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SUSPEIÇÃO
JUIZ
IMPARCIALIDADE
DECISÃO
DECISÕES DESFAVORÁVEIS
Sumário
I. Do facto de um juiz ter proferido decisões desfavoráveis ou não compreendidas por uma das partes não pode extrair-se qualquer ilação quanto a eventuais sentimentos de amizade ou inimizade ou, até, de mera simpatia ou antipatia por uma delas, ou ainda de parcialidade. II. A função jurisdicional implica, pela sua própria natureza e quase sem excepções, a necessidade de dar razão a uma das partes e negá-la à outra, rejeitando as suas pretensões e sacrificando os seus interesses concretos. III. O processo de decisão do juiz não se inicia apenas depois de terminadas as alegações orais, pois, inevitavelmente, ele vai analisando e confrontando os diversos depoimentos e fazendo juízos sobre a credibilidade de cada um deles, mas o importante é que, até ao final das alegações, não feche o espírito à possibilidade de valorar todas as contribuições para a prova, quer confirmem ou infirmem os juízos que foi fazendo. IV. Nenhuma das menções efetuadas pela Juíza no âmbito da diligência que teve a cargo, patenteia algum “pré-juízo” sobre a motivação decisória do mérito da causa ainda a apreciar, mostrando-se circunscritas à respetiva finalidade apreciativa e decisória então proferida, ou seja, à observância do respetivo dever de administrar a Justiça.
Texto Integral
Processo nº 3968/24.8T8CSC-B.L1
Suspeição
8.ª Secção
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I.
1. AA, na qualidade de requerida da ação que, com o n.º 3968/24.8T8CSC, corre termos no Juízo de Família e Menores de Cascais - Juiz 3, veio, por requerimento apresentado em juízo em 11-05-2025, deduzir incidente de suspeição, relativamente à Sra. Juíza de Direito BB, alegando, em suma, que:
- No âmbito dos autos, foram realizadas duas audiências/conferências de progenitores nas datas 2025-01-07 e 2025-05-06;
- Na data de 2025-04-02, foi proferido despacho no sentido de que “inexistem fundamentos para que não seja cumprido o acordo de regulação das responsabilidades a que os Pais chegaram, inexistindo fundamento para obviar à existência de pernoitas com o Progenitor. Assim, advertem-se os progenitores para cumprirem na íntegra com o regime vigente, sob pena de, mantendo-se o incumprimento, ser do mesmo extraídas as devidas consequências quer em termos de condenação em multa quer de eventual alteração do regime vigente”, não obstante a requerente ter remetido – em 2025-03-02 e 2025-05-04 - requerimentos “a justificar, legitima e legalmente, os motivos do incumprimento do acordo do exercício das responsabilidades parentais que o requerente/progenitor invoca”, requerimentos cujo conteúdo, “tem sido liminarmente ignorado” pela Juiz;
- Na audiência/conferência de progenitores realizada em 2025-05-06, após a juiz “ter permitido, generosamente, a intervenção directa do requerente/progenitor, o qual reiterou o mesmo rol de queixas/reclamações atinentes ao alegado incumprimento do acordo em destaque por parte da aqui requerida”, “[c]oncedeu (…) a palavra ao Patrono nomeado da aqui requerida, signatário do presente, para se pronunciar sobre as eventuais inexistências/impossibilidades de contacto por parte do requerente/progenitor através do sistema digital Whatsapp” e, “[a]quando da tomada da palavra por parte do Advogado e Patrono nomeado da requerida, foi de imediato interrompido, quiçá, por não ter apresentado uma justificação conforme a pretensão da Mm.a Juiz, que usou de um tom de voz mais elevado e não compatível com o exercício da inerente função judicativa estatutariamente e constitucionalmente consagrada, mormente, ao dirigir-se ao causídico signatário do presente, como, aliás, se mostra consagrado no artigo 72.°, n.º 1 do EOA, aprovado pela Lei n.° 145/2015, de 09/09, o qual dispõe, expressamente, que os magistrados, agentes de autoridade e trabalhadores em funções públicas devem assegurar aos Advogados, aquando do exercício da sua profissão, tratamento compatível com a dignidade da advocacia”, “[a]cabando por impedir, por ter sido interrompido bruscamente, que o Patrono da requerida concluísse a sua intervenção, alegando que o mesmo estaria a “desconversar”, bem como tendo a Mm.a Juiz asseverado que “as coisas não seriam como a mãe quer" e ainda que “aqui neste processo, aqui não vai ser alterado" e que “o acordo tem de ser alterado nalgumas coisas, mas se calhar não será bem como a mãe” — cfr., gravação áudio da audiência em destaque, de 2025.05.06”;
- O requerimento apresentado pela requerida em 2025-05-04, até ao momento não mereceu qualquer pronúncia;
- “A postura/posição, ainda que subliminarmente, assumida pela Mm.a juiz, revela-se tendencialmente favorável ao requerente/progenitor e desfavorável à aqui requerida, ainda que de forma antecipatória e não concretamente fundamentada”, “[r]esultando por isso, na nossa perspectiva uma evidente violação objectiva e subjectiva dos deveres de isenção e imparcialidade, consagrados nos artigos 6.°-B e 6.°-C, do Estatuto dos Magistrados Judiciais (…)”;
- A “(…) Juiz, ao pronunciar-se nos termos em que o fez, assumiu uma postura não isente e parcial, uma vez que, de modo antecipatório e antes da produção de qualquer prova essencial à descoberta da verdade material e da boa decisão da causa, express[ou] o seu entendimento, claramente tendencial, em benefício do requerente e em desfavor da aqui requerida, logo, não neutral”, “[d]escurando, putativamente, a concreta realidade da situação objecto dos presentes autos, em que está em causa o bem-estar e a segurança de uma menor ainda bebé de cerca de um ano de idade, relevando apenas, tout court, os argumentos esgrimidos pelo requerente na fundamentação de um presumido incumprimento por parte da aqui requerida”;
- As afirmações da Sra. Juíza “traduzem claramente um pré-juízo sobre a sua pré-compreensão atinente à motivação decisória, descortinando-se, efectivamente, uma concreta evidência de violação de direitos da (…) requerida conducentes à conclusão de não isenção e de parcialidade subjectiva”; e
- Atendendo-se ao facto de a Juíza ter adotado “uma postura inequívoca e continuada quanto à tomada de posição ao longo dos presentes autos, quer na condução dos trabalhos, quer nos comentários tecidos a título de pré-juízos negativos em relação à aqui requerida, quer ainda, na prolação de despachos impositivos do cumprimento do acordo do exercício das responsabilidades parentais”, “[c]ircunstâncias adequadas a formular a convicção no espirito da aqui requerida, bem como do seu Patrono, de que a Mm.a juiz, antecipadamente, assimilou os factos que o requerente imputa à aqui requerida, como verdadeiros e desvalorizando na integralidade a argumentação aduzida por esta, afigura-se que resulta evidenciando a parcialidade e falta de isenção da Mm.a Juiz”.
2. Na sequência do referido em 1., a Sra. Juíza de Direito visada, por despacho de 13-05-2025, veio responder – nos presentes autos – nomeadamente, que: “(…) Não vislumbro, do teor do requerimento que antecede, que tenha sido articulada qualquer matéria fáctica suscetível de ser subsumida aos fundamentos jurídicos das causas de suspeição previstas no artigo 120º do Código de Processo Civil. Efetivamente, o conteúdo do requerido prende-se, por um lado, com o mérito das decisões proferidas nos autos (designadamente do despacho proferido a 6 de maio de 2025), sindicáveis através de recurso, tendo, todas essas decisões, sido proferidas em obediência à Lei e sempre tutelando o superior interesse da Criança CC. No que respeita à postura da ora signatária na diligência, que se pretendia uma conferência de pais por forma a serem ambos os progenitores ouvidos, o que se inviabilizou atenta a não comparência da mãe. Ainda assim, ouvido o Pai (como cumpria) pelo mesmo foi relatada a dificuldade em falar com a filha por whatsapp. Foi então questionado o Ilustre patrono da Mãe acerca do alegado pelo Pai, o qual referiu que a Mãe trabalha e que por isso nem sempre podia atender o telefone. Questionado pela signatária com quem é que a criança estava nesses momentos, foi respondido que estava na creche, sendo que obviamente o que se pretendia saber é com quem é que a Criança estava, depois da creche, se não estava com a Mãe por forma a aquilatar qual a forma mais fácil do Pai conseguir entrar em contato com a mesma, independentemente da criança estar com a Mãe ou com outra pessoa da confiança desta. Ora, levou a mal o Ilustre causídico a interpelação, por motivos que só o mesmo poderá esclarecer, sendo que o pretendido era apenas perceber as dinâmicas familiares por forma a encontrar alternativas para viabilizar os contatos telefónicos/videochamadas do Pai.
Concluiu dizendo não vislumbrar “na nossa interpelação qualquer alteração do tom de voz ou discurso desrespeitoso para com o Ilustre Patrono da Progenitora, nem as nossas decisões estão eivadas de qualquer «favoritismo» em relação à figura paterna, mas antes pretendem, sim, assegurar que a Criança CC tem o direito a crescer tendo ambos os progenitores na sua vida”.
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II. Considerando o que resulta dos elementos documentais dos autos, mostra-se relevante para a decisão do incidente requerido, a consideração da seguinte factualidade:
1. Em 27-11-2024, DD, apresentou em juízo petição inicial, dando origem aos autos de incumprimento das responsabilidades parentais, que constituem os autos principais, com o n.º 3968/24.8T8CSC, relativamente à filha menor CC, nascida em 19-12-2023, o que fez contra AA.
2. No desenvolvimento dos autos, em 07-01-2025 teve lugar conferência de pais, presidida pela Sra. Juíza de Direito BB, nos termos documentados na respetiva ata.
3. Em 02-03-2025, a requerida apresentou em juízo, nos referidos autos, requerimento onde se lê, nomeadamente, o seguinte: “(…) notificada que foi, através da plataforma digital CITIUS, do relatório psicossocial remetido aos presentes autos pelo NIJO, vem, mui respeitosamente, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 3.º, n.º 3, do CPC, o qual alberga o princípio do contraditório, que a jurisprudência constitucional tem considerado ínsito no direito fundamental de acesso aos Tribunais, consagrado no n.º 1 do artigo 20.º da Lei Fundamental, e que envolve, desde logo, como vertente essencial “a proibição da «indefesa» que consiste na privação ou limitação do direito de defesa do particular perante os órgãos judiciais, junto dos quais se discutem questões que lhes dizem respeito” – nos precisos termos salientados por, v.g., CANOTILHO, J. J. Gomes, e MOREIRA, Vital, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª Edição, Coimbra Editora, Coimbra, 1993, pág. 164 –, traduzindo-se o “direito de defesa e o direito ao contraditório (…) fundamentalmente na possibilidade de cada uma das partes invocar as razões de facto e de direito, oferecer provas, controlar as provas da outra parte, pronunciar-se sobre o valor e resultado destas provas” – como asseveram, v.g., CANOTILHO, J. J. Gomes, e MOREIRA, Vital, Constituição da República Portuguesa Anotada, 4.ª Edição Revista, Coimbra Editora, Coimbra, Janeiro, 2007, pág. 415 –, expor e requerer nos termos e com os fundamentos seguintes: 1 – Em primeiro lugar, importa esclarecer que, quando a requerida e o requerente viviam juntos, o requerente saía de casa depois de almoço, pois dormia até tarde e chegava em casa depois das meia-noite, por isso não ajudava nas tarefas domésticas nem com a CC e, sendo taxista, poderia fazer seu horário e se adaptar à rotina da família, no entanto, na maioria das vezes, quando o requerente chegava em casa, comentava que tinha ido ao café antes de voltar para casa e era perceptível que o mesmo tinha ingerido bebidas alcoólicas, sendo normal beber a qualquer hora do dia, mesmo durante o horário de trabalho, 2 – Dessarte, inúmeras discussões entre o requerente e a requerida ocorriam em virtude de o requerente chegar a casa alcoolizado, nomeadamente de madrugada, tendo inclusive em alguns casos acabar por acordar a menor filha de ambos, além de o requerente ficar mais agressivo na sua verbalização e não ter noção dos seus comportamentos, tendo ocorrido uma das situações mais graves, em que a requerida teve de sair de casa com a menor por volta das quatro horas da manhã e acordar a sua avó que mora na residência ao lado da residência da requerida, para dormir na casa da mesma, uma vez que o requerente não deixava dormir nem a requerida nem a menor, 3 – No que tange às videochamadas, o requerente quando pedia para fazer videochamada para ver a menor, era normalmente à hora de jantar da menor, o que acabava por não ser compatível com os afazeres da requerida que se encontrava a tratar da menor, 4 – Em relação às pernoitas da menor com o requerente, importa salientar que a menor que ainda tem pouco mais de um ano, ainda acorda várias vezes durante a noite e precisa de muito dos cuidados e presença da progenitora, a requerida, pelo que esta não se sente confortável com a hipótese de a menor pernoitar com o requerente, uma vez que este nunca acordava durante a noite para cuidar da filha e raramente acordava cedo, tendo já ocorrido de a menor chegar da casa do pai e no dia seguinte ficar doente, com febre ou diarreia, como sucedeu no Domingo, dia 23 de Fevereiro, em que a menor precisou voltar mais cedo para a requerida, pois não parava de chorar com o requerente e não conseguia sequer dormir, 5 – De resto, cumpre ainda salientar que o requerente só começou a revelar alguma preocupação com com as rotinas e hábitos da menor, depois que instaurou o presente processo, coloque-se na devida saliência, pelo que a requerida entende que ainda será demasiado prematuro quaisquer possibilidades de pernoitas da menor com o requerente, pelas razões acima elencadas, uma vez que não se vislumbram garantidas as necessárias condições de bem estar da menor por parte do requerente, pelo que, as mesmas não devem ser determinadas em nome dos supremos interesses da menor, a qual não deve ser exposta a situações que ponham em risco o seu bem-estar, 6 – Ainda que, no quadro familiar, o requerente viva com a sua avó, que tem mais de sessenta anos, toma remédios para dormir, dorme cedo e acorda cedo, e durante o dia fica deitada, pois tem algumas dificuldades decorrentes do seu debilitado estado de saúde, 7 – Por fim, não obstante a referência feita às dimensões da residência da requerida e do quarto da menor, mais importante do que as referidas dimensões, serão sempre os cuidados maternais que são dedicados pela requerida enquanto progenitora, bem como as condições de habitabilidade, higiene e salubridade da predita habitação, circunstâncias que, aparentemente, passaram ao lado da visita feita à residência da requerida (…)”.
4. Em 02-04-2025 foi proferido nos mencionados autos, na sequência de promoção do Ministério Público de 26-03-2025, despacho onde se lê, nomeadamente, o seguinte: “(…) Requerimentos dos progenitores: Tomei conhecimento. (…) Compulsados os autos verifica-se que se encontram reguladas por acordo as responsabilidades parentais da Criança CC de acordo com as quais esta ficou a residir com a Mãe, sendo fixados os convívios com o Pai, no âmbito dos quais, além do mais, ficou estipulado que a CC passa fins-de-semana alternados com o Pai, devendo o Pai para o efeito ir buscá-la ao final de tarde de 6ª feira a casa da Mãe entre as 18h e as 20h, entregando-a no mesmo local no domingo pelas 21h. Tal regime não tem sido cumprido pela Mãe alegadamente devido a consumos excessivos de álcool por parte do Pai e por este levar a Filha para locais conotados com o tráfico de estupefacientes, situações que o Pai nega. Foram feitos exames toxicológicos, os quais nada detetaram. Foi solicitado relatório psicossocial do NIJ que concluiu que ambos os progenitores demonstram capacidades para cuidar da Filha, que esta se sente confortável na companhia de ambos e que ambos têm condições habitacionais para ter a Filha consigo. Temos, pois, que dos elementos constantes dos autos, inexistem fundamentos para que não seja cumprido o acordo de regulação das responsabilidades a que os Pais chegaram, inexistindo fundamento para obviar à existência de pernoitas com o Progenitor. Assim, advertem-se os progenitores para cumprirem na íntegra com o regime vigente, sob pena de, mantendo-se o incumprimento, ser do mesmo extraídas as devidas consequências quer em termos de condenação em multa quer de eventual alteração do regime vigente. Notifique o progenitor para se pronunciar sobre o pedido de condenação em litigância de má fé (requerimento da progenitora de 21.1.2025). (…) Para realização de conferência de pais designo o dia 6 de maio de 2025, pelas 10 horas e 15 minutos, neste Tribunal (e não antes por absoluta impossibilidade de agendamento), nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 35º nº 1, por força do disposto no artigo 42º nº 5, do Regime Geral do Processo Tutelar Cível. Estarão presentes Requerente e Requerido. Notifique, nos termos do plasmado no artigo 35º nº 4, do supracitado diploma legal (…)”.
5. Notificada do referido despacho, a requerida apresentou em juízo, em 04-05-2025, requerimento, que se dá por integralmente reproduzido.
6. No desenvolvimento dos autos, em 06-05-2025 teve lugar a continuação de conferência de pais, presidida pela Sra. Juíza de Direito BB, nos termos documentados na respetiva ata, dela constando, nomeadamente, que: “Dada a palavra ao Ilustre Patrono Oficioso pelo mesmo foi dito que a mãe não faz as videochamadas porque nem sempre está disponível porque trabalha.”.
7. Da gravação da diligência referida em 6. consta, nomeadamente, o seguinte segmento:
Juíza: “(…) Com quem é que a filha está quando a mãe está a trabalhar?”
Patrono: “Na creche”. Juíza: “Sem ser na creche? Depois da creche…Como é óbvio…se o pai não vai ligar para a mãe quando a menina está na creche…quando a menina está com a mãe, ou seja, depois de sair da creche?”
Patrono: [Impercetível]
Juíza: “O Sr. Dr. Parece estar a desconversar. Não é disso que estamos a falar, não é? É tão simples quanto: Quando a mãe não pode ir buscar a menina …o que o Sr. Dr. Me disse o que foi: Quando a mãe está a trabalhar não pode estar disponível para atender as chamadas do pai…Ora, obviamente, não seria quando a menina está na creche, não é? Por aí não está com a menina, porque tem de estar a trabalhar…Ok. Pronto muito bem, vamos fazer assim então…”
Patrono: [Impercetível]
Juíza: “Pois foi, pois foi….Pois, não, aqui neste processo não foi…aqui neste processo, aqui não vai ser alterado…aliás, faça constar….e de facto o acordo terá que ser alterado aqui nalgumas coisas…se calhar não será bem como a mãe pretende…”.
8. Na diligência referida em 6. foi proferido pela Sra. Juíza, o seguinte despacho: "Antes de mais, tendo sido junta a informação do NIJ da qual decorre inexistirem fundamentos, em termos habitacionais para que a CC passe os fins de semana com o pai nos termos acordados pelos progenitores, considerando ainda o resultado dos exames toxicológicos realizados, afigura-se inexistir razões para que o regime em vigor não seja cumprido, razão pela qual, sem prejuízo de se vir a aquilatar se anteriormente havia razões para que a mãe não permitisse os convívios e se por isso se julgue verificado ou não o incumprimento, se adverte os progenitores que deverá ser cumprido o regime acordado por ambos. No que respeita ao requerimento junto pela progenitora a 04-05-2025, admite-se a sua junção na medida em que é uma resposta ao requerimento apresentado pelo Progenitor relativo ao reiterado incumprimento (pese embora não tenha cabimento na tramitação dos presentes autos), não se admitindo enquanto requerimento de prova uma vez que, processualmente tal deverá ser indicado aquando das alegações. Não havendo possibilidade de chegar a entendimento, uma vez que ambos mantêm as posições anteriormente firmadas, ao abrigo do disposto no artigo 39.º, n.º 4 do RGPTC, determina-se a notificação dos progenitores para, no prazo de 15 dias e querendo, alegarem o que tiverem por conveniente quanto às questões pendentes, juntarem as provas tida por convenientes e requerer as diligências tidas por convenientes. Com cópia deste despacho e, bem assim, do regime de responsabilidades parentais em vigor, dê conhecimento à creche "O Traquinas" de qual o regime em vigor, sendo que a mãe deverá cumpri-lo. Mais se solicitando que, caso seja dada indicação pela mesma que o pai não pode ir buscar a menina, tal deverá ser comunicado ao Tribunal Informe ainda a escola que, sendo ambos os progenitores detentores do exercício das responsabilidades parentais, o pai não pode ser impedido de visitar a menina na escola. Notifique".”.
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III. O princípio da independência dos tribunais, consagrado no artigo 203.º da Constituição (“os tribunais são independentes e apenas estão sujeitos à lei”), implica uma exigência de imparcialidade.
A Justiça é feita caso a caso, tendo em consideração a real e objetiva situação a dirimir.
O Juiz não é parte nos processos, devendo exercer as suas funções com a maior objetividade e imparcialidade.
Com efeito, os juízes têm por função ser imparciais e objetivos, fundando as suas decisões na lei e na sua consciência.
Como dispõe o artigo 4.º, n.º 1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais, os juízes julgam apenas segundo a Constituição e a lei e não estão sujeitos a ordens ou instruções, salvo o dever de acatamento pelos tribunais inferiores das decisões proferidas, em via de recurso, pelos tribunais superiores.
De acordo com o n.º 2 do artigo 4.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, a independência dos magistrados judiciais manifesta-se na função de julgar, na direção da marcha do processo e na gestão dos processos que lhes forem aleatoriamente atribuídos.
Liminarmente, importa salientar que a apreciação sobre se a situação invocada pela requerente da suspeição se enquadra, ou não, na previsão legal do artigo 120.º do CPC, prende-se, tão só, com a materialização - ou não - dos requisitos do incidente suscitado, e não, com qualquer apreciação de natureza jurisdicional ou substantiva, relativamente ao mérito da pretensão esgrimida por qualquer dos sujeitos processuais nos vários apensos do processo em questão, nem sobre qualquer valoração da prova produzida, a qual, não nos incumbe decidir, nem poderemos efetuar.
Depois, cumpre salientar que não se patenteia qualquer das circunstâncias a que se referem as alíneas a) a f) do n.º 1, do artigo 120.º do CPC, como justificativas de suspeição do julgador.
Quanto à alínea g) – existência de inimizade grave ou grande intimidade entre o juiz e alguma das partes ou seus mandatários – tem-se entendido que “não constitui fundamento específico de suspeição o mero indeferimento de requerimento probatório (RL, 7-11-12, 5275/09) nem a inoportuna expressão pelo juiz sobre a credibilidade das testemunhas (RG 20-3-06, 458/06)” (assim, Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa; Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Almedina, 2018, p. 148).
Nos termos do disposto no nº. 1 do artigo 120.º do CPC, as partes podem opôr suspeição ao juiz quando ocorrer motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade, o que ocorrerá, nomeadamente, nas situações elencadas nas suas alíneas a) a g).
Com efeito, o juiz natural, consagrado na CRP (cfr. artigos 32.º, n.º 9 e 203.º), só pode ser recusado quando se verifiquem circunstâncias assertivas, sérias e graves.
E os motivos sérios e graves, tendentes a gerar desconfiança sobre a imparcialidade do julgador, resultarão da avaliação das circunstâncias invocadas.
O TEDH – na interpretação do segmento inicial do §1 do art.º 6.º da CEDH, (“qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada, equitativa e publicamente, num prazo razoável por um tribunal independente e imparcial, estabelecido pela lei”) - desde o acórdão Piersack v. Bélgica (8692/79), de 01-10-82 (https://hudoc.echr.coe.int/fre?i=001-57557) tem trilhado o caminho da determinação da imparcialidade pela sujeição a um “teste subjetivo”, incidindo sobre a convicção pessoal e o comportamento do concreto juiz, sobre a existência de preconceito (na expressão anglo-saxónica, “bias”) face a determinado caso, e a um “teste objetivo” que atenda à perceção ou dúvida externa legítima sobre a garantia de imparcialidade (cfr., também, os acórdãos Cubber v. Bélgica, de 26-10-84 (https://hudoc.echr.coe.int/ukr?i=001-57465), Borgers v. Bélgica, de 30-10-91, (https://hudoc.echr.coe.int/fre?i=001-57720) e Micallef v. Malte, de 15-10-2009 (https://hudoc.echr.coe.int/fre?i=001-95031) ).
Assim, o TEDH tem vindo a entender que um juiz deve ser e parecer imparcial, devendo abster-se de intervir num assunto, quando existam dúvidas razoáveis da sua imparcialidade, ou porque tenha exteriorizado relativamente ao demandante, juízos antecipados desfavoráveis, ou no processo, tenha emitido algum juízo antecipado de culpabilidade.
A dedução de um incidente de suspeição, pelo que sugere ou implica, deve ser resguardado para casos evidentes que o legislador espelhou no artigo 120.º do CPC, em reforço dos motivos de escusa do juiz, a que se refere o artigo 119.º do CPC.
A imparcialidade do Tribunal constitui um requisito fundamental do processo justo. “A imparcialidade, como exigência específica de uma verdadeira decisão judicial, define-se, por via de regra, como ausência de qualquer prejuízo ou preconceito, em relação à matéria a decidir ou às pessoas afectadas pela decisão” (assim, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13-02-2013, Pº 1475/11.8TAMTS.P1-A.S1, rel. SANTOS CABRAL).
O direito a um julgamento justo, não se trata de uma prerrogativa concedida no interesse dos juízes, mas antes, uma garantia de respeito pelos direitos e liberdades fundamentais, de modo a que, qualquer pessoa tenha confiança no sistema de Justiça.
Do ponto de vista dos intervenientes nos processos, é relevante saber da neutralidade dos juízes face ao objeto da causa.
Com efeito, os motivos sérios e válidos atinentes à imparcialidade de um juiz terão de ser apreciados de um ponto de vista subjetivo e objetivo. “De acordo com o entendimento uniforme da jurisprudência (…), a imparcialidade pode ser avaliada sob duas vertentes, a subjetiva e a objetiva, radicando a primeira na posição pessoal do juiz perante a causa, caracterizada pela inexistência de qualquer predisposição no sentido de beneficiar ou de prejudicar qualquer das partes, e consistindo a segunda na ausência de circunstâncias externas, no sentido de aparentes, que revelem que o juiz tem um pendor a favor ou contra qualquer das partes, afectando a confiança que os cidadãos depositam nos tribunais” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 08-05-2024, Pº 5423/22.1JAPRT-A.P1, rel. PAULA PIRES).
Por outra parte, a consideração da existência de motivo sério e grave adequado a pôr em causa a imparcialidade do julgador, há-de fundar-se em concretas circunstâncias e não em juízos ou conjeturas genéricas e imprecisas.
Conforme se referiu na decisão do Vice-Presidente do Tribunal da Relação de Évora de 08-05-2024 (Pº 254/22.1T8LGS.E1, rel. TOMÉ DE CARVALHO): “Para que se possa suscitar eficazmente a suspeição de um juiz não basta invocar o receio da existência de uma falta de imparcialidade é necessário que esse receio nasça de alguma das circunstâncias integradas na esfera de protecção da norma. A aferição da suspeição deve ser extraída de factos ou eventos concretos, inequívocos e concludentes que sejam susceptíveis de colocar em causa a independência e a imparcialidade do julgador e a objectividade do julgamento”.
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IV. Colocados os parâmetros enunciados que importa observar, analisemos a situação concreta, apreciando se o incidente de suspeição deverá proceder ou improceder.
Importa considerar que, de acordo com os elementos constantes dos autos, não se justificam, nem se mostram pertinentes ou necessárias outras diligências, cumprindo julgar o incidente – cfr. artigo 123.º, n.º 3, do CPC.
A requerente da suspeição invoca diversas circunstâncias e vicissitudes processuais, onde procura sustentar a suspeição que deduz.
Vejamos:
Coloca a requerente da suspeição em questão a justeza do despacho de 02-04-2025, dizendo que apresentou nos autos respetivos os requerimentos de 02-03-2025 e de 04-05-2025, a justificar os motivos do incumprimento, requerimentos que têm sido “liminarmente ignorados” pela Juiz e referindo que, o último, não mereceu qualquer pronúncia.
Ora, considerando os despachos proferidos em 02-04-2025 e em 06-05-2025 verifica-se que, ao invés do invocado, a Sra. Juíza se pronunciou sobre os requerimentos antes apresentados, nos referidos autos, pela requerente da suspeição e aí requerida.
Não se mostra, pois, omitida pronúncia por banda do Tribunal.
De todo o modo, importa sublinhar que, a alegação efetuada pela requerente da suspeição, a este respeito, traduz, tão só, a invocação de questões de exclusiva natureza jurisdicional, manifestando a sua discordância com as decisões jurisdicionais tomadas no processo que elenca, mas, este descontentamento, não pode ser apreciado em incidente de suspeição, cujo escopo não se destina a apreciar questões técnicas relacionadas com o mérito de uma pretensão apresentada em juízo e com a valoração – ou não – de determinado facto ou com respeito à valoração que o Tribunal efetue sobre tal facto.
Com efeito, do facto de um juiz ter proferido decisões desfavoráveis ou não compreendidas por uma das partes não pode extrair-se qualquer ilação quanto a eventuais sentimentos de amizade ou inimizade ou, até, de mera simpatia ou antipatia por uma delas, ou ainda de parcialidade (assim, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16-05-2002, Pº 01P3914, rel. SIMAS SANTOS).
A função jurisdicional “implica, pela sua própria natureza e quase sem excepções, a necessidade de dar razão a uma das partes e negá-la à outra, rejeitando as suas pretensões e sacrificando os seus interesses concretos. Daí que não seja possível retirar do facto de alguma, ou algumas, das pretensões formuladas por uma das partes terem sido rejeitadas a conclusão de que o julgador está a ser parcial ou a revelar qualquer inimizade contra a parte que viu tais pretensões indeferidas" (despacho do Presidente da Relação de Lisboa de 14-06-1999, in CJ, XXIV, 3.º, p. 75).
Não se conformando com as decisões judiciais proferidas, o requerente da suspeição tem ao seu dispor todos os mecanismos legais de impugnação que sejam processualmente admissíveis, mas não, o incidente de suspeição.
O incidente de suspeição não é, de facto, o mecanismo adequado para expressar a discordância jurídica ou processual de uma parte sobre o curso processual de uma diligência ou sobre os atos jurisdicionais levados a efeito pelo julgador. A jurisprudência dos nossos tribunais superiores tem, de forma constante, evidenciado esta asserção (disso são exemplo as decisões expressas nos seguintes acórdãos: STJ de 09-03-2022, Pº 5/22.0YFLSB, rel. HELENA FAZENDA; STJ de 23-09-2020, Pº 685/13.8JACBR.C1-A.S1, rel. MANUEL AUGUSTO DE MATOS; TRL de 11-10-2017, Pº 6300/12.0TDLSB-A-3, rel. JOÃO LEE FERREIRA; TRP de 21-02-2018, Pº 406/15.0GAVFR-A.P1, rel. ELSA PAIXÃO; TRP de 11-11-2020, Pº 1155/18.3T9AVR-A.P1, rel. JOSÉ CARRETO; TRE de 08-03-2018, Pº 13/18.6YREVR, rel. JOÃO AMARO).
Iguais considerações são de efetuar quanto ao invocado contraditório comportamento da Sra. Juíza referente à aplicação de disposições processuais.
No mais, invoca a requerente da suspeição que, na conferência de pais de 06-05-2025, a Sra. Juíza permitiu “generosamente, a intervenção directa do requerente/progenitor”.
Não se encontra na forma de intervenção do progenitor, que durou escassos minutos, o qualificativo encontrado pela requerente da suspeição, nem se antevê da aludida intervenção – um dos atos inerentes à concretização da conferência com a finalidade para que o progenitor foi convocado (cfr. artigos 21.º, n.º 1, al. a) e 41.º, n.º 3, do RGPTC) – alguma parcialidade procedimental.
No mais, não se encontra na forma como teve lugar a demais intervenção da Sra. Juíza – enquadrada no âmbito do exercício dos poderes de gestão da diligência a seu cargo (onde lhe incumbe, nomeadamente, a observância das prerrogativas de manutenção da ordem dos atos processuais a seu cargo – cfr. artigo 150.º do CPC, ex vi, do artigo 33.º do RGPTC) – alguma postura que possa considerar-se como quebra da devida imparcialidade.
De facto, ouvida a gravação da diligência operada em 06-05-2025, não se encontra na forma de intervenção levada a efeito pela Sra. Juíza nenhuma conduta suscetível de poder constituir circunstância ponderosa apta a poder suspeitar-se da sua imparcialidade.
Efetivamente, não nos cabendo ajuizar sobre o modo como decorreu a tomada de esclarecimentos junto do Patrono da requerida do processo de incumprimento, certo é que, não divisamos, na intervenção realizada pela Sra. Juíza nenhum comportamento indevido, descortês, indevido ou, independentemente disso, relevador de alguma postura indevida quanto à imparcialidade relativamente ao litígio em presença.
A forma de intervenção, o tom usado, a postura ou posição de cariz “subliminar” (segundo o invocado pela requerida) subjetivizado pela requerida e/ou pelo respetivo Patrono, mesmo que possam ser por estes criticáveis, não permitem, com a necessária objetividade e concretização factual, assinalar alguma quebra da imparcialidade pela Sra. Juíza, tanto mais que, a respetiva intervenção ocorreu no âmbito do específico objeto processual que lhe incumbia determinar.
Não se verifica, é certo, que tenha ocorrido alguma indevida ou inusitada interrupção da intervenção levada a efeito pelo respetivo causídico e, ainda que tal sucedesse, isso não representaria, por si só, alguma quebra da isenção devida, o que não se demonstra.
Invoca, por fim, a requerente da suspeição que a Sra. Juíza “de modo antecipatório e antes da produção de qualquer prova essencial à descoberta da verdade material e da boa decisão da causa, express[ou] o seu entendimento, claramente tendencial, em benefício do requerente e em desfavor da aqui requerida, logo, não neutral”, “[d]escurando, putativamente, a concreta realidade da situação objecto dos presentes autos, em que está em causa o bem-estar e a segurança de uma menor ainda bebé de cerca de um ano de idade, relevando apenas, tout court, os argumentos esgrimidos pelo requerente na fundamentação de um presumido incumprimento por parte da aqui requerida”; as afirmações da Sra. Juíza “traduzem claramente um pré-juízo sobre a sua pré-compreensão atinente à motivação decisória, descortinando-se, efectivamente, uma concreta evidência de violação de direitos da (…) requerida conducentes à conclusão de não isenção e de parcialidade subjectiva” e que adotou “uma postura inequívoca e continuada quanto à tomada de posição ao longo dos presentes autos, quer na condução dos trabalhos, quer nos comentários tecidos a título de pré-juízos negativos em relação à aqui requerida, quer ainda, na prolação de despachos impositivos do cumprimento do acordo do exercício das responsabilidades parentais”, “[c]ircunstâncias adequadas a formular a convicção no espirito da aqui requerida, bem como do seu Patrono, de que a Mm.a juiz, antecipadamente, assimilou os factos que o requerente imputa à aqui requerida, como verdadeiros e desvalorizando na integralidade a argumentação aduzida por esta, afigura-se que resulta evidenciando a parcialidade e falta de isenção da Mm.a Juiz”.
Importa referir que, do facto de um juiz ter proferido decisões desfavoráveis a uma das partes não pode extrair-se qualquer ilação quanto a eventuais sentimentos de amizade ou inimizade ou, até, de mera simpatia ou antipatia por uma delas, ou ainda de parcialidade (assim, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16-05-2002, Pº 01P3914, rel. SIMAS SANTOS).
A função jurisdicional “implica, pela sua própria natureza e quase sem excepções, a necessidade de dar razão a uma das partes e negá-la à outra, rejeitando as suas pretensões e sacrificando os seus interesses concretos. Daí que não seja possível retirar do facto de alguma, ou algumas, das pretensões formuladas por uma das partes terem sido rejeitadas a conclusão de que o julgador está a ser parcial ou a revelar qualquer inimizade contra a parte que viu tais pretensões indeferidas" (despacho do Presidente da Relação de Lisboa de 14-06-1999, in CJ, XXIV, 3.º, p. 75).
Conforme se lê no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 20-03-2006 (Pº 458/06-2, rel. FERNANDO MONTERROSO): “As simples expressões através das quais o juiz revele a credibilidade que dá a determinada declaração, ou a outro meio de prova, não bastam para deduzir a sua recusa e a violação de alguma das regras sobre a aquisição da prova pode ser impugnada por vários os meios (desde a arguição de irregularidades ou nulidades até à interposição de recurso), mas nenhum deles passa pela dedução do incidente da recusa do juiz. O processo de decisão do juiz não se inicia apenas depois de terminadas as alegações orais, pois, inevitavelmente, ele vai analisando e confrontando os diversos depoimentos e fazendo juízos sobre a credibilidade de cada um deles, mas o importante é que, até ao final das alegações, não feche o espírito à possibilidade de valorar todas as contribuições para a prova, quer confirmem ou infirmem os juízos que foi fazendo. As regras da boa prudência aconselham que o juiz não revele os seus juízos, mas (…), por vezes deve tomar decisões que, ao menos implicitamente, indicam a credibilidade que, até aí, lhe parece merecer determinado depoimento, sem que, em todo o caso, da circunstância da convicção já estar em processo de formação, possa ser tirada a conclusão de que já existia um «pré juízo»”.
No caso em apreço, nenhuma das menções efetuadas pela Sra. Juíza no âmbito da aludida intervenção levada a efeito na diligência de 06-05-2025 patenteia algum “pré-juízo” sobre a motivação decisória do mérito da causa ainda a apreciar, mostrando-se circunscritas à respetiva finalidade apreciativa e decisória então proferida, ou seja, à observância do respetivo dever de administrar a Justiça.
Com efeito, na economia da interpelação efetuada pela Sra. Juíza ao Ilustre Patrono da requerida ou na prolação das decisões por si proferidas, não é possível concluir, ao contrário do que o faz a requerente da suspeição, que possa estar inquinado o processo de julgamento ainda a cargo do julgador, apenas sucedendo que, como tantas vezes ocorre, o juiz tem de, nas concretas circunstâncias de tramitação processual, tomar posição sobre o estado da causa, decidir pretensões e incidentes interlocutórios, de um modo ou de outro, tomando os esclarecimentos necessários, aplicando o Direito, sem que isso possa revelar, em si mesmo, alguma quebra da imparcialidade devida pelo julgador.
Podemos entender que a requerente da suspeição não se reveja no conteúdo de posições tomadas pelo julgador, mas tal não revisão, descontentamento ou discordância, não implica parcialidade do julgador.
A Justiça é feita caso a caso, tendo em consideração a real e objetiva situação a dirimir.
O Juiz não é parte nos processos, devendo exercer as suas funções com a maior objetividade e imparcialidade, sabendo-se que nem sempre se consegue passar esta imagem, mas, o que releva é que esta conceção esteja materializada no julgador e que o utente da justiça, a final, a compreenda.
Perante os elementos disponíveis e o contexto em que teve lugar a intervenção da Sra. Juíza, nos autos em questão e do modo como tal sucedeu, não se conclui que, objetiva e subjetivamente, se mostre posta em causa a imparcialidade do julgador, mesmo em face da constatação, que assinalou, no sentido de que o acordo antes havido teria que ser alterado em determinados aspetos e, se calhar, em termos que não iriam ao encontro da pretensão da requerida.
A vacuidade da afirmação efetuada, não permite, nem pode permitir, alguma consideração diversa a este título.
Assim sendo, entendemos não se encontrarem reunidos os pressupostos que materializam o incidente, o que conduz à sua improcedência.
Não se nos afigura a existência de litigância de má-fé da requerente da suspeição, não se patenteando alguma das circunstâncias a que se reporta o n.º 2 do artigo 542.º do CPC (cfr. artigo 123.º, n.º 3, do CPC).
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V. Face ao exposto, indefiro a suspeição deduzida relativamente à Sra. Juíza de Direito BB.
Não se vislumbra má fé na litigância da requerente da suspeição.
Custas a cargo da requerente do incidente, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficie.
Notifique.