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CRIME DE COACÇÃO SEXUAL
ACTO SEXUAL DE RELEVO
Sumário
I – Acto sexual é o comportamento que objectivamente assume um conteúdo ou significado reportado ao domínio da sexualidade da vítima, podendo estar presente um intuito libidinoso do agente, conquanto a incriminação persista sem esse intuito. II - Considera-se acto sexual de relevo o comportamento pelo qual um homem adulto dá beijos na boca, mexe nos seios, mexe na vagina de uma menor de doze anos, ainda que por sobre a roupa, e lhe exibe o pénis, perguntando-lhe se gostava do que tinha visto.
Texto Integral
Processo n.º 1159/11.7JAPRT.P1
Tribunal Judicial da Comarca de Vimioso
Acordam, em conferência, na 1.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto
I - Relatório.
B… recorreu do acórdão que o condenou, como autor material de um crime de coacção sexual agravado, na forma consumada, previsto e punido pelos art.os 163.º, n.º 1 e 177.º, n.º 6, ambos do Código Penal, na pena de quatro anos de prisão, pedindo que seja anulado e ele absolvido do crime de coação sexual agravada por que foi condenado e caso assim não se entenda reduzida a pena para um ano, com a sua suspensão pelo mesmo prazo, sujeito ao regime de prova, culminando a motivação do recurso com as seguintes conclusões:
1. O recorrente foi condenado pela prática de um crime de coação sexual agravado, na foram consumada, na pena de quatro anos de prisão, p. e p. pelo art.º 163.º, n.º 1, conjugado com o art.º 177.º, n.º 6, ambos do Código Penal.
2. O recorrente não ficou convencido, de facto e de Direito, da justiça e legalidade do decidido, entendendo que do conjunto da prova produzida, interpretada à luz das regras da experiência comum, não resulta provado que, nas circunstâncias de tempo, modo e lugar descritas na Acusação, tivesse cometido o crime em que foi condenado.
3. As declarações da menor para memória futura, apresenta lacunas, deficiências e contradições, quando confrontado com os depoimentos que fez no inquérito dos autos da Policia Judiciária de folhas 91, 92 e 93, cuja leitura e análise desde já se requer.
4. Os factos imputados ao arguido e descritos nos artigos 2.º a 11.º da acusação, não foram provados, porque só o irmão do recorrente é que estava bem posicionado para os confirmar, conforme depoimentos, registados em CD áudio de 00:00.01 a 00:11:19 e que se dão aqui por reproduzidos, nada disso tendo testemunhado, a não ser mais do que avisar a sua irmã C…, que chamasse a mão da ofendida, para vir a retirar a filha do anexo da sua garagem e da companhia do recorrente/arguido, antes que houvesse algum problema de maior.
5. A testemunha D…, mãe da ofendida/menor, e conforme depoimento registado em audiência de julgamento, através de CD áudio 00:00:01 a 00:12:40, veio de imediato após ser avisada, pela testemunha C… e… viu o recorrente ainda sentado no sofá e a sua filha encostada ao sofá, sem ter visto mais nada…, registo áudio que aqui se dá por reproduzido.
6. Inexistem quaisquer manifestações de ordem física que comprovem a prática dos ilícitos por parte do arguido, cfr. melhor consta dos exames de clínica médico-legal de folhas 65 a 68 dos autos, bem como do relatório de perícia pedopsiquiátrica de fls. 146 a 148 também dos autos, que aqui se dão por reproduzidos.
7. Por isso a prova produzida em Audiência de Julgamento, através da qual o Tribunal a quo fundamentou a sua convicção sobre a realidade dos factos imputados ao arguido, não é suficiente para criar a convicção da verdade dos factos, para além de toda a dúvida razoável.
8. A 1.ª instância errou na apreciação que fez da prova, tendo descurado as contradições, incongruências, lacunas e imprecisão da menor existentes nas suas declarações para memória futura, as contradições da menor existentes entre as declarações para memória futura e o seu anterior depoimento prestado perante a Policia Judiciária, o depoimento da testemunha – E… – que estando melhor colocado para constar a veracidade dos factos, nada viu, a não ser o arguido sentado no sofá e a menor, próxima do mesmo sofá, imaginado que dali iria sair alguma asneira, ao que de imediato avisou a sua irmã C…, para que dissesse à mãe da menor, que viesse retirar a filha F… de junto do recorrente, antes que fizessem alguma asneira grave.
9. O Tribunal a quo interpretou a prova produzida, violando as regras da experiência comum, visto ter imputado ao arguido a prática de um crime de coação sexual agravada, na forma consumada, com base nas declarações de uma menor, contraditórias, cheias de lacunas e incongruentes, sem que tivesse qualquer outro meio de prova que, de forma clara e segura, as sustentasse, tendo criado a convicção sobre a realidade dos factos imputados ao arguido de uma forma puramente subjectiva ou emotiva.
10. Assim o Tribunal a quo violou o principio da culpa, da livre apreciação da prova e o art.º 127.º do Código de Processo Penal., tendo produzido uma decisão injusta e ilegal, que deve ser anulada e o recorrente absolvido o crime em que foi condenado.
Sem prescindir e colocando a hipótese de este entendimento do Recorrente não colher:
11. Por sua vez, o recorrente não praticou qualquer crime de coação sexual agravado, conforme dispõe o art.º 163.º/1 do Código Penal, já que tal ilícito pressupõe uma ofensa grave e séria à intimidade e liberdade sexual da vítima, exigindo tal tipo legal de crime que o ato sexual seja de relevo; logo para o ato sexual ser de relevo, terá que a conduta de assumir gravidade, intensidade objectiva e concretizar intuitos e desígnios sexuais visivelmente atentatórios da autodeterminação sexual, de todo o modo será perante o caso concreto de que se trate que o “relevo” tem de recortar-se.
12. Ora, no caso sub judicie, consideramos que o eventual ato praticado contra a ofendida, nunca poderá ser considerado ato sexual de relevo, logo não pode estar preenchido o tipo de crime de coação sexual, pelo qual o arguido vem acusado, visto que os factos dados como provados não integram o conceito de “acto sexual de relevo”.
13. Quanto à conduta típica que se traduz em um ato de coação, a lei distingue três meios típicos:
a) A violência, idónea a vencer a resistência efectiva ou esperada da vítima, segundo as circunstâncias do caso, nos termos conhecidos da doutrina da adequação.
B) A ameaça – devendo esta entender-se como manifestação de causar um mal ou um perigo se a pessoa ameaçada não consentir no ato sexual.
c) O agente constranger a vítima ao ato sexual, depois de, para esse fim, a ter tornado inconsciente ou posto na impossibilidade de resistir.
Nos seus depoimentos a ofendida nunca falou duma suposta ameaça. É elemento essencial da ameaça que o mal futuro anunciado dependa da vontade do agente (ameaçante). Faltando este requisito, não há ameaça, mas advertência, aviso.
14. A ameaça supõe também a coação psicológica e traduz-se na perturbação da liberdade interior de decisão e da liberdade de acção da vítima; ora a ofendida nos seus depoimentos que se encontram registados e junto aos presentes autos, como seja, as declarações para memória futura, ou os depoimentos junto do inquérito da Policia Judiciária, jamais referiu que o arguido tenha sido violento para ela ou que a tenha constrangido, antes pelo contrário, a ofendida esteve sempre serena e muito calma, não referindo por isso qualquer sentimento de constrangimento.
15. Portanto, a conduta do arguido não integra os elementos típicos objectivos e subjectivos do crime de coação sexual p. e p. pelo art.º 163.º, n.º 1 do Código Penal, pelo que impunha-se a absolvição do arguido, dada a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.
16. A moldura penal do crime de coação sexual, p. e p. pelo art.º 163.º, n.º 1 do Código Penal corresponde a pena de prisão de 1 a 8 anos. O arguido considera que a pena de quatro anos de cadeia que lhe foi aplicada, se mostra inadequada, desproporcional em função da culpa e das exigências de prevenção que se fazem sentir.
Até porque os critérios legais na determinação da pena, expressos no artigo 71.º do Código Penal, apontam para que a pena seja encontrada em função da culpa do arguido e das exigências de prevenção, devendo atender-se ainda a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, rodearam o mesmo, antes ou depois do seu cometimento, que resultem a favor ou contra o agente.
17. O arguido não é primário, mas nunca tinha sido condenado por crime desta natureza, é uma pessoa com a 3.ª Classe, não tem trabalho; vive com uma companheira, auferindo 200 € do R.S.I; tem 52 anos; ao que o Tribunal a quo devia ter levado em conta e valorado como elemento atenuante, em termos de medida concreta da pena, mas também em sede de ilicitude e de culpa.
18. Assim, o Tribunal a quo não atendeu a todas as circunstâncias, que não fazendo parte do crime, aproveitam a favor do agente, violando assim os artigos 40.º, 50.º e 71.º, todos do Código Penal.
19. Sendo de aplicar ao recorrente uma pena que não exceda um ano de prisão e que deve ser suspensa na sua execução, sujeita a regime de prova.
Ou caso assim não se considere, uma redução na medida da pena a que o recorrente foi condenado.
20. Por tudo o que supra se mencionou deverá ser revogado o douto Acórdão, ora em crise por violação dos:
• Artigos 40.º, n.º 1, 50.º, 58.º, 70.º e 71.º; 163.º, n.º 1 e 177.º, n.º 6 todos do Código Penal.
• Artigos 2.º, 127.º, 128.º, 355.º, todos do código de Processo Penal.
• Artigos 20.º,n.º 4 e 32.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa.
Ao recurso respondeu o Ministério Público, sustentando que se lhe negue provimento e se confirme o douto acórdão recorrido.
Nesta Relação, o Exm.º Sr. Procurador-Geral Adjunto foi de parecer que o recurso não merece provimento.
Efectuado o exame preliminar e colhidos os vistos, cumpre agora apreciar e decidir.
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II - Fundamentação. 1. Da decisão recorrida. 1.1. Factos julgados provados:
1. O arguido B… de 52 anos de idade, há vários anos que vive a cerca de um km da menor F…, nascida a 24/04/1999, filha de D… e de G…, residente na Rua …, n.º ., …, Vimioso.
2. No dia 30 de Junho de 2011, da parte de tarde, em hora não concretamente apurada, mas situada entre as 15:30 e as 17:00 horas, a menor regressava a casa, após ter estado a brincar com umas amigas, sobrinhas do arguido, numa rua que fica próxima da sua.
Ao passar junto do arguido, em frente à casa das referidas amigas, este chamou-a, pedindo-lhe que lhe levasse uma das bicicletas, que se encontrava no exterior, para o interior do anexo, espécie de oficina, do irmão, sito na Rua …, ., ….
3. Já no seu interior e quando a menor se preparava para abandonar o local, o arguido chamou-a novamente dizendo-lhe “vem cá que já vais”, e, de seguida, disse-lhe para se sentar num sofá que ali existia, ao que a menor acedeu.
4. De imediato o arguido sentou-se ao seu lado e começou e beijá-la na boca, apesar da menor ter tentado libertar-se.
De seguida, quando a menor quis levantar-se para se ir embora, foi impedida pelo arguido, que a segurou por um braço, forçando-a a sentar-se novamente e em acto contínuo, o arguido beijou de novo a menor, ao mesmo tempo que lhe mexia com as mãos quer nos seios, quer na vagina, por cima da roupa, e, seguidamente, desapertou a braguilha das calças e exibiu o seu pénis à menor e, enquanto apertava a braguilha, perguntava-lhe se gostava do que tinha visto.
5. Entretanto, surgiu a mãe da menor – D…, que de imediato a retirou do local, levando-a consigo, pondo assim cobro a que o arguido continuasse os seus intentos.
6. O arguido agiu da forma descrita sempre livre, deliberada e conscientemente, molestando sexualmente a menor e impedindo-a de se ir embora, segurando-a e forçando-a a sentar-se, e fê-lo com o propósito, que concretizou, de satisfazer os seus instintos sexuais e a sua lascívia, não obstante saber a idade da menor e actuar contra a vontade desta, ciente da reprovabilidade da sua conduta e do carácter sexual da mesma e, assim violando o seu direito à determinação e autodeterminação sexual e à integridade da formação e desenvolvimento da sua personalidade.
Sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei.
7. A menor, em consequência da conduta do arguido, ficou psicologicamente perturbada, sofrendo de perturbação de adaptação, de hipervigilância e de perturbações do sono.
8. O arguido vive com uma companheira.
Não desenvolve qualquer actividade profissional, regular ou esporádica, há anos, nem, de resto, a companheira, sendo que o casal subsiste com 200 € mensais de RSI.
Tem a 3.ª classe e é de humilde condição social.
9. O arguido não revelou arrependimento.
10. O arguido sofreu já as seguintes condenações:
- por crime de ofensas corporais com dolo de perigo, cometido em 8/9/1987, na pena de 14 meses de prisão, por sentença de 23/11/1988;
- por crime de homicídio voluntário simples, cometido em 14/5/1988, e englobando a pena parcelar acabada de referir, na pena única de 12 anos e 7 meses de prisão; foi colocado em liberdade condicional em 17/9/02 e definitiva em 14/1/03.
1.2. Factos julgados não provados:
Não se provaram quaisquer outros factos, com relevo para a decisão, e, designadamente, que, o arguido fosse vizinho da menor.
1.3. Fundamentação da decisão da matéria de facto:
O Tribunal formou a sua convicção com base na análise e ponderação da prova produzida e examinada em audiência, conjugada com as regras da experiência comum.
Assim, e quanto aos factos provados, baseou-se, designadamente:
Nas declarações para memória futura, a fls. 164 a 165, lidas em audiência, nos termos da lei, e em que a ofendida faz um relato pormenorizado e coerente (e, portanto, credível) dos factos, que correspondem aos que se deixaram provados.
Esta credibilidade é bem posta em evidência pelos seguintes elementos:
Pelo relatório de perícia pedopsiquiátrica, onde, para além de enunciar os efeitos sobre a menor (perturbações referidas) e de referir a existência de competências cognitivas abaixo da média, o Sr. Perito chegou às conclusões de fls. 146 e 148, concretamente, que “é parecer do perito que a examinanda é credível”, explicando porquê (apresenta vários indicadores habitualmente presentes em situações de abuso sexual, designadamente, psicopatologia relevante).
Como surge evidente, esta perícia, pelos especiais conhecimentos que pressupõe e pela sua objectividade, mereceu especial atenção e reforçou a versão da ofendida.
Pela manutenção, desde o início, da mesma versão, o que é logo visível no relato feito no próprio dia dos factos, quer à sua mãe (ver depoimento de D…) quer no serviço de urgência, como resulta do doc. de fls. 72, o que é particularmente significativo quanto à credibilidade da ofendida, pois não teve “tempo para inventar” o episódio e, diga-se, nem tal “invenção” seria compatível com a deficiência cognitiva da ofendida, afirmada em sede de perícia pedopsiquiátrica, e é mantido no exame médico-legal cujo relatório está a fls. 65 a 68 (com ênfase ainda para a compatibilidade, em abstracto – embora não concretamente demonstrável, dada a ausência de vestígios físicos e/ou biológicos, que não é surpreende, como, de resto, salienta o relatório, face à natureza dos actos em causa, que não implicam penetração – entre o relato da menor e os exames físicos).
Pelas fotos de fls. 83 a 86, referentes ao local da ocorrência dos factos, que é congruente com o relato da ofendida (sofá…).
Pelos depoimentos de:
D…, mãe da menor, na parte em que surpreendeu (explicando convincentemente – de resto, confirmado por E… – o circunstancialismo em que tal ocorreu) o arguido junto à menor, no sofá, e que explicitou o relato que logo lhe fez a filha.
E…, irmão do arguido, que pese embora tenha produzido um depoimento visivelmente parcial, de forma a proteger o irmão, não deixou de admitir que este e a menor estiveram no sofá, e que disse ao irmão para “sair de cima da menor”, o que é significativo, e que a mãe desta (confirmando o circunstancialismo) chegou e “tirou a menor dali” o que também é bem ilustrativo.
Face a estes elementos (e o depoimento de H…, companheira do arguido, nenhum relevo assumiu para o Tribunal, visto que nada sabia dos factos, depôs de forma parcial e quis fazer crer que o arguido era impotente, o que, para além de irrelevante – não houve penetração – não mereceu crédito, porque a isso nem o arguido se tinha referido), não mereceram crédito as declarações do arguido – salvo na parte em que admitiu ser sabedor da idade da menor e ter estado no local e em que se referiu a um contacto físico (beijos; mas não já quando quis fazer crer que foi a menor quem lhos deu e que não foram na boca) –, que negou a prática dos factos, e tentou retratar a menor como promíscua – era ela, afirma, quem o chamava, quem lhe dava beijos – o que mostra bem que não se arrependeu.
Quanto a este aspecto, da falta de arrependimento, deve sublinhar-se que a mãe da menor, quando surpreendeu o arguido, referiu, no seu depoimento, que a este “deu a risa” e, de resto, durante o julgamento, o Tribunal verificou que, amiúde, o arguido ia-se rindo, o que mostra bem que não interiorizou o mal do crime.
Ponderada foi ainda a certidão do registo civil de fls. 189, e bem assim o CRC.
No tocante ao facto não provado, ele resulta das declarações do arguido e do depoimento da mãe da menor.
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2. Poderes de cognição desta Relação e objecto do recurso.
2.1. A abrir diremos que o âmbito do recurso é definido pelas conclusões formuladas pelo recorrente que culminam as suas motivações e é por elas delimitado.[1] Às quais acrescem as questões que são de conhecimento oficioso desta Relação enquanto Tribunal de recurso, como no caso dos vícios ou das nulidades do acórdão a que se reporta o art.º 410.º, n.º 2, alíneas a), b) e c) e 3 do Código de Processo Penal.[2]
Sendo impugnada a matéria de facto pelo recorrente, quer amplamente,[3] quer pela via da invocação dos vícios da do acórdão, na chamada revista alargada,[4] é sabido que «impõem razões de método que se comece pelo reexame de mais largo espectro, para que se não tenha eventualmente de entrar na análise mais limitada, o que só sucederá na falência daquele reexame. No caso, dever-se-ia ter começado a análise da crítica de facto efectuada pela Relação, pela impugnação alargada da matéria de facto provada, só depois se entrando, se fosse o caso, nas restantes questões respeitantes à decisão sobre o facto.»[5]
Mas porque as conclusões são um resumo das motivações,[6] não pode conhecer-se de questões constantes daquelas que não tenham sido explanadas nestas. Daí que as questões a apreciar neste recurso sejam as seguintes:
1.ª Discordando o recorrente da valoração feita pelo tribunal recorrido das declarações e depoimentos produzidos na audiência de julgamento sem que se evidencie qualquer violação de regras da experiência, pode o tribunal de recurso alterar a decisão da matéria de facto?
2.ª Podendo, deve fazê-lo no caso sub iudicio?
3.ª Na hipótese contrária, deve considerar-se como acto sexual de relevo um homem adulto dar beijos na boca, mexer nos seis e vagina por sobre a roupa de uma menor de doze anos e exibir-lhe o pénis, perguntando-lhe se gostava do que tinha visto, apesar dela ter procurado obviar a isso?
4.ª Devendo considerar-se acto sexual de relevo, a pena não deveria exceder um ano de prisão, suspensa na sua execução, sujeita a regime de prova?
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2.2. Vejamos então as questões atrás enunciadas, começando, naturalmente, pela primeira delas.
É comummente aceite que o julgamento da causa é o que se realiza em primeira instância e que o recurso visa apenas corrigir erros de procedimento ou de julgamento que nele possam ter sido cometidos, incluindo erros de julgamento da matéria de facto. Pelo que em caso algum pode o recurso servir para obter um novo julgamento, agora em segunda instância.[7] O objecto do recurso é a decisão recorrida e não o julgamento da causa, propriamente dita.[8] E óbvias razões existem para que assim seja.
Com efeito, a produção da prova decorre perante o tribunal de primeira instância e no respeito de dois princípios fundamentais e interconectados: o da oralidade[9] e o da imediação.[10] E com isso visa-se assegurar o princípio basilar do julgamento da matéria de facto em processo penal: o da livre apreciação da prova por parte do julgador.[11]
O princípio da imediação pressupõe um contacto directo e pessoal entre o julgador e as pessoas que perante ele depõem,[12] sendo esses depoimentos que irá valorar e servirão para fundamentar a decisão da matéria de facto.[13] E é precisamente essa relação de proximidade entre o tribunal do julgamento em primeira instância e as provas que lhe confere os meios próprios e adequados para valorar a credibilidade dos depoentes e que de todo em todo o tribunal do recurso não dispõe.[14] Há na verdade que atender e valorar factores tão diversos como as razões de ciência que os depoentes invocam ou a linguagem que utilizam, verbal e / ou não verbal, a espontaneidade com que depõem e as hesitações que manifestam, o tom de voz com que o fazem, enfim, as emoções que deixam transparecer, quer de inquietude quer de serenidade, através de expressões faciais, o movimento de mãos ou de pés, repetido e descontrolado ou apenas enfático do verbalizado, o encolher de ombros, que umas vezes pode significar ignorância e outras reprovação, a forma e a intensidade do olhar, que muito pode revelar, como seja desejo de vingança, ódio, compaixão, dúvida ou certeza, as contradições que evidenciam e o contexto em que tal acontece, que as pode justificar ou tornar inaceitável.[15]
Por isso é que quando a decisão do julgador se estriba na credibilidade de uma fonte probatória assente na imediação e na oralidade, o tribunal de recurso só a pode exercer censurar se ficar demonstrado que o iter da convicção por ele trilhado ofende as regras da experiência comum.[16]
O duplo grau de jurisdição na apreciação da decisão da matéria de facto não tem, portanto, a virtualidade de abalar o princípio da livre apreciação da prova que está conferido ao julgador de primeira instância, só podendo o tribunal de recurso modificar aquela decisão quando não encontrar qualquer suporte nos meios de prova produzidos no processo.[17] A menos que, como se disse, a convicção formada pelo julgador contrarie as regras da experiência comum, da lógica e dos conhecimentos científicos.
Tanto mais assim é que a alteração do decidido em primeira instância só poderá ocorrer, de acordo com a alínea c), do n.º 3, do a art.º 412.º do Código de Processo Penal, se a reavaliação das provas produzidas impuserem diferente decisão, mas não já se tal for uma das soluções possíveis da sua reanálise segundo as regras da experiência comum.[18] Em suma, sempre que a convicção do julgador em primeira instância surja como uma convicção razoavelmente possível e explicável pelas regras da experiência comum, deve a mesma ser acolhida e respeitada pelo tribunal de recurso.[19] E não é a circunstância, consabidamente recorrente nos processos judiciais, sejam eles de natureza criminal ou outra, de terem sido apresentadas pelos declarantes ou testemunhas versões distintas acerca de determinados factos, ou até mesmo declaração ou depoimento que só em parte é inverosímil, que impõe ao julgador ter de os aceitar ou recusar in totum, antes se impondo a tarefa de os cotejar para detectar em cada um deles o que lhe merece ou não crédito e em que termos.[20] Destarte, estribando-se a decisão da matéria de facto numa convicção objectivada e compreensível para todos, deverá ser aceite e respeitada pelo tribunal superior mesmo que não seja a única mas uma entre outras possíveis, só podendo ser afastada no caso de se revelar ofensiva das regras da lógica e da experiência comum pois que só o julgador em primeira instância beneficiou da oralidade e imediação.[21]
Baixando agora ao caso concreto, o que verificamos é que o Tribunal recorrido valorou as provas constituendas de acordo com o que lhe pareceu ser a credibilidade emanada pelos declarantes e testemunhas que perante ele depuseram e assim formou a sua convicção, não se evidenciando que com isso tenha violado qualquer regra da experiência comum. É certo também que outra é a valoração desses meios de prova feita pelo recorrente e a credibilidade que lhes confere, sendo também naturalmente diferente a conclusão a que chega. Porém, como ex abundanti cautela atrás se escreveu, não é a sua mas a convicção do julgador que releva pelo que, não estando evidenciada qualquer violação de regras de experiência, é o seu julgamento se impõe, não só aos sujeitos do processo com também a esta Relação.
E em contrário disto não se diga, como o recorrente, que o depoimento da menor é contraditório com o que anteriormente prestara perante a Polícia Judiciária pois que, como bem sabe, este último não foi nem poderia ter sido valorado pelo Tribunal a quo por expressa imposição da lei.[22] Nem tão-pouco se pretenda sustentar, como o recorrente, que esse depoimento está cheio de lacunas e incongruências, pois que tal não tem sustentação na realidade.
Com efeito, um depoimento é lacunar quando apresenta omissões ou espaços vazios no devir histórico dos factos relatados e é incongruente quando não condiz, acomoda ou adapta à situação pretendida. Porém, o depoimento da menor relata de forma completa e consistente o que se passou (beijou-a na boca, etc.), onde (na loja de uma casa propriedade da mãe de umas suas amigas) e quando (no dia 30-06-2011), dá uma justificação plausível para a presença no local (fora brincar com as amigas e para lá levaram umas bicicletas estragadas que recolheram de uma sucata situada perto para que o irmão do recorrente as consertasse) e explica como as coisas aconteceram (o recorrente chamou-a, disse-lhe para se sentar num sofá que lá se encontrava, etc.). De resto, nisso façamos justiça ao recorrente, ele mesmo bem sabe que assim é pois que tão-pouco concretizou qualquer lacuna ou incongruência no depoimento da menor.
Por outro lado, se é certo que a única prova afirmativa directa dos factos é o depoimento da própria menor, pois que o recorrente negou a sua realidade e os mesmos não foram presenciados por terceiros,[23] o que de resto é situação comum nestas situações e semelhantes, também é verdade que isso não impedia a que o Tribunal resolvesse essa dissenção valorando livremente as únicas provas disponíveis.
Destarte, fica resolvida a questão da impugnação ampla da decisão da matéria de facto que nos ocupou e com isso prejudicado o conhecimento da segunda, que pressupunha que outra fosse a sua solução.
2.3. Vejamos então se deve considerar-se como acto sexual de relevo um homem adulto dar beijos na boca, mexer nos seis e vagina por sobre a roupa de uma menor de doze anos e exibir-lhe o pénis, perguntando-lhe se gostava do que tinha visto, apesar dela ter procurado obviar a isso.
O crime de coação sexual de menor é traçado na lei desta forma: «Quem, por meio de violência, ameaça grave, ou depois de, para esse fim, a ter tornado inconsciente ou posto na impossibilidade de resistir, constranger outra pessoa a sofrer ou a praticar, consigo ou com outrem, acto sexual de relevo é punido com pena de prisão de um a oito anos.»[24] No entanto, a pena é agravada de metade, nos seus limites mínimo e máximo, se a vítima for menor de 14 anos.[25]
O bem jurídico protegido pela incriminação é consensualmente considerado a liberdade ou autoconformação da vida e prática sexual de outra pessoa.[26]
O tipo objectivo da coação sexual consiste no constrangimento de uma outra pessoa a sofrer ou a praticar com o agente ou terceiro acto sexual de relevo.[27] Sendo para tal indiferente o género agente, da vítima e do terceiro.[28]
Acto sexual é o comportamento que objectivamente assume um conteúdo ou significado reportado ao domínio da sexualidade da vítima, sendo certo que poderá estar presente um intuito libidinoso do agente (e estará a maioria da vezes) mas a incriminação persiste independentemente disso.[29] Pode dizer-se, portanto, que é um acto sexual todo o que assim seja socialmente considerado. E é de relevo o acto que represente uma importante obstrução à liberdade de determinação sexual da vítima.
A violência aqui exigida é a física, sendo a violência psíquica apenas elemento de facto integrador da tipicidade do crime de constrangimento sexual previsto no n.º 2 do art.º 163.º.[30] Violência física que, no entanto, não tem que ser determinada por um padrão específico de gravidade, bastando que seja a idónea, segundo as circunstâncias do caso, a vencer a resistência efectiva ou esperada da vítima.[31]
O elemento subjectivo é aqui o dolo, em qualquer das suas formas.[32]
Posto isto, não restam dúvidas de que se deve considerar como actos sexuais de relevo um homem beijar a boca de uma mulher[33] ou tocar-lhe com os dedos nos seios[34] e na vagina,[35] ainda que sobre a roupa que trazia vestida,[36] pois que todos são objectiva e socialmente de conotação sexual. E se após lhe dar um beijo na boca, quando ela se quis levantar para se ir embora, foi por ele impedida, segurando-a por um braço e forçando-a a sentar-se novamente e em acto contínuo beijou-a de novo, não restam dúvidas de que se terá que considerar que essa forma de agir incorporou violência idónea a cercear-lhe a sua liberdade de determinação no domínio da sua sexualidade. Pelo que a única conclusão plausível a retirar dali é que esse homem cometeu um crime de coacção sexual sobre aquela mulher.
Ora, aquele homem foi o recorrente e a vítima daquele comportamento foi a F…, não uma mulher adulta mas uma menor de doze anos de idade, valendo isto por dizer que muito bem andou o Tribunal recorrido ao considerá-lo autor material do tipo de crime de que vimos falando.
2.4. Devendo considerar-se aquele acto não apenas como sexual mas também como de relevo, resta por apurar se, como pretende o recorrente, a pena em que foi condenado não deveria exceder um ano de prisão, suspensa na sua execução, sujeita a regime de prova.
No que concerne à primeira questão, o recorrente fundamenta a sua pretensão dizendo que se deve atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, rodearam o mesmo, antes ou depois do seu cometimento, que resultam a favor ou contra o agente e que, no caso sub iudicio, não sendo ele primário, nunca tinha sido condenado por crime desta natureza, é uma pessoa com a 3.ª Classe, não tem trabalho, vive com uma companheira, auferindo 200 € do R.S.I, tem 52 anos, o que o Tribunal a quo devia ter levado em conta e valorado como elementos atenuantes, em termos de medida concreta da pena, mas também em sede de ilicitude e de culpa.
Baixemos então ao caso concreto para apreciar mais de perto aquelas questões.
Antes de mais importa lembrar que o crime de coacção sexual de menor de 14 anos é punível com pena de dois a doze anos de prisão.[37] Assim sendo, fica claro que, ainda que os factos acima referidos atenuassem a culpa do recorrente, não poderia o Tribunal a quo ter calibrado a pena até um ano de prisão uma vez que o limite mínimo da pena abstracta é o dobro desse tempo de prisão. Nem, por consequência, poderá esta Relação fazê-lo.
De todo o modo, o acórdão recorrido não merecia a acusação que o recorrente lhe dirigiu, pois que ao valorar outras circunstâncias não integrantes do tipo de crime relevam para a decisão, expressamente consignou, inter alia, que «contra o arguido militam, ainda e com peso específico, … os seus antecedentes criminais (de grande gravidade)» e, ainda, que «a seu favor, com relevância apenas se divisa a fraca condição pessoal e socio-económica.» Fica assim demonstrado, à saciedade, que o Tribunal recorrido ponderou, adequadamente, diga-se em abono da verdade, aquelas circunstâncias.
Mas não terminaremos a questão da medida da pena sem deixar bem claro que os quatro anos de prisão em que o recorrente foi condenado são bem justificados, isto se considerarmos, ainda, como de resto o acórdão em dissídio assinalou, que a culpa com que agiu foi muito intensa (dolo directo), a gravidade dos factos é, dentro do grau de ilicitude pressuposta pelo tipo de coacção sexual, elevado, atenta a natureza dos actos praticados, sua pluralidade, o uso da violência física e as consequências para a menor em consequência da sua conduta (ficou psicologicamente perturbada, sofrendo de perturbação de adaptação, de hipervigilância e de perturbações do sono) e, por fim mas não menos relevante, diríamos, a ausência de arrependimento da sua parte, pois não interiorizou o mal do crime, não revelou auto-crítica ou censura para a gravidade da sua conduta, tudo isto num quadro em que, como com propriedade o Tribunal recorrido acentuou, são prementes as exigências de prevenção geral, pela fortíssima repulsa com que os crimes desta natureza são encarados pela sociedade e pela cada vez maior frequência da sua prática, o que demanda contínua atenção e firme punição. Ora, concretizando a pena de prisão em quatro anos, o Tribunal a quo situou-a mais perto do seu limite mínimo (2 anos) do que do máximo (12 anos) e muito longe até da mediana legal (7 anos).
Quanto à segunda questão (a suspensão da execução da pena de prisão), nada acrescenta o recorrente em apoio da sua tese, levando-nos a supor que se limitou a chamar à colação os factos que arrimou em benefício da sua pretensão de ver diminuída a pena de prisão em que foi condenado.
Já o acórdão recorrido considerou que nem as apontadas exigências de prevenção geral, por si só consideradas, consentem a suspensão da execução da pena de prisão, que não seria suficiente para realizar as finalidades da punição, nem, de resto, as referidas exigências de prevenção especial apontam, bem pelo contrário (impedem absolutamente), para a possibilidade de formulação de um juízo de prognose favorável, pelo que não haverá lugar á suspensão da execução da pena, por não estarem verificados os inerentes pressupostos (art.º 50.º). E bem o fez, diga-se em abono da verdade, bastando atender à ausência de arrependimento que o recorrente manifestou para assim se considerar.
Deste modo, nada mais havendo para apreciar, resta decidir em conformidade com o atrás referido.
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III - Decisão.
Termos em que se nega provimento ao recurso e, em consequência, se mantém o douto acórdão recorrido.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 5 (cinco) UC (art.os 513.º, n.º 1 do Código de Processo Penal e 8.º, n.º 9 do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III anexa ao mesmo).
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Porto, 13-03-2013.
António José Alves Duarte
José Manuel da Silva Castela Rio
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[1] Art.º 412.º, n.º 1 do Código de Processo Penal. Na linha, aliás, do que desde há muito ensinou o Prof. Alberto dos Reis, no Código de Processo Civil, Anotado, volume V, reimpressão, Coimbra, 1984, página 359: «Para serem legítimas e razoáveis, as conclusões devem emergir logicamente do arrazoado feito na alegação. As conclusões são as proposições sintéticas que emanam naturalmente do que se expôs e considerou ao longo da alegação.»
[2] Que assim é decidiu o Supremo Tribunal de Justiça, em acórdão do Plenário das Secções Criminais, de 19-10-1995, tirado no processo n.º 46.680/3.ª, publicado no Diário da República, série I-A, de 28 de Dezembro de 1995, mantendo esta jurisprudência perfeita actualidade, como se pode ver, inter alia, do acórdão do mesmo Supremo Tribunal de Justiça, de 18-06-2009, no processo n.º 159/08.9PQLSB.S1, consultado em http://www.dgsi.pt, assim sumariado: «Continua em vigor o acórdão n.º 7/95 do plenário das secções criminais do STJ de 19-09-1995 (DR I Série - A, de 28-12-1995, e BMJ 450.º/71) que, no âmbito do sistema de revista alargada, decidiu ser oficioso, pelo tribunal de recurso, o conhecimento dos vícios indicados no art. 410.º, n.º 2, do CPP, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito.» Na Doutrina e no sentido propugnado, vd. o Prof. Paulo Pinto de Albuquerque, no Comentário do Código de Processo Penal, 3.ª edição actualizada, página 1049.
[3] Art.º 412.º, n.os 3 e 4 do Código de Processo Penal.
[4] Art.º 410.º, n.º 2, alíneas a), b) e c) do Código de Processo Penal.
[5] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 05-07-2007, processo n.º no processo n.º 07P2279, relatado pelo Exm.º Cons.º Simas Santos, visto em http://www.dgsi,pt, assim sumariado, na parte que aqui releva:
1 – Quando o recorrente pretende impugnar a decisão sobre a questão de facto deve dirigir-se, à Relação que tem competência para tal, como dispõem os art.os 427.º e 428.º, n.º 1 do CPP. O recurso pode então ter a máxima amplitude, abrangendo toda a questão de facto com vista à modificação da decisão da 1.ª Instância sobre essa matéria, designadamente quando, havendo documentação da prova, esta tiver sido impugnada nos termos do art. 412.º, n.º 3 [art. 431.º, al. b)].
2 – Para além da já referida impugnação alargada da decisão de facto, pode sempre o recorrente, em todos os casos, dirigir-se à Relação e criticar a factualidade apurada, com base em qualquer dos vícios das alíneas do n.º 2 do art. 410.º, como o consente o art. 428.º n.º 2 do CPP.
3 – É essa a ordem pela qual a Relação deve conhecer da questão de facto: primeiro da impugnação alargada e, depois e se for o caso, dos vícios do n.º 2 do art. 410.º do Código de Processo Penal.
[6] Idem.
[7] Prof. Germano Marques da Silva, em Forum Justitiæ, Maio de 1999, citado no Acórdão da Relação de Guimarães, de 20-03-2006, visto em publicado em http://www.dgsi.pt, onde sustentou que «o recurso em matéria de facto não se destina a um novo julgamento, constituindo apenas um remédio para os vícios do julgamento em primeira instância.»
[8] Cfr. o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 59/2006, de 18 de Janeiro, Processo n.º 199/2005, da 2.ª Secção, consultado em http://w3b.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20060059.html, de onde respigámos o seguinte trecho: «O que a decisão recorrida disse (e quis dizer) é que o julgamento é efectuado na 1.ª Instância: esse é o verdadeiro julgamento da causa, em que imperam os princípios da imediação e da oralidade e são produzidas todas as provas e as testemunhas, o arguido e o ofendido são ouvidos em pessoa. O recurso para a Relação, mesmo em matéria de facto, não constitui um novo julgamento em que toda a prova documentada (ou todas as questões abordadas na decisão da 1.ª Instância) é reapreciada pelo Tribunal Superior que, como se não tivesse havido o julgamento em 1.ª Instância, estabeleceria os factos provados e não provados e assim indirectamente validaria ou a factualidade anteriormente assente (ou tornaria a decidir as questões suscitadas). Antes se deve entender que os recursos são remédios jurídicos que se destinam a despistar e corrigir erros in judicando ou in procedendo, que são expressamente indicados pelo recorrente, com referência expressa e específica aos meios de prova que impõem decisão diferente, quanto aos pontos de facto concretamente indicados, ou com referência à regra de direito respeitante à prova que teria sido violada, com indicação do sentido em que foi aplicada e qual o sentido com que devia ter sido aplicada. O Tribunal Superior procede então à reanálise dos meios de prova concretamente indicados (ou as questões cuja solução foi impugnada) para concluir pela verificação ou não do erro ou vício de apreciação da prova e daí pela alteração ou não da factualidade apurada (ou da solução dada a determinada questão de direito). Assim, o julgamento em 2.ª Instância não o é da causa, mas sim do recurso e tão só quanto às questões concretamente suscitadas e não quanto a todo o objecto da causa, em que estão presentes, face ao Código actual, alguns apontamentos da imediação (somente na renovação da prova, quando pedida e admitida) e da oralidade (através de alegações orais, se não forem pedidas a admitidas alegações escritas). Este o entendimento presente na afirmação do acórdão recorrido que constitui um dado adquirido no estádio actual de evolução do processo penal, entre nós, e que não enferma de nenhum pecado constitucional.»
[9] Art.º 96.º, n.º 1 do Código de Processo Penal.
[10] Art.º 340.º e seguintes do Código de Processo Penal.
[11] Art.º 127.º do Código de Processo Penal.
[12] E também, naturalmente, com as coisas, nestas incluindo os documentos.
[13] Acórdão da Relação de Coimbra, de 22-04-2009, processo n.º 2912/06.9TALRA.C1, disponível em http://www.dgsi.pt.
[14] Acórdão da Relação de Évora, de 14-03-2006, processo n.º 1050/05-1, disponível em http://www.dgsi.pt.
[15] Acórdão da Relação de Coimbra, de 18-02-2009, processo n.º 1019/05.0GCVIS.C1, visto em http://www.dgsi.pt.
[16] Art.º 127.º do Código de Processo Penal. Neste mesmo sentido vd. os Acórdãos da Relação de Évora, de 14-03-2006, processo n.º 1050/05-1 e da Relação de Coimbra, de 18-02-2009, processo n.º 1019/05.0GCVIS.C1, ambos consultáveis em http://www.dgsi.pt.
[17] Acórdão da Relação de Coimbra, de 18-02-2009, processo n.º 1019/05.0GCVIS.C1, disponível em http://www.dgsi.pt.
[18] No Acórdão da de 22-04-2009, tirado de http://www.dgsi.pt.
[19] Acórdão da Relação do Porto, de 12-05-2004, processo n.º 0410430, visto em http://www.dgsi.pt.
[20] Acórdão da Relação de Coimbra, de 18-02-2009, processo n.º 1019/05.0GCVIS.C1, visto em http://www.dgsi.pt.
[21] Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 24-02-2010, processo 138/06.0GBSTR.C1, publicado em http://www.dgsi.pt.
[22] Art.º 356.º do Código de Processo Penal.
[23] Isto porque as testemunhas E…, irmão do recorrente e D…, mãe da menor, só presenciarem, respectivamente, o que se passou antes e depois dos factos provados; por outro lado, se é verdade que o exame pericial efectuado na menor não detectou qualquer vestígio dos factos a que foi submetida, também é certo que isso é compatível com os factos provados, objectivamente inidóneos a deixarem vestígios físicos.
[24] Art.º 163.º, n.º 1 do Código Penal.
[25] Art.º 177.º, n.º 6 do Código Penal.
[26] Cfr. Profs. Figueiredo Dias, Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo I, 1999, página 444 e 445 e Paulo Pinto de Albuquerque, no Comentário do Código Penal, 2008, página 442 e Cons.º Maia Gonçalves, no Código Penal Português, Anotado e Comentado, 18.ª edição, página 621. O que se depreende, desde logo, da inserção sistemática da norma.
[27] Prof. Paulo Pinto de Albuquerque, no Comentário do Código Penal, 2008, página 442.
[28] Profs. Figueiredo Dias, Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo I, 1999, página 447 e Prof. Paulo Pinto de Albuquerque, no Comentário do Código Penal, 2008, página 442.
[29] Prof. Figueiredo Dias, Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo I, 1999, página 448. Neste sentido seguiu o acórdão da Relação de Évora, de 15-05-2012, no processo n.º 320/09.6PBSTR.E1, publicado em http://www.dgsi.pt.
[30] Sob pena de, como referem os Profs. Figueiredo Dias, Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo I, 1999, página 453 e Paulo Pinto de Albuquerque, no Comentário do Código Penal, 2008, página 443, se originar uma indiscernível confusão entre os meios de coacção e assédio sexual previstos, respectivamente, nos n.os 1 e 2 do art.º 163.º do Código Penal. Assim também os acórdãos das Relações de Guimarães, de 10-05-2010, no processo n.º 77/07.8TAPTB.G2 e de Lisboa, de 20-10-2010, no processo n.º 150/07.2JAPDL.L1-3, ambos publicados em http://www.dgsi.pt.
[31] Acórdão da Relação de Guimarães, de 16-03-2009, no processo n.º 127/01.1TACMN, publicado em http://www.dgsi.pt.
[32] Art.os 13.º e 14.º do Código Penal.
[33] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 30-01-1997, no processo n.º 96P712, publicado em http://www.dgsi.pt.
[34] Acórdãos das Relações de Guimarães, de 02-02-2009, no processo n.º 1766/08-2 e de Coimbra, de 27-06-2012, no processo n.º 286/10.2JACBR.C1, ambos publicado em http://www.dgsi.pt.
[35] Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 30-01-1997, no processo n.º 96P712 e da Relação do Porto, de 28-11-2012, no processo n.º 93/08.2JAPRT.P1, publicado em http://www.dgsi.pt.
[36] A acórdão da Relação do Porto, de 07-10-2009, no processo n.º 530/03.2TAPVZ.P1, publicado em http://www.dgsi.pt.
[37] Art.os 163.º, n.º 1 e 177.º, n.º 6 do Código Penal.