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REENVIO PREJUDICIAL
CONTRATO DE TRABALHO A TERMO
CONTRATO DE TRABALHO POR TEMPO INDETERMINADO
ESTADO
Sumário
I - É conforme ao direito comunitário, nomeadamente aos objetivos da Diretiva 1999/70/CE, do Conselho, de 1999-06-28, uma legislação nacional que proíbe, de modo absoluto, que um contrato de trabalho a termo, celebrado com o Estado, seja convertido em contrato de trabalho por tempo indeterminado, apesar de não se terem indicado nem provado quaisquer razões objetivas para a sua celebração ou apesar de se terem celebrado contratos a termo sucessivos e abusivos, mas determina imperativamente a sua conversão se o empregador, pertencendo ao setor privado, agir de igual modo? II - Sendo a resposta negativa, deverá o juiz nacional acatar tal interpretação do TJCE, mesmo que ela colida com o princípio da igualdade no acesso à função pública, mediante prévio concurso, previsto no Art.° 47.°, n.° 2 da CRP? III - E deverá o juiz nacional acatar tal interpretação do TJCE mesmo que ela colida com a interpretação que desse Art.° 47.°, n.° 2 da CRP, é feita, com força obrigatória geral, pelo Tribunal Constitucional Português ao considerar inconstitucional, por violação desse preceito, norma que admita a conversão do contrato de trabalho a termo, celebrado com o Estado, em contrato de trabalho por tempo indeterminado, nas circunstâncias perguntadas em 1)? IV - Ou, sendo a resposta negativa, deverá o juiz nacional acatar tal interpretação do TJCE mesmo que ela colida com o princípio da igualdade no acesso à função pública, mediante prévio concurso, mas esteja de acordo com o princípio da segurança no emprego, previstos nos Art.°s, respetivamente, 47°, n.° 2 e 53.° da CRP?
Texto Integral
Reg. N.º 976
Proc. N.º 1834/08.3TTPRT.P3
Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
B… instaurou em 2008-12-03 ação emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, contra C… pedindo que se:
- Decrete a conversão do contrato de trabalho entre A. e R. em contrato sem termo;
- Condene a R. a proceder à reintegração do A. no posto de trabalho;
- Decrete a ilicitude do despedimento, quer por o contrato se dever considerar celebrado por tempo indeterminado, quer por, até à cessação do mesmo contrato, não ter sido tempestivamente posta à disposição do A. a compensação e os demais créditos devidos pela declarada caducidade do mesmo contrato;
- Condene a R. a pagar ao A. a quantia de € 1.566,81, bem como as diferenças entre a retribuição devida e o subsídio de desemprego recebido até decisão final deste processo - sic.
Alegou o A. que após um estágio profissional que decorreu de 2001-04-02 a 2002-03-31, celebrou com a R., em abril de 2002, um contrato de prestação de serviços que vigorou até setembro de 2003, tendo sido admitido ao serviço da R. em outubro de 2003, mediante contrato a termo pelo prazo de um ano, que se renovou por igual período, até setembro de 2005; em outubro e novembro de 2005 prestou a mesma atividade à R., mas agora mediante a celebração de alegado contrato de prestação de serviços; por último, celebrou em 2005-12-01 novo contrato de trabalho a termo, por um ano, renovado por uma vez e que a R., em 2007-12-01, fez cessar, por via da sua alegada caducidade, conforme carta recebida pelo A. em 2007-10-09. Mais alegou o A. que, por virtude da caducidade invocada, teria direito a receber a quantia global de € 3.874,81 dos quais, € 2.904,19 a título de compensação, a que se reporta o Art.º 388.º, n.º 2, do Cód. do Trabalho de 2003 [CT2003] e €970,65, correspondentes a 11 duodécimos de férias, e respetivo subsídio, proporcionais ao tempo de trabalho prestado, quantia essa que, nos termos dos Art.ºs 401.º, n.º 1, 431.º, n.º 1, al. c) e 433.º, al. c) do mesmo diploma, deveria ter sido posta à sua disposição até à extinção do contrato (2007-11-30), o que não sucedeu, uma vez que a R. apenas lhe pagou € 1.184,03 em 2007-11-23 e € 2.457,63, em 2008-01-23, encontrando-se ainda em dívida € 1.417,18, pelo que conclui que é ilícita a cessação do contrato, “devendo a Ré ser condenada a pagar ao A. a diferença entre a retribuição que o A. recebia em 30 de Novembro de 2007 – 640,63 euros – e o valor do subsídio de desemprego que o A. se encontra a receber – 491 euros, nos termos do art. 437º, 3, do Código do Trabalho.”. Por último, o A. alegou que trabalhou continuadamente e sem interrupções para a R., sob as ordens, direção e fiscalização desta, em instalações a ela pertencentes, em funções correspondentes a necessidades permanentes da mesma, sendo por ela remunerado e objeto de progressão profissional de acordo com o trabalho anteriormente desempenhado, com um valor mensal uniforme e certo, desde 1 de abril de 2002 até 30 de novembro de 2007 – isto é, durante 5 anos e 7 meses ou 6 anos e 7 meses se se considerar o ano de estágio profissional de 2001-04-01 a 2002-03-31, o que determina a conversão da relação havida entre as partes em contrato sem termo, na medida em que foi ultrapassada a duração máxima permitida e invocando o disposto nos Art.ºs. 141.º e 139.º do CT2003.
Indeferida in limine a petição inicial com fundamento na falta de personalidade judiciária da R., decisão esta de que foi interposto recurso pelo A., foi este julgado procedente por acórdão desta Relação de 2009-06-08 (cfr. fls. 304 ss.), o qual revogou a referida decisão e ordenou “… a sua substituição por outra que assegure a normal tramitação da ação.”.
A R. contestou, por impugnação e, por exceção, alegou a “caducidade do direito invocado pelo A.”, a prescrição dos créditos laborais, a ineptidão da petição inicial e a incompetência material do tribunal do trabalho. E, relativamente à ineptidão da petição inicial, alega que o A. ao peticionar o pagamento de créditos salariais em falta resultantes da compensação pela caducidade do contrato de trabalho a termo e ao, simultaneamente, pedir a conversão do contrato de trabalho a termo em contrato sem termo, a declaração de ilicitude da cessação desse contrato e a sua reintegração na empresa, deduz dois pedidos incompatíveis entre si, o que determina a referida ineptidão.
O A. respondeu alegando, no que se reporta à ineptidão da petição inicial, que o pedido de declaração da ilicitude da cessação do contrato por não ter sido posta à sua disposição a compensação devida, quer no tempo próprio, quer no montante devido, não apresenta contradição com os pedidos formulados; o pedido de condenação da R. no pagamento da quantia de € 1.566,81 tem natureza subsidiária e o facto de, formalmente, não ter sido apresentado em via subsidiária, decorre do direito que, segundo diz, lhe assiste de poder vir a exercer a opção entre a compensação e a reintegração até à sentença do tribunal, nos termos dos Art.ºs 438.º, n.º 1 e 439.º do CT/2003; no entanto, alega ainda, para a hipótese de vir a ser considerado pelo Tribunal haver contradição entre os pedidos principais e o pedido de pagamento “das diferenças da compensação financeira”, configura este último pedido como um pedido subsidiário, alterando nessa medida o pedido, nos termos do Art.º 273.º, n.º 2, do Cód. Proc. Civil.
A R. opôs-se à alteração do pedido efetuada na resposta à contestação, alegando que o Art.º 273.º, n.º 2, do CPC não é subsidiariamente aplicável ao processo laboral e que o A. requereu essa alteração na resposta às exceções, sendo certo que a faculdade permitida pelo citado preceito apenas pode ser usada na réplica.
Pelo despacho de fls. 482 a 486, o Tribunal a quo decidiu “não admitir a alteração do pedido pretendida pelo autor na resposta à contestação”; julgar o tribunal competente em razão da nacionalidade, hierarquia e matéria, julgando improcedente a exceção de incompetência material deduzida pela Ré; e, finalmente, julgou verificada a nulidade de todo o processo por ineptidão da petição inicial e, em consequência, absolveu a Ré da instância.
Pelo requerimento de fls. 489/490, o A. veio:
- requerer a “redução do pedido, nos termos da 2ª parte do nº 2 do artº 273º do Código do Processo Civil, no que se refere ao pedido de pagamento de 1.417,18 euros – relativo às diferenças da compensação devida por cessação do contrato a termo, por caducidade, compreendido no último pedido constante da Petição Inicial, pedido esse que o saneador considerou incompatível com o pedido de conversão do contrato sem termo, com declaração de ilicitude do despedimento e reintegração do A. no posto de trabalho – e a consequente reformulação do despacho saneador, tendo em conta a nova realidade jurídicoprocessual, no sentido de ordenar a continuação do processo, para decisão de fundo.”;
- Para o caso de assim não ser entendido, mantendo-se o saneador nos mesmos termos, interpor recurso “do referido despacho na parte em que, considerando verificar-se a exceção dilatória da ineptidão da petição inicial, pôs termo ao processo, absolvendo o R. da instância”, tendo formulado conclusões.
A Recorrida contra-alegou tendo, de igual modo, formulado conclusões.
A fls. 512, o Tribunal a quo proferiu decisão a indeferir a redução do pedido requerida pelo A. a fls. 489.
Inconformado, veio o A., a fls. 514 ss., recorrer do referido despacho, formulando, a final conclusões.
A R. contra-alegou, pugnando pelo não provimento do recurso.
Por acórdão desta Relação de 2011-05-02, foi decidido o seguinte:
“A. Quanto ao primeiro recurso de agravo, julgá-lo procedente, revogando-se, em consequência, a decisão recorrida que deverá ser substituída por outra que julgue admissível a formulação subsidiária do pedido de condenação da Ré no pagamento da quantia de € 1.417,18 e que julgue não verificada a ineptidão da petição inicial com o aludido fundamento, prosseguindo os autos a sua normal tramitação. B.Quanto ao segundo recurso de agravo, julgá-lo parcialmente procedente e, em consequência, revogar a decisão recorrida, determinando-se à 1ª instância que aprecie e decida dos demais pressupostos de validade da desistência do pedido formulada a fls. 489 , homologando-a ou não, conforme for o caso, e ficando, no mais (revogação, em consequência da referida desistência do pedido subsidiário, do despacho saneador que absolveu a ré da instância por ineptidão da petição inicial), prejudicado o conhecimento do objeto do recurso.”.
Seguidamente, proferiu o Tribunal a quo a seguinte decisão:
“Considerando o decidido no douto acórdão de fls. 573 e ss.:
Nesta ação emergente de contrato de trabalho, que corre termos sob a forma de processo comum, que B… … intentou contra C… … homologo a desistência do pedido formalizada a fls. 489/490, pois que tal desistência é válida tanto pelo seu objeto como pela qualidade do interveniente e, consequentemente, extingue-se o direito que o autor pretendia fazer valer …
Registe e notifique, cumprindo-se relativamente ao autor o disposto no art. 301.º/3 do CPC.
Oportunamente, volte a concluir.”.
Inconformado com o assim decidido, o A. interpôs o presente recurso, alegadamente de apelação, invocando a nulidade da decisão e tendo formulado a final as seguintes conclusões:
I - A decisão judicial tomada em primeira instância, homologando a desistência parcial do pedido, na modalidade de redução do pedido, prolatada antes da elaboração do novo saneador, determinado pela Relação e continuando o processo para decisão de fundo quanto aos demais pedidos não constitui uma sentença, mas um simples despacho.
II - Sendo tal despacho classificado como sentença na respetiva notificação à parte, tal constitui ambiguidade, que deverá ser objeto de esclarecimento quanto à efetiva natureza desse despacho, nos termos do artº 669º, 1., a) do Código do Processo Civil.
III - Tal esclarecimento deverá ser formulado pelo Senhor Juiz da 1ª instância, nos termos do artº 670º do mesmo Código.
IV - Na verdade, a 1ª instância determinou a homologação de um requerimento de redução do pedido e a absolvição do pedido na parte correspondente a tal redução, quando a primeira determinação da Relação era no sentido de essa parte do pedido ser convertido em pedido subsidiário ...
V - ... Devendo tal conversão ser efetuada em novo despacho saneador, elaborado pelo Tribunal de 1.ª instância, na sequência da revogação do anterior despacho saneador, pela Relação, em recurso interposto perante este Tribunal superior, pelo ora Recorrente - permitindo decisão de fundo quanto a esse pedido subsidiário, em caso de improcedência do pedido principal.
VI - O que ainda não sucedeu!
VII - A revogação do saneador, como ocorreu no caso dos autos, acompanhada do comando para elaborar um novo despacho saneador, repercute-se nos atos processuais subsequentes a esse saneador revogado, que com tal despacho tivessem relação ou conexão: o vício invalidante contamina os atos que o tinham como pressuposto.
VIII - Reconhecido pela Relação que a redução do pedido fora efetuada pelo ora Recorrente com a finalidade de impedir a procedência da exceção da ineptidão da petição inicial, e que tal efeito de improcedência dessa exceção já resultara da procedência do recurso do saneador, que determinara a admissão do pedido objeto de redução como pedido subsidiário, ficou assim prejudicado o objeto do segundo recurso interposto pelo Recorrente, relativo ao despacho prolatado após o saneador, que recusara a redução do pedido.
IX - Na medida em que o mesmo efeito pretendido pelo A./Recorrente, de afastar a exceção da ineptidão da petição inicial, fora logrado com o ganho de causa no 1º recurso.
X - A boa execução e cumprimento do acórdão revogatório exige, antes de qualquer outra diligência, e nomeadamente do despacho recorrido, a elaboração de novo saneador, que admita o pedido de compensação por caducidade do contrato de trabalho como pedido subsidiário, devendo tal novo despacho ser notificado ao A./Recorrente.
XI - Ao antecipar a decisão sobre o pedido de redução, antes da prolação de novo saneador, nos termos descritos e tendo-se o pedido de redução transformado num ato inútil, por força de um ato superveniente - a procedência do 1º recurso, sobre a admissão daquele pedido como subsidiário -, o tribunal recorrido incorreu em erro de julgamento.
XII - Pelo que, mesmo que se não configure uma nulidade verdadeira e própria, sempre o ato ora recorrido deverá ser revogado, por ilegal execução e contradição com o teor do acórdão revogatório da Relação.
Indeferida a nulidade, o Tribunal a quo admitiu o recurso, na espécie agravo e designou data para a realização da audiência de discussão e julgamento .
Procedeu-se a julgamento, sem gravação da prova pessoal, tendo o Tribunal a quo assentado a matéria de facto pela forma constante do despacho de fls. 639 a 644, que não suscitou qualquer reclamação conhecida.
No decurso da audiência pelo respetivo Mandatário foi referido que “... o autor declara optar pelo pagamento da indemnização a que legalmente tiver direito, em substituição da reintegração.”.
O Tribunal a quo proferiu sentença na qual decidiu [sic]:
“...julgo a presente ação parcialmente procedente, declarando, em consequência da nulidade dos contratos de trabalho a termo certo a que se reportam os autos, ilícito o despedimento do autor promovido pela ré e, consequentemente, condeno a ré a pagar ao autor uma indemnização de acordo com a sua antiguidade, que se computa no montante de € 2.403,30 (dois mil quatrocentos e três euros e trinta cêntimos), assim como a pagar-lhe a importância correspondente às retribuições que se venceram desde 30 dias antes da data da instauração da ação até à data desta sentença, deduzindo a essa importância o valor recebido pelo autor a título de subsídio de desemprego - valor este que a ré deverá entregar à Segurança Social - e de outras quantias que o autor tenha eventualmente obtido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento, e importância essa a liquidar oportunamente através do competente incidente.
Quanto ao mais improcede o pedido.”.
Inconformada com o assim decidido, a R. interpôs o presente recurso de apelação, pedindo que se revogue a sentença, tendo formulado a final as seguintes conclusões:
I - Salvo melhor opinião, o Mm.° Juiz a quo, procedeu a uma errada interpretação dos seguintes dispositivos legais:
- O artigo 329.° do Código Civil determina que o prazo de caducidade começa a correr no momento em que o direito puder ser legalmente exercido.
- O n.º 2, do artigo 435.°, do Código do Trabalho (lei 99/2003, em vigor à data da instauração da presente ação) que estipula que na ação de impugnação tem de ser intentada no prazo de um ano a contar da data do deepedimento".
- O artigo 331.° do Código Civil que determina que a suspensão da caducidade apenas ocorre do ato a que a lei atribua efeito impeditivo.
- O n.º 1 do artigo 43.° do Decreto-Lei n.º 427/89 e artigo 292.° do Código Civil, conjugado com os artigos 115.°, 116.° do Código do Trabalho de 2003.
- Artigos 14.°, n.º l, 43° n.º 1 do decreto-lei n.º 427/89, de 7/12.
II - A Douta Sentença sob recurso considerou que o termo colocado no contrato de trabalho celebrado com o A. era nulo e que a comunicação da caducidade operada pela R. configurou o alegado despedimento ilícito invocado na P.I.
III - O despedimento é uma declaração negocial recetícia que se torna eficaz logo que chegue ao poder ou seja conhecida pelo seu destinatário, nos termos do artigo 224° n.º 1 do Cod. Civil e a partir desse momento não pode ser retirada, atendendo ao princípio da irrevogabilidade da declaração negocial, expresso no art. 230° n.° 1 do Cod. Civil.
IV - Assim, a partir da data da comunicação da caducidade do contrato de trabalho a termo, rececionada pelo A. em 9 de outubro de 2007 (Cfr. ponto 37 da matéria de facto considerada como provada), este passou a poder impugnar judicialmente a decisão da A.
V - A presente ação deu entrada na secretaria do Tribunal do Trabalho do Porto no dia 3 de dezembro de 2008, tendo sido remetida por correio no dia 2 de dezembro de 2008.
VI – O n.º 2, do artigo 435.°, do Código do Trabalho (lei 99/2003, em vigor à data da instauração da presente ação) estipula que "a ação de impugnação tem de ser intentada no prazo de um ano a contar da data do despedimento”.
VII - O artigo 329.° do Código Civil determina que o prazo de caducidade começa a correr no momento em que o direito puder ser legalmente exercido.
VIII - Pelo que, salvo melhor opinião, o direito do A. interpor a presente ação caducou em 09 de outubro de 2008, um ano, após ter tido conhecimento do direito que lhe assistia.
À cautela e caso assim não se entenda,
IX - O A. na sua P.I. alegou que desempenhou funções na R. até 30 de novembro de 2007, data em que esta fez cessar o seu contrato de trabalho com efeitos a partir de 1 de dezembro de 2007 - Cfr. art.s 23°, 24° e 36° da P.I.
X - O artigo 331.° do Código Civil determina que a suspensão da caducidade apenas ocorre do ato que a lei atribua efeito impeditivo. XI - Salvo melhor opinião o decurso do prazo de caducidade não é um prazo judicial, pelo que a interrupção da caducidade apenas se verifica com a receção da Petição Inicial na Secretaria do Tribunal.
XII - Pelo que, em 3 de dezembro de 2008, data em que a P.I. do A. deu entrada na Secretaria do Tribunal (não obstante ter sido remetida por correio no dia 2/12/2012), já tinha decorrido o prazo de caducidade do direito do A., o que importa a absolvição da R. do pedido.
À Cautela e caso assim não se entenda,
XIII - O A. pediu a condenação da R. em proceder à sua reintegração e no decurso da audiência de discussão e julgamento (ata de audiência de julgamento de 30 de maio de 2012), o A. requereu:
"Optar pelo pagamento da indemnização a que legalmente tiver direito em substituição da reintegração"
XIV - O "Mm.o Juiz a quo" na Sentença sob recurso condenou a R. a pagar ao A. a indemnização legalmente devida, acrescida das retribuições vincendas.
Porém,
XV - O A. não peticionou a condenação da R. no pagamento das retribuições vencidas na Petição inicial, nem no decurso da audiência de discussão e julgamento.
XVI - A presente ação apenas foi instaurada mais de um ano após ter cessado a relação laboral entre o A. e a R., pelo que o direito às retribuições vencidas não constitui um direito indisponível e consequentemente não podem ser oficiosamente atribuídas ao A.
Nesse sentido,
XVII – (…) "IX - Se o empregador tiver despedido ilicitamente o trabalhador antes da declaração de invalidade do contrato, aplicar-se-ão as regras sobre os efeitos do despedimento ilícito, embora seja necessário fazer uma adaptação dessas regras tendo em vista a nulidade do contrato de trabalho: o despedimento tem como consequência, apenas, a obrigação de o empregador pagar as retribuições vencidas correspondentes ao tempo em que o contrato esteve em execução e a indemnização de antiguidade.
X - Não tendo a autora peticionado quaisquer retribuições vencidas desde a data do despedimento até à declaração de nulidade, não podem as quantias correspondentes ser-lhe atribuídas.”
(Cfr. Ac. proferido pelo STJ, em 01-07-2009, processo 08s3443, documento n.º SJ20090701034434, disponível www.dgsi.pt).
XVIII – O que importa a revogação da Sentença nessa parte e a sua substituição por Acórdão que absolva a R. do pagamento das retribuições vencidas ao A. desde os 30 dias anteriores à propositura da ação até à prolação da Sentença que considerou nulo o contrato de trabalho a termo outorgado.
À cautela e caso assim não se entenda,
XIX - A R. na sua contestação invocou a nulidade do contrato de trabalho a termo certo outorgado com o A., mais precisamente, nos artigos 113.º e 117.º da Contestação, por violação do n.º 1 do artigo 43.º do Decreto-Lei n.º 427/89 e do artigo 292.º do Código Civil.
XX - Em 10 de outubro de 2003, data em que foi reportada a antiguidade do A., vigorava o Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de dezembro que estabelecia que a relação jurídica de emprego na Administração Pública constitui-se por nomeação e contrato de pessoal (artigo 3.º), podendo esta última revestir as modalidades de contrato administrativo de provimento e de contrato de trabalho a termo certo [alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 14.º], sendo que, a partir da entrada em vigor do diploma legal em referência, ficou vedada ao Estado a constituição de relações de emprego com caráter subordinado por forma diversa das previstas no seu artigo 14.º.
XXI - Por seu turno, o n.º 3 do mencionado art. 14.º estabelece que o contrato de trabalho a termo certo não confere a qualidade de agente administrativo e o n.º l, do art. 43° n.º 1 do mencionado Dec.-Lei vedou à R. a constituição de relações de emprego com caráter subordinado por forma diferente das previstas neste diploma.
XXII - Por carta datada de 21 de setembro de 2009 o A. foi notificado da contestação deduzida pela R., à qual respondeu.
XXIII - A partir de 21 de setembro de 2009, a R. comunicou ao A. a nulidade do contrato de trabalho a termo que ambos outorgaram, o que importa, salvo melhor opinião, que a partir dessa data a R. deixasse de estar obrigada ao pagamento das retribuições vincendas do A.
XXIV - O Mm.º Juiz a quo, apesar de considerar, e nessa parte a Sentença sob recurso não merece censura, que o contrato outorgado entre a R. e o A. era nulo, condenou a primeira a pagar a diferença entre a retribuição que o A. auferia desde os trinta dias anteriores à propositura da ação até à data da prolação da Sentença.
XXV - O contrato de trabalho, celebrado em violação das disposições acima citadas apesar de nulo, apenas produziu efeitos enquanto vigorou entre as partes, pelo que os efeitos da nulidade do contrato outorgado apenas se produzem até à sua invocação por uma das partes ou até à entença, quando nenhum dos sujeitos processuais invoque a referida nulidade.
Assim,
XXVI - Não sendo permitido o estabelecimento de relações laborais entre o Estado e um qualquer trabalhador mediante a celebração de contrato de trabalho sem termo ou por tempo indeterminado, a contratação do A. pela R. em 10 de outubro de 2003, nos termos em que a mesma se verificou, bem como o desenvolvimento subsequente desse contrato, ocorreu em violação das normas acima descritas, circunstância que fere de nulidade a celebração do contrato em causa, por força do mencionado art. 43.º n.º 1 conjugado com o art. 294.º do Código Civil.
XXVII - Nulidade essa que foi invocada pela R. na Contestação e que salvo melhor opinião, importa que o A. apenas tenha direito a receber as retribuições vencidas até à data em que foi notificado da contestação deduzida pela R., 21 de setembro de 2009, momento a partir da qual se produzem os efeitos da nulidade.
Neste sentido,
XXVIII - "X - Neste contexto, pela ilícita cessação do contrato por iniciativa do R., tem a A. direito a receber os salários intercalares, calculados desde a data do envio dessa carta e até à data da notificação à A. da contestação apresentada nos autos, onde o R., e só aí, invoca a nulidade do contrato.”
(Cfr. Ac. do STJ, datado de 30-09-2009, proferido no processo 4646/06.5TTLSB.Ll.S1, bem como, o Ac. do STJ. datado de 22-09-2011, 4ª Secção, processo n.º 528/08.4TTSTR.El.S1 e os Ac. proferidos pelo Tribunal da Relação do Porto de 07-02-2011 e 22-02-2010, respetivamente, nos processos 544/08.6TTOAZ.P1 e 385/08.0TTOAZ.P1, disponíveis em www.dgsi.pt.)
XXIX - Pelo que, deve a douta sentença sob recurso ser revogada e substituída por Acórdão que considerando nulo o contrato outorgado entre a R. e o A., consigne o pagamento das retribuições devidas apenas até à data em que o trabalhador foi notificado da nulidade desse contrato, invocada pela R., ou seja, até 21 de setembro de 2009.
Por fim,
XXX - Nos últimos anos, a R. tem sido sujeita a enormes cortes de financiamento pelo Estado Português, em cada orçamento de Estado que vai sendo publicado, com reduções orçamentais superiores a 25%.
XXXI - Com referiu e bem o "Mm.º Juiz a quo", a nulidade do contrato resultou apenas da "inobservância de formalidades e é mera decorrência da aplicação do instituto do ónus da prova, não obstante contrato de trabalho a termo certo outorgado com o A. não ter sido renovado por falta de verba orçamental - Cfr. doc. junto com o n.º 3 - não tendo a cessação da relação laboral com o A. importado a contratação de outro trabalhador para desempenhar as mesmas funções.
XXXII - A R. outorgou os contratos de trabalho a termo certo na convicção que cumpria as normas legais e pagou as compensações devidas pela caducidade dos mesmos (que, por exemplo o A. não devolveu, nomeadamente a compensação devida pela caducidade do primeiro contrato a termo certo que caducou em 10 de outubro de 2005).
O A. apresentou a sua contra-alegação e interpôs recurso subordinado, tendo formulado a final as seguintes conclusões:
I - O prazo de um ano para instauração da acção de impugnação de despedimento ilícito a que se refere o artº 435º, 2 do Código do Trabalho de 2003 tem o seu início na data da cessação efetiva do contrato, isto é, da cessação da prestação laboral, data essa fixada pela entidade patronal no respetivo aviso prévio.
II - Ao decidir que o prazo em questão se iniciou no dia 1 de dezembro de 2007, data que a Recorrente designou ao Recorrido como a data da caducidade do contrato de trabalho a termo entre ambos existente e data também da cessação da prestação laboral do Recorrido, em consequência da comunicação da caducidade para tal data, a douta sentença interpretou e aplicou com rigor a referida disposição legal, nenhuma censura merecendo.
III - Improcedem, assim, as Conclusões II a VIII das Alegações da C… Recorrente.
IV - A remessa da petição inicial da ação de impugnação judicial de despedimento ilícito, pelo correio, sob registo postal, equivale à sua entrega na secretaria judicial, valendo a data do registo como data da prática do ato processual respetivo.
V - Trata-se de ato que suspende o prazo de caducidade do artº 435º, 2 do referido Código do Trabalho.
VI - Ao decidir nesse sentido, a sentença interpretou e aplicou adequadamente o disposto no artº 150º, 2., b) do Código do Processo Civil, devendo improceder as Conclusões IX a XII constantes das Alegações da Recorrente.
VII - Intentada a ação de impugnação de despedimento ilícito em 2 de dezembro de 2008, foi a mesma intentada dentro do prazo de um ano a que se refere o artº 435º, 2 do Código do Trabalho de 2003, mas mais de 30 dias após a cessação do contrato de trabalho.
VIII - Decretada judicialmente a ilicitude da cessação do contrato, a data relevante para o início do pagamento das retribuições posteriores ao despedimento a que se refere o artº 437º, 4. do Código do Trabalho de 2003 é a data anterior em 30 dias à data da instauração da ação.
IX - O pedido formulado na petição inicial da ação de impugnação, no sentido de pagamento das retribuições devidas "até decisão final deste processo" compreende, como é tautológico, as retribuições correspondentes ao período entre a instauração da ação e a respetiva decisão final.
X - Ao decidir, em coerência com as Conclusões acima alinhadas, condenar a Recorrente no pagamento das retribuições devidas ao Recorrido desde novembro de 2008 até à data da sentença, esta mesma sentença interpretou e aplicou ajustadamente as referidas disposições legais, pelo que improcedem as Conclusões XIII a XVIII das Alegações da C…/ Recorrente.
XI - E sempre ao Tribunal caberia a faculdade de decidir, na espécie, "extra vel ultra petitum", nos termos do artº 74º do Código do Processo de Trabalho então em vigor.
XII - Organizada a Contestação da Recorrente, na ação de impugnação de despedimento ilícito, na perspetiva da legalidade e conformidade substancial e formal dos contratos de trabalho que configuravam a relação laboral destruída, não pode alegar-se, como faz a Recorrente no recurso, que invocara a nulidade de tais contratos nessa Contestação, para os efeitos do artº 116º, 2 do Código do Trabalho e para se considerar declarada perante o Recorrido a nulidade com efeitos desde a apresentação da Contestação.
XIII - Com efeito, sendo a nulidade invocada a título subsidiário, e para a hipótese de não proceder a tese, alegada em primeira via de defesa, da validade dos contratos, é a sentença, ao declarar improceder a argumentação principal da Contestação, que faz emergir, só então, o referido pedido subsidiário, sendo a data da sentença a relevante para os efeitos da limitação à data da declaração da nulidade da determinação do conteúdo indemnizatório decorrente do despedimento ilícito.
XIV - Para além disso, mesmo nessa perspetiva subsidiária em que a Recorrente apresenta na sua Contestação a dita questão da nulidade, os termos em que ela é apresentada não integram qualquer invocação de nulidade verdadeira e própria.
XV - Na verdade, a Recorrente não assaca aos contratos, nessa peça processual, nenhum vício nem nenhuma ilegalidade, limitando-se a dizer que os contratos de trabalho a termo celebrados entre o Estado e particulares nunca se podem converter em contratos sem termo.
Estaria nessa impossibilidade a nulidade.
XVI - Mas do que se trataria então não seria da invalidade - rectius, da nulidade - de tais contratos a termo, mas de irregularidades na sua execução, que conduziriam à sua conversão, em abstrato, em contratos sem termo. Isto é, a nulidade não consistiria em elementos intrínsecos ao contrato, mas em circunstâncias alheias ao conteúdo concreto do contrato a termo e posteriores à sua celebração.
XVII - É por isso que, nem em via subsidiária se deve considerar invocada pela Recorrente na sua Contestação a nulidade dos contratos a termo, improcedendo igualmente as Conclusões XIX a XXIX das alegações da C…/Recorrente.
XVIII - Finalmente, a Recorrente faz afirmações de factos relativos à sua situação financeira,nas Conclusões XXX a XXXII, que nunca alegara em lª instância e que não suporta com qualquer prova. Bastará para improcederem.
Do recurso subordinado
XIX - Ampliação da Matéria de Facto
Na Motivação do despacho que fixou a matéria de facto, o Senhor Juiz declara ter ficado "esclarecido que ... mais para a parte final do dito período (contratos de prestação de serviços e contratos de trabalho) - o autor exerceu predominantemente outro tipo de tarefas, e em particular o atendimento dos utentes da biblioteca.
XX - Esta anotação levada pelo Senhor Juiz à Motivação, relativa à caraterização das funções desempenhadas pelo Recorrente subordinado, deveria ter sido igualmente levada à Matéria de Facto, dado o seu relevo para a boa decisão da causa.
Com efeito, como é facto do conhecimento geral, se há função que seja típica, duradoura, específica, própria, permanente, numa biblioteca pública é, justamente ... o atendimento dos utentes, dos leitores.
XXI - Por outro lado, o despacho sobre a matéria de facto considerou não provado o facto alegado pela Recorrente no artº 88º da Contestação, acima transcrito - designadamente, a natureza temporária das necessidades que conduziram à contratação do Recorrido -, facto cuja prova incumbia à Recorrente.
XXII - Da combinação da Matéria de Facto aditada com a prova negativa do artº 88º da Contestação da C…, resulta a sustentação da posição do A./Recorrido, de que se verifica contradição entre o tipo contratual escolhido - contrato de trabalho a termo certo, específico para satisfação de necessidades transitórias - e a verdadeira natureza das funções desempenhadas, correspondentes a necessidades permanentes.
XXIII - Tal configura a situação a que se refere o artº 130º. 2 do Código do Trabalho de 2003: "Considera-se sem termo o contrato de trabalho no qual a estipulação da cláusula acessória tenha por fim iludir as disposições que regulam o contrato sem termo ou o celebrado fora dos casos previstos no artigo anterior." - artigo que estabelece a determinação normativa de que "O contrato de trabalho a termo só pode ser celebrado para a satisfação de necessidades temporárias da empresa e pelo período estritamente necessário à satisfação dessas necessidades."
Ao não aderir a esta posição do A./Recorrente subordinado, terá de se considerar que a aliás douta sentença violou, por inaplicação, a citada disposição legal.
XXIV - Com efeito, a ser assim, como se crê que deva ser, o fundamento para a condenação da Recorrente não seria a nulidade dos contratos, mas a ilegalidade do despedimento verdadeira e própria - com o efeito do alargamento para a data do trânsito do período do pagamento das retribuições ilegalmente omitidas.
XXV - Importa igualmente referir, neste contexto, que a sentença considera que, de 2003 a 2007, se verificou entre Recorrente e Recorrido uma única e mesma relação laboral.
XXVI - Ora, nos termos dessa definição da sentença, o contrato de trabalho a termo entre Recorrente e Recorrido perfez um total de três renovações, prolongando-se por 4 anos.
XXVII - Mas, sendo assim, foi ultrapassada, quer a duração máxima de três anos, incluindo renovações, a que se refere o artº 139º, 1 do Código Trabalho de 2003, quer o número máximo de duas renovações, a que se refere a mesma disposição legal.
XXVIII - Pelo que, nos termos do artº 141º do mesmo Código, o contrato se converteu em contrato sem termo - tendo a sentença violado, por inaplicação, a citada disposição legal.
O Exm.º Sr. Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer, manifestando o seu entendimento no sentido de que a apelação principal deve proceder, embora restringindo o direito às retribuições vencidas até à data em que a contestação foi notificada ao A., mas devendo improceder a apelação subordinada bem como o agravo.
Apenas o A. se pronunciou acerca do teor de tal parecer.
Recebido o recurso, elaborado o projeto de acórdão e entregues as respetivas cópias aos Exm.ºs Juízes Desembargadores Adjuntos[1], foram colhidos os vistos legais.
Cumpre decidir.
São os seguintes os factos dados como provados pelo Tribunal a quo:
1 - Em 2 de abril de 2001, o A. iniciou um estágio profissional, aprovado e financiado pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional, estágio que decorreu na C…, mais especificamente na respetiva Biblioteca Central, sob a orientação da Técnica Superior Dr.ª D….
2 - No estágio o autor obteve o aproveitamento de Muito Bom e a ré celebrou com o autor um contrato dito de prestação de serviços, com início em 01-04-2002 e pelo período de 12 meses, nos termos do qual o autor trabalhou nas mesmas instalações onde fizera o estágio, e contrato esse designado de contrato de prestação de serviços cuja cópia consta de fls. 141 e 142 dos autos, dando-se aqui por integralmente reproduzido o seu conteúdo.
3 - Da cláusula 2ª do dito contrato consta que o contrato tem por objeto o desempenho das seguintes tarefas: "apoio ao leitor, colocação de cotas, arrumação de livros, elaboração de inventários, apoio aos serviços de catalogação e empréstimo".
4 - As tarefas foram desempenhadas pelo autor nas instalações da Biblioteca Central da ré utilizando o equipamento informático e os demais utensílios e material de escritório da ré.
5 - A Dr.ª E…, Técnica Superior, e o Dr. F…, Diretor de Serviços, destinavam as tarefas que o autor deveria executar e davam-lhe instruções/orientações.
6 - Desde abril de 2003 o autor também prestou serviço para a ré, nos mesmos termos que até aí e ao abrigo do contrato mencionado em 2.° o vinha fazendo, e auferindo mensalmente, de abril de 2002 a setembro de 2003, o montante de € 525,00.
7 - A ré celebrou com o autor um denominado contrato de trabalho a termo certo, para vigorar a partir de 10-10-2003, por um ano, renovável, para o exercício de funções de técnico auxiliar de biblioteca, mediante retribuição de € 601,78 euros mensais.
8 - Utilizando o autor os mesmos instrumentos de trabalho, nomeadamente equipamento informático e material de escritório, nas mesmas instalações.
9 - De 10 de outubro de 2005 até ao final de novembro de 2005 o autor continuou a prestar trabalho para a ré.
10 - A ré pagou-lhe, por esses quase dois meses, a título de honorários, 1.375,00 €.
11 - À data de novembro de 2007 a retribuição mensal do autor era no montante de 640,63 €.
12 - O estágio profissional foi realizado no âmbito do programa de Estágios Profissionais desenvolvido pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional (I.E.F.P.), o qual foi realizado no âmbito das Portaria n.º 268/97, de 18 de abril, com as alterações introduzidas pelas Portarias n.ºs 1271/97, de 26 de dezembro e 814/98, de 24 de setembro.
13 - Inicialmente estava previsto que o estágio se iniciaria em 02/04/2001 e terminaria em 31/12/2001.
14 - Foi requerida pelo Presidente do Conselho Diretivo da C… ao Diretor do Centro de Emprego do Porto Ocidental uma prorrogação de 3 meses, passando, assim o termo do estágio para 31/03/2002.
15 - O Sr. Diretor do Centro de Emprego do Porto Ocidental por despacho datado de 01/02/2002 aprovou a requerida prorrogação de estágio, informando que havia a necessidade de efetuar uma adenda ao contrato inicial.
16 - Procedeu-se em conformidade, tendo sido efetuado um aditamento à cláusula oitava, segundo a qual, o estágio terminaria em 31/03/2002.
17 - A contratação do A. através do designado contrato de trabalho a termo certo foi autorizada pelo Sr. Vice-Reitor da U.P. através de despacho reitoral de 10/10/2003.
18 - O A. iniciou as suas funções ao abrigo do designado contrato de trabalho a termo certo a 10 de Outubro de 2003.
19 - Quando assinou o contrato, o A. tomou conhecimento da legislação que a ré entendia que lhe era aplicável - arts. 18.°, n.º 1, 20.° e 21.°, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de dezembro, com as alterações que lhe foram introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 218/98, de 17 de julho e art. 6º, do Decreto-Lei n.º 252/97, de 26 de setembro, e que a ré entendia que em momento algum lhe era conferida a qualidade de agente administrativo.
20 - Ao aproximar-se o fim do prazo do contrato, o A. em 17/09/2004 requereu à Sr.ª Presidente do Conselho Diretivo da C… a renovação do mesmo por mais um ano.
21 - Esta, por sua vez, em 01-10-2004 solicitou ao Sr. Vice-Reitor da U.P. autorização para a renovação do contrato de trabalho a termo certo.
22 - A renovação foi autorizada através de despacho reitoral de 12/10/2004, tendo o A. continuado a trabalhar, ao abrigo dessa autorização de renovação, por mais um ano, com efeitos a partir de 10 de outubro de 2004.
23 - Durante a execução do contrato foi sempre paga a retribuição acordada.
24 - A Sr.ª Presidente do Conselho Diretivo da C…. em 07-10-2005 enviou ao Sr. Vice-Reitor da U.P., o processo de contratação do A. para apreciação daquele.
25 - Através de despacho reitoral de 09/11/2005 foi autorizada a contratação do A.
26 - Foi celebrado com o A. um novo designado contrato de trabalho a termo certo, ao qual correspondia uma nova categoria profissional, técnico profissional de segunda classe, com início a 2 de dezembro de 2005 e válido por um ano, eventualmente renovável por iguais períodos, até ao limite de 3 anos, contrato esse cuja cópia se encontra a fls. 428 e 430 e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.
27 - Ao assinar o contrato, o A. tomou conhecimento da legislação que a ré entendia que lhe era aplicável - art. 14.°, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de dezembro, com a redação que lhe foi atribuída pelo art. 29.° da Lei n.º 23/2004, de 22 de junho, art. 6° do Decreto-Lei n.º 252/97, de 26 de setembro e arts. 129.°, n.ºs 1 e 2, aI. f), 139.°, n.ºs 1 e 2 e 140.°, n.ºs 2 e 3, do Código de Trabalho aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, e que a ré entendia que em momento algum lhe era conferida a qualidade de agente administrativo.
28 - No primeiro contrato consta que o A. foi contratado como auxiliar técnico (serviço de documentação e informação) e no segundo consta que o A. foi contratado para o exercício de funções equiparadas a técnico profissional de 2ª classe.
29 - Tendo existido um lapso temporal entre a outorga de ambos os contratos.
30 - Ao aproximar-se o fim do prazo do contrato, que teve o seu início em 2 de dezembro de 2005, o A. em 11/09/2006 requereu a sua renovação por mais um ano.
31 - A 26/09/2006 a Sr.ª Presidente do Conselho Directivo da C… solicitou ao Sr. Vice-Reitor da U.P. a renovação do contrato de trabalho a termo certo do A.
32 - Foi autorizada a renovação através de despacho reitoral de 26/10/2006, com efeitos a partir de 02/12/2006, e pelo período de um ano.
33 - A 03/09/2007 o A. requereu ao Sr. Director da D… a renovação do contrato por mais um ano.
34 - O pedido de renovação foi indeferido por falta de verba orçamental.
35 - A 03/10/2007, foi enviada ao A. uma carta registada com aviso de receção, em que lhe era comunicado que o contrato de trabalho a termo certo cessava por caducidade a 1 de dezembro de 2007.
36 - Na referida carta era dado conhecimento ao A. de que tinha direito à compensação prevista no n.º 2, do art. 388.º do C.T.
37 - O A. tomou conhecimento da comunicação da cessação por caducidade do contrato de trabalho a termo certo, tendo assinado o AR em 09/10/2007.
38 - Foi paga ao A. a quantia de 1.440,51 €, pelo menos, a título de compensação pela caducidade do contrato.
Fundamentação.
Sendo pelas conclusões do recurso que se delimita o respetivo objeto[2], como decorre do disposto nos Art.ºs 684.º, n.º 3 e 685.º-A, n.º 1, ambos do Cód. Proc. Civil, na redação que lhe foi dada pelo diploma referido na nota(1), ex vi do disposto no Art.º 87.º, n.º 1 do Cód. Proc. do Trabalho[3], salvo tratando-se de matérias de conhecimento oficioso de que o Tribunal ad quem pode conhecer por sua iniciativa, são sete as questões a decidir nestes autos, a saber: A – Agravo:
1 – Revogação da sentença homologatória B – Apelação – recurso principal:
2 – Caducidade da ação
3 – Retribuições vencidas e vincemdas, não pedidas
4 – Contagem dos direitos até à data da notificação da contestação
5 – Redução da indemnização C – Apelação – recurso subordinado:
6 – Alteração da matéria de facto
7 – Conversão do CT a termo em CT sem termo.
Previamente, convém referir que, dada a data da instauração da presente ação, 2008-12-03, se mantinha na jurisdição laboral o sistema dualista de recursos.
Por outro lado, tendo o agravo sido interposto pelo A. e dado o disposto no Art.º 710.º do Cód. Proc. Civil, na redação anterior à vigente, tal recurso será conhecido a final, se for caso disso.
Por último, dado o teor das matériasa decidir e sua precedência lógica, seguiremos a seguinte ordem: 6.ª, 2.ª, 3.ª, 5.ª, 4.ª e 7.ª e 1.ª.
A 6.ª questão.
Trata-se de saber, no recurso subordinado, se deve ser alterada a matéria de facto, tal como pretende o A. nas conclusões XIX a XXI, que se transcrevem de novo:
XIX - Ampliação da Matéria de Facto
Na Motivação do despacho que fixou a matéria de facto, o Senhor Juiz declara ter ficado "esclarecido que ... mais para a parte final do dito período (contratos de prestação de serviços e contratos de trabalho) - o autor exerceu predominantemente outro tipo de tarefas, e em particular o atendimento dos utentes da biblioteca.
XX - Esta anotação levada pelo Senhor Juiz à Motivação, relativa à caraterização das funções desempenhadas pelo Recorrente subordinado, deveria ter sido igualmente levada à Matéria de Facto, dado o seu relevo para a boa decisão da causa.
Com efeito, como é facto do conhecimento geral, se há função que seja típica, duradoura, específica, própria, permanente, numa biblioteca pública é, justamente ... o atendimento dos utentes, dos leitores.
XXI - Por outro lado, o despacho sobre a matéria de facto considerou não provado o facto alegado pela Recorrente no artº 88º da Contestação, acima transcrito - designadamente, a natureza temporária das necessidades que conduziram à contratação do Recorrido -, facto cuja prova incumbia à Recorrente.
Vejamos, pois.
Dispõe o Art.º 685.º-B[4], n.ºs 1 e 2 do Cód. Proc. Civil, o seguinte:
1 — Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
2 — No caso previsto na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados e seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 522.º-C, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respetiva transcrição.[5]
Por sua vez, estabelece o n.º 2 do Art.º 522.º-C do mesmo diploma, o seguinte:
Quando haja lugar a registo áudio ou vídeo, devem ser assinalados na ata o início e o termo da gravação de cada depoimento, informação ou esclarecimento, de forma a ser possível uma identificação precisa e separada dos mesmos.[6]
Por último e ainda do mesmo diploma, dispõe o Art.º 712.º, n.º 1:
1 — A decisão do tribunal de 1.ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação:
a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artigo 685.º-B, a decisão com base neles proferida;
b) Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insuscetível de ser destruída por quaisquer outras provas;
c) Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou.
In casu, o apelante subordinado indicou quais os concretos pontos de facto que pretende que sejam alterados e que são as matérias respeitantes às funções desempenhadas pelo A. ao serviço da R., nomeadamente, a matéria alegada no artigo 88.º da contestação.
No entanto, não indicou os concretos meios de prova que imporiam diferente decisão da matéria de facto, seja documental ou depoimentos de testemunhas.
De resto, mesmo que tivesse cumprido tais ónus, o recurso nunca poderia ser admitido, uma vez que não se procedeu à gravação dos depoimentos prestados em audiência de discussão e julgamento.
Improcedem, assim, as conclusões XIX a XXI do recurso subordinado.
A 2.ª questão.
Trata-se de saber, no recurso - principal - de apelação se se verifica a caducidade do direito de ação, tal como a R. entende nas conclusões II a XII, cuja transcrição ora se repete, por facilidade de exposição:
II - A Douta Sentença sob recurso considerou que o termo colocado no contrato de trabalho celebrado com o A. era nulo e que a comunicação da caducidade operada pela R. configurou o alegado despedimento ilícito invocado na P.I.
III - O despedimento é uma declaração negocial recetícia que se torna eficaz logo que chegue ao poder ou seja conhecida pelo seu destinatário, nos termos do artigo 224° n.º 1 do Cod. Civil e a partir desse momento não pode ser retirada, atendendo ao princípio da irrevogabilidade da declaração negocial, expresso no art. 230° n.° 1 do Cod. Civil.
IV - Assim, a partir da data da comunicação da caducidade do contrato de trabalho a termo, rececionada pelo A. em 9 de outubro de 2007 (Cfr. ponto 37 da matéria de facto considerada como provada), este passou a poder impugnar judicialmente a decisão da A.
V - A presente ação deu entrada na secretaria do Tribunal do Trabalho do Porto no dia 3 de dezembro de 2008, tendo sido remetida por correio no dia 2 de dezembro de 2008.
VI – O n.º 2, do artigo 435.°, do Código do Trabalho (lei 99/2003, em vigor à data da instauração da presente ação) estipula que "a ação de impugnação tem de ser intentada no prazo de um ano a contar da data do despedimento”.
VII - O artigo 329.° do Código Civil determina que o prazo de caducidade começa a correr no momento em que o direito puder ser legalmente exercido.
VIII - Pelo que, salvo melhor opinião, o direito do A. interpor a presente ação caducou em 09 de outubro de 2008, um ano, após ter tido conhecimento do direito que lhe assistia.
À cautela e caso assim não se entenda,
IX - O A. na sua P.I. alegou que desempenhou funções na R. até 30 de novembro de 2007, data em que esta fez cessar o seu contrato de trabalho com efeitos a partir de 1 de dezembro de 2007 - Cfr. art.s 23°, 24° e 36° da P.I.
X - O artigo 331.° do Código Civil determina que a suspensão da caducidade apenas ocorre do ato que a lei atribua efeito impeditivo. XI - Salvo melhor opinião o decurso do prazo de caducidade não é um prazo judicial, pelo que a interrupção da caducidade apenas se verifica com a receção da Petição Inicial na Secretaria do Tribunal.
XII - Pelo que, em 3 de dezembro de 2008, data em que a P.I. do A. deu entrada na Secretaria do Tribunal (não obstante ter sido remetida por correio no dia 2/12/2012 [quereria ter escrito 2008-12-02, como resulta do contexto]), já tinha decorrido o prazo de caducidade do direito do A., o que importa a absolvição da R. do pedido.
Vem provado que a R. declarou a caducidade do CT com efeitos reportados a 2007-12-01, do que o A. tomou conhecimento em 2007-10-09, tendo a petição inicial dado entrada na Secretaria em 2008-12-03, remetida no dia anterior, por correio registado.
Sendo o prazo de propositura da ação de um ano e começando a correr no momento em que o direito puder ser legalmente exercido, dadas as disposições legais invocadas e transcritas pela ora apelante, que nos dispensamos de citar e transcrever, parece claro que o prazo de caducidade teve o seu início em 2007-12-01, data em que o contrato cessa. Na verdade, até aí o contrato continua a sua execução, na plenitude dos seus direitos e deveres para ambas as partes, podendo ocorrer diversas vicissitudes a impedir o desenlace final, pela caducidade. Assim, sempre seria necessário aguardar que tal data se verificasse para se saber se o contrato tinha efetivamente cessado e por que forma, só nessa data podendo o direito ser exercido. Pense-se na hipótese de o A. o denunciar antes daquela data ou de a R. o despedir entretanto ou, até, de ambas as partes lhe terem posto fim, por mútuo acordo. Seja como for, o termo inicial do prazo de caducidade para a propositura da ação situa-se, pois, em 2007-12-01.
Já quanto ao termo final, a apelante aceita que ele se situa em 2008-12-02, o que se compreende dada a circunstância do dia 1, anterior, ser, então, feriado, transferindo-se a prática do ato para o dia útil seguinte, atento o disposto no Art.º 279.º, alínea e) do Cód. Civil e no Art.º 144.º, n.º 2 do Cód. Proc. Civil. No entanto, não aceita que a remessa da petição inicial, por correio registado, equivalha à sua entrada na Secretaria, com o argumento de que o prazo de caducidade tem natureza substantiva. Ora, considerando o disposto no Art.º 150.º, n.º 2, alínea b) do Cód. Proc. Civil, a data do registo da carta que remeta a petição inicial equivale à entrega do articulado na Secretaria, sendo assim a própria lei que estabelece o efeito pretendido, sendo irrelevante o que se possa afirmar em sentido oposto, pois a lei abstraiu da natureza do prazo de caducidade em causa. Daí que se deva considerar ex lege que o ato foi praticado em 2008-12-02.
Em síntese, tendo o contrato cessado em 2007-12-01 e tendo a ação sido intentada em 2008-12-02, foi observado o prazo de caducidade de um ano para propor a ação de impugnação.
Improcedem, destarte, as conclusões II a XII do recurso principal.
A 3.ª questão.
Trata-se de saber, no recurso - principal - de apelação se o A. não formulou o pedido relativo às retribuições vencidas e vincendas, decorrentes do despedimento, tal como a R. entende nas conclusões XIII a XVIII.
Vejamos.
Partindo do pressuposto de que o A. foi objeto de um despedimento ilícito, o Tribunal a quo condenou a R. a pagar àquele uma indemnização de antiguidade, conforme opção formulada em audiência de julgamento, bem como as retribuições vencidas até à data da sentença.
Entende a R. que estas não são devidas porque o A. não formulou o pedido correspondente.
Acontece, porém, que conforme consta da petição inicial e se mencionou em relatório, o A. pediu que se condene a R. a pagar-lhe “… as diferenças entre a retribuição devida e o subsídio de desemprego recebido até decisão final deste processo”, isto é, o A. formulou o pedido relativo às retribuições vencidas e vincendas, mas usou uma formulação algo incomum na medida em que, em vez de pedir as ditas retribuições e, em separado, a dedução das prestações do subsídio de desemprego que tenha recebido, pediu logo a diferença. Cremos, no entanto, que tal forma de peticionar nada envolve de incorreto, nem o Tribunal a quo condenou ultra petitum, tendo-se deslocado dentro dos limites do pedido deduzido pelo A., embora este tenha usado uma formulação que não é corrente, atenta a nossa prática judiciária. Seja como for, à R. não assiste razão quanto à questão posta.
Improcedem, por isso, as conclusões XIII a XVIII.
A 5.ª questão.
Trata-se de saber, no recurso - principal - de apelação se deve ser reduzido o montante da indemnização de antiguidade, tal como a R. entende nas conclusões XXX a XXXII, alegando como fundamento que tem sido objeto de redução de verbas no seu orçamento desde há anos a esta parte.
Decidindo.
Conforme afirma o A. na sua contra-alegação, é a primeira vez que a R. coloca esta questão em debate, sendo certo que não havia alegado, até aqui, quaisquer factos relativos à sua situação financeira e, menos ainda, os provou, pelo que se trata efetivamente de questão nova.
Ora, para que a Relação pudesse apreciar a questão – só – agora invocada no presente recurso de apelação, deveria a R., logo na contestação, suscitá-la, dando possibilidade ao A. de exercer o contraditório sobre tal questão e possibilitando a pronúncia do Tribunal a quo sobre tal matéria.
Porém, não o tendo feito, está este Tribunal da Relação impossibilitado de conhecer tal questão, pois os recursos destinam-se a proceder ao reexame de questões já apreciadas pelos tribunais - hierarquicamente - inferiores e não a conhecer de matérias novas, não submetidas à decisão do Tribunal a quo, salvo tratando-se de questões de conhecimento oficioso[7], o que não acontece in casu.
Improcedem, assim, as conclusões XXX a XXXII da apelação – recurso principal.
As 4.ª e 7.ª questões.
Trata-se de saber, no recurso - principal - de apelação, se o A. tem direito às retribuições vencidas até à data de notificação - a este - da contestação ou, no recurso subordinado, até à data do trânsito em julgado da decisão do processo.
Na verdade, são estas as posições das partes, que divergem da sentença, uma vez que nesta se decidiu que o direito às retribuições vencidas devidas ao A. tinham como marco temporal final a data da sentença. Vejamos, porém, a sua fundamentação, na parte pertinente:
“… A questão que urge então esclarecer é se é(são) válidos o(s) termo(s) aposto(s) no(s) contrato(s) ditos de trabalho a termo certo.
Vejamos:
À data de 10.10.2003 encontrava-se em vigor o DL 427/89, de 7/12, com a redação (nomeadamente a do seu art. 18.°) que lhe havia sido conferida pelo DL 218/98, de 17/7 - tais diplomas legais eram, de resto, entendidos já então como aplicáveis pela ré, que pretendia ser ainda aplicável à relação laboral estabelecida o art. 6.° do DL 252/97, de 26/9 ("As Universidades podem celebrar contratos de trabalho a termo desde que estas contratações não visem satisfazer necessidades permanentes dos serviços.") - cf. ponto 19 da lista dos factos provados.
No seu preâmbulo, reza o DL 427/89 - publicado na sequência, e em desenvolvimento, do DL 184/89, de 2/6, que aprovou os "princípios gerais sobre salários e gestão de pessoal na função pública" -, que "Definem-se agora como vínculos jurídicos a nomeação e o contrato, reservando para este as modalidades de contrato administrativo de provimento e contrato de trabalho a termo certo. Pela nomeação assegura-se o exercício de funções próprias do serviço público com caráter de permanência, correspondendo à forma estável de prestar serviço à Administração Pública, sendo o contrato, em qualquer das suas modalidades, limitado a situações específicas claramente definidas, com caraterísticas de excecionalidade e transitoriedade."
O DL 184/89 estabelecia já no seu art. 9.°:
"1 - O exercício transitório de funções de caráter subordinado de duração previsível que não possam ser desempenhadas por nomeados ou contratados em regime de direito administrativo pode excecionalmente ser assegurado por pessoal a contratar segundo o regime do contrato de trabalho a termo certo.
2 - O contrato referido no número anterior obedece ao disposto na lei geral do trabalho sobre contratos de trabalho a termo, salvo no que respeita à renovação, a qual deve ser expressa e não ultrapassar os prazos estabelecidos na lei geral quanto à duração máxima dos contratos a termo."
Na mesma senda, veio o art. 18.° do DL 427/89 a estabelecer que:
"1 - O contrato de trabalho a termo certo é o acordo bilateral pelo qual uma pessoa não integrada nos quadros assegura, com caráter de subordinação, a satisfação de necessidades transitórias dos serviços de duração determinada.
2 - O contrato de trabalho a termo certo só pode ser celebrado nos seguintes casos:
a) Substituição temporária de um funcionário ou agente;
b) Atividades sazonais;
c) Execução de uma tarefa ocasional ou serviço determinado, precisamente definido e não duradouro;
d) Aumento excecional e temporário da atividade do serviço;
e) Desenvolvimento de projetos não inseridos nas atividades normais dos serviços.
3 (…)
4 - O contrato de trabalho a termo certo a que se refere o presente diploma não se converte, em caso algum, em contrato sem termo.
5 - A celebração de contrato de trabalho a termo certo com violação do disposto no presente diploma implica a sua nulidade e constitui os dirigentes em responsabilidade civil, disciplinar e financeira pela prática de atos ilícitos, sendo ainda fundamento para a cessação da comissão de serviço nos termos da lei.
6 (…)".
Adiante-se desde já que nos termos do art. 20.°, n.ºs 1, 6 e 7, do mesmo DL 427/89, o contrato de trabalho a termo certo pode ser objeto de renovação desde que - e sem prejuízo das exceções contempladas nos n.ºs 1 e 2 do mesmo artigo - a sua duração total não exceda dois anos, sendo que atingido o prazo máximo do contrato de trabalho a termo certo não pode ser celebrado novo contrato da mesma natureza e objeto - considerando-se objeto do contrato as funções efetivamente exercidas -, com o mesmo ou outro trabalhador, antes de decorrido o prazo de seis meses.
Ao tempo - da outorga do primeiro dos ditos contratos de trabalho a termo certo - encontrava-se também em vigor a LCCT (DL 64-A/89, de 27/2; a primeira das lei geral do trabalho sobre contratos de trabalho a termo de que fala o art. 9.° do DL 184/89 e o art. 14.º do DL 427/89 e que urge ter em devida conta) cujo art. 42.°, sob a epígrafe de Forma, dispunha:
"1. O contrato de trabalho a termo, certo ou incerto, está sujeito a forma escrita, devendo ser assinado por ambas as partes e conter as seguintes indicações:
a) Nome ou denominação e residência ou sede dos contraentes;
b) Categoria profissional ou funções ajustadas e retribuição do trabalhador;
c) Local e horário de trabalho;
d) Data de início do trabalho;
e) Prazo estipulado com indicação do motivo justificativo ou, no caso de contratos a termo incerto, da atividade, tarefa ou obra cuja execução justifique a respetiva celebração ou o nome do trabalhador substituído;
f) A necessidade do cumprimento do disposto no n.º 1 do artigo 53.°;
g) Data da celebração.
2. Na falta da referência exigida pela alínea d) do n.º 1, considera-se que o contrato tem início na data da sua celebração.
3. Considera-se contrato sem termo aquele em que falte a redução a escrito, a assinatura das partes, o nome ou denominação, bem como as referências exigidas na alínea e) do n.º 1 ou, simultaneamente, nas alíneas d) e f) do mesmo número."
Por sua vez o art. 41.°, n.º 4, da citada LCCT estabelecia que "Cabe ao empregador o ónus da prova dos factos e circunstâncias que fundamentam a celebração de um contrato a termo, sem prejuízo do disposto no n.º 1 do artigo 3.° da Lei n.º 38/96, de 31 de agosto."
Uma vez que se trata de disposições legais que também se afigura pertinente trazer aqui à colação - o CT/2003 logo entrou em vigor em 01 de dezembro de 2003 (art. 3.° da Lei 99/2003) - diga-se que o art. 131.°/1 e) do CT/2003 estabelecia também que do contrato de trabalho deve constar "a indicação do termo estipulado e do respetivo motivo justificativo", sendo que o n.º 3 do mesmo artigo dispõe: "Para efeitos da alínea e) do n.º 1, a indicação do motivo justificativo da aposição do termo deve ser feita pela menção expressa dos factos que o integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado."
E também o art. 130.°/1 do CT/2003 continha uma norma similar à do art. 41.º n.º 4 da LCCT ao dispor que "A prova dos factos que justifiquem a celebração de contrato a termo cabe ao empregador."
Ora, a fundamentação que a ré consignou na pertinente cláusula (1.º parágrafo das assinaladas cláusulas especiais) do dito contrato - que consta de fls. 163 e 164 dos autos - para justificar a aposição do termo resolutivo refere tão só "O segundo outorgante assegura, a título transitório e com caráter de subordinação, o exercício das funções que cabem à categoria para a qual foi contratado, com sujeição ao regime da função pública."
Tal clausulado não esclarece de facto, e com o devido respeito por diverso entendimento, para executar que tarefas, que assumam um caráter transitório, foi o autor admitido a prestar trabalho à ré.
A ré, diga-se, não obstante ter alegado, embora de forma algo genérica e conclusiva (cf. art. 88.º da contestação) - e parece, ademais, que só relativamente ao segundo dos mencionados contratos de trabalho a termo certo -, que o contrato a termo destinou-se a satisfazer necessidades temporárias da ré, nada logrou provar nesse particular - cf. também a pertinente motivação da decisão da matéria de facto.
Aliás a ré não consignou no texto do aludido contrato, ainda que em termos genéricos, ao abrigo de qual das situações elencadas no n.º 2 do art. 18.º do DL 427/89 foi o autor admitido a prestar trabalho através do contrato em questão.
Acontece que, como decorre do citado art. 131.°/3 do CT e tem sido reafirmado pela jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores (cf., a título de exemplo e que se cita por ser um dos mais recentes que se conhece abordando a questão, Ac. da RP de 14/7/2010, proferido no âmbito da Apelação 289/09.0TTGDM.Pl …), "No contrato de trabalho a termo, a justificação do termo deverá constar do contrato escrito - formalidade ad substantiam - e deve enunciar os factos concretos que a integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo.", ou como se sintetizou no sumário referente a acórdão da mesma Relação, proferido em 11.10.20l0 no âmbito do processo 795/09.6TTPRT, "Nos termos do art. 13l.°, n.ºs 1, al. e), 3 e 4 do Código do Trabalho de 2003, no contrato de trabalho a termo deverão ser indicados de forma expressa e concretizada os factos que motivam a aposição do termo, bem como os factos que estabeleçam a conexão entre a justificação invocada e o concreto prazo estipulado, considerando-se sem termo o contrato em que se omita ou seja insuficiente tal indicação." (…).
Mas se assim é, temos de concluir então que o contrato de trabalho a termo certo é nulo - art. 18.°/5 do DL 427/89 e art. 280.°/1 e 286.° do CC.
Atentas as especificidades do regime legal [do] contrato em causa - nomeadamente decorrente das normas supra citadas -, a declaração de nulidade não pode restringir-se à aposição do termo, nem o contrato se converte em contrato sem termo - cf., designadamente, art. 18.°/4 do DL 427/89, e Ac. RC de 13.5.2004, Relator Sr. Desembargador Serra Leitão, Proc. 1250/04, in www.dgsi.pt.jtrc.
O que vem de dizer-se aplica-se também, e no essencial, ao segundo dos denominados contratos de trabalho a termo certo, datado de janeiro de 2006 e com início em 02 de dezembro de 2005 - cf. ponto 26 da matéria de facto.
É certo que deste contrato já consta o motivo justificativo do termo estipulado, elencando-se as funções que o autor - alegadamente - iria exercer ao serviço da ré, e consignando-se que se tratava de tarefas que, "de acordo com a planificação a médio prazo para este serviço, estarão concluídas no último trimestre de 2008."
Porém, como acima já se deixou dito, a este propósito, e sendo seu o ónus da prova, a ré nada logrou provar.
E aplicam-se também no caso as faladas normas do CT/2003 relativas ao contrato de trabalho a termo certo.
É verdade que entretanto entrara em vigor a Lei 23/2004, de 22/6, mas daí decorre que inexiste agora a necessidade de conjugar as pertinentes normas específicas dos DL 184/89 e 427/89 (revogadas pela dita Lei, através do art. 30.° al. a) e b)) com as apontadas normas do regime geral, e sendo ainda certo que, como nota o autor, também se não aplica [a]o caso em apreço a Lei 23/2004, atento o excecionado no art. 1.°/3, al. f), da mesma Lei.
Assim sendo, parece claro que da aplicação das já citadas normas do CT/2003, e v.g. dos art. 130.°/1 e 2 e 131.°/3, é nulo o termo aposto neste segundo contrato de trabalho.
Mas afigura-se-nos também que ainda aqui a nulidade se estende a todo o contrato, não havendo qualquer conversão do contrato em contrato de trabalho sem termo.
Efetivamente, o trabalho na Administração Pública continua a estar balizado por formas de contrato expressamente previstas na lei, obedecendo a admissão dos trabalhadores a requisitos - como seja, para a contratação por tempo indeterminado, a existência de lugar vago nos quadros - e formalismo próprios, não parecendo curial que, por «portas travessas», se obtenha um desiderato que a lei, em termos gerais, proíbe - cf., a propósito da conversão do contrato por via de ter sido ultrapassado o limite máximo de duração total fixado na lei geral, Ac. do Tribunal Constitucional, com força obrigatória geral, in DR, 1.ª Série, de 30.11.00.
Como quer que seja, no caso concreto - em que o autor pede uma indemnização de acordo com a sua antiguidade e não a sua reintegração - em termos práticos é irrelevante que se defenda a nulidade (integral) do contrato celebrado, como se nos afigura ser a solução correta, ou que se perfilhe o entendimento de que ocorreu a conversão do denominado contrato de trabalho a termo certo em contrato de trabalho por tempo indeterminado.
Com efeito, e em qualquer caso, aquela indemnização é devida.
Se houvesse de considerar-se um contrato de trabalho por tempo indeterminado, é claro que a comunicação de caducidade do contrato - cf. pontos 35 a 37 da lista dos factos provados - equivale a uma declaração de despedimento, ilícito - cf. art. 429.º a) do CT/2003.
Mas considerando-se, repete-se, como consideramos, que o contrato de trabalho celebrado é nulo, sucede que a ré não invocou a nulidade da relação laboral - antes, e como já se disse, limitou-se a comunicar ao autor a cessação do contrato por caducidade - e, assim, estamos igualmente perante um caso em que, "no âmbito de uma relação laboral nula e antes de ter ocorrido a declaração dessa nulidade, foi perpretado um despedimento ilícito" - cf. Ac. RP de 21.04.2008, do qual foi Relatora a Exm.ª Desembargadora Paula Leal de Carvalho, in www.gde.mj.pt/jtrp, Proc. 0745792.
Tal conclusão decorre, em primeiro lugar, do disposto no art. 116.°/1 do CT/2003:
"Aos factos extintivos ocorridos antes da declaração de nulidade ou anulação do contrato de trabalho aplicam-se as normas sobre cessação do contrato."
Donde, como para o caso aí tratado, e que se nos afigura semelhante ao agora em análise, se defende no mesmo douto acórdão, existir o direito à indemnização (desde que por esta o trabalhador tenha optado, como, repete-se, sucede no caso presente) e aos salários intercalares - cf. também, em sentido que se nos afigura concordante quanto ao aspecto que vem sendo tratado, Ac. do STJ de 25.06.2009, do qual foi Relatar o Exm.º Conselheiro Pinto Hespanhol, Proc. 08S2655, in www.gde.mj.pt/jstj, Ac. da RP de 07.02.2011, do qual foi Relatar o Exm.º Desembargador Eduardo Petersen, in www.gde.mj.pt/jtrp, Proc. 544/08.6TTOAZ.P1, e art. 436.°/1 a), 437.° e 439.°/1 do CT/2003.
Mesmo que assim se não entenda, vem o STJ defendendo - cf. por ex. Ac. do STJ proferido no âmbito do Proc. 118/09.4TTMAI.Pl.Sl -, em situações que, no essencial e para o que aqui importa, reputamos de similares à versada nos presentes autos, que o trabalhador tem direito a semelhante indemnização, por aplicação do regime previsto no art. 116.°/2 e 3 do CT/2003, posto que "(…) a má fé do Estado decorre, efetivamente, do facto de o mesmo não poder ignorar a invalidade do contrato, enquanto que, em relação à Autora, se presume a sua boa fé, por não lhe ser exigivel conduta diferente da de cumprir os deveres impostos pela relação de trabalho que assumiu.", entendimento este que sempre acarreta o mesmo desiderato em termos decisórios e ao qual, a não se adoptar aquele, aderimos.
Aqui chegados:
Posto que os dois contratos de trabalho referidos são nulos e que no curto período que decorreu entre ambos o autor trabalhou igualmente para a ré - cf. pontos 9 e l0 dos factos provados - entendemos que a antiguidade do autor se deve reportar a 10.10.2003 (data em que se iniciou o 1.° dos ditos contratos de trabalho), pois o que está em causa, no fundo, é uma mesma e única relação laboral.
Entendemos como razoável, equilibrado, e tendo presente o disposto no art. 439.°/1 do CT/2003, atribuir ao autor uma indemnização de acordo com os anos de antiguidade (8 anos[8] e uma fração; note-se que declarando-se nesta sentença a nulidade do contrato de trabalho, o tempo que decorrer até ao trânsito da decisão final não acarretará ulterior liquidação), e com base numa retribuição mensal correspondente a 20 dias (€ 427,09; cf. ponto 11 da matéria de facto) - a ilicitude no presente caso, e tendo presente a matéria de facto efetivamente provada, "apenas" advém de inobservância de formalidades e é mera decorrência da aplicação do instituto do ónus da prova, pelo que se afigura justificar-se ficar algo aquém do ponto médio previsto na lei -, a qual importa no montante de € 3.843,81 (€ 427,09 X 9).
A este valor há que deduzir, como pretende (em defesa subsidiária) a ré o montante que pagou ao autor a título de compensação pela caducidade do contrato de trabalho (€ 1.440,51; ponto 38 da matéria de facto). Assim, é efetivamente devida a este título a quantia de € 2.403,30.
Por outro lado, e quanto à importância correspondente ao valor das retribuições que o autor deixou de auferir são deduzidos os montantes previstos nos nº.s 2, 3 e 4 do artigo 437.° do CT/2003 (o autor foi despedido em 09/10/2007 e a ação apenas deu entrada em 02/12/2008, tendo-se ainda em conta que se o autor entretanto auferiu subsídio de desemprego e remunerações por trabalho que iniciou posteriormente ao despedimento também cumpre deduzir tais prestações) e no seu cômputo a decisão que releva, como já acima se fez referência, é a da data desta sentença; considerando que não temos todos os elementos para efetuar a pertinente dedução, relega-se para liquidação de sentença o apuramento de tal importância - art. 66l.°, n.º 2, e 378.°, n.º 2, do CPC.
Ora, tendo a sentença atendido à data da respetiva prolação para definir o montante da indemnização de antiguidade e tendo indicado essa data como termo final da contagem das retribuições vencidas, a R. recorre por entender que a data a considerar deve ser a de 21 de setembro de 2009, enquanto o A. defende que a data deve conincir com a do trânsito em julgado da decisão do processo.
Na verdade, no recurso de apelação, principal, a R. concorda com a tese da sentença de que os vícios apontados aos contratos de trabalho a termo dos autos geram a nulidade do contrato, qua tale, a qual conduz ao direito a indemnização de antiguidade e às retribuições vencidas, discordando da sentença apenas porque nesta se atendeu à data da sua prolação quando, na opinião da apelante, se deveria atender à data em que a contestação foi notificada ao A., por nela, a seu ver, ter invocado a nulidade do contrato, ou seja, à data de 21 de setembro de 2009. No recurso subordinado, o A. discorda da tese da sentença por entender que os vícios apontados geram a nulidade do termo aposto aos contratos o que, a seu ver, determina a conversão dos contratos de trabalho a termo em contrato de trabalho por tempo indeterminado e, equivalendo a declaração de caducidade a um despedimento ilícito, pede que o termo final para a contagem dos direitos seja a data do trânsito em julgado da decisão do processo.
Em síntese, trata-se de saber se a nulidade abarca o contrato ou apenas o termo, pois da resposta dada concluir-se-á se a data a considerar como termo final da contagem dos direitos reclamados será a da sentença ou a da notificação da contestação ou, na tese do A., a do trânsito em julgado da decisão do processo; noutros termos, trata-se de saber se, no âmbito da administração pública e em cumprimento da Diretiva 1999/70/CE, do Conselho, de 1999-06-28[9], é admissível, ou não, a conversão do contrato de trabalho a termo em contrato de trabalho por tempo indeterminado.
É o seguinte o quadro legislativo mínimo a ter em conta:
1) Art. 6.° do DL 252/97, de 26/9:
"As Universidades podem celebrar contratos de trabalho a termo desde que estas contratações não visem satisfazer necessidades permanentes dos serviços.".
2) Art. 18.° do DL 427/89, de 7 de dezembro:
"4 - O contrato de trabalho a termo certo a que se refere o presente diploma não se converte, em caso algum, em contrato sem termo.”
3) Art.º 41.º-A da LCCT:
"1 – A celebração sucessiva e ou intervalada de contratos de trabalho a termo, entre as mesmas partes, para o exercício das mesmas funções ou para satisfação das mesmas necessidades do empregador determina a conversão automática da relação jurídica em contrato sem termo.”
4) Art.º 42.º da LCCT:
"1. O contrato de trabalho a termo, certo ou incerto, está sujeito a forma escrita, devendo ser assinado por ambas as partes e conter as seguintes indicações:
e) Prazo estipulado com indicação do motivo justificativo ou, no caso de contratos a termo incerto, da atividade, tarefa ou obra cuja execução justifique a respetiva celebração ou o nome do trabalhador substituído;
3. Considera-se contrato sem termo aquele em que falte a redução a escrito, a assinatura das partes, o nome ou denominação, bem como as referências exigidas na alínea e) do n.º 1 ou, simultaneamente, nas alíneas d) e f) do mesmo número."
Sendo a conversão admitida em sede de contrato de trabalho a termo no setor privado e absolutamente proibida nos contratos a termo celebrados no âmbito da administração pública, a questão passou a ser debatida em sede constitucional, entendendo a maioria da doutrina e da jurisprudência - pátrias - que a tese da conversão ofende o princípio da igualdade no acesso à função pública, por falta de prévio concurso, atento o disposto no Art.º 47.º, n.º 2 da CRP [Todos os cidadãos têm o direito de acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, em regra por via de concurso], sendo os restantes de opinião que a conversão observa o princípio da segurança no emprego, nos termos do Art.º 53.º do mesmo diploma [É garantida aos trabalhadores a segurança no emprego, sendo proibidos os despedimentos sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos].[10] Cfr., deste Tribunal da Relação do Porto, a título de exemplo, os acórdãos de 2009-03-16, Processo 0847551 e de 2010-02-22[11], Processo 375/08.3TTGDM.P1, in www.dgsi.pt.
A questão tem também sido debatida ao nível do direito comunitário, existindo teses divergentes, de que são exemplo os Acórdãos Adeneler[12] e Marrosu e Sardino[13], para cuja fundamentação se remete e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
E, a nível nacional, sobre a questão da convertibilidade do contrato de trabalho a termo em contrato sem termo no seio da Administração Pública, pronunciou-se, com força obrigatória geral, o Tribunal Constitucional no seu Acórdão nº 368/2000, publicado no Diário da República, I Série-A, de 2000-11-30, no sentido da inconstitucionalidade do Art.º 14.º, n.º 3, do – então – Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de dezembro (na redação anterior ao Decreto-Lei n.º 218/98, de 17 de julho), “na interpretação segundo a qual os contratos de trabalho a termo celebrados pelo Estado se convertem em contratos de trabalho sem termo, uma vez ultrapassado o limite máximo de duração total fixado na lei geral sobre contratos de trabalho a termo, por violação do disposto no n.º 2 do artigo 47.º da Constituição”, bem como, no que concerne aos institutos públicos, se pronunciou também, no seu Acórdão n.º 61/2004, publicado no Diário da República, 1ª Série-A, de 2004-02-27, havendo declarado, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade do Art.º 22.º do Decreto-Lei n.º 342/99, de 25 de agosto, que cria o Instituto Português de Conservação e Restauro, “na medida em que admite a possibilidade de contratação do pessoal técnico superior e do pessoal técnico especializado em conservação e restauro mediante contrato individual de trabalho, sem que preveja qualquer procedimento de recrutamento e seleção dos candidatos à contratação que garanta o acesso em condições de liberdade e igualdade (…)”, também por violação do n.º 2 do Art.º 47.º da Constituição.
O debate à volta do primado do direito comunitário relativamente ao direito constitucional [quanto ao direito ordinário não há dúvidas] de cada Estado-Membro também não tem conduzido a posições uniformes pois, embora o TJCE venha sublinhando o primado do direito comunitário, tem havido reservas por parte de Tribunais de Estados-Membros, nomeadamente, quando estão em causa direitos liberdades e garantias ou os princípios do estado de direito democrático, tal como previsto na CRP, no seu Art.º 8.º, n.º 4 [As disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respetivas competências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático.], aditado pela sexta revisão constitucional, Lei Constitucional n.º 1/2004, de 24 de julho.[14]
In casu, está provado que não existe motivo nem termo válidos para os contratos de trabalho celebrados, nem foi observada a duração máxima, nem o máximo das renovações permitidas.
Dando de barato que a Diretiva foi devidamente transposta e em tempo, importa determinar se o direito pátrio – proibindo na função pública o que estabeleceu no setor privado quanto à conversão dos contratos a termo em contratos por tempo indeterminado – observou o direito comunitário e se o princípio da igualdade deve ser observado no acesso à função pública ou no acesso a todo e qualquer emprego.
A interpretação da Diretiva por forma a obter uma aplicação uniforme em todo o espaço da comunidade, sendo um objetivo deste diploma comunitário, impõe-se como mais uma forma de efetivar a União, principalmente quando há divergências abissais, tanto a nível interno, como comunitário, seja na doutrina, seja na jurisprudência.
Para obviar a estas situações, foi criado um esquema de colaboração entre os tribunais de cada Estado-Membro e o TJCE, com vista a que este forneça a interpretação do direito comunitário que entende conveniente em cada situação que lhe é colocada, denominado de reenvio prejudicial, proporcionando àqueles a interpretação que deverá ser aplicada no caso concreto.
Não tendo a questão sido colocada pelas partes, nada obsta a que o Tribunal da Relação o faça oficiosamente, tanto mais que a decisão a proferir oportunamente não é suscetível de recurso ordinário, dado o valor da causa e a alçada a atender.
Para o efeito, importa enunciar a questão em termos sintéticos, começando por elaborar considerandos e terminando pela formulação das questões, sob a forma de perguntas, como conclusão do despacho do relator a remeter ao TJCE, o que deverá ser submetido a contraditório das partes.[15]
Por isso,
Considerando que o direito nacional proíbe, de modo absoluto, que um contrato de trabalho a termo, celebrado com o Estado, seja convertido em contrato de trabalho por tempo indeterminado, apesar de nele se não indicar nem se terem provado quaisquer razões objetivas para a sua celebração ou apesar de se celebrarem contratos a termo sucessivos e abusivos, mas determina imperativamente a sua conversão se o empregador, pertencendo ao setor privado, agir de igual modo,
Considerando que a Diretiva 1999/70/CE, do Conselho, de 1999-06-28 visa prevenir a celebração de contratos a termo sem motivo objetivo que justifique o termo ou os abusos com a celebração de contratos a termo sucessivos,
Considerando que a Constituição da República Portuguesa prevê no Art.º 47.º, n.º 2 o princípio da igualdade no acesso à função pública, mediante prévio concurso,
Considerando que o Tribunal Constitucional, no seu Acórdão n.º 368/2000, publicado no Diário da República, I Série-A, de 2000-11-30, se pronunciou, com força obrigatória geral, no sentido da inconstitucionalidade de norma “na interpretação segundo a qual os contratos de trabalho a termo celebrados pelo Estado se convertem em contratos de trabalho sem termo, uma vez ultrapassado o limite máximo de duração total fixado na lei geral sobre contratos de trabalho a termo, por violação do disposto no n.º 2 do artigo 47.º da Constituição” e, bem assim, no âmbito de um Instituto Público [Instituto Português de Conservação e Restauro], se pronunciou, no seu Acórdão n.º 61/2004, publicado no Diário da República, 1ª Série-A, de 2004-02-27, com força obrigatória geral, no sentido da inconstitucionalidade de norma [Art.º 22º do Decreto-Lei n.º 342/99, de 25 de agosto], “na medida em que admite a possibilidade de contratação do pessoal técnico superior e do pessoal técnico especializado em conservação e restauro mediante contrato individual de trabalho, sem que preveja qualquer procedimento de recrutamento e selecção dos candidatos à contratação que garanta o acesso em condições de liberdade e igualdade (…)”, também por violação do n.º 2 do Art.º 47.º da Constituição e
Considerando que a Constituição da República Portuguesa prevê no Art.º 53.º o princípio da segurança no emprego,
Pergunta-se:
1) É conforme ao direito comunitário, nomeadamente aos objetivos da Diretiva 1999/70/CE, do Conselho, de 1999-06-28, uma legislação nacional que proíbe, de modo absoluto, que um contrato de trabalho a termo, celebrado com o Estado, seja convertido em contrato de trabalho por tempo indeterminado, apesar de não se terem indicado nem provado quaisquer razões objetivas para a sua celebração ou apesar de se terem celebrado contratos a termo sucessivos e abusivos, mas determina imperativamente a sua conversão se o empregador, pertencendo ao setor privado, agir de igual modo?
2) Sendo a resposta negativa, deverá o juiz nacional acatar tal interpretação do TJCE, mesmo que ela colida com o princípio da igualdade no acesso à função pública, mediante prévio concurso, previsto no Art.º 47.º, n.º 2 da CRP?
3) E deverá o juiz nacional acatar tal interpretação do TJCE mesmo que ela colida com a interpretação que desse Art.º 47.º, n.º 2 da CRP, é feita, com força obrigatória geral, pelo Tribunal Constitucional Português ao considerar inconstitucional, por violação desse preceito, norma que admita a conversão do contrato de trabalho a termo, celebrado com o Estado, em contrato de trabalho por tempo indeterminado, nas circunstâncias perguntadas em 1)?
4) Ou, sendo a resposta negativa, deverá o juiz nacional acatar tal interpretação do TJCE, mesmo que ela colida com o princípio da igualdade no acesso à função pública, mediante prévio concurso, mas esteja de acordo com o princípio da segurança no emprego, previstos nos Art.ºs, respetivamente, 47.º, n.º 2 e 53.º da CRP?
A resposta a estas questões é essencial para se aferir se o contrato dos autos é nulo ou se é nulo apenas o termo nele aposto, pois no primeiro caso trata-se de aplicar estritamente as consequências previstas na legislação que regula o contrato de trabalho a termo celebrado com pessoas coletivas de direito público, enquanto no segundo caso se trata de aplicar ao caso dos autos as consequências previstas na legislação do setor privado – LCCT e CT2003 – para os contratos a termo em que este é nulo ou inexistente ou para os contratos a termo sucessivos e abusivos. Assim e no primeiro caso, sendo nulo o contrato, na quantificação dos direitos reclamados ter-se-á de atender à data da notificação da contestação ao A. ou, quando muito, à data da sentença e, na segunda hipótese, dever-se-á atender à data do trânsito em julgado da decisão do processo.
Decisão.
Termos em que se acorda em:
I - Negar parcial provimento à apelação da R.
II - Negar parcial provimento ao recurso subordinado do A.
III - Considerar prejudicado, por ora, o conhecimento do agravo e
IV - Suscitar perante o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias - suspendendo a instância até decisão a proferir por esse Tribunal - as seguintes questões prejudiciais:
1) É conforme ao direito comunitário, nomeadamente aos objetivos da Diretiva 1999/70/CE, do Conselho, de 1999-06-28, uma legislação nacional que proíbe, de modo absoluto, que um contrato de trabalho a termo, celebrado com o Estado, seja convertido em contrato de trabalho por tempo indeterminado, apesar de não se terem indicado nem provado quaisquer razões objetivas para a sua celebração ou apesar de se terem celebrado contratos a termo sucessivos e abusivos, mas determina imperativamente a sua conversão se o empregador, pertencendo ao setor privado, agir de igual modo?
2) Sendo a resposta negativa, deverá o juiz nacional acatar tal interpretação do TJCE, mesmo que ela colida com o princípio da igualdade no acesso à função pública, mediante prévio concurso, previsto no Art.º 47.º, n.º 2 da CRP?
3) E deverá o juiz nacional acatar tal interpretação do TJCE mesmo que ela colida com a interpretação que desse Art.º 47.º, n.º 2 da CRP, é feita, com força obrigatória geral, pelo Tribunal Constitucional Português ao considerar inconstitucional, por violação desse preceito, norma que admita a conversão do contrato de trabalho a termo, celebrado com o Estado, em contrato de trabalho por tempo indeterminado, nas circunstâncias perguntadas em 1)?
4) Ou, sendo a resposta negativa, deverá o juiz nacional acatar tal interpretação do TJCE, mesmo que ela colida com o princípio da igualdade no acesso à função pública, mediante prévio concurso, mas esteja de acordo com o princípio da segurança no emprego, previstos nos Art.ºs, respetivamente, 47.º, n.º 2 e 53.º da CRP?
Notifique as partes para em 10 dias dizerem o que se lhes oferecer quanto às questões do reenvio prejudicial, querendo.
Porto, 2013-06-17
Manuel Joaquim Ferreira da Costa
Paula Alexandra Pinheiro Gaspar Leal Sotto Mayor de Carvalho
Maria José Pais de Sousa da Costa Pinto
________________
[1] Atento o disposto no Art.º 707.º, n.º 2 do CPC, na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de agosto, ex vi do disposto nos Art.ºs 11.º, n.º 1 – a contrario sensu – e 12.º, n.º 1, ambos deste diploma.
[2] Cfr. Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, volume V, reimpressão, 1981, págs. 308 a 310 e os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 1986-07-25 e de 1986-10-14, in Boletim do Ministério da Justiça, respetivamente, n.º 359, págs. 522 a 531 e n.º 360, págs. 526 a 532.
[3] Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 480/99, de 9 de novembro.
[4] Nova numeração do artigo – anterior 690.º-A – introduzida pelo diploma referido na nota (1) e aplicável in casu.
[5] Era a seguinte a anterior redação:
1. Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Quais os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ainda ao recorrente, sob pena de rejeição do recurso, indicar os depoimentos em que se funda, por referência ao assinalado na ata, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 522.º-C.
[6] Era a seguinte a anterior redação:
2 - Quando haja lugar a registo áudio ou vídeo, deve ser assinalado na ata o início e o termo da gravação de cada depoimento, informação ou esclarecimento.
[7] Cfr. João de Castro Mendes, in Direito Processual Civil, Recursos, edição AAFDL 1980, págs. 27 a 34, Fernando Amâncio Ferreira, in Manual dos Recursos em Processo Civil, 4.ª edição, 2003, págs. 136 a 140 e 8.ª edição, 2008, págs. 145 a 149, António Santos Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil, Novo Regime, 2007, págs. 90 e 91 e os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 1998-11-25 e de 1999-10-26, in Boletim do Ministério da Justiça, n.ºs e págs., respectivamente, 481/430-436 e 490/250-255.
[8] A sentença foi proferida em 2012-09-03.
[9] Respeitante ao acordo-quadro CES, UNICE e CEEP relativo a contratos de trabalho a termo, in JOCE L175, de 1999-07-10, págs. 43 a 48.
[10] Cfr. João Caupers, in Situação jurídica comparada dos trabalhadores da Administração Pública e dos trabalhadores abrangidos pela legislação do contrato de trabalho, Revista de Direito e de Estudos Sociais, janeiro-junho – 1989, Ano XXXI (IV da 2.ª Série) – N.ºs ½, págs. 243 a 254, Ana Fernanda Neves, in Contratos de trabalho a termo certo e contratos de prestação de serviços na administração pública – situações irregulares – «reintegração», Questões Laborais, Ano II, 1995, N.º 6, Associação de Estudos Laborais, págs. 166 a 182, Francisco Liberal Fernandes, in Sobre a proibição da conversão dos contratos de trabalho a termo certo no emprego público: comentário à jurisprudência do Tribunal Constitucional, Questões Laborais, Ano IX, 2002, N.º 19, Associação de Estudos Laborais, págs. 76 a 95, Jorge Leite, in Contrato de trabalho a prazo: direito português e direito comunitário, Questões Laborais, Ano XIII, 2006, N.º 27, Associação de Estudos Laborais, págs. 1 a 31, Maria do Rosário Palma Ramalho, in Estudos de Direito do Trabalho, Volume I, Almedina, Interseção entre o Regime da Função Pública e o Regime Laboral – Breves Notas, págs. 60 ss., nomeadamente, págs. 85 a 87, Joana Almeida, in Do artigo 348.º do Código do Trabalho à luz do Direito Comunitário, Revista de Direito e de Estudos Sociais, julho-dezembro – 2009, Ano L (XXIII da 2.ª Série) – N.ºs 3/4, págs. 117 ss., Maria João Machado, in A Contratação a Termo na Administração Pública, XI-XII Congresso Nacional de Direito do Trabalho, Memórias, Coordenação de António Moreira, Almedina, 2009, págs. 205 ss., maxime, págs. 221 ss. e Susana Sousa Machado, in Contrato de Trabalho a Termo A Transposição da Diretiva 1999/70/CE para o Ordenamento Jurídico Português: (In)compatibilidades, Coimbra Editora, 2009, maxime, págs. 316 ss.
[11] Cuja fundamentação se transcreve parcialmente:
“…Ao tempo do início de funções, em 2002, vigorava para o contrato individual de trabalho regulado pela LCT, vulgo do regime jurídico do contrato individual de trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 49 408, de 1969-11-24, a LCCT, em cujos Art.ºs 41.º, n.º 2 e 41.º-A, n.º 1 se estatuía para hipóteses paralelas às dos autos, embora ocorridas em contratos celebrados com entidades privadas, a conversão automática da relação jurídica em contrato sem termo, quando nas pessoas coletivas públicas, como vimos na questão anterior, o contrato de trabalho a termo certo … não se converte, em caso algum, em contrato sem termo.
Frente a consequências tão diversas para hipóteses em que o traço diferenciador brigava apenas com a natureza da entidade – pública ou privada – dadora de trabalho, cedo se dividiram as opiniões ao nível da doutrina e da jurisprudência.
É bom que se diga que depois de um período inicial de alguma confusão, a corrente predominante, maxime, ao nível da jurisprudência, firmou-se no sentido da não convertibilidade dos contratos a termo celebrados na admnistração pública, em contratos por tempo indeterminado.
De tal sorte que o Tribunal Constitucional tirou sobre a matéria um aresto com força obrigatória geral, no sentido maioritário indicado, com fundamento essencialmente em que a referida conversão do contrato a termo em contrato sem termo ofendia o princípio da igualdade no acesso à função pública, ínsito no Art.º 47.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa [CRP], para além de criar uma nova forma de ingresso na função pública: contrato individual de trabalho por tempo indeterminado.
Trata-se do Acórdão n.º 368/2000, de 2000-07-11, que decidiu:
“… o Tribunal Constitucional decide declarar inconstitucional, com força obrigatória geral, o artigo 14º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de Dezembro, na interpretação segundo a qual os contratos de trabalho a termo celebrados pelo Estado se convertem em contratos de trabalho sem termo, uma vez ultrapassado o limite máximo de duração total fixado na lei geral sobre contratos de trabalho a termo, por violação do disposto no n.º 2 do artigo 47º da Constituição”.
Tal aresto, embora com força obrigatória geral, obteve a maioria derivada apenas do voto do seu Presidente, tendo merecido o seguinte voto de vencido do Exm.º Conselheiro Bravo Serra:
“Entendendo que a norma declarada inconstitucional no presente aresto não padece de um tal vício, votei vencido quanto à decisão agora tomada.Cumpre, por isso, indicar, embora sinteticamente, os motivos deste meu voto dissidente.
Muito embora se não possa asseverar que, constitucionalmente, o regime da «função pública» aponte para a perpetuidade do exercício de funções na Administração por banda dos respetivos trabalhadores, isso não significa que a garantia da segurança no emprego postulada pelo artigo 53º da Lei Fundamental lhes não seja aplicável, pelo que, para se usarem algumas das palavras do Acórdão deste Tribunal nº 285/92 (in Diário da República, 1ª Série-A, de 17 de Agosto de 1992), no plano daquela garantia constitucional, eles dela beneficiam de idêntico modo do "que usufruem os trabalhadores submetidos ao contrato individual de trabalho", não obstando a essa conclusão "numa primeira análise, a especial relação estatutária" que os envolve.
Sendo embora certo que a contratação a termo de trabalhadores por parte da Administração Pública tem por finalidade legal unicamente a de ocorrer a necessidades pontuais e não permanentes de serviço, menos certo não é que se assiste e tem assistido a que aquela Administração se tem servido do labor desempenhado por tais trabalhadores por períodos muito dilatados, o que, ao fim e ao resto, vem conduzir a que licitamente se possa concluir que aquela finalidade não tem sido, em bom rigor, a iluminante da celebração e perduração de inúmeros contratos celebrados com variados trabalhadores em vários serviços da aludida Administração.
Por isso, uma tal prática conduz, desde logo, no limite e por um raciocínio ad absurdum, a que - em face da aceitação da tese, acolhida no acórdão a que a presente declaração se encontra apendiculada, da compatibilidade constitucional da norma em apreço - a Administração possa, fundada tão só num argumento de ocorrência daquelas necessidades (e que, porventura, poderá não corresponder à realidade), começar a desempenhar assinalável parte das suas funções pelo recurso a meios humanos meramente vinculados por contratos de trabalho a termo certo, ficando, desta arte, com o poder de, ad libitum, dispensar qualquer trabalhador. Ora, a ocorrer esta situação, possível será a satisfação de uma abundante fatia das incumbências da Administração por parte de um acentuado número de meios humanos aos quais, minimamente, não é concedida a garantia que deflui do artigo 53º da Constituição, sendo que não foi o próprio Estado que, ciente que estava das carências dos lugares dos seus quadros e da manutenção no tempo das necessidades dos serviços - que implicariam o aumento daqueles quadros -, curou de prover quanto a esse aumento.
E nem se diga que se não deve transpor para o contrato de que nos ocupamos a consideração de que no âmbito laboral privado, a «conversão» dos contratos a termo certo em contratos sem prazo, decorridos que sejam determinadas prorrogações daqueles, deve ser perspetivada como uma sanção pelo uso de artifício da entidade patronal que se «serviu» daqueles contratos e da respetiva manutenção para além do prazo legalmente estabelecido para, provavelmente, prover à satisfação de necessidades permanentes de serviço. É que, na realidade das coisas, não se vê como se possa, por um lado, inferir no sentido de haver um provimento de satisfação de necessidades permanentes de serviço quando uma entidade patronal privada excede o período máximo de renovação dos contratos de trabalho a termo e, por outro, que uma tal inferência já não seja cabida quando a Administração se vai também servir dessa renovação, múltiplas vezes muito para além daquele período máximo que se encontra estatuído para o regime privatístico do contrato de trabalho a termo.
É também certo que a «conversão» de que nos ocupamos não pode ser visualizada como o único ou, sequer, o meio indispensável para se assegurar a garantia decorrente do artigo 53º da Constituição; simplesmente, no que tange ao regime dos contratos celebrados a termo certo pela Administração, o que se torna indubitável é que nenhum outro meio dele se extrai e de onde, principalmente na vertente do trabalhador, se possa considerar como servindo, atuando ou funcionando ao jeito de um óbice à sua insegurança no emprego.
Tendo em conta a progressiva aproximação do regime dos «trabalhadores da função pública» com o regime laboral comum privatístico, o que é certo é que, com a declaração de inconstitucionalidade ora operada neste aresto, isso vai representar, se não uma desigualdade constitucionalmente censurável, pelo menos uma dissemelhança eivada de injustiça, quando é certo que o Estado - no exercício do seu poder legiferante e em que não pode deixar de ter em conta comandos constitucionais tão relevantes como os tocantes a direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores - vem impor que nas relações laborais privadas, passados que sejam três anos, os contratos a termo celebrados sem interrupção se «convertam» em contratos sem termo.
Não está em causa, como é evidente, questionar a compatibilidade constitucional da celebração, no âmbito da Administração Pública, de contratos a termo certo; o que está, isso sim, é saber se, à míngua de qualquer meio que, no respetivo regime, possa ser surpreendido como obstaculante da insegurança no emprego decorrente da possibilidade de, em qualquer altura, ser cessado esse contrato após terem ocorrido variadas prorrogações dele, a interpretação que veio a ser perfilhada na decisão impugnada, de um lado, é asseguradora da garantia proclamada pelo artigo 53º da Constituição e, de outro, se essa mesma interpretação vai violar a Lei Fundamental.
Por outro lado, e é isto que ora releva, não se me afigura que, contrariamente ao que é defendido maioritariamente neste acórdão, a norma em crise constitua infração ao nº 2 do artigo 47º da Constituição.
De facto, e não se deixando de anotar os problemas (de que, por entre outros, dão conta Gomes Canotilho e Vital Moreira na Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª edição, 264) que se podem levantar acerca do conceito de função pública utilizado naquele normativo constante do Diploma Básico, não posso deixar de sublinhar que a via de concurso como meio de acesso àquela função não é algo imperativamente consagrado na Lei Fundamental, e isso pela singela razão segundo a qual o que naquela disposição se prescreve é que tal via deve, em regra, ser utilizada, não se dizendo, assim, que a regra do concurso é a única utilizável.
Depois, e seja como for, se se admitir que naquele conceito de função pública cabe o exercício de qualquer atividade ao serviço de uma pessoa coletiva pública qualquer que seja o regime jurídico da relação de emprego e independentemente do seu caráter provisório ou definitivo, permanente ou transitório (para se usarem as palavras dos autores citados), então há que reconhecer que, se se postergou o concurso como meio de recrutamento e seleção de pessoal em condições idênticas à da recorrida, isso deveu-se, afinal, a um comportamento da Administração, que desse pessoal se serviu por um lapso de tempo não diminuto (e pelo menos com mais de três prorrogações). A violação da regra do concurso não se situaria, dessa sorte, na norma em análise, mas, em retas contas, numa atuação da Administração que, servindo-se de preceitos permissivos da contratação a termo certo com vista à satisfação de necessidades temporárias, sazonais e excecionais, os foi utilizar para um desenvolvimento das suas normais atividades.
Ainda depois, não se pode passar em claro que, mesmo no âmbito da celebração de contratos a termo certo, a oferta de emprego não deixa de ser objeto de publicitação, a ela, portanto, os demais interessados se podendo candidatar, e que o pessoal a contratar deve ser adequadamente habilitado e qualificado para o desempenho de funções (cfr. artº 19º do Decreto-Lei nº 427/89), pelo que, neste particular, se não lobrigam, a nível substancial, quaisquer abissais diferenças no que concerne à orientação e satisfação do interesse público, à natureza e intensidade dos interesses a ponderar e o direito a um procedimento justo de recrutamento e seleção quanto aos «trabalhadores da função pública» comparativamente com os trabalhadores do setor privado.
Mas, mesmo que fosse aceitável - e para mim não o é - a tese, aqui seguida maioritariamente, da inconstitucionalidade da norma sub specie, justamente com base na consideração de que ela viola a via do concurso, não seria porventura dispiciendo, efetuar-se uma ponderação de valores ou um raciocínio de concordância prática entre a eventual violação do desiderato constitucional de vinculação da Administração em prejuízo da discricionariedade quanto ao recrutamento e seleção do pessoal (como forma de assegurar neste e nesta igualdade e transparência) e a garantia implicada pelo artigo 53º da Constituição, em termos de preponderância desta última.
Igualmente me não parece colher uma argumentação fundada em que a «conversão» dos contratos a termo certo, ultrapassado que fosse determinado período em que os mesmos foram objeto de prorrogação, iria consequenciar uma contradição com a «taxatividade» legal das vias de acesso à função pública.
É que não só essa «taxatividade» não decorre do Diploma Básico, como ainda, a entender-se que a norma ínsita no nº 3 do artº 14º do Decreto-Lei, no ponto em que remete para a lei geral sobre os contratos de trabalho, teve a adequada cobertura parlamentar, então uma interpretação que, fundada nessa lei geral - e porque nada se retira das palavras de qualquer dos normativos vertidos naquele diploma que aponte para se vedar a «conversão» dos contratos a termo certo - admitisse tal «conversão», ainda se moveria adequadamente dentro da opção parlamentar consistente na remissão para a mencionada lei geral.
Por último, e talqualmente foi defendido pelo Ex.mo Conselheiro Luís Nunes de Almeida na sua declaração de voto aposta ao Acórdão nº 683/99, também propendo para entender que, com a decisão ora tomada quanto à norma em apreciação vai, de forma particularmente acentuada, brigar com o conteúdo essencial da garantia constitucional da segurança no emprego e com os princípios do Estado de direito democrático prescrito no artigo 2º da Lei Fundamental.
De facto, como se acentuou nessa declaração, ao se considerar - como no vertente aresto se considera, retomando o que foi dito no Acórdão nº 683/99 - que o direito à segurança no emprego, consagrado no artigo 53º da Constituição, não imporá, necessariamente, mesmo para os trabalhadores com contrato a termo certo regulado pelo direito privado, a previsão de uma sanção da conversão destes contratos em contratos de trabalho sem termo, como único meio de garantir tal segurança, sendo suficiente um regime de indemnização condicionado à existência de "danos pela dificuldade em encontrar trabalho subsequentemente", isso significa a adoção de um entendimento que, "para além de reduzir a segurança no emprego a uma vertente meramente económica", e de não explicar qual o meio legal em que se estribe esse regime indemnizatório, "permite, pela largueza da sua permissividade, a futura adoção de soluções legislativas em que a referida segurança no emprego venha a ser pura e simplesmente substituída por um mero sucedâneo indemnizatório – e isto, não só no que respeita aos contratos a termo certo, como também em relação aos contratos sem termo".
E, também como se disse na aludida declaração, é de assinalar que o raciocínio segundo o qual seria constitucionalmente inadmissível converter automaticamente os contratos a termo certo em contratos de trabalho por tempo indeterminado, no âmbito da Administração Pública, levaria ou, ao menos, pareceria "inviabilizar – mesmo ao legislador – a solução de uma situação de flagrante injustiça, cujo único responsável é o próprio Estado", o que, seguramente, é algo que se posta como conflituante com os falados princípios do Estado de direito democrático.”.
Porém, já anteriormente, pela Lei n.º 25/98, de 26 de maio, seu Art.º 2.º, havia sido aditado ao Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de junho, o seguinte:
Artigo 11.º-A
Contratação de pessoal sob o regime do contrato individual de trabalho
1 — As atividades de limpeza nos serviços e organismos da Administração Pública podem ser asseguradas através da contratação de serviços com empresas.
2 — O pessoal que integra o grupo de pessoal auxiliar pode ser contratado sob o regime do contrato individual de trabalho, quando a duração semanal do trabalho não exceder dois terços do horário normal fixado para a Administração Pública, sendo obrigatoriamente inscrito no regime geral de segurança social, salvo se já estiver inscrito na Caixa Geral de Aposentações.
Cremos que de tal aditamento resulta claramente a intenção do legislador de criar uma nova modalidade de emprego com pessoas coletivas públicas, no figurino do contrato individual de trabalho, seja a termo ou por tempo indeterminado, mas sujeito ao regime jurídico geral, que ao tempo da celebração dos três primeiros contratos dos autos era o regime jurídico aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de fevereiro, a LCCT.
Na verdade, para o pessoal auxiliar com período de trabalho semanal igual ou inferior a 2/3 de 35 horas, estabeleceu o legislador uma modalidade nova de emprego na Administração Pública, regulada pelo referido regime geral. De facto, se esse não fosse o escopo do legislador, em vez de se reportar ao regime do contrato individual de trabalho, teria referido apenas o contrato de trabalho por tempo indeterminado, já que o contrato de trabalho a termo já constituía uma modalidade de contrato no Estado desde a redação originária do diploma referido. Daí que se nos afigure que houve a intenção de criar uma modalidade especial de contrato para acudir a necessidades específicas, como são os serviços de limpeza de instalações, prestados por pessoal auxiliar, em período de trabalho igual ou inferior a 2/3 do período normal de trabalho semanal, 35 horas. Embora se trate de processo legiferante ínvio, o que se afirma com o devido respeito, pois se cria uma modalidade especial de prestação de trabalho no Estado com uma regulamentação que, para além de ser geral, é de natureza privada, cremos que esta é a interpretação razoável que cabe à norma resultante do aditamento do Art.º 11.º-A ao referido diploma.
Posteriormente, veio a ser publicada a Lei n.º 23/2004, de 22 de junho, que tem por objeto a definição do regime jurídico do contrato de trabalho nas pessoas coletivas públicas, conforme dispõe o seu Art.º 1.º, n.º 1 e que estabeleceu como modalidade de contrato de pessoal com as mesmas pessoas coletivas públicas, ao lado de outras anteriormente previstas, o contrato individual de trabalho por tempo indeterminado. Na verdade, o contrato de trabalho a termo previsto no Art.º 7.º, n.º 2, alínea b) do Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de junho e no Art.º 14.º, n.º 1, alínea b) do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de dezembro, foi substituído pelo contrato de trabalho em qualquer das suas modalidades pelos Art.ºs, respetivamente, 28.º e 29.º da Lei n.º 23/2004, de 22 de Junho, dispondo esta, ainda, o seguinte:
Artigo 2.º
Regime jurídico
1 — Aos contratos de trabalho celebrados por pessoas coletivas públicas é aplicável o regime do Código do Trabalho e respetiva legislação especial, com as especificidades constantes da presente lei.
2 — O contrato de trabalho com pessoas coletivas públicas não confere a qualidade de funcionário público ou agente administrativo, ainda que estas tenham um quadro de pessoal em regime de direito público.
Ora, assim sendo, permitido por via de regra o contrato de trabalho sem termo, parece claro que com esta – chamada – privatização da Administração Pública, desaparece o fundamento essencial em que assentou o referido aresto.
Por outro lado, a proibição da conversão do contrato a termo em contrato por tempo indeterminado, prevista nos Art.ºs 18.º, n.º 4 do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de dezembro e no Art.º 10.º, n.º 2 da Lei n.º 23/2004, de 22 de junho, perde a sua razão de ser a partir do momento em que é sempre admitido o trabalho com pessoas coletivas públicas através de qualquer das modalidades que o contrato de trabalho possa revestir. Na verdade, não faz sentido proibir a conversão quando a lei admite o contrato de trabalho em qualquer das suas modalidades, isto é, a norma carece de fundamento material.
Assim, considerando esta evolução legislativa, bem os fundamentos constantes da douta declaração de voto acima transcrita, cremos que a referida proibição de conversão do contrato de trabalho a termo em contrato por tempo indeterminado ofende o princípio da segurança no emprego, ínsito no Art.º 53.º da CRP, maxime, numa situação como a dos autos em que a relação laboral se estendeu por vários anos. Daí que, em vez do princípio da igualdade no acesso à função pública, se tenha de atender ao da igualdade no acesso ao emprego, seja ele público ou privado.
A discussão da matéria tem vindo a ser recentrada, nos tempos mais recentes, ao nível do direito comunitário, sendo chamada a debate a DIRETIVA 1999/70/CE do CONSELHO, de 28 de junho de 1999, respeitante ao acordo-quadro CES, UNICE e CEEP relativo a contratos de trabalho a termo.
Como consta do seu considerando (14), “As partes signatárias pretenderam celebrar um acordo-quadro relativo a contratos de trabalho a termo enunciando os princípios gerais e as prescrições mínimas em matéria de contratos e relações de trabalho a termo. Manifestaram a sua vontade de melhorar a qualidade do trabalho com contrato a termo, garantindo a aplicação do princípio da não discriminação, e de estabelecer um quadro para impedir os abusos decorrentes da utilização de sucessivos contratos de trabalho ou relações laborais a termo;”
Tal Diretiva estabeleceu como data limite para a sua transposição para o direito interno, a de 10 de julho de 2001, como resulta do seu Art.º 2.º, § 1.º.
Por outro lado, o Acordo Quadro CES, UNICE e CEEP relativo a contratos de trabalho a termo, anexo à mesma Diretiva, estabelece o seguinte:
(artigo 1.º)
Objetivo
O objetivo do presente acordo-quadro consiste em:
a) Melhorar a qualidade do trabalho sujeito a contrato a termo garantindo a aplicação do princípio da não discriminação;
b) Estabelecer um quadro para evitar os abusos decorrentes da utilização de sucessivos contratos de trabalho ou relações laborais a termo.
(artigo 5.º)
Disposições para evitar os abusos
1. Para evitar os abusos decorrentes da conclusão de sucessivos contratos de trabalho ou relações laborais a termo e sempre que não existam medidas legais equivalentes para a sua prevenção, os Estados-Membros, após consulta dos parceiros sociais e de acordo com a lei, acordos coletivos ou práticas nacionais, e/ou os parceiros sociais deverão introduzir, de forma a que se tenham em conta as necessidades de setores e/ou categorias de trabalhadores específicos, uma ou várias das seguintes medidas:
a) Razões objetivas que justifiquem a renovação dos supramencionados contratos ou relações laborais;
b) Duração máxima total dos sucessivos contratos de trabalho ou relações laborais a termo;
c) Número máximo de renovações dos contratos ou relações laborais a termo.
2. Os Estados-Membros, após consulta dos parceiros sociais, e/ou os parceiros sociais, deverão, sempre que tal seja necessário, definirem que condições os contratos de trabalho ou relações de trabalho a termo deverão ser considerados:
a) Como sucessivos;
b) Como celebrados sem termo.
Esta Diretiva foi transposta para o direito interno pela Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, que aprovou o Cód. do Trabalho, como flui do seu Art.º 2.º, alínea n).
Cremos, no entanto, que em nenhum outro diploma surge idêntica declaração de transposição, embora admitamos que tenha havido o propósito de a realizar.
Aponta nesse sentido o disposto nos Art.ºs 41.º e 41.º-A, ambos do regime jurídico aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de fevereiro, LCCT, resultantes da redação que lhes foi dada pela Lei n.º 18/2001, de 3 de julho, em que se prevê a transformação do contrato a termo em contrato por tempo indeterminado. Aqui terá ocorrido a transposição da Diretiva referida.
No entanto, no domínio do contrato de trabalho celebrado com pessoas coletivas públicas, cremos que a transposição não foi efetuada, na medida em que a conversão é expressamente proibida.
Claro está que, segundo algumas vozes, a norma do n.º 5 do Art.º 18.º do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de dezembro, segundo o qual “A celebração de contrato de trabalho a termo certo com violação do disposto no presente diploma implica a sua nulidade e constitui os dirigentes em responsabilidade civil, disciplinar e financeira pela prática de atos ilícitos, sendo ainda fundamento para a cessação da comissão de serviço nos termos da lei”, a que genericamente corresponde o disposto no Art.º 10.º, n.º 3 da Lei n.º 23/2004, de 22 de junho, seria suficiente para prevenir os abusos que a Diretiva pretende evitar, na medida em que seria efetivamente dissuasora.
Cremos, porém, que assim não é, nem tem acontecido entre nós.
Na verdade, como é conhecido, nomeadamente, na nossa prática judiciária, os contratos de trabalho a termo sucessivos na Administração Pública proliferam, sem que se consiga perceber a razão pela qual, tendo eles caráter excecional, face ao declarado na lei, nos surjam com tanta frequência. Tal será, eventualmente, explicável porque a legal responsabilidade civil, disciplinar e financeira surge apenas a jusante, nada prevenindo em cada caso concreto. Assim, para além de não ser eficaz como pretende a Diretiva, a responsabilidade civil do dirigente, a ser atuada, apenas poderia estabelecer uma indemnização para o trabalhador, o que é insuficiente para o cumprimento do princípio da segurança no emprego, ínsito no Art.º 53.º da CRP, pois este exige a possibilidade de reintegração, in casu, a conversão do contrato de trabalho a termo em contrato de trabalho por tempo indeterminado. Por isso, não acompanhamos aqueles que entendem que a Diretiva apenas estabelece normas gerais, dirigidas aos Estados-Membros ou que estes apenas têm o dever de as criar e, não, a obrigação de estes adotarem medidas concretas e eficazes que previnam efetivamente, portanto, logo a montante, o uso abusivo de contratos de trabalho a termo sucessivos e sem estarem escorados em razões objetivas.
De igual modo, discordamos daqueles que entendem que uma medida como o estabelecimento da responsabilidade civil, disciplinar e financeira, é suficiente e cumpre os objetivos comunitários. Na verdade, pelo menos entre nós e tanto quanto sabemos, nunca um dirigente da função pública foi chamado a responder nesses termos, perante um trabalhador precário, maxime, civilmente, pelos danos sofridos com a cessação do contrato.
Aliás, como refere Paulo Veiga e Moura, “A Lei 98/97, de 26 de agosto, veio eliminar definitivamente a última particularidade da contratação a termo certo pela Administração Pública, consubstanciada na exigência, anteriormente constante do art. 13.º/1/b da Lei 86/89, da celebração dos contratos a termo certo ter de obter o visto prévio do Tribunal de Contas”.
Daí que, a nosso ver, seja de seguir o entendimento sufragado no Acórdão do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, de 2006-07-04, Processo n.º C-212/04, cujo sumário parcialmente se transcreve:
“2. O artigo 5.°, n.° 1, alínea a), do acordo-quadro relativo a contratos de trabalho a termo, celebrado em 18 de março de 1999, anexo à Diretiva 1999/70, respeitante ao acordo-quadro CES, UNICE e CEEP relativo a contratos de trabalho a termo, disposição relativa às razões objetivas suscetíveis de justificar a renovação dos contratos ou das relações de trabalho a termo, deve ser interpretado no sentido de que se opõe à utilização de contratos a termo sucessivos justificada pelo simples facto de estar prevista por uma disposição legal ou regulamentar geral de um Estado-Membro. Pelo contrário, o conceito de «razões objetivas» na aceção do referido artigo impõe que o recurso a esse género específico de relações de trabalho, como previsto pela legislação nacional, se justifique pela existência de elementos concretos relacionados, designadamente, com a atividade em causa e as respetivas condições de exercício.
Com efeito, uma disposição nacional que se limitasse a autorizar, de modo geral e abstrato, através de uma norma legislativa ou regulamentar, o recurso a contratos a termo sucessivos pode gerar um risco real de recurso abusivo a esse tipo de contratos, pelo que não é compatível com o objetivo e com o efeito útil do acordo-quadro. Assim, admitir que uma disposição nacional pudesse, de pleno direito e sem outra especificação, justificar contratos a termo sucessivos levaria à violação da finalidade do acordo-quadro, que consiste em proteger os trabalhadores contra a instabilidade do emprego, e a esvaziar de conteúdo o princípio de que os contratos sem termo constituem a regra nas relações de trabalho. Mais especificamente, o recurso a contratos a termo tendo por único fundamento uma disposição legal ou regulamentar geral, sem relação com o conteúdo concreto da atividade em causa, não permite estabelecer critérios objetivos e transparentes para efeitos de verificar se a renovação desses contratos responde efetivamente a uma verdadeira necessidade e é apta e necessária para atingir o objetivo prosseguido.
3. O artigo 5.°, n.° 1, alínea a), do acordo-quadro relativo a contratos de trabalho a termo, celebrado em 18 de março de 1999, anexo à Diretiva 1999/70, respeitante ao acordo-quadro CES, UNICE e CEEP relativo a contratos de trabalho a termo, disposição relativa às medidas destinadas a evitar a utilização abusiva de contratos de trabalho a termo sucessivos, deve ser interpretada no sentido de que se opõe a uma legislação nacional, que considera que apenas os contratos ou relações de trabalho a termo que não tenham entre si um intervalo superior a 20 dias úteis devem ser qualificados de «sucessivos» na aceção do referido artigo.
Com efeito, essa legislação nacional deve ser considerada como suscetível de pôr em causa o objeto, a finalidade e o efeito útil do acordo-quadro, porque um conceito tão rígido e restritivo do caráter sucessivo de vários contratos de trabalho subsequentes permitiria contratar trabalhadores precariamente durante anos, uma vez que, na prática, na maior parte dos casos, o trabalhador não teria outra opção senão aceitar interrupções de 20 dias úteis enquadradas numa cadeia de contratos com a sua entidade patronal. Além disso, uma legislação nacional deste tipo pode ter por consequência não só excluir, de facto, um grande número de relações de trabalho a termo da proteção pretendida pela Diretiva 1999/70 e pelo acordo-quadro, esvaziando o objetivo por estes prosseguido de grande parte da sua substância, mas também permitir a utilização abusiva dessas relações de trabalho pelas entidades patronais.
4. O acordo-quadro relativo a contratos de trabalho a termo, celebrado em 18 de março de 1999, anexo à Diretiva 1999/70, respeitante ao acordo-quadro CES, UNICE e CEEP relativo a contratos de trabalho a termo, deve ser interpretado no sentido de que, na medida em que a ordem jurídica do Estado-Membro em causa não preveja, para o setor em questão, outra medida efetiva para evitar e, sendo caso disso, punir a utilização abusiva de contratos a termo sucessivos, o acordo-quadro se opõe à aplicação de uma legislação nacional que proíbe de modo absoluto, apenas no sector público, a conversão em contratos sem termo de contratos de trabalho a termo sucessivos que, de facto, se destinaram a satisfazer «necessidades estáveis e duradouras» da entidade patronal e devem ser considerados abusivos.
5. No caso de uma diretiva ser transposta para a ordem jurídica do Estado-Membro em causa fora do prazo e de as suas disposições pertinentes não terem efeito direto, os tribunais nacionais, na medida do possível, devem interpretar o direito interno, a partir do termo do prazo de transposição, à luz do teor e da finalidade da diretiva em causa, para alcançar os resultados por esta prosseguidos, privilegiando a interpretação das normas nacionais mais conforme a essa finalidade, de modo a chegar, assim, a uma solução compatível com as disposições da referida diretiva.
Daqui decorre necessariamente que, nessa situação, a data em que as medidas nacionais de transposição entram efetivamente em vigor no Estado-Membro em causa não é o critério pertinente. Com efeito, essa solução seria susceptível de pôr gravemente em causa a plena eficácia do direito comunitário e a sua aplicação uniforme, nomeadamente por meio das diretivas. Por outro lado, a partir da data em que uma diretiva entra em vigor, os tribunais dos Estados-Membros devem abster-se, na medida do possível, de interpretar o direito interno de modo suscetível de comprometer seriamente, depois do termo do prazo de transposição, o objetivo prosseguido por essa diretiva.”
A nosso ver, este entendimento não contraria o disposto no Art.º 47.º, n.º 2 da CRP pelas razões que têm sido apontadas: o ingresso através de concurso não é absoluto pois sendo marcado por via de regra, sempre comportará exceções; no entanto e apesar disso, o ingresso através de contrato individual sem termo é feito através de concurso mais ou menos complexo; acresce que o trabalhador que ingressa por esta via não adquire a qualidade de agente administrativo.
Ao contrário, este entendimento está de acordo com o princípio da segurança no emprego, atento o disposto no Art.º 53.º da CRP, pois permite manter efetivamente o emprego, por via da conversão, superando as limitações decorrentes da mera responsabilidade civil do dirigente que, aliás, como referido, nunca vimos atuada.
Daí que se nos afigure que as normas constantes dos Art.ºs 18.º, n.º 4 do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de dezembro e 10.º, n.º 2 da Lei n.º 23/2004, de 22 de junho, ao proibirem a conversão do contrato de trabalho a termo celebrado com pessoas coletivas públicas, em contrato por tempo indeterminado, são inconstitucionais, por ausência de fundamento material, por violarem o disposto no Art.º 53.º da CRP.
Faz, destarte, todo o sentido o entendimento constante do acórdão do TJCE, cujo sumário acima se transcreveu parcialmente, por traduzir a forma de dar cabal cumprimento aos objetivos do acordo quadro e da Diretiva, já várias vezes referidos.
Trata-se de fazer a harmonização do direito mínimo relativo a contratos a termo em cada um dos Estados-Membros da Comunidade Europeia sendo que, no nosso caso, tal harmonização é conforme a CRP, não existindo assim qualquer dissonância entre os dois ordenamentos jurídicos: nacional e comunitário.
No entanto, mesmo que existisse, deveria prevalecer o primado do regime jurídico europeu, incluindo Diretivas, sobre o estatuído em normas de direito interno, incluindo normas constitucionais, sem prejuízo da reserva constitucional de respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático estipulada no Art.º 8.º, n.º 4 da C.R.P., segundo o qual, “As disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respetivas competências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático.”.
Nesta conformidade, não tendo o Estado Português transposto a Diretiva para o direito interno no que concerne aos contratos a termo no setor público, deve o Juiz Nacional interpretar e aplicar o direito pátrio de acordo com as normas do direito comunitário, bastando in casu aplicar a regra que vigora no setor privado, que consiste na conversão do contrato a termo em contrato sem termo: Art.ºs 41.º, n.º 2 e 41.º-A, n.º 1 da LCCT, resultantes da Lei n.º 18/2001, de 3 de julho.
Ora, não lhes tendo sido aposto qualquer motivo justificativo, para além de serem sucessivos, os contratos de trabalho dos autos celebrados durante os anos de 2002 a 2005 devem ser considerados como um único contrato de trabalho e por tempo indeterminado, sobretudo em função das vicissitudes que acompanharam a celebração e a execução dos três primeiros.…”.
[12] Acórdão do TJCE de 2006-07-04, Processo C-212/04, in www.curia.europa.eu.
[13] Acórdão do TJCE de 2006-09-07, Processo C-180/04, in www.curia.europa.eu.
[14] Cfr. Francisco Liberal Fernandes, in Transmissão do estabelecimento e oposição do trabalhador à transferência do contrato: uma leitura do art. 37.º da LCT conforme o direito comunitário, Questões Laborais, Ano VI, 1999, N.º 14, Associação de Estudos Laborais, págs. 213 ss., nomeadamente a págs. 223, nota (20), Maria João Palma e Luís Duarte d’Almeida, in Direito Comunitário, AAFDL, Lisboa, 2000, págs. 117 a 123 e Miguel Gorjão-Henriques, in Direito Comunitário, Almedina, 2001, págs. 202 a 208.
[15] Cfr. a Resolução do Parlamento Europeu, de 2008-07-09, sobre o papel do juiz nacional no sistema jurisdicional europeu (2007/2007(INI)), in JOUE C 294-E, de 2009-12-03, págs. 27 a 32 e a Nota Informativa relativa à apresentação de pedidos de decisão prejudicial pelos órgãos jurisdicionais nacionais, in JOUE C 297, de 2009-12-05, págs. 1 a 6.
Cfr. também Miguel Almeida Andrade, in Guia Prático do Reenvio Prejudicial, Gabinete de Documentação e Direito Comparado, Lisboa, 1991, Rui Manuel Gens de Moura Ramos, in Das Comunidades À União Europeia Estudos de Direito Comunitário, 2.ª edição, Coimbra Editora, págs. 222 ss., Miguel Gorjão-Henriques, in Direito Comunitário, Almedina, 2001, págs. 287 a 299, Sónia Kietzmann Lopes, in O Juiz do Trabalho como Juiz de Direito da União Europeia, em Especial, as Questões Prejudiciais na Jurisdição Laboral, CEJ, Prontuário de Direito do Trabalho, 88/89, janeiro-abril/maio-agosto de 2011, págs. 239 a 248 e Miguel Lopes Lourenço, in Reenvio Prejudicial e o Futuro Tribunal Arbitral do Desporto – Breves Notas, Desporto & Direito, Revista Jurídica do desporto, Ano IX, maio/agosto 2012, n.º 27, págs. 375 ss.