Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
FURTO SIMPLES
INTERPRETAÇÃO DA LEI
PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO
Sumário
I - Na interpretação da Lei aplicável (que inclui a subsunção dos factos ao Direito), o aplicador deve apenas orientar-se pelos princípios gerais da hermenêutica jurídica e pelos especiais aplicáveis ao ramo do Direito em causa, quer seja a mais favorável, quer seja a mais desfavorável para o arguido, não tendo lugar a aplicação do princípio in dubio pro reo. II - A circunstância de não se mostrar provado o valor dos bens objecto da tentativa de subtracção não serve para “desqualificar” o furto, uma vez que, para se considerar um valor como “diminuto”, é necessário que tal valor se encontre incluído nos factos provados.
Texto Integral
Proc. Nº 1102/11.3PAPVZ.P1
1º Juízo de Competência Criminal do T. J. da Póvoa de Varzim
Acordam, em Conferência, os Juízes desta 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto:
No 1º Juízo Criminal do T.J. de Póvoa de Varzim, processo supra referido, foi foram julgados B… e C…, tendo sido proferida Sentença com o seguinte dispositivo:
“Pelo exposto, e ao abrigo das referidas disposições legais:
Julgo a acusação provada, procedente e em consequência:
- Condeno B…, pela prática de um crime de furto qualificado, na forma tentada, previsto e punido pelo artº 204º, nº 1, al. f), com referência aos artºs 22º, nºs 1 e 2, 23º, nº 2, e 73º do Código Penal, na pena de 100 dias de multa, à taxa diária de € 7, o que perfaz o montante global de € 700 (Setecentos Euros);
- Condeno C…, pela prática de um crime de furto qualificado, na forma tentada, previsto e punido pelo artº 204º, nº 1, al. f), com referência aos artºs 22º, nºs 1 e 2, 23º, nº 2, e 73º do Código Penal, na pena de 100 dias de multa, à taxa diária de € 6, o que perfaz o montante global de € 600 (Seiscentos Euros);”
*
*
Desta Sentença recorreu o MºPº, formulando as seguintes conclusões:
“1. Os arguidos foram acusados pela prática, em concurso real, de um crime de furto simples na forma tentada p.p. pelos arts. 203/1 e 22/1 do C.P., e de um crime de introdução em lugar vedado ao público p.p. pelo art. 191 do mesmo código;
2. Realizado o julgamento vieram os arguidos a ser condenados, após ter sido cumprido o disposto no art. 358/3 do CPP, pela prática de um crime de furto qualificado, na forma tentada, p.p, pelo art. 204/1/f com referência aos arts. 22/1/2, 23/2 e 73 do C.P., o B… na pena de 100 dias de multa à taxa diária € 7, o que perfaz o montante global de € 700, e o C… na pena de 100 dias de multa à taxa diária de € 6, o que perfaz o montante global de € 600.
3. Ficou provado que no dia 16-12-2011, cerca das 23 horas, os arguidos dirigiram-se a uma propriedade (exploração pecuária) sita em …, Póvoa de Varzim, pertencente a D…, onde se introduziram passando por um buraco na rede que a vedava; que agiram com intenção de se apoderarem de animais – caprinos – que o D… ali criava, o que só não concretizaram porque foram descobertos pelo proprietário da exploração e puseram-se em fuga; e que actuaram de forma concertada, em conjugação de esforços e execução de acordo previamente estabelecido, de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que os animais ali existentes não lhes pertenciam, que actuavam contra a vontade do respectivo dono e que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei;
4. Não se apurou e nada se diz nos factos provados sobre a quantidade de animais que os arguidos pretendiam e poderiam subtrair (um ou mais) nem o respectivo valor, elementos estes que também não constavam da acusação;
5. Tal situação, ou seja, o desconhecimento do valor dos bens objecto de tentativa de furto, deve favorecer os arguidos no sentido de considerar aqueles bens de valor diminuto, o que desqualifica o crime nos termos do disposto no art. 204/4 do C.P.;
6. Os factos provados, no que respeita ao elemento essencial do valor, não permitem a decisão que foi tomada pelo Tribunal a quo quanto à subsunção no tipo legal agravado, decisão com reflexos substanciais na medida da pena;
7. Assim, e atenta a referida matéria fáctica provada, deveriam os arguidos ter sido condenados pela prática, em co-autoria material, de um crime de furto na forma tentada p.p. pelos arts. 203/1/2, 22, 23/2 e 73 do C.P. – cfr. art. 204/1/f/4 do mesmo código – pela prática do qual foram acusados;
8. Ao assim não proceder e ao condenar os arguidos pela prática do crime de furto qualificado, na forma tentada, p.p. pelos arts. 204/1/f, 22, 23/2 e 73 do C.P., violou o Mmº Juiz os arts. 203/1/2 e 204/4 do C.P. e também o princípio “in dúbio pró reo”.
Termos em que, em provimento do presente recurso, deve a douta decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que condene os arguidos, em co-autoria, pela prática de um crime de furto na forma tentada p.p. pelos arts. 203/1/2, 22, 23/2 e 73 do C.P., pela prática do qual vinham acusados.
Assim, dando provimento ao presente recurso, far-se-á a habitual e esperada
Justiça”
*
Neste Tribunal, o Sr. Procurador-Geral Adjunto apôs o seu visto.
*
Com interesse para a decisão a proferir, é o seguinte o teor da Sentença recorrida.
Factos Provados:
“1. B… e C…, arguidos nos presentes autos, acordaram em se deslocar a uma exploração pecuária sita na Freguesia …, nesta Comarca da Póvoa de Varzim, exploração essa pertencente a D…, a fim de se apropriarem de animais – caprinos – que o último ali cria, numa propriedade que se encontra vedada com rede.
2. Em execução do acordo previamente estabelecido, os arguidos, fazendo-se transportar no veículo automóvel de matrícula ..-..-ZP, pertencente ao arguido B…, deslocaram-se no dia 16 de Dezembro de 2011, cerca das 23.00 horas, à referida propriedade.
3. Ali chegados, os arguidos introduziram-se na referida propriedade, passando por um buraco na rede.
4. Quando se aprestavam para se apropriarem dos animais ali existentes, os arguidos aperceberam-se que haviam sido descobertos pelo proprietário da exploração e colocaram-se em fuga, sem concretizarem os seus desígnios, no veículo automóvel referenciado.
5. Os arguidos deslocaram-se ao local com o propósito de se apropriarem de animais ali existentes o que só não conseguiram por razões estranhas à sua vontade, sabendo que os animais ali existentes não lhes pertenciam e que actuavam contra a vontade do respectivo dono.
6. Introduziram-se na mencionada propriedade, vedada ao longo da sua extensão, sem que estivessem autorizados para o efeito pelo seu proprietário.
7. Agiram com o propósito deliberado e concretizado de se introduzirem na referida propriedade, passando pela rede de vedação, sem terem autorização do proprietário.
8. Actuaram de forma concertada, em conjugação de esforços e execução de acordo previamente estabelecido.
9. Agiram de forma livre, voluntária e consciente.
10. Sabiam que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.
11. Nada consta dos registos criminais do arguido.
12. Os arguidos confessaram integralmente e sem reservas os actos que praticaram.
13. O arguido B… tem actualmente 34 anos de idade.
14. É solteiro.
15. Vive em união de facto.
16. Tem uma filha com 1 ano de idade.
17. Estudou até ao 6º ano de escolaridade.
18. Exerce a profissão de trolha, trabalhando por conta da empresa E…, Lda, com sede em …, Vila do Conde.
19. Aufere um vencimento mensal não concretamente apurado, próximo dos € 600.
20. Reside em casa própria, pagando uma prestação mensal de cerca de € 250 para amortização de empréstimo contraído para a respectiva aquisição.
21. Tem um veículo automóvel de marca Renault e modelo …, pagando uma prestação mensal aproximada de € 200 para amortização de empréstimo contraído para a sua aquisição.
22. O arguido C… tem actualmente 39 anos de idade.
23. É casado.
24. Tem duas filhas, uma com 13 e outra com 9 anos de idade.
25. Estudou até ao 2º ano de escolaridade.
26. Não tem vínculo laboral certo.
27. Recebe da Segurança Social cerca de € 420 por mês a título de subsídio por desemprego.
28. Reside em casa própria, pagando uma prestação mensal de cerca de € 310 para amortização de empréstimo contraído para a sua aquisição.
29. Tem um veículo automóvel, pagando uma prestação de cerca de € 210 para amortização de empréstimo contraído para a sua aquisição.”
*
Enquadramento Jurídico-Penal:
“Aos arguidos vinha imputada a prática de um delito contra a propriedade, na forma tentada, e outro atentatório da reserva da privada, na forma consumada.
Comete o crime de furto, previsto e punido pelo artº 203º, nº 1, do Código Penal, “Quem, com ilegítima intenção de apropriação para si ou para outra pessoa, subtrair coisa móvel alheia”.
Por outro lado, comete o crime de introdução em lugar vedado ao público, previsto e punido pelo artº 191º, do Código Penal, “Quem, sem consentimento ou autorização de quem de direito, entrar ou permanecer em pátios, jardins ou espaços vedados anexos a habitação, em barcos ou outros meios de transporte, em lugar vedado e destinado a serviço ou a empresa públicos, a serviço de transporte ou ao exercício de profissões ou actividades, ou em qualquer outro lugar vedado e não livremente acessível ao público”.
Entendemos, porém, que o crime de furto qualificado, por entrada ilegítima (neste caso, na forma tentada) é o tipo legal que de forma mais ajustada abrange toda a factualidade que ficou assente com relevância criminal, não se justificando a autonomização da tentativa de furto da ilegítima introdução em espaço vedado.
Com efeito, o furto é qualificado, além do mais e no que ora interessa, nos termos do disposto no artº 204º, nº 1, al. f), do Código Penal, quando o agente do crime se introduza ilegitimamente em habitação, ainda que móvel, estabelecimento comercial ou industrial ou espaço fechado, ou aí permaneça escondido com intenção de furtar.
Pelo advérbio “ilegitimamente” deve nesta sede entender-se a introdução sem causa, injustificada, sem motivo válido e atendível, por exemplo o livre acesso ou o consentimento.
No caso sub judice, ficou assente que os arguidos entraram em propriedade alheia, com o intuito de se apoderaram de animais – caprinos e ovinos – que não lhe pertenciam, tendo para o efeito acedido ao interior dessa propriedade passando por um buraco na rede.
Os arguidos não conseguiram apropriar-se desses animais, mas por razões alheias à sua vontade – foram descobertos e impedidos da concretização do assalto.
Assim, o crime em apreço não se chegou a consumar.
Existe tentativa criminalmente relevante, nos termos do artº 22º, nº 1, do Código Penal, quando sejam praticados actos de execução de um crime que se decidiu cometer (a tentativa é necessariamente dolosa), sem que este chegue a consumar-se. O nº 2 do citado preceito legal explicita que são actos de execução os que preencherem um elemento constitutivo de um tipo de crime, bem como os que forem idóneos a produzir o resultado típico e ainda os que segundo a experiência comum e salvo circunstâncias imprevisíveis, forem de natureza a fazer esperar que se lhes sigam actos das espécies indicadas nas alíneas anteriores.
Nem todos os actos e procedimentos incluídos no iter criminis são objecto de punição criminal.
Em primeiro lugar, a simples idealização de um crime, a mera cogitatio, não é punível.
Os actos preparatórios (os que não se enquadram em qualquer das alíneas do nº 2 do artº 22º) não são puníveis a não ser que a lei estipule o contrário, nos termos do artº 21º do Código Penal, o que equivale a dizer que em regra os actos preparatórios não são objecto de punição.
Os actos integrantes da tentativa criminosa são puníveis se a lei o estipular ou se ao crime consumado corresponder pena superior a 3 anos de prisão, nos termos do artº 23º, nº 1, do Código Penal. Ora, ao crime de furto qualificado, nos termos do nº 1, corresponde no máximo pena de prisão até 5 anos, pelo que a tentativa de prática desse crime é punível.
Nestes termos, conclui-se que os arguidos cometeram um crime de furto qualificado, por introdução ilegítima em espaço vedado, na forma tentada.
Cometeram esse crime em co-autoria.
(…)”
*
*
*
Colhidos os Vistos, efectuada a Conferência, cumpre apreciar e decidir.
*
Das conclusões, delimitadoras do respectivo objecto, extrai-se que o recurso se circunscreve à matéria de Direito, impugnando o MºPº a qualificação jurídica efectuada, defendendo que os arguidos incorreram na prática de um crime de furto simples (e não qualificado), na forma tentada.
*
Em síntese, provou-se que o B… e o C… se introduziram, através de um buraco na rede que a vedava, numa exploração pecuária, “a fim de se apropriarem de animais – caprinos”, “ali existentes”.
Só não o concretizaram porque foram “descobertos pelo proprietário da exploração e colocaram-se em fuga”.
Estão condenados pela prática, na forma tentada, de um furto qualificado, pela al. f) (introduzindo-se ilegitimamente em propriedade alheia, vedada) do art. 204º, nº 1, do CP, em pena de multa.
O MºPº, aqui recorrente, defende que «os factos provados apenas permitem a subsunção no tipo de furto simples».
Alega que «não se apurou e nada se diz nos factos provados sobre a quantidade de animais que os arguidos pretendiam e poderiam subtrair (um ou mais) nem o respectivo valor».
«O desconhecimento do valor dos bens objecto de tentativa de furto, deve favorecer os arguidos no sentido de considerar aqueles bens de valor diminuto.»
«Os factos provados, no que respeita ao elemento essencial do valor, não permitem a decisão que foi tomada pelo Tribunal a quo quanto à subsunção no tipo legal agravado», afirmando violadas as normas que o prevêem e punem, e «também o princípio “in dubio pro reo”».
*
Não se nos afigura, no entanto, que tenha razão.
A posição que veicula – e que corresponde a uma tendência jurisprudencial, representada nos Acórdãos deste Tribunal que cita, em apoio, de 16/03/2011 e de 15/04/2009 – cinge-se, basicamente, ao entendimento de que, não estando fixado o valor dos bens objecto de subtracção, tem de se considerar o valor desses bens como diminuto e, em consequência, “desqualificar” o furto, por tal ser mais favorável ao arguido.
Esta posição parte, no entanto, de um equívoco, consistente na introdução do princípio in dubio pro reo como elemento de decisão.
Não tem aqui cabimento a sua aplicação.
Este princípio – tal como já temos referido em várias outras decisões – respeita exclusivamente ao Direito Probatório, reporta-se à prova dos factos, determinando que, em caso de dúvida do Julgador, acerca da ocorrência de um determinado facto, essa dúvida deve ser usada a favor do réu (arguido), dando-se como não provado tal facto.
Na interpretação da Lei aplicável (que inclui a subsunção dos factos ao Direito), o aplicador deve apenas orientar-se pelos princípios gerais da hermenêutica jurídica e pelos especiais aplicáveis ao ramo do Direito em causa – neste caso o penal, que, nomeadamente, interdita o recurso à analogia ou à interpretação extensiva para qualificar qualquer facto como crime –, quer seja a mais favorável, quer seja a mais desfavorável para o réu.
É isso mesmo o que ensina Figueiredo Dias (Direito Processo Penal, I vol., pág. 215): “o princípio in dubio pro reo vale só, evidentemente, em relação à prova da questão-de-facto e já não a qualquer dúvida suscitada dentro da questão de direito: aqui a única solução correcta residirá em escolher, não o entendimento mais favorável ao arguido, mas sim aquele que juridicamente se reputar mais exacto”.
Assim é considerado, também, no Ac. do STJ de 25/05/2006 (citado por Simas Santos e Leal-Henriques em Noções de Processo Penal, Rei dos Livros, 2010, págs. 51 e 52): “o princípio in dubio pro reo constitui um princípio probatório, segundo o qual a dúvida em relação à prova da matéria de facto, tem de ser sempre valorada favoravelmente ao arguido, traduzindo o correspectivo do princípio da culpa em direito penal, a dimensão jurídico-processual do princípio jurídico-material da culpa concreta como suporte axiológico-normativo da pena.
Este princípio não tem quaisquer reflexos ao nível da interpretação das normas penais. Em caso de dúvida sobre o conteúdo e o alcance das normas penais, o problema deve ser solucionado com recurso às regras de interpretação, entre as quais o princípio in dubio pro reo não se inclui, uma vez que este tem reflexos exclusivamente ao nível da apreciação da matéria de facto – sejam os pressupostos do preenchimento do tipo de crime, sejam os factos demonstrativos da existência de uma causa de exclusão da ilicitude ou da culpa.
Estando em causa a qualificação jurídica de uma determinada conduta, questão de direito que envolve a interpretação das normas que tipificam a conduta em causa, não é lícito recorrer ao princípio in dubio pro reo, ou a eventual decorrência substantiva do mesmo, tanto mais quando nenhuma dúvida expressaram as instâncias, nem resulta da matéria de facto provada.”
*
Estabelece o art. 204º, nº 4, do CP: “não há lugar à qualificação se a coisa furtada for de diminuto valor”.
“Valor diminuto” é “aquele que não exceder uma unidade de conta avaliada no momento da prática do facto” – art. 202º, al. c) –, no caso, 102€.
Encontra-se provado que os arguidos pretendiam apoderar-se de “animais caprinos” existentes na propriedade em que se introduziram.
Não se mostra quantificado o número de animais de que se pretendiam apoderar, nem o respectivo valor (refira-se, no entanto, a título informativo, que, de acordo com a Dissertação de Mestrado “Viabilidade da produção intensiva de gado caprino” de Mário Pereira, Universidade Técnica de Lisboa, a esse respeito publicada em www.repository.utl.pt, o preço de mercado de uma cabra já seria, em 2008, de 220€ e de um cabrito, correspondente a 70% desse valor, ou seja, 154€ – quantias superiores aos 102€).
A prova desse número e/ou desse valor poderia – caso se mostrasse possível – ter sido feita em Audiência, por iniciativa do Tribunal ou por impulso do MºPº ou do arguido, pois em Processo Penal não existe, como é sabido, ónus da prova.
Ou seja, o recorrente na sua vinculação ao princípio da legalidade poderia ter impulsionado a produção dessa prova, em Audiência.
E, caso entendesse que tal prova havia sido feita, deveria impugnar a matéria de facto, e não apenas a matéria de Direito.
Trata-se, inequivocamente, de uma questão de facto, que precede e é distinta da que aqui o recorrente coloca.
Tal como bem refere, Simas Santos em anotação ao Acórdão do STJ de 17/12/1997, na Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 8, Julho-Setembro de 2008: “só a constatação de que se trata de coisa de diminuto valor (logo, traduzindo uma menor ilicitude) é que «neutraliza» a maior ilicitude ou culpa a que se reportam as circunstâncias agravativas previstas nas diversas alíneas dos nºs 1 e 2 do art. 204º.
Constatação que, obviamente, só pode ser positiva.”
Assim como tem de se provar que a coisa tem valor “consideravelmente elevado” ou “valor elevado”, também tem de se provar que a coisa tem “diminuto valor”.
Resumindo e concluindo, a circunstância de não se mostrar provado o valor dos bens objecto da tentativa de subtracção não serve para “desqualificar” o furto, nos termos do nº 4, do art. 204º, do CP, uma vez que, para se considerar um valor como “diminuto” (ou seja, no caso, aquele que não exceda 102€), é necessário que tal valor se encontre incluído nos factos provados (ou, noutros termos, se formule um juízo positivo sobre esse valor).
*
Nos termos relatados, decide-se julgar improcedente o recurso, mantendo-se a Sentença recorrida.