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PROCESSO ABREVIADO
RECURSO
CONSTITUIÇÃO DE ASSISTENTE
ACUSAÇÃO
NOTIFICAÇÃO
PRINCÍPIO DA SIMPLICIDADE E CELERIDADE PROCESSUAIS
PEDIDO DE INDEMNIZAÇÃO CIVIL
NOTIFICAÇÃO PARA DEDUÇÃO DO PIC
Sumário
I - Em processo abreviado, apenas é admissível recurso da sentença ou do despacho que puser termo ao processo (arts. 391º-G e 391º do CPP), por serem actos essenciais, que podem afectar direitos, v.g. dos sujeitos processuais. II - Não havendo imposição legal no sentido de ter de haver recurso de toda e qualquer decisão proferida num processo, em nome dos interesses da simplificação e da celeridade podia o legislador, no processo abreviado, criar regime especial (que prevalece sobre o regime geral), considerando assegurados os direitos ao recurso e a um processo justo e equitativo com a possibilidade de impugnação daqueles dois actos processuais (sentença ou despacho que puser termo ao processo). III - No processo abreviado, o requerimento a pedir a constituição de assistente segue o regime previsto no art. 68º do CPP, não dependendo de qualquer notificação prévia para o efeito quando estão em causa crimes públicos (em que seja admissível a constituição de assistente) ou semi-públicos. IV - O processo abreviado tem tramitação própria (prevista nos arts.391º-A a 391º-G do CPP, na redacção da Lei nº 26/2010, de 30.8), sendo apenas na falta de regulamentação específica que se aplica o regime geral; em matéria penal, os procedimentos relativos à acusação e remessa dos autos para julgamento estão especificamente regulados nos arts. 391º-B e 391º-C do CPP, prevalecendo sobre o regime geral. V - A eliminação da referência “à notificação da acusação” contida no art. 391º-C do CPP, na versão anterior à Lei nº 48/2007, de 29.8, é compreensível porque deixou de ser possível requerer a instrução (art. 286º, nº 3, do CPP, tendo sido ultrapassada a questão da eventual inconstitucionalidade pela redacção entretanto dada ao art. 391º-D do CPP pela Lei nº 26/2010, de 30.8), sendo esta forma de processo (abreviado) especial, de natureza urgente até à sentença em 1ª instância, o que é mais uma manifestação da primazia dada aos interesses da simplicidade e da celeridade. VI - A única conclusão a retirar das alterações introduzidas pelas Leis nº 48/2007, de 29.8 e nº 26/2010, de 30.8 é que, a nível da acção penal (tal como resulta dos arts. 391º-B e 391º-C do CPP), deduzida a acusação em processo abreviado, os autos são remetidos para julgamento (à semelhança do que também sucede com o processo sumário) sem haver notificação nos termos do regime geral (arts. 283º, nº 5, 277º, nº 3 e 113º, nº 9, do CPP). VII - Para efeitos de dedução do pedido de indemnização civil, não havendo regulamentação específica no processo abreviado (apesar de no art. 391º-E, nº 2, do CPP haver referência às partes civis), tem de aplicar-se o regime geral (arts. 71º a 84º, 283º, nº 5 e 277º, nº 3, do CPP). VIII - Tendo sido manifestado, na queixa apresentada, o propósito de deduzir pedido de indemnização civil, a denunciante deveria ter sido notificada pelo Ministério Público da acusação deduzida, face ao estatuído nos arts. 77º, nº 2, 283º, nº 5 e 277º, nº 3, parte final, do CPP (no que se refere à notificação a quem tiver manifestado o propósito de deduzir pedido de indemnização civil nos termos do art. 75º do mesmo código). IX - Cometida a irregularidade da falta de notificação da acusação para efeitos de dedução do pedido cível (que não é de conhecimento oficioso, nem obsta ao conhecimento do mérito da causa), a consequência é (por força do disposto no art. 72º, nº 1, al. i), do CPP) a sua dedução em separado (perante o tribunal civil) e não a anulação de todo o processado a partir da acusação (o direito à dedução do pedido de indemnização civil não tem a virtualidade de interferir na decisão penal, sendo certo que neste caso a sentença publicada até já transitou em julgado).
Texto Integral
(proc. n º 155/11.9EAPRT.P1)
* Decisão sumária
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I- RELATÓRIO
1. No processo abreviado nº 155/11.9EAPRT do 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Matosinhos, após ser proferida sentença oral em 5.9.2012 (que concluiu pela absolvição dos arguidos B…… e C……, Lda, do crime de violação do exclusivo de patente p. e p. no art. 321º, al. a), do Código de Propriedade Industrial – ver fls. 281 a 285 do 2º volume), na sequência de notificação (datada de 10.9.2012) feita à sociedade D….., Lda, nos termos e para os efeitos do art. 330º, nº 1, do CPI, veio esta apresentar o requerimento que consta de fls. 287 a 289 (onde arguiu a nulidade da falta de notificação de qualquer acto processual após a apresentação de queixa, designadamente falta de notificação da acusação, tanto mais que tinha manifestado o propósito de deduzir pedido cível e de se constituir assistente ou, assim não se entendendo, a sua irregularidade, pedindo que de qualquer modo seja dado sem efeito todo o processado depois da elaboração da acusação pública, para que possa deduzir pedido cível, ser convocada para comparecer em audiência, sem prejuízo da possibilidade de se constituir assistente), sobre o qual o Sr. Juiz proferiu a seguinte decisão em 17.9.2012 (fls. 309 do 2º volume): A queixosa “D…..” veio arguir Nulidade/irregularidade decorrente da falta de notificação de qualquer acto processual, nomeadamente para se poder constituir assistente e deduzir pedido cível, requerendo, por isso, a anulação do processado. No entanto a pretensão da requerente é improcedente. Em primeiro lugar, importa salientar que foi já concluído o julgamento e proferida sentença. Em segundo lugar, quanto à nulidade invocada, ao abrigo do art. 120º, nº 2, al. b), do CPP, a requerente parte de uma premissa errada – e de que dependeria a cogitação da alegada nulidade por falta de notificação/comparência – que é a de se considerar assistente e/ou parte cível. É que, na verdade, a requerente, nestes autos, figura apenas como queixosa, sem que tenha requerido a constituição como assistente e sem que tenha deduzido pedido cível, e, quanto ao queixoso, não se aplica a obrigatoriedade de notificação da acusação ou de outros actos processuais a que a requerente alude. Em terceiro lugar, quanto à falta de notificação da queixosa para, querendo, deduzir pedido cível, apesar de essa omissão ter ocorrido, contra a previsão do art. 77º, nº 2, do CPP, o certo é que tal não tem implicações invalidantes do processado, seja como nulidade, seja como irregularidade, prevendo antes a própria lei, nos casos da omissão da notificação em causa, um alargamento do prazo para dedução do pedido cível, nos termos do art. 77º, nº 3, do CPP, e a possibilidade de dedução do pedido em separado, nos termos do art. 72º, nº 1, al. i), do CP, sendo tão só estas as consequências daquela omissão de notificação do lesado para deduzir pedido cível. E o certo é que todos os prazos legais para a dedução do pedido cível estão esgotados. Assim sendo, indefere-se as arguidas nulidades/irregularidades. Notifique.
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2. Notificado dessa decisão, veio a sociedade D….., LDA dela recorrer (fls. 313 a 323), apresentando as seguintes conclusões: 1. No requerimento em causa a ofendida informou que no dia 16/03/2011 apresentou junto da ASAE e Serviços do Ministério Público, uma participação criminal que deu origem aos presentes autos, tendo nessa denúncia, tendo manifestado propósito de se constituir Assistente e de deduzir Pedido de Indemnização Civil; 2. Sucede que, desde a data da apresentação daquela queixa, até à recepção da presente notificação datada de 10/09/2012, e recepcionada no dia 11/09/2012, nunca a aqui ofendida foi notificada de qualquer acto processual; 3. Compulsados os autos verifica-se que a ofendida não foi notificada da acusação, como devia ter sido. 4. Nos termos e para os efeitos do art.º 277, n.º 3, “ex vi”art.º 283, n.º5 do Código de Processo Penal, a denunciante com faculdade de se constituir assistente e quem tenha manifestado o propósito de deduzir pedido de indemnização, deve ser notificada da acusação. 5. Não o tendo sido, ficou a denunciante impedida de saber em que estado se encontrava o inquérito e portanto, impedida de se constituir assistente e de deduzir pedido de indemnização civil. 6. A notificação da acusação à ofendida/lesada impunha-se, nomeadamente, porque a mesma tinha manifestado nos autos o propósito de deduzir pedido de Indemnização Cível e de se constituir Assistente 7. Entendeu a Ofendida que tal omissão circunstanciava uma nulidade dependente de arguição, devendo ser anulado e dado sem efeito todo o processado desde a data da elaboração da acusação. 8. Defendeu ainda a ofendida que caso não se entendesse que estaríamos perante uma nulidade, o que só por mera hipótese académica se admitiu, sempre se diria que, no mínimo, tinha ocorrido uma irregularidade, que só agora tinha chegado ao conhecimento da Ofendida (após a recepção da presente notificação que ocorreu no dia 11/09/2012), pelo que, à cautela, se arguiu tal irregularidade, em conformidade e para os efeitos previstos no disposto no art.º 123 do CPP; 9. As irregularidades/nulidades foram indeferidas por despacho notificado à ofendida a 19/09/2012. 10. Ora a falta de notificação da acusação à ofendida/queixosa viola o dever de informação que cabe ao Ministério Público na fase de inquérito, ficando a denunciante privada de intervir no processo logo que deduzida a acusação. 11.Com tal omissão fica prejudicado por essa via os legítimos direitos da ofendida, que por desconhecimento da existência da acusação e dos próprios autos, não teve qualquer possibilidade de deduzir o pedido de indemnização civil e ou de se constituir assistente, querendo. 12. A obrigatoriedade da declaração de propósito de deduzir pedido de indemnização civil visa garantir, de modo mais eficaz, a constituição das partes civis e a sua intervenção processual, utilizando para o efeito formas de notificação específicas e imperativas. 13. Diga-se que a própria teologia do citado art.º 75.º do CPP ao impor o dever de informação ao lesado pela autoridade judiciária pretende acautelar desde logo o exercício do direito do lesado na dedução do pedido de indemnização em Processo Penal, sustentada na regra o Principio da Adesão estabelecido no art.º71º do Código de Processo Penal. 14. Nesta medida despacho em causa ao indeferir as nulidades/ irregularidades invocadas violou as regras as estabelecidas no Código de Processo Penal, tendo em conta nomeadamente, que apesar de verificar que tal omissão ocorreu considera que tal não tem implicações, nem mesmo como irregularidade. 15. Salvo devido respeito que é muito, o douto despacho viola o acórdão do Tribunal de Relação de Guimarães de 27/04/2009 e com o acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 05/07/2009, onde consideram que a falta da notificação de acusação ao lesado constituí irregularidade. 16. A referida irregularidade foi arguida tempestivamente pela ofendida. 17. Ao indeferir tal irregularidade o Tribunal vedou à ofendida /lesada o Acesso ao direito previsto no art.º 77.ºn.º2 do CPP, bem como, violou todas as invocadas normas do CPP, afastando preceitos constitucionais que vinculam directamente por constituírem direitos fundamentais, designadamente, consagrados nos artigos 16.º, 18.º e 20.º, n.º4 e 5 da CRP. 18. Pelo que a decisão recorrida deve ser revogada e substituída por acórdão que julgue procedente a irregularidade invocada e que foi tempestivamente arguida. 19. Em consequência deve-se declara-se a invalidade de todos os termos do processo a partir da omissão dessa notificação.
Termina pedindo o provimento do recurso.
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3. Na 1ª instância o Ministério Público respondeu (fls. 338 a 349 do 2º volume) concluindo pelo não provimento do recurso.
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4. Nesta Relação, no seu parecer (fls. 359 e 360 do 2º volume), o Sr. Procurador-Geral Adjunto pugnou pelo não provimento do recurso.
5. Foi cumprido o disposto no art. 417º, nº 2, do CPP.
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6. Feito o exame preliminar, incumbe apurar se a decisão impugnada é passível de recurso, sabido que, nos termos do art. 414º, nº 3, do CPP, a decisão da 1ª instância que admitiu o recurso, tal como foi proferida, não vincula o tribunal superior.
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II- FUNDAMENTAÇÃO
Face ao teor das conclusões do recurso (art. 412º, nº 1, do CPP), a questão que o recorrente coloca é a de saber se, a decisão que impugna deve ser revogada por não ter declarado a nulidade/irregularidade, arguida tempestivamente, da falta de notificação à recorrente/queixosa de qualquer acto processual, incluindo da acusação deduzida e, em consequência, se deve ser anulado todo o processado ocorrido depois de elaborada a peça acusatória.
Coloca-se, todavia, a questão prévia de apurar se a decisão em causa é ou não passível de recurso.
No âmbito do processo abreviado, tendo em vista o disposto nos arts. 391º-G[1] e e 391º[2] do CPP (redacção da Lei nº 26/2010, de 30.8, aplicável ao caso) só é admissível recurso da sentença ou de despacho que puser termo ao processo.
Portanto, qualquer outra decisão proferida no âmbito do processo abreviado, como seja a decisão que indefere a arguição de nulidade ou irregularidade invocada pelo queixoso/ofendido, como sucedeu neste caso, não é susceptível de recurso.
O legislador entendeu que, no processo abreviado, eram assegurados o direito ao recurso e o direito a um processo justo e equitativo, com a possibilidade de impugnação, por via de recurso, apenas da sentença ou do despacho que puser termo ao processo.
Esses actos (sentença ou decisão que puser termo ao processo) são as peças essenciais que justificam o direito de recurso, uma vez que as respectivas decisões podem afectar direitos v.g. dos sujeitos processuais.
E, como sabido, não há imposição legal (que derive sequer da CRP) no sentido de ter de haver recurso de toda e qualquer decisão proferida num processo.
O entendimento do legislador é justificado em nome dos interesses da simplificação e da celeridade processual, que caracterizam esta forma de processo especial (processo abreviado), prevista para combater, de forma rápida e eficaz, a pequena e média criminalidade.
Prevalecendo o regime especial (previsto no art. 391º-G do CPP) sobre o regime geral (art. 399º do CPP) é lógico concluir pela inadmissibilidade de recurso da decisão proferida em 17.9.2012.
O tribunal da 1ª instância não se pronunciou sobre essa matéria (sobre a natureza especial do art. 391º-G, do CPP), antes optando por admitir o recurso de forma tabelar, em termos gerais (invocando o disposto no art. 401º, nº 1, al. d), do CPP, mas ignorando o estatuído no art. 391º-G do CPP, sobre o qual nem se pronunciou apesar de constituir regime especial) como se verifica do despacho de fls. 350.
Em face do supra exposto, tendo em vista os artigos 417º, nº 6, alínea b), 420º, nº 1, alínea b), 414º, nºs 2 e 3 e 391º-G, todos do CPP, incumbe rejeitar o recurso interposto pela sociedade D….., LDA, por inadmissibilidade legal.
Mas, ainda que assim não fosse (admitindo-se, sem conceder, que seria aplicável o disposto no art. 401º, nº 1, al. d), segunda parte, do CPP, por se tratar de decisão posterior à sentença), também entendemos que é manifesto que não assiste razão à recorrente.
Na análise da questão colocada pela recorrente, importa ter em atenção os seguintes elementos que resultam dos autos:
a)- Na sequência de comunicação urgente, enviada pela D….., LDA para a ASAE, departamento de Lisboa, em 15.3.2011 (fls. 9), este OPC teve a intervenção a que se refere o auto de notícia de fls. 2 e 3 (após as diligências que efectuou – apreensão de colchões, ao abrigo do disposto nos arts. 178º, nº 1 e 249º, nº 2, al. c), do CPP, por indícios da prática do crime de violação do exclusivo da patente – entendeu existir flagrante delito e, invocando o disposto nos arts. 49º, 255º e 256º do CPP, procedeu à detenção do arguido B……, após o que o libertou, por o tribunal estar encerrado, seguindo depois o formalismo previsto no art. 385º do CPP e comunicando a detenção ao MºPº);
b)- A D….., LDA (aqui recorrente) em 17.3.2011 dirigiu à ASAE participação criminal contra a C……, Lda, representada por B……, por “crime de violação exclusiva de patentes previsto no Código de Propriedade Industrial”, tendo declarado reservar-se o direito de se constituir assistente e manifestado o propósito de deduzir pedido de indemnização civil (fls. 25 e 26); fez constar desse requerimento que o mesmo se destinava a ser junto ao “NUIPC 155/11.9EAPRT” (ou seja, a estes autos);
c)- O Ministério Público, por despacho de 17.3.2011 (fls. 34 a 43), propôs a suspensão provisória dos autos relativamente aos arguidos B….. e C……, Lda e, caso a mesma não fosse aceite pelos arguidos, requereu que o julgamento fosse efectuado em processo sumário;
d)- como os arguidos não aceitaram a suspensão provisória do processo (fls. 44), os autos foram remetidos para julgamento em processo sumário;
e)- por despacho de 17.3.2011 (fls. 48), invocando a necessidade de realização de exame pericial e ter a ofendida (aqui recorrente) declarado pretender constituir-se assistente e deduzir pedido cível de indemnização, ao abrigo do art. 390º, al. b), do CPP, o Sr. Juiz determinou o reenvio do processo aos Serviços do Ministério Público para tramitação sob outra forma processual;
f)- Nos serviços do Ministério Público, após inquérito sumário, foi em 9.6.2011 deduzida acusação para julgamento em processo abreviado, contra os arguidos B….. e C……, Lda, nos termos constantes de fls. 93 e 94, sendo imputado ao primeiro um crime de violação do exclusivo de patente, do modelo ou da fotografia de produtos, p. e p. no art. 321º, al. a), do Código de Propriedade Industrial e, considerada a segunda criminalmente responsável nos termos dos arts. 320, 322º do CPI e 3º, nº 1, do DL nº 28/84, sendo punida nos termos do art. 7º desse último diploma legal e solidariamente responsável nos termos do seu art. 2º, nº 3;
g)- Entretanto, em 6.7.2011, invocando a inconstitucionalidade do disposto nos arts. 286º, nº 3 e 391º-C do CPP, por violação do art. 32º, nº 4, da CRP, os arguidos requereram a abertura de instrução nos termos que constam de fls. 103 a 147;
h)- Por despacho de 20.9.2011 (fls. 151 a 155), considerando inconstitucional o disposto nos arts. 286º, nº 3 e 391º-C do CPP, por violação do art. 32º, nº 4, da CRP, O Sr. JI decidiu aplicar o regime geral previsto no art. 287º e seguintes do CPP (afastando o regime previsto naquelas normas que declarou inconstitucionais), razão pela qual declarou aberta a instrução e, realizada esta, por decisão de 15.12.2011 (fls. 181 a 185), pronunciou os arguidos pelos factos e respectiva incriminação constantes da acusação pública que foi dada por reproduzida;
i)- Remetidos os autos para julgamento, por despacho de 23.12.2011 foram autuados como processo abreviado (fls. 191 do 1º volume), iniciando-se o julgamento em 16.4.2012 (fls. 208 e 209 do 2º volume), com a determinação da realização de prova pericial;
j)- Feito o exame pericial, foi designado novo dia para julgamento, o qual veio a ser realizado em 5.9.2012 (fls. 281 a 285), sendo então proferida sentença oral que concluiu pela absolvição dos arguidos B…… e C……., Lda, do crime de violação do exclusivo de patente p. e p. no art. 321º, al. a), do Código de Propriedade Industrial;
l)- Consta, ainda, do dispositivo da sentença, ditado para acta, o seguinte: “Uma vez que se verifica, objectivamente, a violação exclusiva da patente, determina-se nos termos e para os efeitos do art. 330º, nº 1, do C.P. Industrial, se notifique a D……, Lda, no sentido de, querendo, dar o seu consentimento expresso para que os objectos apreendidos voltem a ser introduzidos nos circuitos comerciais ou para que lhes seja dada outra finalidade.”;
m)- Essa notificação (datada de 10.9.2012) foi feita à sociedade D……, Lda, que a recebeu (como reconhece) em 11.9.2012 e, em 13.9.2012, veio apresentar o requerimento supra aludido, que consta de fls. 287 a 289, o qual foi objecto da decisão sob recurso acima transcrita;
n)- Desde que apresentou a participação criminal em 17.3.2011 até à notificação que recebeu em 11.9.2012, à D……, LDA, não recebeu qualquer comunicação/notificação relativa aos presentes autos (v.g. não lhe foi comunicado que havia sido deduzida acusação para julgamento em processo abreviado) e a mesma, apesar de ter declarado na queixa reservar-se o direito de se constituir assistente e manifestar o propósito de deduzir pedido de indemnização civil (fls. 25 e 26), também não requereu a sua constituição como assistente e tão pouco apresentou pedido cível de indemnização;
o)- A sentença proferida não foi objecto de recurso.
Vejamos, então, as questões colocadas pela recorrente por um lado na vertente penal e, por outro lado na vertente cível uma vez que, como sabido, são autónomas, apesar do princípio da adesão previsto no art. 71º do CPP.
Em matéria penal, a denunciante (aqui recorrente), que tinha a faculdade de se constituir assistente (por ser ofendida no crime semi-público participado, verificando-se o condicionalismo previsto no art. 68º, nº 1, al. a), do CPP), logo na queixa que apresentou poderia ter requerido a sua intervenção nessa qualidade.
No entanto, optou antes por reservar o direito de assumir essa qualidade de sujeito processual, tendo conhecimento dos respectivos pressupostos e do prazo para apresentar o respectivo requerimento (art. 68º, nº 3, al. a), do CPP).
Como bem diz o Ministério Público na 1ª instância, por estar em causa crime semi-público, dependia da iniciativa da queixosa/denunciante requerer a sua constituição como assistente.
A intervenção como assistente seguia o regime geral ou comum previsto no art. 68º do CPP, visto que, no processo abreviado, não há norma especial que regule essa matéria (ao contrário do que sucede, por exemplo, no processo sumário, onde pode ser solicitada, mesmo que só verbalmente, até ao início da audiência, a constituição como assistente - art. 388º do CPP).
Ora, não se verificando o condicionalismo previsto nos arts. 246º, nº 4 e 68º, nº 2, do CPP (por não estar em causa crime cujo procedimento dependesse de acusação particular), não incumbia ao Ministério Público, nem ao OPC (Órgão de Policia Criminal), advertir a denunciante para a faculdade de que gozava de requerer a sua constituição como assistente no processo penal.
De resto, tendo a denunciante expressamente reservado a faculdade de se constituir assistente (o que também significa que conhecia o respectivo estatuto e posição processual), caso pretendesse assumir essa posição processual, incumbia-lhe praticar os respectivos actos necessários para o efeito, ou seja, apresentar o respectivo requerimento ao juiz, constituir advogado e pagar a taxa devida, sabido que há prazos para o fazer.
Por isso, o requerimento a pedir a constituição de assistente (que implicava aceitar o processo no estado em que se encontrasse, como determina o art. 68º, nº 3, do CPP), não dependia de qualquer notificação prévia nesse sentido, como sustenta a recorrente.
Acresce que, a ofendida não podia ignorar (perante a intervenção que pediu à ASAE, por comunicação de 15.3.2011 e perante a queixa apresentada em 17.3.2011, que pediu para ser junta a estes autos cujo nº identificou, o que significa que sabia da intervenção da ASAE ocorrida em 16 e 17.3.2011 e que a mesma dera origem ao inicio destes autos) que o Ministério Público, titular da acção penal, podia seguir diferentes procedimentos legais.
Ou seja, se pretendia constituir-se assistente e intervir de “forma activa” (para usar expressão do recorrente) no processo, embora tendo em atenção as normas aplicáveis, deveria ter apresentado o respectivo requerimento para o efeito, em devido tempo, tanto mais que os autos até podiam ter terminado com a suspensão provisória do processo (a lei não obriga a que o ofendido se constitua assistente, nem a notificação do ofendido para esse efeito, quando, por exemplo, em casos como o destes autos, o Ministério Público propõe a suspensão provisória do processo, a qual, desde que obtida a concordância dos respectivos intervenientes, pode fazer terminar os autos decorrido o respectivo prazo, sem o conhecimento do denunciante, mesmo que este tenha a faculdade de se constituir assistente, sendo certo que, perante o disposto no art. 72º, nº 1, al. b), do CPP, o pedido cível pode ser formulado em separado).
A recorrente nunca foi impedida de consultar o processo v.g. para tomar conhecimento do estado em que se encontrava; tão pouco essa consulta ou a sua intervenção na acção penal dependia de qualquer notificação ou informação, v.g. de que fora deduzida acusação para julgamento em processo abreviado.
Portanto, não assiste razão à recorrente quando alega que ficou privada de intervir no processo, em matéria penal, por não ter sido informada que havia sido deduzida acusação (esse raciocínio peca por não ter em atenção que, neste caso, o MºPº formulou acusação para julgamento em processo abreviado, o qual tem tramitação particular, parte dela distinta da geral prevista para o processo comum).
Por outro lado, não se pode esquecer que, mesmo que a denunciante se tivesse constituído assistente, a sua posição processual e atribuições são apenas as que estão definidas no art. 69º do CPP[3], sendo claro que teria a posição de colaborador do Ministério Público, a cuja actividade tinha de subordinar a sua intervenção no processo, salvo as excepções da lei.
Essa relação de subordinação ao Ministério Público é mais evidente quando em causa estão crimes públicos ou semi-públicos (como sucede neste caso em que o procedimento criminal dependia de queixa).
Posição e relação essas que se compreendem uma vez que o titular da acção penal é sempre o Ministério Público, o qual tem a posição e atribuições definidas no art. 53º do CPP[4], tendo o processo penal natureza pública.
O denunciante que se constitui assistente é representado por Advogado (sendo esta uma das condições para ser admitido como tal), incumbindo-lhe fazer a sua opção perante as alternativas que lhe são conferidas pela lei, as quais tutelam e salvaguardam suficientemente os seus direitos, aliás, em conformidade com o estabelecido na CRP, nomeadamente dos seus arts. 16º, 18º e 20º.
Sendo o Ministério Público o titular da acção penal incumbia-lhe promover o processo penal, nomeadamente propondo a suspensão provisória do processo, requerendo o julgamento em processo sumário e depois em processo abreviado, como sucedeu neste caso, actos esses que, sendo lícitos, não podiam ser contrariados pelo denunciante, ainda que se constituísse assistente.
O Ministério Público, no exercício da acção penal (e na acusação que deduziu para julgamento em processo abreviado) não tinha de indicar pessoa ligada ao denunciante como testemunha.
Por isso, o facto do recorrente querer participar no processo nessa qualidade (como testemunha) não estava na sua disponibilidade e não se impunha ao titular da acção penal (que acabou por requerer o julgamento em processo abreviado, nos termos do art. 391º-A do CPP, por entender que as provas existentes nos autos eram simples e evidentes, delas resultando indícios suficientes de se ter verificado o crime imputado aos arguidos).
Ainda que o recorrente se tivesse constituído assistente (o que impedia que fosse ouvido como testemunha, nos termos do art.133º, nº 1, al. b), do CPP), também o Ministério Público não era obrigado a requerer que o mesmo fosse ouvido nessa qualidade de sujeito processual.
Eventual requerimento de assistente constituído como tal, no sentido de ser ouvido em julgamento (artigos 145º, nº 1 e 346º, nº 1, do CPP), não impunha a sua audição uma vez que estava previamente dependente de apreciação pelo juiz, que o iria deferir ou indeferir consoante a sua pertinência ou não para a descoberta da verdade e boa decisão da causa.
E, como é bom de ver, perante as provas documentais existentes nos autos, a prova pericial e a prova testemunhal (constituída pelos elementos da ASAE que participaram no auto de notícia que deu origem ao presente processo), o mais razoável e lógico era que a recorrente não fosse ouvida através do seu representante legal como assistente, caso tivesse em devido tempo adquirido essa qualidade (que não tinha, nem adquiriu por inércia sua, que só a si lhe pode ser imputada).
Resulta do auto de notícia que a actuação da ASAE, descrita nesse auto, ocorreu devido ao impulso da denunciante que, tomou conhecimento daquela intervenção, tanto mais que sabia o nº do NUIPC a que dera origem.
Tinha a denunciante a responsabilidade de decidir se queria ou não constituir-se assistente, o que impunha o cumprimento dos prazos previstos na lei (art. 68º, nº 3, do CPP) e, portanto, deveria, por sua iniciativa, ter indagado do estado dos autos, para não ver precludido (pelo decurso do prazo limite) aquele direito que a lei lhe facultava.
Não o tendo feito, só a si lhe pode ser imputado, o não exercício desse direito, que a lei lhe facultava e que não dependia de qualquer notificação para o efeito.
Acresce que, o processo abreviado tem tramitação própria, prevista nos arts.391º-A a 391º-G do CPP, sendo apenas na falta de regulamentação específica que se aplica o regime geral.
Os procedimentos relativos à acusação e remessa dos autos para julgamento estão especificamente regulados nos arts. 391º-B e 391º-C do CPP.
Nessa parte, quanto à acusação (do Ministério Público e ou também acusação particular) e remessa dos autos para julgamento, tais normas especiais prevalecem sobre o regime geral.
Aliás, também à acusação deduzida em processo sumário não são aplicadas as regras gerais previstas nos arts. 283º, nº 5, 277º, nº 3, 284º e 113º, nº 9, do CPP.
O que se compreende porque estamos perante processos especiais que se querem céleres e, portanto, também com uma tramitação simplificada, o que permite rapidez.
Se o legislador quisesse que, a nível da acção penal, houvesse notificação da acusação em caso de procedimento v.g. por crimes públicos ou semi-públicos[5], assim o teria dito expressamente, nomeadamente no nº 1 do art. 391º-B do CPP[6], onde até fez referência à aplicação do disposto no nº 3 do art. 283º do mesmo código.
Mas, não o fez, sendo certo que com a Lei nº 48/2007, de 29.8, alterou a redacção do anterior art. 391º-C do CPP, cuja epígrafe era “debate instrutório”[7] e onde no seu nº 1 fazia referência à “notificação da acusação”.
A eliminação da fase de instrução e daquela referência “à notificação da acusação” é compreensível porque deixou de ser possível requerer a instrução (art. 286º, nº 3, do CPP, tendo sido ultrapassada a questão da eventual inconstitucionalidade pela redacção entretanto dada ao art. 391º-D pela Lei nº 26/2010, de 30.8, já aplicável no caso destes autos).
Por isso, a única conclusão a retirar das alterações introduzidas pelas Leis nº 48/2007, de 29.8 e nº 26/2010, de 30.8 é que, a nível da acção penal, quando está em causa procedimento penal v.g. por crimes públicos ou semi-públicos, tal como resulta dos arts. 391º-B e 391º-C do CPP, deduzida a acusação em processo abreviado, os autos são remetidos para julgamento sem haver notificação nos termos das regras gerais (arts. 283º, nº 5, 277º, nº 3, e 113º, nº 9, do CPP) e logicamente sem estar dependente de acusação do assistente (art. 284º do CPP).
O mesmo se passa quando, por exemplo, o procedimento depende de acusação particular; nesse caso aplica-se o disposto no art. 391º-B, nº 2, do CPP, sendo depois de deduzida a acusação particular nos termos do art. 285º do CPP, que tem lugar a acusação do Ministério Público, após o que os autos são remetidos para julgamento.
A não exigência da notificação da acusação (pública ou privada) em matéria penal, no âmbito do processo abreviado, compreende-se melhor porque também o arguido deixou de poder requerer a instrução, tal como decorre do disposto no art. 286º, nº 3, do CPP.
A este propósito refira-se que, a realização da instrução, a requerimento do arguido, no caso destes autos foi anómala, uma vez que os argumentos invocados para declarar inconstitucional o disposto nos arts. 286º, nº 3 e 391º-C do CPP, por violação do art. 32º, nº 4, da CRP, não tiveram em atenção a redacção vigente, quer do art. 391º-C, quer do art. 391º-D (sendo já aplicável a redacção da Lei nº 26/2010, de 30.8, os argumentos utilizados pelo Sr. JI deixaram de fazer sentido, não sendo correcto invocar o Ac. do TC nº 158/2000, que foi tirado no âmbito da versão do CPP anterior mesmo à Lei nº 48/2007, de 29.8, que estava ultrapassado em virtude das subsequentes alterações legislativas).
Portanto, as regras gerais relativas à notificação da acusação, previstas nos arts. 283º, nº 5, 277º, nº 3, 284º e 113º, nº 9, do CPP, não são aplicáveis em matéria penal, por haver aqui regime especial e particular para a tramitação do processo abreviado no tocante à acusação (art. 391º-B a 391º-D do CPP).
O que se compreende também porque se trata de processo especial de natureza urgente até à sentença em 1ª instância (art. 103º, nº 1 e nº 2, al. c), do CPP), o que é mais uma manifestação da primazia dada aos interesses da simplicidade e da celeridade.
Por outro lado, não é pelo facto de não haver assistente ou denunciante com a faculdade de se constituir assistente no processo, que o Ministério Público deixa de exercer as suas funções e atribuições, definidas no art. 53º do CPP, v.g. sustentando a acusação em julgamento e interpondo recursos (que no processo abreviado são apenas das decisões indicadas nos arts.391º-G e 391º do CPP).
Se o Ministério Público não recorreu, neste caso, da sentença que absolveu os arguidos, é porque entendeu que a mesma não merecia censura.
O mesmo se passa quando deduz acusação por crime público que não admite a constituição de assistente e em que o Ministério Público sustenta a acusação em julgamento, em processo comum[8] e, depois deste realizado, se conforma com eventual sentença absolutória.
Podemos, assim, concluir que, ao menos desde a entrada em vigor da Lei nº 26/2010, de 30.8 (que alterou a redacção do art. 391º-D do CPP, sendo certo que a Lei nº 48/2007, de 29.8 já havia alterado o art. 391º-C, deixando de prever a notificação da acusação e o debate instrutório), não se podiam suscitar dúvidas que, a nível da acção penal, o Ministério Público não tinha de comunicar/notificar a acusação deduzida em processo abreviado ao arguido, ao assistente e ao denunciante com a faculdade de se constituir assistente, como sucede no regime geral (por aplicação do disposto nos arts. 283º, nº 5, 277º, nº 3 e 113º, nº 9, do CPP).
Igualmente, em matéria penal, não havia neste processo qualquer acto processual praticado antes de deduzida a acusação que tivesse de ser obrigatoriamente notificado/comunicado ao queixoso ou ao denunciante com a faculdade de se constituir assistente.
Daí que, recebidos os autos, o Sr. juiz teria de os analisar de acordo com o disposto nos arts. 391º-C e 391º-D do CPP, pelo que, conhecidas as questões a que se refere o artigo 311º do CPP, na parte aplicável[9], não sendo caso de rejeição da acusação (art. 391º-C, nº 2, do CPP), nem de reenvio para outra forma de processo (art. 391º-D do CPP), apenas lhe restava designar dia para julgamento, proceder à sua realização de acordo com o disposto no art. 391º-E do CPP e, proferir sentença nos termos do art. 391º-F do CPP, como sucedeu.
Portanto, a nível da acção penal, não foi cometida nenhuma nulidade ou irregularidade, por a queixosa ou quem a representasse não ter sido notificada da dedução da acusação pelo Ministério Público (ou de qualquer outro acto processual relacionado com a acção penal), não ter sido notificada para se constituir assistente, nem ter sido convocada para ser ouvida como testemunha ou como assistente.
De resto, como já se referiu, não tendo a queixosa exercido o direito de se constituir assistente em tempo oportuno, só a si lhe pode ser imputada essa omissão (obviamente que não sendo assistente igualmente não podia recorrer da sentença).
Por isso, a nível da acção penal não foi cometida qualquer nulidade ou irregularidade (não sendo este caso equivalente ao decidido nos acórdãos citados pela recorrente, tirados antes das alterações ao CPP introduzidas pela Lei nº 26/2010, de 30.8 e que não se debruçaram sobre as questões aqui em apreço).
Diferente já é a situação em relação a quem tiver manifestado o propósito de deduzir pedido de indemnização civil nos termos do art. 75º do CPP.
Nesse único caso, para efeitos de dedução do pedido de indemnização civil, impunha-se ao Ministério Público notificar a acusação pública, por aplicação do regime geral (citados arts. 283º, nº 5 e 277º, nº 3, do CPP).
É que, na regulamentação sobre o processo abreviado, o legislador nada estabeleceu quanto ao pedido cível, sendo certo que se refere às partes civis no art. 391º-E, nº 2, do CPP.
Veja-se que, no processo sumário, o legislador estabeleceu regime especial, em relação à possibilidade de as pessoas com legitimidade para tal poderem constituir-se assistentes ou intervir como partes civis se assim o solicitarem, mesmo que só verbalmente, em audiência (arts. 388º do CPP).
Também no processo sumaríssimo o legislador regulou especificamente os casos em que é permitida a intervenção das partes civis (art. 392º e 393º do CPP).
Já em matéria cível no processo abreviado, a falta de regulamentação específica, significa que tem de aplicar-se o regime geral, isto é, segue-se o estabelecido nos arts. 71º a 84º, 283º, nº 5 e 277º, nº 3, do CPP.
Ora, na queixa apresentada, a recorrente manifestou o propósito de deduzir pedido de indemnização civil (pedido cível que é autónoma da acção penal, apesar do princípio da adesão), mas não o apresentou em simultâneo como o podia ter feito.
Assim sendo, a queixosa/recorrente deveria ter sido notificada pelo Ministério Público da acusação deduzida, face ao estatuído nos arts. 77º, nº 2, 283º, nº 5 e 277º, nº 3, parte final, do CPP, isto é, na parte em que se refere à notificação a quem tiver manifestado o propósito de deduzir pedido de indemnização civil nos termos do art. 75º do mesmo código.
Ou seja, em matéria civil, neste processo abreviado foi cometida a irregularidade (arguida tempestivamente) que decorre da falta de notificação da acusação do Ministério Público ao queixoso/recorrente, enquanto lesado que manifestou o propósito de deduzir pedido de indemnização civil (não se pode sustentar que se trata de nulidade porque a mesma não está prevista desse modo em qualquer norma, nomeadamente, tendo em atenção também o disposto nos arts. 119º e 120º do CPP).
No entanto, essa irregularidade cometida, afecta apenas a matéria cível, na medida em que aquele que manifestou o propósito de deduzir o pedido de indemnização civil o não pode apresentar neste processo abreviado.
Porém, a lei, concretamente o art. 72º, nº 1, alínea i), segunda parte, do CPP, previu a forma de resolver essa irregularidade, sem afectar o processado relativo à acção penal que, neste caso, findou com a sentença absolutória transitada em julgado (visto que o Ministério Público não interpôs recurso dessa sentença e não havia assistente constituído nos autos, por inércia da própria queixosa, que não tomou a respectiva iniciativa para poder assumir essa qualidade de sujeito processual).
Prevê-se nessa disposição legal (art. 72º, nº 1, al. i), do CPP) que o pedido de indemnização civil pode ser deduzido em separado, perante o tribunal civil, quando o lesado não tiver sido informado da possibilidade de deduzir o pedido civil no processo penal ou notificado para o fazer, nos termos do nº 1 do artigo 75º e do nº 2 do art. 77º.
Por isso, como bem diz o Sr. PGA, a irregularidade cometida a nível da matéria civil não afecta a matéria penal, entretanto decidida.
Efectivamente, apenas está em causa o direito à dedução do pedido de indemnização civil que, foi preterido com aquela omissão de notificação, o que não tem virtualidade para interferir na decisão penal.
E foi isso mesmo que entendeu o legislador uma vez que, em casos como o destes autos, permitiu a formulação do respectivo pedido em separado (assim afastando o princípio geral da adesão ao processo penal).
Daí que se possa sustentar que, neste caso, no que se refere à acção penal, em processo abreviado a acusação não tinha de ser notificada à recorrente, mas no que se relaciona apenas com a possibilidade de dedução de pedido cível, aplicando-se o regime geral, a acusação do Ministério Público teria de lhe ser comunicada, uma vez que na denúncia que apresentou logo manifestou a intenção de apresentar pedido cível.
Note-se que, a irregularidade da falta de notificação da acusação para efeitos de dedução do pedido cível, não é de conhecimento oficioso, nem obsta ao conhecimento do mérito da causa e, face ao estatuído no art. 72º, nº 1, al. i), do CPP, o lesado sempre pode formular o pedido de indemnização civil, em separado da acção penal, perante o tribunal civil.
Por isso, apesar de se verificar a irregularidade apontada em matéria civil, a consequência é a dedução do pedido civil em separado (perante o tribunal civil) e não a pretendida anulação de todo o processado a partir da dedução da acusação.
São autónomos, para este efeito, a acção penal e o pedido cível (bem como as qualidades de assistente e de parte cível, seja demandante cível, seja demandado), resultando do disposto no art. 72º, nº 1, al. i), do CPP que não é vedado à recorrente o acesso ao direito (uma vez que pode deduzir o pedido de indemnização civil em separado, como previu o legislador quando ocorrem irregularidades deste tipo).
Isto significa que sempre improcedia manifestamente a pretensão da recorrente, uma vez que apesar de se verificar a irregularidade acima apontada em matéria civel, não era caso de declarar inválidos os termos do processo (designadamente a partir da omissão da notificação aludida nos arts. 77º, nº 2, 283º, nº 5 e 277º, nº 3, parte final, do CPP, como pretendia a recorrente), sendo certo, além disso, que não foram violadas as normas e princípios por ela invocados.
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III- DECISÃO
Nesta conformidade, embora pela primeira razão apontada, decide-se, nos termos dos artigos 417º, nº 6, alínea b), 420º, nº 1, alínea b), 414º, nºs 2 e 3 e 391º-G, todos do CPP, rejeitar o recurso interposto pela D……, LDA, por inadmissibilidade legal.
Custas a cargo da recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 3 UCs.
Nos termos do art. 420º, nº 3, do CPP, condena-se ainda o recorrente no pagamento de 3 UCs.
Notifique.
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(Processado em computador e revisto pela signatária. O verso das folhas encontra-se em branco – art. 94º, nº 2, do CPP)
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Porto, 6.3.2013
Maria do Carmo Saraiva de Menezes da Silva Dias (relatora)
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[1] Artigo 391.º-G (Recorribilidade) do CPP
É correspondentemente aplicável ao processo abreviado o disposto no artigo 391.º
[2] Artigo 391º (Recorribilidade) do CPP
1 - Em processo sumário só é admissível recurso da sentença ou de despacho que puser termo ao processo.
2 - Excepto no caso previsto no n.º 4 do artigo 389.º-A, o prazo para interposição do recurso conta-se a partir da entrega da cópia da gravação da sentença.
[3] Artigo 69º (Posição processual e atribuições dos assistentes) do CPP
1 - Os assistentes têm a posição de colaboradores do Ministério Público, a cuja actividade subordinam a sua intervenção no processo, salvas as excepções da lei.
2 - Compete em especial aos assistentes:
a) Intervir no inquérito e na instrução, oferecendo provas e requerendo as diligências que se afigurarem necessárias e conhecer os despachos que sobre tais iniciativas recaírem;
b) Deduzir acusação independente da do Ministério Público e, no caso de procedimento dependente de acusação particular, ainda que aquele a não deduza;
c) Interpor recurso das decisões que os afectem, mesmo que o Ministério Público o não tenha feito, dispondo, para o efeito, de acesso aos elementos processuais imprescindíveis, sem prejuízo do regime aplicável ao segredo de justiça. [4] Artigo 53º (Posição e atribuições do Ministério Público no processo) do CPP
1 - Compete ao Ministério Público, no processo penal, colaborar com o tribunal na descoberta da verdade e na realização do direito, obedecendo em todas as intervenções processuais a critérios de estrita objectividade.
2 - Compete em especial ao Ministério Público:
a) Receber as denúncias, as queixas e as participações e apreciar o seguimento a dar-lhes;
b) Dirigir o inquérito;
c) Deduzir acusação e sustentá-la efectivamente na instrução e no julgamento;
d) Interpor recursos, ainda que no exclusivo interesse da defesa;
e) Promover a execução das penas e das medidas de segurança.
[5] No caso de o procedimento depender de acusação particular, a acusação do MºPº (v.g. por crimes públicos ou semi-públicos) apenas tem lugar depois de deduzida acusação particular nos termos do art. 285º do CPP (assim o determina o art. 391º-B, nº 3, do CPP). Do art. 391º-A do CPP também se extrai que, no processo abreviado, mesmo existindo assistente ou denunciante com a faculdade de se constituir assistente, não é aplicada a regra geral prevista no artigo 284º do CPP (cf. também art. 68º, nº 4, do mesmo código).
[6] Dispõe o artigo 391º-B (Acusação, arquivamento e suspensão do processo) do CPP na versão da Lei nº 26/2010, de 30.8, já aplicável no caso destes autos:
1 - A acusação do Ministério Público deve conter os elementos a que se refere o n.º 3 do artigo 283.º. A identificação do arguido e a narração dos factos podem ser efectuadas, no todo ou em parte, por remissão para o auto de notícia ou para a denúncia.
2 - Sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 384.º, a acusação é deduzida no prazo de 90 dias a contar da:
a) Aquisição da notícia do crime, nos termos do disposto no artigo 241º, tratando-se de crime público; ou
b) Apresentação de queixa, nos restantes casos.
3 - Se o procedimento depender de acusação particular, a acusação do Ministério Público tem lugar depois de deduzida acusação nos termos do artigo 285º.
4 - É correspondentemente aplicável em processo abreviado o disposto nos artigos 280º a 282º. [7] Artigo 391º-C (debate instrutório) do CPP, na versão anterior à citada Lei nº 48/2007:
1 - No prazo de 10 dias a contar da notificação da acusação, o arguido pode requerer ao juiz de instrução a realização de debate instrutório, com as finalidades a que se refere o artigo 298º.
2 - O juiz de instrução encerra o debate instrutório no prazo máximo de 30 dias a contar do requerimento a que se refere o número anterior.
3 - O despacho de pronúncia pode ser efectuado por remissão para a acusação.
4 - É correspondentemente aplicável o disposto nos artigos 287º, nºs 2 e 3, 297º, 299º, 300º a 305º, 307º, nºs 1 e 2, e 308º a 310º, podendo o arguido requerer a prática dos actos que entender necessários.
[8] Não obstante, no regime geral, nesse caso (requerido o julgamento em processo comum), ter pelo menos de notificar a acusação ao arguido (caso não haja assistente, não haja denunciante com a faculdade de se constituir assistente, nem haja pessoa que tenha manifestado o propósito de deduzir pedido de indemnização civil nos termos do art. 75º) por aplicação do disposto no art. 283º, nº 5 e 277º, nº 3, do CPP.
[9] A nulidade/irregularidade invocada pela recorrente, dependia sempre de arguição, não sendo de conhecimento oficioso (pelo que não podia ser declarada pelo Sr. Juiz que recebeu os autos), nem obstava ao conhecimento do mérito da causa.