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VERIFICAÇÃO DE CRÉDITOS
EXTINÇÃO DA INSTÂNCIA
HOMOLOGAÇÃO
PLANO DE INSOLVÊNCIA
Sumário
I- A homologação de um plano de insolvência não importa a inutilidade do processo de verificação de créditos ou das acções ulteriores de créditos, pois que, a sentença de verificação a proferir continua a manter interesse quer como meio de estabilização do passivo do devedor, quer servindo como título executivo a par com a sentença de homologação do plano de insolvência quando haja incumprimento deste. II - O encerramento do processo de insolvência por aprovação do plano não acarreta a extinção da instância do processo de verificação e graduação de créditos (nem das acções ulteriores de créditos), devendo prosseguir até final, ainda que não tenha sido proferida sentença de verificação.
Texto Integral
Processo nº 2609/11.8TBPDL-K. P1-Apelação
Origem-Tribunal Judicial da Comarca de Santa Maria da Feira, 4º Juízo Cível
Relator: Manuel Fernandes
1º Adjunto Des. Caimoto Jácome
2º Adjunto Des. Macedo Domingues
5ª Secção
Sumário: I- A homologação de um plano de insolvência não importa a inutilidade do processo de verificação de créditos ou das acções ulteriores de créditos, pois que, a sentença de verificação a proferir continua a manter interesse quer como meio de estabilização do passivo do devedor, quer servindo como título executivo a par com a sentença de homologação do plano de insolvência quando haja incumprimento deste. II - O encerramento do processo de insolvência por aprovação do plano não acarreta a extinção da instância do processo de verificação e graduação de créditos (nem das acções ulteriores de créditos), devendo prosseguir até final, ainda que não tenha sido proferida sentença de verificação.
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I-RELATÓRIO
No apenso de reclamação de créditos que corre por apenso ao processo de insolvência n.º 2609/11.8TBPDL e em que é insolvente B…, S.A. foi proferido, em 04-11-2013, despacho a julgar extinta a instância por impossibilidade superveniente da lide, nos termos do art. 233.º, n.º 2 al. b) do CIRE.
Não se conformando com assim decidido vieram os credores C… e D…, interpor recurso concluindo as suas alegações nos seguintes termos: Alegação de C…
1. Decidindo como decidiu, salvo o devido respeito, a douta sentença recorrida não fez correcta aplicação do direito. 2. O Recorrente está convicto que Vossas Excelências não deixarão de revogar a sentença recorrida, substituindo-a por outra que determine o prosseguimento do apenso de verificação e graduação de créditos seguindo os seus termos ulteriores até final. 3. Com efeito o Recorrente tempestivamente reclamou crédito no valor global de Euros 5.302,33, relativo a créditos laborais. 4. Porém, o Recorrente foi notificado, mediante carta registada, datada de 4 de Maio de 2012, pelo Ex.mo Sr. Administrador de Insolvência nos termos e para os efeitos no disposto no artigo 129.º, n.º 4 do CIRE, na medida em que foi reconhecido um crédito de montante diferente do reclamado pelo aqui Recorrente. 5. Nessa medida, o Recorrente apresentou em juízo impugnação da Lista de Créditos reconhecidos, nos termos do artigo 130.º do CIRE. 6. Em 23-09-2013, veio o tribunal a quo notificar todos os credores impugnantes para se pronunciarem quanto à possibilidade de, por força da sentença de homologação do plano de insolvência, se declarar extinta a instância de verificação de créditos, nos termos do artigo 233º, nº 2, alínea b), do CIRE. 7. Sendo que, vários credores impugnantes, nomeadamente o ora recorrente, manifestado oposição ao encerramento. 8. Ao invés, foi o Credor aqui Recorrente notificado da sentença que julgou extinto o apenso da Reclamação de Créditos nos termos do disposto nos artigos 233.º, n.º 2, alínea b) do CIRE; 9. Em 14-11-2013, o recorrente requereu a aclaração da sentença. 10. Sendo que tal requerimento mereceu despacho no sentido de que solução jurídica plasmada no despacho em causa está claramente expresso. 11. De acordo com Tribunal a quo a homologação do Plano de Insolvência determina o encerramento do processo de insolvência e, em consequência a extinção da instância da verificação de créditos, nos termos do disposto no artigo 232.º, n.º 2, alínea b) do CIRE, fazendo “ouvidos de mercador” às impugnações deduzidas pelos vários credores bem como, a oposição manifestada ao encerramento, incluindo a do aqui Recorrente. 12. Pelo contrário, foi antes notificado da sentença que julgou extinto o apenso da reclamação, nos termos do disposto nos artigos 233.º, n.º 2, alínea b) do CIRE. 13. É entendimento do Tribunal a quo que a homologação do Plano de Insolvência determina o encerramento do processo de insolvência e, em consequência a extinção da instância da verificação de créditos, nos termos do disposto no artigo 232.º, n.º 2, alínea b) do CIRE, fazendo “ouvidos de mercador” às impugnações deduzidos pelos vários credores, incluindo a do aqui Recorrente, não obstante reunirem todas as condições necessárias para que sobre a mesma recaía uma decisão favorável. 14. Decidindo como decidiu, Tribunal a quo não visou proteger o direito dos vários credores Impugnantes de verem reconhecidos e pagos, no âmbito do Plano de Insolvência aprovado, em igualdade com os demais Credores, os seus créditos contestados, violando por isso os princípios subjacentes ao disposto no artigo 128.º, n.º 3 do CIRE, de que todos os créditos têm que ser reclamados e reconhecidos no processo de insolvência após a sua declaração. 15. Assim a questão a decidir e que constitui objecto do presente recurso prende-se em saber se após o trânsito em julgado da sentença de homologação do Plano de insolvência deverá o apenso de verificação de créditos ser extinto, nos termos do disposto nos artigos 233.º, n.º 2, alínea b) do CIRE do CPC, tal como foi considerado pelo Tribunal a quo, e cujo entendimento, salvo o devido respeito, não é perfilhado pelo aqui Recorrente. 16. É entendimento do Recorrente que o Tribunal a quo interpretou erradamente A norma prevista no artigo 233.º, n.º 2, alínea b) do CIRE, porquanto a mesma não determina a extinção dos processos de verificação de créditos, conforme se irá demonstrar. 17. Com efeito, com a actual redacção foi intenção expressa do legislador excepcionar a Extinção da instância do processo de verificação de créditos não só à situação da falta do trânsito em julgado da sentença de verificação e graduação de créditos, como ao encerramento do processo de insolvência resultante da aprovação de plano de insolvência. 18. Esta alteração foi efectuada na mesma alteração legislativa que passou a permitir que a aprovação de um Plano de Insolvência pudesse ocorrer antes de ser proferida sentença de verificação e graduação de créditos. 19. É pois manifesto que actualmente é permitido a aprovação de um Plano de Insolvência em momento anterior ao da prolação da sentença de verificação e graduação de créditos; no entanto, esta nova alteração legislativa não pode resultar numa causa extintiva dessa acção. 20. Dito de outra forma, o novo regime legal, previsto no artigo 233.º., n.º 2, alínea b) do CIRE, comporta duas excepções à extinção do apenso de verificação e graduação de créditos pendente, a saber: (i) Prolação da sentença de verificação e graduação de créditos; (ii) Quando o encerramento decorra da aprovação de um Plano de Insolvência. 21. Ora, poder-se-á assim concluir-com o devido respeito por opinião diversa-, que apesar da redacção do normativo legal, não ser muito clara não há dúvidas que o legislador quis sagrar e consagrou a referida excepção, pelo que alguma proficuidade a mesma há-de ter, pelo que devemos entender que consagrou a solução mais acertada e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (artigo 9.º, n.º 3 do Código Civil), isto é, ao determinar esta excepção é pretensão do legislador que o apenso de verificação e graduação de créditos siga os seus trâmite até que seja proferida decisão final. 22. Dissecando, de perto a actual redacção daquele dispositivo legal, verificamos que a segunda excepção [“(…)ou se o encerramento decorrer da aprovação do plano de insolvência, (…)], foi colocada com independência, entre virgulas, mas desordenadamente no permeio do corpo normativo da primeira (e até então única) hipótese, quando seria mais recomendável a sua inserção na parte final, pois aqui não suscitaria quaisquer dúvidas quanto a outros requisitos–sendo de notar a manutenção do singular e, “caso em que prosseguem até final …”. 23. Não será por isso, desapropriado dizer-se que esta segunda excepção à extinção dos apensos não é mais do que a manifestação de vontade do legislador no prosseguimento, sem mais, da verificação de créditos até final. 24. Pois, a não ser assim, não se antevê qual o efeito prático pretendido pelo legislador ao efectuar a alteração ao artigo 209.º, n.º 3 do CIRE, uma vez que tal não foi acautelado pelo Tribunal a quo. 25. Conforme doutrina perfilhada pelo Tribunal da Relação de Coimbra no âmbito do processo 1979/11.2T2AVR – A.C1 (Relator: Francisco Caetano): “Quer dizer, não obstante o trânsito em julgado da sentença homologatória do plano de insolvência determinar o encerramento do processo (art.º 230.º, n.º 1, alínea. b), do CIRE), não há lugar à extinção da instância do processo de verificação de créditos, sob pena de a cautela prevenida no citado n.º 3 do art. 209.º do CIRE não ter efeito útil.” 26. Nessa conformidade, interpretar o artigo 233.º, n.º 2, alínea b), do CIRE em sentido diverso ao defendido pelo aqui Banco Recorrente, será um claro atropelo do direito do ora Recorrente em ver reconhecido o seu crédito validamente reclamado, o que constituiria uma clara INJUSTIÇA! 27. Na verdade, não deixa de constituir uma arbitrariedade., aquelas situações em que os Credores Impugnantes-cujo crédito foi erradamente modificado, qualificado ou excluído, apenas por uma mera deliberação do Administrador de Insolvência e que sequer foi devidamente fundamentada, vêm o processo de verificação de créditos extinto, por impossibilidade superveniente da lide. 28. É sabido que o Administrador de Insolvência não tem competência para apreciar e julgar questões litigiosas submetidas pelas partes ao Tribunal. 29. E essa não foi a intenção do legislador, nem poderia ser à luz do artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, que consagra o acesso ao direito à tutela jurisdicional efectiva a todos, consagrando ainda no seu artigo 202.º, que é competência dos Tribunais administrar a justiça em nome do povo. 30. Conforme é o entendimento do Tribunal da Relação de Coimbra no âmbito Acórdão proferido no processo 1979/11.2T2AVR –A.C1.: “Em conclusão, o encerramento do processo de insolvência decorrente da aprovação de um plano de insolvência não determina a extinção d instância do apenso de verificação de créditos, havendo assim, este que prosseguir relativamente aos recorrentes com visa á prolação da respectiva sentença sobre as impugnações oportunamente apresentadas.” 31. No mesmo sentido pode, ver-se ainda o Acórdão da Relação do Porto, datado de 9 de Novembro de 2009, proferido no âmbito do processo 241/09.5TYVNG-A.P1: “O mero trânsito em julgado da sentença homologatória do plano de insolvência e do despacho de encerramento do processo em que foi proferida não determina a extinção da instância do processo de verificação de créditos por inutilidade ou impossibilidade superveniente da lide.” 32. E bem assim, o entendimento vertido no Acórdão da Relação de Guimarães, datado de 12 de Novembro de 2013, proferido no âmbito do processo 8550/11.7TBBRG-D.G1,“A extinção da instância por inutilidade ou impossibilidade superveniente da lide, referidas na alínea e) do art. 287.º, pressupõe a ocorrência de um fato do qual resulte que a pretensão do autor se não pode mais manter, o que poderá suceder apenas desaparecendo os sujeitos (morte ou extinção de uma das partes, em situações em que a prestação é pessoal); desaparecendo o objecto, tratando-se de coisa infungível; ou quando a pretensão do autor foi satisfeita por outro meio. 33. Finalmente, cumpre ainda ponderar uma outra questão que se prende com a violação do Principio da Igualdade dos Credores, previsto no artigo 194.º do CIRE. 34. Princípio não pode deixar de ser referido no âmbito do presente recurso, na medida em que tendo o Plano de Insolvência sido homologado antes de proferida qualquer decisão acerca da impugnação deduzida pelo aqui Recorrente, pelo que, não ficaram precavidos os efeitos da eventual procedência da impugnação. 35. Nessa medida, não ficou assegurada a finalidade que o processo de insolvência visa garantir – a satisfação dos interesses dos credores. Ora tal, não foi de todo conseguido, pelo menos no que ao aqui Recorrente diz respeito. 36. Nesta matéria, são sintomáticas as considerações expendidas no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 06 de Novembro de 2012, processo nº 444/06.4TBCNT-Q.C1, in www.dgsi.pt. 37. A violação do consagrado princípio de igualdade funda-se no facto de que o Plano de Insolvência foi homologado antes de ser proferida decisão das impugnações deduzidas, sem que nele estejam acautelados os efeitos da eventual procedência das impugnações deduzidas. 38 - Por todo o exposto, verifica-se assim que mal andou o Tribunal a quo, em clara violação do disposto noas artigos 130.º, 194.º, 209.º, n.º 4 e 233.º, n.º 2 alínea b) do CIRE e 20.º da CRP. não poderá caducar, de acordo com o disposto no n.º 3 do artigo 824º do Código Civil.
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Alegação de D…
1º) A sentença de que ora se recorre, datada de 04.11.2013, determinou a extinção da instância da verificação de créditos, por impossibilidade superveniente da lide, nos termos do disposto na alínea b) do nº 2 do artigo 233º do CIRE, porquanto o encerramento do processo de insolvência se deu antes do rateio final por força da aprovação do plano de insolvência. 2º) A sentença labora em erro grosseiro, faz uma errada aplicação das normas jurídicas ínsitas na alínea e) do artigo 277º do CPC e na alínea b) do nº 2 do artigo 233º do CIRE e viola flagrantemente as disposições conjugadas dos artigos 136º a 140º, 173º, 209º, nº 3 e 233º, nº 2 alínea b) do CIRE, artigo 2º do CPC e artigo 20º da CRP e, como tal, deve ser revogada. 3º) O ora recorrente reclamou o seu crédito junto do Ex.mo Sr. Administrador de Insolvência, no montante de 39.608,99 €. 4º) O Ex.mo Sr. Administrador de Insolvência apenas reconheceu o crédito do ora recorrente no montante de 4.479,45 €, pelo que foi apresentada nos presentes autos a competente impugnação da exclusão de parte do montante do crédito da lista de créditos reconhecidos. 5º) Nessa impugnação, o ora recorrente juntou um vasto número de documentos, arrolou testemunhas e requereu a notificação do Sr. Administrador para proceder à junção de vários documentos para prova do seu crédito. 6º) Tal impugnação foi contestada pela insolvente devedora, que também requereu diligências de prova. 7º) Até à presente data, não recaiu qualquer decisão sobre a impugnação do crédito apresentada pelo ora recorrente, nem o Sr. Administrador de Insolvência se pronunciou sobre o seu teor. 8º) Entretanto, por douto despacho de fls. datado de 19.03.2013, foi solicitada a emissão de parecer da comissão de credores a que alude o artigo 135º do CIRE. 9º) Foi, pois, dado cumprimento nos autos à tramitação prevista nos artigos 128º a 135º do CIRE. 10º) Não obstante, está ainda por verificar e reconhecer o montante do crédito do ora recorrente, tendo ficado este a aguardar o cumprimento das diligências previstas nos artigos 136º a 139º do CIRE, designadamente a marcação de audiência para tentativa de conciliação, a prolação do despacho saneador previsto no nº 3 do artigo 136º do CIRE e/ou a realização das diligências de prova por si requeridas. 11º) O ora recorrente desconhece qual o montante do crédito que lhe será pago de acordo com os critérios estabelecidos no plano de insolvência (o montante reclamado ou o montante reconhecido pelo Sr. Administrador?). 12º) A sentença recorrida determina a extinção da instância de verificação de créditos com base na alínea b) do nº 2 do artigo 233º do CIRE, que estabelece: “O encerramento do processo de insolvência antes do rateio final determina: (…) b) A extinção da instância dos processos de verificação de créditos (…) que se encontrem pendentes, excepto (…) se o encerramento decorrer da aprovação de plano de insolvência (…)”. 13º) Ora, considerando que o encerramento do processo de insolvência se verificou por força da aprovação (e homologação) do plano de insolvência, não pode ser extinta a instância da verificação de créditos por estarmos no âmbito de uma das excepções previstas na alínea b) do nº 2 do artigo 233º do CIRE. 14º) De facto, a plano de insolvência foi aprovado em assembleia de credores realizada no dia 04.12.2012, onde o Ex.mo Sr. Administrador esclareceu os credores presentes que, nos termos do disposto nos artigos 209º, nº 3 e 210º do CIRE, os créditos impugnados seriam pagos, após o seu reconhecimento, na respectiva medida, conjuntamente com os da mesma natureza e de acordo com os critérios estabelecidos no plano de insolvência. 15º) O plano de insolvência aprovado foi homologado por douta decisão datada de 04.02.2013. 16º) Na sequência da decisão de homologação do plano de insolvência, o Ex.mo Sr. Juiz a quo determinou o encerramento do processo. 17º) Após o encerramento, o Ex.mo Sr. Juiz a quo mandou solicitar a emissão de parecer da comissão de credores previsto no artigo 135º do CIRE, por forma a realizar as diligências subsequentes para verificação dos créditos impugnados. 18º) Assim, o encerramento do processo de insolvência antes do rateio final que decorreu da aprovação do plano de insolvência impede a extinção da instância, nos termos da alínea b) do nº 2 do artigo 233º do CIRE. 19º) A sentença recorrida fez, pois, uma errada interpretação e aplicação daquela norma legal. 20º) Acresce que, a instância de verificação de créditos não pode ser extinta por impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide, porquanto o apenso de verificação de créditos não perdeu o seu efeito útil e ainda pode – e deve – dar satisfação à pretensão dos credores impugnantes, que não têm outro meio para fazer valer os seus direitos. 21º) Tanto mais que o nº 3 do artigo 209º do CIRE acautela a situação que se analisa in casu: quando o plano de insolvência é aprovado antes do trânsito em julgado da sentença de verificação e graduação dos créditos, aquele plano garante os efeitos da eventual procedência das impugnações da lista de credores reconhecidos, de forma a assegurar o tratamento devido aos créditos controvertidos. 22º) O plano de insolvência, aprovado e homologado nos presentes autos, contempla que os créditos impugnados que forem reconhecidos terão tratamento igual aos da mesma natureza e de acordo com os critérios ali estabelecidos. 23º) Ora, o recorrente não sabe qual o valor que lhe será pago porque o seu crédito não está verificado por sentença judicial, conforme exigem os artigos 140º e 173º do CIRE. 24º) Da sentença recorrida resulta a extinção da instância de verificação de créditos, pelo que não haverá lugar à realização de diligências de prova requeridas para demonstração do montante do crédito reclamado, nem haverá prolação de sentença que verifique o montante do crédito do ora recorrente. 25º) A decisão de que ora se recorre nega ao recorrente, e aos restantes credores impugnantes, o acesso à justiça e o direito de obter uma decisão judicial que aprecie, com força de caso julgado, uma pretensão regularmente deduzida em juízo, direitos garantidos legal e constitucionalmente (cfr. artigo 2º do CPC e artigo 20º da CRP). 26º) Por tudo isto, a sentença recorrida viola flagrantemente as disposições conjugadas dos artigos 136º a 140º, 173º, 209º, nº 3 e 233º, nº 2 alínea b) do CIRE, artigo 2º do CPC e artigo 20º da CRP. 27º) Pelas razões expostas, a sentença exarada a fls. do apenso K, no dia 04.11.2013, deve ser revogada.
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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Após os vistos legais cumpre decidir.
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II- FUNDAMENTOS
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 3, e 639.º, nºs 1 e 2, do C.P.Civil.
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No seguimento desta orientação é apenas uma a questão a decidir: - saber se o encerramento do processo de insolvência na decorrência de um plano de insolvência tem como consequência necessária a extinção da instância do apenso de verificação e graduação de créditos ou se, quando há créditos impugnados, como no caso presente, se justifica o prosseguimento da verificação de créditos.
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A)-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Os factos a considerar provados para a decisão do presente recurso são os seguintes:
1º)-No âmbito dos presentes autos vários credores, entre eles os ora recorrentes, apresentaram a sua reclamação de créditos;
2º)-Apresentada pelos Sr. Administrador lista dos credores reconhecidos e não reconhecidos foram os diversos credores dela notificados;
3º)-Os recorrentes não se conformando com essa lista apresentaram, em devido tempo, a respectiva impugnação;
4º)- Em 06-03-2013, o tribunal a quo profere a seguinte decisão no âmbito do processo principal: “Uma vez que se mostra transitada a homologação do plano de insolvência, sem que o conteúdo do mesmo se oponha ao encerramento, nos termos do artigo 230.º, n.º 1, b), do CIRE, determina-se o encerramento do processo”;
5º)-O presente apenso de reclamação de créditos encontrava-se, a essa data, a aguardar a tramitação subsequente estatuída nos artigos 135 e ss. do CIRE;
6º)- De seguida foi, nesses autos, proferida a decisão recorrida, com o seguinte teor: “Vi as várias posições processuais que antecedem. Nos autos principais foi já declarado o encerramento do processo em virtude do trânsito em julgado da decisão de homologação do plano de insolvência. Ora, o artigo 233º do CIRE trata dos efeitos do encerramento do processo e, na alínea b) do seu nº 2, estabelece-se que o encerramento do processo de insolvência antes do rateio final determina a extinção da instância dos processos de verificação de créditos e de restituição e separação de bens já liquidados que se encontrem pendentes, excepto se tiver já sido proferida a sentença de verificação e graduação de créditos prevista no artigo 140º, ou se o encerramento decorrer da aprovação do plano de insolvência, caso em que prosseguem até final os recursos interpostos dessa sentença e as acções cujos autores assim o requeiram, no prazo de 30 dias. Resulta desta norma que só se verifica a excepção ao encerramento do processo no que concerne ao apenso de verificação de créditos no caso em que a sentença já tenha sido proferida porque, não o tendo sido, então vigora o regime previsto na alínea c) do nº 1 do mesmo preceito legal. Pela forma absolutamente clara com que tratam esta questão CARVALHO FERNANDES/JOÃO LABAREDA, CIRE anotado, Quid Iuris, 2006, Volume II, pp. 173, transcreve-se aqui, com a devida vénia, parte da anotação à alínea b) do nº 2 do artigo 233º do CIRE: “Em boa verdade, a ressalva de o processo ter terminado na decorrência da aprovação e homologação de um plano de insolvência–é justificado o reparo feito, a este propósito, por A. Raposo Subtil e Outros, ob. cit., pp. 307–só ganha autonomia quando isso suceda sem que tenha sido proferida a sentença de verificação, porquanto, no caso contrário, a não produção do efeito geral, nos termos em que está consignado, é coberta pela primeira excepção contemplada no nº 2, alínea b) e resulta dela. Certo é que, a partir da alteração introduzida pelo Decreto-Lei nº 200/2004, no nº 2 do artigo 209º, passou a ser possível a aprovação de um plano de insolvência sem estar previamente proferida sentença de verificação, embora esteja necessariamente esgotado o prazo de reclamação e também de impugnação das reclamações deduzidas. Ora, se se trata de uma situação em que tenha sido proferida sentença de verificação, é manifesto que se produzem as duas consequências que integram a estatuição da parte final da alínea b) do nº 2: prosseguem até final os recursos interpostos dessa sentença e as acções, pendentes, de restituição e separação de bens já liquidados, cujos autores o requeiram, no prazo de trinta dias. Dada a formulação do preceito, o requerimento do interessado parece necessário somente para o prosseguimento das acções em causa, mas não para a continuação dos recursos interpostos da sentença de verificação. Mas, quando o processo de insolvência encerre em consequência da homologação judicial de um plano de insolvência, sobram dúvidas sobre o exacto conteúdo do regime aplicável, como passamos a expor. O aditamento feito pelo Decreto-Lei nº 200/2004 operou intercalando-se a nova excepção logo após a descrição da primeira e separando, assim, esta da parte final do preceito, que começa–como começava antes – em «caso em que prosseguem […]”. A primeira leitura indicia que a estatuição legal se desencadeia de igual modo e com idêntico conteúdo, seja qual for a excepção que se verifique. Contudo, uma ponderação mais cuidada do texto legal evidencia dificuldades com que temos de contar. Desde logo, nota-se que a lei manteve, na forma singular, o substantivo caso, quando, porventura, seria mais razoável que o tivesse passado a usar no plural. Mas, mais significativo do que isso é o facto de parte relevante da estatuição não ser aplicável no caso de a excepção aparente ser a da homologação de um plano de insolvência. Nesta verdade, nesta hipótese só pode haver recursos da sentença de verificação se, obviamente, ela foi já proferida e essa é a situação a que se reporta a restante previsão normativa e constitui, por isso, a primeira das ressalvas ao regime geral. Isto dito, o sentido literal da lei aponta então para que, não sendo aplicável, na hipótese sub iudice, a parte que se refere ao seguimento dos recursos, resta somente a que respeita à constituição das acções de restituição e separação de bens. Não pode, todavia, deixar de se perguntar se o pensamento legislativo não irá mais além, a ponto de determinar a continuação do apenso de verificação de créditos até decisão final, no caso de o processo de insolvência terminar na decorrência da homologação de um plano, o que se apresenta sobremaneira sugestivo na eventualidade de terem sido deduzidas impugnações à lista de créditos elaborada pelo administrador da insolvência, dada uma certa analogia com a hipótese de interposição de recurso da sentença de verificação. Embora com alguma perplexidade pela forma como a alteração do nº 2, alínea b) operou, respondemos negativamente á questão colocada, pelo conjunto de razões que seguida e sumariamente expomos. Desde logo, visto em si mesmo, o texto legal, tal como ficou, não apoia a conclusão que se equacionou. Acontece que a exigência de proferimento da sentença de verificação de créditos, mesmo depois da homologação judicial de um plano de insolvência com a consequência da extinção do processo principal, constituiria, se fosse de considerar, uma importante novidade. Natural seria pois que o legislador, sendo esse o pensamento legislativo, expressasse em termos suficientemente esclarecedores, o que, decerto, não podia deixar de se traduzir numa redacção formal e substancialmente diferente da do preceito. E, tendo identificado, no Preâmbulo do Decreto-Lei nº 200/2004, as principais alterações por ele introduzidas, normal seria também que evidenciasse a sofrida pelo artigo 233º, nº 2, alínea b) se, realmente, ela significasse o imperativo da prolação da sentença de verificação de créditos. Cremos que o silêncio a este respeito é sintomático do pouco relevo da alteração. Isto dito, bem vistas as coisas, apesar de alguma aparência do contrário a que acima se alude, a verdade é que, mesmo quando a lista de credores foi impugnada, não há verdadeira analogia com o recurso da sentença de verificação de créditos que fundamenta, por si só, a não extinção da respectiva instância. É que, precisamente, num caso há sentença e no outro não! Uma palavra mais para sublinhar que, sendo certo poderem invocar-se razões substantivas para justificar o interesse na prolação da sentença de verificação, como meio de estabilização do passivo do devedor, relevante para efeitos do plano de insolvência, certo é também que outros motivos há que desaconselham semelhante opção, que poderia, em diversas situações, perturbar a execução do próprio plano aprovado e homologado. Quer dizer, não é, sequer, possível fazer apelo a razões de fundo suficientemente fortes e seguras para suportar uma resposta afirmativa à dúvida colocada. Neste contexto, cremos que, no caso de o processo judicial ter terminado na decorrência de um plano de insolvência, não estando, como é pressuposto, proferida sentença de verificação de créditos, apenas se salvaguarda a continuação das acções pendentes de restituição e separação de bens já liquidados cujos autores assim requeiram, no prazo de trinta dias”. Assim, sem necessidade de outras considerações, uma vez que o encerramento do presente processo de insolvência se deu antes do rateio final por força da aprovação do aludido plano, determino a extinção da presente instância de verificação de créditos, por impossibilidade superveniente da lide, tudo nos termos do artigo 233º, nº 2, alínea b) do CIRE. Custas pela massa insolvente. Notifique”.
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III- O DIREITO
Face à factualidade supra descrita apreciemos então única questão que vem posta no recurso: - saber se o encerramento do processo de insolvência na decorrência de um plano de insolvência tem como consequência necessária a extinção da instância do apenso de verificação e graduação de créditos ou se, quando há créditos impugnados, como no caso presente, se justifica o prosseguimento da verificação de créditos.
Na sentença recorrida respondeu-se de forma afirmativa à questão colocada.
Deste entendimento dissentem os recorrentes.
Quid iuris?
Como consta do despacho proferido no processo principal, o processo de insolvência foi encerrado nos termos do artigo 230.º, n.º 1 al. b) do Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas, que estipula:
1. Prosseguindo o processo após a declaração de insolvência, o juiz declara o seu encerramento.
a) (…)
b) Após o trânsito em julgado da decisão de homologação do plano de insolvência, se a isso não se opuser o conteúdo deste.
Por sua vez o artigo 233.º, n.º 2 al. b) do CIRE, em que se baseou a decisão recorrida, na redacção conferida pelo DL n.º 200/2004 de 18.08, estipula:
“2 - O encerramento do processo de insolvência antes do rateio final determina:
a) (…)
b) A extinção da instância dos processos de verificação de créditos e de restituição e separação de bens já liquidados que se encontrem pendentes, excepto se tiver já sido proferida a sentença de verificação e graduação de créditos prevista no artigo 140.º, ou se o encerramento decorrer da aprovação do plano de insolvência, caso em que prosseguem até final os recursos interpostos dessa sentença e as acções cujos autores assim o requeiram, no prazo de 30 dias.
A decisão recorrida, sufragando o entendimento Carvalho Fernandes e João Labareda[1], entendeu que só se verifica a excepção ao encerramento do processo no que concerne ao apenso de verificação de créditos no caso em que a sentença já tenha sido proferida porque, não o tendo sido, então vigora o regime previsto na alínea c) do nº 1 do mesmo preceito legal.
Não acompanhamos, salvo o devido respeito, o entendimento vertido na decisão recorrida nem o defendido por aqueles autores em que tal decisão assentou.
Vejamos.
O estatuído no artigo 233.º, nº 2 al. b) do CIRE tem de ser concatenado o disposto no artigo 209.º do CIRE, também com a redacção introduzida pelo DL n.º 200/2004, que estipula:
1- (…)
2 – A assembleia de credores convocada para os fins do número anterior não se pode reunir antes de transitada em julgado a sentença de declaração de insolvência, de esgotado o prazo para a impugnação da lista dos credores reconhecidos e da realização da assembleia de apreciação de relatório.
3- O plano de insolvência aprovado antes do trânsito em julgado da sentença de verificação e graduação de créditos acautela os efeitos da eventual procedência das impugnações da lista de credores reconhecidos ou dos recursos interpostos dessa sentença, de forma a assegurar que, nessa hipótese, seja concedido aos créditos controvertidos o tratamento devido.
A redacção primitiva das transcritas disposições conferida pelo DL n.º 53/2004, de 18.03 que aprovou o CIRE, era a seguinte:
1- (…)
2 – A assembleia de credores convocada para os fins do número anterior não se pode reunir antes de transitada em julgado a sentença de declaração de insolvência, de proferida sentença de verificação e graduação de créditos, de esgotado o prazo para a interposição de recursos desta sentença e da realização da assembleia de apreciação de relatório.
3- O plano de insolvência aprovado antes do trânsito em julgado da sentença de verificação e graduação de créditos acautela os efeitos da eventual procedência dos recursos interpostos dessa sentença, de forma a assegurar que, nessa hipótese, seja concedido aos créditos controvertidos o tratamento devido.
Como se evidencia da comparação das duas versões do n.º 2 do art. 209º, deixou de ser requisito, para que a assembleia de credores reúna com o objectivo de deliberar sobre uma proposta relativa ao plano de insolvência apresentado, ter sido proferida a sentença de verificação e graduação de créditos e ter decorrido o prazo para interposição dos recursos dessa sentença.
Ou seja, com a actual redacção do n.º 2 do artigo 209.º (introduzida pelo DL n.º 200/2004) permite-se que a assembleia de credores reúna para aprovação de plano de insolvência logo após o termo do prazo para as impugnações dos créditos.
Portanto, a ratio desta alteração foi permitir uma maior celeridade na deliberação da assembleia de credores sobre uma proposta de plano de insolvência e, como expressamente refere o legislador, no preâmbulo do DL n.º 200/2004, visa “claramente favorecer as perspectivas de recuperação de empresas.”
Não obstante, o legislador teve a preocupação de, no caso de ainda não ter sido proferida a sentença de verificação de créditos, impor que o plano de insolvência acautele os efeitos da eventual procedência das impugnações da lista de credores reconhecidos ou dos recursos interpostos dessa sentença, de forma a assegurar que, nessa hipótese, seja concedido aos créditos controvertidos o tratamento devido.
Acontece que, esta alteração importou que se fizesse também a adaptação do citado artigo 233.º, n.º 2 al. b), nele tendo o legislador enxertado a nova excepção.
Efectivamente, esta alínea tem a redacção dada pelo DL n.º 200/2004, de 18/8, que lhe aditou outra excepção à extinção da instância, contemplando a hipótese em que o encerramento do processo decorra da “aprovação do plano de insolvência”.
A questão que agora se coloca é, pois, a de saber se o encerramento do processo de insolvência na decorrência da aprovação do plano de insolvência, tem como consequência obrigatória a extinção da instância no apenso de reclamação de créditos, a não ser que já tenha sido proferida sentença, ou antes se, a citada al. b) do n.º2 do art. 233º do CIRE, em conjugação com o art. 209º, admite a possibilidade de o apenso de verificação de crédito prosseguir os seus termos até à decisão final.
Numa análise literal do mencionado preceito, sobretudo da sua parte final que se manteve inalterada e, invocando a falta de esclarecimentos por parte do legislador, há quem defenda a não aplicação da estatuição ali prevista aos autos de verificação de créditos de forma a impossibilitar a sua continuação até à decisão final, como é o caso de Carvalho Fernandes e João Labareda já atrás citados, quando afirmam: “no caso de o processo judicial ter terminado na decorrência de um plano de insolvência, não estando, como é pressuposto, proferida sentença de verificação de créditos, apenas se salvaguarda a continuação das acções pendentes de restituição e separação de bens já liquidados cujos autores assim requeiram, no prazo de trinta dias”.[2]
Não cremos que esta seja, a melhor interpretação do preceito citado. Primeiro.
Parece-nos que a aprovação do plano não importa a inutilidade do apenso da verificação de créditos (ou de eventuais acções ulteriores de créditos).
Obtemperam os apelantes que, tendo os respectivos créditos, sido objecto de impugnação, nomeadamente quanto ao seu montante, só a prolação da sentença de verificação lhes assegurará a certeza de que obterão pagamento no âmbito do plano homologado.
E, neste segmento, assiste-lhes inteira razão.
De facto o credor/reclamante que não possua título executivo a incorporar o seu crédito, pode continuar a manter todo o interesse em obter o respectivo reconhecimento judicial, uma vez que, com o encerramento do processo pela aprovação de um plano de insolvência, não só se extinguem todos os efeitos que resultam da declaração de insolvência, como pode mesmo fazer prosseguir ou instaurar acção executiva contra a sociedade devedora, que poderá mesmo prosseguir a sua actividade, em conformidade com os termos previstos no plano [artigo 233.º, nº 1, als. a) a c), do CIRE].
E, embora os credores/Apelantes tenham reclamado os seus créditos nos presentes autos, constando da lista de créditos reconhecidos elaborados pelo Administrador de Insolvência, o certo é que, tendo os mesmos sido objecto de impugnação mantém-se a incerteza não só quanto à existência e montantes dos créditos reclamados, mas igualmente quanto à questão de saber se se encontram abrangidos pelo plano e em que termos (como créditos comuns, privilegiados?), sendo que, as condições de pagamentos aí previstas, como é natural, variam em função da classe de créditos em que se inserem.
Ou seja, a prolação da sentença nesta fase, continuaria a manter interesse como meio de estabilização do passivo do devedor, relevantes para efeitos do plano de insolvência.
Todavia, o interesse no prosseguimento não se esgota na função de definição do passivo, uma vez que, para efeitos de cobrança dos créditos após o encerramento do processo de insolvência, a al. c) do nº 1 do artigo 233.º do CIRE atribui expressamente a natureza de título executivo à sentença de verificação de créditos ou decisão proferida em acção ulterior de créditos em conjugação com a sentença homologatória do plano de insolvência.
Acresce que, embora a sentença de homologação tenha o efeito de produzir as alterações dos créditos da insolvência introduzidas pelo plano, independentemente de tais créditos terem sido, ou não, reclamados ou verificados (nº 1 do art. 217.º do CIRE), isto é, se a modificação se dá mesmo relativamente aos créditos não verificados ou não reclamados, haverá que atentar-se em que a lei atribui direitos fundamentais aos credores que vejam os seus créditos reconhecidos através de uma sentença de verificação de créditos.
De facto, o legislador veio a restringir os efeitos do incumprimento do plano previstos na al. a) do nº 1 do artigo 218.º do CIRE, “aos créditos reconhecidos por sentença de verificação de créditos ou por outra decisão judicial, ainda que não transitadas em julgado”.
Dispõe, então, o citado artigo 218.º: 1 – Salvo disposição expressa do plano de insolvência em sentido diverso, a moratória ou perdão ficam sem efeito: a) Quanto a crédito relativamente ao qual o devedor se constitua em mora, se a prestação, acrescida dos juros moratórios, não for cumprida no prazo de 15 dias após interpelação escrita pelo credor. b) Quanto a todos os créditos se, antes de finda a execução do plano, o devedor for declarado em situação de insolvência em novo processo. 2 – A mora do devedor apenas tem os efeitos previstos na al. a) do número anterior se disser respeito a créditos reconhecidos pela sentença de verificação de créditos ou por outra decisão judicial, ainda que não transitadas em julgado. 3 – (…).”
A produção dos efeitos definidos na al. a) do nº 1, decorrentes da mora do devedor por incumprimento do plano–perda da moratória ou do perdão concedidos pelo plano, se a prestação acrescida dos juros moratórios não for satisfeita no prazo de 15 dias a contar da interpelação–encontra-se expressamente limitada em relação aos créditos reconhecidos pela sentença de verificação e graduação ou outra decisão judicial, apesar de se exigir que ela haja transitado em julgado.
Como assim, com a aprovação do plano, não só o credor/reclamante poderá manter o interesse em ver reconhecido o seu crédito, sobretudo se o mesmo for litigioso–quer quanto ao respectivo montante quer quanto à sua categoria em que se insere (comum, privilegiado ou garantido), para cabal esclarecimento do modo como irá ser pago em conformidade com os demais termos estabelecidos no plano–, como, mesmo não se tratando de crédito litigioso (por ter sido reconhecido pelo administrador e não ter sido objecto de impugnação), só se o seu crédito for reconhecido por sentença de verificação se poderá valer dos efeitos previstos na al. a) do nº1 do artigo 218.º para o caso de mora do devedor.
Isto é, não só se manterá para o credor reclamante a utilidade geral de reconhecimento judicial do seu crédito (utilidade que poderia, eventualmente, lograr com a propositura de uma nova acção declarativa comum), como a sentença de verificação lhe permitirá o reconhecimento ou exercício de um direito só por essa via alcançável.
Mas, para além do reconhecido interesse para os credores na continuação do processo de verificação, entende-se que o legislador previu e quis o respectivo prosseguimento no caso de no mesmo não ter sido proferida sentença de verificação à data da homologação do plano.
Na verdade, nos termos já referidos, a redacção dada pelo legislador ao nº 3 do artigo 209.º, conclui-se que o mesmo não só admite como pressupõe o prosseguimento do apenso da verificação de créditos após a aprovação do plano até decisão final, independentemente de, à data da sua aprovação, ter sido ou não proferida sentença de verificação e graduação de créditos (pelo menos no caso de existência de impugnações à lista de credores reconhecidos).
Aliás, se assim não for não vemos, em que situações terá aplicação o estatuído nesse normativo e qual o seu conteúdo prático.
Portanto, o citado normativo só tem aquele conteúdo se, apesar da aprovação do plano, o processo de verificação de créditos puder prosseguir e por isso, manda o legislador que naquela plano se observem cautelas para o caso da eventual procedência das impugnações da lista de credores reconhecidos ou dos recursos interpostos dessa sentença, ou seja, a referência àquelas cautelas só fazem sentido se a aprovação do plano possa ainda vir a sofrer alterações decorrentes da decisão que venha a ser proferida no âmbito daquele processo.[3]
Como assim e sob pena de o estatuído no nº 3 do já citado artigo 209.º do CIRE ficar esvaziado de conteúdo, terá de entender-se que, de facto, o processo de verificação de créditos terá de prosseguir os seus regulares termos até á decisão final. Segundo.
Cremos que o encerramento do processo por aprovação do plano não acarreta a extinção do processo de verificação de créditos no caso de neste não ter sido ainda proferida sentença.
Dúvidas não existem que o artigo 233.º, nº 2 al. b) do CIRE, já atrás transcrito, apresenta uma redacção dúbia, sendo que, analisando as decisões que têm vindo a ser proferidas sobre tal matéria, podemos encontrar três interpretações distintas:
- No Acórdão de 29-11-2011[4] desta Relação entendeu-se que o encerramento do processo por aprovação do plano de insolvência, não acarreta a extinção do apenso da verificação e graduação de créditos, que deverá continuar até decisão final.
- No Acórdão de 19-02-2013[5], do Tribunal da Relação de Guimarães, considerou-se que o encerramento do processo de insolvência antes do rateio final, importará sempre a extinção da instância nos processos de verificação e graduação de créditos em que não tenha sido proferida sentença;
- No Acórdão de 16-04-2013[6], do Tribunal da Relação de Coimbra, considerou-se que, em tal caso–encerramento do processo de insolvência antes do rateio final sem que tenha sido proferida sentença de verificação–, o prosseguimento das acções de verificação só terá lugar mediante requerimento dos respectivos autores no prazo de 30 dias.
Por nossa parte, tendemos para acompanhar a posição sustentada no Acórdão desta Relação de 15/10/2013.[7]
Na verdade, como se diz no citado Acórdão “analisando a actual redação al. c) do nº2 do art. 233º, resultante da alteração que lhe foi introduzida pelo DL 200/2004, de 18 de Agosto, e motivada pela circunstância de se passar a permitir que a assembleia de aprovação do plano se reúna para aprovação do plano de insolvência logo após o termo do prazo para a impugnação da lista de credores–teremos de concluir que a mesma resulta necessariamente de um lapso do legislador”.
A mencionada al. b) do nº 2 do artigo 233.º do CIRE determina as consequências do encerramento do processo de insolvência, ocorrido antes do rateio final, relativamente a dois tipos de apensos do processo de insolvência:
a) verificação e graduação de créditos;
b) restituição e separação de bens já liquidados.
Ora, diante da referida redacção do preceito, seria líquido que o encerramento do processo de insolvência antes do rateio final determinaria, em regra, a extinção quer dos processos de verificação de créditos, quer de restituição e separação de bens já liquidados, excepcionando o legislador as duas seguintes situações:
a) ter sido já proferida a sentença verificação e graduação de créditos prevista no art. 140º, caso em que prosseguem até final os recursos interpostos dessa sentença;
b) as acções cujos autores assim o requeiram, no prazo de 30 dias.
Acontece que, sendo o propósito do legislador, com a nova redacção, excepcionar o encerramento decorrente da aprovação do plano, submetendo-o a um regime distinto do previsto em geral para os demais casos de encerramento do processo após o rateio final, ao entrelinhar tal excepção “encerramento por aprovação do plano de insolvência” no meio da primeira excepção aí anteriormente consagrada, entre “ter já sido proferida a sentença de verificação de créditos prevista no art. 140º” e “caso em que os recursos prosseguem até final”, tornou, como muito bem se diz no citado acórdão e que aqui seguimos de perto, tal norma ininteligível e sujeita às mais diversas interpretações.
Se já tiver sido proferida sentença de verificação e graduação de créditos, dúvidas não se levantam de que, quer o encerramento decorra de outras causas, quer decorra da aprovação de um plano de insolvência, a solução manter-se-á mesma: os recursos dessa sentença prosseguirão até final.
As dúvidas suscitam-se, tão só, no caso de encerramento do processo de insolvência antes do rateio final sem que tenha sido proferida sentença de verificação de créditos.
Todavia, não poderá de deixar se atribuir algum sentido útil à entrelinhada excepção respeitante ao “encerramento decorrente da aprovação do plano”. E, uma vez que na hipótese de ter sido proferida sentença de verificação de créditos o respectivo prosseguimento já se encontrava assegurado pela primeira excepção constante de tal alínea, o aditamento introduzido só pode ter o significado de, com o mesmo, se pretender a continuação do processo de verificação (ou de acção ulterior de créditos) até à decisão final. Interpretação que melhor se compagina com os efeitos que à sentença de verificação são atribuídos no caso de aprovação de um plano de insolvência.[8]
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Concluindo, o encerramento do processo de insolvência na decorrência da aprovação do plano de insolvência, não tem como consequência obrigatória a extinção da instância no apenso de reclamação de créditos, quando ainda não foi proferida sentença de verificação e graduação de créditos, devendo a al. b) do n.º2 do art. 233º do CIRE ser interpretada de forma a que, quando a sentença a proferir tenha interesse para a estabilização do passivo do devedor e/ou seja relevante para a execução do plano de insolvência, o apenso de verificação de crédito tem de prosseguir os seus termos até à decisão final.
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Destarte, haverá, pois, que dar provimento aos recursos interpostos, impondo-se, por isso, a revogação da decisão recorrida, devendo, assim, o processo da reclamação de créditos seguir os posteriores termos processuais até à decisão final.
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IV-DECISÃO
Pelos fundamentos acima expostos acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em revogar a decisão e, consequentemente, determina-se que o processo de reclamação de créditos siga os seus regulares termos até que seja proferida a decisão final.
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Custas pela massa insolvente (artigo 304.º do CIRE).
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Porto, 28 de Abril de 2014
Manuel Domingos Fernandes
Caimoto Jácome
Macedo Domingues
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[1] Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, reimpressão de 2009, págs. 772 a 773.
[2] Obra citada, pág. 773.
[3] Aliás, esta norma tem alguma semelhança com o que se estatuía no artigo 1384.º no âmbito do processo de inventário, a propósito da entrega dos bens antes da sentença transitar em julgado.
[4] In www.dgsi.pt.
[5] In www.dgsi.pt.
[6] In www.dgsi.pt.
[7] In www.dgsi.pt.
[8] No sentido de que a letra da lei, aparentemente, permite também o prosseguimento das acções de verificação ulterior de créditos, se pronunciam Ana Prata, Jorge Morais Carvalho e Rui Simões, sem que adiantem, contudo, qualquer novo argumento à discussão gerada à volta da interpretação de tal norma–“Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado”, Almedina 2013, pág. 645.