SUSPENSÃO DO DESPEDIMENTO
PROCEDIMENTO CAUTELAR
IMPUGNAÇÃO JUDICIAL DA REGULARIDADE E LICITUDE DO DESPEDIMENTO
Sumário

I - Do art. 34º, nº 4, do CPT resulta que o requerente de procedimento cautelar de suspensão de despedimento deve, desde logo no requerimento inicial desse procedimento, requerer também a impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento (caso não tenha ainda sido apresentado o formulário referido no art. 98º-C), sob pena de extinção do procedimento cautelar.
II - A fundamentação da suspensão do despedimento, que passa necessariamente pela alegação da sua ilicitude, não pode ser tida como substitutiva da exigência legal prevista no citado art. 34º, nº 4.
III - Tendo o Requerente omitido a declaração a que se reporta o art. 34º, nº 4 e não havendo essa omissão sido colmatada, conforme prescreve o art. 27º, al. b), do CPT, até à audiência final, impõe-se concluir no sentido da extinção do procedimento cautelar.

Texto Integral

Procº nº 1004/13.9TTBCL.P1
Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 728)
Adjuntos: Des. Rui Penha
Des. Maria José Costa Pinto

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

I. Relatório:

B…, aos 12.09.2013, intentou o presente procedimento cautelar de suspensão de despedimento individual contra C…, tendo formulado o seguinte pedido: “Termos em que se requer a V. exa. se digne designar dia para a audição das partes, de acordo com o preceituado no artigo 36º do Código Processo Trabalho, seguindo-se os ulteriores termos, vindo a final a decretar-se a suspensão do despedimento, atendendo ao facto se de verificar inexistência de justa causa e nulidade do processo disciplinar.”.
Para tanto, alega em síntese que: aos 20.07.2013, foi-lhe comunicado ter-lhe sido instaurado procedimento disciplinar, com o envio de nota de culpa, na sequência do qual veio a ser despedida com invocação de justa causa aos 09.09.2013; na decisão de despedimento foram-lhe imputados factos não constantes da nota de culpa, pelo que foi preterido o seu direito de defesa; os factos por si praticados não constituem justa causa para o despedimento.

Foi ordenada a citação da Requerida para “contestar” e juntar o procedimento disciplinar e designada data para audiência final.

A Requerida juntou o procedimento disciplinar e deduziu oposição, alegando em síntese que: nos termos do art. 34º, nº4, do CPT, a impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento deve ser requerida no requerimento inicial caso não tenha ainda sido apresentado o formulário referido no art. 98º-C, sob pena de extinção do procedimento cautelar, resultando do nº 2 deste art. 98º-C que o requerimento inicial do procedimento cautelar do qual conste que o trabalhador requer aquela impugnação constitui meio idóneo ao início deste processo, tornando desnecessária a apresentação de tal formulário; no caso, a Requerente não requereu a impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, pelo que deverá ser declarado extinto o procedimento cautelar nos termos do citado art. 34º, nº 4, conjugado com os arts. 98º-C e 98-D, todos do CPT; sem prescindir, pugna pela validade do procedimento disciplinar e pela não verificação de probabilidade séria de inexistência de justa causa, atento o número de faltas injustificadas dadas pela Requerente.

Realizou-se a audiência final, com prévia tentativa de conciliação das partes, que se frustrou, após o que, aos 09.12.2013, foi proferida decisão julgando procedente o procedimento cautelar e determinando “a imediata suspensão do despedimento da requerente, pelo requerido, ocorrido em 09.09.2013, condenado o requerido C… a readmitir a requerente ao seu serviço.”.

Inconformada com o assim decidido, veio a Requerida recorrer, formulando, a final das suas alegações, as seguintes conclusões:
“1- O Tribunal considerou julgar procedente a providência cautelar de suspensão do despedimento, instaurada pelo Requerente, aqui apelada, a 12 de Setembro de 2013, entendendo indiciariamente que o despedimento foi ilícito, face à séria probabilidade de inexistência de justa causa para o mesmo, ao abrigo do disposto no art. 39º, nº 1, al. b) do CT.
2- Do pedido do requerimento inicial de suspensão do despedimento consta a procedência da mesma, atendendo ao facto de se verificar inexistência de justa causa e nulidade do processo disciplinar.
3 - Não se verificando quaisquer das circunstâncias que legitimam a suspensão do despedimento prevista no nº 1 do art. 39º do CPT, o Apelante impugnou em sede de oposição, o pedido realizado pela Requerente, pugnando pela regularidade e validade do procedimento disciplinar e pela licitude do despedimento, pela não verificação de probabilidade séria e inexistência de justa causa de despedimento.
4- Do requerimento inicial de suspensão não consta, de forma expressa e/ou implícita, o requerimento da impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, bem como não foi apresentado o formulário referido no art. 98º-C do CPT.
5- Pelo que, em sede de oposição, o Apelante arguiu a extinção do procedimento cautelar por consequência do previsto no nº 4 do art. 34º, conjugado com os arts. 98º-C e 98º-D do CPT, tendo o Tribunal a quo se pronunciado em sentença no sentido da improcedência da nulidade suscitada.
6- Fez aquele tribunal uma errónea interpretação/dedução do requerimento de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, dando-o como implicitamente vertido no articulado de requerimento de suspensão, não tendo dado cumprimento ao preceituado no nº 4 do art. 34º e do nº 1 do art. 98º-C do CPT, e não tendo, consequentemente, declarado a extinção do procedimento cautelar.
7- Em momento algum ao longo do articulado inicial se pode sequer depreender a intenção ou motivação da Apelada em impugnar judicialmente o despedimento.
8- O nº 4 do art. 34º CPT dispõe que “a impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento deve ser requerida no requerimento inicial, caso não tenha sido apresentado o formulário referido no art. 98º-C, sob pena de extinção do procedimento cautelar.”
9-Naturalmente que, para requerer a suspensão do despedimento, ainda que provisória, a Apelada teria que suscitar a regularidade e licitude daquele despedimento, não bastando, no entanto, esta invocação para que se considere preenchido o disposto no nº 4 do art. 34º do CPT.
10- A lei é clara em exigir que haja requerimento expresso, não sendo concebível requerer a suspensão do despedimento sem impugnar a sua regularidade e/ou licitude.
11- Atendendo à ratio legis do art. 34º, nº 4 e 98º-C, nº 2 do CPT, é clara a pretensão do legislador: em termos de economia processual (evitando assim a duplicação de procedimentos no que concerne à apresentação do formulário); o procedimento cautelar caduca se a acção de impugnação do despedimento não for proposta, - como aliás decorre do previsto na al. b) do art. 40º-A do CPT; e nos caos em que é aplicável o processo especial de impugnação de regularidade e licitude do despedimento, pretende-se que a acção principal não seja proposta depois do procedimento cautelar.
12- O procedimento cautelar de suspensão do despedimento é de natureza antecipatória, tratando-se de uma providência instrumental à acção de impugnação de despedimento individual.
13-Até à data da interposição do presente recurso, o Apelante não foi citado de qualquer acção judicial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, verificando-se assim a inutilidade superveniente da lide que, nos termos da alínea e) do art. 277º do CPC, extingue a instância.
14-Não pode, em nossa opinião, ser julgada procedente a presente providência cautelar se o direito que a Apelada pretende acautelar, e que lhe está associado, caducou, nos termos do nº 2 do art. 387º do CPT e do nº 2 do art. 298º do CC.
Termos em que (…), deve ser dado provimento ao presente recurso interposto, devendo a decisão da 1ª instância ser revogada e, consequentemente, ser o procedimento cautelar de suspensão do despedimento julgado improcedente, com as legais consequências.”

A Requerida, litigando com o benefício de apoio judiciário, na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo, contra-alegou, pugnando pelo não provimento do recurso e formulando, a final, as seguintes conclusões [1]:
“(…)

A recorrida intentou a presente providência cautelar contra a recorrente, pedindo a suspensão do despedimento de que foi alvo em 06.07.2013, alegando em síntese, ter exercido funções ao serviço e sob as ordens, direcção e fiscalização da recorrente como ajudante de acção educativa de 2ª e que, no seguimento do processo disciplinar movido, esta a despediu ilegalmente, sem justa causa, por considerar a violação do dever de assiduidade em que incorreu, não foi intencional, o que afasta, igualmente, a ocorrência de comportamento culposo.

O Tribunal “a quo” deu como provado que a recorrida comunicou todas as faltas dadas, à excepção das descontadas no recibo de vencimento do mês de Fevereiro de 2013.
10º
A recorrente requereu a extinção do presente procedimento cautelar, com fundamento no disposto no art. 34º, nº 4, do CPT, invocando que a recorrida não procedeu à impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento no requerimento inicial, como lhe competia, atento o facto de não ter apresentado o formulário a que se refere o disposto no art. 98º-C do CPT.
11º
Prevê o art. 34, nº 4, do CPT que “a impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento deve ser requerida no requerimento inicial, caso não tenha sido apresentado o formulário referido no art. 98º-C, sob pena de extinção do procedimento cautelar.”
12º
É verdade que não resulta, de forma expressa, do pedido formulado pela requerente, a fls. 22, a impugnação a que acima aludimos; todavia, não é menos verdade que os factos integradores da impugnação da regularidade e licitude do despedimento de que foi alvo, se encontram ao longo de todo o articulado, pugnando, a requerente, pela declaração de nulidade do procedimento disciplinar, pela preterição dos seus formalismos legais, in casu, mediante a disparidade de factos consagrados na decisão e os que foram consagrados na nota de culpa e, paralelamente, invocando a inexistência de justa causa em relação aos fundamentos de que se serviu a entidade empregadora, para justificar o despedimento.
Vale isto por dizer que, a impugnação que lhe era exigível, se mostra vertida no requerimento inicial, apenas não constando, de forma expressa, do pedido formulado a final.
13º
Pelo que não procede a nulidade suscitada.
14º
A recorrente também alega que, a providência cautelar caducou nos termos do disposto no art. 387º nº 2 do CPT e nº 2 do artigo 298º do C.C.
15º
Ora, salvo o devido respeito não tem qualquer fundamento jurídico tal alegação, pois para além de existir o artigo 387º nº 2 do código de Processo de Trabalho, mesmo que se considere que trata-se de mero lapso e pretendia a recorrente dizer Código de Processo Civil, esta norma também nada tem haver [sic] com a caducidade das providências cautelares, mas no presente caso, nunca teria caducado o procedimento cautelar, pois, termos do artigo 371º do CPC “sem prejuízo das regras sobre distribuição do ónus da provas [sic], logo que transite em julgado a decisão que haja decretada [sic] a providência cautelar e invertido o contencioso, é o requerido notificado, com a advertência de que, querendo, deve intentar a acção destinada a impugnar a existência do direito acautelado nos 30 dias subsequentes à notificação, sob pena de a providência decretada se consolidar como composição definitiva do litígio.”.
16º
E, nos termos do artigo 373º nº 1 alínea a) do CPC a providência caduca se o requerente não propuser a ação da qual a providência depende dentro de 30 dias contados da data em que lhe tiver sido notificado do trânsito em julgado da decisão que a haja ordenado, ora, no presente caso, a decisão proferida pelo Tribunal a quo ainda não transitou em julgado.
17º
Pelo que não procede a caducidade invocada.
18º
Portanto, face à factualidade dada como provada, não restam dúvidas que o desfecho da questão não podia ser outro que o proferido pelo Tribunal “a quo”, pois não restam dúvidas que a recorrida apenas não justificou as faltas dadas no mês de Fevereiro de 2013, na medida em que, em relação aos demais meses, nos seus recibos de vencimento, as faltas vêm apenas consideradas como não remuneradas, o que significa que foi apresentada a respectiva justificação, assim sendo, as faltas imputadas à Autora não são passíveis de integrar infracção disciplinar, tal como não é fundamento bastante para constituir factos integradores de justa causa de despedimento.
19º
Assim, não passa o alegado pela recorrente, na sua minuta, dum amontado de alusões jurídicas sem qualquer alcance válido os factos dados como provados. Por isso, só a manutenção do decidido será o despacho admissível.
Nestes Termos,
Deve ser negado provimento ao presente recurso de apelação interposto pela requerida, por falta de fundamento jurídico, conforme acima expedido[sic], proferindo douto acórdão que mantenha e confirme a douta sentença nos precisos termos em que foi proferida, com as restantes consequências legais, por tal ser o que corresponde à justiça.

A Exmª Srª Procuradora Geral Adjunta emitiu douto parecer no sentido do não provimento do recurso, sobre o qual, notificadas as partes, apenas a requerente se pronunciou com ele concordando.

Foram colhidos os vistos legais.

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II. Matéria de Facto Assente:

Não tendo sido impugnada a decisão da matéria de facto proferida pela 1ª instância, e não havendo qualquer alteração a introduzir-lhe[2], nos termos e ao abrigo do disposto no art. 663º, nº 6, do CPC aprovado pela Lei 41/213, para ela se remete.
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III. Do Direito

1. Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões, são as seguintes as questões suscitadas pela Recorrente:
- se o procedimento cautelar deveria ter sido declarada extinto.
- da caducidade do procedimento cautelar e do direito que com ele se pretende acautelar e da extinção da instância por inutilidade superveniente da lide.

2. Se o procedimento cautelar deveria ter sido declarada extinto

Na oposição que deduziu ao presente procedimento cautelar de suspensão de despedimento alegou então a Requerida, ora Recorrente, que o mesmo deveria ser, nos termos do disposto no art. 34º, nº 4, conjugado com os arts. 98º-C e 98º-D, do CPT, declarado extinto uma vez que a Requerente, ora Recorrida, no requerimento inicial não requereu, expressa ou implicitamente, a impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento.
A decisão recorrida julgou improcedente tal questão, referindo para tanto o seguinte:
“A requerida requereu a extinção do presente procedimento cautelar, com fundamento no disposto no art. 34º, n.º 4, do CPT, invocando que a requerente não procedeu à impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento no requerimento inicial, como lhe competia, atento o facto de não ter apresentado o formulário a que se refere o disposto no art. 98º-C, do CPT.
Prevê o art. 34º, n.º 4, do CPT que “A impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento deve ser requerida no requerimento inicial (do procedimento cautelar de suspensão de despedimento), caso não tenha ainda sido apresentado o formulário referido no artigo 98º-C, sob pena de extinção do procedimento cautelar”.
É verdade que não resulta, de forma expressa, do pedido formulado pela requerente, a fls. 22, a impugnação a que acima aludimos; todavia, não é menos verdade que os factos integradores da impugnação da regularidade e licitude do despedimento de que foi alvo, se encontram ao longo de todo o articulado, pugnando, a requerente, pela declaração de nulidade do procedimento disciplinar, pela preterição dos seus formalismos legais, in casu, mediante a disparidade de factos consagrados na decisão e os que foram consagrados na nota de culpa e, paralelamente, invocando a inexistência de justa causa em relação aos fundamentos de que se serviu a entidade empregadora, para justificar o despedimento.
Vale isto por dizer que, a impugnação que lhe era exigível, se mostra vertida no requerimento inicial, apenas não constando, de forma expressa, do pedido formulado a final.
Pelo que não procede a nulidade suscitada.”.
A Recorrente discorda do assim decidido com fundamento, no essencial, na argumentação então aduzida em sede de oposição.
A Recorrida concorda com o decidido com fundamento no constante da decisão recorrida (o que consta das conclusões 11, 12 e 13 mais não é do que o que consta dessa decisão).

2.1. Ao caso é aplicável o Código de Processo do Trabalho na versão aprovada pelo DL 295/2009, de 13 10, ao qual nos reportaremos de ora em diante.
O DL 295/2009, dando resposta processual às significativas alterações introduzidas em matéria de despedimento pela Reforma do Código do Trabalho operada pela Lei 7/2009, de 12.02, alterou também o CPT, introduzindo, para os casos de despedimento individual em que a decisão seja comunicada por escrito ao trabalhador, uma nova forma de processo especial, qual seja a “Acção de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento” prevista nos arts. 98º-B a 98º-P, acção essa que, de harmonia com o nº 1 desse art. 98º-B, se inicia com a entrega, pelo trabalhador, junto do tribunal competente, de requerimento, em formulário que veio a ser aprovado pela Portaria 1460-C/2009, de 31.12., do qual consta a declaração do trabalhador de oposição ao despedimento.
Porém, dispõe o nº 2 desse art. 98º-B que:
“2 – Caso tenha sido apresentada providência cautelar de suspensão preventiva do despedimento, nos termos previstos nos artigos 34º e seguintes, o requerimento inicial do procedimento cautelar do qual conste que o trabalhador requer a impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento dispensa a apresentação do formulário referido no número anterior.”.
E, por sua vez, de harmonia com o nº 4 do citado art. 34º, que rege em matéria de procedimento cautelar de suspensão de despedimento, “4- A impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento deve ser requerida no requerimento inicial, caso não tenha ainda sido apresentado o formulário referido no artigo 98º-C, sob pena de extinção do procedimento cautelar.”.
À boa compreensão e interpretação deste preceito assume relevância, também, o disposto no art. 98º-F, nºs 1 e 3, nos termos do qual “1. Recebido o requerimento, o juiz designa data para audiência de partes, a realizar no prazo de 15 dias” e “3. Tendo sido requerida a suspensão de despedimento, a audiência de partes referida no nº 1 antecede a audiência final do procedimento cautelar.”. E é, ainda, de salientar, que a acção de impugnação da regularidade e licitude do despedimento foi erigida à categoria de processo de natureza urgente, como decorre do nº 1, al. a) do art. 26º do CPT.
Do art. 34º, nº 4, resulta, sem margem para dúvidas, que o requerente de procedimento cautelar de suspensão de despedimento deve, desde logo no requerimento inicial desse procedimento, requerer a impugnação judicial do despedimento, formalidade essa cuja razão de ser radica no manifesto propósito do legislador de, com esse requerimento do trabalhador (de que pretende impugnar judicialmente a regularidade e licitude do despedimento) e tendo em conta o principio do dispositivo[3], dar desde logo início à respectiva acção principal. Tal é, também, o que decorre do citado art. 98º-F, nº 3, nos termos do qual, tendo sido intentado procedimento cautelar de suspensão de despedimento, a audiência final deste não poderá ter lugar antes da audiência de partes na acção principal.
Ou seja, pretendeu-se, em caso de procedimento cautelar e sob pena de extinção deste, uma propositura simultânea da ação principal (de impugnação da regularidade e licitude do despedimento) e, bem assim, uma conjugação das diligências previstas nos arts. 36º e 98º-F, nº 3, do CPT; e, daí, o dever de, no requerimento inicial da suspensão do despedimento, constar, também e desde logo nesse momento, o requerimento do trabalhador a solicitar a impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, com o que se dará início não apenas ao procedimento cautelar, como também à própria acção principal. Propósito esse que está, igualmente, em consonância com a natureza urgente da acção de impugnação judicial, partindo o legislador, certamente e também, do pressuposto de que, requerida a suspensão do despedimento, já o trabalhador terá ponderado e decidido impugnar o despedimento, não se justificando que, nesse caso, a acção principal apenas viesse a ser proposta posteriormente. E, daí que, requerendo o trabalhador a suspensão do despedimento, a omissão do pedido de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, com o qual é desencadeada a ação principal, determine a extinção do procedimento cautelar.
Por outro lado, o requerimento a que se reporta o art. 34º, nº 4, do CPT e que substitui o formulário a que se reportam os arts. 387º do CT/2009 e 98º-C, nº 1, do CPT, não se pode, a nosso ver, confundir, nem consubstanciar, apenas, no pedido de suspensão do despedimento e/ou ser substituído pela fundamentação aduzida pelo Requerente no sentido da ilicitude do despedimento (seja por invalidade do procedimento disciplinar, seja por inexistência de justa causa, seja por ambas).
O requerente do procedimento cautelar de suspensão de despedimento tem naturalmente que invocar a causa de pedir e, por consequência e nos termos das regras do ónus de alegação, tem que fundamentar essa sua pretensão, pelo que, para que se possa apreciar da pretensão de suspensão do despedimento, tem necessariamente que por em causa o despedimento, aduzindo as razões que, a seu ver, determinam a sua ilicitude e, consequentemente, impugnando a sua bondade.
Ora, se, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 34º, nº 4, tanto bastasse, então mal se compreenderia a exigência prevista neste preceito. Bastaria ao legislador dizer que a apresentação do requerimento inicial da suspensão do despedimento valeria, também, como impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento e /ou que a sua apresentação dispensaria qualquer outra forma de desencadear essa ação especial. Ora, não é isso que diz o art. 34º, nº 4, que exige expressamente que seja requerida a impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento.
Como se diz no Acórdão da Relação de Lisboa, de 28.09.2011, in www.dgsi.pt, Processo 1718/11.8TTLSB.L1-4, “É inequívoco que a lei exige que, em caso de requerimento de suspensão de despedimento, seja (se porventura o não foi antes), requerido também expressa e simultaneamente a impugnação da regularidade e da licitude do despedimento, sendo, nesse caso, dispensada a apresentação do formulário. Trata-se, pois, de um requisito formal específico que não pode deixar de ser satisfeito. E, no caso, é evidente que não o foi, dado tal requerimento não ter sido formulado.
É bem verdade que o recorrente alegou em vários passos do seu requerimento que considera o despedimento irregular e ilícito, como tem de o fazer quem quer que requeira a suspensão do respectivo despedimento, já que lhe cabe invocar como fundamento de tal pretensão os motivos que a justifiquem e que configurem probabilidade séria de ilicitude, pelo que, ainda que não requeira expressamente a impugnação da regularidade e licitude do despedimento, sempre terá de invocar essa irregularidade ou ilicitude. Mas, salvo o devido respeito, essa invocação não basta para que se considere preenchido o disposto no art. 34º nº 4, uma vez que a lei é clara em exigir que haja requerimento expresso.”.

2.2. Assim sendo, no caso, não podemos concordar com a decisão recorrida.
Com efeito, e pese embora o Requerente, ora recorrido, haja alegado que alguns dos factos constantes da decisão do despedimento extravasavam a nota de culpa, com o que teria sido preterido o seu direito de defesa e que, pelas razões que invocou, que não existia também justa causa para o despedimento, a verdade é que não requereu no procedimento cautelar de suspensão do despedimento, seja no requerimento inicial, seja posteriormente, a impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, sendo que, aliás e ao longo do seu articulado, em passo algum faz referência a essa terminologia e/ou à sua pretensão de, com o requerimento inicial de suspensão do despedimento, querer e/ou considerar que está também e desde logo a dar início à ação principal de impugnação da regularidade e licitude do despedimento.
E, como se disse, a fundamentação da pretendida suspensão do despedimento não pode ser tida como substitutiva da exigência legal prevista no citado art. 34º, nº 4.
Por outro lado, e diga-se, se o tribunal a quo entendeu, como decorre do que diz na decisão recorrida, que tal exigência estaria satisfeita, então teria também que ter procedido à audiência de partes a que se reporta o art. 98º-F, nº 3, e à subsequente tramitação da ação especial da regularidade e licitude do despedimento, o que não consta que tenha ocorrido (nem dos autos consta diligência de audiência de partes ou convocatória para esse efeito, nem que o requerimento inicial de suspensão de despedimento tenha dado, concomitantemente, origem a ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, nem a decisão recorrida o refere, nem tão pouco a Recorrida o alega[4]).

2.3. Por outro lado, perante a omissão da declaração a que se reporta o art. 34º, nº 4, diga-se também que o tribunal a quo não proferiu despacho formulando à Requerente, até à audiência final, convite ao aperfeiçoamento como poderia e deveria ter feito nos termos do art. 27º, al. b), do CPT.
Sobre esta questão pronuncia-se António Santos Abrantes Geraldes, in Suspensão de Despedimento e Outros Procedimentos Cautelares no Processo do Trabalho, Novo Regime – Decreto-Lei nº 295/2009, de 13 de Outubro, Almedina, págs. 39, em termos que merecem a nossa concordância e se acolhem, aí se escrevendo que: “(…) Considerando que, nos termos do art. 34º, nº 4, 1ª parte, do CPT, a formulação do pedido de impugnação constitui um requisito formal e específico do procedimento cautelar que seja instrumental em relação à acção com processo especial dos arts. 98º-B e segs., a melhor resposta à questão enunciada passa por considerar que a omissão de tal pedido complementar traduz um articulado irregular, devendo ser submetido a um despacho de aperfeiçoamento, nos termos do art. 54º, nº 1, do CPT. O efeito extintivo do procedimento deverá ser reservado para os casos em que o requerente não acolha o convite que lhe seja dirigido.”.
E, também neste sentido, o Acórdão da Relação de Lisboa acima citado.
Por outro lado, admite-se também que o convite ao aperfeiçoamento, não tendo tido lugar nos termos do citado art. 54º, nº 1, sempre poderia/deveria, nos termos do art. 27º, al. b), do CPT, ter tido lugar até ao início da audiência final, como decorre do disposto no art. 27º, al. b), do CPT, preceito este que consagra um poder/dever e não e não um mero poder discricionário.
Realça-se, todavia, que essa possibilidade apenas poderia ter tido lugar até à audiência de julgamento, pelo que, tendo esta já ocorrido, não é o mesmo possível.
Acresce que a omissão de tal diligência – convite ao aperfeiçoamento - consubstancia nulidade processual por omissão de ato processual que deveria ter sido praticado (art. 195º do CPC), a qual não é, todavia, de conhecimento oficioso, para além de que se encontra sanada, não havendo sido arguida pela Recorrida (e, muito menos, o foi no prazo previsto no art. 199º do CPC).

2.4. Deste modo, impõe-se concluir, nesta parte, no sentido do provimento do recurso, com a revogação da decisão recorrida e devendo-se, nos termos do art. 34º, nº 4, do CPT, declarar a extinção do presente procedimento cautelar de suspensão do despedimento.

3. Caducidade do procedimento cautelar e do direito que com ela se pretende e extinção da instância por inutilidade superveniente da lide

A Recorrente invoca a caducidade do procedimento cautelar (art. 40º-A, al. b), do CPT) [conclusão 11ª], a caducidade do direito de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, este o direito que se pretende acautelar e que está associado à providência (art. 387º, nº 2, do CT[5] e 298º, nº 2, do CC) e a inutilidade superveniente da lide [conclusões 14ª e 13ª].
Tais questões mostram-se, todavia, prejudicadas pela solução dada à questão anterior, para além de que consubstanciam questões novas, não suscitadas na 1ª instância e sobre as quais esta não se pronunciou. Ora, como é sabido, salvas as questões de conhecimento oficioso, que não é o caso, cabe à Relação a reapreciação de questões suscitadas e apreciadas pelo tribunal a quo, mas não já o conhecimento de questões novas.
Assim, e nesta parte, não se conhece do objeto do recurso.
*
IV. Decisão

Em face do exposto, acorda-se em conceder provimento ao recurso e, em consequência, revoga-se a decisão recorrida, que é substituída pelo presente acórdão em que se decide declarar a extinção do presente procedimento cautelar de suspensão do despedimento da Requerente, B…, decretado pela Requerida, C….

Custas, em ambas as instâncias, pela Requerente/Recorrida.

Porto, 07-04-2014
Paula Leal de Carvalho
Rui Penha
Maria José Costa Pinto
_________________
[1] As conclusões 1ª a 7ª não têm qualquer relevância, consubstanciando apenas a tramitação do procedimento disciplinar. E, daí, que se transcreva apenas a partir da conclusão 8ª.
[2] A qual também não releva para as questões em apreço no recurso.
[3] Nos termos do qual é as partes que cabe a iniciativa de formularem as pretensões que pretendem ver resolvidas e de desencadearem a correspondente tutela jurisdicional.
[4] Refira-se que, com os presentes autos, foi remetido um apenso – Apenso A – do qual consta apenas despacho (fls. 27 do mesmo), proferido aos 14.11.2013, em que se refere que a A., ora Requerente, intentou contra a ré, ora Requerida, ação pedindo a condenação desta no pagamento de indemnização com base em despedimento ilícito, no pagamento de remunerações mensais em dívida e juros de mora e no qual, invocando-se o disposto nos arts. 552º e 590º do CPC, se decidiu não admitir “a petição inicial apresentada a fls. 2/26, ordenando-se o seu desentranhamento e subsequente devolução à sua apresentante”, devolução essa que teve lugar por correio registado expedido aos 10.12.2013.
[5] A recorrente refere o “CPT”, o que decorre de lapso manifesto, pois que o preceito 387º, nº 2, invocado e que sustenta o que alega, reporta-se ao CT/2009 (e, diga-se, não ao “CPC”, como refere a Recorrida).