INSOLVÊNCIA
VEÍCULO AUTOMÓVEL
CLÁUSULA DE RESERVA DE PROPRIEDADE
NULIDADE DA CLÁUSULA
ACÇÃO DE DECLARAÇÃO DE NULIDADE DA CLÁUSULA DE RESERVA DE PROPRIEDADE
Sumário

Quando no processo de insolvência exista uma reserva de propriedade a favor de um credor sobre um veículo apreendido para a massa insolvente e, citado este para os efeitos do artº 119º, nº 4 do Código de Registo Predial haja declarado que o veículo lhe pertence, devem as partes ser remetidas para os meios comuns para aí se apurar ou não da invocada nulidade da reserva de propriedade.

Texto Integral


Pº nº 1181/12.6TBPFR-E.P1
Apelação
(149)



ACÓRDÃO

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto


I - RELATÓRIO

Por requerimento enviado aos autos em 03 de Outubro de 2012, pela administradora de Insolvência, foi requerida declaração de nulidade da cláusula de reserva de propriedade que incide sobre o veículo da marca BMW, modelo Série 3 Touring Diesel, com a matrícula ..-..-VD, inventariado a favor da Massa Insolvente e, consequentemente, o levantamento da aludida cláusula no registo da Conservatória do Registo Automóvel, de forma a libertar-se o bem de tal ónus e possibilitar o seu registo definitivo a favor da Massa Insolvente (cfr. fls. 92/94).
Para tanto, alegou a Administradora de Insolvência (doravante A.I.) que sobre o referido veículo encontra-se registada reserva de propriedade a favor de B….., S.A., entidade que financiou a sua aquisição por parte dos insolventes, mediante a outorga de um contrato de mútuo.
Assim, não tendo sido aquela instituição financeira a adquirir o bem mas, apenas e tão só, a financiar a aquisição do mesmo, aliás, como a própria o reconhece na própria reclamação de créditos deduzida e recebida pela A.I., não sobejam quaisquer dúvidas de que os seus proprietários eram e são os insolventes.
Neste sentido, sendo entendimento da A.I. que a reserva de propriedade só pode ser atribuída a quem é proprietário do bem em causa, já que só pode reservar para si a propriedade quem é titular da mesma, concluiu pugnando pela declaração de nulidade da cláusula de reserva de propriedade.
Mais procedeu à junção, com aquele requerimento, de cópias do contrato de mútuo celebrado entre os insolventes e a B….., S.A., a reclamação de créditos por esta deduzida e, ainda, a informação emitida pela Conservatória do Registo Automóvel.
Mais gizou diversos argumentos e fundamentos jurídicos, assentes na doutrina e jurisprudência correntes, apontando no sentido de que a aludida cláusula de reserva de propriedade deverá ser declarada nula, quando incluída em contrato de financiamento a favor do financiador que mutuou o preço de aquisição do veículo, como é o caso sub judice.

Em 13 de Novembro de 2012 (cfr. fls. 114), o Mmº Juiz a quo proferiu o despacho que se passa a transcrever:
“Antes de mais deverá a Sra. A.I. dizer se, caso o veículo faça parte da massa insolvente, pretende assegurar os demais pagamentos mensais ou o que tiver por conveniente.”

Nestes termos e dando cabal resposta ao ordenado, veio a A.I., através do requerimento enviado aos autos em 22 de Novembro de 2012 (cfr. fls. 115 e vº), esclarecer que o aludido veículo faz efectivamente parte da massa insolvente, uma vez que consta do Inventário datado de 18 de Setembro de 2012.
Mais informou da recusa de cumprimento das prestações derivadas do contrato de mútuo, tendo em conta que o credor B….., S.A. reclamou tempestivamente os seus créditos no processo de insolvência, os quais foram integralmente reconhecidos e derivam do incumprimento do referido contrato de financiamento.
E, no mais, reiterou o já vertido no requerimento antecedente, requerendo, mais uma vez, a declaração de nulidade da cláusula de reserva de propriedade que incide sobre o veículo inventariado nos autos de insolvência, bem como, o levantamento da mesma no registo da Conservatória do Registo Automóvel.

Foi dado cumprimento ao disposto no artº 119º nº 1 do Cód. de Registo Predial (cfr. fls. 117).

B….., S.A., deduziu requerimento nos autos, no qual invoca a propriedade do aludido veículo em virtude da constituição de uma reserva de propriedade em seu favor, e no seguimento da celebração de um contrato de mútuo com os insolventes em 07 de Agosto de 2007.

Nesta sequência, foi em 07 de Janeiro de 2013, proferido o despacho recorrido, no qual se determinou a retirada do veículo do inventário, por se entender não poder fazer o mesmo parte da massa insolvente (cfr. fls. 122).

Inconformada, apelou a Massa Insolvente de C….. e D….., apresentando alegações, cujas conclusões são as seguintes:
1º/ A decisão recorrida não decide a questão controvertida que foi colocada nos autos, designadamente, não se pronuncia acerca da requerida declaração de nulidade da cláusula de reserva de propriedade incidente sobre um veículo inventariado a favor da massa insolvente.
2º/ Sobre tal questão impor-se-ia, face aos argumentos esgrimidos pela A. I. e à posição assumida pelo detentor da reserva de propriedade a seu favor, B….., S.A., uma decisão que contivesse a razão jurídica que lhe serviu de fundamento, o que não acontece.
3º/ A decisão recorrida viola, assim, o estipulado no nº 1 do art. 158º do Código de Processo Civil, o qual refere que “as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas”, bem como, ainda o preceito constitucional contido no art. 205º, nº 1 da Lei Fundamental.
4º/ Tanto mais porque, tal despacho não se trata de um despacho de mero expediente e, outrossim, de um despacho decisório que faz caso julgado material.
5º/ A decisão recorrida, padece, por isso, da nulidade prevista no art. 668º, nº 1, b) por remissão do art. 666º, nº 3, ambos do Código de Processo Civil, por não conter os fundamentos de facto e direito que a justificam.
6º/ Por outro lado, a decisão recorrida não se pronuncia, em momento algum, acerca da requerida nulidade da reserva de propriedade, nos termos peticionados pela A. I., nos dois requerimentos enviados aos autos, pelo que viola o disposto na 1ª parte da al. d) do nº 1 do art. 668º do Código de Processo Civil por não se pronunciar acerca das questões que devesse apreciar.
7º/ A decisão recorrida faz uma errada aplicação do Direito ao caso sub judice, ignorando os institutos jurídicos em causa e os princípios gerais que subjazem ao disposto nos arts. 879º, a) e 408º, nº 1 do Código Civil.
8º/ Porquanto, se a transmissão da propriedade da coisa do vendedor para o comprador opera-se por efeito do contrato, a cláusula de reserva de propriedade a favor de uma instituição financeira que se limitou tão-só a financiar a aquisição de um bem de consumo, sem assumir, em momento algum, a posição de efetiva vendedora desse bem, terá de ser nula.
9º/ Neste sentido, deveria o Meritíssimo Juiz a quo, através de uma decisão devidamente fundamentada com todas as razões jurídicas que considerasse pertinentes ao caso sub judice, ter declarado a nulidade da dita cláusula de reserva de propriedade incidente sobre o veículo em causa e, consequentemente, ordenado o seu levantamento do registo na competente Conservatória do Registo Automóvel.
Nestes termos, deverá o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, ser a decisão recorrida revogada por outra que declare nula a cláusula de reserva de propriedade que incide sobre o veículo inventariado a favor da massa insolvente, da marca BMW, modelo Série 3 Touring Diesel, com a matrícula ..-..-VD e, em consequência, ordenar o levantamento da aludida cláusula no Registo da Conservatória do Registo Automóvel.

Contra-alegou o E…. SA, concluindo da seguinte forma:
1. O recorrente não tem interesse em agir, não devendo o recurso ser admitido por tal facto, pois que, não se olvidando que o que está em causa é o interesse geral dos credores, caso se verifique a procedência dos intentos daquela com a consequente declaração de nulidade daquela cláusula, sempre haverá que recorrer ao mecanismo previsto no artigo 293º do CC, convertendo a reserva de propriedade declarada nula numa hipoteca a favor do credor, fim que terá como único beneficiário o credor.
2. Da dita conversão, nenhuma vantagem advirá para os demais credores, antes desvantagens (delonga processual, o incremento das dívidas da massa insolvente e, ainda, eventual, responsabilidade civil desta para com o credor ou mesmo da senhora administradora de insolvência para com todos os credores ou apenas perante o credor - bastará pensar numa situação do risco de perecimento do bem em causa, da sua desvalorização, entre tantos outros.
3. Assim, na óptica do credor, não se vislumbra qual o interesse em agir por parte do recorrente, considerando-se, portanto que este inexiste e, como tal, não pode o recurso ser admitido.
4. A decisão recorrida, embora não de forma extensa, fundamenta a sua decisão aderindo aos fundamentos invocados pelo credor, além de que, ao decidir como decide, pronuncia-se claramente pela validade da reserva de propriedade a favor do credor, pois que, caso contrário não teria ordenado que a viatura em causa fosse eliminada do inventário e não teria a recorrente interposto o presente recurso, pelo que inexiste qualquer nulidade da mesma, pelo menos com a gravidade suficiente para a inquinar inexoravelmente.
5. No que concerne à validade da cláusula de reserva de propriedade a favor do credor, embora se reconheça que não foi concebida para o contrato de mútuo, os usos, a jurisprudência e doutrina que se entende ser a mais acertada e avisada, admitem a sua fixação, nomeadamente quando aquele contrato está intensamente conexionado com o de compra e venda, ou seja, nos chamados “contratos de crédito coligados” - veja-se a este título o Acórdão da Relação de Coimbra, processo 285/07.1TBTND.C1 e 2007/08.0TBFIG.C1, relator Emídio Costa, os Acórdãos do Supremo Tribunal Judicial de 04 de Maio de 2004 e 14 de Fevereiro de 2008, processos 05B006 e 08B074, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
6. Tal como resulta do documento junto com a respectiva reclamação de créditos apresentada pelo credor, este concedeu aos insolventes um crédito para aquisição da dita viatura, obrigando-se estes a reembolsar o mútuo àquele em prestações mensais; ou seja, a pedido dos insolventes tendo em vista a aquisição de uma viatura, o credor procedeu ao pagamento do preço ao vendedor do bem e fez registar a seu favor, uma cláusula de reserva de propriedade, garantindo, por esta via, o seu crédito, que os insolventes se obrigaram a reembolsar em prestações mensais; em termos de negócios jurídicos, foi celebrado uma compra e venda, um financiamento e uma constituição de uma garantia a favor do financiador, contratos escritos que regulam as operações em apreço, com a necessária intervenção de todas as partes (vendedor, financiador e comprador).
7. O credor, ao efectuar o pagamento do preço ao vendedor, ficou sub-rogado nos direitos daquele (artigo 589 do CC), direitos que incluem a cláusula de reserva de propriedade (artigo 582 do CC, aplicável ex vi artigo 594 do CC), sendo espelho dessa sub-rogação o simples facto de a reserva de propriedade estar registada a favor do credor e não do vendedor, operando-se a transmissibilidade da reserva de propriedade, como acessório do direito de crédito.
8. Ainda que assim não se entenda, sempre teria de se aceitar que os insolventes, cumprindo a obrigação com dinheiro financiado pelo credor, sub-rogaram este último nos direitos do anterior proprietário, mediante declaração expressa, no documento do financiamento, razão pela qual declararam no contrato de mútuo, que autorizam a entrega do empréstimo ao fornecedor e, bem assim, aceitam reserva de propriedade a favor do credor, prevista na cláusula 10ª das condições gerais do mesmo contrato.
9. Considerando-se nula a reserva de propriedade a favor do credor, sempre terá de operar a conversão daquela numa hipoteca (artigo 293º do CC), na medida em que, se verificam os seus requisitos objectivos e subjectivos.
10. Desde logo, a função da reserva de propriedade in casu é a de garantir ao credor o reembolso do seu crédito pelos insolventes.
11. Insolventes e credor, se cientes da nulidade daquela reserva, não deixariam de celebrar o mesmo mútuo, porém recorreriam à constituição de hipoteca para manter a garantia necessária para salvaguardar os interesses do credor.
12. Assim, o negócio sucedâneo - hipoteca - tem os mesmos elementos fácticos caracterizadores do comportamento negocial, assegurando o fim prático que as partes procuravam realizar com o negócio
nulo.
13. A hipoteca assegura para o credor a garantia exigida, sendo que, para os insolventes, sabendo que o credor necessitaria de uma garantia para salvaguarda do crédito e do pronto cumprimento do plano de reembolso do mesmo, era-lhes indiferente se fosse constituída a reserva de propriedade ou uma hipoteca (que provavelmente prefeririam), pelo que sempre celebrariam o contrato de compra e venda da viatura e concessão do financiamento para tal.
Nestes termos, deverá ser negado provimento ao presente recurso, confirmando-se a sentença recorrida.

Foram colhidos os vistos legais.

II – QUESTÕES A RESOLVER

Como se sabe, o âmbito objectivo do recurso é definido pelas conclusões do recorrente (artºs 684º nº 3 e 690º nº 1 do CPC), importando, assim, decidir as questões nelas colocadas – e, bem assim, as que forem de conhecimento oficioso –, exceptuadas aquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras – artº 660º nº 2 também do CPC.
Assim, em face das conclusões apresentadas, são as seguintes as questões a resolver por este Tribunal:
1. Saber se o despacho recorrido enferma das nulidades previstas no artº 668º nº 1 als. b) e d) do CPCivil.
2. Saber se a decisão recorrida fez uma errada aplicação do direito.

III – FUNDAMENTOS DE FACTO

Os factos pertinentes para a resolução do presente recurso decorrem do relatório antecedente, sendo que a decisão recorrida é do seguinte teor:
“Ponderando a posição assumida pela Administradora da Insolvência a folhas 51/52, e do B….., a folhas 58, e o que resulta do regime previsto pelo artigo 104º do CIRE, o veículo em causa não pode considerar-se como fazendo parte da massa insolvente.
Assim sendo, deverá ser retirado do inventário, o que se declara neste ato.
Aponha de imediato vistos em correição.”

IV – FUNDAMENTOS DE DIREITO

1. Saber se o despacho recorrido enferma das nulidades previstas no artº 668º nº 1 al. b) e d) do CPCivil.

Como se extrai do teor do relatório deste acórdão, por requerimento enviado aos autos em 03 de Outubro de 2012, pela Administradora de Insolvência, foi requerida declaração de nulidade da cláusula de reserva de propriedade que incide sobre o veículo da marca BMW, modelo Série 3 Touring Diesel, com a matrícula ..-..-VD, inventariado a favor da Massa Insolvente e, consequentemente, o levantamento da aludida cláusula no registo da Conservatória do Registo Automóvel, de forma a libertar-se o bem de tal ónus e possibilitar o seu registo definitivo a favor da Massa Insolvente (cfr. fls. 92/94).
Sobre esta questão e face aos argumentos esgrimidos pela AI e à posição assumida pelo detentor da reserva de propriedade a seu favor, a B….., SA, impor-se-ia – no entender da recorrente – uma decisão que contivesse os pressupostos subjacentes à decisão que tomou, o que não aconteceu, o que constitui falta de fundamentação, acarretando a nulidade da aludida decisão.
Começaremos, então, pela questão de saber se a decisão recorrida enferma da nulidade prevista na al. b) do nº 1 do artº 668º do CPCivil.
Nos termos do disposto neste preceito legal “é nula a decisão quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão”.
A falta de motivação a que se refere a citada al. b) como refere Rodrigues Bastos, [1] não é uma especificação eventualmente incompleta ou deficiente, mas a total omissão dos fundamentos de facto ou de direito, suporte da decisão. Esta nulidade só ocorre, portanto, se existe falta absoluta de motivação. Se a motivação é apenas deficiente, medíocre ou errada, a sentença fica sujeita ao risco de revogação ou alteração em via de recurso, mas nula é que nunca será. [2]
Analisando a decisão recorrida, ressalta que a mesma não enferma do invocado vício, gerador de nulidade.
Na verdade, tal decisão, em nosso entender, muito embora seja parca nas palavras, encontra-se suficientemente fundamentada, já que regista terem sido ponderadas as tomadas de posições das partes sobre a questão fulcral de declaração de nulidade da cláusula de reserva de propriedade que incide sobre o veículo inventariado a favor da massa insolvente e faz alusão a uma norma jurídica do CIRE. Nessa sequência, considerou que o veículo em causa não pode fazer parte da massa insolvente, determinando a sua retirada do inventário.
Por isso, não sendo total ou absoluta a falta de fundamentação de facto e de direito na decisão recorrida, o que de acordo com a jurisprudência largamente dominante, acarretaria a mencionada nulidade, improcede, a invocada causa de nulidade a que se refere a al. b) do nº 1 do artº 668º do CPCivil.

Vejamos agora se a mesma decisão enferma da nulidade prevista na al. d) do mesmo preceito legal.
Há nulidade por omissão de pronúncia quando, desrespeitando o comando fixado no nº 2 do artº 660º do CPCivil, o Juiz deixa de pronunciar-se sobre questões que as partes submeteram à sua apreciação.
Sustenta a recorrente que, na decisão recorrida, em momento algum, o Mmº Juiz “a quo” se pronunciou acerca da requerida nulidade da reserva de propriedade, conforme por si peticionado nos dois requerimentos enviados aos autos.
Em boa verdade, não se pronunciou nem tinha que se pronunciar.
É que, neste processo de insolvência, existindo uma reserva de propriedade a favor da credora/apelada sobre um veículo inventariado na massa insolvente e tendo sido determinada a citação daquela, nos termos e para os efeitos do artigo 119º nº 1, do Código de Registo Predial, aplicável ex vi do artigo 29º do DL nº 54/75, de 12 de Fevereiro e tendo aquela declarado que o veículo lhe pertencia, deveriam as partes ter sido remetidas para os meios comuns, conforme determina o nº 4 do citado artigo 119º do Código de Registo Predial para aí sim se apurar ou não da requerida nulidade da reserva de propriedade nos termos peticionados pela AI nos dois requerimentos destes autos. [3]
Isto quer dizer que, num processo de insolvência, o tribunal não podia nunca declarar nula a reserva de propriedade existente sobre um veículo a favor da aqui credora/apelada.
De resto, para que o registo de uma reserva de propriedade seja declarado nulo é necessária a propositura de uma acção específica para o efeito (alínea b) do nº 1 do artigo 6º do DL nº 54/75, de 12 de Fevereiro).
Por isso, não de descortina onde possa estar a alegada omissão de pronúncia, pelo que, improcede, a apontada nulidade prevista no artº 668º nº 1 al. d) do CPCivil.

2. Saber se a decisão recorrida fez uma errada aplicação do direito.

Sustenta a recorrente que a decisão recorrida fez uma errada aplicação do Direito ao caso em apreço, ignorando os institutos jurídicos em causa e os princípios gerais que subjazem ao disposto nos artºs 879º al. a) e 408º nº 1 do CCivil.
Salvo o devido respeito, não cremos que a decisão recorrida tenha feito uma errada aplicação das normas jurídicas.
De facto, até se apurar em acção própria, se se verifica ou não a nulidade da reserva de propriedade sobre o veículo apreendido na insolvência, não pode este fazer parte do acervo da massa insolvente.
Caso se queira ver declarada a nulidade da reserva de propriedade sobre o veículo apreendido na insolvência ter-se-á de intentar, como já frisámos, a respectiva acção nos meios processuais comuns, nos termos do artº 119º/4 do Código do Registo Predial.
Por isso, no processo de insolvência, não poderia nunca ser declarada a nulidade da reserva de propriedade sobre o veículo apreendido e ordenado o levantamento do registo na competente Conservatória do Registo Automóvel, para possibilitar o registo definitivo a favor da massa insolvente e a posterior venda de tal veículo, como pretende a apelante.
Deste modo, bem andou o Tribunal “a quo” ao determinar que o veículo automóvel fosse retirado do inventário da massa insolvente, podendo, no entanto, ter remetido as partes para os meios processuais comuns, o que não fez.
De qualquer forma, improcedem, in totum, as conclusões da apelação.

V – DECISÃO

Nos termos expostos, acorda-se em julgar improcedente a apelação, confirmando-se integralmente a decisão recorrida.

Custas pela apelante.

(Processado por computador e integralmente revisto pela Relatora)

Porto, 27/05/2013
Maria José Simões
Abílio Gonçalves Costa
António Augusto Carvalho
__________________________
[1] In Notas ao Código de Processo Civil, vol. III, pag 246
[2] No mesmo sentido, cfr. Ac. do STJ de 11/05/2006 (relator Oliveira Barros), consultável em www.dgsi.pt
[3] Neste sentido, cfr. Ac. do TRP de 30/01/2012 (relator Augusto de Carvalho) disponível em www.dgsi.pt