INCAPACIDADE PERMANENTE PARCIAL
INCAPACIDADE PERMANENTE ABSOLUTA PARA O TRABALHO HABITUAL
JUNTA MÉDICA
AUTO DE TENTATIVA DE CONCILIAÇÃO
Sumário

I - Se o juiz ao aceitar o resultado do exame por junta médica que apenas atribuiu à sinistrada uma IPP mas já não IPATH (ao contrário do que ocorreu no exame singular) está a considerar que a mesma apenas está afetada daquela, pronunciou-se sobre a natureza e grau de incapacidade que afetam a sinistrada, razão pela qual não estamos perante uma nulidade da sentença por omissão de pronúncia.
II – Não se pode considerar assente um facto relativamente ao qual não ficou consignado no auto de tentativa de conciliação que houve acordo sobre o mesmo, nem o silêncio pode ser interpretado como tal.
III – Nos termos do nº 8 das Instruções Gerais da TNI, o resultado dos exames é expresso em ficha apropriada, devendo os peritos fundamentar todas as suas conclusões.
IV - Se o relatório do exame por junta médica não permite ao tribunal concretizar o grau de incapacidade a atribuir, nomeadamente, se a sinistrada se encontra afetada de IPATH, não constam do processo todos os elementos que nos permitam apreciar esta questão, face à insuficiência da matéria de facto, impõe-se a sua ampliação e consequente anulação da decisão recorrida – n.º 4, do artigo 662.º, do C.P.C..

Texto Integral

Apelação n.º 120/12.9TTMAI.P1
Tribunal do Trabalho de Vila Nova de Gaia (2º juízo)
___________________________________________
Relatora – Paula Maria Roberto
Adjuntos – Desembargadora Fernanda Soares
– Desembargador Domingos Morais

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

I - Relatório

B…, S.A., com sede em Lisboa,

participou o presente acidente de trabalho de que foi vítima C…, ocorrido em 04/02/2011, ao serviço da entidade patronal D…, Ldª, tomadora do seguro.

*
Procedeu-se à realização de exame médico no INML e no qual foi atribuída à sinistrada uma IPP de 45,4938% e IPATH.
*
Teve lugar a tentativa de conciliação, conforme auto de fls. 392 a 394 e na qual não foi obtido acordo porque a Companhia de Seguros não aceitou o grau de incapacidade fixado pelo perito médico nem os períodos relativos às incapacidades temporárias constantes do relatório do INML.
*
A Companhia de Seguros B…, veio requerer a realização de exame por junta médica para fixação de incapacidade, ao abrigo do disposto no n.º 2, do artigo 138.º, do C.P.T..
*
Procedeu-se a exame por junta médica conforme auto de fls. 430 a 431 e no qual foi atribuída à sinistrada uma IPP de 43%, sem mais.
*
Foi, depois, proferida sentença (fls. 434 a 436) que decidiu, além do mais, que a sinistrada se encontra afetada de uma IPP de 43%, condenando a Ré a pagar-lhe a quantia de € 103,60 a título de transportes e a pensão anual e vitalícia, com efeitos desde 14/04/2012, no montante de € 2.559,13, atualizada em a partir de 01/01/2014 para € 2.643,87.
*
A sinistrada, notificada desta sentença, interpôs o presente recurso, cuja alegação concluiu da seguinte forma:
“1.ª - O presente recurso visa a arguição da nulidade da douta sentença, nos termos do disposto nos artigos 77.º do CPT e 615.º, n.º 1, d) do CPC.
2.ª - O presente recurso visa também impugnar a decisão proferida quanto à matéria de facto dada como provada pelo ilustre julgador a quo, nos termos do artigo 662.º, n.º 1 do C.P.C. e bem assim a sua repercussão na aplicação do direito na decisão final e respectivo cômputo do montante indemnizatório a atribuir à sinistrada, uma vez que este não considerou provada a afectação da sinistrada de uma Incapacidade Permanente Absoluta para o Trabalho Habitual (de ora em diante IPATH), conforme ficou assente no auto de tentativa de conciliação e consequentemente não lhe deu o competente rebate no âmbito da decisão.
3.ª - Sem conceder e por mera hipótese académica, o presente recurso visa igualmente impugnar a decisão proferida quanto à matéria de facto dada como provada pelo ilustre julgador a quo, nos termos do artigo 662.º, n.º 1 do C.P.C., e bem assim a sua repercussão na aplicação do direito na decisão final e respectivo cômputo do montante indemnizatório a atribuir à sinistrada, uma vez que, mesmo que se entenda não assente a existência de uma IPATH na data da tentativa de conciliação, a verdade é que no âmbito da junta médica requerida nos autos, nem a Seguradora, nem o ilustre julgador a quo lograram quesitar de molde a suscitar junto da junta médica esta questão e como tal, jamais esta poderia efectuar a contraprova deste facto no laudo que produziu, conforme detalharemos adiante.
4.ª - Mais uma vez sem conceder, se não se considerar que alguma das duas hipóteses anteriores merece provimento, o presente recurso visa do mesmo modo impugnar a decisão proferida quanto à matéria de facto dada como provada pelo ilustre julgador a quo, nos termos do artigo 662.º, n.º 2, c) do C.P.C., e bem assim a sua na aplicação do direito na decisão final e respectivo cômputo do montante indemnizatório a atribuir à sinistrada, porquanto, o ilustre julgador a quo, quer por via de omissão de pronúncia do relatório da junta médica quanto à questão da IPATH, quer por falta de quesito que perguntasse a esta última quanto a essa questão, não tinha elementos ou meios de prova suficientes que suportassem a decisão de facto e de direito proferida.
5.ª - Nos termos do Artigo 615.º do C.P.C., é nula a sentença quando, entre outras coisas, (alínea d)), o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar.
6.ª – De facto, à data da tentativa de conciliação, constava dos autos que a sinistrada além duma IPP de 45,4938%, se achava afectada de uma Incapacidade Permanente Absoluta para o Trabalho Habitual (IPATH).
7.ª - Em sede de tentativa de conciliação, a seguradora não se pronunciou expressamente quanto a esta questão, pelo que esta matéria de facto, ficou definitivamente assente nesta fase processual. Mas mesmo que assim não se entenda, a verdade é que no âmbito da formulação dos quesitos para a junta médica, não se vislumbra em que medida a questão haja sido colocada à apreciação da mesma.
8.ª - Como tal, apenas consta dos autos o que acerca deste facto (a IPATH) foi dito pelo INML e que não foi desdito ou afastado por qualquer outro elemento ou meio de prova.
9.ª - Nesse sentido, entendemos que a sentença enferma de nulidade nos termos do 615.º, n.º 1, d) do C.P.C., uma vez que o julgador deixou de se pronunciar quanto a esta questão, ainda que não a julgasse como facto provado, e que é de toda a relevância, já que a natureza da incapacidade, eu no caso vertente será uma IPATH, redefine os termos em que a sentença em apreço deveria ter sido proferida.
10.ª - Nesse sentido, impõe-se que o ilustre julgador venha suprir a nulidade em apreço, nos termos supra propostos, isto é, venha pronunciar-se quanto à questão da IPATH, suscitada nos autos pela averiguação do INML.
11.ª - De acordo com a douta sentença têm interesse para as presentes alegações os factos que de acordo com o tribunal a quo foram dados como provados.
12.ª - A matéria de facto incorrectamente julgada:
- É portadora de uma incapacidade permanente parcial (IPP) de 43,00 % (0,43);
(Seria o ponto 8) seguindo a numeração da Sentença recorrida)
13.ª - Dos autos de acidente de trabalho constam elementos de prova que implicam decisão diversa da recorrida – artigo 662.º, n.º 1 do C.P.C.
14.ª - Não se conforma a ora recorrente com a decisão recorrida, pois entende que da prova efectivamente produzida nos autos resultaria necessariamente provada matéria diferente daquela que foi dada como definitivamente assente pelo julgador a quo, na douta sentença.
15.ª - A decisão de primeira instância, quanto à matéria de facto, padece de incorrecções de julgamento e insuficiência, porque o julgador não leva em linha de conta a totalidade da prova produzida nos autos, aplicando consequentemente erradamente a Lei e as orientações jurisprudenciais e assim, atenta a prova produzida nos autos, desde logo na tentativa de conciliação, outra deveria ter sido aquela matéria que o ilustre tribunal a quo deu como provada.
16.ª - Pelas razões e fundamentos que adiante melhor se explicitarão, e sem prejuízo da modificação da decisão sobre a matéria de facto que, no caso em apreço, se impõe, considera a recorrente que o Tribunal a quo fez errada aplicação e interpretação da lei e não atendeu sequer às normas legais aplicáveis à situação sub judice, motivo por que a douta sentença deve ser revogada, devendo ser proferida nova decisão nos termos que melhor se referirá.
17.ª - Após a instrução preliminar do processo, o Ministério Público, solicita a realização de perícia médica - cfr. art.º 101.º, n.º 1, do CPT, resultando as seguintes conclusões:
“- A data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 13 de Abril de 2012;
- Incapacidade temporária absoluta fixável num período total de 824 dias;
- Incapacidade permanente parcial fixável em 45,4938%;
- As sequelas atrás descritas são causa de incapacidade permanente absoluta para actividade profissional habitual.” – Vide relatório médico-legal do INML.
18.ª - Realizada que seja a perícia médica, o Ministério Público determina a realização de tentativa de conciliação, o que de facto aconteceu e teve lugar em 21 de Janeiro de 2014.
19.ª - Chegados ao momento da realização da tentativa de conciliação, da matéria que constava nos autos que foi exarada expressamente no corpo do auto de tentativa de conciliação, constavam designadamente estes mesmos factos:
“… encontra-se a sinistrado afectada de uma incapacidade permanente parcial (IPP) de 45,4938%, com incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual (I.P.A.T.H.)…”
20.ª - De acordo com a globalidade dos mesmos, aceitava a sinistrada conciliar-se, o que fez, remetendo genericamente para os “…termos acima propostos.”, mas no que à incapacidade dizia respeito, especificou sem quaisquer reservas, que aceitava “… o grau de desvalorização fixado pelo perito médico e respectiva I.P.A.T.H…”, pelo que, a sinistrada, especificou os exactos termos da sua conciliação, destrinçando até, e ser, entre grau de incapacidade e natureza da incapacidade para efeito dum acordo expresso e sem equívoco.
21.ª - Por seu turno, a seguradora, através do seu representante, aceitou a existência do acidente (como de trabalho naturalmente), o salário em causa e a sua transferência para si, o nexo de causalidade entre as lesões e o acidente e as despesas que a sinistrada suportou em deslocações.
22.ª - No que aos factos não aceites diz respeito, apenas referiu que não aceitava o grau de incapacidade fixado pelo perito médico, bem como os períodos relativos às incapacidades temporárias apuradas pelo INML, acrescentando que, nessa medida, (grau da incapacidade e períodos relativos às incapacidades temporárias apuradas pelo INML) iria requerer a realização de junta médica.
23.ª - Dito isto, muito embora se trate duma não conciliação, de acordo com o escopo da lei processual laboral e com o caso concreto, o que está aqui em causa é uma conciliação parcial entre as partes. Algo que ainda assim, não esgota esta diligência como o seu único fim, pois de acordo com o disposto no artigo 112.º do CPT, mais do que uma chance de acordo global e final entre as partes, pretende-se que o litígio a debater na fase contenciosa do processo se circunscreva unicamente às questões de facto em relação às quais não se logrou obter o acordo dos interessados no decurso da fase conciliatória, excluindo-se pois, do debate contencioso todas as questões de facto já aqui admitidas por acordo.
24.ª - Naturalmente, nesta fase, e para a(s) parte(s) que discordem acerca de determinado facto constante dos autos, estatui a lei um ónus de impugnação expressa e especificada dos mesmos, algo que a seguradora não fez, pois tão somente discordou do grau da incapacidade, isto é, da IPP, que mais não é que a quantificação do dano corporal em termos percentuais, bem como dos períodos relativos às incapacidades temporárias apuradas pelo INML.
25.ª - Ora, coisa diferente do grau da incapacidade, isto é, da IPP, é a componente da natureza da incapacidade, como tal, ao não aceitar o grau da incapacidade em questão, a seguradora apenas coloca em causa a percentagem de IPP atribuída à sinistrada e não se a mesma tem a natureza de incapacidade para o trabalho habitual ou não.
26.ª - De facto, uma I.P.A.T.H., nada mais é que uma incapacidade de 100% (absoluta) para o trabalho habitual, isto é, a sinistrada não pode mais exercer o trabalho habitual, mas poderá exercer outro qualquer com uma incapacidade (agora parcial, no caso concreto, de 45,4938%).
27.ª - Queremos com isto dizer, que não fosse a incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual, e a sinistrada efectivamente estaria apenas afectada de uma IPP (Incapacidade Permanente Parcial) para o seu trabalho habitual ou qualquer outro, pelo que a existência de uma I.P.A.T.H., é necessariamente coisa diferente e independente da IPP, e que apenas se conjuga com esta para se estabelecer o quadro geral definitivo do dano corporal de que padece à sinistrada.
28.ª - Assim, de acordo com o ónus legal que impende sobre quem não se concilia, a seguradora deveria ter referido que além (designadamente) do grau da incapacidade atribuído à sinistrada, não aceitava igualmente a respectiva I.P.A.T.H., facto autónomo da IPP, dado que são conceitos jurídicos necessariamente diferentes.
29.ª - A lei não prevê uma impugnação genérica dos factos, mas antes uma que é necessariamente especificada, até porque como se referiu diversas vezes já, o escopo da artigo 112.º do CPT, além do eventual acordo entre partes, pretende-se que o litígio a debater na fase contenciosa do processo se circunscreva unicamente às questões de facto em relação às quais não se logrou obter o acordo dos interessados no decurso da fase conciliatória, excluindo-se pois, do debate contencioso todas as questões de facto já aqui admitidas por acordo. Só assim será possível ao juiz, na fase contenciosa e no despacho saneador, considerar na matéria assente esses mesmos factos - como se estatui no art.º 131.º, n.º 1 al. c), do CPT -, para posteriormente os tomar em consideração na sentença final - cfr. art.º 135.º, do CPT.
30.ª - Nesta medida, e voltando aos exactos termos do que disse a seguradora, esta apenas não aceitou taxativamente o grau da incapacidade, bem como os períodos relativos às incapacidade temporárias. E muito embora se possa dizer que a seguradora também não aceitou taxativamente a existência da I.P.A.T.H., a lei integra esta questão, ao obrigar as partes a declararem expressa e especificadamente os exactos factos sobre os quais aceitam ou não conciliar-se.
31.ª – Nesse sentido, só pode resultar como consequência, que no silêncio da parte quanto a um dado facto constante dos autos à data da tentativa de conciliação, considera-se que confessa essa mesma matéria.
32.ª - Mais ainda, não se diga, por hipótese que, como a lei exige acordo expresso entre as partes, e não houve tomada de posição expressa de uma delas sobre dado facto, não estamos perante uma confissão por acordo e portanto, estamos perante uma não conciliação tácita.
33.ª - É que, no outro extremo do espectro jurídico, de acordo com o ónus de impugnação que necessariamente cabe a quem não aceita conciliar-se sobre dado facto, a mesma deverá ser também inequívoca, e no mínimo ser dirigida àqueles factos efectivamente elencados na proposta de conciliação (como era o caso da I.P.A.T.H.) com os quais se não concorda.
34.ª – Mais ainda, a seguradora estava já avisada deste facto, quando foi notificada da tentativa de conciliação, dado que foi notificada também do relatório do INML com a devida antecedência e como bem se sabe, além de possuir serviços que analisem as questões médicas, possuem quadros jurídicos próprios ou avençados que analisem, por sua vez, as questões jurídicas que decorrem das primeiras, em função do conteúdo de um tal documento, perante a fase processual respectiva.
35.ª - Isto para dizer que não há a verdadeira igualdade entre sinistrada e seguradora, dada a desproporção de meios à disposição de uma outra, pelo que, é de exigir à seguradora que aja com a precisão jurídica que a sua dimensão permite, não sendo de admitir da sua parte imprecisões e ambiguidades, que não são de admitir sequer à sinistrada (um mero particular) à luz da lei.
36.ª - O ónus que a lei faz impender sobre as partes, implicava que a seguradora, na hora de não se conciliar referisse expressa e especificadamente qual/quais os factos sobre os quais não se conciliaria, o que esta não fez e nessa medida, fosse qual fosse a razão pela qual o não fez, confessou o facto.
37.ª - Ou seja, no tocante àquele facto sobre o qual não se pronunciou, no caso concreto a existência de uma I.P.A.T.H., a seguradora admitiu-o por acordo. E de facto, tem vindo a ser jurisprudencialmente entendido que a admissão por acordo desses factos equivale, em suma, a uma confissão judicial espontânea (por todos, cfr. Ac. do STJ de 30.06.2004, proc.º n.º 04S1506, disponível em www.dgsi.pt), fazendo prova plena dos mesmos para todos os efeitos legais.
38.ª - Como consequência, somos a afirmar que de acordo com o disposto no artigo 662.º, n.º 1 do C.P.C., se impõe a anulação da sentença recorrida e a sua substituição por outra que espelhe a alteração da matéria de facto sugerida, nos moldes que infra referiremos.
Sem conceder e para o caso de assim não se entender,
39.ª - Analisando-se a questão em crise numa outra perspetiva, vejamos, posteriormente à realização da tentativa de conciliação e conforme se propôs fazer veio a seguradora apresentar requerimento, solicitando a realização de Junta Médica e onde formulou quesitos a responder pela mesma e que conformaram o âmbito de tal diligência.
40.ª - O ilustre tribunal a quo, no despacho que admite tal requerimento, indefere, porém, liminarmente, os quesitos 1.º a 5.º e admitindo os quesitos 6.º a 10.º do requerimento da seguradora, formulando em seguida os seus quesitos, designadamente e para o que aqui importa:
2.º Quais as sequelas que a sinistrada apresenta na sequência das lesões sofridas?
3.º Tais sequelas determinam para a sinistrada alguma incapacidade?
4.º Se sim, qual o grau dessa incapacidade?
41.ª - Realizou-se a dita Junta Médica em 31 de março de 2014, a qual entendeu que para responder aos referidos quesitos, seria necessário desdobrar-se em duas juntas médicas de especialidade (oftalmologia e psiquiatria).
42.ª - As referidas juntas medicas de especialidade tinham como enquadramento necessariamente a matéria contida nos quesitos formulados indicado no respectivo despacho judicial, pelo que, quer as juntas de especialidade, quer a junta médica original jamais poderiam responder a outras questões que não as formuladas pelas partes e pelo tribunal.
43.ª – Desse modo, não estaria em causa a questão da I.P.A.T.H., até porque nenhum quesito formulado pela seguradora ou pelo tribunal, questiona concretamente os srs. peritos médicos da junta médica requerida, acerca da existência ou não de uma I.P.A.T.H.
44.ª - Assim, e feita esta ressalva, diga-se que, os quesitos da seguradora, deveriam ter sido formulados de modo a permitir prova/contraprova dos factos sobre os quais não aceitava conciliar-se, e de facto, nenhum quesito por si formulado questiona a Junta Médica acerca da natureza da incapacidade que afecta a sinistrada!
45.ª – Diga-se o mesmo dos quesitos formulados pelo ilustre tribunal a quo, pois não logrou quesitar de molde a perguntar à junta médica acerca da verificação da existência ou não, de uma IPATH.
46.ª - Consequentemente, ainda que se concedesse quanto ao facto de ter ficado assente ou não, a existência da I.P.A.T.H., em sede de acordo parcial na tentativa de conciliação, a verdade é que, também na fase contenciosa, concretamente em sede de junta médica, não estava em causa a apreciação da existência ou não de I.P.A.T.H., simplesmente porque, os quesitos formulados não eram idóneos a perguntar directa ou indirectamente à junta médica àcerca da existência de I.P.A.T.H.,
47.ª - Assim, o único quesito específico formulado quanto à incapacidade de que padecia a sinistrada, reporta-se, como se constacta, ao grau dessa mesma incapacidade e grau de incapacidade, não compreende em si mesmo, enquanto conceito jurídico e médico-legal, o conceito de natureza da incapacidade, nem com este se confunde.
48.ª - Como tal, deveria ter sido formulado um quesito específico sobre a existência de I.P.A.T.H., ou pela seguradora, ou pelo tribunal a quo, ou no limite, deveria ter sido perguntado se a incapacidade de que padecia/padece a sinistrada, a impedia absolutamente de exercer a actividade habitual, dado que só assim se lograria obter da junta médica conclusão médico-legal idónea, a colocar em causa ou não a conclusão do INML quanto à existência de I.P.A.T.H. e nessa medida, a obter-se uma resposta conclusiva da referida junta.
49.ª - Não tendo sido assim, não poderá dizer-se de boa-fé, que em algum momento deste processo foi efectuada contraprova de que a sinistrada padece de I.P.A.T.H., além da IPP que lhe foi atribuída.
50.ª - Como consequência, somos a afirmar que de acordo com o disposto no artigo 662.º, n.º 1 do C.P.C., se impõe a anulação da sentença recorrida e a sua substituição por outra que espelhe a alteração da matéria de facto sugerida, nos moldes que infra referiremos.
51.ª - De acordo com o supra exposto, o ponto da matéria de facto supra referido como incorrectamente julgado deveria ter a seguinte redacção:
- É portadora de uma incapacidade permanente parcial (IPP) de 43,00 % (0,43) com incapacidade absoluta para o trabalho habitual (I.P.A.T.H.);
Sem conceder e para o caso de assim não se entender,
52.ª - Cremos que deverá ser anulada a decisão recorrida e ser alterada a matéria de facto em apreço, nos termos do artigo 662.º, n.º2, c) do C.P.C.
53.ª – Ora, podemos enquadrar a situação presente nos termos da norma supra referida se se perspectivar a questão de uma de duas formas:
A. Ou os quesitos formulados à junta médica quer pela seguradora, quer pelo ilustre tribunal a quo são idóneos a colocar em questão a existência de I.P.A.T.H. junto da primeira;
B. Os quesitos formulados à junta médica quer pela seguradora, quer pelo ilustre tribunal a quo não são idóneos a colocar em questão a existência de I.P.A.T.H. junto da primeira;
54.ª - Dependendo de qual das hipóteses se equacione, diferente será a solução fornecida pelo normativo indicado.
55.ª - Nesse sentido, a primeira hipótese implica que o problema de saber se a sinistrada padece de uma I.P.A.T.H., radica na ausência de resposta da junta médica quanto a este ponto, já que não resulta dos diversos autos de junta médica que a esta questão tenha sido análisada pelos senhores peritos, incluindo nas perícias de especialidade (oftalmologia e psiquiatria), e muito menos que tenham dado resposta a esta questão concreta, como resulta da análise do teor dos ditos autos.
56.ª - A decisão da 1ª instância que fixa a natureza e grau de incapacidade (no caso em apreço, apenas fixou o grau de incapacidade) é sindicável pela Relação, pelo que as deficiências e insuficiência, designadamente por falta de fundamentação, do laudo da junta médica, na medida em que se refletem na decisão que o acolheu, como impossibilitam a reapreciação da matéria de facto quanto à I.P.A.T.H. e a consequente decisão de direito, determinam, a anulação da sentença.
57.ª - Ora, o meio de prova constituído pela junta médica realizada nos autos de acidente de trabalho, apresenta-se omisso quanto a esta matéria, o que impede a formulação de um juízo sobre este concreto ponto da matéria de facto, implicando a sua repetição quanto a esta, e apenas esta questão da I.P.A.T.H., à qual a junta médica deverá dar resposta autónoma e inequívoca – Artigo 662.º, n.º 2, c) do C.P.C..
58.ª - Em função de tal resposta e anulada que seja a decisão recorrida, deverá o tribunal a quo proferir nova decisão, a qual espelhe a resposta/esclarecimento da junta médica quanto à I.P.A.T.H..
59.ª - Na segunda hipótese, o problema de saber se a sinistrada padece de uma I.P.A.T.H. radica inversamente na falta de quesito próprio no qual se pergunte expressa e inequivocamente à junta médica da afectação da sinistrada de uma I.P.A.T.H..
60.ª - Assim sendo, estamos perante a necessidade de uma ampliação da matéria de facto, no sentido de ser formulado um novo quesito autónomo perguntando à junta médica quanto a esta questão, o qual teria a seguinte formulação:
A sinistrada encontra-se afectada de uma incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual (I.P.A.T.H.)?
61.ª - Em função de tal resposta e anulada que seja a decisão recorrida, deverá o tribunal a quo proferir nova decisão, a qual espelhe a resposta da junta médica a este quesito concreto – Artigo 662.º, n.º 2, c) do C.P.C..
Termos em que, deve a decisão recorrida ser revogada na medida acima assinalada, assim se fazendo inteira JUSTIÇA!!
*
A apresentou resposta formulando as seguintes conclusões:
“I. sobre a nulidade da decisão:
1. O recorrente alega a nulidade da douta sentença proferida, fundamentando a pretensa nulidade no facto de, à data da tentativa de conciliação, ter sido determinado pelo INML que, para além da incapacidade parcial permanente de 45,4948%, a sinistrada “se achava afetada de uma incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual” (IPATH).
2. Esta alegação de nulidade estaria fundamentada na pretensa confissão tácita, pela seguradora, da existência de IPATH em sede de tentativa de conciliação, o que estaria aliado à aduzida inexistência de quesitos, na junta médica requerida pela aqui exponente, que digam respeito à existência de IPATH;
3. É facto que, nos termos do disposto no artigo 615.º al. d) do Código do Processo Civil, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar. De acordo com o disposto no artigo 607.º n.º 4 do Código do Processo Civil (CPC), aplicável de forma subsidiária ao caso em análise, na “fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência.”
4. Para que uma sentença seja considerada nula, por omissão de pronúncia, não basta que não se pronuncie sobre um facto, mas sim, sobre uma questão que devesse apreciar. A nulidade de sentença por omissão de pronúncia refere-se, pois, a questões e não a razões ou argumentos invocados pela parte ou pelo sujeito processual em defesa do seu ponto de vista, o que sucede no caso em análise.
5. “São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzido pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão.” – Código de Processo Civil anotado, vol. V, pág. 143.
6. In casu, a inclusão, ou não, da referência à IPATH que era referida no relatório de junta médica, na douta sentença não é essencial para a decisão da presente causa, atendendo à natureza da mesma (acidente de trabalho) e, por isso, não enferma aquela com nulidade, sendo, apenas, um argumento proferido pelo recorrente que em nada altera o sentido da decisão.
7. A questão da existência de IPATH não ficou admitida por acordo em sede de tentativa de conciliação, uma vez que a aqui exponente não admitiu qualquer consequência no que tange a incapacidade da sinistrada.
8. Por força da não conciliação entre as partes em sede de tentativa de conciliação, foi requerida a realização de uma junta médica com vista à fixação da incapacidade da sinistrada.
9. A confissão é o reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária – cfr. art. 352.º do Código Civil (CC). In casu, estaríamos perante uma situação de confissão judicial, na sua modalidade prevista no artigo 355.º n.º 3 do Código Civil. Como previsto no artigo 356.º CC, a “confissão judicial espontânea pode ser feita nos articulados, segundo as prescrições da lei processual, ou em qualquer outro ato do processo, firmado pela parte pessoalmente ou por procurador especialmente autorizado.” O que, no caso sub iudice, não sucedeu.
10. Sublinha-se que a B…, em sede de tentativa de conciliação declarou que “aceita a existência do acidente, aceita o salário acima referido e para si transferido, aceita o nexo de causalidade entre as lesões e o acidente, aceita pagar as despesas com transportes ao INML e a este Tribunal no montante acima referido. Porém não aceita o grau de incapacidade fixado pelo perito médico bem como os períodos relativos às incapacidades temporárias constantes do relatório do INML pelo que vai requerer Junta Médica.” – vide auto de tentativa de conciliação.
11. Não há qualquer confissão tácita da existência de IPATH, uma vez que, por força da letra e ratio do disposto no artigo 112.º CPT, não pode ser valorado o silêncio das partes como aceitação.
12. Quanto ao valor das declarações da B… em sede de tentativa de conciliação, o acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 3.3.1998 disponível in BMJ, é imprescindível ao expressar que “tendo a seguradora, no auto de não conciliação, apenas discordado do grau de desvalorização atribuído pelo perito médico ao sinistrado, não pode entender-se que tenha aceite a incapacidade para o trabalho habitual declarada por aquele mesmo perito, porque se tivesse havido acordo sobre esse facto devia o mesmo ter sido exarado no respetivo auto, pois o artigo 114.º n.º 1 do Código do Processo Trabalho não permite a leitura de ilações a tirar de eventuais silêncios das partes”.
iii)
13. A junta médica realizada posteriormente à tentativa de conciliação determinou a existência de uma IPP de 43%, sem alusão à existência de IPATH.
14. O Tribunal a quo, em sede de sentença, apreciou e valorou todos os meios de prova disponíveis nos autos, designadamente os enunciados pelo recorrente, e teve em conta os argumentos apresentados, especificando, na sentença, as concretas razões pelas quais a decisão foi tomada;
15. A sentença recorrida cumpre os objetivos traçados no artigo 140.º CPT, maxime a natureza e grau de incapacidade e o valor da causa, bem como a configuração do sinistro como de acidente de trabalho.
16. Partindo o apelante da nulidade do exame por junta médica, por ausência de fundamentação das respostas aos quesitos, para a nulidade da sentença, com os fundamentos referidos, a omissão de pronúncia teria ocorrido naquele exame, portanto, antes e fora da sentença.
17. Não houve qualquer omissão de pronúncia sobre questões que o Tribunal a quo devia conhecer, sendo evidente que a decisão recorrida não padece de nulidade, por omissão de pronúncia, salvo melhor opinião, não podendo deixar de se indeferir o pedido de declaração de nulidade da predita sentença.
18. O Tribunal a quo, em sede de matéria de facto, fundamentou a decisão nos factos acordados pelas partes na tentativa de conciliação e, quanto à matéria de Direito, invocou as disposições constantes de vários artigos da Lei 98/2009, de 4 de setembro.
19. Daí que e sem necessidades de mais aprofundados fundamentos se conclua no sentido de que deve ser indeferida a invocada nulidade da sentença, assim improcedendo as conclusões 1.º, 5 a 14.º do seu recurso.
II. Da correção da decisão com base na matéria de facto apurada:
20. Nos termos do disposto no artigo 112.º Código do Processo do Trabalho, “Se se frustrar a tentativa de conciliação, no respetivo auto são consignados os factos sobre os quais tenha havido acordo, referindo-se expressamente se houve ou não acordo acerca da existência e caracterização do acidente, do nexo causal entre a lesão e o acidente, da retribuição do sinistrado, da entidade responsável e da natureza e grau da incapacidade atribuída.”
21. Como se frustrou a tentativa de conciliação, no respetivo auto foram consignados os factos sobre os quais tenha havido pronúncia inequívoca e acordo – cfr. art. 112.º CPT
22. Na tentativa de conciliação que teve lugar no dia 21 de janeiro de 2014, as partes visaram atingir acordo sobre a existência de um acidente de trabalho, sua descrição, salário auferido e sua transferência integral para a entidade responsável seguradora. A entidade responsável não aceitou qualquer grau de incapacidade fixado, seja ele a título de IPP, seja a título de IPATH.
23. O Tribunal da Relação de Évora, de 3.3.1998 disponível in BMJ, de primordial interesse para o caso sub iudice, quando determina que “tendo a seguradora, no auto de não conciliação, apenas discordado do grau de desvalorização atribuído pelo perito médico ao sinistrado, não pode entender-se que tenha aceite a incapacidade para o trabalho habitual declarada por aquele mesmo perito, porque se tivesse havido acordo sobre esse facto devia o mesmo ter sido exarado no respetivo auto, pois o artigo 114.º n.º 1 do Código do Processo Trabalho não permite a leitura de ilações a tirar de eventuais silêncios das partes”.
24. Face à posição da B… na tentativa de conciliação, foi requerida a realização de uma junta médica, para a qual aquela apresentou os quesitos às matérias que pretendia ver esclarecidos pelos peritos, designadamente no que tange à fixação das incapacidades que, eventualmente, a sinistrada padeceria.
25. A B…, com o exame pericial, pretendia a fixação da amplitude e natureza da incapacidade da trabalhadora, atenta a discordância do resultado do exame médico singular, o que, necessariamente, fez com que a sinistrada fosse objeto de nova perícia (agora colegial), quer quanto à existência de IPATH, quer quanto ao grau de IPP.
26. A finalidade da junta médica é a cristalização das questões colocadas em sede de exame médico, podendo aquela alterar as conclusões apresentadas neste.
27. A recorrente não apresentou qualquer ampliação dos quesitos a serem respondidos em sede de perícia médica. De facto, a sinistrada não apresentou quaisquer quesitos.
28. O acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 21/05/2007, disponível in www.dgsi.pt, é claro ao referir que “a aceitação, pela seguradora, na tentativa de conciliação da natureza de incapacidade fixada não consubstancia qualquer declaração confessória (na medida em que apenas expressa a sua concordância com o exame pericial singular quanto à natureza e grau de desvalorização) (…)” e que “o sinistrado é que suporta o risco de ter preferido remeter a questão da incapacidade para a fase contenciosa, sabendo-se que o exame feito pela junta médica poderia dar um resultado diverso do que fora obtido na fase de conciliação e que um e outro são livremente apreciados pelo tribunal”.
29. A realização da junta médica veio, com base nos quesitos apresentados e em todos os elementos clínicos que se encontravam à disposição dos peritos, determinar o tipo e a extensão da incapacidade que a sinistrada padece por força do acidente de trabalho, tal como requerido pelos quesitos apresentados;
30. A junta médica não admite qualquer existência de IPATH, fixando, somente, no que à incapacidade diz respeito, uma IPP de 43%.
31. O exame médico colegial não poderia deixar de ter como objeto a existência, ou não, de IPATH, pois, uma vez requerido tal exame, todas as questões relativas à incapacidade (seja quanto à sua natureza, seja quanto ao grau de desvalorização) passam a controvertidas – cfr. neste sentido, Ac. Tribunal da Relação do Porto de 21/5/2007.
32. A mera realização de junta médica pressupõe, per si, a pronúncia dos peritos sobre todo o tipo de lesões que a sinistrada pudesse padecer, e, dessa forma, a “omissão” de IPATH apenas pode demonstrar a (consciente) não atribuição desse género de incapacidade à sinistrada.
33. A recorrente alega, também, que a sentença, tendo em conta os elementos factuais reunidos nos autos, não os valora corretamente, o que leva à incorreta elaboração da decisão final, por não incluir a indemnização por existência de IPATH, que era referida em sede de exame médico singular, mas não em relatório de junta médica.
34. A decisão em análise foi preferida tendo como principal fundamento fáctico o resultado da junta médica, realizada por força da não conciliação das partes, afastando a perícia médica singular elaborada anteriormente.
35. O exame de perícia médica é pressuposto essencial no âmbito de um processo de acidente de trabalho, devendo ser seguida da respetiva tentativa de conciliação.
36. A junta médica visa a confirmação dos resultados apresentados no relatório de exame médico singular, tem caráter urgente, secreto e tem obrigatoriamente de ser constituídas por três peritos para poderem validamente funcionar – cfr. art. 139.º CPT.
37. A prova pericial, conforme resulta do art. 388.º do C.P.C., tem por fim a perceção ou apreciação de factos por meio de peritos, quando sejam necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuam, ou quando os factos, relativos a pessoas, não devam ser objeto de inspeção judicial.
38. A perícia por junta médica consubstancia um exame pericial, pelo que o respetivo laudo ou relatório deve ser notificado às partes, a fim de as partes poderem exercer o direito de formular as suas reclamações, caso entendam “que há qualquer deficiência, obscuridade ou contradição no relatório pericial ou que as conclusões não se mostrem devidamente fundamentadas” – cfr. Código Processo Civil.
39. A perícia por junta médica, sendo uma forma de prova pericial, está sujeita à livre apreciação do juiz. De facto, o valor probatório das respostas dos peritos é livremente apreciado e fixado pelo tribunal - arts. 389.º do Cód. Civil e 507.º n.º 5 do C.P.C.
40. O laudo dos peritos é um meio de prova sujeito à livre apreciação do Tribunal, cabendo sempre ao julgador a valoração definitiva dos factos pericialmente apreciados, conjuntamente com as demais provas – arts. 591.º e 655.º do C.P.C.
41. In casu, a junta médica não foi impugnada pela sinistrada, nem foram requeridos quaisquer esclarecimentos ou apresentadas reclamações ao seu teor.
42. Posteriormente à notificação do relatório pericial colegial, o tribunal a quo proferiu a sentença tendo por base, em fundamentação, o predito laudo.
43. A livre apreciação da prova pericial tem contornos mais precisos/exigentes do que os postulados pela regra geral da liberdade de julgamento consagrada no art. 655.º/1 do C.P.C., cuja decisão remete para (...e se basta com) a prudente convicção do Julgador acerca de cada facto.
44. Face às suas naturais limitações científicas, e tratando-se de uma valoração eminentemente técnica, é induzido a aceitar, por via de regra, o saber técnicocientífico inerente às “legis artis” do múnus pericial.
45. No caso sub judice, a fundamentação da sentença tem por base o laudo de junta médica, sendo os limites da condenação determinados por esta. Por outro lado, a segunda perícia, embora não invalidando necessariamente a primeira, é uma perícia colegial, nela não podendo, por via de regra, intervir perito que tenha participado na primeira.
46. A junta médica destina-se a corrigir a eventual inexatidão dos resultados do exame médico singular;
47. In casu e não obstante a clara e unânime resposta dos Senhores peritos que integraram a Junta, entendeu-se que deveria prelevar o laudo do perito colegial.
48. Sempre se estranharia que, face ao objetivo da segunda perícia, (o de corrigir a eventual inexatidão dos resultados do exame singular, como já se disse), se não retirasse das respostas dadas aos quesitos aí formulados a convicção mais ou menos segura sobre a valia do juízo técnico colegial, ademais alcançado em uníssono!
49. Se dúvidas restassem do resultado da junta médica impor-se-ia a formulação de outros/novos quesitos, o pedido de esclarecimentos ou informações, afinal a confrontação do trio de peritos com o teor do primeiro exame, com vista à dissipação de qualquer dificuldade ou complexidade suscitadas pela especificidade do caso, o que o requerente não exigiu;
50. Os peritos da Junta consultaram o processo, (conferindo todos os seus elementos relevantes e observando o sinistrado, como aliás se consignou no respetivo auto), e responderam ao que concretamente se lhes perguntou.
51. Não há qualquer fundamento válido para desvalorizar o resultado da segunda perícia que, avaliando necessariamente os mesmos factos sobre que incidiu a primeira, ajuizou, por unanimidade dos seus membros, que o sinistrado não apresenta a sequela de IPATH.
52. A sentença proferida tem, por base, o relatório de junta médica, tendo fundamentado a decisão exatamente nos termos aí consagrados, no que tange à fixação da natureza e grau de incapacidade.
III. Do objeto do recurso:
53. O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, não podendo o tribunal de recurso conhecer de matéria nelas não inserida.
54. A recorrente cinge o objeto do recurso à impugnação da decisão proferida, o que, pelos argumentos supra e infra mencionados, não tem qualquer enquadramento legal.
55. Deve o presente recurso ser considerado improcedente, pelas questões trazidas pela recorrente em sede de conclusões não terem qualquer aplicabilidade.
Termos em que, deve a decisão recorrida ser confirmada nos termos supra mencionados, assim se fazendo inteira JUSTIÇA!”
*
A Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta emitiu o parecer de fls. 525 e segs., no sentido de se conceder provimento ao recurso, anulando-se a sentença recorrida.
*
A Ré recorrida, notificada do citado parecer veio oferecer a sua resposta de fls. 530 e segs..
*
Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.
*
*
II- Fundamentação.
a) - Factos provados
Os constantes do relatório supra.
E da sentença recorrida:
Além da incapacidade e da data da alta, igualmente resulta dos autos que:
1) C… foi vítima de um acidente no dia 04 de Fevereiro de 2011, quando se deslocava para casa vinda do local de trabalho, na Maia, onde prestava serviço sob as ordens e direção de D…, Lda.;
2) Tinha a categoria profissional de caixeira/empregada de mesa e auferia à data a remuneração anual de 8.502,10€ (oito mil, quinhentos e dois euros e dez cêntimos);
3) A responsabilidade infortunística encontrava-se integralmente transferida para a seguradora demandada;
4) A seguradora reconheceu o acidente como acidente de trabalho, o nexo de causalidade entre as lesões e o acidente, o salário auferido pela sinistrada à data do acidente e a sua responsabilidade na reparação, tendo aceite expressamente pagar-lhe a quantia gasta em transportes;
5) C… gastou a quantia de 103,60€ (cento e três euros e sessenta cêntimos) em transportes ao tribunal e ao INML;
6) C… nasceu em 19/10/1977 – doc. de fls. 84.
*
b) - Discussão
Como é sabido, a apreciação e a decisão dos recursos são delimitadas pelas conclusões da alegação do recorrente (artigo 639.º, n.º 1, do C.P.C., na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 41/2013 de 26/06), com exceção das de conhecimento oficioso.
Assim, cumpre apreciar as questões suscitadas pela sinistrada recorrente, quais sejam:
Nulidade da sentença por omissão de pronúncia
Impugnação da matéria de facto
Se devia ter sido formulado um quesito específico sobre a existência de IPATH e se a sua omissão e a falta de fundamentação do laudo de junta médica determina a sua repetição e a anulação da sentença.
*
questão:
Nulidade da sentença
A recorrente veio arguir a nulidade da sentença por omissão de pronúncia, cumprindo o disposto no artigo 77.º, do C.P.T. e alegando que o julgador deixou de se pronunciar sobre a IPATH que lhe foi atribuída pelo perito médico no exame do INML; que na tentativa de conciliação a seguradora não se pronunciou expressamente quanto a esta questão (devia ter referido que além da IPP não aceitava igualmente a IPATH), pelo que, a mesma ficou definitivamente assente, no silêncio da parte, considera-se que confessa essa matéria e, ainda, que mesmo que assim não se entenda a questão não foi colocada à junta médica no âmbito da formulação de quesitos.
Na verdade, a sentença é nula se o juiz deixar de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar (alínea d), do n.º 1, do artigo 615.º, do C.P.C.).
As nulidades da sentença são aquelas que consubstanciam vícios de essência da mesma.
No que respeita à omissão de pronúncia a mesma está ligada ao disposto no n.º 2, do artigo 608.º do C.P.C., segundo o qual <<o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (…)>>. Quanto ao sentido que de dar-se à expressão “questões”, como refere o Professor Alberto dos Reis[1], <<realmente uma coisa é o tribunal deixar de pronunciar-se sobre questão que devia apreciar, outra invocar razão boa ou má, procedente ou improcedente, para justificar a sua abstenção. (…).
São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão>>.
Assim, só a falta de conhecimento das verdadeiras questões e já não das razões e argumentos é que integra a citada nulidade[2].
Regressando ao caso em apreciação:
Conforme resulta do artigo 112.º, n.º 1, do C.P.T. <<se se frustrar a tentativa de conciliação, no respectivo auto são consignados os factos sobre os quais tenha havido acordo, referindo-se expressamente se houve ou não acordo acerca da existência e caracterização do acidente, do nexo causal entre a lesão e o acidente, da retribuição do sinistrado, da entidade responsável e da natureza e grau da incapacidade atribuída>>.
Compulsados os autos, mais concretamente o auto de tentativa de conciliação (fls. 392 e segs.), constatamos que pelo representante da Companhia de Seguros foi dito que: “a sua representada aceita a existência do acidente, aceita o salário acima referido e para si transferido, aceita o nexo de causalidade entre as lesões e o acidente, aceita pagar as despesas com transportes ao INML e a este Tribunal no montante acima referido.
Porém não aceita o grau de incapacidade fixado pelo perito médico bem como os períodos relativos às incapacidade temporárias constantes do relatório do INML pelo que vai requerer Junta Médica”.
Do conteúdo deste auto resulta, desde logo, que ficou expressamente consignado que a Ré seguradora não aceitava o grau de incapacidade fixado pelo perito médico do INML, sendo que, não consta do mesmo que as partes acordaram quanto ao facto de a sinistrada se encontrar afetada de IPATH.
Ora, o citado artigo 112.º, n.º 1, é claro quando refere que no auto são consignados os factos sobre os quais tenha havido acordo, referindo-se expressamente se houve ou não acordo acerca da natureza e grau de incapacidade atribuída, razão pela qual, o mesmo não pode ser entendido no sentido de que ao não ter sido feita referência à IPATH mas apenas à IPP, a Ré seguradora aceitou a primeira, pois se tivesse existido acordo sobre tal facto o mesmo devia ter ficado exarado no respetivo auto[3]. Acresce que, ao contrário do alegado pela recorrente, o silêncio da seguradora no que respeita à IPATH não pode ser interpretado como aceitação da mesma, uma vez que, o silêncio só vale <<como declaração negocial, quando esse valor lhe seja atribuído por lei, uso ou convenção>> - artigo 218.º, do C.C..
Quanto ao mais, a este propósito consta da sentença recorrida o seguinte:
“A seguradora veio requerer a reavaliação da sinistrada em junta médica (fls. 400).
Realizada esta (fls. 430 e ss.) consideraram unanimemente os Ex.mos peritos que por força do acidente sofrido, a sinistrada esteve afetada de incapacidade temporária absoluta entre a data do acidente (04/02/2011) e a data da alta (13/04/2012) e é portadora de lesões que lhe determinam uma incapacidade permanente parcial (IPP) de 43,00% (0,43).
Tendo em conta este parecer unânime dos peritos intervenientes na junta médica, as respostas aos quesitos e a respetiva fundamentação, bem como os demais elementos trazidos ao processo, nada há que habilite o tribunal a discordar da conclusão a que chegaram estes Ex.mos Peritos, pelo que é de subscrever o grau de incapacidade arbitrado pela junta médica.
Assim, considero que a sinistrada esteve afetada de incapacidade temporária absoluta entre a data do acidente (04/02/2011) e a data da alta (13/04/2012) e está clinicamente curada, mas sendo portadora da incapacidade permanente parcial (IPP) de 43,00% (0,43) desde o dia imediato ao da alta”.
Certo é, então, que a sentença recorrida não se pronunciou expressamente sobre a IPATH que foi atribuída à sinistrada pelo perito médico do INML, no entanto, não o fez porque subscreveu o grau de incapacidade arbitrado pela junta médica, ou seja, a IPP de 43%, sem mais.
Desta forma, entendemos que não estamos perante uma omissão de pronúncia tal como a enunciámos supra, na medida em que, o juiz ao aceitar o resultado do exame por junta médica que apenas atribuiu à sinistrada uma IPP mas já não IPATH (ao contrário do que ocorreu no exame singular) está a considerar que a mesma apenas está afetada daquela, pronunciando-se, assim, sobre a natureza e grau de incapacidade que afetam a sinistrada.
Saber se a junta médica se devia ter pronunciado sobre a existência de IPATH é outra questão que apreciaremos de seguida.
Improcede, assim, a nulidade da sentença invocada pela recorrente.

Impugnação da matéria de facto
A sinistrada recorrente alega que pretende impugnar a matéria de facto dada como provada, uma vez que não foi considerado provado que se encontrava afetada de uma IPATH, conforme ficou assente no auto de tentativa de conciliação.
Como já referimos na análise da anterior questão, do conteúdo do auto de conciliação resulta, desde logo, que ficou expressamente consignado que a Ré seguradora não aceitava o grau de incapacidade fixado pelo perito médico do INML, sendo que, não consta do mesmo que as partes acordaram quanto ao facto de a sinistrada se encontrar afetada de IPATH.
Ora, o citado artigo 112.º, n.º 1, é claro quando refere que no auto são consignados os factos sobre os quais tenha havido acordo, referindo-se expressamente se houve ou não acordo acerca da natureza e grau de incapacidade atribuída, razão pela qual, o mesmo não pode ser entendido no sentido de que ao não ter sido feita referência à IPATH mas apenas à IPP, a Ré seguradora aceitou a primeira, pois se tivesse existido acordo sobre tal facto o mesmo devia ter ficado exarado no respetivo auto[4]. Acresce que, ao contrário do alegado pela recorrente, o silêncio da seguradora no que respeita à IPATH não pode ser interpretado como aceitação da mesma, uma vez que, o silêncio só vale <<como declaração negocial, quando esse valor lhe seja atribuído por lei, uso ou convenção>> - artigo 218.º, do C.C..
Assim sendo, ao contrário do alegado pela recorrente, o facto de que se encontra afetada de IPATH não se encontra assente pois não ficou consignado no auto de tentativa de conciliação que houve acordo sobre o mesmo, nem o silêncio pode ser interpretado como tal.
Desta forma, não existe qualquer fundamento legal para alterar a matéria de facto dada como provada.
Improcede, assim, mais esta conclusão da recorrente.

Se devia ter sido formulado um quesito específico sobre a existência de IPATH e se a sua omissão e a falta de fundamentação do laudo de junta médica determinam a repetição desta e a anulação da sentença.
A sinistrada recorrente veio alegar que nenhum quesito formulado pela seguradora ou pelo tribunal questiona os peritos da junta médica acerca da existência ou não de uma IPATH, o que devia ter sido feito e apresentando-se este meio de prova omisso deve ser repetido e anulada a decisão recorrida.
Vejamos:
Conforme o disposto no n.º 8 das instruções gerais da TNI, anexo I ao D.L. n.º 352/2007, de 23/10, o resultado dos exames é expresso em ficha apropriada, devendo os peritos fundamentar todas as suas conclusões.
E, <<a fim de permitir o maior rigor na avaliação das incapacidades resultantes de acidente de trabalho e doença profissional, a garantia dos direitos da vítimas e a apreciação jurisdicional, o processo constituído para o efeito deve conter obrigatoriamente os seguintes elementos:
a) Inquérito profissional, nomeadamente para o efeito de história profissional;
b) Análise do posto de trabalho, com caracterização dos riscos profissionais e sua quantificação, sempre que tecnicamente possível (para concretizar e quantificar o agente causal de AT ou DP);
c) História clínica, com referência obrigatória aos antecedentes médico-cirúrgicos relevantes;
d) Exames complementares de diagnóstico apropriados.>> - n.º 13 das mesmas instruções gerais da TNI.
Assim, vejamos, então, se o relatório do exame por junta médica não se encontra devidamente fundamentado.
<<Se na tentativa de conciliação apenas tiver havido discordância quanto à questão da incapacidade, o pedido de junta médica é deduzido em requerimento a apresentar no prazo a que se refere o n.º 1 do artigo 119.º (…)>> - n.º 2, do artigo 138.º, do C.P.T..
Por outro lado, a perícia por junta médica é constituída e realizada nos termos constantes do artigo 139.º, n.ºs 1 a 6, do C.P.T., sendo que, se o juiz o considerar necessário, pode determinar a realização de exames e pareceres complementares ou requisitar pareceres técnicos (n.º 7, do mesmo normativo).
Por fim, realizadas as perícias supra referidas, o juiz profere decisão, fixando a natureza e grau de incapacidade e o valor da causa (n.º 1, do artigo 140.º do C.P.T.).
A este propósito consta da sentença recorrida o seguinte:
“A seguradora veio requerer a reavaliação da sinistrada em junta médica (fls. 400).
Realizada esta (fls. 430 e ss.) consideraram unanimemente os Ex.mos peritos que por força do acidente sofrido, a sinistrada esteve afetada de incapacidade temporária absoluta entre a data do acidente (04/02/2011) e a data da alta (13/04/2012) e é portadora de lesões que lhe determinam uma incapacidade permanente parcial (IPP) de 43,00% (0,43).
Tendo em conta este parecer unânime dos peritos intervenientes na junta médica, as respostas aos quesitos e a respetiva fundamentação, bem como os demais elementos trazidos ao processo, nada há que habilite o tribunal a discordar da conclusão a que chegaram estes Ex.mos Peritos, pelo que é de subscrever o grau de incapacidade arbitrado pela junta médica.
Assim, considero que a sinistrada esteve afetada de incapacidade temporária absoluta entre a data do acidente (04/02/2011) e a data da alta (13/04/2012) e está clinicamente curada, mas sendo portadora da incapacidade permanente parcial (IPP) de 43,00% (0,43) desde o dia imediato ao da alta.”
*
Por sua vez, no exame do INML, junto a fls. 367 e segs., considerou-se que a sinistrada apresenta cicatrizes na face, no tórax e nas pernas; mantém diplopia em posição primária obrigando a torcicolo compensador e diplopia binocular no campo visual esquerdo; perturbação depressiva e sequelas que afetam de forma moderada a capacidade de desenvolvimento autónomo da atividade profissional da examinada e enquadram-se num quadro de perturbação da adaptação com sintomatologia persistente e sequelas neuro psicológicas.
Mais concluiu o perito médico que a IPP resultante do acidente, tendo em conta as sequelas atrás descritas e a consulta da TNI, é de 45,4938%; que na determinação do valor final da incapacidade foi considerada: perda de função inerente ou imprescindível ao desempenho do posto de trabalho que a vítima ocupava com carácter permanente e que as mesmas sequelas são causa de incapacidade permanente absoluta para a atividade profissional habitual e enquadráveis no capítulo X, 1. Grau II; III 4.5.1 a); V 5.2.3; V 2.1 a) e X, 3 2.2.
Por outro lado, os peritos médicos intervenientes no exame por junta médica de fls. 430 e segs., por unanimidade, consideraram que como sequelas a sinistrada apresenta perturbação de personalidade derivada a lesão cerebral; paralisia óculo motora com diplopia e hipostesia da hemiface esquerda e que a IPP a atribuir ao sinistrado é de 43%, enquadráveis nos capítulos III 4.5.1. a); V 5.2.3 e X 4 grau III .
Ora, face ao que ficou dito, entendemos que as respostas aos quesitos dadas pelos senhores peritos médicos no exame por junta médica, não consubstanciam suficiente fundamentação.
Na verdade, os senhores peritos médicos consultaram os autos e observaram a sinistrada, pelo que, não podiam deixar de se aperceber que no exame singular foi atribuída à sinistrada uma IPATH.
É certo que não foram questionados, como o deviam ter sido, sobre a existência ou não desta incapacidade. No entanto, concluir-se que a sinistrada apresenta as sequelas contempladas nas juntas de psiquiatria e oftalmologia e, ainda, hipostesia da hemiface direita, sequelas que lhe determinaram uma IPP de 43%, sem mais, sem qualquer referência a uma eventual IPATH, não permite ao tribunal concluir pela existência ou não desta.
É que os laudos emitidos pela junta médica, mesmo que por unanimidade, não são vinculativos para o tribunal; encontra-se aqui também presente o princípio da livre apreciação da prova pelo tribunal – artigo 389.º, do C.C. e 591.º, do C.P.C..
Constitui entendimento pacífico na jurisprudência que, não estando o juiz adstrito às conclusões da perícia médica, por falta de habilitação técnica para o efeito, apenas dela deverá discordar em casos devidamente fundamentados, designadamente com base em opinião científica em contrário, em regras de raciocínio ou máximas da experiência que, no âmbito da sua prudente convicção, possa extrair ou por razões de natureza processual que possam inquinar tal prova.
No entanto, como resulta do Acórdão desta Relação de 05/02/2007, disponível em www.dgsi.pt, <<tais exames não serão de considerar pelo tribunal, como elemento válido de prova pericial, se as respostas aos quesitos ou o relatório forem deficientes, obscuros ou contraditórios ou se as conclusões ou respostas aos quesitos não se mostrarem fundamentadas>>.
<<Aliás, nos termos do nº 8 das Instruções Gerais da TNI, o resultado dos exames é expresso em ficha elaborada nos termos do modelo anexo, devendo os peritos fundamentar todas as suas conclusões (o sublinhado é nosso), do qual decorre que as respostas aos quesitos ou a fundamentação aduzida no laudo pericial deverão permitir com segurança ao julgador (que não é técnico de medicina) analisar e ponderar o grau de incapacidade a atribuir>>[5].
Como já referimos, o laudo pericial da junta médica não permite ao tribunal concluir se a sinistrada se encontra ou não afetada de IPATH, sendo certo que esta lhe foi atribuída pelo perito do INML.
<<Se a Junta Médica não fundamentar as suas respostas, de forma a que o julgador não possa captar as razões e o processo lógico que conduziu à resposta radicalmente divergente do resultado do exame singular, devem ser feitas as diligências complementares entendidas oportunas (nova Junta Médica, exames complementares ou outros), com vista ao correcto apuramento do grau de incapacidade de que sofre o sinistrado>>[6].
Desta forma, não constam do processo todos os elementos que nos permitam apreciar esta questão suscitada no presente recurso e, assim, face à insuficiência da matéria de facto, impõe-se a sua ampliação – n.º 4, do artigo 662.º, do C.P.C. e consequente anulação da decisão recorrida.
Para tanto, e concluindo, deve proceder-se a um novo exame por junta médica a fim de os senhores peritos médicos responderem ao quesito a formular previamente no sentido de ser averiguado se a sinistrada se encontra ou não afetada de IPATH, resposta que deve ser fundamentada, desde logo, em confronto com o exame singular.
Estando em causa a verificação, ou não, de incapacidade permanente e absoluta para o trabalho habitual, antes da realização do exame por junta médica, deve o tribunal diligenciar no sentido de serem elaborados e juntos aos autos o inquérito profissional bem como a análise do posto de trabalho a que alude o n.º 13 das instruções gerais da supra citada TNI.
Procede, assim, esta conclusão da recorrente.
*
*
IV – Sumário[7]
1 – Se o juiz ao aceitar o resultado do exame por junta médica que apenas atribuiu à sinistrada uma IPP mas já não IPATH (ao contrário do que ocorreu no exame singular) está a considerar que a mesma apenas está afetada daquela, pronunciou-se sobre a natureza e grau de incapacidade que afetam a sinistrada, razão pela qual não estamos perante uma nulidade da sentença por omissão de pronúncia.
2 – Não se pode considerar assente um facto relativamente ao qual não ficou consignado no auto de tentativa de conciliação que houve acordo sobre o mesmo, nem o silêncio pode ser interpretado como tal.
3 – Nos termos do nº 8 das Instruções Gerais da TNI, o resultado dos exames é expresso em ficha apropriada, devendo os peritos fundamentar todas as suas conclusões.
4 - Se o relatório do exame por junta médica não permite ao tribunal concretizar o grau de incapacidade a atribuir, nomeadamente, se a sinistrada se encontra afetada de IPATH, não constam do processo todos os elementos que nos permitam apreciar esta questão e, assim, face à insuficiência da matéria de facto, impõe-se a sua ampliação e consequente anulação da decisão recorrida – n.º 4, do artigo 662.º, do C.P.C..
*
*
V - DECISÃO.
Nestes termos, sem outras considerações, acorda-se em anular a sentença recorrida, devendo o tribunal de 1ª instância ordenar a realização de junta médica nos termos e para os efeitos supra referidos e, de seguida, proferir decisão em conformidade.
*
*
Custas pela parte vencida a final.
*
*
Porto, 2015/03/23
Paula Maria Roberto
Fernanda Soares
Domingos Morais
____________
[1] Código de Processo Civil anotado, volume V, Coimbra Editora, 1984, pág. 143.
[2] Neste sentido cfr. os acórdãos do STJ de 05/05/2011 e de 21/06/2011, disponíveis em www.dgsi.pt.
[3] Neste sentido o acórdão da RE de 03/03/1998, BMJ, 475º, 789.
[4] Neste sentido o acórdão da RE de 03/03/1998, BMJ, 475º, 789.
[5] Acórdão desta Relação de 12/12/2011, disponível em www.dgsi.pt.
[6] Acórdão desta Relação de 23/10/2006, disponível em www.dgsi.pt.
[7] O sumário é da responsabilidade exclusiva da relatora.