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CONTRATO DE SEGURO
EXCLUSÃO DA GARANTIA
Sumário
Os danos não patrimoniais sofridos por familiares do condutor do veículo, em consequência do óbito deste em acidente de viação pelo qual ele foi responsável, não são indemnizáveis e estão excluídos da garantia do seguro, nos termos do art.º 14.º, n.º 1 do DL n.º 291/2007, de 21/8, por se tratar de danos indirectos, decorrentes dos danos corporais ali previstos.
Texto Integral
Proc. nº 128/12.4TBCHV.P1
Rel. F. Pinto de Almeida (R. 1508)
Adj. Des. Teles de Menezes, Des. Mário Fernandes
Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
I. B… e C… intentaram a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra Companhia de Seguros D…, S.A..
Pediram que a ré seja condenada a pagar-lhes, a título de indemnização por dano não patrimonial próprio que sofreram pela morte do marido e pai, a quantia total de € 75.000,00, sendo € 50.000,00 para a autora mulher e € 25.000,00 para a autora filha, quantia acrescida dos legais juros, desde a citação até ao efectivo e integral pagamento.
Como fundamento invocaram, no essencial, a ocorrência de um acidente de viação, no qual foi interveniente o motociclo de matrícula ..-..-EC, conduzido pelo seu proprietário E…, marido da autora B… e pai da autora C…, sendo que o motociclo acabou por entrar em despiste, vindo a falecer o seu condutor, tendo as autoras, consequentemente, sofrido danos de ordem não patrimonial, como decorrência do falecimento do seu familiar.
A ré contestou, impugnando por desconhecimento, os factos alegados pelas autoras, referentes aos alegados danos sofridos.
A título de excepção, defende não ser devida às autoras qualquer compensação pelos danos não patrimoniais próprios que referem ter sofrido em virtude da morte do marido e pai, condutor do motociclo e único e exclusivo causador do acidente em que veio a falecer.
As autoras replicaram, respondendo à excepção e concluindo pela sua improcedência.
Percorrida a tramitação normal, foi proferida sentença que julgou a presente acção parcialmente procedente, decidindo-se: 1º Condeno a ré “Companhia de Seguros D…, S.A.” a pagar às autoras, a quantia global de € 30.000,00 (trinta mil euros), sendo € 20.000,00 (vinte mil euros) devidos à autora B… e € 10.000,00 (dez mil euros) devidos à autora C…, quantias acrescidas de juros, à taxa legal, a contar a partir do trânsito em julgado desta decisão. 2º Absolvo a ré da parte restante do pedido.
Discordando desta decisão, dela interpôs recurso a ré, tendo apresentado as seguintes
Conclusões: 1. A lei nacional, seguindo aliás os princípios que norteiam a legislação europeia mais comum (CE) sobre a matéria, exclui da cobertura do seguro obrigatório automóvel "os danos morais sofridos pelo condutor do veículo seguro responsável pelo acidente assim como os danos decorrentes daqueles" - v. art. 14°/1 DL 291/2007, de 21 de Agosto; 2. A sentença recorrida assim o não entendeu e, com violação do ali disposto, por erro de interpretação e/ou aplicação, quando em conjugação com o disposto no art. 496°/2 CCivil, veio a conceder indemnização por danos morais à viúva e filha do condutor lesado e único responsável pela eclosão do sinistro de que foi a vítima mortal, ignorando a séria afronta que tal concessão faz às normas morais vigentes na civilização ocidental pós-kantiana, em termos de jus in persona (v. texto); 3. Tal procedimento constitui erro de julgamento que pode e deve ser sindicado pelo tribunal superior, em função até da pendência actual no STJ dum processo de revista alargada que é tendente à uniformização de jurisprudência acerca da matéria no nosso país. Termos em que deve ser revogada a sentença recorrida, por ofensa ao disposto na lei vigente supracitada, e a acção ser julgada não provada e improcedente, com todas as legais consequências.
As autoras renunciaram à apresentação de resposta, requerendo a subida imediata do recurso.
Após os vistos legais, cumpre decidir.
II.
Questões a resolver:
Discute-se no recurso se as autoras têm direito a ser indemnizadas pela ré seguradora pelos danos não patrimoniais sofridos em consequência do falecimento do condutor do veículo seguro, isto é, se esses danos estão ou não excluídos da garantia do seguro, face ao disposto no art. 14º nº 1 do DL 291/2007, de 21/8.
III.
Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes factos:
A) No dia 30 de Janeiro de 2010, pelas 03h00, ao km 02,300 da estrada … (… - …), …, Espanha, ocorreu um acidente de viação em que foi interveniente o motociclo de matricula ..-..-EC, marca BMW, modelo …, conduzido pelo seu proprietário E…, residente em Chaves.
B) Em consequência do acidente referido em A) E… faleceu.
C) A responsabilidade civil pelos danos causados com a circulação do EC foi transferida para a ré, por contrato de seguro titulado pela apólice ……., válido e eficaz à data do acidente.
D) A autora B… era casada com o falecido E…, há mais de 30 anos.
E) A autora C… era filha do falecido E….
F) O EC circulava na estrada referida em A) no sentido …-…, sendo que ao km 02,300 entrou em despiste, projectando-se contra o rail e depois no solo, sofrendo o seu condutor ferimentos graves em diversas partes do corpo.
G) O condutor do EC conduzia a viatura atento às regras de trânsito.
H) Sendo que, sem que nada o fizesse prever, ao chegar à localidade de … - … permitiu que o motociclo entrasse em despiste.
I) Do despiste, o motociclo projectou-se no solo, vindo o seu condutor a projectar-se também contra o solo e depois contra os rails.
J) O despiste ocorreu de forma inesperada, repentina e violenta.
1- As autoras, ao terem conhecimento da morte do marido e pai, sofreram um choque profundo.
2- Após o acidente, deslocaram-se ao local a fim de saber do sucedido, onde sentiram incómodo, angústia e profunda tristeza e desgosto.
3- Andaram tristes e passaram noites sem dormir.
4- Entre a autora B… e o falecido E… existia uma boa relação de convivência, estima, respeito, admiração e consideração.
5- A autora C… sempre esteve muito ligada ao pai, sentindo por ele admiração, e existindo muito convívio entre ambos.
6- As autoras recebiam do falecido muito apoio e carinho.
IV.
Na sentença, depois de se reconhecer que o direito das autoras à indemnização pelos danos invocados (danos não patrimoniais por elas sofridos em consequência da morte do marido e pai) "estaria, em princípio, legitimado", face ao disposto no art. 496º nºs 1 a 3 do CC, acrescenta-se o seguinte, no âmbito da questão acima referida:
"Contudo, em situações como este caso concreto, a questão da indemnização peticionada, tem dividido a jurisprudência e, no caso dos autos, divide autoras e ré, uma vez que estão em causa os danos surgidos com a morte do marido e pai das autoras, condutor do veículo responsável/único interveniente no acidente.
As autoras, cientes da responsabilidade do seu familiar falecido na ocorrência do acidente em discussão, limitam-se a pedir uma compensação pelos danos não patrimoniais próprios que dizem ter sofrido em virtude da morte daquele, não peticionando indemnização por danos morais próprios da vítima ou pela perda do direito à vida desta.
A ré entende, contudo, que nem sequer o dano moral próprio invocado pelas autoras e sofrido em consequência da perda do marido e pai, deve ser compensado, precisamente, por este ser o causador único e exclusivo do despiste que o veio a vitimar.
O contrato de seguro celebrado com a ré garante a responsabilidade civil emergente da circulação do motociclo de matrícula ..-..-EC.
De acordo com o disposto no art. 14º do Dec. Lei nº 291/2007, de 21 de Agosto, ficam excluídos da garantia de seguro, os danos corporais sofridos pelo condutor do veículo seguro responsável pelo acidente, assim como os danos decorrentes daqueles.
Esse mesmo preceito exclui, também, da garantia do seguro os danos resultantes de lesões materiais causados, entre outros, ao condutor responsável pelo acidente e ao cônjuge e descendentes desse condutor, situação que interessa para a análise da questão que se coloca nos autos.
Sucede que, as autoras nem reclamam o ressarcimento de quaisquer danos materiais, nem indemnização de qualquer direito que pudesse caber a seu marido e pai, condutor do motociclo, como o dano moral próprio deste ou o dano pela perda do direito à vida, mas apenas um direito próprio delas autoras, direito esse de natureza não patrimonial.
Ora, em nosso entender, a garantia de seguro não exclui os danos próprios, de natureza não patrimonial, sofridos pelas autoras, esposa e filha do condutor do motociclo, já que, embora decorrentes da morte deste, não são pelo mesmo sofridos, mas sim pelas próprias autoras, uma vez que consistem no sofrimento, no desgosto e na tristeza que a morte de seu marido e pai lhes provocou directamente a elas.
Consequentemente, o ressarcimento desse tipo de danos, aqui reclamados pelas autoras, não está excluído da garantia do seguro, pelo que a ré terá de as indemnizar pelos danos não patrimoniais próprios sofridos em consequência da perda do seu familiar".
A controvérsia jurisprudencial, aflorada nesta fundamentação, vem já do regime legal anterior, constante do art. 7º do DL 522/85, de 31/12 (na redacção introduzida pelo DL 130/94, de 19/5), onde se dispunha:
1. Excluem-se da garantia do seguro os danos decorrentes de lesões corporais sofridos pelo condutor do veículo seguro.
2. Excluem-se também da garantia do seguro quaisquer danos decorrentes de lesões materiais causados às seguintes pessoas:
a) Condutor do veículo e titular da apólice; (...)
d) Cônjuge, ascendentes, descendentes ou adoptados das pessoas referidas nas alíneas a) e b), assim como outros parentes ou afins até ao 3.° grau das mesmas pessoas, mas, neste último caso, só quando com elas coabitem ou vivam a seu cargo. (…)
A interpretação destas normas não era, nem é, pacífica, designadamente sobre a questão de saber se são indemnizáveis e estão cobertos pela garantia do seguro obrigatório os danos não patrimoniais sofridos por familiares do condutor do veículo, em consequência do falecimento deste em acidente de viação pelo qual ele foi responsável[1].
A questão parece-nos, todavia, criteriosa e convincentemente analisada no citado Acórdão do STJ de 24.02.2011.
Afirma-se aí que, da conjugação dos arts. 4º nº 1 a) e 5º al. a) do DL 522/85, "temos que o seguro obrigatório automóvel abrange, «…a obrigação de indemnizar estabelecida na lei civil, … e relativamente aos danos emergentes de acidentes não excepcionados no presente diploma», isto é, a primeira operação a efectuar é verificar se existe obrigação de indemnizar face à lei civil vigente e, posteriormente, caso se venha a concluir pela positiva, se tal obrigação não estará abrangida pelas exclusões previstas no mencionado diploma legal, ou seja, no seu art. 7º (em que são abrangidas situações de obrigação de indemnizar por responsabilidade por facto ilícitos e pelo risco).
Ora importa realçar, desde já, que, como se dispõe no art. 8º, nº 1 do diploma legal em causa, «O contrato garante a responsabilidade civil do tomador do seguro, dos sujeitos da obrigação de segurar previstos no artigo 2º e dos legítimos detentores e condutores do veículo».
No caso sub judice, o acidente que determinou as lesões causadoras da morte do marido e pai dos AA., ficou a dever-se a culpa daquele, condutor do veículo no momento do acidente, sendo-lhe, assim, imputável a verificação do dano morte, dano este que, enquanto vítima (lesado), não era susceptível de originar uma obrigação de indemnizar na medida em que era resultante de actividade do próprio e violadora do seu direito – arts. 483º e 570 nº 2 do CCivil.
Daí que, inexistindo obrigação de indemnizar o dano morte por este não resultar da violação ilícita de um direito de outrem, princípio este transversal a todo o regime de responsabilidade civil extracontratual por actos ilícitos, soçobre qualquer obrigação de indemnizar decorrente desse facto originário – morte, na medida em que ela resulta de conduta culposa e lesiva do direito à vida do próprio, e a indemnização prevista no art. 496º do CCivil, por danos não patrimoniais dos familiares da vítima, por maior que tenha sido o seu padecimento, independentemente de poder ser considerado dano próprio ou não, não deixa de ser um dano indirecto que exige a verificação de indemnizar por outrem que não da própria vítima (lesado).
Assim, haver-se-á de concluir pela inexistência da obrigação de indemnizar pela ré Seguradora, no âmbito do contrato de seguro celebrado e accionado, enquanto seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, por, no caso, inexistir obrigação de indemnizar os familiares da vítima em consequência de lesão provocada por si e sobre si mesmo, sendo que tal obrigação de indemnizar, e que veio a ser accionada, salvo melhor entendimento, não resulta, portanto, do regime jurídico do seguro obrigatório automóvel previsto no Dec.-Lei nº 522/85, de 31/12. (…)
Pode assim afirmar-se que o regime jurídico do seguro obrigatório automóvel previsto no Dec. Lei nº 522/85, de 31/12, não tinha que prever, expressa e concretamente, o que de forma genérica já havia de ser considerado excluído em função da lei civil geral aplicável (cfr. art. 5º, al. a) do referido diploma) (…)".
Esta argumentação é retomada no citado Acórdão desta Relação de 19.03.2012, nestes termos:
"(…) O seguro, como bem se sabe, visa a tutela de terceiros lesados pela (com a) conduta do segurado. E a pergunta que fica é esta: os familiares podiam alguma vez responsabilizar o falecido em razão da conduta deste, quando esta conduta os não atinge? (…)
O sentido da pergunta, à qual respondemos negativamente, é o de dizer que os familiares só podiam ser indemnizados quando o falecido tiver sido lesado por uma ação de terceiro.
Como refere Mário Júlio de Almeida Costa (Direito das Obrigações, 8.ª edição, Almedina, 2000, págs. 465/466) a responsabilidade civil "ocorre quando uma pessoa deve reparar um dano sofrido por outra. A lei faz surgir uma obrigação em que o responsável é devedor e o lesado credor".
Ora, importa não esquecer que o dano próprio previsto no artigo 496.º, n.º 2 do CC é um dano indireto, ou seja, é um dano resultante da lesão sofrida por outra pessoa – no caso, o marido e pai dos autores – mas isso pressupõe necessariamente que o lesado direto possa ser considerado lesado (repetimos: lesado) para efeitos da responsabilidade civil.
Só que, olhando ao disposto no artigo 483.º do CC, não pode ser lesado direto quem interveio sozinho num acidente, melhor dito, o único causador do sinistro.
O artigo 483.º, n.º 1 do CC alude apenas à ação do agente sobre os bens (o direito de) outrem e as exceções a esta regra, previstas nos artigos 495.º e 496.º do mesmo diploma, continuam a pressupor que o lesante é uma pessoa diversa do lesado direto, ou seja, que há um ato ilícito de terceiro que viola o direito à vida, à integridade física ou à propriedade do lesado.
Qual lesado? – O falecido, no caso em apreço.
Qual terceiro? – Quem o lesou; no caso, ninguém.
Ninguém porque, no fundo, como resulta claro da redação do artigo 483.º, n.º 1 do CC, a relação entre lesante e lesado pressupõe pessoas distintas e afasta a confusão de ambas na mesma pessoa, numa mesma ocasião.
Por ser assim, e porque temos por indefensável que possa haver dano indireto sem dano direto imputável, o que verdadeiramente sucede – como defende a apelante, reconhece-se – é que, no caso presente não há responsabilidade civil de ninguém (ou seja de outrem) pelos danos causados ao pai e marido dos autores.
Mas, assim, a seguradora não tem que tomar o lugar de ninguém, ou seja, não se transferiu uma responsabilidade que não existe.
Por isso, no caso, os autores, independentemente da abrangência abstrata do seguro, não têm o direito de serem indemnizados pelos danos morais sofridos".
A questão parece assim dever ser resolvida a montante do problema da abrangência do seguro, por ser de afastar a existência da obrigação de indemnizar, nos termos gerais da lei civil aplicável.
De todo o modo, é aplicável ao caso destes autos o disposto no actual art. 14º do DL 271/2007, de 21/8, que veio substituir o anterior art. 7º do DL 522/85 e que é deste teor:
1. Excluem-se da garantia do seguro os danos corporais sofridos pelo condutor do veículo seguro responsável pelo acidente assim como os danos decorrentes daqueles.
2. Excluem-se também da garantia do seguro quaisquer danos materiais causados às seguintes pessoas:
a) Condutor do veículo responsável pelo acidente;
b) Tomador do seguro; (…)
e) Cônjuge, ascendentes, descendentes, adoptados das pessoas referidas nas alíneas a) a c), assim como outros parentes ou afins até ao 3.° grau das mesmas pessoas, mas, neste último caso, só quando com elas coabitem ou vivam a seu cargo.
A controvérsia jurisprudencial, porém, mantém-se[2].
Como acima se afirmou, o dano sofrido pelos aludidos familiares do condutor é um dano indirecto e, assim, pode considerar-se que é um "dano decorrente" do dano corporal sofrido por esse condutor.
Admite-se, por isso, como tem sido entendido[3], que o legislador não tenha pretendido delimitar subjectivamente os danos referidos no nº 1 do art. 14º aos danos sofridos pelo condutor e que o apontado segmento da norma tenha em vista (para os excluir do âmbito do seguro) os danos não patrimoniais de outros lesados, sofridos em consequência daqueles – já que no nº 2 do mesmo preceito se refere apenas a lesões materiais – pondo termo, desse modo, à divergência jurisprudencial existente.
Pelo que fica dito, entende-se que as autoras não têm direito de serem indemnizadas pelo dano não patrimonial que invocaram, uma vez que se trata de um dano indirecto, que pressupõe a existência de um lesado directo, o que não é o caso do marido e pai das autoras, que foi o único interveniente no acidente e que lhe deu causa.
O seguro visa cobrir a responsabilidade pela reparação dos danos corporais ou materiais causados a terceiros (arts. 4º nº 1 e 15º nº 1 do DL 271/2007); só que, no caso, o condutor (proprietário do veículo e tomador do seguro) não causou os danos que as autoras pretendem ver ressarcidos e cuja responsabilidade entendem transferida para a ré; estes danos derivam do dano corporal sofrido pelo condutor e só por ele causado.
Daí que não se possa realmente considerar-se transferida para a ré uma responsabilidade que afinal não existe.
A norma do art. 14º, interpretada nos termos acima referidos, harmoniza-se com este entendimento, permitindo a conclusão de que estão excluídos da garantia do seguro os danos indirectos sofridos pelos familiares do condutor, responsável pelo acidente, como dano decorrente do dano corporal (morte – cfr. art. 3º nº 2 do citado diploma) sofrido por este.
Resta acrescentar que, como tem sido reconhecido[4], o entendimento exposto não colide com as normas comunitárias, as Directivas Automóvel, uma vez que estas, no que se relaciona com a presente questão[5], "visam apenas evitar que os familiares do tomador do seguro, do condutor e qualquer pessoa responsável, possam ser prejudicados só pelo facto de terem essa qualidade – ser familiar do responsável, afastando a sua discriminação relativamente a outros terceiros vítimas que possam seguir como passageiros na viatura causadora do acidente, imputável a título de culpa àquele familiar".
Nada prevendo essas normas sobre danos próprios sofridos pelos familiares do condutor em consequência do falecimento deste, esta questão deve ser resolvida com recurso ao direito interno de cada Estado-Membro, por permanecer na esfera de competência deste.
V.
Em face do exposto, julga-se a apelação procedente, revogando-se a sentença recorrida e, em consequência, absolve-se a ré dos pedidos formulados pelas autoras.
Custas pelas apeladas.
Porto, 26 de Setembro de 2013
Fernando Manuel Pinto de Almeida
Trajano A. Seabra Teles de Menezes e Melo
Mário Manuel Baptista Fernandes
_________________
[1] Exemplos dessas decisões são, no sentido de que o dano é indemnizável e não excluído da garantia do seguro, os Acórdãos do STJ de 21.10.2003 e de 08.01.2009 (Proc. 08B796) e desta Relação de 08.07.2010 e de 10.05.2012.
Em sentido contrário, podem ver-se os Acórdãos do STJ de 08.01.2009 (Proc. 08B3722) e de 24.02.2011 (CJ STJ XIX, 1, 95) e desta Relação de 19.03.2012, todos, com excepção do penúltimo, em www.dgsi.pt.
[2] Já no domínio deste preceito, cfr. o Acórdão da Rel. de Guimarães de 07.02.2012, no sentido da ressarcibilidade e da não exclusão do apontado dano. Em sentido contrário, o voto de vencido a esse mesmo Acórdão e os Acórdãos da mesma Relação de 18.04.2013 e da Rel. de Coimbra de 28.05.2013, todos em www.dgsi.pt.
[3] Cfr. os dois últimos Acórdãos citados na nota anterior.
[4] Cfr. os citados Acórdãos do STJ de 08.01.2009 (Proc. 08B3722) e de 24.02.2011; também Alessandra Silveira e Sophie Fernandes, O Seguro Automóvel. Considerações sobre a posição do Tribunal de Justiça da União Europeia em sede de reenvio prejudicial, CDP, 34º-3 e segs.
[5] Cfr., designadamente, o que dispõe o art. 3.º da 2.ª Directiva Automóvel (84/5/CEE): "Os membros da família do tomador do seguro, do condutor ou de qualquer outra pessoa cuja responsabilidade civil decorrente de um sinistro se encontre coberta pelo seguro mencionado no n.º1 do artigo 1.º não podem, por força desse parentesco, ser excluídos da garantia do seguro, relativamente a danos corporais sofridos".
E também o art. 1.º da Terceira Directiva do Conselho, de 14.5.1980 (90/232/CEE): o seguro obrigatório "cobrirá a responsabilidade por danos pessoais de todos os passageiros, excepto o condutor, resultantes da circulação de um veículo".