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CONTRATO PROMESSA
CONDIÇÃO RESOLUTIVA
Sumário
“I. Deve-se entender que os contraentes visaram estabelecer uma condição resolutiva, quando, num contrato promessa de compra e venda de parte de prédio rústico, estipularam que a celebração do contrato definitivo (prometido) ficava condicionada à efectiva desanexação (do prédio mãe) da parcela pretendida, objecto da prometida venda, sob pena do contrato promessa ficar sem efeito.
2. Nestas circunstâncias, se os promitentes vendedores não lograrem desanexar a prometida área do terreno, deve-se concluir que, por verificação da condição resolutiva, ocorre a extinção do contrato promessa, por resolução automática do mesmo, sem penalização alguma para os contraentes.
3. Mesmo que os promitentes vendedores lograssem provar algum incumprimento por parte do promitente comprador, sempre a resolução então pretendida do contrato e fundada naquele incumprimento encontraria obstáculo na impossibilidade dessa declaração de resolução operar os seus efeitos, face à prévia extinção automática do contrato promessa, derivada da verificação da condição resolutiva expressamente estipulada pelas partes no mesmo.
4. Assim, verificando-se a condição resolutiva, nunca a conduta do promitente comprador de recusar a outorga da escritura pública definitiva (que consubstanciaria o incumprimento definitivo, na tese dos promitentes vendedores), podia fundamentar o exercício válido do direito de resolução por parte daqueles, já que não se pode tornar operativa a resolução do contrato comunicada quando o mesmo já se mostrava extinto por verificação da condição resolutiva (impossibilidade de cumprir a obrigação de desanexação da parcela do prédio, objecto da prometida venda).
Texto Integral
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.
I. RELATÓRIO.
Recorrente(s):- J. C., M. C. e Herança Ilíquida e indivisa aberta por óbito de M. G..
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M. A. instaurou a presente acção declarativa com processo comum, contra J. C. e esposa C. R., M. C. e marido J. M., M. P. e Herança Ilíquida e indivisa aberta por óbito de M. G., X IMOBILIÁRIA, Lda. e S. S. peticionando que se declare resolvido o contrato-promessa junto como documento 5, por incumprimento e culpa e exclusiva dos RR. identificados em I, II e IV e sejam todos os RR. condenados a pagaram solidariamente ao A. a quantia de €10.000,00 (sinal em dobro); subsidiariamente, seja decretada a resolução do mesmo contrato-promessa, por verificação da condição resolutiva prevista no número 2, da cláusula terceira e, por via disso, os RR. condenados a pagaram solidariamente ao A. a quantia de 6.489,54, respeitando €5.0000,00 à restituição do sinal e €1.489,54 a indemnização por danos patrimoniais do A.; subsidiariamente, ainda, serem os RR. condenados nesta última quantia, mas a título de enriquecimento sem causa.
Para tanto, alega, em síntese, que tendo visto uma publicidade da R. X que anunciava a venda do prédio inscrito na matriz predial sob o número 222, contactou a R. S. S. que lhe comunicou que era uma parte do prédio que se encontrava à venda, tendo o A. dito que apenas pretendia comprar aproximadamente 2.500 m2. Os RR. asseguraram ao A. que esse prédio tinha sido objecto de partilha cabendo uma quarta parte ao decesso M. G., pai dos RR. J. C. e M. C. e marido da R. M. P. e asseguraram destacar uma parcela do mesmo com a área pretendida pelo A..
Alega que o A. aceitou, e, em 11.11.2014, outorgaram o contrato-promessa de compra e venda, junto como documento nº 5., mas condicionaram a concretização da compra e venda à efectiva desanexação da área aproximada de 2.500 m2. Nessa altura, e a título de sinal, o A. entregou à R. S. S. €5.000,00. Contudo o prédio tinha mais três comproprietários, e como estes não deram o consentimento à desanexação, a R. fez a participação do prédio como omisso no Serviço de Finanças, com a área de 2200 m2, e assim inscreveu o prédio na matriz e, na sequência, os RR. procederam ao seu registo na CRP.
Alega que o A. em Março instou os promitentes vendedores a procederem à escritura até ao dia 10 de Abril de 2015, advertindo-os que apenas outorgaria a dita escritura desde que todos os proprietários do prédio mãe aceitassem a desanexação. Em face da falta de autorização, o A. solicitou a devolução do sinal, mas os RR. não devolveram e marcaram a escritura de compra em venda em causa e o A., tendo comparecido, recusou-se a assinar a mesma, pois o prédio que da escritura constava não era o mesmo prometido vender. Por tal facto o A. teve de pagar no cartório €489,54.
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Os RR., foram regularmente citados e contestaram a acção e deduziram pedido reconvencional.
Assim, contestaram, excepcionando desde logo a ilegitimidade dos RR. que não figuram no contrato-promessa, devendo apenas serem demandados no incumprimento de tal contrato os RR. J. C. e M. C..
Mais defendem que o que prometeram vender foi uma unidade autónoma demarcada e dividida, material e fisicamente do prédio identificado em 5 da p.i., há mais de 40 anos, nele praticando todos os actos conducentes à usucapião. E foi o A. que escolheu a parcela que pretendia com 2.200m2, mas como tal prédio não estava reconhecido no Serviço de Finanças, foi necessário proceder a tal, e disso foi dado conhecimento ao A.
Alegam ainda que o A. apesar de ter remetido a carta aos RR. de interpelação para marcação, deu a mesma sem efeito ao apresentar-se no dia 28 de Maio de 2015 para celebrar a escritura. Assim foi este que ao recusar-se a assinar a dita escritura que incumpriu com o contrato.
Terminam, deste modo, pugnando pela absolvição dos RR. e a condenação do A. a reconhecer o seu incumprimento do contrato-promessa e a ver declarado perdido a favor dos co-RR. J. C., M. C. e M. P., o montante de €5.000,00 que entregou a título de sinal, bem como a pagar indemnização pelos prejuízos causados, a liquidar em execução de sentença.
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Os AA., em sede de resposta, pugnam pela improcedência da excepção e pela improcedência do pedido reconvencional, impugnando os factos contrários à versão que havia apresentado em sede de petição, que mantém.
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Foi decidida improcedente a alegada excepção de ilegitimidade, admitida a reconvenção e proferido despacho saneador.
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Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com observância de todo o formalismo legal.
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Na sequência foi proferida a seguinte sentença:
“IV. DECISÃO
Pelo exposto, julga-se procedente um dos pedidos subsidiários e, em consequência:
A) Condeno os RR. J. C., M. C. e Herança Ilíquida e Indivisa de M. G. a restituir ao A. a quantia de €5.000,00 (cinco mil euros), correspondente ao sinal, em singelo, por si recebido, a que acresce a quantia de €489,54 (quatrocentos e oitenta e nove euros e cinquenta e quatro cêntimos) e os respectivos juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal, contados desde a data da citação até integral pagamento; B) Absolvo os RR. J. C., M. C. e Herança Ilíquida e Indivisa de M. G. dos restantes pedidos formulados; C) Absolvo os RR. M. P., X Imobiliária, Lda. e S. S. dos pedidos formulados; D) Absolvo o A. do pedido reconvencional contra si deduzido..”
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É justamente desta decisão que os Recorrentes vieram interpor o presente Recurso, concluindo as suas alegações da seguinte forma:
“1 – A sentença recorrida, ao dar como provados os factos 23º, 25º e 26º, primeira parte, e como não provados os factos os factos vertidos nos § 2º a 8º, andou mal, por erro na apreciação das provas produzidas, razão pela qual se visa também, com o presente recurso, impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto, mais concretamente os factos anteriormente identificados, como adiante se exporá; 2 - Por esse motivo, e em cumprimento do disposto no art. 640º do CPC, desde já os recorrentes especificam que: a) Considera ter sido incorrectamente julgada a matéria de facto constante da sentença recorrida nos factos provados, nos pontos factos 23º, 25º e 26º, primeira parte, na medida em que os factos ali insertos deveriam ter sido julgados, clara e inequivocamente, conforme consta do ponto VI destas alegações, e da matéria de facto não provada que deveria ter sido dada como provada, os identificados em § 2º a 8º; b) A decisão que se impunha sobre aquela matéria factual, diversa da recorrida, era efectivamente a única possível, até por força da circunstância do ónus da respectiva prova incumbir, indubitavelmente, ao A./recorrido e por força de praticamente todos os meios probatórios produzidos, nomeadamente, do depoimento de parte, dos documentos juntos aos autos, bem como dos depoimentos gravados no processo, das testemunhas dos RR./recorrentes constantes da gravação digital, disponibilizados aos recorrentes em CD, L. M., L. S. e R. A.. 3 - E tendo-se verificado erro na apreciação das provas, e sendo algumas delas meios probatórios que foram gravados, os recorrentes indicam, em cumprimento do disposto no n.º 2 do art. 640º, n.º 2, al. a) do CPC, os depoimentos em que se fundam, por referência ao assinalado na acta, a saber:
-o depoimento das testemunhas identificadas em V c), bem como o seu depoimento, cujas passagens concretas que impõe decisão diversa foram referidas ao longo destas alegações, nomeadamente, em V c); e 4 – Impõe-se alterar a matéria de facto nos termos supra referidos em VI da alegação; 5 – Se o prédio identificado em 5. dos factos provados estava em compropriedade, conforme a cláusula primeira, nº 1, do contrato-promessa, de fls. 34 e 35, o recorrido quando assinou o dito contrato conhecia a situação jurídica do prédio; 6 - Do elenco dos factos provados não resulta que a parcela prometida vender não possa ser desanexada do referido prédio, por falta de consentimento dos demais comproprietários ou por qualquer outro motivo; nem que o referido prédio não possa ser dividido, entre os comproprietários, e, após a divisão, não possa ser desanexada a parcela da parte que seja adjudicada aos recorrentes; 7 – Para que a condição resolutiva se pudesse ter como verificada era necessário dar como provada a impossibilidade definitiva da desanexação da parcela prometida vender do prédio dos promitentes vendedores, mesmo que os demais comproprietários não dessem autorização à desanexação da referida parcela do prédio identificado em 5., sempre os recorrentes poderiam desanexar sem consentimento dos demais comproprietários, após a divisão do prédio, nos termos do art. 1412º, nº 1, do CCivil; 8 – Não está, pois, verificada a condição resolutiva, para que tal suceda, era necessário estarem esgotadas as possibilidades de desanexação da parcela prometida vender e do texto do acervo dos factos dados como provados não resultam provadas que todas as possibilidades de desanexação estejam fora de hipótese; 9 – O facto de os recorrentes não o terem feito, ou seja, desanexado a parcela, não significa que se verifique a condição resolutiva ou, ainda, incumprimento definitivo dos recorrentes, até porque o prazo fixado pelos recorrentes na interpelação inserta em 22. não tem o efeito cominatório do incumprimento definitivo, ultrapassada a data fixada, porque da mesma não surtiu esse efeito; 10 – A sentença recorrida violou os arts. 270º, 342º, nº1, 349º, 351º, 352º, 356º, nº2, 376º, nºs 1 e 2,1305º, 1412º, nº 1, e 1413º, todos do CCivil e o art. 607º, nºs 4 e 5, do CPC.
TERMOS EM QUE, deve a sentença recorrida ser revogada e proferido Acórdão que considere a acção improcedente, e a reconvenção procedente”.
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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II- FUNDAMENTOS
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.
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No seguimento desta orientação, a(o)(s) Recorrente(s) coloca(m) as seguintes questões que importa apreciar:
1. Determinar se o tribunal a quo incorreu num erro de julgamento, e, consequentemente, se, reponderado esse julgamento, devem:
- ser alterados os factos constantes dos pontos 23º, 25º e 26º, primeira parte, devendo tal matéria de facto merecer a seguinte resposta:
“23. O Autor solicitou aos Réus a devolução de 5.000 € (cinco mil euros) que lhes tinha pago a título de sinal.
25. Passa a constar como não provado.
26. Os RR. procederam à marcação da escritura de compra e venda do referido prédio, inscrito sob o artigo 444, no Cartório Notarial de Monção, para o dia 27 de Maio de 2015, pelas 15:00 horas.”
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-considerar-se provados os factos que a sentença de primeira Instância considerou como não provados nos pontos 2º a 8º de matéria julgada como não provada.
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2. Saber se, sendo modificada a matéria de facto no sentido propugnado pelo(s) Recorrente(s), a acção (primitiva) tem de improceder e, por outro lado, a acção reconvencional deve ser julgada procedente.
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A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
A sentença proferida em 1ª instância julgou provados os seguintes factos:
“III. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Factos Provados
1. O Autor é empresário da actividade fúnebre, sendo sócio gerente da sociedade comercial por quotas designada W. – AGÊNCIA FUNERÁRIA LDA, NIPC …, com sede no lugar de …, freguesia de …, concelho de Monção. 2. A referida empresa W. tem por objecto social, entre outros, a Prestação de serviços relativos à organização e realização de funerais, transporte de cadáveres para exéquias fúnebres, inumação, cremação ou expatriamento e transladação de restos mortais já inumados. 3. O Autor pretendia adquirir em nome próprio, mas com a perspectiva de ulteriormente afectar o respectivo uso à actividade exercida pela referida sociedade, um terreno onde fosse possível proceder à construção de um edifício destinado às instalações laborais desta. 4. Para o efeito, apercebeu-se de que se encontrava à venda um terreno que infra se descreverá, mediante a visualização de uma placa existente no mesmo com os dizeres publicitários da Ré X LIMITADA, a qual anunciava “VENDE-SE”. 5. O referido terreno correspondia a um prédio rústico, composto por terreno de pinhal e mato, sito no lugar …, freguesia de … (presentemente freguesia de Monção e Troviscoso), concelho de Monção, inscrito na respectiva matriz sob o artigo 222 e na extinta matriz da freguesia de … sob o artigo 999, descrito na Conservatória do Registo Predial de Monção sob o número 15907 da Freguesia de Troviscoso, o qual possuía uma área total de 16 200 m2 (dezasseis mil e duzentos metros quadrados) 6. O Autor contactou pessoalmente a Ré S. S., a qual é sócia gerente da Ré X IMOBILIÁRIA LIMITADA, no sentido de averiguar qual o preço de venda e as características do terreno e pela mesma foi dito que o terreno que se encontrava à venda era uma parte do prédio mencionado em 5 supra. 7. O Autor transmitiu-lhe que pretendia adquirir, unicamente, a área aproximada de 2 500 m2 do mesmo com o fim de aí edificar um edifício que servisse de instalações laborais para o exercício da actividade prosseguida pela sociedade de que era sócio gerente, a citada W. LDA. 8. No seguimento da aludida conversa, a Ré S. S. contactou os demais Réus, transmitindo-lhes a intenção do Autor e estes asseveraram ao Autor que o prédio mencionado em 5. supra tinha sido objecto de partilha em virtude da qual coubera uma quarta parte do mesmo ao decesso M. G., pai dos Réus J. C. e M. C. e marido da Ré M. P., quinhão esse que corresponderia a aproximadamente 4 000 m2 da totalidade da área do prédio e que, sendo os sobreditos réus os únicos e universais herdeiros do M. G., estavam na disponibilidade de destacar uma parcela do mesmo com a área pretendida pelo Autor de aproximadamente 2 500 m2, que se localizaria no local pretendido pelo Autor e por este indicado aos Réus (junto à Estrada Municipal) e vender-lha pelo preço de € 45 000,00 (quarenta e cinco mil euros). 9. O Autor aceitou o preço e, consequentemente, outorgaram um contrato promessa de compra e venda, em 11 de Novembro de 2014. 10. No aludido contrato promessa de compra e venda, os Réus J. C.; M. C. e a HERANÇA ILIQUIDA E INDIVISA ABERTA POR ÓBITO DE M. G., então representada pelo co-Réu J. C., assumiram a posição contratual de promitentes vendedores da idealizada parcela de terreno com a área aproximada de 2 500 m2 pretendida pelo Autor, e este assumiu a posição contratual de promitente comprador da mesma. 11. Ficou estipulado na cláusula primeira do aludido contrato que:
“1 – Os primeiros outorgantes são donos e legítimos proprietários de ¼ do prédio rústico, sito no lugar da Ponte – Igreja, freguesia de Troviscoso inscrito na respectiva matriz sob o artigo 222. --------------------------------
2 – Os primeiros outorgantes por este contrato prometem vender ao segundo outorgante que, por sua vez promete comprar, a área correspondente a aproximadamente 2.500 m2 do referido prédio. -----------
3 – Para o efeito do número anterior, o primeiro outorgante está a diligenciar no sentido de desanexar a parcela aqui objecto de venda.---------- “ 12. Na cláusula segunda do referenciado contrato, ficou estabelecido o preço da aludida compra e venda, qual seja € 45 000,00 (quarenta e cinco mil euros), que seria pago pelo Autor aos Réus promitentes vendedores fraccionadamente, em duas prestações. Uma no valor de € 5 000,00 (cinco mil euros) a pagar pelo Autor no acto de assinatura do referido contrato, e à qual lhe foi conferido pelas partes o carácter de sinal e antecipação parcial do pagamento do preço. Outra, correspondente à quantia remanescente de € 40 000,00 (quarenta mil euros) que seria paga pelo Autor no acto da escritura definitiva de compra e venda. 13. Para pagamento da supra mencionada primeira prestação correspondente ao sinal, o Autor entregou à Ré S. S., sócia gerente da sociedade Ré X IMOBILIÁRIA LIMITADA, o cheque com o nº ...4, pelo valor de € 5 000,00 (cinco mil euros), datado de 11 de Novembro de 2014 e sacado sobre a conta nº ...3 do Banco Y. 14. O aludido cheque foi apresentado a pagamento em 13 de Novembro de 2014 pela Ré X IMOBILIÁRIA LIMITADA, tendo a referida quantia de € 5 000,00 sido debitada da conta do Autor nessa mesma data. 15. Mais ficou estipulado na cláusula terceira do sobredito contrato promessa de compra e venda que:
1 – A escritura notarial de compra e venda será celebrada, no prazo máximo de 15 dias, após o momento em que toda a documentação legalmente exigida esteja em ordem, considerando-se ambos os promitentes devidamente informados do mesmo pela assinatura do presente contrato promessa, sem necessidade de futura notificação. --------
2 – A escritura definitiva apenas será realizada mediante o cumprimento do estabelecido na cláusula primeira nº 3, caso o mesmo não se verifique este contrato fica sem efeito, sendo devolvido o valor de sinal entregue. ----------------
3 – Ficam por conta dos promitentes compradores as despesas ocasionadas com a escritura de compra e venda desta transacção. ----------- 16. Ora, o prédio mencionado em 5. supra, que seria o prédio mãe ao qual os Réus promitentes vendedores projectaram subtrair-lhe os 2 500 m2 para vender ao Autor, pertence, também, a outros proprietários, nomeadamente: JOSÉ; HERANÇA ABERTA POR ÓBITO DE J. E.; HERANÇA ABERTA POR ÓBITO DE A. B.. 17. Assim, e para efectivar a desanexação deste prédio dos 2 500 m2 que os Réus prometeram vender aos Autores, careciam os Réus do consentimento e intervenção activa dos demais aludidos comproprietários do prédio, na concretização dos procedimentos administrativos e registrais a realizar para o efeito junto das Finanças e da Conservatória do Registro Predial, mas a Sra. Solicitadora incumbida para o efeito, após ter procedido a diversas diligências junto dos demais comproprietários do prédio supra mencionado, transmitiu ao Autor que estes não prestavam o respectivo consentimento para a sobredita desanexação. 18. Subsequentemente, a Sra. Solicitadora e a Ré S. S. abordaram o Autor e apresentaram-lhe uma participação de prédio omisso no Serviço de Finanças, da qual constava terem os Réus promitentes vendedores participado no Serviço de Finanças a omissão na respectiva matriz de um prédio rústico pertencente à herança ora Ré, com a área de 2 200 m2, localizado no lugar …, freguesia de …, concelho de Monção, confrontando do norte com Estrada Nacional, do Sul com Caminho Público, do Nascente com caminho de servidão e do Poente com Herdeiros de M. G.. 19. A aludida participação de prédio omisso, originou a inscrição do terreno em causa na matriz predial rústica da freguesia de Monção e Troviscoso, tendo-lhe sido atribuído pelo respectivo Serviço de Finanças o artigo rústico 444 e subsequentemente, em 11 de Maio de 2015, os Réus procederam ao registo do terreno em causa na Conservatória do Registo Predial, aí lhe tendo sido atribuída a descrição 1491/20150511. 20. Os Réus J. C., M. C. e M. P., para lograrem passar a constar no Registo respeitante ao aludido terreno como sendo os titulares do respectivo direito de propriedade, declararam na Conservatória do Registo Predial que adquiriram o mesmo por sucessão hereditária do decesso M. G.. 21. Em 31 de Março de 2015 sem que os Réus se predispusessem a outorgar a escritura de compra e venda do terreno objecto do contra promessa supra mencionado, o Autor dirigiu aos Réus X IMOBILIÁRIA LIMITADA, M. C. e J. C. cartas registadas com aviso de recepção. 22. Nas referidas cartas o Autor instou os sobreditos Réus, para:
Que procedessem à realização da escritura de compra e venda respeitante à parcela de terreno objecto do contrato promessa de compra, até 10 de Abril de 2015;
Que o Autor somente outorgaria a aludida escritura de compra e venda da parcela de terreno em causa desde que todos os proprietários do prédio mãe, do qual seria desanexada, subscrevessem a referida escritura e autorizassem a necessária desanexação. 23. Perante a sobredita impossibilidade de os Réus desanexarem a parcela de terreno objecto do contrato promessa e, consequentemente, de darem cumprimento ao mesmo, o Autor solicitou-lhes a devolução dos € 5 000,00 (cinco mil euros) que lhes tinha pago a título de sinal. 24. Os RR. transmitiram ao Autor que não admitiam a aludida impossibilidade de desanexarem a parcela de terreno em causa, uma vez considerarem que a mesma já possuía artigo matricial e descrição registral próprios e autónomos relativamente ao sobredito prédio inscrito sob o artigo 222 da freguesia de … e que a criação do artigo lhes permitia formalizar a escritura de compra e venda da parcela de terreno que prometeram vender ao Autor e, que assim sendo, iriam proceder à marcação da escritura pública e notificariam o Autor para comparecer no local, data e hora que lhe fosse indicado para o efeito. 25. Uma vez mais, o Autor reiterou à Ré S. S. e à Sra. Solicitadora, que somente outorgaria a escritura pública que respeitasse à compra e venda de uma parcela de terreno que tivesse sido efectivamente desanexada do prédio inscrito sob o artigo matricial 222 e não a escritura do aludido prédio “ficcionado” pelos Réus, ao qual tinha sido atribuía a inscrição matricial 444. 26. Contra a expressa vontade do A., os RR. procederam à marcação da escritura de compra e venda do referido prédio, inscrito sob o artigo 444, no Cartório Notarial de Monção, para o dia 27 de Maio de 2015, pelas 15:00 horas. 27. O Autor compareceu à hora que lhe foi designada no aludido Cartório Notarial, assim como os Réus acompanhados pela Sra. Solicitadora, contudo, quando a Sra. Notária titular do mesmo, procedeu à identificação do prédio que os Réus pretendiam vender ao Autor, o aludido artigo 444, este recusou-se a assinar a escritura, em virtude de o prédio que os Réus lhe prometeram vender não corresponder a este prédio objecto da escritura. 28. Como consequência de o Autor ter recusado assinar a escritura supra mencionada, foi-lhe imputado pelo aludido Cartório Notarial o pagamento do respectivo custo, que ascendeu à quantia de € 397,29 e pagou, ainda, a quantia de € 92,25 pela emissão do Certificado/Declaração correspondente. 29. O A. deslocou-se diversas vezes ao local e escolheu a parcela prometida vender e comprar, colocando marcos a delimitá-la e fez um levantamento topográfico, através de topógrafo, da parcela delimitada, com 2.200 m2. 30. O A., antes da assinatura do contrato-promessa, logo após que mostrou interesse na aquisição da aludida parcela, estava esclarecido em relação ao prédio que comprava, quanto às suas características, à sua composição, à sua dimensão.
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Factos Não Provados:
- O A. prevê despender com os honorários do Il. Advogado, na presente acção, a quantia de €1.000,00. - O terreno de 4.000 m2 do qual os RR. prometeram vender ao A. aproximadamente 2200m2, há mais de 20, 30 e 40 anos, que constituía uma unidade autónoma, demarcada e dividida, material e fisicamente, do prédio identificado em 5.. - Desde 1975 que os comproprietários do prédio rústico identificado em 5. o dividiram em quatro unidades autónomas e colocaram marcos para a demarcação de cada uma das unidades, passando cada uma a constituir um prédio rústico devidamente delimitado. - Assim, desde aquela data que os RR. J. C. e M. C. e M. P., por si e antepossuidores, são legítimos possuidores de um prédio rústico, destinado a pinhal e mato, denominado “Ponte”, sito no lugar …., da freguesia de …, concelho de Monção, com a área de 4.000 m2, a confrontar de norte com Estrada Nacional 202, de sul com Estrada Municipal, de nascente com caminho de servidão e de poente com L. C.. - Os RR., J. C. José, M. C. e M. P., por si e antecessores de quem o houveram, vêm possuindo este prédio, procedendo ao corte de lenha, ao roço de mato, à recolha de pruma, à sua limpeza e vigiando-o, dali retirando todas as vantagens, destinadas à satisfação das suas necessidades concreta e diárias, com conhecimento e aceitação de toda a gente, ininterruptamente e sem oposição de quem quer que seja, e na convicção de exercerem um direito próprio de proprietários, com a consciência de não lesarem direitos de outros pessoas, desde a escritura de partilha celebrada em 06 de Junho de 1975. - O A., antes da assinatura do contrato-promessa, logo após que mostrou interesse na aquisição da aludida parcela, estava esclarecido em relação ao prédio que comprava, quanto à situação jurídica. - Antes da assinatura do contrato-promessa de compra e venda, foi dado a conhecer ao A. que o prédio não estava inscrito no Serviço de Finanças, nem descrito na Conservatória do Registo Predial. - O A. nunca se opôs ao procedimento administrativo adoptado pelos RR. e aceitou a designação da escritura pública.
- O A., mesmo sabendo como estava a ser realizada a autonomização do prédio que prometera comprar, até à data em que esteve no Cartório Notarial – 28-05-2015 -, nunca disse aos RR. que não assinaria a escritura.
- Os co-RR. J. C., M. C. e M. P. terão de pagar à co- R. imobiliária mediadora do negócio um valor a título de comissão.
- Estes co-RR. ainda não liquidaram os serviços que contrataram da Sr. Solicitadora.
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B)- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
Já se referiram em cima as questões que importa apreciar e decidir.
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Da impugnação da decisão sobre a matéria de facto:
Compulsado o Recurso interposto, pode-se concluir que, como resulta do corpo das alegações e das respectivas conclusões, os RR/ Recorrentes impugnaram a decisão da matéria de facto, tendo dado cumprimento aos ónus impostos pelo artigo 640.º, nº 1 als. a), b) e c) do CPC, pois que, fazem referência aos concretos pontos da matéria de facto que consideram incorrectamente julgados, e a decisão que, no seu entender, deveria sobre eles ter sido proferida.
Cumpridos aqueles ónus e, portanto, nada obstando ao conhecimento do objecto de recurso nesse segmento, importa verificar, pois, se se pode dar razão aos Recorrentes, quanto aos questionados pontos da matéria de facto.
(…)
Aqui chegados, pode-se, assim, concluir quanto à presente Impugnação da matéria de facto que, à luz do antes exposto, e com base nos meios de prova antes citados, a convicção (autónoma) deste tribunal, em sede de reapreciação da matéria de facto, é, em absoluto, coincidente com a que formou o tribunal recorrido, não se vislumbrando qualquer razão para proceder à alteração do ali decidido, que se mantém na íntegra, seja quanto à factualidade provada, seja quanto à factualidade não provada.
Na verdade, e não obstante as críticas que lhe são dirigidas pelos ora Recorrentes, não se vislumbra, à luz dos meios de prova invocados (e que por nós foram, não obstante a distância e consequente perda de imediação ou proximidade, reanalisados) um qualquer erro ao nível da apreciação ou valoração da prova produzida – sujeita à livre convicção do julgador –, à luz das regras da experiência, da lógica ou da ciência.
Ao invés, a convicção do julgador colhe, a nosso ver, completo apoio nos ditos meios de prova produzidos, sendo, portanto, de manter a factualidade provada e não provada, tal como decidido pelo tribunal recorrido.
Conclui-se, pois, que compulsada a prova produzida, e conjugando os depoimentos de parte produzidos e os depoimentos das testemunhas, com a prova documental junta aos autos, não podem restar dúvidas que os factos constantes dos pontos aqui questionados devem manter-se inalterados, confirmando-se a análise crítica efectuada pelo Tribunal de Primeira Instância quanto a essa factualidade
Em consequência, improcede a apelação nesta parte.
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Aqui chegados, importa verificar se, independentemente de não se ter procedido à alteração da matéria de facto no sentido propugnado pelos Recorrentes deve manter-se a apreciação de mérito efectuada pela Decisão Recorrida, em face da matéria de facto dada como provada.
A questão que se coloca- e que se mantém válida em face da matéria de facto que já havia sido considerada provada-, é a de saber se, em face do clausulado do contrato, se pode entender que o contrato promessa deve ser considerado “sem efeito” por verificação da condição resolutiva expressamente consagrada no contrato.
Não se mostra questionado que, no caso concreto, se discute um contrato promessa de compra e venda de uma parte de um prédio rústico identificado na petição inicial (art. 410º e ss. do CC).
E também se depreende da posição das partes que o que se discutiu neste âmbito era saber se existiu incumprimento definitivo do contrato, imputável a uma das partes (respectivamente, pedido principal -incumprimento dos RR.- e pedido reconvencional -incumprimento do Autor), já que ambas as partes aceitam que só o incumprimento que assuma aquela natureza é que pode fundamentar o exercício do direito de resolução do contrato promessa aqui peticionado por ambas as partes(1).
Além disso, discute-se o pedido subsidiário formulado pelo Autor, fundado na verificação de uma condição resolutiva prevista no contrato.
Como é sabido, de acordo com o disposto no art. 406º do CC o contrato deve ser pontualmente cumprido, só podendo modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos por lei.
As relações obrigacionais podem extinguir-se por resolução – a resolução destrói a relação contratual (validamente constituída), sendo operada por um dos contraentes, com base num facto posterior à celebração do contrato (2).
Consiste ela, assim, na destruição da relação contratual operada por acto posterior de vontade de um dos contraentes que pretende fazer regressar as partes à situação em que se encontrariam se o contrato não tivesse sido celebrado.
O que é preciso é que uma das partes esteja em falta e a outra não, ou seja, que um dos contraentes não execute culposamente o contrato e que o outro o tenha executado ou se tenha prestado a executá-lo.
O direito à resolução do contrato tanto pode ter por fonte a lei como a convenção das partes (art. 432º, nº 1 do CC).
Na generalidade dos casos, a resolução assentará num poder vinculado, obrigando-se a parte que dela se pretende fazer valer a alegar e provar o fundamento, previsto na convenção da partes ou na lei, que justifica a destruição unilateral do contrato (3).
A resolução é, na maior parte dos casos, extrajudicial, não necessitando do concurso do tribunal para operar os seus efeitos, pois que opera mediante declaração de uma parte à outra – art. 436º, nº 1 do CC.
Ao caso dos autos interessa apurar da resolução com fundamento na lei, pois que não pactuaram os contratantes, através da lex contractus, a resolução convencional (não estabeleceram, por acordo, qualquer cláusula resolutiva).
Com efeito, apenas ficou mencionado na cláusula 5ª do contrato promessa que a resolução do contrato ficava subordinada “aos princípios legais aplicáveis”, remetendo para o regime legal.
Assim, não se pode considerar que tal cláusula traduza efectivamente uma cláusula resolutiva expressa.
Com efeito, “… a resolução convencional baseia-se num acordo, normalmente ajustado aquando da celebração do negócio, nos termos do qual uma das partes pode pôr termo ao contrato por qualquer motivo que as partes tenham aceitado…” (4).
Assim, por via de regra, da cláusula de resolução deriva que uma das partes pode resolver o contrato sem se discutir a gravidade do incumprimento, nem a culpa do faltoso, constituindo uma ameaça para o potencial incumpridor que será impelido a cumprir pontualmente a obrigação a que se encontra adstrito.
Ora, “…não constitui uma verdadeira cláusula de resolução a remissão para um regime legal de resolução ou a mera referência de que se confere o direito de resolver o contrato nos termos gerais, excepto se as regras para as quais se remete, com soluções diversas das que resultam do regime supletivo legal, não se aplicassem àquela relação contratual… “ (5)
Assim, não há que confundir estas situações em que se especificam as condições em que há lugar à resolução do contrato, com aquelas em que os contraentes se limitam a remeter genericamente para o regime legal da resolução dos contratos.
Na verdade, “… cumpre realçar que é muito frequente- o que tem sido relevado devidamente pela doutrina-, a cláusula que determina que “se considera resolvido o contrato no caso de incumprimento de qualquer das obrigações dele emergentes”.
Tal convenção qualificada como sendo de estilo ou até inútil, não representa qualquer modificação do regime legal de incumprimento. A sua falta de precisão, o facto de ser genérica e indeterminada, torna-a uma cláusula não distintiva para produzir o efeito produzido…” (6).
Ora, é justamente isso que sucede, no caso concreto, em que os contraentes não especificaram qualquer condição concreta que permitiria a resolução do contrato.
Nessa medida, pode-se concluir que os contraentes, apesar da declaração genérica constante do contrato não convencionaram efectivamente uma cláusula resolutiva expressa nos termos expostos.
No entanto, decorre do teor do contrato que as partes contraentes subordinaram a celebração do contrato a uma condição resolutiva.
Com efeito, o presente contrato promessa foi celebrado, no âmbito da liberdade contratual (art. 405º do CC) (7), com a estipulação da seguinte cláusula contratual livremente estabelecida pelas partes contraentes (cláusula Terceira):
”… 1 – A escritura notarial de compra e venda será celebrada, no prazo máximo de 15 dias, após o momento em que toda a documentação legalmente exigida esteja em ordem, considerando-se ambos os promitentes devidamente informados do mesmo pela assinatura do presente contrato promessa, sem necessidade de futura notificação. --------
2 – A escritura definitiva apenas será realizada mediante o cumprimento do estabelecido na cláusula primeira nº 3, caso o mesmo não se verifique este contrato fica sem efeito, sendo devolvido o valor de sinal entregue. ----------------
3 – Ficam por conta dos promitentes compradores as despesas ocasionadas com a escritura de compra e venda desta transacção. -----------
Lê-se ainda na referida cláusula Primeira, nº 3 que:
“3- Para o efeito do número anterior, o primeiro Outorgante está a diligenciar no sentido de desanexar a parcela aqui objecto da venda”
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Ora, esta cláusula contratual configura (8) inequivocamente uma cláusula em que se estipula a chamada “ condição resolutiva “(cfr. artigo 270º do Código Civil) (9).
Como resulta do art. 270º do CCivil, a condição é suspensiva se o negócio só produz efeitos após a verificação do evento condicionante, suspendendo assim a sua eficácia; é resolutiva se o negócio deixa de produzir efeitos após a verificação do evento condicionante, sendo eficaz até lá.
Segundo o Prof. Manuel de Andrade (10), podemos definir a condição como “ … a cláusula por virtude da qual a eficácia de um negócio (o conjunto dos efeitos que ele pretende desencadear) é posta na dependência dum acontecimento futuro e incerto, por maneira que ou só verificado esse acontecimento é que o negócio produzirá os seus efeitos (condição suspensiva) ou então só nessa eventualidade é que o negócio deixará de os produzir (condição resolutiva) … “.
A importância prática da estipulação condicional resulta de que, por esse meio, o declarante pode tomar em conta o futuro que se apresenta como incerto e realizar o negócio em termos de estar sempre de acordo com o que julga ser os seus interesses, seja qual for o rumo das coisas, o curso dos acontecimentos, no que toca ao ponto ou pontos sobre os quais não se supõe habilitado a fazer previsões seguras.
Ora, no caso concreto, como se referiu, na cláusula 3ª as partes contraentes estipularam uma condição que assume a natureza de uma condição resolutiva, porquanto, a sua eventual verificação determina que o negócio deixe de produzir efeitos uma vez verificada a condição- embora se possa dizer, no âmbito da cláusula em causa, que o próprio destino do contrato-promessa, que não apenas do contrato definitivo, ficou subordinado à verificação de tal condição, pois não sendo possível celebrar o contrato definitivo e prometido não seria possível cumprir o contrato-promessa (11).
Ou seja, decorre da referida cláusula que, enquanto a condição não se verificasse, as partes contraentes não podiam exigir à parte contrária o cumprimento da obrigação principal estabelecida no contrato promessa, qual seja a de exigir a celebração do contrato definitivo (contrato prometido – no caso, o contrato de compra e venda da parcela do prédio identificado na cláusula Primeira).
Por outro lado, a partir do momento em que se verificasse que seria impossível desanexar a parcela do prédio prometida vender, o contrato promessa teria que ser considerado “sem efeito”.
Trata-se de uma verdadeira condição resolutiva do contrato promessa (12), conectada com a efectivação de evento futuro e incerto: - a celebração do contrato definitivo (prometido) ficou condicionada à efectiva desanexação da parcela do prédio aqui objecto da venda (cl. 3ª, nº 2; cfr. cl. 1ª, nº 3 do contrato) - e não a qualquer outro facto como, por exemplo, a eventual divisão de coisa comum (contrariamente àquilo que defendem os Recorrentes).
A interpretação que se impõe, assim, de acordo com a matéria de facto provada, e, em especial, atendendo ao texto que consubstancia o contrato, é a seguinte:
- Previram os contraentes que a escritura pública prometida seria outorgada no prazo máximo de 15 dias após o momento em que toda a documentação legalmente exigida estivesse em ordem (cl. 3ª, nº 1).
Porém, se o promitente vendedor não viesse a conseguir a desanexação da parcela do prédio identificada, o contrato ficaria “sem efeito”.
Tal significava que, não logrando os promitentes vendedores desanexar a pretendida área do terreno, deixavam de dispor de condições objectivas para concretização da promessa, pelo que, nessas circunstâncias, ficou, desde logo, estabelecido no contrato que ocorria a extinção, por resolução automática do contrato promessa, sem penalização alguma para os contraentes.
Assim, nestas circunstâncias, ambas as partes ficariam automaticamente desvinculados do cumprimento das suas respectivas obrigações.
É que uma das características desta cláusula é a de que verificada a condição (resolutiva) o efeito resolutivo surge “… eficaz, efectivado, no plano jurídico: de forma automática, ipso juris, de conhecimento ex officio e de modo absoluto ou real. Isto é independentemente de qualquer vontade das partes (a favor ou contra)… “ (13), sendo que os efeitos da verificação da condição resolutiva retrotraem-se à data da conclusão do negócio (art. 276º do CC) (14) - o que significa que “ na hipótese de a condição ser resolutiva, os efeitos do negócio condicionado consideram.se destruídos desde a data da respectiva conclusão, ou seja, tudo se passa como se o negócio nunca se tivesse celebrado…” (15).
“ … Em suma, verificada a condição resolutiva o contrato caduca, mas aplicam-se os efeitos da resolução dos contratos, pelo que a diferença (em relação à resolução convencional) respeita ao modo de exercício: na condição resolutiva, a extinção do vínculo verifica-se em razão de um acordo desde que ocorra um facto; na resolução convencional a extinção funda-se também num acordo, e além de um facto justificativo, pressupõe ainda a declaração de uma parte, manifestando vontade de resolver o contrato… “ (16).
“O efeito da verificação ou não verificação da condição é automático: a produção ou a resolução dos efeitos jurídico-negociais desencadeia-se automaticamente com o preenchimento do evento condicionante, não sendo necessária qualquer declaração ou actuação dos sujeitos do negócio, nem também qualquer intervenção jurídica de natureza declarativa ou constitutiva… “ (17)
Destas considerações resulta, assim, que uma vez verificada a condição resolutiva- e a mesma, no caso concreto, verificou-se no momento em que se constatou a impossibilidade de desanexação da parcela do prédio prometida vender (foram os próprios RR. que o comunicaram ao Autor- pontos 17 e 23) - o contrato promessa tem que se considerar extinto, automaticamente, independentemente de declaração da parte contraente (é isso, como se referiu, que a diferencia justamente da resolução contratual), com as assinaladas consequências gerais destrutivas, e com os efeitos aqui especialmente acordados e previstos na cláusula 3ª, nº 2 do contrato, ou seja “o contrato fica sem efeito, sendo devolvido o valor do sinal entregue…”.
De todas estas considerações resulta que é correcta a decisão do Tribunal Recorrido, quando, de uma forma fundamentada, julgou procedente o pedido subsidiário que havia sido formulado pelo Autor (fundado na condição resolutiva), desatendendo o pedido principal (que se fundamentava na resolução do contrato).
Na verdade, como aí ficou dito:
“O A., a título principal, peticiona o sinal em dobro, alegando o incumprimento definitivo, pois os RR. pretendiam vender-lhe um prédio diferente do prometido. Contudo, resulta de toda a factualidade apurada que a razão do A. não ter outorgado a escritura em causa se prendeu com a ausência de todos os comproprietários do prédio prometido vender que autorizassem a desanexação acordada. Isso quer dizer que, não existiu uma qualquer outra razão que não fosse a falta do procedimento de desanexação acordado, pelo que se impõe considerar que a causa de resolução do contrato, foi precisamente a verificação da condição e, por isso, conforme o acordado terá o A. direito a receber dos promitentes vendedores o sinal em singelo, pois foi isso o que resulta da vontade das partes e, não, o dito sinal em dobro por aplicação do disposto no artigo 442.º, n.º 2 do C.C.”
Ora, aqui chegados, e por assim ser, torna-se também claro que por efeito da extinção automática do contrato promessa celebrado não se pode aqui reconhecer a pretensão reconvencional dos RR., que se fundava num alegado incumprimento do contrato imputável ao Autor que não encontra qualquer apoio na factualidade considerada como provada.
Desde logo, porque como já se referiu em cima, enquanto a condição não se verificasse (e não estava verificada- desanexação da parcela do terreno), as partes contraentes (os RR.) não podiam exigir à parte contrária (ao Autor) o cumprimento da obrigação principal estabelecida no contrato promessa, qual seja a de exigir a celebração do contrato definitivo (contrato prometido – no caso, o contrato de compra e venda da parcela do prédio identificado na cláusula Primeira).
Além disso, sempre importaria atender a que a questão da verificação da condição resolutiva e a da resolução do contrato, fundada em incumprimento do contrato, são duas questões que, como é bom de ver, estão interligadas.
Na verdade, é pacífico que só se pode resolver um contrato que ainda se mostre em vigor entre as partes contraentes- o que, além do mais, significa que não se pode tornar operativa a resolução do contrato comunicada quando o contrato é nulo ou já tenha sido validamente resolvido ou já se mostre extinto, por verificação, por ex. de uma condição resolutiva (e isto porque os efeitos da resolução válida do contrato são “… equiparados… à nulidade ou anulabilidade do negócio jurídico, com ressalva do disposto nos artigos seguintes… “ (art. 433º do CC; rectroactividade- art. 434º do CC; efeitos em relação a terceiros- art. 435º do CC) (18).
Nessa medida, mesmo que os RR. lograssem provar algum incumprimento por parte do Autor- o que não conseguiram-, sempre a resolução do contrato, que nele se fundasse, encontraria obstáculo na impossibilidade dessa declaração de resolução operar os seus efeitos, face à prévia extinção automática do contrato derivada da verificação da condição resolutiva expressamente estipulada pelas partes no contrato promessa celebrado.
Ou seja, verificando-se a condição resolutiva, nunca a conduta do Autor de recusar a outorga da escritura pública definitiva (que consubstanciaria o incumprimento definitivo, na tese dos RR.), podia fundamentar o exercício válido do direito de resolução por parte daqueles, já que, como se referiu, não se pode tornar operativa a resolução do contrato comunicada quando o contrato já se mostre extinto por verificação de uma condição resolutiva.
Numa outra perspectiva, aliás, a questão que se coloca é que os RR. não parecem atender às consequências e efeitos da cláusula estabelecida no contrato- cláusula em que se estabelecia, como se referiu, uma condição resolutiva do contrato- nomeadamente, no que concerne à quantia prestada a título de sinal pelo Autor e que lhes foi entregue na data da celebração do contrato.
É que, justamente, por força da introdução desta cláusula no contrato “… enquanto não se verificar o respectivo facto futuro e incerto… a produção de efeitos entretanto realizada, não só não é definitiva e sólida (porque eles podem cair com a não verificação do facto) como até não se produzirão todos os efeitos que normalmente andam ligados ao tipo puro daquele negócio… “ (19).
“A estipulação de uma condição pelas partes conduz desta forma a um estado de pendência. Não existe ainda um direito pleno na pessoa do adquirente; mas há já um direito à aquisição plena que podemos designar por “ expectativa jurídica…” (20).
Assim, “… a fase da pendência da condição corresponde, pois, a uma situação provisória ou interina, um estado de espera… “, onde se gera “… todavia um estado de incerteza ou de indefinição, posto que não se sabe se o negócio produzirá (ou produzirá definitivamente) todos os seus efeitos… “ (21).
Ou seja, as partes contraentes estavam na situação daquilo a que a doutrina chama de “parte expectante” (que lhe conferia uma protecção enquanto detentor de uma “expectativa jurídica” ou de um “direito especifico na pendência condicional”), situação que lhe confere como que “… um direito, ao direito”; assim é “um direito, ao eventual conseguimento dum direito… “ (22).
É isto, no fundo, que os RR. parecem não ter entendido, e daí que tenham assumido a conduta contratual que assumiram, apesar de entretanto a condição resolutiva do contrato promessa celebrado se ter verificado.
Conclui-se, pois, que não se pode reconhecer aos RR. os direitos que aqui pretendiam ver reconhecidos, nomeadamente, não se pode reconhecer como fundada a resolução do contrato, nem os demais direitos peticionados como decorrência daquela declaração.
Nesta conformidade, e por todo o exposto, considera-se que não se pode dar razão aos Recorrentes.
Improcede, pois, totalmente o Recurso.
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III- DECISÃO
Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar:
- O Recurso interposto pelos RR/Recorrentes totalmente improcedente;
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Custas pelos Recorrentes (artigo 527º, nº 1 do CPC);
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Guimarães, 1 de Fevereiro de 2018
(Dr. Pedro Alexandre Damião e Cunha)
(Dra. Maria João Marques Pinto de Matos)
(Dr. José Alberto Moreira Dias)
1. Como é sabido, a redacção do nº 3 do artigo 442º, introduzida pelo DL 379/86 de 11/11, provocou divergências na doutrina e jurisprudência. Uma posição entende que, com a actual redacção do artigo 442º, a simples mora no cumprimento do contrato-promessa sinalizado desencadeia imediatamente a aplicação das sanções predispostas no n.º 2 do artigo 442º, independentemente da conversão da mora em falta de cumprimento, nos termos do artigo 808- cfr. neste sentido, Antunes Varela, Direito das Obrigações, vol. I. pág. 352 e segs. e Sobre o contrato promessa, pág. 148 e segs., embora critique a solução, entende que tem de ser respeitada; Almeida Costa, RLJ, ano 131, págs. 352 e segs. Na jurisprudência, entre outros, os acórdãos da Relação do Porto, de 21.9.92, CJ, tomo 4, pág. 241 e de 8.6.89, CJ, tomo 3, pág. 214 e do S.T.J. de 10.2.98, CJ ( STJ), tomo I, pág. 63. Outra posição, que é aquela que aqui se acolhe, continua a defender que a aplicação do n.º 2 do artigo 442º do CC pressupõe uma situação de incumprimento definitivo- cfr., neste sentido, Calvão da Silva, Sinal e Contrato-promessa, 1987, pág.76 e segs., Galvão Telles, Obrigações, pág. 129 e na jurisprudência, entre outros, o acórdão da RP de 10.7.97, CJ, ano IV, pág. 183, onde se faz um estudo aprofundado da questão 2. A. Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. II, p. 265. 3. A. Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. II, p. 265. 4. Pedro Romano Martinez, in “Da cessação do contrato”, pág. 170. No mesmo sentido, Gravato Morais, in “ Contrato promessa em geral, contratos-promessa em especial”, pág. 165. 5. Pedro Romano Martinez, in “Da cessação do contrato”, pág. 171. 6. Gravato Morais, in “Contrato promessa em geral, contratos-promessa em especial”, pág. 165. 7. Ana Afonso, in “ Comentário ao CCivil- Parte Geral”, UCP, pág. 661 “… a aposição de uma cláusula de condição a um negócio jurídico corresponde ao exercício da autonomia privada, servindo o interesse dos sujeitos do negócio de se precaverem quanto à evolução futura de acontecimentos que não controlam e dos quais depende a mais perfeita concretização dos seus interesses negociais… “; 8. Sendo que a interpretação do clausulado dos contratos deve ser efectuada por recurso às regras comuns de interpretação dos negócios jurídicos (art. 236º do CC); assim “…saber se a condição é resolutiva ou suspensiva é problema de pura interpretação da vontade das partes… “ (Antunes Varela/ P. Lima, in “CCivil anotado”, vol. I, pág. 250); Ana Afonso, in “Comentário ao CCivil- Parte Geral”, UCP, pág. 663; 9. V., Galvão Telles in “ Manual dos Contratos em Geral “, pág. 234 : “ Na pendência da condição resolutiva os efeitos produzem-se como se o acto fosse puro e simples, mas há algumas atenuações derivadas da resolubilidade desses efeitos, os quais desaparecem se a condição se realizar ( … ) A outra parte (o alienante) tem entretanto uma expectativa, com valor prático e jurídico. Para ela, o não preenchimento da condição resolutiva é uma conditio iuris (suspensiva) de que depende o regresso ao estado de coisas anterior à celebração do acto “. 10. In “Teoria Geral da Relação jurídica”, Vol. II, pág. 356; 11. V. ac. da RP de 28.11.2011 ( relator: Anabela Luna de Carvalho ); 12. E ao mesmo tempo, uma condição suspensiva da celebração do contrato definitivo. No mesmo sentido, v. Durval Ferreira, in “ Negócio Jurídico Condicional “, pág. 15 e 16, assinalando justamente esta dupla natureza das condições resolutivas e suspensivas “… E por sua vez na dita condição resolutiva- que é a que não suspende logo a produção imediata e permanente de efeitos até à concretização da realidade futura e apenas resolve e ab initio o negócio se o facto futuro incerto (na perspectiva resolutiva dos interesses) se verificar – nesta condição também está imanente uma qualidade suspensiva (relativa) de efeitos”; 13. Durval Ferreira, in “ Negócio Jurídico Condicional “, pág. 189; 14. Como diz Gravato Morais, in “Contrato promessa em geral; contratos-promessa em especial “, pág 166 “… à luz do art. 274, nº1 do CC a referida condição (resolutiva) produz efeitos ex tunc, ou seja, rectroactivamente… “ 15. Ana Afonso, in “ Comentário ao CCivil- Parte Geral”, UCP, pág. 678; 16. Romano Martinez, in “Da cessação do contrato”, pág. 174; Menezes Leitão, in “Direito das Obrigações”, Vol. II, pág. 106; 17. Ana Afonso, in “ Comentário ao CCivil- Parte Geral”, UCP, pág. 674; 18. Veja-se, no entanto, quanto à condição resolutiva o disposto nos arts. 272º a 277º do CC; 19. Durval Ferreira, in “ Negócio Jurídico Condicional “, pág. 16; 20. Heinrich Hörster, in “ A parte geral do CC português- Teoria geral do direito civil “, pág. 493; 21. Ana Afonso, in “ Comentário ao CCivil- Parte Geral”, UCP, pág. 667; 22. Durval Ferreira, in “ Negócio Jurídico Condicional “, pág. 194;