OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO
CAUSA PREJUDICIAL
DECISÃO SURPRESA
INCONSTITUCIONALIDADE
COMPENSAÇÃO
Sumário

I - Padece de nulidade, por omissão de pronúncia, a sentença em que o juiz deixa de tomar posição expressa sobre questões que deva abordar e resolver.
II - Não pode suspender-se a instância executiva com fundamento em prejudicialidade.
III - Apenas estamos perante uma decisão surpresa quando ela comporte uma solução jurídica que as partes não tenham obrigação de prever.
IV - A norma do art.º 814.º, n.º 2, do CPC, quando interpretada no sentido de limitar a oposição à execução fundada em injunção à qual foi aposta fórmula executória, é inconstitucional por violação do direito de defesa.
V - A compensação, enquanto facto extintivo das obrigações, constitui fundamento de oposição à execução e, não se baseando esta em sentença, pode ser invocada nos mesmos termos e nas mesmas circunstâncias em que poderia ser invocada no processo de declaração.

Texto Integral

TRPorto.
Apelação nº 849/12.1TBVCD-A.P1 - 2013.
Relator: Amaral Ferreira (791).
Adj: Des. Ana Paula Lobo.
Adj.: Des. Deolinda Varão.

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I - RELATÓRIO.

1. Por apenso à execução comum para pagamento de quantia certa, contra ela instaurada no Tribunal Judicial de Vila do Conde, por “B, Ldª”, em que o título executivo é a aposição, em 9/3/2012, pelo secretário de justiça do Balcão Nacional de Injunções, de força executória em requerimento de injunção, deduziu a executada C…, Ldª oposição à execução, que conclui do seguinte modo:
- Deve ser comunicado à Autoridade Tributária, ao abrigo do disposto no artº 280º do Código de Processo Civil, a infracção decorrente da emissão, pela exequente, da nota de débito …, cujo objectivo foi aumentar o valor da factura ….. e não corrigir qualquer incorrecção, em violação do disposto nos artºs 36º e 29º do CIVA;
- Deve ser declarado que pode a oponente opor-se à execução com os mesmos fundamentos que a lei faculta ao réu em processo de declaração, nos termos do artº 816º do Código de Processo Civil;
- Caso assim se não entenda, declarada a inconstitucionalidade dos artºs 814º, nº 2, do Código de Processo Civil, e 14º do Regime Anexo ao DL nº 269/98, de 1/9, se interpretados de forma diversa à constante do acórdão do Tribunal Constitucional nº 658/2006;
- Deve ser absolvida do pedido e declarada a verificação dos pressupostos legais da excepção da compensação do seu crédito sobre a exequente, com a consequente extinção da dívida exequenda na parte correspondente ao seu contra-crédito.
Alega para tanto, e em resumo, que, apesar de a execução se basear na aposição de fórmula executória a injunção a que não deduziu oposição, lhe assiste o direito de se opor através de todos os meios de defesa que seria lícito deduzir no processo de declaração, como foi decidido no acórdão nº 658/2006 do Tribunal Constitucional, ou, se assim se não entender, declarada a inconstitucionalidade dos artºs 814º, nº 2, do Código de Processo Civil, e 14º do Regime anexo ao DL nº 269/98, de 1/9; mais aduz que, invocando a exequente no requerimento de injunção a existência de um crédito proveniente de contrato de compra e venda de produtos, descritos na factura nº ….., no valor de € 5.512,20, e de um crédito constante da nota de débito …, esta corresponde a um acréscimo do preço da factura, pois dela consta referir-se à retirada de 4% de desconto adicional da factura, quando desta resulta o desconto de 0%, o que constitui violação fiscal, e ainda que a exequente não tem direito a cobrar o crédito exequendo porquanto os produtos que lhe foram vendidos não correspondiam ao solicitado, como pretende provar na perícia que requer, facto que lhe provocou os prejuízos que descrimina, nomeadamente por se ter visto obrigada a recorrer a outra fornecedora para cumprir o que acordara com a dona da obra a quem se destinavam os produtos, motivo pelo qual instaurou acção declarativa contra a exequente, que se encontra a correr termos nos Juízos de Média e Pequena Instância Cível do Tribunal da Comarca do Baixo Vouga - Albergaria a Velha - sob o nº 99/12.7T2ALB, acção que constitui causa prejudicial, pelo que, além de não ser devedora da quantia exequenda, deve a mesma ser compensada com o seu contra-crédito sobre a exequente.

2. Conclusos os autos, foi proferida decisão que, declarando conforme à Constituição da República Portuguesa a norma ínsita no nº 2 do artº 814º do Código de Processo Civil, na redacção que lhe foi dada pelo DL nº 226/2008, de 26/11, consequentemente indeferiu liminarmente a oposição à execução, por a compensação só poder ser provada por documento e ainda se encontrar a ser discutida na acção movida pela oponente à oponida/exequente.

3. Inconformada, apelou a oponente que, alegando, formulou as seguintes conclusões:
1ª: A douta Sentença julgou contra o Direito (violando os arts. 18º, 20º, 202º e 204º da CRP), porquanto indeferiu liminarmente a Oposição à Execução da Recorrente, entendendo que os fundamentos vertidos pela Opoente neste articulado não poderiam ser invocados, atento o disposto no art. 814.º n.º 2 do Código de Processo Civil, o que consubstancia uma interpretação inconstitucional, que deverá este Tribunal declarar, revogar a Sentença proferida, devendo a Oposição à Execução da Opoente ser recebida nos termos do art. 816º do CPC.
2ª: Com efeito, não só a norma do art. 814º, nº2 do CPC (na redacção do DL nº 226/2008), ao restringir os meios de oposição e limitar o direito de defesa, é materialmente inconstitucional, por violação do art. 20º da CRP, como inconstitucional, pelo mesmos fundamentos, é a norma contida no artigo 814.º do Código do Processo Civil, na interpretação de limitar a oposição à execução fundada em injunção à qual foi aposta fórmula executória, tudo conforme invocado na Oposição à Execução mas que foi indeferido pela Sentença a quo, a qual deverão Vªs Exas. revogar e, consequentemente, admitir que sejam apreciados, para além dos fundamentos especificados para as sentenças, todos os outros admissíveis como defesa no processo de declaração e que licitamente a Recorrente/Opoente deduziu na sua Oposição à Execução, concretamente, no capítulo “II) DOS FACTOS”a artigos 16º e ss, e que se prendem directamente com a relação material subjacente.
3ª: Na verdade, é hoje praticamente unânime - na Doutrina e a Jurisprudência -, que o Executado poderá, em sede de Oposição à Execução, lançar mão do disposto no art. 816.º do CPC, isto é, de todos os meios de defesa, in casu, excepções dilatórias e peremptórias que poderiam ser invocadas em Oposição à Injunção - tal-qualmente o fez a Recorrente na sua Oposição à Execução liminarmente indeferida -, porquanto tal é o entendimento que melhor se coaduna com o acesso à tutela judicial efectiva, garantia do art. 20º da CRP, sendo certo, que a recente alteração, operada pelo Decreto-Lei 226/2008 de 20 de Novembro em nada veio alterar o que até então era referido pelo Tribunal Constitucional (Acórdão N.º 658/2006 do Tribunal Constitucional, Processo n.º 292/06, 2.ª Secção, em que foi relator o Conselheiro Paulo Mota Pinto. Este Tribunal, tendo nesse aresto por Relator um Ilustre Civilista, julgou Inconstitucional, por violação do princípio da proibição da indefesa ínsito no direito de acesso ao direito e aos tribunais, consagrado no artigo 20.º da Constituição, a norma do artigo 14.º do Regime anexo ao Decreto Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro, na interpretação segundo a qual, na execução baseada em título que resulta da aposição da fórmula executória a um requerimento de injunção, o Executado apenas pode fundar a sua oposição na alegação e prova, que lhe incumbe, de factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado pelo exequente, o qual se tem por demonstrado).
4ª: Aclare-se, que com a alteração operada pelo DL 226/2008 relativamente ao art. 814.º do CPC, a questão da inconstitucionalidade manteve-se intacta e foi invocada na nossa Oposição à Execução, pese embora indeferida tal arguição pelo Tribunal a quo, ao arrepio, aliás, de abundante jurisprudência (A norma do art. 814º, nº2 do CPC (na redacção do DL nº 226/2008), ao restringir os meios de oposição e limitar o direito de defesa, é materialmente inconstitucional, por violação do art. 20º da CRP (…) À execução baseada em requerimento de injunção a que foi aposta a fórmula executória pode o executado opor os fundamentos do art.816º do CPC (sistema não restritivo) -Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 13 de Dezembro de 2011, processo n.º 1506/10.9T2OVR-A.C1 em www.dgsi.pt.).
5ª: É absolutamente unânime na Doutrina que a execução baseada em título judicial impróprio admite um sistema amplo de oposição, podendo invocar-se, para além dos fundamentos especificados para as sentenças, quaisquer outros que seria lícito deduzir-se como defesa no processo de declaração (Cf., por ex., Castro Mendes, Acção Executiva, pág. 59, Lebre de Freitas, “O Silêncio do Terceiro Devedor”, ROA, 2002 II, pág.402), pelo que mal andou a Sentença recorrida, ao arrepio do recentemente decidido pelo Tribunal Constitucional, em acórdão publicado em Diário da República, 2.ª série - Nº 211 - 31 de Outubro de 2012), tendo julgado “inconstitucional a norma contida no artigo 814.º do Código do Processo Civil, quando interpretada no sentido de “limitar a oposição à execução fundada em injunção à qual foi aposta fórmula executória”, sendo que esta decisão teve já em consideração o DL 226/2008 de 20 de Novembro, estando por isso em antítese à Sentença a quo (“Ponderado o que acaba de ser citado, sem deixar de notar que a ‘norma’ em análise resulta, agora, directamente do texto da lei - artigo 814.º, n.º 2 do Código de Processo Civil - e se projeta na parte inicial do artigo 816.º deste diploma legal, após a alteração introduzida a ambos os preceitos legais pelo Decreto -Lei n.º 226/2008, de 20 de novembro, haver -se -á de concluir que apenas se justificam «... normas restritivas quando se revelem proporcionais, evidenciem uma justificação racional ou procurem garantir o adequado equilíbrio face a outros direitos e interesses constitucionalmente protegidos, ...» (cf. Acórdão n.º 283/2011, disponível ‘in’ www.tribunalconstitucional.pt), pelo que a ‘norma’ em apreço, na medida em que limita injustificadamente os fundamentos de oposição à execução baseada em ‘requerimento de injunção a que foi aposta fórmula executória’, padece do vício de inconstitucionalidade por violar o ‘princípio da proibição da indefesa’, enquanto aceção do direito de acesso ao direito e aos tribunais consagrado no artigo 20.º, n.º 1 da Constituição”).
6ª: Acresce que sempre o Tribunal recorrido deveria ter conhecido dos fundamentos de facto alegados pela Recorrente por configurarem uma excepção que se impunha conhecer: a excepção peremptória da compensação, arguida nos termos do disposto nos arts. 814 n.º 1 alínea g) do CPC e 847.º do CC. tal-qualmente resulta da Oposição à Execução (arts. 9.º e ss), facto extintivo do direito da Recorrida que per se legitimaria a admissibilidade da Oposição à Execução [“I - O artº 814º, al. g), CPC, permite ao executado invocar na oposição à execução fundamento de natureza substantiva relativo à própria obrigação exequenda (qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação). II - A compensação é um facto modificativo ou extintivo da obrigação (artº 847º C. Civ.)” -Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 05 de Agosto de 2007, processo n.º 735-B/2002.C1 em www.dgsi.pt ].
7ª: Com efeito, encontrando-se a correr termos acção declarativa autónoma (docs. nºs 10 e 11 da oposição à execução) com vista ao reconhecimento judicial do crédito da Opoente, nada obstaria à sua invocação em sede de Oposição à Execução, sendo certo, que esse processo declarativo constituía questão prejudicial (cfr. art. 279º do CPC), conforme o invocado pela Opoente no seu art. 14.º da Oposição à Execução, que em que figuram como Autora a aqui Recorrente e como Ré a aqui Recorrida [O processo em causa é o Processo n.º 99/12.7T2ALB, acção de processo sumaríssima emergente de incumprimento contratual a correr os seus termos no Tribunal da Comarca de Baixo Vouga de Albergaria à Velha (Docs. n.º s 10 e 11 da Oposição à Execução].
8ª: Sucede, porém, que o Tribunal recorrido entendeu que a arguição da excepção da compensação não seria admissível, violando de forma flagrante, o disposto na lei civil e processual.
9ª: A sentença recorrida encontra-se enfermada com duas falácias absolutamente claras, sendo a primeira delas o entendimento desacertado de que a Opoente “Não junta e nem virá a juntar” documento susceptível de comprovar o direito a compensar, retirando-se da fundamentação da sentença que tal documento apenas poderia ser uma sentença noutro processo judicial, expondo o Tribunal a quo de forma desacertada que “esse seu alegado direito de crédito sobre a Exequente está ainda a ser discutido em acção declarativa que a mesma contra esta intentou”, daqui se retirando, portanto, que apenas uma sentença noutro processo judicial poderia servir de documento idóneo.
10ª: Ora, nada mais errado, tendo em consideração o supra citado Ac. deste Tribunal da Relação do Porto de 24/02/2011 que diz precisamente o contrário: “III -Não constituem obstáculo à invocação da compensação, na oposição à execução, para efeitos de extinção do crédito exequendo, a falta de reconhecimento judicial do crédito e a sua litigiosidade, exigindo-se somente a prova da sua existência e da sua exigibilidade no processo onde aquela for invocada” (Cfr. Ac. Tribunal da Relação do Porto de 24/02/2011. Proferido na Apelação nº 3507/06.2TBMAI-A.P1 -3ª Sec em http://www.trp.pt/jurisprudenciacivel/civel_3507/06.2tbmaia.p1.html prova que a Opoente fez quanto à sua existência e sua exigibilidade em processo e que o Tribunal a quo reconheceu.
11ª: A segunda falácia consubstancia-se na conclusão que o Tribunal a quo retira, para o mesmo desiderato, do facto de que “a Executada admite e requer, para a sua comprovação, a prova pericial que ateste que a mercadoria que a primeira lhe vendeu não corresponde ao acordado”, confundindo aqui a Sentença os motivos de se requerer prova pericial com a existência de documento susceptível de comprovar o direito a compensar (Mister salientar ensinamentos do Sr. Juiz Conselheiro Fernando Amâncio Ferreira quando propugna que o conceito de documento para efeitos de oposição por motivo substancial para efeitos da alínea g) do art. 814º do CPC, deverá considerar-se ainda que, “Face ao disposto no n.º 2 do art. 364º do CC, poderá o documento ser substituído por confissão, por nos encontrarmos, em princípio, perante uma formalidade ad probationem. Donde, e mesmo sem possuir o necessário documento, poder a oposição ser deduzida, contanto o opoente no seu decurso, obter a confissão do exequente.” In Curso de Processo de Execução, Almedina, 12ª Ed., pág. 178, nota de rodapé 290).
12ª: Exponha-se, ainda que a Opoída nem chegou a ser notificada pelo Tribunal para Contestar a Oposição à Execução, tendo o Tribunal a quo aí coarctado a hipótese de a Opoída vir, no decurso dos autos - maxime na Contestação -, confessar o motivo substancial alegado pela Opoente na sua Oposição., resultando claro que na Oposição foi alegado que a Recorrida confessou, na qualidade de Ré nos autos n.º 99/12.7T2ALB, que não entregou os certificados dos produtos porque o seu fornecedor UNEMSA não lhos tinha entregue não obstante lhos ter pedido, pelo que tal confissão do Recorrida seria elemento de prova suficiente para a compensação invocada, facto fulcral que o Tribunal a quo olvidou, já para não se acrescentar que o tribunal recorrido coarctoua hipótese de a Opoída vir, no decurso dos autos - maxime na Contestação -, confessar o motivo substancial, o qual nem tão-pouco poderia negar face à confissão já feita no outro processo judicial em curso.
13ª: Acresce que na Oposição foi feita referência ao documento emitido pelo fabricante do mesmo tipo de material fornecido pela Recorrida à Recorrente através da antedita factura, que se protestou juntar (cfr. artº 49º da oposição à execução in fine), bem como aos certificados de conformidade do produto, ou melhor, a falta deles, por parte da Recorrida, prova documental a contrario do direito invocado pela Recorrente, documento cuja junção aos autos deveria ser ordenada pelo Tribunal a quo, conforme o referido no art. 49.º da Oposição à Execução.
14ª: Sem embargo, a questão da perícia foi incorrectamente interpretada pelo Tribunal a quo, porquanto perícia, à luz da formulação dada pelo artigo 388º do Código Civil, tem em vista “a percepção ou apreciação de factos por meio de peritos”, (art° 389° do CC e 611 ° do CPC) acto que permite ao Juiz adquirir, por esse meio, uma mais correcta percepção dos factos que a parte pretende provar, contudo, a perícia a ser realizada não seria o único idóneo a provar, nos termos e para os efeitos da alínea g) do art. 814º do CPC, o motivo substancial alegado na Oposição, a qual, portanto, deveria ter sido recebida.
15ª: Conforme o supra referido nas Alegações de Recurso (Designadamente nas Alegações 59 a 114 deste Recurso, conteúdo para o qual expressamente se remete), a decisão recorrida encontra-se ainda enfermada de diversos vícios na fundamentação, que sustentam o presente recurso, pois, deveria o Tribunal recorrido ter considerado compensados os créditos alegadamente invocados, caso se considerasse devido o montante descrito na Injunção ex vi fórmula executória que lhe foi aposta, servindo a notificação da Oposição à Execução como declaração da compensação nos termos e para os efeitos do disposto no art. 848.º do CC.
16ª: Para além disso, a Sentença recorrida encontra-se enfermada de nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do disposto no art. 668.º n.º 1 d) do CPC, excepção que expressamente se argúi para os devidos e legais efeitos nos termos do art. 668.º n.º 2, porquanto o Tribunal a quo não se pronunciou relativamente à questão prejudicial invocada pela Recorrente no art. 14º da Oposição à Execução (cfr. art. 279.º do CPC).
17ª: Com efeito, a qualificação como questão prejudicial acarretava a suspensão dos presentes autos até ser decidida a acção pendente (Maxime, o já referido Processo n.º 99/12.7T2ALB na Comarca do Baixo Vouga - Albergaria-a-Velha - Juízo de Média e Pequena Instância Cível) para apreciação de causa prejudicial ao objecto da oposição, nos termos do disposto nos arts. 276°, c), e 279°, 1 e 3, do CPC, normas violadas pela decisão recorrida, juntamente com o postulado no art. 201.º do CPC).
18ª: O caso sub judice subsumia-se, inteiramente, à qualificação como decisão prejudicial, na esteira do já referido por muitos dos nossos Tribunais Superiores, e que nas alegações convenientemente se citaram: “1. É aplicável o disposto nos arts 276°, c), e 279°. 1 e 3, CPC, à oposição à execução, atenta a sua natureza declarativa, sendo admissível a sua suspensão até ser decidida a acção pendente para apreciação de causa prejudicial ao objecto da oposição” (Cfr. (Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 19 de Janeiro de 2012, processo n.º 4319/11.7TBBRG-A.G1 em www.dgsi.pt). De forma assertiva expõe que “2. O reconhecimento judicial, prosseguido em acção declarativa pendente, do crédito dado à compensação pelo Executado e por ele invocado na oposição como causa extintiva da obrigação exequenda, constitui questão prejudicial que justifica a suspensão da instância da oposição”).
19ª: Imperativo ainda salientar que se reportava obrigatória a suspensão oficiosa da instância, conforme, facilmente se retira, da epígrafe do artigo 279.º do CPC: suspensão por determinação do Juiz. o que não sucedeu, e que por isso, constitui nulidade, que expressamente se argui, pela omissão da prática de um acto legalmente obrigatório (cfr. art. 201.º do CPC).
20ª: A Sentença recorrida encontra-se, ainda, enfermada com omissão de pronúncia nos termos do disposto no art. 668.º alínea d) do CPC, pois, ao abrigo do disposto no art. 280º do CPC, deveria o Tribunal a quo ter comunicado à Autoridade Tributária a infracção decorrente da emissão, pela Recorrida, da Nota de Débito … para aumentar o valor da factura ….. descrita no Requerimento de Injunção, porquanto essa nota de débito não corrige qualquer incorrecção da factura, antes aumenta o valor do negócio titulado pela factura, constituindo uma violação do dever de emissão de factura previsto nos art. 36º e 29º do CIVA, conforme o referido pela Recorrente nos seus arts. 19.º a 25.º do Oposição à Execução, bem como no seu primeiro pedido (alínea a)) deduzido afinal no seu articulado.
21ª: A comunicação à Autoridade Tributária é um acto legalmente obrigatório nos termos do disposto no referido art. 280.º do CPC, não sendo necessário que a contraparte o requeira (o que não sucedeu, conforme arts. 19.º a 25 da Oposição à Execução), pelo que a omissão deste acto legalmente obrigatório (art. 280.º n.º 3 do CPC n.º 3), consubstancia nulidade nos termos do art. 201.º do CPC.
22ª: Acrescente-se, que a Opoente protestou juntar o documento emitido pelo fabricante do mesmo tipo de material fornecido pela Recorrida à Recorrente, conforme o vertido no art. 48.º in fine da Oposição à Execução, tendo ainda sido requerida a junção de documentos em posse da contraparte, designadamente, foi solicitada a notificação à Recorrida para juntar aos autos os certificados de conformidade do produto da Factura n.º 12216 que se juntou como Doc. n.º 3 na Oposição à Injunção, ao abrigo dos art. 529º do CPC n.º 2 do art. 519º do CPC e n.º 2 do art. 344º do Código Civil.
23ª: Porém, sobre isso, mais uma vez, o Tribunal recorrido não se pronunciou, alegando não existir “prova documental”, tendo a rejeição liminar da nossa Oposição coarctado as possibilidades de acréscimo probatório do motivo substancial invocado pela Opoente e assim, evidentemente, os seus direitos de defesa.
24ª: Não só existia prova documental junta aos autos, atinente a demonstrar a legitimidade e oportunidade para a arguição da compensação nos termos do disposto no art. 814.º n,º 1 g) do CPC, como o documento que se protestou juntar seria outro dos documentos bastantes a corroborar o alegado pela Recorrente, pelo que deveria o Tribunal recorrido ter convidado a Recorrente à sua junção (Conforme, mutatis mutandis e nunca esquecendo o princípio de Igualdade de armas consagrado no art. 3º-A do CPC, referiram já os Ilustres Desembargadores do Tribunal da Relação de Lisboa: “A falta de junção com o requerimento inicial de execução da livrança - que se protestara juntar - em que conjuntamente com uma escritura de hipoteca, o exequente fundamenta a execução, é fundamento de despacho a convidar a apresentá-la antes da citação do executado, nos termos do art. 811º-B do Cód. de Proc. Civil, então em vigor”-Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 22 de Janeiro de 2004, processo n.º 9073/2003-8 em www.dgsi.pt).
25ª: Na verdade, ficou a Recorrente segura que nenhuma decisão iria, por enquanto, ser tomada, sem que fosse notificada para a junção do já referido documento, para além da notificação à Recorrida nos termos do disposto no 529.º do CPC, pelo que, ao decidir como decidiu, o Tribunal recorrido proferiu uma decisão surpresa nos termos do disposto no art. 3.º n.º 3 do CPC.
26ª: Por último, o Tribunal recorrido realizou uma interpretação errada do Direito, quando prolata que a compensação alegada pela Recorrente não poderia operar porque o seu direito de crédito “sobre a exequente está ainda a ser discutido em acção declarativa que a mesma contra esta intentou”.
27ª: O facto do crédito da Recorrente poder considerar-se litigioso, isto é, que a sua existência estaria sob apreciação, jamais constituiria impedimento bastante para que o Tribunal recorrido não conhecesse da excepção, sendo que, em abstracto, esse entendimento faria com que o instituto da compensação perdesse o seu alcance e sentido, isto é, a eficácia desta ficaria na total dependência da vontade do sujeito passivo do contra-crédito - (Este entendimento é o vertido no já supra citado aresto do Tribunal da Relação de Guimarães, “3. A litigiosidade do crédito dado à compensação, resultante de o credor/devedor não aceitar nem reconhecer a existência desse crédito, não pode impedir nem impede a compensação, sob pena de a eficácia desta ficar na total dependência da vontade do sujeito passivo do contra-crédito, o que, na prática, esvaziava de conteúdo este instituto” - Cfr. (Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 19 de Janeiro de 2012, processo n.º 4319/11.7TBBRG-A.G1 em www.dgsi.pt) - No mesmo sentido este Venerando Tribunal da Relação do Porto propugnou já que: “(…) III Não constituem obstáculo à invocação da compensação, na oposição à execução, para efeitos de extinção do crédito exequendo, a falta de reconhecimento judicial do crédito e a sua litigiosidade, exigindo-se somente aprova da sua existência e da sua exigibilidade no processo onde aquela for invocada (…)”.
28ª: É evidente que, se é possível a futura existência e exigibilidade do crédito que é invocado para efeitos de compensação, pelo que, sempre teria o Tribunal recorrido que admitir e conhecer da excepção da compensação invocada, o que não sucedeu, violando assim, de forma aguda, o disposto nos arts. 814.º n.º 1 g) do CPC e art. 847º do CC.
Termos em que, deverá o Ilustre Tribunal da Relação do Porto receber o presente Recurso, considerando provado todo o seu conteúdo e consequentemente revogando a sentença ora em crise:
A) Julgando admissível a Oposição à Execução deduzida pela Recorrente;
B) Julgando inconstitucional o disposto no art. 814.º n.º 2 do Código de Processo Civil, por restringir os meios de oposição e limitar o direito de defesa, inconstitucionalidade material por violação dos arts. 18.º, 20, 202 e 204.º da CRP;
C) Julgando admissível a arguição da excepção peremptória da compensação, arguida nos termos do disposto nos arts. 814 n.º 1 alínea g) do CPC e 847.º do CC;
D) Julgando a sentença recorrida nula por omissão de pronúncia, nos termos do disposto no art. 668.º n.º 1 d) do CPC, porquanto o Tribunal a quo não se pronunciou relativamente à questão prejudicial invocada pela Recorrente no art. 14.º da Oposição à Execução (cfr. arts 201.º e 276°, c), e 279°. 1.º e 3.º do CPC);
E) Julgando a sentença recorrida nula por omissão de pronúncia, nos termos do disposto no art. 668.º n.º 1 d) do CPC, pois, ao abrigo do disposto no art. 280º do CPC, deveria o Tribunal a quo ter comunicado à Autoridade Tributária o descrito pela Recorrente nos arts. 19.º a 25.º do Oposição à Execução;
F) Julgando a decisão recorrida nula por decisão surpresa nos termos do disposto no art. 3.º n.º 3 do CPC;
ASSIM SE PROPUGNANDO, NO CASO SUB JUDICE, POR UMA BOA REALIZAÇÃO DA JUSTIÇA!

4. Tendo a oponida declarado não pretender oferecer contra-alegações, colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO.

1. Os factos a considerar na decisão do recurso são os que acima se relataram, designadamente os alegados pela recorrente no articulado de oposição, de que foi feita síntese em I.1., a ainda, conforme resulta dos documentos juntos, que a acção que moveu contra a exequente e a correr termos nos Juízos de Média e Pequena Instância Cível do Tribunal da Comarca do Baixo Vouga - Albergaria a Velha - sob o nº 99/12.7T2ALB, foi instaurada em 19/4/2012, posteriormente à instauração da execução de que a presente oposição é apenso.

2. Sendo o objecto dos recursos balizado pelas conclusões das alegações do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso, que neles se apreciam questões e não razões e que não visam criar decisões sobre matéria nova, estando o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido, as questões suscitadas são as seguintes:
- Nulidade da sentença;
- Decisão surpresa;
- Inconstitucionalidade do artº 814º, nº 2, do Código de Processo Civil e
- Admissibilidade da compensação na oposição à execução.

Nulidade da sentença.
Atribui a apelante à decisão o vício da nulidade por omissão de pronúncia com o fundamento de que ela não se pronunciou sobre a requerida suspensão da instância, por existência de causa prejudicial, e sobre a requerida comunicação à Autoridade Tributária, por alegada infracção pela apelada decorrente da emissão de nota de débito, que teria servido para aumentar o valor da factura cujo pagamento é peticionado e não para corrigir qualquer incorrecção dessa factura.
Encontrando-se as nulidades da sentença taxativamente enumeradas no nº 1 do artº 668º do Código de Processo Civil (diploma a que pertencerão os demais preceitos legais doravante a citar, sem outra indicação de origem), nos termos da al. d) é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar.
A omissão de pronúncia constitui uma patologia da decisão que consiste numa incompletude da decisão, analisada por referência aos deveres de pronúncia e decisão que decorrem dos termos das questões suscitadas e da formulação do objecto da decisão e das respostas que a decisão fornece.
Quando se configura a existência de omissão está subjacente uma omissão do tribunal em relação a questões que lhe são propostas. Admitindo que a decisão se consubstancia num silogismo assente na conclusão inferida de duas premissas a omissão de pronúncia implica que uma daquelas premissas está incompleta.
A omissão de pronúncia significa, fundamentalmente, ausência de posição ou de decisão do tribunal sobre matérias em que a lei imponha que o juiz tome posição expressa. As questões que o juiz deve apreciar são aquelas que os sujeitos processuais interessados submetem à apreciação do tribunal (artigo 660, nº 2), e as que sejam de conhecimento oficioso, isto é, de que o tribunal deva conhecer, independentemente de alegação e do conteúdo concreto da questão controvertida, quer digam respeito à relação material, quer à relação processual.
As questões que são submetidas ao tribunal constituem o thema decidendum, como complexo de problemas concretos sobre que é chamado a pronunciar-se. Os problemas concretos que integram o thema decidendum sobre os quais o tribunal deve pronunciar-se e decidir, devem constituir questões específicas que o tribunal deve, como tal, abordar e resolver, e não razões, no sentido de argumentos, opiniões e doutrinas expostas pelos interessados na apresentação das respectivas posições
Feitas estas considerações, analisando a decisão recorrida, verifica-se que ela não se pronunciou sobre as requeridas pela apelante, na petição de oposição, suspensão da instância por existência de causa prejudicial - a acção que instaurou contra a oponida e que se encontra a correr termos no Tribunal Judicial de Albergaria-a-Velha -, e comunicação à Autoridade Tributária, por alegada infracção pela apelada decorrente da emissão de nota de débito, que teria servido para aumentar o valor da factura cujo pagamento é peticionado e não para corrigir qualquer incorrecção dessa factura, ou seja, incorreu no vício da nulidade que lhe assaca a recorrente.
O nº 1 do artº 715º consagra expressamente a regra da substituição deste Tribunal ao Tribunal recorrido, ao estatuir que, embora o tribunal de recurso declare nula a sentença proferida na 1ª instância, não deixará de conhecer do objecto da apelação, constituindo pressuposto desse conhecimento que os autos contenham todos os elementos que a permitam apreciar, o que se verifica, pelo que se vai conhecer das questões.

Como se deixou sublinhado e resulta do presente relatório, sustenta a apelante a suspensão da instância com base em existência de causa prejudicial - acção declarativa que instaurou contra a exequente e que, com o nº 99/12.7T2ALB, corre termos nos Juízos de Média e Pequena Instância Cível do Tribunal da Comarca do Baixo Vouga - Albergaria-a-Velha -, na qual alega inexistir o crédito exequendo, porquanto os produtos que lhe foram vendidos não correspondiam ao solicitado, como pretende provar na perícia que requer, facto que lhe provocou os prejuízos que descrimina, nomeadamente por se ter visto obrigada a recorrer a outra fornecedora para cumprir o que acordara com a dona da obra a quem se destinavam os produtos.
Continuando-se a sufragar o entendimento constante do acórdão proferido por este Tribunal, em 29/5/2008, no recurso de agravo nº 1308/08, relatado pelo ora relator e subscrito pela ora 1ª Adjunta, disponível em www.dgsi.pt., não pode suspender-se a instância executiva, com fundamento em prejudicialidade.
Vejamos porquê.
Nos termos do disposto nos artºs 276º, nº 1, al. c) e 279º, nº 1, o tribunal pode ordenar a suspensão da instância quando a decisão de uma causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer motivo justificado.
Uma causa está dependente do julgamento de outra, isto é, pende causa prejudicial, quando o julgamento ou decisão da questão a apreciar na primeira possa influir ou afectar o julgamento ou decisão da segunda, nomeadamente modificando ou inutilizando os seus efeitos ou mesmo tirando razão de ser à mesma - cfr. Alberto dos Reis, Comentário ao Código de Processo Civil, vol. 3º, pág. 206, Teixeira de Sousa, Revista de Direito e Estudos Sociais, ano XXIV, nº 4, pág. 306, e Acs. do STJ de 18/02/93, BMJ nº 424, pág. 587, de 1/02/95, CJ/STJ, Tomo I, pág. 265, e da RC de 7/07/2004 e de 15/02/2005, disponíveis em www dgsi.pt.
Mas, como se afirma no Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 14/10/2004 (Relator Conselheiro Araújo de Barros), Proc. 04B2771, www.dgsi.pt., louvando-se na doutrina e jurisprudência nele citado, a jurisprudência é praticamente uniforme no sentido de que a norma do referido artº 279º, nº 1, não é aplicável às acções executivas (cfr., no mesmo sentido, os acórdãos do STJ de 4/06/80, BMJ nº 298, pág. 232, de 26/04/90, Proc. 78870, www.dgsi.pt, de 14/01/93, CJ/STJ, Tomo I, pág. 59, de 18/06/96, CJ/STJ, Tomo II, pág.149, de 08/10/98, Proc. 83880, de 8/02/2001, Proc. 3485, de 30/09/2004, Proc. 04B2538, de 14/10/2004, Proc. 2771, de 31/05/2007, Proc. 07B864, e de 27/01/2010, Proc. 594/09.5YFLSB, e deste Tribunal da Relação de 14/09/2006, Proc. 0632701, de 07/07/2009, Proc. 3967/04.6TBSTS-C.P1, de 4/05/2010, Proc. 300/04.6TBMBR-A.P1, acessíveis em www.dgsi.pt.
E bem se compreende que assim seja já que, conforme resulta do artº 4º, nº 3, a acção executiva destina-se à reparação efectiva do direito violado, à realização coerciva do referido direito.
Para a instauração de acção executiva, o exequente deve estar necessariamente munido de um título executivo, sendo por este que se determinam o fim e os limites daquela acção - artº 45º, nº 1.
Nela não se visa a obtenção de uma decisão, mas antes a realização coerciva de uma prestação que está reconhecida no título dado à execução.
Em rigor, apenas em sede de oposição à acção executiva, quando se vise infirmar total ou parcialmente o título exequendo, se profere uma decisão, ainda que de conteúdo negativo, pois terá sempre como objectivo precípuo ajuizar da subsistência total ou parcial do título dado à execução.
Aliás, na vigência do Código de Processo Civil de 1939, cujo artº 284º continha uma redacção muito semelhante à do actual artº 279º, nº 1 (“O juiz pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta”), a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça dividiu-se quanto a saber se a execução podia ou não ser suspensa nos termos da primeira parte do seu artº 284º, divergência a que o Assento de 24/05/60, Diário do Governo, 1ª Série, de 15 de Julho de 1960, pôs termo, fixando jurisprudência no sentido de que «a execução propriamente dita não pode ser suspensa pelo primeiro fundamento do artigo 284º do Código de Processo Civil».
E, como se referiu, a primeira parte do artº 284º do Código de Processo Civil de 1939 é idêntica à primeira parte do artº 279º, nº 1, do código vigente, conforme se alcança do confronto dos dois citados textos legais.
O Assento de 24/05/60 consagrou a doutrina que ainda hoje parece ser a melhor, embora apenas com o valor de acórdão uniformizador de jurisprudência (artº 17º, nº 2, do DL nº 329-A/95, de 12 de Dezembro).
Com efeito, a doutrina dos assentos (e dos acórdãos uniformizadores) não caduca pelo simples facto de ser revogada a legislação vigente quando foram proferidos: se essa legislação foi substituída por outra que contenha textos idênticos, não havendo razões para excluir que o sentido dos novos textos seja igual ao dos antigos, a doutrina do assento será de manter e de considerar em vigor (neste sentido Lopes do Rego, Comentários ao Código de Processo Civil, 2.ª ed., pág. 281/282).
Reforçando este entendimento, embora a lei não distinga no artº 279° entre a acção declarativa e a acção executiva, e se trate de uma norma geral sobre a suspensão da instância, a redacção da primeira parte do nº 1 torna inaplicável esse comando à execução propriamente dita. Realmente, desde que a suspensão, neste caso, resulta de estar a decisão da causa dependente do julgamento de outra já proposta, parece clara a sua inaplicabilidade ao processo de execução, em que não há que proferir decisão sobre o fundo da causa, visto o direito que se pretende efectivar já estar declarado (ou consta de título que lhe confere prova de primeira aparência), e daí que, enquanto tal direito subsistir, é sempre possível a sua execução.
E, apesar de a lei admitir que, dentro do litígio executório, exista uma fase em que é possível ainda discutir a relação jurídica em questão (a fase da oposição), seria contrário a um princípio de eficácia, que deve presidir à concretização ou satisfação prática de um direito, bem como à própria economia processual, admitir que a execução se pudesse também enredar na malha da prejudicialidade.
Senão, teríamos, como no caso dos autos, a interposição da acção declarativa - até posterior à propositura da execução - com a consequência já não de prejudicialidade, mas de litispendência entre essa acção e o processo de oposição.
Acresce que o modo preciso como o artº 818º regula a forma da oposição suspender ou não a execução, indica que o legislador apenas previu uma espécie de prejudicialidade interna ou no âmbito da própria acção executiva, que é incompatível com a aplicação do disposto no artº 279º, nº 1, às execuções, dado que, a não ser assim, o regime daquele artº 818º deixaria de ter aplicação - neste sentido o Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 31/5/2007, Proc. 07B864, www.dgsi.pt..
Finalmente, ainda que se admita que o disposto no artº 279º é aplicável ao processo de execução, sempre haveria que ponderar que, nos termos do nº 2 desse preceito legal, não obstante a pendência de causa prejudicial, não deve ser ordenada a suspensão se houver fundadas razões para crer que aquela foi intentada unicamente para se obter a suspensão.
Ora, no caso em apreço existem fundadas razões para crer que a acção prejudicial foi intentada com o objectivo de obter a suspensão da execução, como seja o facto de ela ter sido instaurada em data posterior à instauração da execução, sendo ainda certo que, tal circunstância não constitui fundamento de oposição à execução, apenas tendo como consequência que a exequente não possa ser paga sem prestar caução e que a execução iniciada se extinguirá ou modificará em conformidade com a decisão definitiva comprovada por certidão, além de que, na oposição, a executada, com base nos mesmos factos, invoca a excepção da compensação.
Face ao exposto, não pode a instância da acção executiva suspender-se com fundamento na pendência de causa prejudicial, fundamento que foi o invocado pela executada/oponente.
Não obstante, sempre se dirá que também não se está perante a previsão de ocorrência de outro motivo justificado, constante da 2ª parte do nº 1 do referido artº 279º.
O motivo justificado susceptível de determinar a suspensão de uma execução, é o que inere ao próprio processo executivo, como, v.g., a arguição de nulidade de um título executivo, um problema que surja em matéria de liquidação da quantia exequenda - cfr. Acórdão do STJ de 16/04/2009, proc. 09B0674, acessível em www.dgsi.pt.
Como adverte Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, 2ª edição, pág. 546, “a 2ª parte do nº 1 (do citado artº 279º) tem âmbito de previsão diferente da sua 1ª parte (…) não podendo nela fundar-se a suspensão da acção executiva por pendência de acção autónoma”.
Donde resulta que, como refere o Acórdão da RC de 7/07/04, Proc. 2000/04, www dgsi.pt. «… para que se ordene a suspensão de uma acção executiva com base na 2ª parte do nº 1 do citado artº 279º do CPC - ocorrência de motivo justificado - necessário se torna que o motivo invocado seja outro que não a pendência de uma qualquer outra causa autónoma, ou melhor, o motivo invocado não pode ter nada a ver com a pendência de qualquer outra acção, já que se não lá estaria a mesma a funcionar, no fundo, como verdadeira causa prejudicial, o que a lei não permite (e daí falar “em outro motivo”); sendo certo que, a não se entender assim, estaria a deixar-se entrar pela “janela” aquilo que a lei não permite que entre pela “porta”».
E, no caso em apreço, o motivo invocado pela recorrente está directamente relacionado com a pendência da referida acção declarativa, acabando a mesma por funcionar como uma verdadeira causa prejudicial em relação à presente acção executiva, pelo que também e, de qualquer modo, não lhe podia ser aqui aplicável a 2ª parte do nº 1 do artº 279º.
A entender-se que constitui motivo justificado para a suspensão de um processo de execução, a simples instauração, de uma acção na pendência da execução, cujo objecto fosse o bem executado, ou a resolução contratual por incumprimento, acção essa, como quase todas, de resultado necessariamente aleatório, autorizada estaria uma forma de protelamento da execução que mais não visa do que dar realização prática a uma situação jurídica definida por sentença passada em julgado ou documentada por título executivo legalmente válido, em manifesto prejuízo dos direitos reconhecidos dos exequentes o que, isso sim, seria incompaginável com o Estado de Direito democrático e com o seu ordenamento jurídico constitucional e legal (cfr. o citado acórdão do STJ, de 16/04/2009, e o acórdão deste Tribunal e Secção de 24/1/2013, Proc. 7115/11.8YYPRT.P1, www.dgsi.pt.).

Já relativamente à oposição à execução, dada a sua natureza declarativa, é de admitir, em princípio, a sua suspensão por via da pendência de causa prejudicial, maxime da acção em que se discuta a obrigação exequenda, sem prejuízo das normas que disciplinam a influência de pendência dessa acção declarativa na própria acção executiva (Lebre de Freitas, obra citada, pág. 545).
Mas, como adverte de seguida o mesmo autor, é de ponderar se a finalidade da realização do direito, que é própria da acção executiva não deve levar, sempre que possível, a deslocar para a sua esfera a apreciação das questões que possam ser tratadas em processo declarativo apenso (que tem uma função de concentração conforme ao princípio da economia processual), só admitindo a suspensão quando tal não seja possível, havendo, nomeadamente, que evitar que, pela via da suspensão duma acção declarativa apensa à execução se consiga o mesmo resultado que procuram evitar preceitos como os dos artºs 909º, nº 1, al. d) - a acção de reivindicação pode levar à anulação da venda executiva, mas não suspende a execução - e 777º - a pendência de recurso de revisão não impede a execução da sentença.
Como decidido no acórdão da RL de 5/7/2000, Proc. 00591, sumariado em www.dgsi.pt., “Para uma causa ser prejudicial em relação a outra por forma a originar a suspensão desta, é necessário que na primeira se discuta, em via principal, uma questão que é essencial para a decisão da outra causa, não existindo tal prejudicialidade quando em ambos os processos se discuta a mesma questão”.
Transpondo o que acaba de se expor para o caso dos autos, estando em discussão em sede de oposição à execução, a extinção (total ou parcial) da obrigação exequenda por via dos efeitos de uma invocada compensação de um crédito da oponente sobre a exequente - pelos prejuízos que lhe advieram por se ter visto obrigada a recorrer a outra fornecedora para cumprir o que acordara com a dona da obra a quem se destinavam tais produtos -, exigido judicialmente na acção declarativa, essa invocada compensação só pode ser feita valer nessa acção, uma vez que a oposição tem como objectivo precípuo ajuizar da subsistência total ou parcial do título dado à execução, o que significa que a questão da declarada compensação de créditos está dependente de uma outra que é seu pressuposto - a da existência do crédito da compensante e que se discute na acção declarativa que, com o nº 99/12.7T2ALB, corre termos nos Juízos de Média e Pequena Instância Cível do Tribunal da Comarca do Baixo Vouga (Albergaria-a-Velha) -, ou seja, existe uma relação de prejudicialidade, ou de dependência, entre um dos fundamentos da oposição - declaração da excepção peremptória da compensação - e a referida acção declarativa.
E se é certo que a invocada compensação está dependente da prova de que o fornecimento dos produtos vendidos pela exequente à oponente não correspondeu ao que esta solicitou, como alega a última também em sede de oposição à execução, certo é que não existe total identidade de questões entre a oposição à execução e a acção declarativa e que o caso julgado que vier a ser formado na acção se reflectirá na oposição, assim se evitando uma eventual contradição de julgados.
Concluindo, face ao que se deixou exposto sobre a ocorrência de causa prejudicial, existe relação de prejudicialidade entre a referida acção que a oponente instaurou contra a exequente e a oposição à execução, conducente à suspensão da oposição à execução até ao trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida na acção, pelo que procede a questão.

Sustenta também a apelante que deve ser comunicado, por força do disposto no artº 280º, nº 3 (“Quando se trate de acções fundadas em actos provenientes do exercício de actividades sujeitas a tributação e o interessado não haja demonstrado o cumprimento do dever fiscal que lhe incumba, a secretaria ou o agente de execução deve comunicar a pendência da causa e o seu objecto à administração fiscal, preferencialmente por via electrónica, sem que o andamento regular do processo seja suspenso”), à Autoridade Tributária, o crédito constante da nota de débito …, emitida pela apelada e peticionada no requerimento de injunção.
Como fundamento da comunicação, invoca a violação fiscal decorrente da alegação de que a nota de débito corresponde a um acréscimo da factura nº …...
Ora, estando a alegada violação fiscal dependente da produção de prova, uma vez que é alegado que a referida nota de débito corresponde a um acréscimo da factura nº ….., e não que esta não tenha sido comunicada, não se vê fundamento para, nesta fase processual e na ausência de prova da alegação aduzida, efectuar a aludida comunicação, pelo que improcede a questão.

Decisão surpresa.
Defende a recorrente que, ao indeferir liminarmente a oposição com o fundamento de que não haviam sido juntos documentos comprovativos dos certificados de conformidade dos produtos que lhe foram vendidos pela exequente e constantes da factura cujo pagamento foi reclamado na injunção e destinado a comprovar a excepção da compensação, foi pelo Tribunal recorrido proferida decisão surpresa, pois, além de ter requerido que a oponida, na posse de quem alegadamente se encontravam, os juntasse, não lhe concedeu tal oportunidade.
Sem prejuízo do que se verá infra aquando da apreciação das duas questões subsequentes, não lhe assiste razão.
Retira-se da decisão recorrida que, depois de considerar ser conforme à Constituição da República Portuguesa a norma ínsita no artº 814º, nº 2, do CPC, na redacção que lhe foi dada pelo DL nº 226/2008, de 20/11, nos termos da qual os fundamentos da oposição à execução fundada em requerimento de injunção ao qual tenha sido aposta fórmula executória, são apenas os constantes do nº 1 do preceito, entendeu que a compensação, como facto extintivo e/ou modificativo da obrigação, apenas poderia operar se fosse posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração e se fosse provado por documento, o que não era o caso.
A seguir-se a tese da conformidade à Constituição da República Portuguesa do citado artº 814º, nº 2, nenhuma censura merece a decisão recorrida, porque, nos termos do nº 1, al. g), do mesmo preceito, para operar como fundamento de oposição à execução, a compensação teria que ser posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração (ou seja no processo de injunção, o que pressupunha a dedução de oposição) e, cumulativamente, ser provada por documento.
Ora, de acordo com a própria alegação da recorrente, a compensação era anterior à prolação da decisão no processo de declaração, rectius à aposição de força executória ao requerimento de injunção, pelo que e em consonância, se afirma na decisão recorrida que a oponente não juntou documento, nem poderia juntá-lo, comprovativo da compensação.
Nos termos do artº 817º, nº 1, al. b), constitui fundamento de indeferimento liminar da oposição, quando o fundamento não se ajustar ao disposto nos artigos 814º a 816º.
Acresce que o artº 664º, sob a expressiva epígrafe «Relação entre a actividade das partes e a do juiz» estatui que “O juiz não está sujeito ás alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito; mas só pode servir-se dos factos articulados pelas partes, sem prejuízo do disposto no artigo 264º”.
A interpretação deste preceito é doutrinal e jurisprudencialmente pacífica.
Basta atentar na clara síntese efectivada por Abílio Neto, Breves Notas ao Código de Processo Civil, 2005, pág. 193, segundo o qual «Em matéria de direito o tribunal pode e deve substituir-se à parte (artºs 664º, 713º nº2 e 726º), dando por violadas normas que na realidade tenham sido, explícita ou implicitamente invocadas, ou nem tal sequer, desde que efectivamente cogentes para resolução das questões submetidas à sua apreciação, não se encontrando, assim, adstrito à qualificação dos factos efectuada pelas partes…desde que se mantenha dentro da causa de pedir invocada pelas partes e observe o artº 3º, nº 3».
Assim, o cumprimento do princípio do contraditório não se pode reportar às normas que o juiz entende aplicar, nem à interpretação que delas venha a fazer, mas antes aos factos invocados e às posições assumidas pelas partes.
O que se verificou no caso, na medida em que o tribunal recorrido se socorreu dos factos alegados pela oponente/apelante.
Daí que não se entenda constituir a decisão recorrida uma “decisão surpresa”.
Na verdade a decisão surpresa a que se reporta o artº 3º, nº 3, não se confunde com a suposição que as partes possam ter feito nem com a expectativa que elas possam ter acalentado quanto à decisão, quer de facto, quer de direito.
A lei, ao referir-se à decisão surpresa, não quis excluir delas as que juridicamente são possíveis embora não tenham sido pedidas.
O que importa é que os termos da decisão, ou melhor, os seus fundamentos, estejam ínsitos ou relacionados com o pedido formulado e se situem dentro do geral e abstractamente permitido pela lei e que de antemão possa e deva ser conhecido ou perspectivado como sendo possível.
Ou seja apenas estamos perante uma decisão surpresa quando ela comporte uma solução jurídica que as partes não tinham obrigação de prever - cfr., neste sentido os Acs do STJ de 29/09/1998 e de 14/05/2002, www.dgsi.pt., Processos 98A801 e 02A1353, respectivamente.
Como refere Abílio Neto, obra citada, pág. 10, o artº 3º nº3 do CPC não retira ao tribunal a liberdade de dizer o direito, o que constitui uma das essentialia da função jurisdicional. E sendo verdade que os advogados das partes devem conhecer o direito, uma vez na posse dos factos, devem prever todas as qualificações jurídicas de que os mesmos são susceptíveis, pelo que só a alteração particularmente relevante do módulo jurídico perfilhado pode ter a virtualidade de se subsumir em tal segmento normativo.
Não é, manifestamente, o caso dos autos, na medida em que, embora o Tribunal Constitucional já se tenha pronunciado pela inconstitucionalidade do artº 814º, nº 2, não declarou a sua inconstitucionalidade com força obrigatória geral pelo que, enquanto tal não suceder, é admissível defender-se a sua constitucionalidade e, consequentemente, sustentar que os fundamentos de oposição à execução fundada em requerimento de injunção ao qual tenha sido aposta fórmula executória, são apenas os constantes do artº 814º, nº 1, maxime o da al. g).
Não pode, portanto, concluir-se que a oponente deva considerar-se surpreendida com a aplicação e interpretação de tal preceito, tendo, ao invés, obrigação de as prever.

Inconstitucionalidade do artº 814º, nº 2, do Código de Processo Civil.
Pugna a recorrente, como sustentara na oposição, mas que foi desatendido na decisão recorrida, pela declaração de inconstitucionalidade do artº 814º, nº 2, na redacção que lhe foi dada pelo DL nº 226/2008, de 20/11, por restringir os meios de oposição à execução e limitar o direito de defesa.
É inquestionável, face ao que se deixou relatado, que na base da execução de que a presente oposição é dependência está um requerimento de injunção, apresentado pela exequente/oponida no Balcão Nacional de Injunções contra a oponente, no qual foi aposta pelo secretário judicial, fórmula executória, após a entrada em vigor do citado DL nº 226/2008, que ocorreu em 31/03/2009 (artº 23º).
E é também inquestionável que a fórmula executória foi aposta no requerimento de injunção em virtude de a executada/oponente não ter deduzido oposição à execução porquanto, se o tivesse feito, não teria sido aposta a referida fórmula executória e a injunção teria sido remetida à distribuição, transmudando-se em acção declarativa especial - cfr. artºs 14º, 16º e 17º do DL nº 269/98, de 01/09, diploma que, revogando o nº DL 404/93, de 10/12, que havia criado o procedimento de injunção, instituiu o regime jurídico dos procedimentos destinados a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior à alçada do tribunal de 1ª instância, mantendo-se o procedimento de injunção com a mesma natureza e semelhantes formalidades, se bem que aperfeiçoadas, ampliando-se, porém, o âmbito de aplicação da providência a que é admissível recorrer quando estão em causa obrigações pecuniárias de valor não superior à alçada do tribunal de 1ª instância (artºs 1º do DL 269/98 e 7º do regime jurídico por ele instituído), quando, pelo DL 404/93, a injunção só era admissível em relação a obrigações pecuniárias de valor não superior a metade dessa alçada.
Não está em causa saber se o requerimento de injunção a que foi aposta a fórmula executória é ou não título executivo válido, até porque os nºs 1 e 2 do artº 21º do DL 269/98 são inequívocos no sentido de que o é, mas saber que espécie de defesa pode ser apresentada pelo executado em execução fundada nesse título: se os fundamentos da oposição a ele deduzida são apenas os previstos no artº 814º, nº 1, ou se também podem ser invocados os fundamentos previstos no artº 816º.

Como se afirma no Ac. deste Tribunal de 4/5/2010, publicado em www.dgsi.pt., fazendo uma breve resenha histórica do regime jurídico da oposição à execução baseada em requerimento de injunção no qual tivesse sido aposta a fórmula executória:
“Se o título executivo a que temos aludido se tivesse formado à luz do primeiro diploma que regulou a “providência” de injunção no nosso ordenamento jurídico, ou seja, do DL 404/93, de 10/12, a solução … seria fácil … pois o legislador expressamente referiu no preâmbulo de tal diploma que «a aposição da fórmula executória», não constituindo, de modo algum, um acto jurisdicional, permite indubitavelmente ao devedor defender-se em futura acção executiva, com a mesma amplitude com que o pode fazer no processo de declaração, nos termos do disposto no (então) artº 815º (que regia, como agora o artº 816º, sobre os fundamentos da «oposição à execução baseada noutro título» que não em sentença judicial ou arbitral) do Código de Processo Civil.
Mas o título dado à execução pela exequente, ora apelada - qualificado como título judicial impróprio, especial ou atípico e enquadrável na previsão da al. d) do nº 1 do artº 46º do CPC -, formou-se, como resulta do que já ficou exposto, ao abrigo do DL 269/98, de 01/09, …. E no preâmbulo daquele … DL nada se diz acerca do assunto em equação; nem num sentido, nem noutro. Nele apenas se alude à «aceitação inexpressiva» que o regime instituído pelo DL 404/93 tinha tido até então e que com a nova regulamentação da injunção, operada por aquele DL 269/98, «procura-se agora incentivar o recurso à injunção, em especial (…) pela remoção de obstáculos de natureza processual que a doutrina opôs ao Decreto-Lei nº 404/93, nomeadamente no difícil, senão impraticável, enlace entre a providência e certas questões incidentais nela suscitadas, a exigirem decisão judicial, caso em que a injunção passará a seguir como acção»”.
A jurisprudência e a doutrina (antes da entrada em vigor do citado DL nº 226/2008) não eram unânimes na afirmação do tipo de oposição que o executado podia opor à execução baseada no título assim formado. Uns consideravam que nele tinha aplicação o disposto no artº 814º; outros sustentavam que o executado podia fundamentar a sua oposição em qualquer causa permitida pelo artº 816º, neste sentido se tendo pronunciado designadamente o Ac. deste Tribunal de 5/7/2006, www.dgsi.pt., subscrito como adjunto pelo ora relator.
Argumentavam os primeiros, essencialmente, que: “resultando a aposição da fórmula executória no requerimento da injunção, da falta de contestação do requerido, levando assim ao reconhecimento implícito da existência da dívida, conforme foi reclamada, temos desse modo que a formação do título executivo possibilita o exercício do contraditório, com a dedução de defesa, sendo certo que no que concerne à oportunidade de apresentação desta última rege o princípio da preclusão, do artº 489º do CPC, pelo que não se compreende que a respectiva formulação possa ser relegada para momento posterior, sem prejuízo do que for superveniente ou de conhecimento oficioso”; que “não se configura como decisivo a não jurisdicionalização da aposição da fórmula executória, na medida em que a análise a fazer deve ser efectivamente centrada em termos da interpretação das normas aplicáveis, passando de forma necessária pela intenção do legislador, na … obtenção célere e simplificada de um título executivo, mas sem gerar uma situação de indefesa, pois desde que exercitada, sempre será apreciada em acção, para a qual se transmuta o processo injuntivo”.
Por sua vez, a argumentação dos segundos era, primordialmente, a de que: “o requerimento de injunção a que foi aposta a fórmula executória, …, não contém nem o reconhecimento de um direito nem a imposição ao requerido do cumprimento da prestação, como resultado de uma decisão jurisdicional, formado completamente à margem da intervenção do juiz”. Que “a fórmula executória é insusceptível de assumir efeito de caso julgado ou preclusivo para o requerido que pode, na acção executiva, controverter a exigibilidade da obrigação exequenda, tal como o pode fazer qualquer executado em relação a qualquer título executivo extrajudicial”. Que “o requerimento de injunção, a que foi aposta a fórmula executória, não é nem tem o valor de uma sentença, como não tem o valor de um despacho judicial ou outras decisões da autoridade judicial que condenam no cumprimento de uma prestação” (excertos do citado Ac. deste Tribunal de 05/07/2006).

Esta argumentação deixou de fazer sentido com a entrada em vigor do DL nº 226/2008 e as inerentes alterações que veio introduzir aos mencionados artºs 814º e 816º.
Antes da entrada em vigor do DL nº 226/2008, o artº 814º, que não continha os actuais nºs 2 e 3, subordinado à epígrafe “Fundamentos de oposição à execução baseada em sentença”, enunciava os fundamentos de oposição à execução baseada em sentença, entre eles se incluindo a al. g) - qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração e se prove por documento … -, fundamento este que é o invocado pelo oponente/apelado na oposição, na medida em que alega a compensação ... pagamento da factura peticionada no requerimento de injunção, em data anterior à instauração desta.
Todavia, com as alterações introduzidas pelo DL nº 226/2008, ao preceito legal em apreço, cuja epígrafe passou a ser “Fundamentos de oposição à execução baseada em sentença ou injunção”, designadamente aditando-lhe o nº 2, dispõe expressamente este nº 2 que “O disposto no número anterior (actual nº 1, que correspondia à redacção anterior, no qual são enunciados os fundamentos da oposição) aplica-se, com as necessárias adaptações, à oposição à execução fundada em requerimento de injunção ao qual tenha sido aposta fórmula executória, desde que o procedimento de formação desse título admita oposição pelo requerido”.
Ou seja, a opção do legislador do DL nº 226/2008 foi claramente no sentido de que, não tendo o requerido deduzido oposição ao procedimento de injunção, v.g., invocando qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, já não o pode fazer na oposição à execução baseada em requerimento de injunção no qual tenha sido aposta fórmula executória, ao contrário do decidido no citado Ac. desde Tribunal de 5/7/2006, numa altura em que não existia norma equivalente ao actual nº 2 do artº 814º.
No mesmo sentido aponta a actual redacção do artº 816º, introduzida pelo DL nº 226/2008, subordinado à epígrafe “Fundamentos da oposição à execução baseada noutro título”, que dispõe “Não se baseando a execução em sentença ou em requerimento de injunção ao qual tenha sido aposta fórmula executória, além dos fundamentos de oposição baseados no nº 1 do artigo 814º, na parte que sejam aplicáveis, podem ser alegados quaisquer outros que possam ser invocados no processo de declaração”, nela passando a incluir a expressão “ou em requerimento de injunção ao qual tenha sido aposta fórmula executória”, inexistente anteriormente.
Daí que, estabelecendo o nº 2 do artº 814º que “o disposto no número anterior aplica-se, com as necessárias adaptações, à oposição fundada em requerimento de injunção ao qual tenha sido aposta fórmula executória, desde que o procedimento de formação desse título admita oposição pelo requerido”, e sendo a oposição sempre admitida pelo DL 269/98 (cfr. Amâncio Ferreira, Curso de Processo de Execução, 11ª ed., 2009, pág. 184), não tendo a oponente/apelante deduzido oposição ao requerimento de injunção, não seja admissível o fundamento de oposição que deduziu à execução baseada naquele título ao qual foi aposta fórmula executória, fundamento que integraria a al. g) do nº 1 do artº 814º.

Mas, a recorrente suscita a questão da inconstitucionalidade do artº 814º, nº 2, na redacção do DL nº 226/2008, quando interpretada no sentido de “limitar a oposição à execução fundada em injunção à qual foi aposta fórmula executória”.
Chamado a pronunciar-se sobre a questão, o Tribunal Constitucional tem vindo a entender de forma largamente maioritária, como se extrai dos subscritores dos arestos que se citarão, que a norma em questão, na medida em que limita injustificadamente os fundamentos de oposição à execução baseada em “requerimento de injunção a que foi aposta fórmula executória”, padece do vício de inconstitucionalidade por violar o “princípio da proibição da indefesa”, enquanto acepção do direito de acesso ao direito e aos tribunais consagrado no artigo 20º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa [acórdãos nº 437/2012, 468/2012, ambos proferidos por unanimidade, e nº 529/2012, com um voto de vencido, todos disponíveis em Link Para o Tribunal Constitucional (Acórdãos), www.dgsi.pt., e bem assim no acórdão proferido no processo nº 4861/11.0YYPRT-A.P1 deste Tribunal e Secção, no recurso dele interposto da decisão proferida em 5/7/2012, disponível no referido sítio da Internet].
Como se afirma nesses arestos, não obstante a norma em questão resultar agora directamente do texto da lei, ou seja, constituir uma opção do legislador, limita excessivamente os fundamentos de oposição à execução baseada em requerimento de injunção a que foi aposta fórmula executória, face ao regime de formulação desse título, sendo pertinente chamar à colação o que, a esse propósito, se referiu supra sobre a admissibilidade dos fundamentos de oposição à injunção a que foi aposta fórmula executória, antes das alterações introduzidas ao artº 814º pelo DL nº 226/2008 no entendimento sufragado como adjunto pelo ora relator (acórdão deste Tribunal de 5/7/2006).
Face ao exposto, entende-se que a norma do artº 814°, nº 2, do Código de Processo Civil, quando interpretada no sentido de limitar a oposição à execução fundada em injunção à qual foi aposta fórmula executória, é inconstitucional por violação do direito de defesa, pelo que, afastando a aplicação dessa norma, é de admitir a oposição à execução apresentada pela apelante.

Admissibilidade da compensação.
Nesta questão, que a proceder implicará o prosseguimento da oposição, pois que, nos termos do disposto no artº 510º, nº 1, al. b), o despacho saneador só deve conhecer do mérito da causa se o estado do processo o permitir, sem necessidade de mais provas, sustenta a apelante a admissibilidade da compensação que invocou e que o Tribunal recorrido entendeu não ser admissível.
Recusada, pelo que se referiu na questão antecedente, a aplicação da norma constante do artº 814º, nº 2, não pode deixar de proceder a questão.
Vejamos porquê.
Dispõe o artº 847º do Código Civil (CC)) que “quando duas pessoas sejam reciprocamente credor e devedor, qualquer delas pode livrar-se da sua obrigação por meio de compensação com a obrigação do seu credor, verificados os seguintes requisitos:
a) Ser o seu crédito exigível judicialmente e não proceder contra ele excepção, peremptória ou dilatória, de direito material;
b) Terem as duas obrigações por objecto coisas fungíveis da mesma espécie e qualidade”.
Se as duas dívidas não forem de igual montante, pode dar-se a compensação na parte correspondente - cfr. nº 2 da citada disposição legal - sendo que a iliquidez da dívida não impede a compensação - cfr. nº 3.
Estipula, por sua vez, o artº 848º, nº 1, do CC, que a compensação se torna efectiva mediante declaração de uma das partes à outra, sendo indiscutível que tal declaração - destinada a tornar efectiva a compensação - pode ser efectuada em acção judicial por via de excepção, como sucede no caso em apreço.
No que respeita ao processo de execução que se não baseie em sentença, dispõe o artº 816º do Código de Processo Civil que, além dos fundamentos especificados no artº 814º, na parte em que sejam aplicáveis, podem ser alegados quaisquer outros que seria lícito deduzir como defesa no processo de declaração.
Daí que a compensação, enquanto facto extintivo da obrigação, constitua fundamento de oposição à execução. E, se é certo que, no âmbito da execução fundada em sentença, a compensação apenas constitui fundamento de oposição à execução desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração (já que, sendo anterior, teria que ser invocada na acção declarativa onde foi proferida a sentença) e se prove por documento [artº 814º, alínea g) do Código de Processo Civil], certo é também que tais restrições não existem no âmbito da execução fundada noutro título.
Nesta, a compensação pode ser invocada nos mesmos termos e nas mesmas circunstâncias em que poderia ser invocada no processo de declaração (artº 816º do Código de Processo Civil).
Sendo assim, impõe-se, desde já, concluir que, ao contrário do que se considerou na decisão recorrida, a circunstância de a oponente não ter junto documento comprovativo seja totalmente irrelevante para efeitos de admissibilidade de invocação da compensação na oposição à execução, sendo certo que esse não constitui, manifestamente e face ao disposto no citado artº 847º, um dos requisitos de que depende a sua invocação, afigurando-se não ser legítimo invocar - para efeitos de não admitir a compensação - argumentos que apenas teriam aplicação no âmbito do processo de execução, como já que, como resulta do disposto no art. 816º do Código de Processo Civil, o legislador admitiu, nas execuções não baseadas em sentença, a possibilidade de invocação de todos os meios de defesa que seriam admissíveis no processo de declaração.
Importa, assim, saber se estão ou não verificados os pressupostos de que depende a admissibilidade da compensação, pressupostos esses que estão enunciados no citado artº 847º.
A compensação pressupõe, em primeiro lugar, a reciprocidade de créditos, reciprocidade que nada tem a ver com a existência de sinalagma entre as duas prestações, (que no caso existe porquanto o crédito invocado para efeitos de compensação tem a sua fonte ou origem na mesma relação que fundamentava o pedido da exequente.
Aliás, a reciprocidade de créditos significa apenas que a compensação apenas pode operar entre pessoas que sejam reciprocamente credor e devedor, ou seja, é necessário que o devedor de determinada obrigação seja, por força da mesma ou de diversa relação jurídica, credor do seu credor.
É assim que, por força do disposto no artº 851º, a compensação apenas pode abranger a dívida do declarante (e não a de terceiro) e apenas pode operar mediante a utilização de créditos que sejam do próprio declarante (e não créditos alheios).
Deste modo, perante os factos alegados pela oponente, existe reciprocidade de créditos, na medida em que o crédito que a mesma invoca para extinguir a sua obrigação relativamente ao exequente é um crédito dela sobre a exequente.
Ou seja, de acordo com os factos alegados, oponente e exequente são, reciprocamente, credor e devedor.
Mas, para além da reciprocidade de créditos, a compensação pressupõe ainda que o crédito invocado para efeitos de compensação seja judicialmente exigível e não proceda contra ele excepção, peremptória ou dilatória, de direito material.
Sobre o que deve entender-se por crédito judicialmente exigível, há quem entenda que o crédito apenas é judicialmente exigível quando já está reconhecido e quando o credor está em condições de obter a sua realização coactiva, instaurando a respectiva execução (cfr., neste sentido, os Acórdãos deste Tribunal de 19/01/2006 e de 18/03/2004, ambos em www.dgsi.pt.).
Aparentemente, resulta desses arestos que o crédito só será judicialmente exigível se já estiver reconhecido e se o respectivo titular estiver em condições de o executar, ou seja, se estiver munido de título executivo.
Não cremos, porém, que esse entendimento não pode ser acolhido com a amplitude que dele parece resultar.
Com efeito, como se acentuou, não podem aqui ser invocados quaisquer argumentos que apenas teriam aplicação à execução executiva, como será o caso da afirmação feita naqueles acórdãos de que a admissibilidade da compensação naquelas circunstâncias (sem estar judicialmente reconhecido o crédito) corresponderia a “…abrir o caminho para entorpecer, ou até inviabilizar, a actividade de cobrança rápida e eficaz de créditos”, já que, como resulta do disposto no artº 816º do Código de Processo Civil, o legislador admitiu, nas execuções não baseadas em sentença, a invocação de todos os meios de defesa que seriam admissíveis no processo de declaração, e, portanto, se a invocação da compensação for possível no âmbito de uma acção declarativa, também o será no âmbito de uma acção executiva que não se funde em sentença.
Conforme refere Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. II, 7ª ed., pág. 204, “Para que o devedor se possa livrar da obrigação por compensação, é preciso que ele possa impor nesse momento ao notificado a realização coactiva do crédito (contra-crédito) que se arroga contra este” que, mais à frente, acrescenta “Diz-se judicialmente exigível a obrigação que, não sendo voluntariamente cumprida, dá direito à acção de cumprimento e à execução do património do devedor … requisito que não se verifica nas obrigações naturais (artº 402º), por uma razão, nem nas obrigações sob condição ou a termo, quando a condição ainda se não tenha verificado ou o prazo ainda se não tenha vencido, por outra”.
Ou seja, a obrigação é judicialmente exigível quando o credor puder exigir o seu cumprimento imediato, através de uma acção executiva (se já estiver munido de título executivo) ou (não estando munido de título executivo) através de uma acção declarativa tendente a obter uma sentença que, reconhecendo a existência da obrigação e a sua exigibilidade judicial, condene o devedor ao seu imediato cumprimento.
Já se tem objectado que, se se entendesse que um crédito exigível judicialmente é aquele que pode ser peticionado em tribunal, isso significaria que qualquer crédito seria bom para compensação porque - com excepção das obrigações naturais - qualquer crédito pode, teoricamente, ser exigido em tribunal.
É certo que a exigibilidade judicial da obrigação não pode ser equiparada à mera possibilidade de a mesma ser peticionada em tribunal (porquanto os créditos inexigíveis também podem ser peticionados em tribunal - cfr. artº 662º do Código de Processo Civil), mas tal exigibilidade também não pode ser reduzida aos casos em que existe título executivo e o credor está em condições imediatas de recorrer à acção executiva.
A exigibilidade judicial da obrigação nada tem a ver com a existência de título executivo.
Com efeito, o credor pode estar munido de título executivo e, apesar disso, a obrigação não ser exigível (por não estar verificada uma condição ou por não estar ainda vencida), caso em que a execução se inicia pelas diligências necessárias a tornar a obrigação exigível - cfr. artº 802º do Código de Processo Civil.
Por outro lado, a mera inexistência de título não obsta a que a obrigação seja imediatamente exigível, peticionando o respectivo credor, em acção declarativa o seu cumprimento imediato.
Do exposto decorre que a obrigação é judicialmente exigível se, em determinado momento, o credor tem o direito de exigir em tribunal o seu cumprimento imediato, através de acção executiva (se estiver munido de título executivo) ou através de acção declarativa (se não tiver título) onde possa obter decisão que, reconhecendo a existência e a exigibilidade da obrigação, condene ao devedor ao seu cumprimento imediato.
A obrigação é judicialmente inexigível quando o credor não pode exigir o seu cumprimento (como é o caso das obrigações naturais) ou quando não o pode fazer nesse momento e, consequentemente, não está em condições de obter uma decisão que condene o devedor ao seu imediato cumprimento, porque, embora seja reconhecida a existência da obrigação, a mesma é inexigível (caso em que, nos termos do artº 662º do Código de Processo Civil, o devedor é condenado a satisfazer a prestação no momento próprio e não de imediato).
Ora, ressalvando a situação (a que se reportam alguns dos arestos atrás citados) de o crédito já estar a ser discutido numa outra acção que se encontra pendente ou a situação de a própria existência do crédito estar dependente de uma decisão que ainda não existe (como será o caso de um crédito de indemnização por facto ilícito, cuja existência está dependente de decisão ou declaração que reconheça a existência de responsabilidade civil), é na acção onde é deduzida a compensação que deve ser apreciada e constatada a existência e exigibilidade do crédito, por forma a concluir se tal crédito existe e se pode ou não ser invocado para fins de compensação.
O que significa que a mera circunstância de o crédito não estar judicialmente reconhecido e a mera circunstância de o crédito ser controvertido - porque o respectivo devedor impugna a sua existência - não constituem, em princípio, obstáculo à admissibilidade de invocação da compensação, na oposição à execução, para efeitos de extinção do crédito exequendo, devendo ser feita a prova do crédito e da sua exigibilidade no processo onde a compensação é invocada - cfr., neste sentido, os Acórdãos da Relação de Coimbra de 03/12/2009, e deste Tribunal de 09/05/2007 e de 3/11/2010, todos em www.dgsi.pt..
Naturalmente que, se a existência ou a exigibilidade do crédito que é invocado para efeitos de compensação é impugnada pelo pretenso devedor, não estando previamente reconhecida por decisão judicial, a compensação apenas poderá ter eficácia extintiva da obrigação caso venha a ser reconhecida a existência e a exigibilidade desse crédito.
Mas isso não determina, sem mais, a inadmissibilidade de invocação da excepção, determinando apenas a necessidade de produção da prova necessária de forma a que, no processo onde a compensação é invocada, seja apreciada a existência e exigibilidade do crédito, bem como a verificação dos demais pressupostos de que depende a compensação, enquanto causa de extinção do crédito que, nesse processo, era peticionado.
No caso em apreço, a oponente alega que teve prejuízos com o fornecimento de produtos que lhe foi efectuado pela exequente, cujo pagamento reclama na acção declarativa que contra ela instaurou e atrás referida.
A provar-se tal alegação, a mesma é susceptível de integrar a excepção da compensação, o que implica a necessidade de a oposição prosseguir seus termos.

III. DECISÃO.

Pelo exposto, acordam os juízes que constituem esta Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto, em julgar parcialmente procedente a apelação e, em consequência, revogar a decisão recorrida e ordenar o prosseguimento da oposição, sem prejuízo da suspensão da instância nos termos referidos na fundamentação.

*
Custas da apelação pela parte vencida a final.
*
Porto, 28/06/2013
António do Amaral Ferreira
Ana Paula Fonseca Lobo
Deolinda Maria Fazendas Borges Varão