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RETRIBUIÇÃO
SUBSÍDIO
Sumário
I - Em primeira linha, a retribuição é determinada pelo clausulado do contrato e pelos usos laborais, e eventualmente por certos critérios normativos (o salário mínimo, a igualdade retributiva, etc.). No entanto, num segundo momento, ao montante global da retribuição poderão acrescer certas prestações que preencham os requisitos de periodicidade e regularidade. II - O primeiro critério sublinha a ideia de correspetividade ou contrapartida negocial: é retribuição tudo o que as partes contratarem (ou resultar dos usos ou da lei para o tipo de relação laboral em causa) como contrapartida da disponibilidade da força de trabalho. O segundo critério assenta numa presunção: considera-se que as prestações que sejam realizadas regular e periodicamente pressupõem uma vinculação prévia do empregador e suscitam uma expetativa de ganho por parte do trabalhador, ainda que tais prestações se não encontrem expressamente consignadas no contrato. III - As prestações que assumem um carácter regular e periódico e, consequentemente, para o trabalhador, apresentam uma expetativa legítima quanto ao seu recebimento, devem ser consideradas nas férias, nos subsídios de férias e nos subsídios de natal, porquanto igualmente decorrem da lei que as prevê. IV - Tendo em conta as disposições do AE/C… e a interpretação que das mesmas deve ser feita, concretamente da previsão contida no n.º 1 da sua cláusula 143.º, o pagamento da média das remunerações auferidas a título de subsídios deve ser feito também no subsídio de natal. V - Assistindo ao A. o direito a ver ponderadas na retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de natal tais prestações, face ao estatuído no art. º 11.º, n.º 1 da Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto (que aprovou o Código do Trabalho de 2003) a “nova” legislação nunca poderia implicar a redução da retribuição.
Texto Integral
Apelação n.º 411/11.6TTVLG.P1
Tribunal do Trabalho de Valongo
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Relator – Paula Maria Roberto
Adjuntos – Machado da Silva
Fernanda Soares
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:
I - Relatório
B…, casado, funcionário dos C…, residente em …,
intentou a presente ação de processo comum, contra
C…, S.A., com sede em Lisboa
alegando, em síntese que:
- Foi admitido pela Ré em maio de 1995 e para exercer as funções de carteiro.
- Em julho de 2000 foi prestar funções para a C1….
- Em abril de 2007 foi colocado no COCN de Gaia e, em outubro de 2010, foi transferido para a Maia onde se encontra.
- Nunca recebeu os subsídios de férias, natal e retribuição de férias com os valores médios das prestações pagas pela Ré regular e periodicamente ao longo do ano, designadamente, o trabalho extraordinário, trabalho noturno, compensação por horário incómodo, entre outros.
- Se estas prestações integraram a retribuição do A., de forma regular e periódica, ao longo dos anos em que está ao serviço devem, como tal, ser incluídas na média para o pagamento dos subsídios em questão.
- A Ré deve ser condenada a pagar as verbas que apurou, no valor de € 11.291,68 como média de uma retribuição variável auferida no período de maio de 1995 a maio de 2010, nos subsídios de férias e de natal e na retribuição de férias, acrescida de juros vencidos e vincendos até efetivo e integral pagamento.
Termina, dizendo que a presente ação deve ser julgada procedente, por provada e, consequentemente, ser a Ré condenada a pagar ao A. as diferenças salariais apuradas no valor de € 11.291,68, acrescidas dos respetivos juros vencidos e vincendos das quantias em dívida, até integral pagamento.
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Realizou-se a audiência de partes e na qual não foi obtida a conciliação das mesmas.
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A Ré contestou alegando, em sinopse, que:
- Os juros das diferenças retributivas vencidos há mais de 5 anos, nos termos da al. d) do art. 310.º do C.Civ., encontram-se prescritos, não se aplicando aos juros de mora o art. 38.º da LCT nem, por maioria de razão, o art. 381.º do C. Trab., uma vez que a obrigação dos juros pressupõe uma obrigação de capital, que não assume natureza laboral, apenas porque a obrigação principal reveste essa natureza.
- É verdade que o Autor recebe e recebeu, além do seu vencimento base e diuturnidades, subsídios de diversa ordem, porém e ao contrário do que vem alegado, aqueles não fazem parte do conceito legal de retribuição.
- O seu pagamento só é devido quando prestado efetivamente o trabalho, ou quando verificados os requisitos expressos no AE/C…, logo, não o poderá ser durante o período de férias, nem no pagamento dos subsídios de férias e natal.
- O trabalho noturno e o trabalho suplementar são, pela sua própria natureza e por força da lei, um desenvolvimento transitório da relação laboral, o que lhes retira o eventual carácter de regularidade ou habitualidade.
- O subsídio de condução nada mais é do que ajudas de custo que se destinam a fazer face a despesas concretas que o trabalhador tem de efetuar para executar o contrato, não constituindo um ganho acrescido, daí que não se justifica a sua inclusão na retribuição de férias e nos subsídios de férias e de natal.
- E o mesmo se passa quanto ao subsídio de chefia que apenas é devido enquanto o A. exerceu um cargo de chefia.
- O complemento de horário incómodo; comp. Dif. H.S., Sub. Carg. Desc., remuneração adicional, complemento de horário descontínuo, Sub. Div. Corr. e subsídio de turno, só são devidos em circunstâncias especiais e, por isso, não fazem parte do conceito de retribuição.
- Por outro lado, não são regulares os subsídios pagos a título de complemento de horário incómodo, nos anos de 2007 e 2008; o complemento de horário descontínuo, no ano de 2008; o comp. Dif. H. S., remuneração adicional e subsídio de turno, no ano de 2007; trabalho suplementar, subsídio de divisão de correio e subsídio de chefia, no ano de 2011.
- Os subsídios peticionados pelo A. não integram o conceito de retribuição, não são nem nunca fizeram parte da retribuição do A., pois só lhe eram pagos quando se verificassem os requisitos para a sua atribuição, nos termos do AE/C…, pelo que, não são devidos aquando do pagamento ao A. das férias, subsídios de férias e de natal.
Termina dizendo que deve julgar-se procedente a exceção suscitada, no que respeita aos juros, com a consequente absolvição do pedido, nessa parte e a ação ser julgada improcedente por não provada e a Ré absolvida do pedido, na sua totalidade, com as consequências legais inerentes.
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Foi proferido o despacho saneador de fls. 82, tendo sido julgada improcedente a exceção de prescrição dos juros arguida pela Ré.
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Procedeu-se a julgamento, tendo o tribunal, atenta o acordo das partes quanto à matéria de facto, dado como assente os factos constantes do despacho de fls. 97 a 107.
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Foi, depois, proferida sentença (fls. 108 e segs.) que julgou a presente ação parcialmente procedente e, em consequência condenou a Ré a pagar ao A. a quantia de € 9.446,25, a título de diferenças salariais relativas à retribuição de férias e dos subsídios de férias e de natal de 1995 a 2011, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data dos respetivos vencimentos e até integral pagamento e, no mais, absolver a Ré.
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A Ré notificada desta sentença, veio interpor o presente recurso que concluiu da forma seguinte:
“I. É entendimento da recorrente que se impõe a modificação da decisão do Tribunal a quo por inegável erro de julgamento, nos termos do art. 669.º n.º 2, a) e b) do C.P.Civ., por a decisão recorrida ter sido tomada contra legem.
II. Na verdade, e no que respeita à integração das prestações complementares, andou mal a sentença recorrida ao considerar que se presume que tais quantias integram a retribuição.
III. Entende a Recorrente que estas prestações não integram o conceito de retribuição, não são devidas no âmbito de férias, nem no subsídio de Natal, não decorrem da Lei, nem assim é regulamentado no AE/C…, aplicável ao contrato de trabalho sub judice.
IV. Nos termos do art. 82.º da LCT, a retribuição traduz o conjunto de valores com carácter pecuniário ou em espécie que o empregador se encontra obrigado a pagar regular e periodicamente ao trabalhador em contrapartida do seu trabalho ou, mais precisamente, da disponibilidade da sua força de trabalho, por força do contrato, da lei, de instrumento de regulamentação colectiva ou dos usos.
V. As prestações complementares estão ligadas a contingências especiais da prestação do trabalho ou ao mérito, assiduidade ou produtividade do trabalhador ou até a certas situações pessoais deste. Todos os subsídios referidos têm por pressuposto a efectiva prestação de trabalho, não sendo, portanto, devidos nos casos em que a prestação de trabalho não se verifica, seja qual for o seu fundamento;
VI. É entendimento do STJ que “mesmo o facto das prestações periódica e regularmente recebidas pelo trabalhador integrarem, em princípio, o conceito de retribuição não significa que linearmente tenham se ser levadas em conta para efeitos de cálculo das prestações cujo montante se encontra indexado ao valor da retribuição. A retribuição a atender para esse efeito não é – tirando as especificidades que resultem concretamente da lei – a retribuição global, mas sim a chamada retribuição modular ou padrão, da qual devem ser excluídas aquelas prestações cujo pagamento não é justificado pela prestação de trabalho em si mesma, mas por outra razão específica (Ac. do STJ, de 17/01/2007, in http://www.dgsi.pt)”.
Ora,
VII. De acordo com a cláusula 123.º do AE/C…, o subsídio de trabalho nocturno, só é devido quando é prestado entre as 20.00 horas de um dia e as 08.00 horas do dia imediato.
VIII. E, nos termos da Cláusula 122.º do AE/C…, considera-se trabalho suplementar, o prestado fora do período normal de trabalho.
IX. O trabalho nocturno e o trabalho suplementar são, pela sua própria natureza e por força da lei, um desenvolvimento transitório da relação contratual laboral, o que, aliás, lhes retira o eventual carácter de regularidade ou habitualidade.
X. Como tal, estas prestações são devidas somente na medida em que o trabalho seja efectivamente prestado nas condições acima especificadas. Assim, ainda que sejam prestações periódicas, não podemos incluir no conceito restrito de retribuição estes subsídios por trabalho nocturno ou suplementar, nos termos do art. 86.º da LCT.
XI. Já a compensação especial tem uma finalidade específica, que é o pagamento da assinatura do telefone que só ocorre 12 vezes, e que por isso não tem justificação para integrar os subsídios de férias e de natal.
XII. O mesmo se diga quanto ao subsídio de chefia que apenas é devido enquanto se mantiver a situação em que assenta o seu fundamento, ou seja, enquanto o A. exerceu um cargo de chefia, estando a sua atribuição estritamente ligada às funções desempenhas.
XIII. Igualmente, o subsídio de refeição por trabalho suplementar não tem a natureza de retribuição em sentido jurídico, já que visa cobrir ou minorar as despesas que o trabalhador tem de suportar por ter de tomar as suas refeições fora de casa e não entra, por isso, no cálculo da retribuição de férias e dos subsídios de férias e de Natal.
XIV. Logo, não constituem um ganho acrescido resultante da sua prestação laboral, são valores compensatórios de despesas, não podem as mesmas ser consideradas como parte integrante da retribuição, a não ser que excedessem as despesas normais do trabalhador e fossem tidas para o efeito, pelo contrato e pelos usos.
XV. Como tal não tem carácter de retribuição, tanto mais que as respectivas importâncias não excedem os montantes normais devidos pelas despesas a que se refere.
XVI. Cabendo ao Autor a prova de que tais ajudas constituem uma forma disfarçada de retribuição, por o seu montante exceder o valor das despesas feitas em serviço, assim decidido no Ac. da Relação do Porto, de 26/06/2000, in BMJ 498, p. 275.
XVII. Ora, não tendo sido alegados e provados factos em conformidade, deveria improceder a sua pretensão neste sentido.
XVIII. Igualmente, o subsídio de divisão de correio, Remuneração Adicional, Compensação de Horário Incómodo e Descontínuo, os mesmos só são devidos em circunstâncias especiais e, igualmente, não fazem parte da retribuição.
XIX. Por fim, e no que à contagem dos juros concerne, também andou mal a sentença recorrida. Na verdade, e nos termos da al. d) do art. 310.º do C.Civ., encontram-se prescritos os juros das diferenças retributivas vencidos há mais de 5 anos.
XX. Não se aplicando aos juros de mora o disposto no art. 38.º da LCT nem, por maioria de razão, o art. 381.º do C.TRab., uma vez que a obrigação dos juros pressupõe uma obrigação de capital, que não assume natureza laboral, apenas porque a obrigação principal reveste essa natureza.
XXI. O que significa que, a haver diferenças retributivas devidas desde 1995, aquelas quantias só começam a vencer juros 5 anos antes da citação da Ré e não desde a data do respectivo vencimento, conforme tem vindo a ser entendimento da jurisprudência, nomeadamente no Acórdão do Tribunal da relação de Lisboa, de 13 de Dezembro de 2007, proferido no Processo n.º 8367/07.
XXII. O M.mº Juiz a quo violou, entre outras e com o douto suprimento desse Venerando Tribunal, os arts. 82.º, 83.º, 86.º da LCT, 249.º e 260.º C.Trab, 310.º C.Civ e as normas constantes do AE/C….
Nestes termos, e nos mais de direito, sempre do douto suprimento de V. Ex.ªs, deverá ser concedido provimento ao presente Recurso e ser revogada a Sentença Recorrida, na parte em que condena a Ré ao pagamento das quantias a título de subsídio de condução e abono de viagem e substituída por outra que julgue a improcedência desse pedido, como é de inteira JUSTIÇA.”
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O A. não respondeu ao recurso interposto pela Ré.
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O Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu o douto parecer de fls. 151 e segs., no sentido de que “tendo-se demonstrado que o autor/apelado auferiu, entre Janeiro de 2000 e Dezembro de 2010, com carácter regular e periódico, os complementos remuneratórios que constam dos “quadros” dados por assente – materialidade que não vem impugnada pela apelante, que se conformou com a decisão de facto – tinha o mesmo direito a ver repercutida a média desses complementos remuneratórios na retribuição de férias e subsídios de férias e de Natal”, termos em que, o recurso não merece provimento.
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Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.
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II – Saneamento
A instância mantém inteira regularidade por nada ter entretanto sobrevindo que a invalidasse.
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III – Fundamentação Factos provados
A) Em maio de 1995 o autor foi admitido, com contrato de trabalho a termo certo, para trabalhar sob autoridade e direção da ré, para exercer as funções de carteiro no setor da encomenda comercial – unidade orgânica dos C….
B) Em abril de 1997 foi admitido como efetivo para exercer as mesmas funções no mesmo local de trabalho, onde permaneceu até junho de 2000.
C) Em julho de 2000, mediante contrato de cedência, foi prestar funções para a empresa C1….
D) Em abril de 2007, foi feito cessar o contrato de cedência em vigor e foi o autor colocado no COCN/Gaia, tendo em out. 2010 sido transferido para Maia, por motivo de mudança definitiva de instalações do COCN.
E) O autor sempre desempenhou as funções de carteiro para a ré. F) Atualmente, o autor continua com a categoria profissional de carteiro e encontra-se colocado no COCN/Maia.
G) Em virtude das suas funções e do horário de trabalho que praticava ao serviço da ré, o autor vinha auferindo mensalmente as quantias descritas nos quadros seguintes:
QUADRO I
Discriminação de retribuições complementares respeitantes ao ano de 1995
QUADRO II
Discriminação de retribuições complementares respeitantes ao ano de 1996
QUADRO IV
Discriminação de retribuições complementares respeitantes ao ano de 1998
QUADRO V
Discriminação de retribuições complementares respeitantes ao ano de 1999
QUADRO VI
Discriminação de retribuições complementares respeitantes ao ano de 2000
QUADRO VII
Discriminação de retribuições complementares respeitantes ao ano de 2001
QUADRO VIII
Discriminação de retribuições complementares respeitantes ao ano de 2002
QUADRO IX
Discriminação de retribuições complementares respeitantes ao ano de 2003
QUADRO X
Discriminação de retribuições complementares respeitantes ao ano de 2004
QUADRO XI
Discriminação de retribuições complementares respeitantes ao ano de 2005
QUADRO XII
Discriminação de retribuições complementares respeitantes ao ano de 2006
QUADRO XIII
Discriminação de retribuições complementares respeitantes ao ano de 2007
QUADRO XIV
Discriminação de retribuições complementares respeitantes ao ano de 2008
QUADRO XV
Discriminação de retribuições complementares respeitantes ao ano de 2009
QUADRO XVI
Discriminação de retribuições complementares respeitantes ao ano de 2010
QUADRO XVII
Discriminação de retribuições complementares respeitantes ao ano de 2011 QUADRO XVIIII
Prestações retributivas complementares pagas pela empresa
J) No que respeita ao subsídio de Natal, a Ré nunca fez incidir qualquer quantia relativa àquelas prestações complementares.
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b) - Discussão
Como é sabido, a apreciação e a decisão dos recursos são delimitadas pelas conclusões da alegação do recorrente (art.º 684.º, n.º 3 e 685.º-A, n.º 1, do CPC), com exceção das questões de conhecimento oficioso.
Assim, cumpre apreciar as questões suscitadas pela Ré recorrente, quais sejam: 1ª Da existência de erro de julgamento por se ter considerado que se presume que as prestações complementares pagas ao A. a título de trabalho noturno, trabalho suplementar, compensação especial, subsídio de chefia, subsídio de refeição por trabalho suplementar, subsídio de divisão de correio, remuneração adicional, compensação de horário incómodo e descontínuo, fazem parte da retribuição e são devidas no âmbito das férias, subsídios de férias e de natal. 2ª Da prescrição dos juros das diferenças retributivas vencidos há mais de cinco anos.
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1ª questão
Como consta da sentença recorrida:
<<Tendo em consideração que o primeiro desses “quadros” se reporta ao ano de 1995 e o último a 2011 são diversos os regimes jurídicos a analisar pelo que há que fazer uma análise desses diversos regimes que se foram sucedendo.
Temos assim que atender ao D.L. nº 49408 de 24/11/1969 (L.C.T.), ao D.L. nº 88/96 nº de 3 de Julho, (subsídio de Natal), ao D.L. nº 874/76, de 28/12 (L.F.F.F.), ao Código do Trabalho de 2003, ao Código do Trabalho de 2009, bem como à Portaria de Regulamentação do Trabalho para os trabalhadores dos C…, publicada no B.T.E. (Boletim do Trabalho e Emprego) nº 28/77 de 29 de Julho.
Há ainda que atender aos instrumentos de regulamentação colectiva que vinculam ambas as partes, como seja desde logo o Acordo de Empresa (A.E.) publicado no B.T.E. nº 24 de 29/06/1981>>.
Por outro lado, como se sabe, a retribuição é um conjunto de valores expressos ou não em moeda, a que o trabalhador tem direito, por título contratual ou normativo, correspondente a um dever da entidade patronal e que se destina a integrar o orçamento normal do trabalhador, conferindo-lhe a justa expetativa do seu recebimento, dada a sua regularidade e continuidade periódicas.
O artigo 249.º do Código do Trabalho de 2003, nos seus n.º s 1 a 3, refere que “só se considera retribuição aquilo a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho” (n.º 1); “na contrapartida do trabalho incluem-se a retribuição base e todas as prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie” (n.º 2) e “até prova em contrário, presume-se constituir retribuição toda e qualquer prestação do empregador ao trabalhador” (n.º 3) - do que resulta, tendo em conta os princípios de repartição do ónus da prova, e, especificadamente, o disposto no n.º 1 do art. 344.º do Cód. Civil que, sobre o empregador impende o ónus de provar que certa prestação que o mesmo fez ao seu trabalhador não tem a natureza de retribuição.
O art.º 249.º do Cód. do Trabalho de 2003 corresponde, com alterações sem significado relevante ao caso presente, aos n.º s 1 a 3 do artigo 82.º da LCT, sendo aplicável o preceituado neste diploma legal até à entrada em vigor do Código do Trabalho (1.12.2003).
Por sua vez, o Código de Trabalho de 2009, não introduziu alterações em termos desse regime, agora consagrado nos artigos 258.º a 269.º.
Por regularidade, deve entender-se que a prestação não é arbitrária, mas sim constante.
A periodicidade determina que a prestação seja paga em períodos certos no tempo ou aproximadamente certos, inserindo-se na própria ideia de periodicidade típica do contrato de trabalho.
Assim, em primeira linha, a retribuição é determinada pelo clausulado do contrato e pelos usos laborais, e eventualmente por certos critérios normativos (o salário mínimo, a igualdade retributiva, etc.). No entanto, num segundo momento, ao montante global da retribuição poderão acrescer certas prestações que preencham os requisitos de periodicidade e regularidade.
O primeiro critério sublinha a ideia de correspetividade ou contrapartida negocial: é retribuição tudo o que as partes contratarem (ou resultar dos usos ou da lei para o tipo de relação laboral em causa) como contrapartida da disponibilidade da força de trabalho. O segundo critério assenta numa presunção: considera-se que as prestações que sejam realizadas regular e periodicamente pressupõem uma vinculação prévia do empregador e suscitam uma expetativa de ganho por parte do trabalhador, ainda que tais prestações se não encontrem expressamente consignadas no contrato (vide, Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 11.ª edição, Coimbra, págs. 440-441).
Da conjugação das citadas normas resulta muito sumariamente que, a retribuição do trabalho é “o conjunto de valores (pecuniários ou não) que a entidade patronal está obrigada a pagar regular e periodicamente ao trabalhador em razão da actividade por ele desempenhada (ou, mais rigorosamente, da disponibilidade da força de trabalho por ele oferecida)”[1], integrando a mesma não só a remuneração de base como ainda outras prestações regulares e periódicas, feitas direta ou indiretamente, incluindo as remunerações por trabalho extraordinário, quando as mesmas, sendo de carácter regular e periódico, criem no trabalhador a convicção de que elas constituem um complemento do seu salário – neste sentido, Monteiro Fernandes, ob. cit., pág. 449; Bernardo Lobo Xavier in Curso de Direito do Trabalho, 2.ª ed., pág. 382.
Por seu lado, o direito a férias pagas tem consagração constitucional (artigo 59.º da CRP) e mostra-se igualmente consagrado no Código do Trabalho (artigo 255.º e actualmente 264.º) tal como aí se encontra a previsão relativa ao subsídio de Natal (artigo 254.º e no presente 263.º).
O Código do Trabalho de 2003, como se referiu, só tem aplicação depois de 1.12.2003, valendo, em relação ao período precedente, as estipulações constantes do Decreto – Lei n.º 874/76, de 28 de Dezembro[2] e do Decreto – Lei n.º 88/96, de 3 de Julho[3], sendo aplicável o CT (aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro) a partir de 17 de fevereiro de 2009.
Importa, por outro lado, atentar no direito convencionado, nomeadamente as cláusulas 162.ª e 143.ª do AE/C… de 2000/2001 (anteriores cláusulas 150ª e 151ª do AE de 1981): a primeira, no seu n.º 1, consagra a retribuição do período de férias, que em caso algum pode ser inferior ao que o trabalhador receberia se estivesse em serviço normal e acrescenta que o mesmo é credor de um subsídio de igual montante; a cláusula 143.ª, igualmente no seu n.º 1, estabelece que os trabalhadores abrangidos pelo AE têm direito a receber um subsídio correspondente à sua remuneração mensal, a ser pago com a remuneração do mês de dezembro.
Como decorre do já citado artigo 82.º da LCT, que os CT (2003 e 2009) repercutiram, a retribuição do trabalhador é a contrapartida pela prestação de trabalho efetuada pelo trabalhador e liga-se indelevelmente à regularidade e periodicidade do seu pagamento; a regularidade e periodicidade, com efeito, se vincam a legitima expetativa – do trabalhador – ao seu recebimento, igualmente contribuem para a presunção do inerente dever de pagamento.
A interpretação das normas do AE não pode ser feita em dissonância com as disposições legais que vieram prever o pagamento de férias, acrescentado do respetivo subsídio e, bem assim, o pagamento de subsídio de Natal.
A referência ao recebimento do valor não inferior ao recebido quando em serviço normal só pode ter o sentido interpretativo plausível de significar o valor “como se se estivesse num mês normal”, “como se fosse um mês normal”, “como se não estivesse em férias”.
As prestações em causa nestes autos (tal como se encontram definidas na sentença recorrida) assumem um carácter regular e periódico e, consequentemente, para o trabalhador, apresentam uma expetativa legítima quanto ao seu recebimento. Devem ser consideradas nas férias, nos subsídios de férias e nos subsídios de natal, porquanto igualmente decorrem da lei que as prevê[4].
Se até à entrada em vigor do Cód. do Trabalho de 2003 o entendimento do direito convencionado corresponde ao sentido do direito legislado (LFFF e D.L. do Subsídio de Natal), as novas definições dadas ao subsídio de férias e ao subsídio de natal poderiam questionar o direito do trabalhador e, em razão disso, importa saber se, mesmo depois de 1 de dezembro de 2003, continua o mesmo a ter direito à ponderação das prestações invocadas no pagamento das férias, subsídio de férias e subsídio de natal[5].
A resposta, porém, não pode deixar de ser positiva.
Em primeiro lugar, o seu pagamento nas férias nunca estaria em causa, atenta a redação dada ao artigo 255.º, n.º 1 do Código do Trabalho; o seu pagamento no subsídio de férias, por seu turno, igualmente não deve questionar-se, porquanto os subsídios em causa se ligam diretamente ao modo específico da execução do trabalho[6]; têm aí, aliás, a sua origem e razão de ser.
O problema interpretativo colocar-se-á em relação ao subsídio de natal, mas, mesmo no que a este respeita, o artigo 250.º é claro ao impor a sua aplicabilidade apenas na falta de “disposições legais, convencionais ou contratuais ...”.
Assim, tendo em conta as disposições do AE/C… e a interpretação que das mesmas deve ser feita, concretamente da previsão contida no n.º 1 da sua cláusula 143.º, o pagamento da média das remunerações auferidas a título de subsídios deve ser feito também no subsídio de natal.
Em suma, a natureza regular e periódica das prestações invocadas pelo A. (trabalho suplementar, trabalho noturno; comp. esp.; comp. horário incómodo; ab. CRER; sub. ref. trab. suplem.; comp. dif. h. s.; rem. adic.; sub. carga desc.; sub. turno; comp. hor. desc.; sub. condução; sub. div. correio e sub. chefia subst.) – regularidade e periodicidade que se torna evidente face aos factos provados sob a alínea G) – impõem a sua ponderação e pagamento nas férias, no subsídio de férias e no subsídio de natal, tal como consta da sentença recorrida.
Essa imposição decorre diretamente do CT aplicável, mas igualmente do AE/C… e, por força deste, continua a abranger o subsídio de Natal, mesmo depois dos Códigos do Trabalho de 2003 e 2009.
Seja como for, e ainda que assim não se entendesse, assistindo ao A. o direito a ver ponderadas na retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de natal tais prestações, face ao estatuído no art. º 11.º, n.º 1 da Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto (que aprovou o Código do Trabalho de 2003) a “nova” legislação nunca poderia implicar a redução da retribuição.[7]
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Alega a Ré recorrente que as prestações complementares não integram o conceito de retribuição e não são devidas no âmbito de férias nem no subsídio de natal, não decorrem da lei nem assim é regulamentado no AE/C…; que o trabalho noturno e o trabalho suplementar são um desenvolvimento transitório da relação laboral, o que lhes retira o eventual carácter de regularidade ou habitualidade e só são devidas na medida em que o trabalho seja efetivamente prestado; a compensação especial tem uma finalidade específica que é o pagamento da assinatura do telefone que só ocorre 12 vezes e por isso não tem justificação para integrar os subsídios de férias e de natal; o subsídio de chefia só é devido enquanto exerceu um cargo de chefia; o subsídio de refeição por trabalho suplementar visa cobrir ou minorar as despesas que o trabalhador tem de suportar por ter de tomar as suas refeições fora de casa; são valores compensatórios de despesas e não podem ser considerados como parte integrante da retribuição, a não ser que excedessem as despesas normais; cabia ao A. a prova de que tais ajudas constituem uma forma disfarçada de retribuição por o seu montante exceder o valor das despesas feitas em serviço e que o subsídio de divisão de correio, remuneração adicional, compensação de horário incómodo e descontínuo, os mesmos só são devidos em circunstâncias especiais e não fazem parte da retribuição.
Ora, face ao que ficou dito, desde já adiantamos que não assiste qualquer razão à Ré.
Na verdade, <<presumindo-se constituir retribuição qualquer prestação do empregador ao trabalhador>> (atual n.º 3, do artigo 258.º, do C.T.), ao A. não compete provar que os valores que recebe excedem as despesas normais, as despesas feitas em serviço mas, tão só, alegar e provar quais as prestações que lhe foram pagas e o seu carácter regular e periódico. Cabe à Ré ilidir esta presunção provando que as tais prestações complementares que pagou se destinavam, por exemplo, a custear despesas concretas, o que não fez.
E, salvo o devido respeito por opinião contrária, em nada altera o que ficou dito, o facto de o AE/C… prever aquelas prestações, algumas delas com finalidades específicas, como é o caso do subsídio de condução. É que esta previsão não afasta aquela presunção nem dispensa a Ré empregadora de provar que os montantes pagos se destinaram a custear apenas aquelas despesas concretas.
No que respeita à alegação da Ré recorrente no sentido de que o trabalho noturno e o trabalho suplementar são um desenvolvimento transitório da relação laboral, o que lhes retira o eventual carácter de regularidade ou habitualidade, também não lhe assiste razão, na medida em que, é precisamente da ponderação dos meses em que tal trabalho foi prestado que se retira a sua regularidade e periodicidade.
Quanto à alegação de que a compensação especial tem uma finalidade específica que é o pagamento da assinatura do telefone que só ocorre 12 vezes e por isso não tem justificação para integrar os subsídios de férias e de natal, tal finalidade nem sequer resultou provada.
Por fim, o facto de o subsídio de chefia só ser devido enquanto o A. exerceu um cargo de chefia, por si só, não retira ao mesmo a natureza de retribuição, uma vez que, serão a regularidade e periodicidade do seu pagamento a determinarem a mesma e, consequentemente, a sua ponderação nas férias e nos subsídios de férias e de natal.
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Desta forma, conforme consta da sentença recorrida:
<<No caso em apreço, o Autor pretende que sejam contabilizadas as prestações complementares que resultaram dos quadros dados como provados.
Compulsados os mesmos verifica-se que maioritariamente as características de regularidade e periodicidade estão bem evidenciadas, sendo pagas no mínimo seis vezes por ano, criando na expectativa do mesmo que poderia legitimidade contar com tais complementos salariais para fazer face aos seus gastos.
Porém tal não sucede em todos os anos relativamente a algumas delas, conforme resultou provado por acordo das partes.
Assim:
A prestação por trabalho nocturno no ano de 1995, foi apenas paga em 5 meses.
A prestação por trabalho suplementar no ano de 1996, foi apenas paga em 3 meses e a prestação por trabalho nocturno desse ano, foi apenas paga num único mês.
A prestação por complemento especial e o trabalho suplementar no ano de 1998, foi apenas paga em 3 meses e nesse mesmo ano, o trabalho nocturno, o complemento por horário incómodo, o abono de função de trabalhadores do Centro Repartidor de Encomendas Rápidas (CPER) e o subsídio de refeição por trabalho suplementar, foi apenas pago em 2 meses.
No ano de 2000, o complemento especial foi pago em 4 meses e o abono de função de trabalhadores do Centro Repartidor de Encomendas Rápidas, apenas foi pago em 3 meses.
No ano de 2004, o complemento especial foi apenas pago em 5 meses.
O complemento por horário incómodo, o Comp. Dif. H. S. e o Rem. Adic., no ano de 2007, apenas foi pago em 3 meses.
O complemento por horário incómodo e o complemento por horário descontínuo, no ano de 2008, apenas foi pago em 3 meses.
Nestes termos, tendo em consideração que o Autor tinha o direito a ver repercutida a média desses complementos remuneratórios na retribuição de férias, subsídio de férias e de Natal que lhe foram pagos no mínimo, seis meses no ano, tal totaliza entre os anos de 1995 a 2011 a quantia global de 14.043,61 euros, e como a Ré a esse título pagou-lhe atempadamente a quantia total de 4.597,36 euros, encontra-se ainda em dívida a importância global de 9.446,25 (nove mil, quatrocentos e quarenta e seis euros e vinte e cinco cêntimos)>>.
2ª questão
Finalmente, no que atine aos juros reclamados os mesmos mostram-se devidos, atenta a natureza pecuniária da obrigação e a circunstância da mesma ter vencimento certo. Não estamos perante uma obrigação ilíquida (ou só aparentemente se pode considerar ilíquida) e o pagamento do montante relativo a cada subsídio de férias, retribuição de férias ou subsídio de natal vence-se nos termos legais e convencionais em data determinada. Em conformidade, os juros de mora são devidos pela Ré desde a ocasião em que o pagamento integral dos aludidos subsídios e retribuição de férias devia ter tido lugar.
Não obstante, defendeu a Ré que, relativamente aos juros vencidos há mais de 5 anos os mesmos se encontram prescritos perante o que se estatui no art.º 310.º, alínea d) do Código Civil.
No entanto, também aqui sem razão.
Com efeito, conforme tem sido jurisprudência, ao que se julga maioritária, do S.T.J. (v.g. acórdãos de 14 de dezembro de 2006, proferido no processo 06S2448, de 21 de fevereiro de 2006, proferido no processo 05S3141 e de 6 de março de 2002, proferido no processo nº 599/01, da 4ª secção e de 30 de setembro de 2004, revista nº 1761/04, da 4ª secção), os juros de mora relativos a créditos laborais encontram-se submetidos ao regime da prescrição constante do art. 38.º, n.º1 da LCT, 381.º do C.T. de 2003 e 337.º do CT de 2009, que estabelecem um regime especial e, nessa medida, constitui um desvio ao regime geral estabelecido no art. 310.º, al. d) do CC.
Cita-se, a este propósito, o escrito no já referido acórdão do STJ de 30.09.04 «Seria perfeitamente absurdo que a A. estivesse em tempo de pedir ao R. os créditos resultantes do incumprimento parcial do contrato de trabalho que os uniu e já não pudesse pedir-lhe os juros de mora, por se considerarem prescritos.
Tal entendimento aberrante obrigaria a autora a accionar o réu para pagamento dos juros dos seus créditos laborais na vigência do contrato de trabalho, criando mal-estar e atritos com o empregador, que a lei pretendeu evitar ao conceder-lhe o prazo de 1 ano a partir do dia seguinte ao da cessação daquele para o fazer. Tal entendimento anularia o escopo prosseguido pelo legislador com aquele normativo, caso a autora não estivesse na disposição de prescindir dos juros de mora dos seus créditos».
Ponderando as razões subjacentes ao regime especial contido no art.º 38.º da LCT e 337.º do CT de 2009, e a expressão ampla usada na lei - "todos os créditos resultantes do contrato de trabalho" e “o crédito do trabalhador emergente de contrato de trabalho” não há justificação para distinguir em tal regime de prescrição especial os juros (obrigação acessória) dos créditos resultantes da obrigação principal, antes fazendo todo o sentido que partilhem de igual regime (especial).
Significa isto que, estando vigente o contrato de trabalho entre o A. e a Ré não ocorreu a invocada exceção.
E, como se refere na sentença recorrida <<Tem assim direito o Autor a receber os juros moratórios calculados à taxa supletiva legal, desde a data dos respectivos vencimentos e até integral pagamento>>.
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Improcedem, assim, todas as conclusões da recorrente, impondo-se a manutenção da sentença recorrida.
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IV – Sumário[8]
1. Até prova em contrário, presume-se constituir retribuição toda e qualquer prestação do empregador ao trabalhador, do que resulta, tendo em conta os princípios de repartição do ónus da prova, e, especificadamente, o disposto no n.º 1 do art. 344.º do Cód. Civil que, sobre o empregador impende o ónus de provar que certa prestação que o mesmo fez ao seu trabalhador não tem a natureza de retribuição.
2. Em primeira linha, a retribuição é determinada pelo clausulado do contrato e pelos usos laborais, e eventualmente por certos critérios normativos (o salário mínimo, a igualdade retributiva, etc.). No entanto, num segundo momento, ao montante global da retribuição poderão acrescer certas prestações que preencham os requisitos de periodicidade e regularidade.
3. O primeiro critério sublinha a ideia de correspetividade ou contrapartida negocial: é retribuição tudo o que as partes contratarem (ou resultar dos usos ou da lei para o tipo de relação laboral em causa) como contrapartida da disponibilidade da força de trabalho. O segundo critério assenta numa presunção: considera-se que as prestações que sejam realizadas regular e periodicamente pressupõem uma vinculação prévia do empregador e suscitam uma expetativa de ganho por parte do trabalhador, ainda que tais prestações se não encontrem expressamente consignadas no contrato.
4. As prestações que assumem um carácter regular e periódico e, consequentemente, para o trabalhador, apresentam uma expetativa legítima quanto ao seu recebimento, devem ser consideradas nas férias, nos subsídios de férias e nos subsídios de natal, porquanto igualmente decorrem da lei que as prevê.
5. Tendo em conta as disposições do AE/C… e a interpretação que das mesmas deve ser feita, concretamente da previsão contida no n.º 1 da sua cláusula 143.º, o pagamento da média das remunerações auferidas a título de subsídios deve ser feito também no subsídio de natal.
6. Assistindo ao A. o direito a ver ponderadas na retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de natal tais prestações, face ao estatuído no art. º 11.º, n.º 1 da Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto (que aprovou o Código do Trabalho de 2003) a “nova” legislação nunca poderia implicar a redução da retribuição.
7. Ponderando as razões subjacentes ao regime especial contido no art.º 38.º da LCT e 337.º do CT de 2009, e a expressão ampla usada na lei - "todos os créditos resultantes do contrato de trabalho" e “o crédito do trabalhador emergente de contrato de trabalho” não há justificação para distinguir em tal regime de prescrição especial os juros (obrigação acessória) dos créditos resultantes da obrigação principal, antes fazendo todo o sentido que partilhem de igual regime (especial).
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V - DECISÃO
Nestes termos, sem outras considerações acorda-se:
1-) em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
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Custas a cargo da Ré recorrente.
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Porto, 2013/03/11
Paula Maria Mendes Ferreira Roberto
José Carlos Dinis Machado da Silva
Maria Fernanda Pereira Soares (Vencida em parte, por considerar que o elemento regularidade deve ser aferido e considerado a partir do seu recebimento por 7 meses, no mínimo)
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[1] Cfr. Monteiro Fernandes, in Direito do Trabalho, 11ª, Ed., Almedina, 2002, pág. 439.
[2] - Nos termos do artigo 6.º do aludido Decreto – Lei, a retribuição correspondente ao período de férias não pode ser inferior á que os trabalhadores receberiam se estivessem em serviço efectivo e igualmente os trabalhadores tinham direito a um subsídio de férias de montante igual ao daquela retribuição.
[3] - Diploma que, no n.º 1 do seu artigo 2.º, determinava que os trabalhadores tinham direito a um subsídio de natal de valor igual a um mês de retribuição, a ser pago até 15 de Dezembro de cada ano.
[4] - Como referiu o Acórdão do STJ de 30 de Março de 2006 (Revista n.º 8/2006 – 4.ª Secção) a retribuição de férias e os subsídios de férias e de Natal devem incluir todas as prestações regulares e periódicas que são pagas ao trabalhador como se ele estivesse em serviço efectivo, isto é, como se ele estivesse a desempenhar o seu trabalho “no concreto condicionalismo em que o costuma desempenhar (nomeadamente, condicionalismo de tempo e de risco, sem esquecer a sua antiguidade)” e do seu cômputo apenas devem ser excluídas as prestações que são atribuídas, não para retribuir o trabalho, mas para compensar despesas, como sucede com o subsídio de alimentação ou o subsídio de transporte pessoal.
[5] - A este propósito, os Código do Trabalho de 2003 e de 2009 dizem-nos que “o trabalhador tem direito a subsídio de Natal de valor igual a um mês de retribuição, que deve ser pago até 15 de Dezembro de cada ano (254.º, n.º 1 e 263.º, n.º 1, respectivamente) e que “a retribuição do período de férias corresponde á que o trabalhador receberia se estivesse em serviço efectivo” (255.º, n.º 1 e 264.º, n.º do C.T.) e que “além da retribuição mencionada no número anterior, o trabalhador tem direito a um subsídio de férias cujo montante compreende a retribuição base e as demais prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico da execução do trabalho”.
Por outro lado, e significativamente, o artigo 250.º do Código do Trabalho de 2003 –262.º do NCT - veio estipular o seguinte: “1 – Quando as disposições legais, convencionais ou contratuais não disponham em contrário, entende-se que a base de cálculo das prestações complementares e acessórias nelas estabelecidas é constituída apenas pela retribuição base e diuturnidades. 2 – Para efeito do disposto no número anterior, entende-se por: a) retribuição base – aquela que, nos termos do contrato ou instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, corresponde ao exercício da actividade desempenhada pelo trabalhador de acordo com o período normal de trabalho que tenha sido definido; b) diuturnidade – a prestação pecuniária, de natureza retributiva e com vencimento periódico, devida ao trabalhador, nos termos do contrato ou do instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, com fundamento na antiguidade”.
Comentando este preceito, Joana Vasconcelos (Pedro Romano Martinez e outros, Código do Trabalho Anotado, 4.ª edição, Almedina, 2005, pp. 455) refere que a sua primeira novidade é precisamente a adopção de uma regra destinada ao cálculo do valor das prestações complementares ou acessórias e acrescenta: “esta solução, que envolve a irrelevância de princípio, para este efeito, das demais prestações retributivas, vai condicionar decisivamente a interpretação de disposições do Código do Trabalho que, a propósito do cálculo de certas prestações se referem, sem mais, à retribuição ou a uma sua percentagem (como sucede, designadamente, com o artigo 254.º, n.º 1, relativo ao subsídio de Natal ou o artigo 258.º, n.º 1, relativo á retribuição do trabalho nocturno)”.
[6] Artigo 255.º, n.º 2 do Código do Trabalho de 2003.
[7] Neste sentido ver Acórdãos deste tribunal de 14/06/2010, 13/09/2010, 15/11/2010 e 21/02/2011, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
[8] O sumário é da responsabilidade exclusiva do relator.