plena liberdade de decisão e com intenção de injuriar a ofendida, tendo dirigido à mesma as expressões que utilizou apenas e só para a injuriar.
Sabia que tais comportamentos eram ilícitos bem como sabia que a ofendida era a mãe dos filhos de ambos.
Assim, contra o recorrente milita o grau de ilicitude da conduta deste arguido e o modo gravoso de execução dos factos, na preparação e execução dos mesmos, bem evidenciado no factualismo provado, bem como o tipo de personalidade manifestado nos factos e a culpa manifestada na execução dos mesmos, sendo o seu dolo directo (modalidade mais gravosa do dolo).
A favor do arguido, apenas as suas condições pessoais e inserção social, dado que a ausência de antecedentes criminais deve ser a regra de todo o cidadão.
Ora, compulsando a materialidade considerada provada e tendo em conta os factores enunciados e o disposto no citado artigo 71º, entendemos ser de manter a medida das penas. É que, face ao elevado grau de ilicitude da conduta do arguido, à intensidade do dolo, às concretas exigências de prevenção geral e a personalidade revelada pelo arguido, fica inviabilizada por si só a possibilidade de acolhimento da pretensão por ele formulada.
Assim, perante estas concretas circunstâncias e face à moldura penal do tipo legal de crime acima mencionada, entendemos, que se mostram adequadas para o arguido as penas que lhe foram aplicadas em primeira instância, pelo que se mantêm.
Igualmente entendemos correcta a efectivação do cúmulo jurídico das penas parcelares supra aplicadas na pena global e única de pena única de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de 6€, o que perfaz o montante global de 900,00€ (novecentos euros).
Ou seja, atentos os critérios contidos nos artigos 40º, 70º e 71º C Penal, como suficientemente claro, se deixou exarado na decisão recorrida – ser, assim, óbvia a constatação que bem se decidiu, não merecendo qualquer censura, mostrando-se ajustadas, quer a espécie, quer a medida concreta da pena.
Consequentemente, não foi violada qualquer das disposições legais referidas, mormente arts. 181º, 184º e 347°, nº1, do C.Penal, nem o art.º 18 da CRP, pelo que, também nesta parte o recurso improcederá. *** III – Decisão.
Face ao exposto, acordam os Juízes que compõem esta Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra, em negar provimento ao recurso, mantendo-se na íntegra a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente com taxa de justiça de 6 UCs. *** Calvário Antunes (Relator) Mouraz Lopes