Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
ACIDENTE DE VIAÇÃO
GABINETE PORTUGUÊS DA CARTA VERDE
SOLICITAÇÃO DIRECTA DO LESADO À SEGURADORA
PRAZO
APRESENTAÇÃO
PROPOSTA
INDEMNIZAÇÃO
Sumário
I - A competência do Gabinete Português de Carta Verde não obsta à possibilidade do terceiro lesado se dirigir à empresa de seguros – ou à sua representante em território nacional – de modo a obter directamente junto da mesma a resolução de acidente que envolveu veículo estrangeiro. II - A quantia a que se reporta o artigo 40.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, é repartida entre o lesado e o Instituto de Seguros de Portugal. III - A sanção prevista no artigo 40.º, n.º 2, do Decreto-lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, não contraria o disposto no artigo 4.º, n.º 6, da Directiva 2000/26/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de Maio de 2000.
Texto Integral
Processo n.º 571/09.6TBOVR-A.P1 5.ª Secção (3.ª Cível) do Tribunal da Relação do Porto
Sumário (artigo 713.º, n.º 7, do Código de Processo Civil):
I- A competência do Gabinete Português de Carta Verde não obsta à possibilidade do terceiro lesado se dirigir à empresa de seguros – ou à sua representante em território nacional – de modo a obter directamente junto da mesma a resolução de acidente que envolveu veículo estrangeiro.
II- A quantia a que se reporta o artigo 40.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, é repartida entre o lesado e o Instituto de Seguros de Portugal.
III- A sanção prevista no artigo 40.º, n.º 2, do Decreto-lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, não contraria o disposto no artigo 4.º, n.º 6, da Directiva 2000/26/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de Maio de 2000.
Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I) Relatório 1.1B… instaurou no Juízo de Pequena e Média Instância Cível de Ovar, comarca do Baixo Vouga, acção de condenação, com processo comum e sob a forma sumaríssima, contra Gabinete Português da Carta Verde, ambos melhor identificados nos autos.
Alega que no dia 19 de Janeiro de 2008, pelas 20.30 horas, ocorreu um acidente de viação, entre o veículo de matrícula ..-..-GQ, pertencente ao autor e conduzido por seu filho, e o veículo de matrícula espanhola ….FDC, cujo proprietário e condutor residia em Espanha, estando a viatura segura em seguradora espanhola.
O acidente consubstanciou-se no embate entre os dois veículos e ficou a dever-se ao condutor da viatura de matrícula espanhola: mudou repentinamente de direcção à esquerda, sem qualquer sinalização e quando estava a ser ultrapassado pela viatura do autor, cortando a trajectória deste.
Reclama indemnizações por diferentes danos que diz ter sofrido, formulando pedido nos seguintes termos:
«(…) Ser o Réu condenado a pagar ao Autor as seguintes quantias:
a) 1240,00 €, pelos danos no veículo;
b) 1000,00 €, como indemnização/compensação pela privação do uso do veículo, ou o que subsidiariamente se peticiona, um valor a fixar com recurso à equidade, tendo como referência o período de tempo sem poder utilizar o veículo (85 dias) e o valor a pagar pelo aluguer de um veículo de substituição do sinistrado (25.00 € dia);
c) juros à taxa legal a contar da citação, acrescidos das sanções civis previstas no DL 291/2007, de 21 de Agosto, além das custas e o que mais for de lei.»
A ré, a fls. 30 e seguintes, apresentou contestação, confirmando a existência de contrato de seguro e a legitimidade da sua intervenção e impugnando a versão dos factos, quanto à dinâmica do acidente, constante da petição inicial.
Termina afirmando a improcedência da acção. 1.2 Reportando-se ao mesmo acidente, C…, com sede em Espanha, na qualidade de seguradora do veículo de matrícula espanhola ….FDC, demandou D…, Companhia de Seguros, S.A., esta na qualidade de seguradora do veículo de matrícula ..-..-GQ, em acção de condenação, com processo comum e sob a forma sumária, instaurada no mesmo tribunal.
Alega que o veículo seguro na ré, cujo condutor seguia distraído, imprimindo velocidade superior a 90 km/hora, não conseguindo imobilizar o veiculo no espaço livre e visível à sua frente, embatendo no ….FDC, no momento em que este já realizava manobra de mudança de direcção à esquerda, foi o responsável pela ocorrência.
Pede que a ré, D…, seja condenada a pagar-lhe a quantia de €10.713,83 (dez mil setecentos e treze euros e oitenta e três cêntimos), montante que entregou a E…, proprietário do veículo de matrícula ….FDC, por força de contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel. 1.3 Oportunamente, foi determinada a apensação das acções e, realizada audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença (fls. 153 e seguintes) que, apreciando a matéria referente a ambos os processos, decidiu nos seguintes termos:
«A) Absolvo a Ré Companhia de Seguros D…, S.A. dos pedidos contra ela formulados.
B) Condeno o Réu Gabinete Português da Carta Verde a pagar ao Autor B… a quantia de €: 2.240,00 (dois mil duzentos e quarenta euros), acrescida da quantia de €: 200,00 por dia, desde 22 de Fevereiro de 2008 até 04 de Maio de 2009.
C) Condeno o Réu Gabinete Português da Carta Verde a pagar ao Autor B… os juros de mora, à taxa legal, sobre a quantia de €: 2.240,00 (dois mil duzentos e quarenta euros), a contar desde a data de citação, até integral pagamento.» 2.1 O réu Gabinete Português da Carta Verde formulou reclamação onde, além do mais, arguiu nulidade processual e requereu a reforma da sentença, nomeadamente em relação à indicação do valor da acção, que é omitida.
Por despacho exarado a fls. 270 dos autos, foi indeferida a arguição de nulidades da sentença e, com referência ao disposto nos artigos 315.º, n.º 3, e 306.º, n.º 12, ambos do Código de Processo Civil, o valor da acção foi fixado em € 12.953,83. Em ulterior aditamento, consignou-se que este valor é a soma das duas acções apensas, sendo € 10.713,83 da acção sumária e € 2.240,00 da acção sumaríssima.
Inconformado, o réu Gabinete Português da Carta Verde interpôs recurso, suscitando a apreciação das seguintes questões: a nulidade processual, por não ter sido fixado o valor da acção na data em que foi proferida a sentença; saber se o valor da acção deveria ter sido corrigido para o valor da utilidade económica do pedido.
Por acórdão proferido por este Tribunal da Relação do Porto, em 20 de Setembro de 2012 (cf. apenso B), na apreciação deste recurso e que transitou em julgado, foi decidido nos seguintes termos:
«(…) Julga-se a apelação procedente, revogando-se as decisões recorridas e, em consequência:
- Anulam-se, em relação ao réu Gabinete Português da Carta Verde, todos os actos processuais posteriores à notificação da sentença;
- Fixa-se o valor da acção proposta por B… em € 32.240,00 (trinta e dois mil duzentos e quarenta euros).
Custas (…)». 2.2 Entretanto, a ré C…, interpôs recurso da sentença proferida, impugnando a matéria de facto e pretendendo que, face à prova produzida, deviam ter sido dados como provados os itens 1.º a 8.º e não provados os itens 11.º, 12.º, 13.º, 14.º, 18.º, 19.º, 21.º, 22.º e 23.º, todos da Base Instrutória.
O recurso foi apreciado nos termos documentados a fls. 326 e seguintes dos presentes autos. Por acórdão proferido por este Tribunal da Relação do Porto, em 22 de Outubro de 2012 (fls. 332 a 343), foi decidido negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmar a decisão recorrida. 3.1 Na sequência da prolação do acórdão deste Tribunal da Relação, de 20 de Setembro de 2012, supra referido em 2.1, o réu Gabinete Português da Carta Verde, não se conformando com a decisão proferida na sentença, veio interpor o recurso de apelação que aqui se aprecia, concluindo assim a respectiva motivação (transcrição integral das conclusões apresentadas na motivação do recurso, a fls. 364 e seguintes):
«1. – A recorrente não se pode conformar com a resposta dada aos quesitos 1.º, 2.º, 3.º, 4.º, 5.º, 6.º, 7.º,8.º, 11.º, 12.º, 13.º, 14.º, 18.º, 19.º, 21.º, 22.º e 23.º da Base Instrutória, entendendo que face à prova produzida, deveria ter sido dada uma resposta positiva aos quesitos 1.º a 8.º da Base Instrutória e resposta negativa aos quesitos 11.º, 12.º, 13.º, 14.º, 18.º, 19.º, 21.º, 22.º e 23.º da Base Instrutória.
2. – Com efeito a resposta dada aos quesitos acima referidos teve como base o depoimento das testemunhas F… e G….
3. – Desde logo se diga que a testemunha F… é filho do proprietário do veículo seguro na Recorrida. Estranho seria que a referida testemunha fosse prejudicar o seu pai, tanto mais que a acção interposta pelo seu pai estava apensa a este processo. Qual pode ser a credibilidade de tal testemunho?
4. – Mas mesmo assim, repare-se que o seu depoimento é incoerente e inconstante. Senão, vejamos o que refere a testemunha F… (cujo depoimento se encontra gravado no sistema Habilus deste tribunal):
5. – Do depoimento desta testemunha (cujo depoimento se encontra gravado no sistema Habilus deste tribunal) resulta que o embate se verifica junto à berma do lado esquerdo da rua …, atento o sentido …/….
6. – Por outro lado, o embate entre os veículos verifica-se entre a frente do veículo GQ e a parte lateral traseira do lado esquerdo do veículo ….FDC.
7. – Ora destes factos resulta claramente que, aquando do embate, o veiculo ….FDC já se encontrava com a parte da frente fora da faixa de rodagem. Significa isto que, com toda a certeza, o veículo ….FDC já tinha iniciado a manobra da mudança de direcção à esquerda muito antes do condutor do veículo GQ ter iniciado a manobra de ultrapassagem. Repare-se que o condutor do veículo ….FDC teria ainda de subir um passeio para efectuar a manobra de mudança de direcção e estacionar o seu veículo fora da faixa de rodagem, o que significava que teria de circular a uma velocidade muito reduzida.
8. – Acresce que, atento aos danos sofridos pelos veículos, nomeadamente a perda total de veículo 6Q e a reparação de €10.000,00 sofrida pelo ….FDC, nunca a velocidade do GQ seria inferior a pelo menos 80Km/horas.
9. – Já do depoimento da testemunha G… (cujo depoimento se encontra gravado no sistema habilus deste Tribunal) resulta desde logo que só se apercebe do acidente quando o veículo GQ entra em derrapagem. Isto é, só tem percepção do acidente quando este se está a verificar, pelo que não tem a percepção da movimentação dos veículos antes do acidente. No entanto, o seu depoimento foi valorizado pelo Meritíssimo Juiz “a quo”.
10. – Assim, do seu depoimento pouco se pode extrair quanto à dinâmica do acidente. No entanto, é valorizado.
11. – Por todos os factos acima expostos, entende a Recorrente que deve ser dada resposta positiva aos factos vertidos nos artigos 1.º a 8.º da Base Instrutória e uma resposta negativa aos factos vertidos nos artigos 11.º, 12.º, 13.º, 14.º, 18.º, 19.º, 21.º, 22.º e 23.º da Base Instrutória, o que desde já se pede.
12. – Em consequência, deve o condutor do veículo GQ ser julgado o exclusivo culpado na produção do acidente.
13. – O recorrente também não concorda com a resposta dada aos factos vertidos nos artigos 27.º a 33.º da Base Instrutória.
14. – De facto, do depoimento da testemunha H… (cujo depoimento se encontra gravado no sistema de gravação digital deste tribunal) resulta claramente que o Autor era proprietário de um veículo de condições idênticas (e quando dizemos idênticas é porque era um veículo de modelo e cor igual ao sinistrado) ao do veículo sinistrado.
15. – Resulta deste depoimento que o Autor tinha dois veículos exactamente iguais, pelo que não há neste caso concreto, qualquer dano pela privação do uso do veículo sinistrado.
16. – Assim, teria sempre de resultar não provados os factos vertidos nos artigos 27.º a 33.º da Base Instrutória, o que desde já se pede.
17. – No que diz respeito à sanção civil, refere a sentença de fls. que “No caso sub judice resulta assente que o Gabinete Português da Carta Verde incumpriu o disposto na alínea e), do n.º 1, do artigo 36, tal como confessa em sede de contestação, pelo que é devida a peticionada sanção de € 200,00 por cada dia de atraso no cumprimento da referida obrigação, nos termos do disposto no artigo 40.º, n.º 2, 39.º, n.º 2, 38.º, n.º 2, todos do Decreto-Lei 291/2007, de 21 de Agosto”.
18. – Antes de tudo, sempre se deve dizer que o Réu nunca confessou ou incumpriu o disposto na alínea e), do n.º 1, do artigo 36.º do Decreto-Lei 291/2007, de 21 de Agosto. Com efeito, apenas refere que houve atrasos na emissão da resposta, mas nunca confessou que violou o disposto no artigo 36.º, n.º 1, alínea e) do citado Decreto-Lei. Até porque nunca o podia fazer, uma vez que o acidente nunca lhe foi participado.
19. – Senão vejamos: o Gabinete Português da Carta Verde é uma entidade jurídica autónoma e que se rege pelo Acordo entre os Serviços Nacionais de Seguros dos Estados Membros do Espaço Económico Europeu e outros Estados Associados, de 30 de Maio de 2002 (Apêndice do anexo à Decisão da Comissão de 28 de Julho de 2003 (2003/564/CE) sobre a aplicação da Directiva 72/166/CEE), bem como pelo Regulamento Geral do Conselho dos Serviços Nacionais de Seguros.
20. – Desde logo o artigo 3, n.º 1, do Regulamento Geral acima referido que “Quando um Serviço Nacional é informado da ocorrência de um acidente no território do país relativamente ao qual é competente que envolve um veículo proveniente de outro país, deve proceder, sem aguardar qualquer pedido de indemnização formal, a um inquérito sobre as circunstâncias desse acidente…”.
21. – Isto é, o Gabinete Português da Carta Verde tem a autonomia e a obrigação de resolver qualquer sinistro ocorrido em Portugal.
22. – Mas tal sinistro tem de lhe ser participado, o que nunca aconteceu. Muito pelo contrário.
23. – Optou, isso sim, o Autor por interpelar directamente, não a C… (seguradora do veículo), mas sim a I…. S.A. Significa isto que o Autor deveria ter participado o acidente directamente ao Recorrente, o qual tem autonomia para proceder à regularização do sinistro, como acima se referiu, pelo que não pode vir agora pedir ao Recorrente uma sanção civil nos termos do referido Decreto-Lei.
24. – Aliás, o próprio artigo 32.º, n.º 5 do citado Decreto-Lei refere que “as referências às empresas de seguro devem ser tidas como sendo efectuadas ao Gabinete Português da Carta Verde ...”. Isto é, a participação do sinistro deveria ter sido efectuada ao Réu e não a terceiros, nos termos do disposto no artigo 36.º e 37.º do citado Decreto-Lei.
25. – Diga-se, ainda, que o Autor poderia ter interpelado judicialmente a I…, S.A., nos termos do disposto no artigo 66.º do Decreto-lei n.º 94-8/98, de 17 de Abril.
26. – Assim, e pelo acima exposto, não pode agora ser o Réu responsável pelos eventuais atrasos na assumpção da responsabilidade na regularização do sinistro, devendo, por isso, ser revogada a sentença e ser o Recorrente absolvido nesta parte do peticionado.
27. – Ainda que assim não se entenda, o que apenas se admite por mera hipótese académica, sempre se dirá que a sanção civil agora aplicada é manifestamente excessiva face ao que resultou provado em sede de julgamento e ao peticionado pelo Recorrido.
28. – De facto, resultou provado e aceite que o próprio Autor recebeu, e percebeu, o teor da comunicação referida no artigo 14.º dos factos provados. Quer isto dizer que a referida sanção civil, a ser devida, apenas o deveria ser até 07 de Agosto de 2008, e não como o fez a sentença de fls., até 4 de Março de 2009.
29. – Como também o início do prazo para a aplicação das sanções civis deve ter em conta o disposto no artigo 8.º do citado Regulamento Geral, por força do disposto no artigo 32.º, n.º 4 do Decreto-Lei 291/2007, de 21 de Agosto.
30. – Com efeito nos termos do disposto no artigo 8.º do Regulamento acima citado o Réu dispõe de 3 meses para verificar a validade da carta verde, pelo que só após estes 3 meses é que poderia incorrer em sanções civis.
31. – Por outro lado, a douta sentença de fls. condena o Réu ao pagamento ao Autor da sanção civil de € 200.00 por cada dia de atraso quando na verdade, a referida quantia deve ser repartida entre o Autor e o Instituto de Seguros de Portugal tal como consta no artigo 40.º, n.º 2 do citado Decreto-Lei, pelo que também aqui deve a douta sentença de fls. ser revogada.
32. – Acresce que, tal como consta do documento n.º 3 junto com a petição inicial, a I…, S.A. comunicou ao Autor em 13 de Fevereiro de 2008, os valores relativos ao veículo, bem como a informar que não assumia qualquer responsabilidade do seu segurado na produção do acidente, pelo que sempre se teria de considerar que o Autor soube desde 13 de Fevereiro que a empresa de seguros não assumia qualquer responsabilidade na produção do acidente.
33. – O Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, teve como escopo a transposição para a ordem jurídica interna da Directiva n.º 2005/14/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Maio, que altera as Directivas n.º 72/166/CEE, 88/357/CEE e 10/232/CEE, do Conselho, e a Directiva n.º 2000/26/CE, relativos ao seguro de responsabilidade civil resultante da circulação de veículos automóveis.
34. – De acordo com o disposto no artigo 4.º, n.º 6, alínea b) da Directiva 2000/26/CE (o qual não foi alterado pela Directiva 2005/14/CE): “Os Estados Membros devem prever obrigações avalizadas por sanções, pecuniárias ou administrativas equivalentes, adequadas e eficazes e sistemáticas, por forma a garantir que, num prazo de 3 meses a contar da data em que a pessoa lesada tenha apresentado o seu pedido de indemnização à empresa de seguros da pessoa que causou o sinistro ou ao seu representante para sinistros: b) A empresa a quem tiver sido dirigido o pedido de indemnização ou o seu representante dêem uma resposta fundamentada quanto aos pontos invocados no pedido, no caso de a responsabilidade ter sido rejeitada, ou não ter sido claramente determinada ou os danos sofridos não estarem totalmente quantificados”.
35. – Significa isto que, nos termos do n.º 6, do artigo 4.º, daquela Directiva, é necessária a verificação cumulativa de duas condições para o Estado Membro poder aplicar sanções às empresas de seguros:
c) Que o lesado tenha dirigido o Pedido de Indemnização à empresa de Seguros;
d) E que a empresa de seguros, no prazo de três meses, não tenha dado resposta a esse mesmo pedido de indemnização por parte do lesado.
36. – Ora, o Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto deturpa por completo o escopo estabelecido na Directiva acima referida.
37. – Com efeito, a sanção prevista no artigo 40.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, ao contrário do estabelecido na Directiva acima referida inicia-se nos trinta dias após a participação do sinistro, o que manifestamente vai contra o teor da Directiva.
38. – E repara-se, é lícito aos agentes nacionais ou internacionais invocar em juízo uma Directiva não apenas quando ela produza um efeito directo na respectiva esfera jurídica individual, mas igualmente sempre que tenham um interesse legítimo em que os Tribunais Nacionais procedam ao controlo de adopção das medidas adoptadas a ordem interna para alcançar o resultado prescrito pela Directiva.
39. – A referida Directiva prescreve condições enumeradas e cumulativas para a aplicação de sanções pecuniárias às empresas de seguros, condições essas que não são respeitadas pelo Decreto-lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, pelo que não são de aplicar ao caso concreto, por manifesta contradição com o constante no n.º 6, do artigo 4.º, da Directiva 2000/26/CE, devendo antes, aplicar-se o disposto na Directiva.
40. – Assim, por este motivo, também deve ser a douta sentença de fls. ser revogada, e ser o ora Réu absolvido do pagamento das sanções civis a que foi condenado.
41. – A douta sentença de fls. violou, entre outros, o disposto nos artigos 40.º do Dec.-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto.»
Termina afirmando que deve ser revogada a sentença recorrida. 3.2 O autor, B…, veio responder, nos termos documentados a fls. 397 e seguintes, formulando as seguintes conclusões (transcrição integral):
«A- A partir da notificação do Acórdão da Relação do Porto proferido pela 3.ª secção no processo n.º 571/09.6TBOVR-B.P1, o réu Gabinete Português de Carta Verde dispunha do prazo de 30 dias para interpor recurso da sentença de 1.ª instância.
B- Tal prazo terminava em 24/10/2012 ou, caso o recurso tivesse por objecto a reapreciação da prova, em 05/11/2012.
C- O recurso foi interposto em 08/11/2012, pelo que não foi tempestivamente apresentado, o que se alega nos termos e para os efeitos do art. 685, n.º 6 do C. Proc. Civil.
D- A decisão do tribunal de 1.ª instância sobre a responsabilidade no acidente está correcta face à prova produzida, e nesse sentido se pronunciou já o Tribunal da Relação em anterior recurso (interposto pela C…, autora na acção apensa).
E- As respostas aos artigos 27 a 33 da Base Instrutória decorreram da prova produzida.
No que respeita aos arts. 27 e 28 a argumentação do recorrente para alterar as respostas de provado para não provado, não pode proceder porque se baseia em factos não provados, e nem sequer alegados.
No que respeita aos arts. 29 a 33, o recorrente não justifica minimamente porque é que os mesmos deviam ter merecido a resposta de não provados.
F- Quanto à sanção civil, o recorrente apenas tem razão quanto à parte da decisão que o condena a pagar integralmente ao autor 200,00 € por dia. Este montante deve ser repartido entre o autor e o Instituto de Seguros de Portugal.
G- Pelo que deve ser mantida a decisão do tribunal de 1.ª instância, com excepção da parte da condenação na sanção civil de 200,00 € por dia que deve ser a repartir entre o autor e o Instituto de Seguros de Portugal em partes iguais». 4. Como resulta da transcrição que antecede, é questionada pelo autor/recorrido a tempestividade do recurso.
Pela anterior relatora a quem os presentes autos foram distribuídos foi proferido despacho rejeitando a admissão do recurso, por intempestivo (teor de fls. 447). O recorrente reclamou, vindo a ser acordada em conferência, face à constatação do pagamento da multa prevista no artigo 145.º, n.º 5, alínea c), do Código de Processo Civil, a reforma do despacho e a admissão do recurso de apelação do Gabinete Português da Carta Verde.
A apreciação deste recurso não é prejudicada pela decisão do acórdão de 22 de Outubro de 2012, na medida em que esta se restringe à negação de provimento ao recurso interposto pela autora C…, no âmbito da acção que instaurou contra D…, Companhia de Seguros, S.A.
Colhidos os vistos legais e na ausência de fundamento que obste ao seu conhecimento, cumpre apreciar e decidir o recurso interposto pelo réu Gabinete Português da Carta Verde.
Importa salientar que, como resulta do que antes se deixou enunciado, o recurso se restringe à pretensão deduzida pelo autor B… contra o réu Gabinete Português da Carta Verde.
As conclusões formuladas definem a matéria que é objecto de recurso e que cabe aqui precisar. Assim, atenta a formulação das conclusões da motivação do recurso, impõe-se decidir as seguintes questões:
● A impugnação das respostas dadas aos quesitos 1.º, 2.º, 3.º, 4.º, 5.º, 6.º, 7.º, 8.º, 11.º, 12.º, 13.º, 14.º, 18.º, 19.º, 21.º, 22.º e 23.º e ainda aos artigos 27.º a 33.º, todos da Base Instrutória.
● A sanção civil: a responsabilidade do recorrente por atrasos na assumpção de responsabilidades na regularização do sinistro, a adequação do período fixado pelo tribunal e do destinatário da prestação e o desrespeito da Directiva 2000/26/CE, pelo Decreto-lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto. II) Fundamentação 1. Factos relevantes.
Com interesse para a decisão a proferir, importa considerar os factos que foram julgados provados na sentença recorrida e que integralmente se transcrevem.
«1.º A C… é uma empresa que se dedica à actividade seguradora, devidamente legalizada e autorizada a celebrar contratos de seguro em todos os ramos, com todos os segurados.
2.º No âmbito da sua actividade, a C… celebrou com E… um contrato de seguro de danos próprios do ramo automóvel, titulado pela apólice n.º ………..
3.º Através do contrato referido em 2.º foi transferida para a C… a responsabilidade civil emergente da circulação do veículo ligeiro de passageiros de matrícula ….FDC, “propriedade” de E…, até ao limite estabelecido nas Condições Particulares e Gerais da Apólice.
4.º No dia 19 de Janeiro de 2008, pelas 20.30 horas, ocorreu um acidente de viação na Rua …, freguesia …, concelho de Ovar.
5.º No acidente de viação referido em 4.º foram intervenientes o veículo ligeiro de passageiros, de matrícula ..-..-GQ, “propriedade” de B… e conduzido por F… e o veículo ligeiro de passageiros, de matrícula ….FDC, “propriedade” de E… e conduzido pelo mesmo.
6.º No local do acidente, a Rua … configura uma recta, com duas vias de trânsito, uma no sentido …/… e outra no sentido contrário, divididas entre si por linha descontínua.
7.º Na sua totalidade, e em largura, a faixa de rodagem mede 5,45 metros e cada hemi-faixa 2,72 metros.
8.º A estrada é asfaltada e apresenta um piso em bom estado de conservação, que, no momento do acidente, se encontrava seco.
9.º O condutor do veículo de matrícula ….FDC circulava na Rua …, no sentido …/…, pela hemi-faixa de rodagem mais à direita, atento o sentido referido, imprimindo uma velocidade não superior a 40 km/hora.
10.º O GQ embateu com a frente na parte lateral esquerda traseira do FDC.
11.º A Ré Companhia de Seguros D…. S.A., por via de contrato de seguro titulado pela apólice n.º ………, assumiu a responsabilidade pela circulação do veículo ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-GQ, “propriedade” de B….
12.º O veículo de matrícula ..-..-GQ circulava na mesma via, no mesmo sentido e pela hemi-faixa de rodagem que o ….FDC, mas na retaguarda deste.
13.º O acidente dos autos foi participado à I… em 22 de Janeiro de 2008.
14.º Em 07 de Agosto de 2008, a I… remeteu ao mediador da Companhia de Seguros D…, S.A., o fax que faz fls. 25, referindo que “em resposta ao fax datado de 23 de Maio de 2008, informamos que a nossa representada declina toda e qualquer responsabilidade no presente sinistro, com base no incumprimento do v/cliente ao artigo 38.º do CE”.
15.º Ao aproximar-se do ….FDC, o condutor do ..-..-GQ decidiu ultrapassá-lo.
16.º O condutor do GQ assegurou-se que não havia trânsito a circular em sentido contrário ao seu.
17.º E que não havia, na retaguarda, trânsito a circular no mesmo sentido que o seu.
18.º O condutor do GQ accionou o sinal de mudança de direcção para a esquerda, vulgo “pisca-pisca”.
19.º Na mesma ocasião, alternou as luzes médias para máximas, avisando o condutor do ….FDC que o ia ultrapassar.
20.º Foi aproximando o ..-..-GQ do eixo da via, que acabou por transpor, passando a circular na hemi-faixa esquerda atento o sentido …/….
21.º Quando o veículo ..-..-GQ já se encontrava na hemi-faixa esquerda e em aceleração, o condutor do ….FDC guinou para a esquerda, obliquando o veículo ….FDC, de forma súbita e inopinada, em direcção à berma do lado esquerdo (atento o sentido …/…), transpondo o eixo da via e atravessando o ….FDV na hemi-faixa esquerda (atento sentido …/…), por onde o ..-…-GQ já circulava, constituindo-se em obstáculo à progressão da marcha do GQ.
22.º O condutor do GQ ainda desviou, em manobra de recurso, o veículo para a esquerda (atento o sentido …/…).
23.º Após o acidente, o veículo GQ ficou impedido de circular.
24.º O veículo de matrícula GQ era utilizado pelo Autor B… para se deslocar no seu dia-a-dia.
25.º O Autor B… fazia em média quatro a seis deslocações diárias da sua residência para o trabalho e do trabalho para a sua residência, seis dias por semana.
26.º Da residência do Autor B… até ao seu local de trabalho distam 7 km.
27.º O veículo do Autor de B… era também por ele utilizado para fazer compras de mercearia semanais e para proceder ao pagamento das despesas relacionadas com a sua habitação (água, luz, gás, telefone).
28.º Em diversas situações, o Autor B… teve de pedir transporte a terceiras pessoas.
29.º O Autor B… insistiu com o representante do Gabinete Português da Carta Verde, por diversas vezes, para que fosse paga a indemnização dos seus danos.
30.º À data do acidente, o GQ valia €: 1.300,00 (mil e trezentos euros).
31.º Após o acidente, o salvado do GQ valia €: 60,00 (sessenta euros).
32.º Para a reparação dos danos do veículo ….FDC provocados pelo acidente dos autos, o seu proprietário despendeu a quantia de €: 11.182,67 (onze mil cento e oitenta e dois euros e sessenta e sete cêntimos).
33.º A Autora C… procedeu à regularização do sinistro, tendo pago ao proprietário do veículo ….FDC, E…, a quantia de €: 10.713,83 (dez mil setecentos e treze euros e oitenta e três cêntimos).» 2. A impugnação da matéria de facto. 2.1 Nos termos do artigo 712.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Civil, a decisão do tribunal de 1.ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artigo 685.º-B, a decisão com base neles proferida – cf. artigos 662.º e 639.º na redacção actual, resultante da Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho.
Importa ter presente a prevalência do princípio da liberdade de julgamento, consagrado no artigo 655.º do Código de Processo Civil (artigo 607.º, n.º 5, na redacção actual), nos termos do qual o tribunal aprecia livremente as provas, decidindo segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto controvertido; não invalida a convicção do tribunal o facto de não existir uma prova directa e imediata da generalidade dos factos em discussão, sendo legítimo que se extraiam conclusões em função de elementos de prova, segundo juízos de normalidade e de razoabilidade, ou que se retirem ilações a partir de factos conhecidos.
Por isso, a alteração da matéria de facto pela Relação deve ser realizada ponderadamente, em casos excepcionais e pontuais; só deverá ocorrer se, do confronto dos meios de prova indicados pelo recorrente com a globalidade dos elementos que integram os autos, se concluir que tais elementos probatórios, evidenciando a existência de erro de julgamento, sustentam, em concreto e de modo inequívoco, o sentido pretendido pelo recorrente.
“A efectivação do segundo grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto não implica a repetição do julgamento pelo tribunal de 2.ª instância – um novo julgamento, no sentido de produzir, ex novo, respostas aos quesitos da base instrutória –, mas, apenas, verificar, mediante a análise da prova produzida, nomeadamente a que foi objecto de gravação, se as respostas dadas pelo tribunal recorrido têm nas provas suporte razoável, ou se, pelo contrário, a convicção do tribunal de 1.ª instância assentou em erro tão flagrante que o mero exame das provas gravadas revela que a decisão não pode subsistir” – Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 21 de Junho de 2007 (disponível em www.dgsi.pt, processo 06S3540).
Assim, as disposições em causa não visam propriamente a concretização de um segundo julgamento que inclua a reapreciação global e genérica de toda a prova, tendo antes em vista um segundo grau de apreciação da matéria de facto, de modo a colmatar eventuais erros de julgamento, nos concretos pontos de facto que o recorrente assinala.
Acresce que, quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, além dos concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida e, neste caso, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados e seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, deve indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respectiva transcrição – artigo 685.º-B do Código de Processo Civil.
Esta exigência não se satisfaz com a transcrição integral do depoimento da generalidade ou de algumas das testemunhas, sobretudo quando, como sucede nos presentes autos, o sistema de gravação permite localizar ao segundo os trechos dos depoimentos que se queira indicar e que imponham decisão diversa. 2.2 O recorrente começa por questionar a resposta dada aos quesitos 1.º, 2.º, 3.º, 4.º, 5.º, 6.º, 7.º, 8.º, 11.º, 12.º, 13.º, 14.º, 18.º, 19.º, 21.º, 22.º e 23.º da Base Instrutória, pretendendo que, face à prova produzida, deveria ter sido dada uma resposta positiva aos quesitos 1.º a 8.º da Base Instrutória e resposta negativa aos quesitos 11.º, 12.º, 13.º, 14.º, 18.º, 19.º, 21.º, 22.º e 23.º da Base Instrutória (correspondendo estes aos pontos 16.º a 19.º e 21.º e 22.º da matéria de facto provada e que antes se deixou transcrita).
Esta matéria foi o objecto exclusivo do acórdão proferido em 22 de Outubro de 2012, por este Tribunal da Relação do Porto, de fls. 332 a 343 dos autos, restrito à apreciação do recurso interposto pela autora C… da sentença que também aqui é objecto de recurso.
A motivação do recurso e os respectivos fundamentos são, neste ponto, exactamente iguais em ambos os recursos.
Não se vê que haja razão para alterar o sentido da decisão proferida nesse acórdão e os respectivos fundamentos.
Assim, quanto a esta questão, transcreve-se a fundamentação do aludido acórdão:
«O recurso incide sobre matéria de facto.
Alega a recorrente que devem ser dados como provados os itens 1 a 8 e não provados os itens 11, 12, 13, 14, 18, 19, 21, 22 e 23 todos da BI (o tribunal a quo deu como não provados os itens 1 a 8 e provados os restantes).
Argumenta, para o efeito, que os depoimentos em que se baseou a decisão recorrida (testemunhos de F… e G…, respectivamente, condutor do GQ e testemunha presencial do embate) não são credíveis quer porque a 1.ª testemunha é filho do proprietário do GQ e prestou um depoimento incoerente e inconstante quer porque a 2.ª testemunha só se apercebeu do acidente quando este se estava a verificar não tendo, por isso, percepção da movimentação dos veículos antes do embate.
Conclui a sua alegação pela culpa exclusiva do condutor do GQ na ocorrência do evento em questão e pela condenação da seguradora recorrida no pagamento da indemnização peticionada.
Os únicos elementos existentes conducentes à avaliação do acidente que envolveu o GQ e o FDC são o croqui policial junto aos autos (do qual consta a posição das viaturas após o embate e a descrição do ambiente físico circundante) e o depoimento das duas supra referidas testemunhas.
Os depoimentos em causa são compatíveis com a narração do evento tal como foi acolhida pelo tribunal recorrido (em suma, manobra imprudente de viragem à esquerda do condutor do FDC ignorando a ultrapassagem, na circunstância, do GQ).
Na posição das duas viaturas após o embate (na hemi-faixa esquerda atento o sentido …/…) e nos danos nos veículos (embate da frente do GQ com a parte lateral esquerda do FDC) também existe compatibilidade com a sobredita manobra de viragem à esquerda aquando da referida ultrapassagem.
Conclui-se, neste contexto, que o tribunal a quo teve fundamento para dar como provados os factos que deu como provados e não provados os que deu como não provados acolhendo, assim, a versão do acidente da recorrida.
Acresce que, tal versão é a mais compatível com a forma como decorreu o acidente tendo como pano de fundo os elementos probatórios acima identificados.
Para se lograr a impugnação da matéria de facto é necessário, além do mais, indicar os concretos meios probatórios que imponham decisão diversa da recorrida conforme preceitua o art. 685.º-B n.º 1 al. b) do CPC o que no presente caso não aconteceu (os elementos probatórios a que lança mão a recorrente não só não impõem decisão diversa da recorrida como corroboram a decisão sob recurso).
Por outro lado, o tribunal decide segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto e aprecia livremente as provas conforme art. 655.º do CPC.
No caso em apreço, independentemente das circunstâncias particulares da testemunha F… (filho do proprietário do GQ e condutor deste) é possível avaliar o respectivo depoimento dando-lhe credibilidade (como fez o tribunal recorrido) porque, no essencial, transmitiu uma versão compatível com a realidade que visou descrever (viragem intempestiva à esquerda do condutor do FDC).
Acresce que tal depoimento se harmoniza com o da testemunha G… que, sem qualquer interesse na causa, refere uma sucessão de eventos compatíveis com os dados como provados a que, no essencial, praticamente presenciou.»
Assim, improcede nesta parte a impugnação da matéria de facto deduzida pela recorrente.
Perante os factos em questão não há censura a fazer à sentença recorrida quando, reportando-se aos mesmos, conclui que se provou a culpa do condutor do veículo de matrícula ….FDV, relativamente ao acidente em discussão nos autos, ficando prejudicada a pretensão do recorrente na parte em que sustenta que o condutor do veículo do autor deve ser julgado o exclusivo culpado na produção do acidente, com as consequências daí decorrentes. 2.3 O recorrente questiona depois a resposta dada aos quesitos 27.º a 33.º da Base Instrutória, pretendendo que, face à prova produzida, teriam de resultar não provados os factos aí vertidos (correspondendo os aludidos quesitos aos pontos 24.º a 28.º da matéria de facto provada e que antes se deixou transcrita).
Para sustentar este entendimento alega que do depoimento da testemunha H…, gravado no sistema de gravação digital do tribunal, resulta claramente que o autor era proprietário de um veículo de modelo e cor igual ao sinistrado, pelo que, tendo dois veículos exactamente iguais, não há neste caso concreto, qualquer dano pela privação do uso do veículo sinistrado. Transcreve dois curtos trechos do depoimento da testemunha onde esta, afirmando ter dado boleias ao autor, depois do acidente, afirma também que o autor tinha dois veículos idênticos (dois Ford …).
Especificamente em relação a estes quesitos, consignou-se em sede de fundamentação da resposta à matéria de facto (fls. 128):
«No que tange à prova dos factos constantes dos arts. 24.º, 27.º, 28.º, 30.º, 31.º, a sua prova teve, para além do mais, por base os depoimentos das seguintes testemunhas:
- F…, filho do Autor, o qual deu conta ao Tribunal do tipo de utilização dada ao veículo, do seu estado após o acidente e dos incómodos resultantes da paralisação. Tal testemunha revelou um conhecimento directo e circunstanciado dos factos, adveniente da proximidade existencial para com o Autor, atento o grau de parentesco e o facto de residirem juntos;
- H…, colega de trabalho do Autor, o qual prestou o seu depoimento de forma espontânea e não totalmente favorável aos interesses de quem o indicou, o que reforça a sua credibilidade. Referiu ter, após o acidente e por várias vezes, dado boleias ao Autor para o seu local de trabalho.»
Importa salientar que, ao fazer a transcrição de parte do depoimento da testemunha H…, o recorrente não cumpre de forma correcta as exigências do artigo 685.º-B, do Código de Processo Civil e que antes se deixaram mencionadas, na medida em que não explicita a exacta localização das passagens que transcreve, num depoimento com o total de 8 minutos e 26 segundos, na certeza de que o sistema de registo da gravação permite essa localização com rigor.
De qualquer modo, a audição do depoimento desta testemunha confirma que a mesma relatou que o autor tinha “outro carro também” (02m:12s), tinha dois carros iguais (02m:30s).
A relevância desta afirmação restringe-se aos quesitos 27.º, 28.º e 33.º (artigos 24.º, 25.º e 28.º dos factos que acima se deixaram transcritos), sendo inócua em relação à matéria dos restantes artigos sob reclamação e antes apreciados.
De qualquer modo, importa salientar que a testemunha H… também afirmou que uma das viaturas, embora em nome do autor, estava emprestada e era utilizada pelo filho deste (03m:42s e 08m:11s); afirmou ainda que uma das viaturas esteve avariada (02m:18s e 02m:46s) e reiterou que, no período subsequente ao acidente, o autor não tinha carro, dando-lhe boleia o próprio depoente, tal como fizeram outros colegas (03m:50s, 04m:30s, 04m:50s e 06m:35s).
Nestas circunstâncias, não se vê que esteja contrariada a efectiva indisponibilidade de viatura por parte do autor, em consequência do acidente em discussão nos autos, em termos que ponham em causa a convicção afirmada pelo tribunal recorrido e que justifiquem a pretendida alteração da matéria de facto.
Por isso, também aqui improcede a impugnação da matéria de facto deduzida pela recorrente.
Perante os factos provados, subsiste a sentença recorrida na parte em que condenou o réu recorrente, Gabinete Português da Carta Verde, a pagar ao autor B… a quantia de €: 2.240,00 (dois mil duzentos e quarenta euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, calculados sobre a acudida quantia, a contar desde a data de citação e até integral pagamento. 3. A sanção civil: a responsabilidade do recorrente por atrasos na assumpção de responsabilidades na regularização do sinistro, a adequação do período fixado pelo tribunal e do destinatário da prestação e o desrespeito da Directiva 2000/26/CE, pelo Decreto-lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto. 3.1 O Decreto-lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, aprovou o actual regime do sistema do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel e transpôs parcialmente para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2005/14/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Maio, que alterou as Directivas n.ºs 72/166/CEE, 84/5/CEE, 88/357/CEE e 90/232/CEE, do Conselho, e a Directiva n.º 2000/26/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, relativas ao seguro de responsabilidade civil resultante da circulação de veículos automóveis.
O capítulo da regularização dos sinistros fixa as regras e os procedimentos a observar pelas empresas de seguros com vista a garantir, de forma pronta e diligente, a assunção da sua responsabilidade e o pagamento das indemnizações devidas em caso de sinistro.
Nesse capítulo e na parte que aqui interessa, o artigo 34.º, n.º 1, estabelece que, em caso de sinistro, o tomador do seguro ou o segurado, sob pena de responder por perdas e danos, obriga-se a comunicar tal facto à empresa de seguros no mais curto prazo de tempo possível, nunca superior a oito dias a contar do dia da ocorrência ou do dia em que tenha conhecimento da mesma, fornecendo todas as indicações e provas documentais e ou testemunhais relevantes para uma correcta determinação das responsabilidades.
Nos termos do artigo 36.º, n.º 1, do mesmo diploma, sempre que lhe seja comunicada pelo tomador do seguro, pelo segurado ou pelo terceiro lesado a ocorrência de um sinistro automóvel coberto por um contrato de seguro, a empresa de seguros deve proceder ao primeiro contacto com o tomador do seguro, com o segurado ou com o terceiro lesado no prazo de dois dias úteis, marcando as peritagens que devam ter lugar [alínea a)] e comunicar a assunção, ou a não assunção, da responsabilidade no prazo de 30 dias úteis, a contar do termo do prazo antes mencionado, informando desse facto o tomador do seguro ou o segurado e o terceiro lesado, por escrito ou por documento electrónico [alínea e)].
A posição prevista nesta alínea consubstancia-se numa proposta razoável de indemnização, no caso de a responsabilidade não ser contestada e de o dano sofrido ser quantificável, no todo ou em parte (artigo 38.º, n.º 1). Em caso de incumprimento dos deveres fixados na disposição antes identificada, quando revistam a forma dele constante, são devidos juros no dobro da taxa legal prevista na lei aplicável ao caso sobre o montante da indemnização fixado pelo tribunal ou, em alternativa, sobre o montante da indemnização proposto para além do prazo pela empresa de seguros, que seja aceite pelo lesado, e a partir do fim desse prazo (artigo 38.º, n.º 2).
A comunicação da não assunção da responsabilidade, nos termos previstos nas disposições identificadas no n.º 1 do artigo 38.º consubstancia-se numa resposta fundamentada em todos os pontos invocados no pedido nos seguintes casos: a responsabilidade tenha sido rejeitada; a responsabilidade não tenha sido claramente determinada; os danos sofridos não sejam totalmente quantificáveis (artigo 40.º, n.º 1). Em caso de atraso no cumprimento dos deveres fixados nas disposições identificadas no n.º 1 do artigo 38.º, quando revistam a forma constante do número anterior, para além dos juros devidos a partir do 1.º dia de atraso sobre o montante previsto no n.º 2 do artigo anterior, esta constitui-se devedora para com o lesado e para com o Instituto de Seguros de Portugal, em partes iguais, de uma quantia de € 200 por cada dia de atraso (artigo 40.º, n.º 2).
Estes procedimentos aplicam-se a sinistros cujos danos indemnizáveis totais não excedam o capital mínimo legalmente estabelecido para o seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel e responsabilizem as empresas de seguros relativamente às indemnizações devidas em caso de sinistro no âmbito do seguro de responsabilidade civil automóvel. Aplicam-se ainda, com as devidas adaptações, aos sinistros cuja regularização deva ser efectuada pelo Fundo de Garantia Automóvel, ou pelo Gabinete Português da Carta Verde, na qualidade prevista no artigo 90.º, e neste caso sem prejuízo das obrigações internacionais decorrentes da subscrição do Acordo entre os serviços nacionais de seguros; para esse efeito, as referências às empresas de seguros devem ser tidas como sendo efectuadas ao Gabinete Português de Carta Verde ou ao Fundo de Garantia Automóvel – artigo 32.º, n.ºs 4 e 5.
Compete ao Gabinete Português de Carta Verde, nomeadamente, a satisfação, ao abrigo do Acordo entre os serviços nacionais de seguros, das indemnizações devidas nos termos do Decreto-lei n.º 291/2007 aos lesados por acidentes ocorridos em Portugal e causados por veículos portadores do documento previsto nas alíneas b) a e) do n.º 1 do artigo 28.º e com estacionamento habitual em país cujo serviço nacional de seguros tenha aderido a esse Acordo – artigo 90.º do referido diploma. 3.2 Na sentença recorrida e a este propósito, consignou-se:
«Reclama o Autor B…, a título de danos, as seguintes quantias:
(…)
c) €: 200,00 (duzentos euros) por cada dia de atraso no pagamento da indemnização, nos termos do disposto nos arts. 40.º, n.º 2, 39.º, n.º 2, 38.º, n.º 2, todos do Decreto-lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto.
(…)
No que se refere ao pedido aludido na alínea c), dispõe o art. 36.º, n.º 1, alínea e), do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, que “sempre que lhe seja comunicado pelo tomador do seguro, pelo segurado ou pelo terceiro lesado a ocorrência de um sinistro automóvel coberto por um contrato de seguro, a empresa de seguros deve comunicar a assunção, ou não assunção, da responsabilidade, no prazo de trinta dias úteis, a contar do termo do prazo fixado na alínea a), informando desse facto o tomador do seguro ou o segurado e o terceiro lesado, por escrito ou documento electrónico.”
Tal disposição legal é aplicável ao Gabinete Português da Carta Verde, por força do art. 32.º, n.ºs 4 e 5, do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto.
No caso “sub judice” resultou assente que o Gabinete Português da Carta Verde incumpriu o disposto na alínea e) do n.º 1 do art. 36.º, tal como expressamente confessa em sede de contestação, pelo que é devida a peticionada sanção de €: 200,00 (duzentos euros) por cada dia de atraso no cumprimento da referida obrigação, nos termos do disposto nos arts. 40.º, n.º 2, 39.º, n.º 2, 38.º, n.º 2, todos do Decreto-lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto.
Tal sanção inicia-se em 22 de Fevereiro de 2008 (trinta dias após a comunicação ao Réu da ocorrência do acidente), e termina em 04 de Maio de 2009, data de apresentação da contestação nos presentes autos, momento em que a C…, representada pelo Réu Gabinete Português da Carta Verde, declinou, de forma fundada (apresentando uma versão alternativa do acidente), assumir a responsabilidade pelo ocorrência do embate e ressarcir os danos.» 3.3 O recorrente começa por questionar a sua responsabilização por atrasos na assumpção de responsabilidades decorrentes do acidente, afirmando a este propósito que, sendo uma entidade com autonomia e obrigação de resolver qualquer sinistro ocorrido em Portugal, a sua intervenção pressupõe que o sinistro lhe tenha sido participado, o que nunca aconteceu no caso dos autos.
Em sede de contestação, o réu agora recorrente defendeu que não é aplicável o disposto no artigo 36.º, n.º 1, alínea e), do Decreto-lei n.º 291/2007, dado que um dos veículos intervenientes é de matrícula estrangeira e a respectiva seguradora, espanhola, não tem obrigação de conhecer a aludida norma, especificamente, o prazo que aí se estabelece, “motivo pelo qual a comunicação não foi dada dentro do prazo estipulado no referido Decreto-Lei”.
Perante esta afirmação, o réu admite que a comunicação feita ao autor pela empresa seguradora espanhola, em que esta declina a respectiva responsabilidade, ocorreu para além do prazo estabelecido na aludida norma. Pretende no entanto que, perante a razão que enuncia, há fundamento para excluir a sua própria responsabilidade.
O Gabinete Português de Carta Verde consubstancia o organismo de indemnização previsto na Directiva transposta pelo Decreto-lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto – Directiva 2000/26/CE, o serviço nacional de seguros a que se reportam o acordo entre os serviços nacionais de seguros dos Estados-Membros do espaço Económico Europeu e outros Estados associados, de 30 de Maio de 2002 e o Regulamento Geral do Conselho dos Serviços Nacionais de Seguros, publicados no Jornal Oficial da União Europeia, L 192, de 31 de Junho de 2003.
Cabe-lhe actuar, reciprocamente, como Gabinete Gestor, prestando a necessária assistência a segurados de empresas de seguros inscritas nos Gabinetes congéneres estrangeiros, quando da ocorrência de acidentes em Portugal, e representando os legítimos interesses daquelas seguradoras e Gabinetes e assegurar os legítimos direitos das vítimas de acidentes ocorridos em Portugal sempre que a responsabilidade deva ser atribuída a seguradoras inscritas nos Gabinetes congéneres estrangeiros colaborando e procurando obter a colaboração de todas as entidades públicas competentes de modo a facilitar o tráfego de veículos matriculados ou registados no estrangeiro abrangidos por extensão territorial válida do seguro de responsabilidade civil automóvel do país de origem, para Portugal.
Este facto não obsta à possibilidade do terceiro lesado se dirigir à empresa de seguros – ou à sua representante em território nacional – de modo a obter directamente junto da mesma a resolução do acidente, tal como este contacto também não impede que, em sede de acção judicial, esta seja dirigida ao organismo nacional, no caso, ao Gabinete Português de Carta Verde.
A intervenção do réu ocorre no âmbito de convénio que, perante a existência de seguro, não é insensível ao mesmo, legitimando o reembolso do valor despendido a título de indemnização, mas responsabilizando o Gabinete pelo concreto procedimento que possa ter tido a seguradora.
Ao demandar o réu, o autor reporta as diligências efectuadas junto da seguradora do veículo alegado causador do acidente (C…), mais especificamente, junto da sua representante em território nacional (I…).
Da matéria de facto provada resulta que o acidente dos autos foi participado a esta em 22 de Janeiro de 2008.
Perante os factos provados, não se evidencia que o acidente a que se reportam os autos tenha sido directamente comunicado ao réu. No entanto, também se comprova que tinha efectivo conhecimento do sinistro e das suas implicações, na medida em que se provou que o autor, B…, insistiu com o representante do Gabinete Português da Carta Verde, por diversas vezes, para que fosse paga a indemnização dos seus danos – conforme resulta do parágrafo 29.º dos factos provados, que constituía o quesito 34.º da base instrutória e que o réu/recorrente não questiona na respectiva motivação de recurso.
Em tais circunstâncias, não pode afirmar-se o alheamento do réu relativamente ao acidente que se discute nos autos e à sua regularização e, nessa medida, a sua responsabilização pelos atrasos que se tenham registado e as consequências daí decorrentes no que concerne à sanção civil estabelecido no artigo 40.º, n.º 2, do Decreto-lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto.
Por isso, improcede nesta parte a pretensão do recorrente. 3.4 A adequação do valor fixado pelo tribunal e dos respectivos destinatários.
O recorrente pretende, quanto ao valor fixado pelo tribunal, que a sanção civil aplicada é manifestamente excessiva face ao que resultou provado em sede de julgamento e ao peticionado pelo recorrido.
Alega para o efeito que resultou provado e aceite que o próprio autor recebeu, e percebeu, o teor da comunicação referida no artigo 14.º dos factos provados. Quer isto dizer que a referida sanção civil, a ser devida, apenas o deveria ser até 7 de Agosto de 2008, e não como o fez a sentença recorrida, até 4 de Março de 2009; quanto ao início do prazo para a aplicação das sanções civis deve-se ter em conta o disposto no artigo 8.º do citado Regulamento Geral, por força do disposto no artigo 32.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, nos termos do qual o réu dispõe de 3 meses para verificar a validade da carta verde, pelo que só após estes 3 meses é que poderia incorrer em sanções civis.
Acresce que, tal como consta do documento n.º 3 junto com a petição inicial, a I…, S.A. comunicou ao Autor em 13 de Fevereiro de 2008, os valores relativos ao veículo, bem como a informar que não assumia qualquer responsabilidade do seu segurado na produção do acidente, pelo que sempre se teria de considerar que o autor soube desde 13 de Fevereiro que a empresa de seguros não assumia qualquer responsabilidade na produção do acidente.
Por outro lado e quanto aos respectivos destinatários, alega que a sentença o condena ao pagamento ao autor da sanção civil de € 200.00 por cada dia de atraso quando na verdade, a referida quantia deve ser repartida entre o autor e o Instituto de Seguros de Portugal tal como consta no artigo 40.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto. 3.4.1 É manifesto que assiste razão ao recorrente nesta última parte. A letra da lei (referido artigo 40.º, n.º 2) é inequívoca ao afirmar que, em caso de atraso no cumprimento dos deveres fixados nas disposições identificadas no n.º 1 do artigo 38.º, quando revistam a forma constante do número anterior, para além dos juros, é devida para com o lesado e para com o Instituto de Seguros de Portugal, em partes iguais, uma quantia de € 200 por cada dia de atraso.
Assim, a quantia em causa é repartida entre o lesado e o Instituto de Seguros de Portugal, pelo que se impõe a correcção da sentença recorrida nessa parte, caso não procedam os restantes fundamentos de oposição suscitados pelo recorrente. 3.4.2 Já não assiste razão ao recorrente quando pretende que o autor sabe, desde 13 de Fevereiro de 2008, que a empresa de seguros não assumia qualquer responsabilidade na produção do acidente, reportando-se para o efeito ao documento n.º 3 apresentado com a petição inicial.
No elenco dos factos provados, nada consta que permita concluir nesse sentido.
O documento a que se reporta o recorrente, a fls. 23 do processo instaurado pelo autor, foi ponderado pelo tribunal recorrido na resposta à matéria de facto, especificamente em relação aos quesitos 34.º a 36.º, conforme teor de fls. 129.
Dele não se extrai a leitura pretendida pelo recorrente; como este afirma, a I…, S.A. informou o autor, no aludido documento, dos valores relativos ao veículo (valor de venda no mercado, valor de venda com base em tabelas de desvalorização e valor dos salvados); como resulta do próprio documento, é só este o objectivo visado pela seguradora, pelo que esta, à cautela, afirma que comunica os valores “a título meramente informativo e sem que tal pressuponha a assunção de qualquer responsabilidade por parte desta Seguradora”.
Os termos desta afirmação não expressam qualquer posição final e fundamentada quanto à posição da seguradora em relação ao acidente. Assim, não tem razão o réu quando pretende que o autor, em 13 de Fevereiro de 2008, soube que a empresa de seguros não assumia qualquer responsabilidade na produção do acidente. 3.4.3 Na sentença recorrida fixou-se o período de atraso entre 22 de Fevereiro de 2008 (data em que se completaram trinta dias sobre a comunicação da ocorrência do acidente à seguradora) e 4 de Maio de 2009 (data em que o réu apresentou a contestação na presente acção e que afirma corresponder ao momento em que a seguradora, representada pelo réu, declinou, de forma fundada, apresentando uma versão alternativa do acidente, assumir a responsabilidade pelo ocorrência do embate e ressarcir os danos).
Importa começar por salientar que, relativamente à data final, em que a seguradora tomou posição sobre o acidente e a comunicou, declinando qualquer responsabilidade, o próprio autor – na petição inicial – a reporta a 7 de Agosto de 2008, quando remeteu ao mediador da Companhia de Seguros D…, S.A., a seguradora do autor, o fax que faz fls. 25, referindo que “em resposta ao fax datado de 23 de Maio de 2008, informamos que a nossa representada declina toda e qualquer responsabilidade no presente sinistro, com base no incumprimento do v/cliente ao artigo 38.º do CE”. O autor reporta a esta e não a qualquer outra data o conhecimento da posição assumida pela seguradora.
Em tais circunstâncias, necessariamente se condiciona à data indicada pelo próprio autor (7 de Agosto de 2008) o momento até ao qual se impõe a sanção em causa. 3.4.4 Quanto à data inicial, o recorrente pretende que dispõe de 3 meses para verificar a validade da carta verde, pelo que só após estes 3 meses é que poderia incorrer em sanções civis; invoca para o efeito o disposto nos artigos 32.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto e 8.º do Regulamento Geral do Conselho dos Serviços Nacionais de Seguros.
Nos termos do primeiro dos referidos normativos, os procedimentos aí estabelecidos quanto à regularização dos sinistros aplicam-se, com as devidas adaptações aos sinistros cuja regularização deva ser efectuada pelo Fundo de Garantia Automóvel, ou pelo Gabinete Português da Carta Verde, na qualidade prevista no artigo 90.º, e neste caso sem prejuízo das obrigações internacionais decorrentes da subscrição do Acordo entre os serviços nacionais de seguros. O artigo 8.º do Regulamento Geral estabelece que todos os pedidos de confirmação da validade de uma carta verde identificada, enviados por telecópia ou correio electrónico a um serviço nacional pelo serviço nacional do país do acidente, ou por qualquer mandatário por ele designado para esse efeito, devem receber uma resposta definitiva no prazo de três meses; caso não seja dada uma resposta decorrido esse período, presume-se que a carta verde é válida.
Pretende o recorrente prevalecer-se deste prazo de três meses. No entanto, compulsados os autos, não se vê que tenha sido formulado qualquer pedido de confirmação da validade de carta verde. Em tais circunstâncias, não relevam as aludidas normas nem beneficia a recorrente.
Regista-se no entanto que a data inicial considerada pela sentença recorrida não se mostra conforme ao que resulta do disposto nas normas aí citadas – artigos 36.º, 38.º e 40.º do Decreto-lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto.
Nos termos do artigo 36.º, n.º 1, alínea e), sempre que lhe seja comunicada pelo tomador do seguro, pelo segurado ou pelo terceiro lesado a ocorrência de um sinistro automóvel coberto por um contrato de seguro, a empresa de seguros deve comunicar a assunção, ou a não assunção, da responsabilidade no prazo de 30 dias úteis, a contar do termo do prazo fixado na alínea a), informando desse facto o tomador do seguro ou o segurado e o terceiro lesado, por escrito ou por documento electrónico; o prazo referido na alínea a) é de dois dias úteis.
Tendo presente que o acidente foi participado à seguradora no dia 22 de Janeiro de 2008 (parágrafo 13.º dos factos provados) e contados os dois dias úteis da alínea a) e os trinta dias úteis da alínea e), ambas do artigo 36.º do Decreto-lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, logo avulta que o atraso se iniciou em 7 de Março de 2008 e não em 22 de Fevereiro.
Assim, caso não proceda o último dos diferentes fundamentos invocados pelo recorrente e que ainda não foi apreciado, a sanção a considerar inicia-se em 7 de Março de 2008 e termina em 7 de Agosto de 2008. 3.5 O alegado desrespeito da Directiva 2000/26/CE, pelo Decreto-lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto.
A este propósito, o recorrente pretende que a sanção prevista no artigo 40.º, n.º 2, do Decreto-lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, antes citado, contraria o disposto no artigo 4.º, n.º 6, da Directiva 2000/26/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de Maio de 2000.
Esta Directiva, a quarta directiva sobre o seguro automóvel, visou a aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes ao seguro de responsabilidade civil relativo à circulação de veículos automóveis, alterando as Directivas 73/239/CEE e 88/357/CEE do Conselho.
O seu objectivo foi o estabelecimento de disposições específicas aplicáveis às pessoas lesadas com direito a indemnização por qualquer perda ou dano sofridos em resultado de sinistros ocorridos num Estado-Membro que não o seu Estado-Membro de residência, causados pela circulação de veículos habitualmente estacionados e segurados num Estado-Membro.
As directivas europeias fixam os objectivos a atingir pelos Estados-Membros, delegando nestes a escolha dos meios para o fazer. Para que os princípios estabelecidos nas directivas produzam efeitos ao nível do cidadão, o legislador nacional tem de adoptar um acto de transposição para o direito nacional dos objectivos definidos na directiva – o que, relativamente à Directiva antes mencionada, se traduziu no Decreto-lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto.
O artigo 4.º, n.º 6, da Directiva 2000/26/CE estabelece que os Estados-Membros devem prever obrigações avalizadas por sanções, pecuniárias ou administrativas equivalentes, adequadas, eficazes e sistemáticas, por forma a garantir que, num prazo de três meses a contar da data em que a pessoa lesada tenha apresentado o seu pedido de indemnização directamente à empresa de seguros da pessoa que causou o sinistro ou ao seu representante para sinistros, a empresa de seguros da pessoa que causou o sinistro ou o seu representante para sinistros apresentem uma proposta de indemnização fundamentada, no caso de a responsabilidade não ser contestada e o dano sofrido estar quantificado [alínea a)]; ou a empresa de seguros a quem tiver sido dirigido o pedido de indemnização ou o seu representante para sinistros dêem uma resposta fundamentada quanto aos pontos invocados no pedido, no caso de a responsabilidade ter sido rejeitada ou não ter sido claramente determinada ou os danos sofridos não estarem totalmente quantificados [alínea b)]. Os Estados-Membros devem adoptar as disposições necessárias para garantir que quando a proposta não tenha sido apresentada dentro do prazo de três meses, serão devidos juros sobre o montante da compensação proposta pela empresa de seguros ou concedida pelo tribunal à pessoa lesada.
No âmbito da legislação nacional, o artigo 36.º, n.º 1, do Decreto-lei n.º 291/2007, estabelece que, sempre que lhe seja comunicada pelo tomador do seguro, pelo segurado ou pelo terceiro lesado a ocorrência de um sinistro automóvel coberto por um contrato de seguro, a empresa de seguros deve proceder ao primeiro contacto com o tomador do seguro, com o segurado ou com o terceiro lesado no prazo de dois dias úteis, marcando as peritagens que devam ter lugar [alínea a)], concluir as peritagens no prazo dos oito dias úteis seguintes ao fim do prazo mencionado na alínea anterior [alínea b)], em caso de necessidade de desmontagem, o tomador do seguro e o segurado ou o terceiro lesado devem ser notificados da data da conclusão das peritagens, as quais devem ser concluídas no prazo máximo dos 12 dias úteis seguintes ao fim do prazo mencionado na alínea a) [alínea c)], disponibilizar os relatórios das peritagens no prazo dos quatro dias úteis após a conclusão destas, bem como dos relatórios de averiguação indispensáveis à sua compreensão [alínea d)], comunicar a assunção, ou a não assunção, da responsabilidade no prazo de 30 dias úteis, a contar do termo do prazo fixado na alínea a), informando desse facto o tomador do seguro ou o segurado e o terceiro lesado, por escrito ou por documento electrónico [alínea e)].
Estes prazos duplicam aquando da ocorrência de factores climatéricos excepcionais ou da ocorrência de um número de acidentes excepcionalmente elevado em simultâneo – artigo 36.º, n.º 6.
Em caso de atraso no cumprimento dos deveres fixados nas disposições identificadas nos n.ºs 1 do artigo 38.º e artigo 39.º, quando revistam a forma constante do número anterior, para além dos juros devidos a partir do 1.º dia de atraso sobre o montante previsto no n.º 2 do artigo anterior, esta constitui-se devedora para com o lesado e para com o Instituto de Seguros de Portugal, em partes iguais, de uma quantia de € 200 por cada dia de atraso.
Importa começar por salientar que, diversamente do que sucede na norma comunitária, a norma nacional se reporta a dias úteis, pelo que os trinta dias ultrapassam o mês numa média de oito a dez dias.
De qualquer modo, a Directiva, ao estabelecer que os Estados-Membros devem prever obrigações avalizadas por sanções, pecuniárias ou administrativas equivalentes, adequadas, eficazes e sistemáticas, por forma a garantir que, num prazo de três meses a contar da data em que a pessoa lesada tenha apresentado o seu pedido de indemnização, não estatui um prazo com natureza peremptória, visando antes assegurar uma resposta pronta às pessoas lesadas com direito a indemnização por qualquer perda ou dano sofridos em resultado de acidentes de viação ocorridos num Estado-Membro e envolvendo veículos de diferentes Estados-Membros.
A norma em questão dá resposta a esta exigência, sem que o faça de forma que se possa qualificar como excessivamente gravosa para as seguradoras.
Assim, também aqui improcede a pretensão do recorrente. 4. Conforme antes se deixou enunciado, perante os factos provados, subsiste a sentença recorrida na parte em que condenou o réu recorrente, Gabinete Português da Carta Verde, a pagar ao autor B… a quantia de €: 2.240,00 (dois mil duzentos e quarenta euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, calculados sobre a acudida quantia, a contar desde a data de citação e até integral pagamento
Pelas razões que antecedem, revogando-se a sentença recorrida na parte em que condenou o réu, Gabinete Português da Carta Verde, a pagar ao autor, B…, a quantia de € 200,00 por dia, desde 22 de Fevereiro de 2008 até 04 de Maio de 2009, impõe-se a condenação do réu, Gabinete Português da Carta Verde, a pagar ao autor, B…, e ao Instituto de Seguros de Portugal, em partes iguais, a quantia de € 200,00 (duzentos euros) por dia, desde 7 de Março de 2008 até 7 de Agosto de 2008.
A decisão assim proferida dá total procedência à pretensão do autor, pelo que é encargo do réu o pagamento das custas da acção.
Em sede de recurso, obtendo o réu/recorrente parcial provimento e perante os termos da impugnação do autor/recorrido, devem as custas ser repartidas por ambas as partes. III) Decisão:
Pelas razões expostas e dando parcial provimento ao recurso:
a) Revoga-se a sentença recorrida na parte em que condenou o réu, Gabinete Português da Carta Verde, a pagar ao autor, B…, a quantia de € 200,00 por dia, desde 22 de Fevereiro de 2008 até 04 de Maio de 2009.
b) Condena-se o réu, Gabinete Português da Carta Verde, a pagar ao autor, B…, e ao Instituto de Seguros de Portugal, em partes iguais, a quantia de € 200,00 (duzentos euros) por dia, desde 7 de Março de 2008 até 7 de Agosto de 2008.
c) Custas da acção a cargo do réu; custas do recurso a cargo do recorrente e do recorrido, em partes iguais.
*
Porto, 13 de Janeiro de 2014.
Correia Pinto
Ana Paula Amorim
Ana Paula Carvalho