RECLAMAÇÃO
ARTIGO 105.º N.º 4 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
ACIDENTE DE TRABALHO
COMPETÊNCIA TERRITORIAL
PARTICIPAÇÃO
ERROS
OMISSÕES
PARTES
Sumário

I. No caso dos autos, o invocado acidente de trabalho teve lugar em Santa Cruz, na Ilha da Madeira.
II. Por ser o foro do domicílio do autor – residente em Moita – o sinistrado dirigiu a participação do correspondente acidente de trabalho ao Juízo do Trabalho do Barreiro.
III. No caso em apreço, o sinistrado endereçou a participação do sinistro ao Juízo do Trabalho do Barreiro – da comarca de Lisboa – onde tem o seu domicílio, operando, com tal apresentação, a faculdade contida no artigo 15.º, n.º 4, do CPT, sendo que, a participação foi, contudo, por razões que se desconhecem, encaminhada para o Juízo do Trabalho de Lisboa, onde também deu entrada a petição inicial ulteriormente apresentada, na fase contenciosa.
IV. Contudo, não poderão os atos incorretamente executados prejudicar, em qualquer caso, as respetivas partes (sobre os atos praticados pela secretaria judicial, tal princípio resulta do artigo 157.º, n.º 6, do CPC).
V. Em face do referido, não poderá considerar-se operante a previsão do n.º 1 do artigo 15.º do CPT, pelo que, não poderá firmar-se a competência territorial com referência ao lugar onde o acidente ocorreu.
VI. O Tribunal territorialmente competente para conhecer do presente sinistro é o Juízo do Trabalho do Barreiro, onde a causa deverá prosseguir os respetivos termos.

Texto Integral

Processo nº 9541/24.3T8LSB.L1
Reclamação – Artigo 105º, n.º 4, do CPC
4.ª Secção
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I.
1. Em 10-04-2024, AA veio, ao abrigo do disposto no artigo 99.º e ss. do Código de Processo do Trabalho (CPT) apresentar contra Marítimo da Madeira – Futebol, SAD e Caravela- Companhia de Seguros, S.A., participação de acidente de trabalho, tendo dirigido a participação ao “Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Juízo do Trabalho do Barreiro Exmo. Senhor Procurador da República junto do Juízo do Trabalho do Barreiro do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa”;
2. Tendo os autos prosseguido termos na fase conciliatória, não se mostrou possível a conciliação (cf. auto de tentativa de conciliação de 12-11-2024);
3. Em 02-12-2024, o sinistrado veio apresentar em juízo petição inicial, ao abrigo do disposto nos artigos 15.º e 117.º e seguintes do CPT, indicando no respetivo formulário, no campo “CARACTERIZAÇÃO”, o seguinte:
“Tribunal Competente: Lisboa - Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa
Unidade Orgânica: Juízo do Trabalho de Lisboa - Juiz 6
Nº Processo: 9541/24.3T8LSB”;
4. No articulado da petição inicial referida em 3. foi indicada a seguinte menção no intróito: “Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa
Juízo do Trabalho de Lisboa - Juiz 6
Processo n.º 9541/24.3T8LSB”;
5. Em 13-12-2024, o Juízo do Trabalho de Lisboa – Juiz 6 proferiu o seguinte despacho:
“Declaro aberta a fase contenciosa.
Considerando o preceituado pelo artigo 15º e pelo artigo 19º, n.º4, do Código de Processo do Trabalho e a circunstância de o alegado acidente de trabalho ter ocorrido em Santa Cruz, na Região Autónoma da Madeira, por forma a cumprir integralmente o estatuído pelo artigo 3º, n.º 3, do Código de Processo Civil, na dimensão normativa aí estatuída que impede que o tribunal emita pronúncia ou profira decisão nova, sem que, previamente accione o contraditório, confiro ao Autor a possibilidade de, em dez dias, se pronunciar quanto a uma eventual incompetência territorial.
D.N. (…)”;
6. Em 02-01-2025, o sinistrado apresentou em juízo requerimento, no qual se lê, nomeadamente, o seguinte:
“(…) 1. Em 16 de Abril de 2023, conforme relatado na Petição Inicial, o Autor sofreu acidente de trabalho, quando representava o Marítimo B no jogo com a Associação Desportiva da Camacha, realizado no Complexo Desportivo da Camacha, em Santa Cruz, Madeira.
2. Na sequência disso e com vista a dar início ao processo previsto nos artigos 99.º e seguintes do Código de Processo do Trabalho (doravante o “CPT”), o Autor apresentou participação por acidente de trabalho.
3. Esta participação foi apresentada junto do Juízo do Trabalho do Barreiro do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, por ser este o juízo do trabalho do domicílio do Autor.
4. Com efeito, o Autor é residente na Rua 1.
5. De harmonia com o artigo 15.º, n.º 4 do CPT, a participação do acidente de trabalho pode ser apresentada no juízo do trabalho do domicílio do sinistrado, que será, assim, competente para o conhecimento da acção que se lhe seguir (vide n.º 1 do mesmo artigo 15.º).
6. Compulsado os autos, constata-se, porém, que o processo foi distribuído ao Juízo do Trabalho de Lisboa (Juiz 6) do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa.
7. O Autor desconhece a razão de assim ter sido.
8. Como se disse e facilmente se retira da mera leitura da participação, esta foi dirigida ao Juízo do Trabalho do Barreiro, que detém competência nos termos da lei.
9. Mais se dirá que, conforme é entendimento reiterado da jurisprudência, a fase conciliatória não é a sede própria para conhecimento da questão da competência, tendo em conta que não se trata de fase que seja dirigida pelo juiz.
10. Vejam-se, neste sentido, os acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra e da Relação de Lisboa, datados, respectivamente de 16 de Abril de 2015 e 8 de Junho de 2022.
(…)
12. Durante a fase conciliatória do processo, o Autor não foi (nem, em rigor, poderia ter sido) notificado para se pronunciar quanto à competência do Tribunal.
13. Face ao regime legal e tendo em conta que se tratou de fase sem a intervenção de juiz, o Autor também nada podia ter feito, com vista a suscitar essa mesma questão.
14. No despacho a que ora se responde, que declarou aberta a fase contenciosa do processo, o Tribunal, compreensivelmente, veio levantar a questão.
15. À luz do exposto, não resta ao Autor senão requer a V. Ex.ª que, no caso de se vir a declarar territorialmente incompetente para conhecer da presente acção, ordene a remessa dos autos ao Juízo do Trabalho do Barreiro, ao abrigo do disposto no artigo 15.º, n.º 4 do CPT, visto que foi junto desse tribunal, que é o do domicílio do Autor, que foi apresentada a participação do acidente de trabalho (…)”.
7. Em 20-01-2025, o Juízo do Trabalho de Lisboa – Juiz 6 proferiu o seguinte despacho:
“(…) Tomei conhecimento do requerimento entrado em juízo sob a Ref.ª Citius (…).
BB participou, junto deste Tribunal, o seu acidente de trabalho ( conforme expressamente se extrai do teor do formulário Citius entrado em juízo sob a Ref.ª Citius (…).
Alega para o efeito que, no dia 16 de Abril de 2023, quando se encontrava no exercício das suas funções de jogador de futebol, ao serviço do “Marítimo da Madeira, Futebol, SAD”, foi vítima de um acidente, no jogo que decorria no Complexo Desportivo da Camacha, em Santa Cruz (Região Autónoma da Madeira).
Dos autos resulta que o sinistrado declara residir na Moita.
Efectuada tentativa de conciliação, as partes não se encontravam de acordo quanto à existência de um acidente de trabalho, tendo o Autor apresentado a competente Petição Inicial, assim se iniciando a fase contenciosa dos autos.
Preceitua o artigo 15º, do Código de Processo do Trabalho, no seu n.º 1, que as acções emergentes de acidentes de trabalho devem ser propostas no tribunal do lugar onde o acidente ocorreu (assim se estabelecendo o foro legal ou necessário).
Estabelece, no entanto, no seu n.º 4, a possibilidade de o processo correr os seus termos no tribunal do domicílio do sinistrado, se este assim o requerer até à fase contenciosa do processo.
Ponderado o assim estabelecido, temos que o Autor não exerceu este seu direito de escolha, tendo os autos agora entrado na sua fase contenciosa.
Analisado o teor da participação do acidente e os elementos que o acompanham e, bem assim, o teor do auto de não conciliação, constata-se inexistir qualquer conexão entre o acidente em análise e este Juízo de Trabalho de Lisboa, na medida em que o sinistrado reside em área territorial de competência do Juízo de Trabalho do Barreiro e que o local do acidente pertence à área de competência do Juízo de Trabalho do Funchal (tendo em conta o disposto pelo artigo 126º, da Lei 62/2013, de 26/08 e o seu Anexo II e o estabelecido pelo artigo 86º e Mapa III, do Decreto-Lei 49/2014, de 27/03).
Ao contrário do alegado pelo sinistrado, não necessitava este de ser notificado pelo Tribunal para se pronunciar sobre a competência territorial, estando na sua disponibilidade efectuar o requerimento para que os autos passassem a correr termos no Tribunal da sua área de residência.
Esta é uma prerrogativa atribuída ao sinistrado que, livremente, a pode exercer até que se declare iniciada a fase contenciosa ( sendo que tendo apresentado vários requerimentos aos autos e participado em diligências – a última das quais, tentativa de conciliação – facilmente se teria apercebido de que os autos corriam os seus termos no Tribunal de Trabalho de Lisboa e não no Tribunal de Trabalho do Barreiro ( estando aí, ainda em tempo de efectuar o requerimento de transição para o Tribunal da sua área de residência).
Estabelece o artigo 19º, do Código de Processo do Trabalho que a incompetência em razão do território deve ser conhecida oficiosamente pelo tribunal, observando-se, quanto ao mais, o regime estabelecido nos artigos 102º a 108º, do Código de Processo Civil, com as necessárias adaptações.
O artigo 104º, do Código de Processo Civil, por seu turno, estabelece que a incompetência em razão do território deve ser conhecida oficiosamente sempre que os autos fornecerem os elementos necessários.
Esse é, efectivamente, o caso dos autos.
Nestes termos, sem maiores considerações, ao abrigo das disposições legais supra referidas e, bem assim, do disposto no artigo 15º, n.º1 e n.º4, a contrario, do Código de Processo do Trabalho e artigos 102º, 103º e 105º, todos do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi do disposto pelo artigo 19º, n.º2, do Código de Processo do Trabalho, julgo este tribunal territorialmente incompetente para conhecer da presente acção.
Consubstanciando a incompetência territorial uma incompetência relativa – cfr. artigo 102º, do Código de Processo Civil – a decisão que considere que a mesma se verifica nos autos determina a sua remessa ao tribunal territorialmente competente. Isso mesmo dispõe o artigo 105º, n.º3, do Código de Processo Civil.
Ponderando o local do acidente e o disposto pelo artigo 126º, da Lei 62/2013, de 26/08 e o seu Anexo II, e, bem assim, o estabelecido pelo artigo 86º e Mapa III, do Decreto-Lei 49/2014, de 27/03, tal Tribunal configura o Juízo de Trabalho do Funchal.
Em face do exposto, declaro este Tribunal territorialmente incompetente para a tramitação da presente acção, e competente para a mesma o Juízo de Trabalho do Funchal.
Notifique e, após trânsito, dê baixa dos presentes autos, e remeta-os ao Juízo de Trabalho do Funchal (…)”.
8. Inconformado, reclama o sinistrado, nos termos do disposto no artigo 105.º, n.º 4, do CPC – cf. reclamação apresentada em 06-02-2025 -, concluindo, em síntese, que:
- De acordo com o disposto no artigo 15.º, n.ºs. 1 e 4, do CPT, a participação do acidente de trabalho pode ser apresentada no juízo do trabalho do domicílio do sinistrado, que será, assim, competente para o conhecimento da ação que se lhe seguir;
- No caso, o autor participou o acidente de trabalho junto do Tribunal do Trabalho do Barreiro, por ser este o juízo de trabalho do seu domicílio (Moita);
- No formulário Citius submetido com a participação, no campo referente à identificação do Tribunal, indicou-se “Lisboa – Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa” e não, de forma mais específica, o Juízo do Trabalho do Barreiro (também da Comarca de Lisboa), facto de que o autor só recentemente se apercebeu, mas, daí não se retira que o autor tenha pretendido apresentar a participação junto do Juízo do Trabalho de Lisboa;
- A vontade expressa do autor foi dirigir a participação ao Juízo do Trabalho do Barreiro, conforme se retira do cabeçalho da participação;
- Sempre assistiria ao autor o direito a retificar o (putativo) lapso no formulário submetido a juízo, ao abrigo do disposto no artigo 7.º, n.º 3, da Portaria n.º 280/2013, de 26 de agosto;
- O autor exerceu esse direito por requerimento de 02-02-2025 (refª 50892612) no qual veio esclarecer que a participação foi apresentada junto ao Juízo do Trabalho do Barreiro e requerer também que, caso o Tribunal a quo viesse a declarar-se territorialmente incompetente, fosse ordenada a remessa dos autos ao Juízo do Trabalho do Barreiro; e
- Ao deferir a competência ao Juízo do Trabalho do Funchal, o Tribunal violou o disposto nos artigos 15.º, n.º 4, do CPT e 7.º, n.º 3 da Portaria n.º 280/2013, de 26 de agosto.
Termina o reclamante pedindo seja o despacho de 20-01-2025 revogado e substituído por outro que ordene a remessa dos autos ao Juízo do Trabalho do Barreiro;
9. Por despacho de 11-03-2025, a reclamação apresentada foi mandada prosseguir - e bem, diga-se - como reclamação, nos termos do disposto no artigo 105.º, n.º 4, do CPC.
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II. O autor reclama – ao abrigo do disposto no artigo 105.º, n.º 4, do CPC - da decisão de 20-01-2025 que declarou o Juízo do Trabalho de Lisboa territorialmente incompetente para a tramitação da presente ação e competente o Juízo do Trabalho do Funchal.
A infração das regras de competência fundadas na divisão judicial do território determina a incompetência relativa do tribunal.
Os critérios territoriais de determinação da competência determinam em que circunscrição territorial deve a ação ser instaurada.
O critério geral nesta matéria é o de que o autor deve demandar, em regra, no tribunal do domicílio do réu (regra semelhante consta, relativamente a pessoas coletivas e sociedades). Contudo, a lei prevê casos em que esse critério geral é afastado por regras especiais.
Assim, sempre que alguma das regras especiais for aplicável à situação em causa, o critério geral não terá aplicação, sendo antes aplicável a regra especial.
Como refere Miguel Teixeira de Sousa (A competência declarativa dos tribunais comuns; 1994, Lex, p. 83) “os critérios especiais determinam a competência territorial em função de um nexo entre o tribunal e o objecto da causa ou as partes da acção”.
No presente caso, conforme decorre da petição inicial, a presente ação constitui ação emergente de acidente de trabalho.
O processo para a efectivação de direitos resultantes de acidente de trabalho que tem por base a participação do acidente inicia-se por uma fase conciliatória - cfr. art.º 99.º, n.º 1, do CPT.
“Nesta fase, jurisdicional35 e de realização obrigatória, não existe ainda um litígio em sentido estrito, um verdadeiro conflito entre os interessados, os quais apenas pretendem a composição, por acordo e conforme à lei, dos direitos e obrigações que lhes assistem. No caso de não ser atingido tal desiderato, a fase conciliatória constitui ainda para os interessados, maxime para o sinistrado ou beneficiário(s) legal(ais), uma "condição" processual obrigatória de acesso ao debate contencioso da questão, não podendo esse debate ter lugar sem precedência da realização dessa fase - cfr. art.ºs 117.º e segs., do CPT” (assim, João Monteiro; “Fase Conciliatória do Processo para a Efectivação de Direitos Resultantes de Acidente de Trabalho – Enquadramento e Tramitação”, in Prontuário de direito do Trabalho, n.º 87, pp. 155-156).
Sobre esta matéria dispõe o artigo 15.º do CPT que:
“1 - As ações emergentes de acidentes de trabalho e de doença profissional devem ser propostas no juízo do trabalho do lugar onde o acidente ocorreu ou onde o doente trabalhou pela última vez em serviço suscetível de originar a doença.
2 - Se o acidente ocorrer no estrangeiro, a ação deve ser proposta em Portugal, no juízo do trabalho do domicílio do sinistrado.
3 - As participações exigidas por lei devem ser dirigidas ao juízo do trabalho a que se referem os números anteriores.
4 - É também competente o juízo do trabalho do domicílio do sinistrado, doente ou beneficiário se ele o requerer até à fase contenciosa do processo ou se aí tiver apresentado a participação.
5 - No caso de uma pluralidade de beneficiários exercer a faculdade prevista no número anterior, é territorialmente competente o juízo do trabalho da área de residência do maior número deles ou, em caso de ser igual o número de requerentes, o juízo do trabalho da área de residência do primeiro a requerer.
6 - Se o sinistrado, doente ou beneficiário for inscrito marítimo ou tripulante de qualquer aeronave e o acidente ocorrer em viagem ou durante ela se verificar a doença, é ainda competente o juízo do trabalho da primeira localidade em território nacional a que chegar o barco ou aeronave ou o da sua matrícula”.
Conforme se decidiu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27-09-2000 (Pº 00S061, rel. DINIZ NUNES):
“(…) A pretensão do sinistrado deve ser deduzida no decurso da fase administrativa ou seja até ao final da fase conciliatória, deixando de a poder deduzir quando o processo findar por conciliação homologada por sentença transitada.
A este propósito escreve Alberto Leite Ferreira, in Código de Processo do Trabalho Anotado, 4ª edição, página 94: "A faculdade reconhecida às vítimas directas ou indirectas de acidentes de trabalho ou de doenças profissionais de requererem a transferência da competência normal do tribunal do lugar do acidente ou do local do último trabalho para a do tribunal do domicílio dos autores pressupõe o processo em movimento, que o mesmo é dizer, o processo pendente (…)”.
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III. Conhecendo:
No caso dos autos, o invocado acidente de trabalho teve lugar em Santa Cruz, na Ilha da Madeira.
Por ser o foro do domicílio do autor – residente em Moita – o sinistrado dirigiu a participação do correspondente acidente de trabalho ao Juízo do Trabalho do Barreiro.
O Juízo do Trabalho de Lisboa, ao qual foi distribuída a apresentação da petição inicial, veio a concluir que o autor não exerceu a opção – do artigo 15.º, n.º 4, do CPT – de o processo poder correr os seus termos no tribunal do domicílio do sinistrado, por não ter requerido tal opção até à fase contenciosa do processo.
O reclamante contesta este entendimento, em suma, com os seguintes argumentos:
- O autor participou o acidente de trabalho junto do Tribunal do Trabalho do Barreiro, por ser este o juízo de trabalho do seu domicílio (Moita);
- No formulário Citius submetido com a participação, no campo referente à identificação do Tribunal, indicou-se “Lisboa – Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa” e não, de forma mais específica, o Juízo do Trabalho do Barreiro (também da Comarca de Lisboa), facto de que o autor só recentemente se apercebeu, mas, daí não se retira que o autor tenha pretendido apresentar a participação junto do Juízo do Trabalho de Lisboa;
- A vontade expressa do autor foi dirigir a participação ao Juízo do Trabalho do Barreiro, conforme se retira do cabeçalho da participação;
- Sempre assistiria ao autor o direito a retificar o (putativo) lapso no formulário submetido a juízo, ao abrigo do disposto no artigo 7.º, n.º 3, da Portaria n.º 280/2013, de 26 de agosto; e
- O autor exerceu esse direito por requerimento de 02-02-2025, esclarecendo que a participação foi apresentada junto ao Juízo do Trabalho do Barreiro e requerendo que, caso o Tribunal a quo viesse a declarar-se territorialmente incompetente, fosse ordenada a remessa dos autos ao Juízo do Trabalho do Barreiro.
Ora, no caso em apreço, verifica-se que, de facto, o sinistrado endereçou a participação do sinistro ao Juízo do Trabalho do Barreiro – da comarca de Lisboa – onde tem o seu domicílio, operando, com tal apresentação, a faculdade contida no artigo 15.º, n.º 4, do CPT.
Por razões que se nos ultrapassam – bem como ao sinistrado – a participação foi, contudo, encaminhada para o Juízo do Trabalho de Lisboa, onde também deu entrada a petição inicial ulteriormente apresentada, na fase contenciosa.
Sucede, contudo, que não poderão os atos incorretamente executados prejudicar, em qualquer caso, as respetivas partes (sobre os atos praticados pela secretaria judicial, tal princípio resulta do artigo 157.º, n.º 6, do CPC).
Em face do referido, não poderá considerar-se operante a previsão do n.º 1 do artigo 15.º do CPT, pelo que, não poderá firmar-se a competência territorial com referência ao lugar onde o acidente ocorreu.
O Tribunal territorialmente competente para conhecer do presente sinistro é, pois, o Juízo do Trabalho do Barreiro, onde a causa deverá prosseguir os respetivos termos.
Assim, a decisão reclamada não poderá subsistir, devendo ser objeto de revogação.
E, em consequência, a competência territorial para a apreciação do presente litígio ficará radicada no Juízo do Trabalho do Barreiro.
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IV. Nos termos expostos, julga-se procedente a reclamação apresentada, revogando-se o despacho reclamado, declarando-se competente para prosseguir a lide, o Juízo do Trabalho do Barreiro.
Sem custas.
Notifique.
Baixem os autos.

Lisboa, 11-04-2025,
Carlos Castelo Branco.