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TÍTULO EXECUTIVO
RELAÇÃO SUBJACENTE
MÚTUO NULO POR FALTA DE FORMA
INEXEQUIBILIDADE DO TÍTULO
Sumário
I - O título executivo - documento donde consta a obrigação cuja prestação coactiva se pretende - não se confunde com a causa de pedir na acção executiva - facto jurídico de onde emerge a pretensão deduzida pelo exequente. II - Sendo o título executivo condição necessária da execução, a afirmação de que é condição suficiente - no sentido de dispensar qualquer indagação prévia sobre a real subsistência do direito a que se refere - não se pode afirmar em termos absolutos. III - Quando a lei substantiva exija certo tipo de documento para a sua constituição ou prova, não se pode admitir execução fundada em documento com menor valor probatório para o efeito de cumprimento de obrigações correspondentes ao tipo de negócio em causa. IV - Consistindo o título executivo numa declaração de reconhecimento de uma obrigação resultante de um mútuo nulo por falta de forma, tal título é inexequível, não podendo o juiz, conhecendo de tal nulidade, reconhecer ao exequente o direito à restituição da quantia mutuada com fundamento no art. 289º do Código Civil.
Texto Integral
Processo nº 2390/11.0TBPRD-A.P1 –Apelação
Relator: Maria João Areias
1º Adjunto: Maria de Jesus Pereira
2º Adjunto: José Igreja Matos
Acordam no Tribunal da Relação do Porto (2ª Secção): I – RELATÓRIO
Por apenso à execução comum para pagamento de quantia certa, que contra si é movida por B… e C…, a executada D… veio deduzir oposição à execução, alegando em síntese:
a “declaração negocial” dada à execução contém uma condição suspensiva – “que os declarantes liquidarão quando lhes for exigido” –, pelo que, enquanto a mesma não estiver documentada nos autos, deverá o tribunal determinar, sem mais, o indeferimento liminar da execução;
em 20.12.2001, os exequentes instauraram acção declarativa comum contra a aqui executada com o mesmo e exacto objectivo de conseguirem o pagamento desse mesmo valor de 6 milhões de escudos, a qual correu os seus termos sob o nº 649/2001, do 4º juízo cível deste tribunal, e na qual juntaram para prova do invocado empréstimo de seis milhões de escudos uma fotocópia autenticada da “declaração negocial” que aqui se pretende executar;
face à prova aí produzida, o tribunal considerou que os ali AA. e aqui exequentes não tinham emprestado qualquer quantia à ali Ré e aqui executada, absolvendo a mesma do pedido, verificando-se a excepção de caso julgado;
de qualquer modo, no âmbito de uma longa batalha jurídica entre a o único filhos dos exequentes, ex-marido da executada, e dos exequentes, contra a executada, no processo nº 774/03.7TBPNF, a executada e o seu ex-marido chegaram a um acordo, pelo qual a ora oponente aceitou pagar ao ex-marido a quantia de 42.000,00 €, por todos os gastos que o mesmo e a sua família haviam tido nas obras do imóvel, quantia que a Ré pagou.
Conclui pelo indeferimento liminar da execução, ou, caso assim se não entenda, pela procedência da oposição, com a consequente extinção da execução, pedindo ainda a condenação dos exequentes como litigantes de má-fé.
Os exequentes contestaram, impugnando os factos constantes na oposição deduzida, alegando ainda que a dívida não é a mesma que foi peticionada no proc. 649/2001, concluindo pela improcedência da oposição.
Foi proferido saneador/sentença que, julgando procedente a excepção de inexequibilidade do título, declarou extinta a instância executiva.
Inconformados com tal decisão, os exequentes dela interpuseram recurso de apelação, concluindo a sua motivação com as seguintes conclusões:
1ª Foi dado à execução um documento particular que as partes denominaram de “declaração negocial”, junto aos autos como doc. 1, e que aqui se dá por integralmente reproduzido para os legais efeitos, tendo no mesmo, a executada D…, confessado o empréstimo da quantia de € 29.927,87, obrigando-se, esta e conforme o ali clausulado, a restituir aos ora exequentes, aquela mesma quantia.
2ª Assim é que os exequentes C… e B…, deram à execução o documento particular o qual, pese embora estar encimado com a designação de “DECLARAÇÃO NEGOCIAL”, assinado pela executada D…, consubstancia, inquestionavelmente, uma confissão de dívida de quem o assinou, a ora executada.
3ª Daquele documento, a que se alude nas conclusões 1ª e 2ª, consta o seguinte, que foi assinado por ambas as partes:
(…)
4ª Citada a executada, pese embora ter deduzido oposição, não invocou a eventual nulidade daquele contrato, por violação do art. 1143º do C. Civil.
5ª Acontece que o Tribunal “a quo”, entendendo que o documento consubstancia um “contrato de mútuo”, o qual não foi celebrado por escritura pública, não questionando a validade do contrato, nem constar do mesmo os requisitos exigidos para que o mesmo possa ser tido como título executivo – elementos nele consubstanciados – conforme o art. 46º, n.º 1, al. c), do C.P. Civil, declara-o nulo, ao abrigo do citado art. 1143º do C. Civil.
6ª Na situação “sub judice”, afigura-se-nos salvo o devido respeito estarem preenchidos os requisitos necessários para que a referida confissão de dívida, seja qualificada como título executivo a que alude a alínea c) do n.º 1, do art. 46º, do C.P.Civil, sendo que a executada reconhece naquele documento, terem-lhe, os exequentes, emprestado o montante e a existência de uma obrigação contratual para com os exequentes, aqui apelantes, obrigação essa que emerge do questionado documento (confissão de dívida), que é dizer, reconhece dever aos exequentes, o montante de € 29.927,87, titulado por aquele documento particular, por si assinado.
7ª Por isso, devendo aquela confissão de dívida ser tida como título executivo, o que se infere de todo o seu conteúdo e da vontade das partes, não deverá ser tida como “contrato de mútuo”, que o mesmo poderá ser entendido como tal, tanto mais que lendo e interpretando tal documento, o mesmo não reúne os requisitos do contrato de mútuo (art. 1143º do C. Civil).
Neste sentido, ensina o Prof. Anselmo de Castro, “in” A Acção Executiva, Singular, Comum e Especial, págs. 41 e 42, 3ª edição: “não há coincidência entre a força probatória legal e força executiva ou exequibilidade. A lei concede força executiva a títulos que não possuem força probatória legal”. E acrescenta mais adiante: “mesmo quando representativas de mútuo” – referindo-se a obrigações pecuniárias -, “formalmente nulo, será o título de considerar-se sempre exequível para a restituição da respectiva importância, só o não sendo para o cumprimento específico do contrato (v.g. para exigir os juros) ”.
8ª Na verdade, do documento particular, dado à execução, a devedora, que reconhece ter recebido dos exequentes a importância de € 29.927,87, dela se confessando devedora, obriga-se a restitui-la, logo que lhe seja exigida, o que é dizer que estando reconhecida determinada a quantia exequenda, o referido documento configura, inquestionavelmente, um título executivo, nos termos do art. 46º, n.º 1, al. c), do C.P. Civil, e é bastante para instruir e sustentar a presente acção executiva (cfr. neste sentido, Ac. STJ de 19/02/2009, Proc. 07B4427, “in” www.dgsi.pt, Ac. do STJ, de 13/07/2010, Proc. 6357/04.7MTS“in” www.dgsi.pt e Ac. da Relação de Coimbra, de 20/06/2012, Proc. 280/10.3TBVNO-A.C2, “in” www.dgsi.pt.
9ª Dúvidas não poderão restar que o documento dado à execução é um documento particular, o qual, numa análise e interpretação jurídica avisada, tal como aconteceu no douto Acórdão invocado, reunindo, em qualquer dos casos, os necessários requisitos do título executivo, a que alude o art. 46º, n.º 1, al. c), do C.P. Civil, é válido e com força vinculativa, para sustentar a presente acção executiva, que deverá prosseguir os seus termos até final.
10ª É que, pese embora o título dado à execução, se entendido como “contrato de mútuo”, seja nulo, o mesmo vale como documento particular, onde é reconhecido o crédito exequendo e onde se consignaram as razões que o originaram (empréstimo com obrigação de devolução, confessado pela executada, aqui apelada), sempre sendo título executivo à luz do disposto no art. 46º, n.º 1, al. c), do C.P.C.
11ª E mesmo que se entendesse ser o referido título, num contrato de mútuo, declarado nulo por falta de forma, constando do título, o reconhecimento da dívida exequenda e a obrigação de restituição, não emergindo o direito dos exequentes do contrato, face à sua nulidade formal, a executada sempre está obrigada a restituir o que lhe foi emprestado, na medida em que, naquele documento reconhece a dívida e a obrigação de pagá-la, cabendo aos credores o direito de exigi-la e executá-la ao abrigo do disposto nas disposições conjugadas do art. 289º, n.º 1, do C. Civil (art. 46º, n.º 1, al. c), do C.P.C.), dando à execução o questionado título, sem necessidade de propor uma acção declarativa para o efeito, segundo os ensinamentos do já citado Acórdão do STJ.
12ª Configura, assim, o questionado documento, por parte dos exequentes, um empréstimo (crédito) e por parte da executada, uma dívida por si reconhecida (débito), tal documento constitui, indiscutivelmente, um documento particular, válido como título executivo, nos termos do art. 46º, n.º 1, al. c), do C.P. Civil, sendo por consequência título bastante para alicerçar a presente acção executiva, deverá, o douto despacho saneador sentença “sub judice” ser revogado e substituído por outro e que ordene o prosseguimento dos autos executivos até final.
13ª Ao decidir, como decidiu, o douto despacho saneador sentença, ora em crise, viola o disposto no art. 46º, n.º 1, al. c), do C.P. Civil.
Conclui que, na procedência do recurso, se revogue o despacho recorrido substituindo-o por outro que ordene o prosseguimento dos autos.
A oponente apresentou contra-alegações, defendendo a manutenção do decidido. De qualquer modo, e de vir a ser julgada procedente alguma das alegações de recurso, requer a ampliação do âmbito do recurso:
1. Enquanto as condições, quais sejam, a interpelação para o pagamento do alegado “empréstimo de seis milhões de escudos” …, tal como o “…deixarem de habitar a casa” não estiverem demonstradas no próprio titulo, isto é, não emergir do próprio titulo sem necessidade de recurso a um processado de natureza declarativa tendente a demonstrar que estão verificadas as condições que tornariam devido o sinalagma dos dois declarantes, não podem os Exequentes brandir a mesma como se de um título executivo se tratasse – aplicação conjugada do disposto nos arts. 270º, 275º n.º 2 e, ou, 278º do C.C. e 46º n.º 1 al. c) “a contrario” e 816º do C.P.C..
2. Aqueles dizeres constantes da última linha do número quatro da denominada “declaração negocial” configuram uma clara cláusula suspensiva, na medida em que, somente após a verificação de um acontecimento futuro e incerto, qual seja a exigência do pagamento do aludido quantia a ambos os declarantes e, não apenas a um deles…e o “deixarem de habitar a casa”, passaria a ser, eventualmente, exigível à Executada e ao senhor seu ex-marido – filho único dos Exequentes - o pagamento daquela verba inscrita na declaração – art. 270.º e segs. do C.C.e art. 45.º e 46.º n.º 1 alínea c) “a contrario” do C.P.C. –.
3. Ora, não está inscrito e não emerge do documento dado à execução – fotocópia de uma “declaração negocial” – e os Exequentes/Apelantes também não invocam no seu requerimento executivo, e muito menos demonstram por documento idóneo, terem, em algum momento, exigido e, ou, interpelado seja à Apelada/Executada, seja ao outro aí mencionado declarante, para o pagamento daquele valor que afirmam – muito falsa e dolosamente – terem emprestado em 06/11/1996 “…. Aos declarantes”!!
5. Sendo óbvio que os Exequentes, nas ditas circunstâncias e condições, não têm qualquer título executivo, e também não têm o direito de vir reclamar o pagamento daquela quantia de seis milhões de escudos acrescida de juros, demandando e perseguindo apenas a aqui executada/Apelada.
6. O mero articulado dos exequentes não tem a virtualidade de complementar a fotocópia do chamado “titulo executivo”, conferindo-lhe força executiva.
7. Como se escreveu no acórdão da Relação deCoimbra de 15/05/2012, o titulo “há-de bastar-se por si próprio”, nãopodendo estar dependente de um processado de natureza declarativatendente a demonstrar que “ tenham cristalizado as condições quetornariam devido o sinalagma da executada”.
8. Também por este fundamento o “titulo” que se veio dar à execução carece, em relação à obrigação exequenda, de exequibilidade e a inexequibilidade do titulo constitui uma excepção dilatória que é do conhecimento oficioso do tribunal e importa a extinção da execução, nos termos dos arts. 493º nº 2, 495º, 812.º-E n.º 1, alínea a), 814º nº 1 e 817º nº 4 todos do C.P.C.
Por outro lado,
9. “A invalidade formal do negócio jurídico afecta não só a constituição do próprio dever de prestar, como a eficácia do respectivo documento como título executivo”.
10. A norma do art. 458º, nº 2 do Cod. Civil, confirma indirectamente o acerto deste entendimento ao permitir que o devedor afaste a presunção fixada no nº 1 do mesmo preceito – a presunção de que a dívida reconhecida tem uma causa – mediante a alegação da invalidade da relação fundamental por falta de forma “ad substantiam” do respectivo acto constitutivo.
Cumpridos os vistos legais, há que decidir. II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
Tendo em consideração que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações de recurso, sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso – cfr., arts. 684º, nº3 e 690º, do Código de Processo Civil (na redacção anterior ao DL 303/2007, de 24.08), as questões a decidir são as seguintes:
1. Na sequência da apelação dos exequentes: Título executivo – confissão de dívida – nulidade por falta de forma do negócio do qual emerge a obrigação reconhecida.
2. Na sequência da ampliação do recurso, formulada pela Apelada, para o caso da procedência da apelação: verificação da condição prevista na “declaração negocial”. III – APRECIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO 1. Título executivo – confissão de dívida – nulidade por falta de forma do negócio do qual resulta a confessada dívida.
Considerando o juiz a quo que o documento dado à execução – declaração de dívida –, “foi emitida no âmbito de um contrato verbal de mútuo, mútuo esse que não é válido, pois é de valor superior a 14.963 €, pelo que deveria ter sido celebrado por escritura pública (art. 1143º do CC). Sendo nulo o contrato de mútuo, subjacente à relação jurídica invocada, que emerge de um contrato formal, o documento em causa não constitui título executivo.”, julgou procedente a oposição, declarando extinta a instância executiva.
Insurgem-se os apelantes contra o decidido, defendendo, em síntese, que, reconhecendo a executada naquele documento terem-lhe os exequentes emprestado o montante de 29.927,87 €, obrigando-se a restituí-lo logo que lhe seja exigido, encontram-se preenchidos os requisitos necessários para que a referida confissão de dívida seja qualificada como título executivo a que alude a al. c) do nº1 do art. 46º do CPC. E, ainda que se entendesse ser o referido título um contrato nulo por falta de forma, a executada sempre estaria obrigada a restituir o que lhe foi emprestado, ao abrigo do disposto no art. 289º do CC, dando à execução o referido título sem necessidade de propor uma acção declarativa para o efeito, invocando a seu favor a posição assumida por Anselmo de Castro e alguma jurisprudência.
Numa análise global ao tratamento que tem vindo a ser dado a tal questão, constatamos que a posição defendida pelos Apelantes encontra apoio em grande parte da nossa jurisprudência, quer ao nível dos Tribunais da Relação quer ao nível do Supremo[1].
Tal corrente apoia-se na posição assumida por Artur Anselmo de Castro, segundo o qual, “não há coincidência entre a força probatória legal e a força executiva ou exequibilidade. A lei concede força executiva a títulos que não possuem força probatória legal (…), mesmo quando representativos de mútuo, formalmente nulo, será o título de considerar-se sempre exequível para a restituição da respectiva importância, só o não sendo para o cumprimento do contrato (v.g., para exigir os juros)[2]”.
Tal posição socorre-se ainda da jurisprudência uniformizada constante no Assento 4/95, segundo qual, “quando o tribunal conhecer oficiosamente da nulidade do negócio jurídico invocado como pressuposto da sua validade, e se na acção tiverem sido fixadas os necessários factos materiais deve a parte ser condenada na restituição do recebido, com fundamento nº nº1 do art. 289º do Código Civil”.
Reconhecendo, embora, que a conclusão contida no referido assento tenha o seu campo de aplicação mais talhado para a acção declarativa, consideram não se divisar nenhuma razão séria para que igual doutrina não seja seguida em sede executiva: “Ainda que o fundamento jurídico da pretensão exequenda não seja aquele que efectivamente opera por força da declaração de nulidade, os efeitos práticos atingidos são num e noutro caso idênticos, só assim não sucedendo, se porventura o exequente tivesse exigido o pagamento de juros remuneratórios, o que não foi o caso dos autos, tanto mais que o mútuo foi gratuito[3]”.
A partir daí, concluem que “a exequibilidade do título em que se confessa o recebimento de certo capital por força de um contrato nulo por vício de forma é a solução que melhor se conforma com o princípio da economia processual, sem contudo molestar as garantias do executado”.
Embora sejamos sensíveis às razões de economia processual que têm vindo a ser invocadas no sentido de atribuir exequibilidade a documentos particulares que reconheçam a existência de uma dívida (com ou sem indicação de causa) quando a causa debendi respeite a um negócio nulo por falta de forma, entendemos que a elas se terão de contrapor razões de segurança e de evitar o risco de execuções injustas[4].
No caso em apreço, os exequentes apresentaram como título executivo, um documento designado “declaração negocial”, assinado unicamente pela ora executada/oponente, do qual consta, entre outras declarações:
“Os Srs. C… esposa, B…, casados no regime de comunhão geral de bens, (…) efectuaram em 6 de Novembro de 1996 aos declarantes um empréstimo de seis milhões de escudos que os declarantes liquidarão quando lhes for exigido, se deixarem de habitar a casa”.
E, no requerimento executivo, os exequentes fizeram constar, a seguinte fundamentação de facto:
“considerando que a executada devia bastante dinheiro aos exequentes, e que eles tinham investido na reconstrução do prédio, na expectativa de que também iria ser a sua habitação, como veio a acontecer de 1998 até àquele ano de 2001(…).
Nesse mesmo ano de 2001, 03 de Maio, dado que as relações entre a executada, D…, proprietária do imóvel, e o seu marido, E…, começaram a deteriorar-se, a ora executada confessou-se devedora aos exequentes, mediante a Declaração Negocial de Dívida (Confissão de Dívida), datada de 03 de Maio de 2001, da quantia de 6.000.000$00 (seis milhões de escudos), o que corresponde a € 29.927,87 (vinte e nove mil novecentos e vinte e sete euros e oitenta e sete cêntimos), tudo como melhor consta daquele título executivo (…).
É pois dito e assumido pela executada, de forma expressa, a obrigação de liquidar tal quantia, aos ora exequentes, caso estes deixassem de habitar a referida casa.
Foi precisamente o que veio a acontecer, isto é, os aqui exequentes logo no ano de 2002, pelo facto de entre a executada e o filho dos exequentes, se ter deteriorado as relações conjugais, viram-se confrontados com uma acção de despejo, que contra si correu termos sob o nº 218/2012, do 1º juízo”.
Toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva – art. 45º, nº1 do CPC.
O art. 46º do CPC enumerando os vários tipos de título executivo, atribui tal qualidade, na sua al. c), aos “documentos particulares, assinados pelo devedor, que importem constituição e reconhecimento de obrigações pecuniárias, cujo montante seja determinado ou determinável por simples cálculo aritmético, ou de obrigação de entrega de coisa ou de prestação de facto”.
No caso em apreço, os exequentes basearam a execução numa declaração assinada pela executada/oponente, na qual a mesma reconhece que os ora exequentes, efectuaram em 6 Novembro de 1996 à ora executada e ao seu ex-marido um empréstimo de seis milhões de escudos que estes liquidarão quando lhes for exigido, se deixarem habitar na casa”.
Não se põe em causa que tal escrito particular preencha os requisitos exigidos pela al. c) do art.º 46.º do CPC, para que um qualquer documento particular possa servir de base à execução – a assinatura do devedor e o reconhecimento de uma obrigação pecuniária.
Como refere Lopes do Rego, quer quanto aos documentos autênticos ou autenticados (al. b)), quer quanto aos documentos particulares (al. c)), estabelece-se expressamente que a força executiva tanto é conferida aos documentos “que incorporem o acto ou negócio constitutivo do débito exequendo, como aos de carácter puramente recognitivo, que envolvam mero reconhecimento pelo devedor de uma obrigação pré-existente[5]”.
E, desde que preencha os requisitos externos de exequibilidade previstos por lei, presume-se a existência do direito que o título corporiza, só susceptível de ser afastada pela prova da inexigibilidade ou inexistência do direito, a alegar e a provar pelo executado em oposição à execução[6].
Contudo, como consta do respectivo teor, tal declaração de dívida foi emitida na sequência de um contrato verbal de mútuo – o que resulta não só da própria “declaração negocial” apresentada como título executivo, como da própria alegação efectuada pelos exequentes no requerimento executivo inicial.
À data em que teria sido celebrado o mencionado contrato, o mútuo de valor superior a 3.000.000 $00 só seria válido se fosse celebrado por escritura pública e o de valor superior a 200.000$00 se o fosse por documento assinado pelo mutuário (art. 1143º do Código Civil, na redacção do DL nº 163/95, de 13 de Julho, então em vigor).
O contrato a que respeita a obrigação reconhecida pela executada em tal documento é assim nulo por falta de forma, nos termos do art. 286º do CC.
É certo que Anselmo de Castro defende que, quanto às obrigações pecuniárias, quando representativas de um mútuo formalmente nulo, será o título sempre exequível para a restituição da respectiva importância[7].
Contudo, haverá que ter em consideração a configuração dada por aquele autor ao título executivo – não só considera o título condição necessária e suficiente, como faz coincidir a causa de pedir material com o próprio título executivo, “sendo inútil, por irrelevante, tudo quanto sobre aquela e para além do título exponha na petição[8]”.
Ora, não é esta a posição por nós adoptada relativamente a cada uma das referidas questões.
O título executivo – documento onde consta a obrigação cuja prestação coactiva se pretende – não se confunde com a causa de pedir da acção executiva – facto jurídico concreto, simples ou concreto, de onde emerge a pretensão deduzida pelo autor (art. 498º, nº4, do CPC).
Aderindo-se à conceptualização defendida por João de Castro Mendes e Antunes Varela, a causa de pedir e o título executivo são conceitos estrutural e funcionalmente distintos: o título executivo é o documento donde consta (não donde nasce) a obrigação que se pretende obter por via coactiva; a causa de pedir é o facto (as mais das vezes complexo nos seus efeitos) que serve de fonte à pretensão processual. Ou ainda, “a causa de pedir é um elemento essencial de identificação da pretensão processual, ao passo que o título executivo é um instrumento probatório especial da obrigação exequenda[9].
Tal distinção entre título e causa de pedir na acção executiva encontra-se plasmada no nosso regime processual civil, estabelecendo-se na al. e), do nº1 do art. 810º do CPC (na redacção que lhe foi dada pelo DL 226/2008, de 20.11) que o requerimento executivo deve conter, entre outros elementos, “a exposição sucinta dos factos que fundamentam o pedido, quando não constem do título executivo”.
É certo que tendo a execução por base um título executivo que deve acompanhar o requerimento executivo, a indicação da causa de pedir só tem de ter lugar quando não conste do título.
Como refere Lopes do Rego em anotação a tal norma, “a especificidade da acção executiva, assente necessariamente no título executivo, leva, em regra, a que não caiba ao exequente o ónus de “expor os factos e as razões de direito que servem de fundamento à acção”, ressurgindo tal ónus de alegação dos factos que servem de “causa petendi”, nos casos em que eles não constem integralmente do título executivo, cabendo, então ao exequente a exposição sucinta da matéria de facto que fundamenta a pretensão executiva[10]”.
Também a afirmação de Anselmo de Castro de que o título executivo é condição necessária e suficiente não pode ser aceite sem algumas considerações.
Com efeito, se é indiscutível que o título executivo é condição necessária da acção executiva – sem titulo não haverá execução – a doutrina tem vindo a considerar que a afirmação de que o título é condição suficiente – no sentido de dispensar qualquer indagação prévia sobre a real subsistência do direito a que se refere – não se pode afirmar em termos absolutos.
Constatamos, assim, que a doutrina e a jurisprudência maioritárias vão no sentido de atribuir ao juiz o poder de averiguar da desconformidade entre o título e o direito que se pretende executar, tanto no plano da realidade substancial, como no da realidade formal[11].
Na opinião de Soveral Martins[12], o juiz na sua actividade de heterocomposição não se poderá limitar a conhecer a existência do título enquanto mero documento, tendo de levar mais longe essa actividade de forma a indagar do seu próprio conteúdo instrumental: assim, se o juiz apura a verificação dos requisitos de existência do documento mas apura que nele se não verificam os requisitos formais de exigibilidade deverá julgar inexistente o título executivo (ex., sentença não assinada pelo juiz); se o juiz apura a existência do documento e dos requisitos de exigibilidade mas constata que ele não é forma válida da declaração do resultado compositivo final deverá igualmente julgar inexistente o título executivo:
“De facto, a lei exige, por vezes, que a declaração dos resultados compositivos seja formalizada através de certos documentos sob pena de invalidade formal. É o caso dos contratos de transmissão da propriedade de imóveis ou dos contratos de mútuo de valor superior a vinte mil escudos cujo consenso obrigacional deve ser declarado através de escritura pública. E, assim, se o comprador do imóvel ou o mutuante intentarem acção executiva com base em simples documento particular este não será título executivo por vício formal de declaração[13]”.
Igual opinião é partilhada por José Lebre de Freitas:
“No plano da validade formal, é obvio que quando a lei substantiva exija certo tipo de documento para a sua constituição ou prova, não se pode admitir execução fundada em documento de menor valor probatório para o efeito de cumprimento de obrigações correspondentes ao tipo de negócio em causa. Não pode, por exemplo, ser admitida execução para entrega de um andar com base em documento particular de compra e venda[14]”.
E Lebre de Freitas[15] dá ainda como exemplo de vício formal que afecta o acto jurídico a que a declaração de ciência se reporte, os casos em que é confessada a prática dum acto sujeito a forma especial ou em que é reconhecido um direito que também só por acto formal s possa constituir.
Também para Miguel Teixeira de Sousa, “a invalidade formal do negócio jurídico afecta não só a constituição do próprio dever de prestar, como a eficácia do respectivo documento como título executivo. Essa invalidade formal atinge não só a exequibilidade da pretensão, mas também a exequibilidade do título[16]”.
“Se a lei substantiva exige determinado tipo de documento para a constituição ou prova de determinado tipo de negócio jurídico, a execução só pode fundar-se em documento de força probatória igual ou superior àquele (art. 364º do CPC), para o feito de cumprimento de obrigações correspondentes a esse tipo de negócio[17]”.
Segundo Francisco Lucas Ferreira de Almeida[18], é na força probatória do escrito, atentas as formalidades a observar, que radica a eficácia do título executivo, pelo que a virtualidade para servir de fonte à execução depende da observância da forma legal pelo acto ou negócio jurídico certificado.
E, em nosso entender, não nos podemos socorrer da jurisprudência constante do assento do STJ nº4/95, de que, tendo sido proferida no âmbito da acção declarativa, sustenta que se o tribunal conhecer oficiosamente da nulidade do negócio jurídico invocado no pressuposto da sua validade, e desde que na acção tenham sido apurados os necessários factos materiais deve a parte ser condenada na restituição do recebido, com fundamento nº nº1 do art. 289º do Código Civil.
É que, se tal solução levanta algumas dúvidas na doutrina na sequência da aplicação do princípio do dispositivo aos factos e ao direito, mesmo na acção declarativa[19], em que há uma actividade do juiz com vista à declaração do direito do autor, maiores dificuldades encontramos em permitir tal reconhecimento na acção executiva, em que o título tem de valer por si próprio.
Com efeito, se através da acção declarativa se visa a declaração de direitos – pré-existentes ou a constituir pela sentença – ou a declaração de meros factos jurídicos, na acção executiva não se cuida já de declarar direitos, mas de assegurar a sua reparação coactiva, no pressuposto de que existem e de que foram violados: “A declaração ou acertamento é assim o ponto de chegada da acção declarativa e, ao invés, o ponto de partida da acção executiva[20]”.
Na acção declarativa, no âmbito da actividade declarativa aí desenvolvida tendente ao reconhecimento do direito do autor, permitir-se-á, eventualmente, ao juiz, desde que os factos provados nos autos o permitam, reconhecer o dever de restituição da quantia mutuada com um fundamento distinto do alegado pelo autor.
Contudo, na acção executiva, face à inexistência de qualquer actividade declarativa, a obrigação exequenda tem de emergir directamente do próprio título, ou, como afirma José Lebre de Freitas, “a obrigação exequenda tem de constar do título[21]”.
E se a obrigação reconhecida no título tem por fonte um negócio nulo por falta de forma, o juiz só pode limitar-se a reconhecê-lo, não cabendo qualquer indagação sobre as consequências da declaração de tal nulidade, ou seja, qualquer actividade com vista à averiguação sobre se uma vez declarado nulo tal negócio, sempre se imporia a restituição da quantia peticionada pelo exequente.
A pretensão executiva aqui exercida pelos exequentes consiste no cumprimento da obrigação de liquidação da quantia mutuada por força da celebração de um contrato de mútuo, nas condições então definidas (quando lhes for exigido e logo que os exequentes deixassem de habitar a casa), e não na restituição derivada da nulidade do negócio, a operar com fundamento no art. 289º, do Código Civil.
A verdadeira causa da obrigação executada é aquele mútuo que, sendo nulo por falta de forma não produzirá quaisquer efeitos, não sendo permitido ao juiz a “convolação” da causa de pedir da acção executiva.
Como afirma António Abrantes Geraldes, defendendo que a exequibilidade prevista na citada al. c), do art. 46º está reservada às obrigações de entrega de bens imóveis validamente constituídas[22], “é característico do título executivo que dele transpareça, sem incertezas, o direito que se pretende exercitar. A acção executiva não constituiu o meio idóneo para definir direitos litigiosos, servindo apenas para veicular o cumprimento coercivo de obrigações suja constituição ou reconhecimento beneficiem do grau de certeza de segurança necessário[23]”.
Concluímos, assim, em conformidade com o decidido no Acórdão do STJ de 10-07-2008, relatado por Nuno Cameira[24], que, não garantindo o título a validade do negócio jurídico que lhe subjaz e sendo a nulidade de conhecimento oficioso, “a invalidade formal do negócio atinge a exequibilidade da pretensão incorporada no título e a do próprio título executivo”.
Como tal, confirma-se o juízo de inexequibilidade do título face à pretensão exequenda, improcedendo a apelação. IV – DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar a Apelação improcedente, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas a suportar pelos Apelantes.
Porto, 28 de Maio de 2013
Maria João Fontinha Areias Cardoso
Maria de Jesus Pereira
José Manuel Igreja Martins Matos
______________
[1] Cfr., entre outros, Acórdãos do STJ de 19.02.2009, relatado por Pires da Rosa, e de 13.07.2010, relatado por João Camilo, Acórdãos do TRL de 13.10.2011, relatado por José Mouro, e de 08.05.2012, relatado por António Santos, Acórdãos do TRC de 20.06.2012, relatado por Carlos Querido, e de 24.04.2012, relatado por Moreira do Carmo, e Acórdãos do TRP de 22.04.2013, relatado por Carlos Gil, e de 04.11.2011, relatado por Ramos Lopes, todos disponíveis in http://www.dgsi.pt.
[2] “A Acção Executiva Singular, Comum e Especial”, 3ª ed., Coimbra Editora 1977, págs. 41 e 42.
[3] Acórdão do TRP de 22-04-2013, relatado por Carlos Querido, disponível in http://www.dgsi.pt.
[4] Note-se que o legislador, consciente de tal risco, potenciado pelo aumento do número de hipóteses em que a execução se inicia pela penhora de bens do executado, na Proposta de Lei para revisão do CPC, datada de 22.11.2012, optou por retirar exequibilidade aos documentos particulares, qualquer que seja a obrigação que titulem (ressalvados os títulos de crédito) – cfr., Exposição de Motivos que precede tal proposta.
[5] “Comentários ao Código de Processo Civil”, Vol. I, 2ª ed. – 2004, Almedina, pág. 82.
[6] Como afirma José Lebre de Freitas, encontramo-nos perante a figura da presunção de direito: “para além da eficácia própria do documento que o consubstancia, o título executivo constitui base da presunção da existência (e titularidade) da obrigação exequenda e não apenas da existência do facto que a constituiu” – cfr., “A Acção Executiva depois da Reforma da Reforma”, 5ª ed., pag. 74, nota 89.
[7] E, em consonância com a sua tese de que a exequibilidade e validade formal do título podem não coincidir, acaba por considerar que, quando o título executivo se não revista de força probatória legal, não é ao executado que compete a prova negativa dos factos constitutivos do direito, mas sim ao exequente a prova da sua existência – “A Acção Executiva Singular, Comum e Especial”, 3ª ed., Coimbra Editora 1977, pág. 49.
[8] “A Acção Executiva Singular, Comum e Especial”, págs. 15 e 90.
[9] Antunes Varela, anotação ao Acórdão do STJ de 24.11.83, in RLJ Ano 121, págs. 147 e 148, e, em igual sentido, João de Castro Mendes, “A Causa de Pedir na Acção Executiva”, 1965.
[10] “Comentários ao Código de Processo Civil”, Vol. II, 2ª ed. 2004, Almedina, pág. 25.
[11] Cfr., entre outros, J.P. Remédio Marques, “Curso de Processo Executivo Comum à Face do Código Revisto”, Almedina, 2000, págs. 49 e 50.
[12] “Processo e Direito Processual Executivo”, Centelha 1984-1985, págs. 168 e ss.
[13] Autor e obra citados, pág. 169 e 170.
[14] “A Acção Executiva depois da reforma da reforma”, 5ª ed., Coimbra Editora 2009, pág. 72.
[15] Obra citada, pág. 72, nota 84.
[16] “A Acção Executiva Singular”, LEX Lisboa 1998, pág. 70, e em igual sentido, “A Reforma da Acção Executiva”, LEX Lisboa 2004, pág. 70, na qual afirma, a propósito do alargamento do âmbito dos títulos executivos introduzido na al. c), do art. 46º, às obrigações de entrega de coisa imóvel, pelo Dec. Lei nº 38/2003, de 08/03: “É claro que se exige que o acto negocial seja válido quanto à forma pela qual foi celebrado, porque a exequibilidade de um documento pressupõe que ele respeita as exigências de forma”.
[17] J. M. Gonçalves Sampaio, “A Acção Executiva e a Problemática das Execuções Injustas”, 2ª ed., Almedina 2008, pág. 74; em igual sentido, se pronuncia ainda Fernando Amâncio Ferreira, “Curso de Processo de Execução”, 11ª ed., Almedina 2009, pág. 161.
[18] “Direito Processual Civil”, Vol. I, Almedina 2010, págs. 122 e 123.
[19] Reconhecendo que aquilo que o Supremo quis, uma vez mais, foi evitar a instauração de uma segunda acção em que as partes viessem, na sequência da primeira, pedir a restituição do que houvessem reciprocamente prestado, Paula Costa e Silva censura a posição tomada pelo Supremo no citado Assento nº 4/95, argumentando que o tribunal não se limita a redenominar a pretensão deduzida, mas, fazendo mais do que isso, altera o efeito que a parte imputa aos factos que fundamentavam a acção. Segundo tal autora, embora livre na qualificação do direito, encontrando-se o tribunal vinculado ao pedido do autor, se o tribunal não pode decretar o efeito pedido que não tenha suporte legal, também não poderá decretar o efeito legalmente previsto, que não tenha expressão no pedido formulado pela parte – cfr., págs. 565 e ss., em especial, pág. 567, pág. 572 nota (1204), e pág. 577 nota (1217).
[20] José Lebre de Freitas, “Concentração da Defesa e Constituição de caso julgado em embargos de executado”, in Estudos Sobre Direito Civil e Processo Civil, Coimbra Editora 2002, págs. 452 e 453.
[21] “A Acção Executiva, depois da Reforma da Reforma”, 5ª ed., Coimbra Editora 2009, pág. 74.
[22] Em igual sentido, Carlos Lopes do Rego, Comentários ao Código de Processo Civil, Vol. I, 2ª ed. 2004, Almedina, pág. 83.
[23] “Títulos Executivos”, in Revista THEMIS, Ano IV, nº7-2003, “A Reforma da Acção Executiva”, págs. 45 e 46.
[24] Acórdão disponível in http://www.dgsi.pt.
______________ V – Sumário elaborado nos termos do art. 713º, nº7, do CPC.
1. O título executivo – documento donde consta a obrigação cuja prestação coactiva se pretende – não se confunde com a causa de pedir na acção executiva – facto jurídico de onde emerge a pretensão deduzida pelo exequente.
2. Sendo o título executivo condição necessária da execução, a afirmação de que é condição suficiente – no sentido de dispensar qualquer indagação prévia sobre a real subsistência do direito a que se refere – não se pode afirmar em termos absolutos.
3. Quando a lei substantiva exija certo tipo de documento para a sua constituição ou prova, não se pode admitir execução fundada em documento com menor valor probatório para o efeito de cumprimento de obrigações correspondentes ao tipo de negócio em causa.
4. Consistindo o título executivo numa declaração de reconhecimento de uma obrigação resultante de um mútuo nulo por falta de forma, tal título é inexequível, não podendo o juiz, conhecendo de tal nulidade, reconhecer ao exequente o direito à restituição da quantia mutuada com fundamento no art. 289º do Código Civil.