RESPONSABILIDADES PARENTAIS
REGIME PROVISÓRIO
FIXAÇÃO DA RESIDÊNCIA HABITUAL DA CRIANÇA
REGIME DE VISITAS
PENSÃO DE ALIMENTOS
Sumário


I As regras relativas à obrigatoriedade de fundamentação fatual e jurídica das sentenças podem ser aplicadas aos despachos decisórios, que igualmente têm de ser devidamente fundamentados de facto e de direito, decorrendo o maior ou menor grau de exigência do seu respeito, da maior ou menor complexidade da questão a dirimir.
II Impõe-se a sua observância numa decisão provisória de regulação do exercício das responsabilidades parentais, ao abrigo dos art.ºs 28º e 38º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, aprovado pela Lei n.º 141/2015 de 8/9 (RGPTC).
III Cabe aos pais, num primeiro momento, diligenciar pelas melhores soluções para os seus filhos numa situação de crise/separação do casal. Encontrada uma primeira alternativa, cabe-lhes facilitar e promover o contacto dos filhos com o outro. A sua postura será avaliada pelo Tribunal. E muitas vezes determina o sentido da decisão a proferir.
IV A decisão relativa ao valor da pensão de alimentos num regime provisório é fundada no justo arbítrio do julgador, e, numa fase embrionária dos autos, antecedida da recolha dos elementos mínimos à decisão de caráter provisório.

Texto Integral


Acordam os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

I RELATÓRIO (com consulta eletrónica da integralidade dos autos).

Em 17/2/2025 AA intentou ação de regulação do exercício das responsabilidades parentais contra BB, visando os filhos do casal, CC, nascido a ../../2008, e DD, nascida a ../../2012.
Realizada conferência de pais em 7/5/2025 (constando gravação das declarações prestadas), foram ouvidas as crianças, constando em ata que manifestaram vontade de ficar a viver com o pai.
Foram também ouvidos ambos os progenitores.
Em resposta à solicitação determinada pelo Tribunal, a CPCJ informou que existe processo de promoção e proteção relativo às crianças, em fase de avaliação diagnóstica.
Em resposta à solicitação determinada pelo Tribunal, foi localizado o processo de inquérito 369/25.4GBBCL em que é arguido o requerido, estando em causa crime de violência doméstica contra cônjuge ou análogos; mais foi localizado o inquérito 1404/24.9GBBCL, em que igualmente é arguido, e por dano simples. Em ambos é ofendida a requerente.
Em resposta à solicitação determinada pelo Tribunal, a GNR informou que foram registadas duas deslocações à residência da Sr.ª AA, nos dias 7/4/2025 e 8/4/2025, e os factos foram participados ao DIAP de Barcelos no âmbito do processo 369/25.4GBBCL.
Em 1/7/2025 o MP promoveu que em sede provisória se fixasse a residência dos filhos junto do pai, não havendo condições para o exercício conjunto das responsabilidades parentais; mais promoveu que a pensão de alimentos a cargo da progenitora fosse fixada em € 125,00 mensais, e que as despesas escolares, médicas e medicamentosas fossem suportadas por ambos os progenitores na proporção de metade; e que outras despesas fossem suportadas a meias desde que autorizadas. Em sede de visitas, propôs um regime livre, sem prejuízo do repouso das crianças, horas de refeições e de realização de atividades escolares e extracurriculares.
Em 15/7/2025 foi obtido acordo no apenso D (Falta de Acordo), tendo sido o mesmo homologado, mediante o qual a progenitora autorizou que os filhos se deslocassem à ... na companhia do pai no período de 15/8 e 1/9, e por sua vez o pai deu o seu acordo a que os filhos passassem um período de férias correspondente à primeira quinzena de agosto na companhia da mãe.

Em 16/7/2025 foi proferido despacho a regular provisoriamente o exercício das responsabilidades parentais, que culminou no seguinte:
“i. Os menores residirão habitualmente com o pai, a cuja guarda e cuidados ficam confiados, a este cabendo o exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente dos filhos.
ii. As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida dos menores serão exercidas em comum por ambos os progenitores, salvo nos casos de manifesta urgência, em que qualquer deles poderá agir sozinho, devendo prestar informações ao outro logo que possível.
iii. Quando se encontrarem temporariamente com a progenitora, caberá a esta o exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente dos filhos, não devendo, no entanto, contrariar a orientações educativas mais relevantes tal como definidas pelo progenitor.
iv. A progenitora poderá contactar e conviver com os filhos em regime livre, nos moldes a articular com eles e com o progenitor, mas sempre sem prejuízo das suas horas de descanso, alimentação, e das actividades escolares e circum-escolares.
v. A progenitora contribuirá para o sustento de cada um dos filhos com uma prestação de alimentos no valor mensal de € 125,00 (cento e vinte e cinco euros), que entregará ao pai até ao dia 8 de cada mês através de transferência bancária, actualizando-se essa prestação todos os anos, a partir de Janeiro de 2026, em € 5,00 (cinco euros).
vi. A mãe suportará ainda metade das despesas médicas extraordinárias (v.g. óculos, aparelhos dentários, lentes graduadas, cirurgias, internamentos hospitalares, etc.), assim como igual proporção das despesas com consultas médicas e com medicamentos receitados por médico, bem como com a aquisição de livros e outro material necessário às actividades escolares do CC e da DD.
vii. Essas despesas serão facturadas em nome da criança a que disserem respeito e os comprovativos entregues à progenitora até final de cada mês, que deverá entregar ao pai a comparticipação que lhe compete juntamente com a prestação alimentar do mês seguinte, e pela mesma via.”
As partes foram remetidas para a audição técnica especializada, por um período máximo de dois meses.
Inconformada, a requerente apresentou recurso com alegações que terminam com as seguintes
-CONCLUSÕES-(que se reproduzem)
“1.ª – Com todo o respeito, a recorrente entende que o despacho padece de nulidade, pois não especifica adequadamente os fundamentos de facto que sustentam a decisão, limitando-se a uma referência genérica às declarações prestadas, à audição das crianças e à prova documental, sem explicitação concreta dos meios probatórios valorizados nem dos critérios de apreciação seguidos - vd. artigo 615.º, n.º 1, alínea b) do CPC
2.ª – A recorrente requer a alteração do ponto m) da matéria de facto para a seguinte redação: “O requerido é sócio-gerente de uma empresa de metalurgia que emprega cerca de 20 trabalhadores, auferindo uma remuneração que excede substancialmente a declarada de € 1.300,00.”
Tal redação traduz com maior fidelidade a realidade apurada na conferência de pais, atendendo aos indícios objetivos revelados pelo próprio recorrido e ao seu padrão de vida incompatível com o vencimento declarado, como a condução habitual de veículos de luxo (..., EE) e o uso de objetos de elevado valor (relógio superior a €4.000,00 e blusão acima de €1.000,00) - vd. declarações do recorrido prestadas na conferência de pais a min. 01:15-04:30
3.ª – Resultando diretamente da prova documental junta, deveriam constar como provados os seguintes factos:
 O recorrido está constituído arguido no processo n.º 369/25.4GBBCL, pendente no DIAP de Barcelos, pela alegada prática de crime de violência doméstica contra a recorrente;
 Está igualmente arguido no processo n.º 1404/24.9GBBCL, pendente no DIAP de Barcelos, pela alegada prática de crime de dano simples contra a recorrente;
 A GNR deslocou-se à residência da recorrente nos dias 07 e 08.04.2024, na sequência de ocorrências relacionadas com o processo n.º 369/25.4GBBCL.
- vd. informação prestada pela Unidade Central em 26.05.2025 e informação prestada pelo Posto ... da GNR, datada de 27.05.2025 (27.05.2025)
4.ª – A inclusão destes factos na matéria de facto é fundamental, pois refletem o contexto relacional e comportamental do recorrido perante a recorrente, o que não pode ser desvalorizado na apreciação global da causa, especialmente no que respeita à definição do regime de responsabilidades parentais
5.ª – A recorrente não concorda com a decisão do Tribunal a quo de fixar a residência habitual dos menores junto do pai, porquanto tal solução não se revela a mais adequada nem salvaguarda, no caso concreto, o superior interesse das crianças:
- apesar da oposição dos menores em residir com a mãe, não há razão objetiva ou grave que justifique romper o contexto familiar até então existente;
- tal oposição deve-se, muito provavelmente, ao facto de a recorrente impor regras e disciplina, que os adolescentes rejeitam num momento de rebeldia natural;
- a recorrente sempre foi a principal referência afetiva e cuidadora dos filhos, tendo assumido, desde o nascimento, um papel central no seu acompanhamento diário, nas rotinas escolares e nos cuidados de saúde;
- a experiência judiciária demonstra que nem sempre o desejo dos menores coincide com o seu superior interesse, especialmente quando esse desejo está influenciado por fatores conjunturais, como maior permissividade, oferta de bens materiais ou ausência de regras
- os menores residem com a avó paterna, que não tem capacidade para impor limites ou supervisionar eficazmente, resultando numa rotina de ampla liberdade e ausência de acompanhamento;
- os menores encontram-se num contexto de ausência parental efetiva, sem regras, sem acompanhamento escolar, sem orientação próxima — o que é particularmente grave numa fase de vida formativa e emocionalmente vulnerável;
- a afetividade da recorrente é recusada não por ausência de amor ou negligência, mas por exigir disciplina e atenção constante, ausentes na atual situação paternal;
- não existe qualquer indício que aponte para a existência de negligência, violência física ou psicológica, ou qualquer outra conduta parental reprovável por parte da ora recorrente mas existem tais indícios contra o recorrido que foi constituído arguido em dois processos-crime, a correr termos no DIAP de Barcelos, com os nºs 369/25.4GBBCL e 1404/24.9GBBCL pelos quais responde por crimes de violência doméstica e dano;
- a desigualdade financeira entre recorrente e recorrido também deve ser ponderada porque a ostentação do recorrido – com oferta de presentes e férias aos menores, que a recorrente não consegue igualar – contribui para o afastamento afetivo em relação à recorrente
- vd. declarações que recorrente e menores prestaram na conferência de pais com as transcrições nas pp. 12 a 23 antecedentes
- vd. informação prestada pela Unidade Central em 26.05.2025 e informação prestada pelo Posto ... da GNR, datada de 27.05.2025
6.ª – Compreende-se que os filhos prefiram uma rotina permissiva, sem obrigações nem contrariedades, mas não se compreende — nem se aceita —que essa preferência subjetiva possa servir de base para determinar o local de residência habitual, quando tal vai contra o seu verdadeiro interesse
- vd. artigo 4.º, n.º 1 do RGPTC
7.ª – A manter-se a situação atual, é expectável um afastamento progressivo da recorrente — sem que esta tenha feito algo que o justifique, a não ser o exercício firme e consciente do seu papel de mãe, sem nunca pretender ou afetar o bem-estar ou o “superior interesse” dos seus filhos
8.ª – Não há, por isso, motivos para que os menores passem a residir com o recorrido (ou, como sucederá, se mantenham a residir com a sua avó paterna) e essa situação não garante o acompanhamento necessário ao seu desenvolvimento nem protege os menores do risco de negligência educativa pois que tal significa que, na prática, os menores ficarão a residir com um terceiro, à margem do controlo parental efetivo, o que desvirtua totalmente os pressupostos da decisão recorrida
9.ª – Caso seja acolhido o recurso quanto à alteração da residência, o ponto iii) da decisão deve ser reformulado nos seguintes termos: “Quando os menores estiverem com o progenitor, este exercerá as responsabilidades parentais relativas aos atos da vida corrente, sem contrariar as orientações educativas definidas pela progenitora.”
10.ª – No caso de não ser procedente o recurso na parte relativa à residência dos menores, a recorrente impugna a fixação de um regime livre de visitas porquanto ficou claro nos autos que, ao contrário do que deveria suceder, os filhos praticamente não mantêm contacto com a recorrente, apesar de estar fixado um regime de convívios livres:
- ambos os menores admitiram, nas respetivas audições, que raramente estão com a mãe, sendo que a DD chegou mesmo a afirmar não saber há quanto tempo não passa tempo com ela;
- esta ausência de convivência traduz um claro afastamento que, se mantido, apenas agravará o vínculo afetivo entre mãe e filhos, conduzindo a uma progressiva rutura da relação, o que é manifestamente contrário aos interesses dos menores
- vd. declarações dos menores prestadas na conferência de pais transcritas na p. 24 antecedente
11.ª – Tal solução, longe de proteger os direitos e interesses dos menores, traduz-se, na prática, numa abstenção do Tribunal a quo quanto ao dever de assegurar o direito ao convívio regular com ambos os progenitores — e, em particular, com a recorrente, que até à separação foi a figura de maior referência no seu quotidiano; aceitar que, num contexto de conflito parental e ausência de articulação, os contactos se processem em “regime livre” é deixar ao abandono uma dimensão essencial da parentalidade — a convivência
12.ª – Um regime livre só pode funcionar em contextos de elevada cooperação parental e com maturidade dos menores, o que manifestamente não se verifica no caso dos autos: as relações entre os progenitores são fortemente marcadas pela conflitualidade — sendo o recorrido arguido em dois processos-crime pendentes, um deles por violência doméstica contra a ora recorrente — e a relação dos menores com a mãe tem vindo a degradar-se de forma evidente, não por desinteresse desta, mas pelo contexto de permissividade e afastamento a que estão atualmente expostos
13.ª – Numa situação idêntica, já decidiu o TRP em 06.02.2025, no proc. n.º 1142/24.0T8VNG-C.P1 :
IV - Verificando-se distanciamento entre o progenitor não guardião e os filhos, o regime de visitas a adotar deve promover a reaproximação e o restabelecimento dos laços de confiança entre todos.
V - Com esse fim, o regime a adotar deve ser, no caso concreto, não um regime ‘livre’, sujeito à prévia concordância da progenitora com quem residem e das próprias criança e jovem, mas um regime de visitas em dias em momentos previamente definidos.
14.ª – Por tudo isto, deve ser revogada a decisão proferida nesta parte, fixando-se um regime estruturado e regular de visitas — com dias, horários e condições claras, que assegurem o direito da mãe a estar com os filhos e, sobretudo, o direito dos filhos a manter um vínculo emocional e real com a sua mãe, propondo-se que, pelo menos, os menores jantem com a recorrente todas as quartas-feiras e passem com ela um fum de semana de quinze em quinze dias
15.ª – Igualmente no caso de ser improcedente o recurso a respeito do regime de residência dos menores, a recorrente impugna a decisão na parte em que lhe impõe o pagamento de uma prestação de alimentos no valor de €125,00 mensais por cada um dos filhos, com atualização anual de €5,00 a partir de janeiro de 2026 porquanto tal valor não resulta adequado às circunstâncias do caso em apreço nem devidamente justificado na decisão impugnada, peticionando que seja o mesmo reduzido para € 25,00 mensais por cada filho
- vd. art. 2004.º do CC
- vd. STJ de 09.03.2021, proc. n.º 4519/15.0T8MTS.P2.S1
16.ª – Sendo julgado procedente o presente recurso no que concerne à contribuição da ora recorrente para alimentos deverá também o ponto vi) da sentença ser reformulado nos seguintes termos: “O pai suportará ainda metade das despesas médicas extraordinárias (v.g. óculos, aparelhos dentários, lentes graduadas, cirurgias, internamentos hospitalares, etc.), assim como igual proporção das despesas com consultas médicas e com medicamentos receitados por médico, bem como com a aquisição de livros e outro material necessário às atividades escolares do CC e da DD.”

*
O requerido apresentou contra-alegações que terminam com as seguintes
-CONCLUSÕES-(que se reproduzem)
“1.º - Sempre se dirá que não assiste qualquer razão à Recorrente, bem decidindo o douto tribunal ao fixar o regime provisório do exercício das responsabilidades parentais relativas aos menores CC e DD.
2.º - A presente decisão encontra-se bem fundamentada, estando perante uma decisão provisório ao qual o douto tribunal decide sumariamente e de forma célere, reproduzindo a produção de prova e documentos juntos aos autos, através de averiguações sumárias tidos por convenientes, não padecendo, pelo exposto, de qualquer nulidade nos termos e para os efeitos do artigo 615.º n.º 1 al. b) do CPC.
3.º - Seguidamente, não assiste qualquer razão à Recorrente quanto peticiona a alteração da matéria de facto, bem como da matéria de direito, impugnando tudo o quanto decidido relativamente à residência fixada, montante de pensão de alimentos e regime de visitas.
4.º - Com todo o respeito, no que concerne à indicação das provas, a Recorrente não procede à indicação exata e precisa das passagens na gravação, não cumprindo o ónus legal do artigo 640.º do CPC.
5.º - E, vejamos que, ao reproduzir a matéria de facto, a mesma não se encontra devidamente transcrita, bem como teria que proceder a uma análise critica e não apenas uma interpretação descontextualizada, desvirtuada da realidade, com base em meras presunções e conclusões que em nada se coadunam com a realidade de vida dos menores.
6.º - Ora, não aceita a Recorrente o montante fixado a título de pensão de alimentos, considerando excessivo o montante de €125,00 – cento e vinte cinco euros por cada menor, peticionando a alteração, com a alegação de que o progenitor e aqui Recorrido tem uma condição de vida superior, assentando em convicções pessoais que não refletem a realidade.
7.º - Alimentos nos termos do artigo 2003.º nº 1 do Código Civil é “tudo aquilo que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário” ao qual se inclui a “instrução e a educação”; não sendo uma faculdade de conteúdo egoístico e de exercício livre, ao arbítrio dos respetivos titulares.
8.º - Sendo uma obrigação de alimentos, vigorando nesta matéria o princípio de igualdade de deveres de ambos os progenitores na manutenção dos filhos; não se restringe à prestação mínima e residual de dar aos filhos um pouco do que lhes sobra. É que “a natureza da obrigação, enquanto responsabilidade parental, impõe que se considere que as necessidades dos filhos sobrelevem as dificuldades económicas dos pais.
9.º - Pelo que, no caso concreto, sempre se dirá que o douto tribunal teve em consideração, estando perante uma decisão provisória, o rendimento do Recorrido no montante de €1.300,00 – mil e trezentos euros mensais e que vive numa casa arrendada, pelo menos aos fins-de-semana, como resulta da prova produzida.
10.º - E, a Recorrente, que continua a habitar a casa morada de família, sem qualquer custo mensal, mantendo o salário correspondente à retribuição mínima mensal.
11.º - Pelo que, o valor fixado no montante de €125,00 – cento e vinte e cinco euros mensais, corresponde ao mínimo legal para um filho menor, sendo que, o progenitor recairá sempre um montante mensal muito superior por cada filho menor.
12.º - Deste modo, o peticionado pela Recorrente, ao qual peticionada que seja fixado um valor de €25,00 – vinte e cinco euros mensais por cada filho menor, demonstra-se completamente desproporcional, irreal com os custos de vida atuais e que se vivem atualmente, sobrecarregando um progenitor para com o outro.
[i]11.º - Tanto mais, que a medida da contribuição de cada progenitor, para além das capacidades económicas de cada um para prover às necessidades dos filhos, sempre se dirá que estas necessidade sobrelevam a disponibilidade económica dos pais, no sentido de que o conteúdo da obrigação de alimentos que lhe compete cumprir, não se restringe à prestação mínima e residual de dar aos filhos um pouco do que lhes sobra.
12.º - Assim, sempre se dirá que não assiste qualquer razão ao peticionado pela Recorrente quanto à redução do valor da pensão de alimentos para o montante de €25,00 – vinte e cinco euros mensais, mantendo-se o valor de €125,00 – cento e vinte cinco euros mensais por cada filho menor.
13.º - Bem como, sempre se dirá que, quanto à inclusão no ponto m) da matéria de facto acrescentando “auferindo uma remuneração que excede substancialmente a declarada de €1.300,00”, não assiste qualquer razão à Recorrente, porquanto foi devidamente esclarecido que a viatura conduzida pelo Recorrido é da propriedade da empresa, nem sendo tão pouco esclarecido, nem relevante para os presentes autos o relógio ou blusão do Recorrido.
14.º - De facto, ao acrescentarmos tal ponto na matéria de facto, estará em muito a extravasar a matéria de facto e de direito destes autos, sendo que, como já anteriormente mencionado, o montante fixado de pensão de alimentos à Recorrente, ficou estabelecido pelo mínimo habitualmente fixado pelos tribunais, tendo em consideração o custo de vida e a realidade económica de cada progenitor.
15.º - Sempre se dirá que não assiste razão à Recorrente quando alega que o douto tribunal desconsiderou a existência de processos crimes em fase de inquérito, bem como a informação da GNR datada de 27.05.2025 para a decisão provisória; porquanto, consta dos autos, bem como do parecer emitido pelo Ministério Público, os pedidos de consulta do estado daqueles processos, bem como a acompanhar o desenvolvimento daqueles.
16.º - Ademais, em todos os processos mencionados, não foi aplicado qualquer medida de coação de proibição de contacto entre progenitores, nem qualquer outra situação definida nos termos do artigo 44.º A RGPTC.
17.º - Ainda, sempre se dirá que em momento algum, o Recorrido, praticou qualquer facto suscetível de integrar o crime de violência doméstica ou qualquer outro, não subsistindo qualquer perigo para os menores.
18.º Peticiona a Recorrente a alteração da matéria de direito quanto à alteração do regime provisório de regulação das responsabilidades parentais relativamente aos pontos i), iii), iv), bem como v) e vi) já exposto supra.
19.º - É certo que os menores quando questionados com quem pretendiam residir, ambos foram perentórios e assertivos quando mencionaram que pretendiam ficar a residir com o progenitor, perante o afastamento progressivo e mau ambiente criado pela progenitora, declarações devidamente reproduzida no corpo do texto.
20.º - Os menores no momento da separação dos progenitores ficaram a residir com a progenitora, sendo que, devido aos comportamentos daqueles, eles optaram por abandonar a residência da mãe, passando a residir na avó paterna (vizinha da residência da mãe), sendo que o progenitor, passou a pernoitar na casa da avó paterna, para manter as rotinas dos menores, como ir levar e buscar à escola, jantar com os menores e acompanhar os menores diariamente; sendo que, já houveram várias tentativas de regressarem à casa para junto da mãe, mas nunca correram bem.
21.º - Sendo falsa qualquer alegação que o progenitor ou a avó paterna dão mais liberdade ou não impõe regras; sendo que, o facto do menor, ter tido más notas, vem de uma fase em que aquele residia apenas com a progenitora e aqui Recorrente, que causou vários conflitos com os menores, não estabelecendo uma relação saudável e harmoniosa com aqueles.
22.º - Bem como, é totalmente falso que a progenitora compra apenas o essencial e o progenitor dá bastantes prendas, sendo a afirmação dos menores que o “pai compra o essencial” e que não estão com ele devido a prendas, pelo que deve ser ouvida devidamente as declarações do menor CC, ao minuto 04:50.
23.º - Ora, o progenitor tem-se dedicado aos filhos menores, e embora tenha arrendado um apartamento em ..., o qual aos fins-de-semana os menores vão para a sua companhia em ..., com a mudança dos menores para a casa da avó paterna, o mesmo passou a pernoitar e a fazer a sua vida na casa da avó paterna, local que os menores afirmaram sentirem-se mais seguros do que na casa da Recorrente.
24.º - Pelo que, pelo superior interesse dos menores, não assiste qualquer razão para o pedido de alteração de residência dos menores para junto da Recorrente, perante o estado da relação entre os menores e a Recorrente, que causa instabilidade e insegurança naqueles, face aos conflitos que tem ocorrido entre filhos e progenitora.
25.º - Sendo o regime provisório fixado, aquele que mais salvaguarda os menores, não se aceitando qualquer alegação e meras presunções e interpretações erróneas de que o progenitor “compra” os menores, que dá liberdade ou não impõe regras aos menores, sendo falsas tais alegações. O progenitor tem criado um ambiente tranquilo, seguro e estável para que os menores cresçam e se desenvolvam saudavelmente, o que seguramente se irá refletir nos estudos.
26.º -Nestes termos, sempre de dirá que deverá ser mantido tudo o quanto fixado relativa à residência dos menores junto do progenitor e aqui Recorrido mantendo-se nos mesmos termos o fixado na alínea i) da douta decisão proferida.
27.º - O mesmo se dirá quanto ao regime de visitas fixado nos termos da alínea iv) da decisão proferida, designadamente, quanto ao regime de visitas fixado.
28.º - Conforme a douta sentença “determina o artigo 38º do R.G.P.T.C. que seja o juiz a decidir provisoriamente sobre o pedido de regulação, em função dos elementos já obtidos, normativo que se conexiona com a previsão do nº 1 do artigo 28º daquele diploma legal, segundo a qual, em qualquer estado da causa, o tribunal pode – neste momento processual, deve – decidir provisoriamente questões que devam ser apreciadas a final.”
29.º - E, fundadamente o douto tribunal esclareceu que “embora não tivessem ficado completamente esclarecidos os motivos que estarão na base dessa rejeição dos menores relativamente à figura materna – mas sempre referiram, p. ex., que não gostavam dos comentários depreciativos acerca do pai que ela recorrentemente fazia na presença deles - , a realidade é que um jovem com dezassete anos de idade e uma adolescente com doze anos manifestaram não apenas a sua vontade de viver com o pai, mas, mais do que isso, a recusa de voltarem a residir habitualmente com a mãe; assim como rejeitaram a hipótese de, por enquanto, serem forçados a visitar a progenitora ou manterem com ela convívios num regime fixo, como habitualmente sucede.”
30.º - Por conseguinte, resultou das declarações dos menores, o CC com 17 anos e a DD com 12 anos, que neste momento tem dificuldades de relacionamento com a progenitora, pelo que, não subsiste razão para que se imponha, sem mais, os convívios com a progenitora.
31.º - Pelo que a imposição por si só, poderá ter um efeito de ainda agravar ainda mais a relação entre progenitora e filhos, sendo que, estamos perante um decisão provisório, tendo sido os presentes autos reencaminhado para audição técnica e especializada, o que poderá eventualmente, surgirem ferramentas de aproximação de progenitora com os filhos menores.
32.º - Pelo que, reitera-se que não assiste qualquer razão à Recorrente quanto ao decidido, devendo-se o mesmo manter inalterado, sempre no superior interesse dos menores.
33.º - Sempre se dirá que decisão provisória de regulação de responsabilidades parentais é aquela que melhor defende o superior interesse dos menores.
34.º - Deverá ser mantido tudo o quanto decidido, seja quanto ao valor estabelecido da pensão de alimentos a pagar, seja quanto à residência fixada, bem como ao regime de visitas, não devendo alterar-se a matéria de facto nem tão pouco de direito, nem acrescentar novos factos aos factos dados como provados.
35.º - Pelo que, andou bem o douto tribunal quando na sua fundamentação foi claro e determinante para o regime de visitas que, conforme se transcreve a douta sentença, “a realidade é que um jovem com dezassete anos de idade e uma adolescente com doze anos manifestaram não apenas a sua vontade de viver com o pai, mas, mais do que isso, a recusa de voltarem a residir habitualmente com a mãe; assim como rejeitaram a hipótese de, por enquanto, serem forçados a visitar a progenitora ou manterem com ela convívios num regime fixo, como habitualmente sucede”.
36.º - E, tal como a douta promoção do Ministério Público “decidir-se-á confiar provisoriamente as crianças ao requerido, fixando-se junto dele a residência habitual dos filhos, mas mantendo-se cometido a ambos os progenitores o exercício em conjunto das responsabilidades parentais relativamente às questões de particular importância para a vida dos descendentes (como é regra nos termos do nº 1 do artigo 1906º do Código Civil), por se considerar que as dificuldades de relacionamento e comunicacionais actualmente existentes entre a requerente e requerido não constituem razão bastante para afastar aquele princípio.”
37.º - Por conseguinte, “já no que respeita à fixação dum regime convivial, somos a entender – tal como o Ministério Público – que o actual circunstancialismo, isto é, a difícil relação presentemente existente entre a mãe e dois filhos nestas idades, desaconselha que se estabeleça um regime de visitas rígido, que “imponha” às crianças a obrigação de, mesmo contra as suas vontades, contactarem e conviverem com a mãe em períodos certos e mais ou menos prolongados.
38.º - Duvida-se muito que um regime estabelecido nesses moldes pudesse ser pacificamente posto em prática no actual contexto. Acredita-se, pelo contrário, que um tal regime fixo e inflexível acabaria por trazer mais prejuízos do que benefícios para a desejável normalização da relação entre a requerente e os seus filhos.”
39.º - Quanto ao possível afastamento dos menores com a Recorrente, somos do entendimento, que perante o afastamento progressivo causado pela Recorrente com os sucessivos conflitos com os menores, sempre se dirá que com a Audição Técnica Especializada, poderão adquirir ferramentas para que todos (menores e progenitora) possam voltar a aproximar-se, não sendo, no caso concreto, pela via da imposição (face à idade) a melhor solução.
40.º - Decisão fixada que garante um desenvolvimento físico, psíquico, moral e harmonioso para os menores, sendo a principal exigência na regulação do exercício das responsabilidades parentais, ainda que provisoria, é que a mesma satisfaça os interesses dos menores.
41.º - Pelo que, salvo melhor opinião, deve negar-se provimento ao presente recurso mantendo-se integralmente a decisão recorrida.”
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O MP também apresentou contra-alegações que terminam com as seguintes
-CONCLUSÕES-(que se reproduzem)

“1. As questões suscitadas nas presentes alegações subsumem-se à necessidade de saber se (i) existe nulidade do douto despacho escrutinado, por falta de fundamentação, (ii) deve a matéria dada como provada ser alterada para modificar a residência das crianças, fixando-a junto da apelante, sua mãe, e, (iii) se assim não se entender, deve o regime convivial estabelecido entre si e os seus filhos ser alargado, por insuficiente (1), e a prestação alimentícia fixada para cada uma das crianças ser alterada de 125,00 € para 25,00 € mensais (2);
2. A decisão apelada, prolatada no âmbito de um procedimento de urgência – providência cautelar – é provisória, instrumental daquela a ocorrer em momento posterior no próprio processo de regulação do exercício das responsabilidades parentais e funda-se em prova simples e bastante para demonstrar à saciedade ao destinatário as razões aduzidas para assim concluir;
3. Mesmo que não se tivesse em conta aquela realidade, sempre se diria que tal decisão não é nula nos termos do artº 615º, nº 1, al. b), do Código de Processo Civil, pois que o tribunal a quo analisou com sobriedade e perspicácia a factualidade carreada para os autos, transmitindo com absoluta clareza o percurso lógico percorrido para cristalizar os factos dados como provados, que assim deverão permanecer face ao seu evidente acerto;
4. Nos termos do artº 662º, nº 1, do Código de Processo Civil, o Tribunal da Relação só deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa, o que manifestamente não ocorreu;
5. A idade das crianças, a sua vontade conjunta em não querer ver a apelante e a situação fáctica cristalizada há longos meses inviabilizam de forma irremediável a fixação da residência de CC e DD junto da mãe e, também, de um regime convivial que não seja estabelecido nos moldes em que o foi, aqui sob pena da inevitável ocorrência de sucessivos incidentes de incumprimento que dificultarão a tramitação dos autos e trarão uma crescente separação emocional entre os três;
6. Efectivamente, as crianças têm 17 (na iminência de ver cessadas as responsabilidades parentais) e 12 anos, atingiram uma idade em que se torna absolutamente despropositado forçar a ambicionada convivência sem que daí derivem, necessariamente, conflitos evitáveis, estão neste momento em sintonia quanto ao (não) contacto com a sua progenitora, sequer em contexto convivial, e essa realidade tem vindo a ser executada há alguns meses;
7. A prestação alimentícia fixada a título de alimentos é de cariz provisório e, face à manifesta impossibilidade de produzir prova bastante que a escorasse convenientemente, fundou-se naquela que perfunctoriamente foi averiguada, baseou-se em critérios de bom senso e, segura e independentemente da fixação da residência junto da apelante ou do apelado, virá a ser substancialmente inflacionada;
8. Não foram violados quaisquer preceitos legais.”
Pugna pela improcedência do recurso.
*
O recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata, em separado e efeito devolutivo, o que foi confirmado por este Tribunal.
O Tribunal recorrido proferiu o seguinte despacho:
“A recorrente AA vem arguir a nulidade da decisão impugnada, argumentando que a mesma padece de vício de falta de fundamentação, subsumível à previsão da al. b) do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil.
Crê-se que sem razão.
Segundo textua aquele normativo, a sentença é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.
Tem sido entendimento pacífico que essa nulidade apenas se verifica nos casos de absolta falta de fundamentação; já não nos casos em que a fundamentação seja alegadamente insuficiente, e ainda menos nas situações em que a parte considere errada a decisão.
O despacho recorrido está, no entendimento deste tribunal, suficientemente fundamentado, quer de facto, quer de direito, razão pela qual se desatende a arguição de nulidade.”
*
Após os vistos legais, cumpre decidir.
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II QUESTÕES A DECIDIR.

Decorre da conjugação do disposto nos art.ºs 608º, n.º 2, 609º, n.º 1, 635º, n.º 4, e 639º do Código de Processo Civil (C.P.C.) que são as conclusões das alegações de recurso que estabelecem o thema decidendum do mesmo. Impõe-se ainda ao Tribunal ad quem apreciar as questões de conhecimento oficioso que resultem dos autos.
Impõe-se, por isso, no caso concreto e face às elencadas conclusões decidir:
-se a decisão é nula, por falta de fundamentação de facto e/ou motivação;
-se deve ser admitida a impugnação da decisão da matéria de facto e, na afirmativa, se deve ser alterada;
-se, em consequência da procedência dessa alteração, ou independentemente da mesma, deve ser alterada a decisão no sentido pretendido pela requerente: deve ser fixada junto de si a residência das crianças; a não ser assim, o regime de visitas deve ser estruturado e regular, e o valor da pensão de alimentos deve situar-se nos € 25,00 para cada filho, e o pai deverá suportar metade das despesas médicas extraordinárias (v.g. óculos, aparelhos dentários, lentes graduadas, cirurgias, internamentos hospitalares, etc.), assim como igual proporção das despesas com consultas médicas e com medicamentos receitados por médico, bem como com a aquisição de livros e outro material necessário às atividades escolares do CC e da DD.
***
III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
O Tribunal recorrido assentou na seguinte matéria (que entendeu estar apurada face às declarações prestadas pelos progenitores, audição das crianças e prova documental disponível):
“a) A requerente AA e o requerido BB contraíram casamento entre si no dia ../../2005.
b) Desse casamento existem dois filhos: CC e DD, nascidos, respectivamente, a ../../2008 e ../../2012.
c) A requerente e o requerido estão separados desde finais de Novembro de 2024, encontrando-se em processo de divórcio.
d) Após se ter dado a separação, a requerida permaneceu na casa de morada da família, sita na freguesia ..., do concelho ..., e o requerido foi habitar um apartamento arrendado, de tipologia ..., localizado em ..., no concelho ....
e) Logo após a separação, o CC e a DD continuaram a viver na casa de morada de família, juntamente com a mãe.
f) Posteriormente, após terem ocorrido alguns desentendimentos entre a mãe e os filhos, o CC e a DD recusaram continuar a viver com a progenitora.
g) Por vontade própria, desde há alguns meses o CC e a DD vivem e pernoitam, durante a semana, na casa da sua avó paterna, localizada também na freguesia ..., do concelho ....
h) Os menores estão todos os dias da semana com o pai na casa da avó paterna, sendo ele quem habitualmente os leva e recolhe na escola, e passam também com ele os fins-de semana, em ....
i) O CC e a DD têm rejeitado nos últimos meses manter convívios regulares com a progenitora.
j) Aquando da sua audição, quer o CC, quer a DD disseram que queriam viver com o pai, recusando regressar para junto da mãe.
k) O CC completou o 11º ano de escolaridade na Escola Secundária ..., na cidade ..., e a DD o 7º ano de escolaridade na Escola EB 2,3 de ..., sita neste concelho ....
l) Durante a coabitação do casal era a requerente quem habitualmente cuidava dos assuntos relacionados com os filhos, nomeadamente quem os levava e trazia da escola, os levava ao médico, lhes preparava as refeições, quem exercia e exerce ainda as funções de encarregada de educação.
m) O requerido é sócio-gerente de uma empresa de metalurgia que emprega cerca de 20 trabalhadores, auferindo uma remuneração declarada de € 1.300,00.
n) A requerente é funcionária administrativa na empresa da qual o requerido é sócio-gerente, auferindo o salário mínimo nacional.
o) Está suspensa de funções e tem pendente contra si um processo disciplinar com vista ao seu despedimento.”
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IV MÉRITO DO RECURSO.

NULIDADE DE SENTENÇA.

Dispõe o art.º 615º, nº 1, C.P.C. que é nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
As nulidades da sentença são vícios formais e intrínsecos de tal peça processual e encontram-se taxativamente previstos no normativo legal supra citado.
Este regime aplica-se também aos despachos, por força do art.º 613º, n.º 3, do C.P.C..
Os referidos vícios, designados como error in procedendo, respeitam unicamente à estrutura ou aos limites da sentença.
O dever de fundamentação assenta no princípio constitucional da obrigatoriedade de fundamentação de todas as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente (art.º 205º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa).
A fundamentação tem de ser factual e jurídica. E, de acordo com o n.º 2 do art.º 154º, não pode ser através da mera adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou oposição em apreço, salvo quando, tratando-se de despacho interlocutório, a contraparte não tenha apresentado oposição ao pedido e o caso seja de manifesta simplicidade. O dever de fundamentação abrange todos os pedidos controvertidos e todas as dúvidas suscitadas no processo, mas também abrange o dever de explicitação dos motivos que levaram o julgador a dirimir a controvérsia em determinado sentido.
A nível de fundamentação fáctica o juiz deve discriminar os factos que considera indiciariamente apurados ou provados (consoante o nível probatório exigido, o que varia com o tipo de decisão a proferir: cautelar ou provisória, ou definitiva, sem prejuízo em qualquer caso da sua impugnação), e motivar a sua decisão. A nível jurídico, deve indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, concluindo pela decisão final –cfr. o n.º 3 do art.º 607º do C.P.C, que dispõe no que se refere às sentenças.
Concomitantemente com o dever geral de fundamentação, existem regras específicas que devem ser observadas na elaboração da sentença a nível factual, elencadas no mesmo art.º 607º, do C.P.C., agora n.º 4: na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção. Daí decorre a imposição do art.º 640º C.P.C. relativamente aos ónus de impugnação da matéria de facto.
Estas regras podem ser importadas para os despachos decisórios, que igualmente têm de ser devidamente fundamentados de facto e de direito, decorrendo o maior ou menor grau de exigência do seu respeito da maior ou menor complexidade da questão a dirimir. E, nomeadamente, impõe-se a sua observância numa decisão provisória de regulação do exercício das responsabilidades parentais, ao abrigo dos art.ºs 28º e 38º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, aprovado pela Lei n.º 141/2015 de 8/9 (RGPTC), em virtude da sua imposição constitucional e por força do art.º 33º do mesmo diploma, sendo que, primordialmente, aplicam-se aqui as regras da jurisdição voluntária (art.ºs 986º a 988º do C.P.C.) face à natureza conferida a estes processos pelo art.º 12º do RGPTC.
Pode divergir-se se a falta absoluta constitui a causa de nulidade prevista na alínea b) do n.º 1 do art.º 615º – “a ausência total de fundamentos de direito e de facto” conforme refere José Alberto dos Reis “Código V cit., pág. 140, e Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio Nora, “Manual de Processo Civil”, 2ª. ed., 1985, págs. 670 a 672; ou se a integra uma fundamentação apenas incompleta ou insuficiente.
Tem sido posição maioritária da jurisprudência que apenas a falta absoluta conduz à nulidade; admite-se que uma insuficiência grosseira (situação diversa da falta de mérito justificativo suficiente para justificar a parte dispositiva, que sempre se traduzirá antes em erro de julgamento) possa equivaler à falta.
A deficiência do julgamento da matéria de facto, sempre que ocorra, ao impedir o estabelecimento de uma plataforma sólida para a integração jurídica do caso, atento o pedido, causa de pedir e exceções que nele foram invocados pelas partes, é de conhecimento oficioso do tribunal ad quem, impondo-lhe que, no uso dos seus poderes de substituição, sempre que o processo contenha todos os elementos de prova que lhe permitam com a necessária segurança fazer o julgamento de facto quanto à matéria em relação à qual o Tribunal a quo não tomou posição -art. 665º, ex vi, art. 662º, n.º 1 do CPC), supra esse vício, fazendo ele próprio o julgamento da matéria de facto quanto a essa concreta factualidade, sem prejuízo de haver casos em que se justifique ou imponha, conforme previsto na alínea c), do n.º 2 do art. 662º, C.P.C., a anulação da decisão recorrida - Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, págs. 293 a 295 da 4ª ed..
O Ac. da Relação de Lisboa de 5/6/2025 (proferido no processo n.º 6652/25.1T8LSB-D.L1-2, e disponível em www.dgsi.pt, como todos os que se citarão sem outra indicação), tratou dessa problemática nesta sede tutelar e cautelar, chamando à colação um critério de flexibilidade, que deve ser adaptado à tipologia da decisão e à fase processual em que for proferida.
Fazendo aplicação ao caso, e face à delimitação que resulta do que foi abordado nas conclusões de recurso, não é difícil concluir que, numa primeira visão, nunca estaríamos perante uma nulidade da decisão/despacho por falta de fundamentação uma vez que o que a recorrente invoca é a insuficiência ou falta de consideração de matéria fatual que consta dos autos e que a seu ver é relevante para a apreciação da questão a dirimir, o que constituiria erro de julgamento e não nulidade de decisão.
Verificada a decisão, dela consta o elenco da matéria factual: bastante ou não, toda a que emana do processo ou não.
Numa segunda visão, há que apreciar se estamos perante uma insuficiente motivação da matéria de facto, de tal modo que possa equivaler à sua ausência. Em casos pontuais essa situação pode ter de conduzir à aplicação pelo Tribunal de recurso do disposto no art.º 662º, n.º 2, alínea d).
Da decisão resulta uma referência - ainda que remissiva, sumária e genérica - aos meios de prova em que se sustenta.
Neste segundo segmento, assumido que a motivação da matéria de facto inclui a necessária fundamentação das decisões, é de salientar que nesta fase ainda não foi apresentada prova pelas partes; os documentos a que o Tribunal se refere só podem reportar-se ao casamento e paternidade, uma vez que nada mais foi junto. Assim facilmente se conclui que o Tribunal baseou-se nas declarações das partes e das crianças, e na avaliação que delas fez. E podemos ainda acrescentar que os factos em que assentou não foram propriamente controvertidos, quando muito pecaram por defeito –cfr. o pretendido em sede de impugnação pela recorrente. Ou seja, o Tribunal assentou naquilo que não ofereceu reserva ou controvérsia.
Daí que também a fundamentação nesta vertente (motivação) seja clara e, por isso, no caso em apreço, suficiente. E foi percetível para a recorrente.
Por isso se conclui pela improcedência da invocada nulidade por falta de fundamentação, restando verificar da pertinência das alterações que a recorrente pretende que se introduza no elenco da matéria de facto, caso se lhe reconheça suporte nessa sua pretensão.
*
A parte que pretenda impugnar a matéria de facto assente, ainda que indiciariamente assente, não está dispensada de cumprir os ónus que são impostos para o efeito pelo art.º 640º do C.P.C. aplicável em sede tutelar por força da aplicação subsidiária do Código de Processo Civil a que já fizemos referência.
A parte que pretenda aditar matéria de facto ao elenco do que foi tido em consideração pelo Tribunal ad quem tem de indicar os factos em causa, a prova ainda que indiciária, em que sustenta a sua pretensão, aplicando-se de igual modo o art.º 640º do C.P.C..
No caso dos autos o próprio Tribunal recorrido determinou que fossem averiguadas determinadas circunstâncias junto do DIAP, CPCJ, e GNR, conforme poderes/deveres que lhe assistem, desde logo por força do princípio do inquisitório que vigora nos processos de jurisdição voluntária. 
A recorrente pretende que as informações obtidas, enviadas pelos ofícios respetivos, constem dos factos assentes. Nesta matéria, resultam cumpridos os ónus do art.º 640º, uma vez que diz o que pretende que se acrescente e indica os ofícios juntos aos autos como suporte.

E com razão.
Assim, deve ser acrescentado ao elenco dos factos apurados nesta fase:
- "O recorrido encontra-se atualmente constituído como arguido no processo n.º 369/25.4GBBCL, pendente no DIAP de Barcelos, pela alegada prática de um crime de violência doméstica contra cônjuge, sendo ofendida a recorrente."
- "O recorrido encontra-se também constituído como arguido no processo n.º 1404/24.9GBBCL, pendente no DIAP de Barcelos, pela alegada prática de um crime de dano simples, sendo igualmente ofendida a recorrente."
- “A GNR deslocou-se à residência da recorrente nos dias 07.04.2024 e 08.04.2024, em razão de ocorrências relacionadas com o processo n.º 369/25.4GBBCL."
Tal como deve ser acrescentado, face ao ofício constante dos autos nesse sentido, que:
- “A denúncia que deu origem aos inquéritos reporta-se à deslocação à que foi casa de morada de família, acompanhado do filho, e imputada danificação de um alarme e um sensor da residência comum.”
E ainda, face igualmente ao ofício junto aos autos:
- “Existe processo de promoção e proteção a correr na CPCJ relativamente às duas crianças, encontrando-se em fase de avaliação diagnóstica.”
Pretende também a recorrente que o facto referido na alínea m) passe a mencionar: “O requerido é sócio-gerente de uma empresa de metalurgia que emprega cerca de 20 trabalhadores, auferindo uma remuneração que excede substancialmente a remuneração declarada de € 1.300,00”.
Sustenta-se nas declarações prestadas pelo próprio requerido (situando as partes que entende relevantes no registo áudio), e nas ilações que delas devem ser retiradas, segundo juízos de lógica/experiência comum; partindo de factos que delas resultam, com base nesse juízo, chega ao que pretende aditar (cfr. prova por presunção prevista nos art.ºs 349º e 351º do Código Civil –C.C.). No fundo pretende que se retrate nos factos que o rendimento real do requerido é substancialmente superior ao declarado.
Mostram-se, por isso, também neste ponto, cumpridas as imposições do art.º 640º do C.P.C. (cfr. contra-alegações do recorrido).
Sucede que, substancialmente é uma expressão conclusiva, que nada nos diz de concreto e que por isso não assume qualquer relevo para a decisão a tomar no que concerne à fixação do valor a título de pensão de alimentos. Além disso, a recorrente impugna juridicamente essa decisão na medida em que a primeira (fixação da residência das crianças junto de si) não proceda – ou seja, em causa está a fixação da pensão a seu cargo. Significa isso que, nessas circunstâncias, não é relevante (e por isso melhor averiguação dessa matéria sempre se mostraria um ato inútil, proibido pelo art.º 130º do C.P.C.) saber se o requerido aufere mais do que € 1.300,00 pois que estando em causa a contribuição da recorrente importa, prima facie, saber das suas possibilidades. É que, os dois elementos a ter em conta são as necessidades das crianças por um lado, e as possibilidades da recorrente por outro. E só no caso de se concluir que quem tem de prestar alimentos não tem possibilidade de assegurar o sustento dos seus filhos é que pode ponderar os rendimentos do outro progenitor para fixar pelo mínimo o seu contributo. É que não é pelo facto de um dos progenitores ter um nível de rendimentos superior ao outro que este outro fica desobrigado de contribuir de modo igual para o sustento dos filhos. Isso só sucederá se de todo o progenitor obrigado a alimentos não consegue sequer assegurar a sua subsistência; ou se a sua falta/menor possibilidade económica conduzir a um grande desequilíbrio no modo de vida dos filhos quando estão ora com um, ora com outro (de modo a que quase se possa dizer que um deles não consegue cobrir as necessidades dos filhos), e neste tem relevância quando o que tem menor capacidade económica é aquele progenitor que tem os filhos a residir habitualmente consigo, ou quando há uma residência alternada, situação em que o outro poderá ter de cobrir em maior grau as necessidades dos filhos, assumindo uma pensão mais elevada e alterando o critério da igualdade do dever de sustento.
Não estamos nesta última situação, em que as crianças ficaram com residência junto do pai e a recorrente viu fixado um regime de visitas livre.
Não estamos na primeira situação, uma vez que a recorrente aufere a retribuição mínima mensal, como melhor veremos.
Assim sendo, improcede esta pretensão recursória de ver alterada a alínea m) da matéria de facto.
Para além do que apreciamos, e aí assiste razão ao recorrido, a recorrente não indicou qualquer outra matéria que pretendesse ver alterada. Limita-se a aludir às declarações prestadas de modo a justificar uma diferente decisão no que concerne ao regime provisório. No que respeita às declarações prestadas pelos filhos, tenta interpretá-las e encontrar uma justificação para a sua recusa de contactos consigo. Daí que não estejamos perante uma verdadeira impugnação da matéria de facto, e ainda que o pretendesse não havia cumprimento do disposto no art.º 640º do C.P.C..
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IV MÉRITO DO RECURSO.

A matéria a analisar prende-se com o acerto do regime provisório, e em primeiro lugar com a fixação da residência habitual das crianças junto do progenitor.
Nos termos do art. 40º do RGPTC, impõe-se, num regime definitivo, como, à partida, num provisório, definir/decidir sobre as seguintes questões:
-a fixação da residência habitual da criança, com a atribuição das decisões relativas aos atos da vida corrente, como dispõe o artº. 1906º, nº. 3, C.C.;
-a determinação do exercício das decisões de particular importância para a vida da criança;
-o regime de visitas;
-a prestação de alimentos;
tudo tendo em conta o interesse das crianças.
De facto, a sentença de regulação do exercício das responsabilidades parentais deverá definir o destino da criança, quem toma as decisões de particular importância para a sua vida, as visitas do progenitor a quem a mesma não tenha sido confiada, e o regime da prestação de alimentos, atendendo aos interesses da criança, valorados em concreto – art.ºs 1905º e 1906º do C.C. (cfr. art.º 1909º), e art.ºs 40 e 43º, do RGPTC.
No que diz respeito ao preenchimento do conceito interesse da criança devem ser ponderados os fatores tendentes em geral a assegurar a garantia das condições materiais, sociais, morais e psicológicas da criança, que possibilitem o seu desenvolvimento estável e equilibrado, nomeadamente salvaguardando tanto quanto possível o estabelecimento de relações afetivas contínuas com ambos os progenitores, e a consequente participação interessada, coordenada e responsável de ambos no acompanhamento e educação do filho; isto sempre e necessariamente em termos casuísticos. Nessa medida, a decisão sobre o exercício das responsabilidades parentais, norteada prioritariamente pela defesa dos interesses da criança, tenderá a promover a sua integração num núcleo familiar estável e gratificante, com respeito pela posição igualitária de ambos os progenitores quanto aos direitos e deveres na sua educação e manutenção.
Relevam por isso fundamentalmente a disponibilidade manifestada por cada um dos pais para promover relações habituais do filho com o outro, a manutenção de uma relação de grande proximidade com os dois progenitores e a partilha de responsabilidades entre os pais (cfr. a leitura do art.º 1906º).
Na Declaração dos Direitos da Criança aprovada em 20/11/59 pela Assembleia das Nações Unidas refere-se na base II que “A criança deve beneficiar de uma proteção especial e ver-se rodeada de possibilidades concedidas pela Lei e por outros meios, a fim de se poder desenvolver de uma maneira sã e normal no plano físico, intelectual, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. Na adoção de leis para este fim, o interesse superior da criança deve ser a consideração determinante”. Também a Convenção sobre os Direitos da Criança de 26/1/90 (ratificada pela Resolução da AR nº. 20/90) refere que “O erigir do interesse do menor em princípio fundamental enformador de qualquer decisão atinente à regulação do poder paternal releva de uma certa conceção do poder paternal quase pacificamente aceite na doutrina, portuguesa como estrangeira: o poder paternal entendido como um poder dever, um poder funcional. Não pois um conjunto de faculdades conferidas no interesse dos seus titulares (os pais) e que estes possam exercer a seu bel-talante, mas antes um acervo de diretivas com um escopo altruísta, que devem ser exercitadas de forma vinculada, visando o objetivo primacial de proteção e promoção dos interesses do menor, com vista aos seu integral e harmonioso desenvolvimento físico, intelectual e moral”.
Aplicando ao caso, temos duas crianças com 17 e 12 anos respetivamente, que embora num primeiro momento da separação dos pais se tenham mantido na casa de morada de família e na companhia da mãe, nesta fase encontram-se a passar a semana na casa da avó paterna, onde estão com o pai, ficam na casa deste ao fim de semana, e mostram rejeição em estar com a mãe.
Ora, nesta fase, que se espera curta e até que se proceda a melhor avaliação, não nos parece que fosse profícuo forçar os jovens a regressar a uma situação da qual os mesmos saíram, de acordo com a sua vontade, ou a forçar uma convivência em termos rígidos (e muitas vezes incompatível com a organização que os próprios jovens gostam de fazer do seu tempo) com a mãe. Não revelaria bom senso e poderia até afastá-los mais da mãe, impor outras soluções, sem que se perceba os motivos da rejeição, e até sem prejuízo de, estando os mesmos esclarecidos, se optar por outra situação.
São os motivos verbalizados pelos filhos que a recorrente expõe e tenta rebater nas suas alegações. Porém isso é matéria para se ponderar noutra fase de apreciação após a avaliação diagnóstica. Se são de atender ou não as razões apontadas pelos filhos e o modo de lidar com isso não está nesta fase dilucidado, nem tinha de estar, dado o momento processual em que nos situamos.
Igualmente algumas lacunas apontadas pela recorrente à situação em que os filhos se possam encontrar junto da avó e pai, será matéria que alegará e se apurará, se for o caso e no momento próprio. Nada do que diz é suscetível de configurar fator de risco iminente para as crianças.
Muito embora possa parecer o contrário, dar-lhes esta possibilidade de se manterem numa situação que resultou da articulação da própria família perante o conflito, será o que melhor pode contribuir para dar margem para se aproximarem da mãe.
Não podemos deixar de referir que a solução encontrada não será, a nosso ver, a ideal. As crianças andam de um lado para o outro, e ainda não está assegurada a sua estabilidade. Impõe-se a busca de uma solução confortável para si, promotora de um bom relacionamento e convívio gratificante com as figuras de referência, primordialmente os pais, mas também certamente a avó paterna e outros elementos da família. É para essa averiguação que o processo segue.
De referir que as informações obtidas pelo Tribunal junto das entidades respetivas, e cuja matéria foi acrescentada aos factos, em nada afastam essa ponderação. Da situação que terá alegadamente dado origem aos inquéritos não se retira que haja motivo suficiente para pôr em causa as competências parentais do requerido, muito embora não deva envolver ou expor o filho em qualquer tipo de situação delicada da sua relação com a requerente. Não se cogita a aplicação ou ponderação do disposto no art.º 1906º-A, C.C.. A circunstância de correr processo na CPCJ nada acrescenta de relevo.
Definida a residência, os restantes itens, suscitados pela recorrente, desse dependente, ficam prejudicados; o mais definido é o que se compatibiliza com a determinação da residência junto do pai.
No que respeita concretamente ao modelo do regime de visitas, resulta do que já expusemos que se nos afigura que nesta fase, e tendo em conta a idade das crianças, o regime livre é o mais indicado, sem prejuízo de, se assim se justificar, ser alterado, até provisoriamente, este ponto (como qualquer outro se tal se justificar). De facto, não está cogitado que o progenitor manifeste resistência/oposição aos contactos dos filhos com a mãe. E quanto aos contactos entre os progenitores para o efeito, eles terão de ser recíprocos.
Cabe aos pais, num primeiro momento, diligenciar pelas melhores soluções para os seus filhos numa situação de crise/separação do casal. Encontrada uma primeira alternativa, cabe-lhes facilitar e promover o contacto dos filhos com o outro. A sua postura será avaliada pelo Tribunal. E muitas vezes determina o sentido da decisão a proferir.
Resta apreciar se o valor fixado a título de pensão de alimentos e repartição de despesas se mostra acertado, tendo em conta alguns princípios que vamos enunciar, frisando-se, mais uma vez, que estamos numa fase processual em que as partes ainda não tiveram oportunidade de apresentar as suas provas e discutir a integralidade dos factos que podem ser pertinentes.
Assentemos, muito brevemente, no seguinte:
- por força da nossa Constituição vigora o princípio da igualdade de deveres dos progenitores em relação à manutenção dos filhos –artºs. 36º, n.º 5, da CRP e 1878º, n.º 1, do C.C.; este princípio não implica uma regra sem maleabilidade de exigência de metade a cargo de cada um dos progenitores, mas antes deve conter o sentido de que sobre cada progenitor impenda a responsabilidade de assegurar, na medida das suas possibilidades, o que for necessário ao sustento, habitação e vestuário, transportes, bem como à instrução e educação das crianças cfr. artºs. 2003º, 2004º, e 2005º, do C.C.;
- em causa está a satisfação das necessidades das crianças no contexto das suas aptidões, tendo em vista a promoção do seu desenvolvimento físico, intelectual e moral;
- dispõe o art.º 2007º, n.º 1, do C.C. um critério de prudente arbítrio na fixação dos alimentos provisórios.
Note-se que o que resulta dos factos indiciários, e a recorrente não o colocou em causa de forma eficaz (com respeito pelo disposto no art.º 640º do C.P.C. já citado), é que o recorrido vive num apartamento arrendado; por sua vez a recorrente permaneceu na casa de morada de família, não constado as despesas que isso acarreta.
Também não resultou apurado que as crianças tenham despesas fora do comum, pelo que a esse nível devemo-nos guiar por critérios de normalidade, tendo em conta a sua idade.
Igualmente temos de considerar que, não obstante a suspensão de funções, não foi suspenso o pagamento da retribuição da recorrente.
Numa forma básica de ver as coisas, se a repartição for por igual, isso significa que se arbitrou como valor necessário e suficiente para assegurar a vida destas crianças o valor de € 250,00, respetivamente.
Este não é um valor exagerado, muito pelo contrário. Nem a recorrente o diz.
Note-se que se situa num valor inferior ao que resultaria do critério proposto, entre outros, no Ac. desta Relação de 27/6/2024, em que a aqui relatora foi 2ª adjunta (processo n.º 1770/23.3T8VCT.G1), que sumariou: “IV. Não se apurando o concreto montante das despesas do filho comum, dever-se-á recorrer ao indexante de apoios sociais, que define o mínimo económico para uma vida minimamente digna de um adulto; e, simultaneamente, a escalas de equivalência (que permitem ter em conta as diferenças das necessidades das crianças e jovens face às demais do agregado familiar em que se inserem), nomeadamente à denominada escala de Oxford, acolhida pelo Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de Junho (diploma que estabeleceu os critérios para concessão de apoios sociais), que na capitação devida a cada um dos membros do agregado familiar atribui ao requerente do apoio social o peso 1, atribui a cada indivíduo maior o peso 0,7, e atribui a cada indivíduo menor o peso 0,5.”
A única questão que coloca é se, em face dos rendimentos conhecidos, o valor a cargo de cada um deve ser calculado noutra proporção. Concretamente, se a seu cargo devem ficar € 25,00 para cada filho.
A defesa desta pretensão baseava-se no sucesso da sua pretensão de alteração da matéria em que se assentou quanto ao real valor dos rendimentos do recorrido; não logrou alcançar esse objetivo.
Ainda que assim não fosse, e porque salvaguardada a sua própria subsistência, face ao atual valor da retribuição mínima garantida, e, reiteramos, na falta de apuramento de concretas despesas que possa ter em virtude de ter ficado na casa de morada de família (e tendo em conta que o recorrido arrendou casa), pensamos que o valor deve manter-se tal como fixado, inclusivamente no que respeita à repartição de outras despesas, tal como previsto no regime provisório.
É precisamente a ausência de matéria para fazer um confronto entre as obrigações próprias que cada um dos pais tem - e ponderando que a requerida, ainda que contribua com o valor fixado, e numa ordem de prioridade do sustento dos filhos, não vê colocada em causa a sua sobrevivência digna, e não obstante haver uma diferença de rendimento -, que impede uma alteração do equilíbrio que resulta do que foi provisoriamente fixado.
Trata-se de uma decisão equitativa, fundada no justo arbítrio do julgador, e, a nosso ver, acertada na fase embrionária dos autos, antecedida da recolha dos elementos mínimos à decisão de caráter provisório que se impõe proferir.
Deve, portanto, improceder na íntegra o recurso intentado pela progenitora.
A recorrente, vencida, deve arcar com as custas – art.º 527º, n.ºs. 1 e 2, C.P.C..
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VI   DISPOSITIVO.
Pelo exposto, acordam os juízes do Tribunal da Relação em julgar o recurso totalmente improcedente e, em consequência, negar provimento à apelação e confirmar a decisão recorrida.
Custas a cargo da recorrente (artº. 527º, nºs. 1 e 2, C.P.C.).
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Guimarães, 4 de novembro de 2025.
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Os Juízes Desembargadores
Relatora: Lígia Paula Ferreira Sousa Santos Venade
1ª Adjunta: Susana Raquel Sousa Pereira
2º Adjunto: Gonçalo Oliveira Magalhães

(A presente peça processual tem assinaturas eletrónicas)

[i] O requerido terá incorrido em lapso ao voltar ao ponto 11º.