I - Relativamente aos países não abrangidos pela Convenção 051, relativa à vigilância de pessoas condenadas, ratificada pelo Estado Português em 1994, a vigilância de pessoas condenadas ou libertadas condicionalmente é admissível com base no princípio da reciprocidade, nos termos do artigo 4.º e 126.º e seguintes da Lei n.º 144/99, de 31 de Agosto.
II - Quando solicitar apenas a vigilância o Estado português dá conhecimento das condições impostas ao condenado e, sendo caso disso, das medidas com que este deve conformar-se durante o período de prova.
III - Em nenhum caso as medidas aplicadas no país estrangeiro podem agravar, quer pela sua natureza, quer pela sua duração, as prescritas na decisão condenatória proferida pelo Estado português requerente.
IV - Diferentemente do que sucede com o pedido de delegação da execução da sentença, no pedido de vigilância não há renúncia de Portugal à execução da sentença, continuando o Estado português a ser o responsável pelas decisões a proferir no processo, e não é necessário obter o consentimento do condenado.
Processo 253/25.1YRCBR
Execução no Estrangeiro de Sentença Penal Portuguesa
Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra:
I. RELATÓRIO
O Ministério Público junto deste Tribunal da Relação requereu ao abrigo do disposto no artigo 107º nº 3, da Lei no 144/99 de 31/08, o procedimento de delegação na República Federativa do Brasil de execução de sentença penal portuguesa (pedido de vigilância), proferida contra o cidadão de nacionalidade brasileira:
…, presentemente a residir …, Brasil,
com os seguintes fundamentos (transcrição com sublinhados nossos):
1. O identificado foi condenado, por sentença transitada em julgado em 21/02/2024, proferida em 22/01/2024 no processo no 1183/22...., …, como autor de um crime de violência doméstica previsto e punido pelo artigo 152º, nº 1, alínea b), e nº 2 , alínea a), do código penal português, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão de prisão, que ficou suspensa na respectiva execução por igual período de tempo, acompanhada de regime de prova e subordinada à obrigação de frequência de programas destinados ao controlo da violência, especialmente direccionados para o concreto problema da violência doméstica, em horário e locais a articular com a Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais e sob o acompanhamento desta entidade.
2. Foi elaborado e judicialmente homologado o plano de reinserção social.
3. Entretanto, o condenado regressou ao Brasil, onde se encontra novamente a residir e, ao que tudo indica, na morada acima indicada, pelo que o regime de prova e as condições impostas ainda não foram cumpridas.
4. A pena não se mostra extinta por efeito da prescrição.
5. O cumprimento da pena na República Federativa do Brasil permitir-lhe-á uma melhor reinserção social, sendo que, segundo informação chegada ao processo da condenação, terá cometido no Brasil novos factos de idêntica natureza, podendo aí correr processo relativamente a esses novos factos.
6. A transmissão à República Federativa do Brasil do pedido de delegação de execução da pena foi considerada admissível por despacho de Sua Excelência o Conselheiro Procurador-Geral da República, proferido no exercício das competências que lhe foram delegadas pela alínea c) do Despacho no 7317/2025, de 24/06/2025, publicado no Diário da República no 125, II Série, de 2/07/2025, de Sua Excelência a Ministra da Justiça, nos termos do disposto nos artigos 104º nº 1, alíneas a), b), d) e f), 107º e 143º da Lei no 144/99, de 31 de Agosto.
7. Mostram-se reunidas as condições elencadas no artigo 104º, da Lei no 144/99 de 31 de Agosto.
8. As autoridades brasileiras informaram que, nos termos da lei interna, poderão aceitar a delegação de execução de sentença na República Federativa do Brasil, porquanto “o instituto de vigilância de pessoas condenadas do ordenamento jurídico português guarda similitude com a figura jurídica denominada período de prova admitida no direito brasileiro.”
9. Estando apenas em causa um pedido de vigilância do regime de prova, as disposições relativas ao consentimento do condenado não têm aplicação - cf. artigo 143º, nº 2, da dita lei.
…
Nestes termos, requer-se que:
a) seja declarada a admissibilidade da delegação de execução na República Federativa do Brasil da sentença condenatória, com regime de prova a ser vigiado naquele país.
b) a demais tramitação, com cumprimento do disposto no artigo 109º da citada lei 144/99.
O MP juntou com o requerimento inicial, documentação constituída por ofícios do gabinete da CJIMP (Cooperação Judiciária Internacional em Matéria Penal) da PGR (Procuradoria-Geral da República) referentes ao presente pedido, despacho de Sua Excelência o Conselheiro Procurador-Geral da República, certidão do tribunal da condenação com a sentença condenatória, auto de audição de arguido, plano de reinserção social e respectivo despacho homologatório, formulário preenchido pelo tribunal da condenação do pedido de auxílio judiciário em matéria penal, ofício de resposta das autoridades brasileiras de aceitação da execução da sentença, concretamente do regime de prova/vigilância.
Não se afigura a este Tribunal da Relação, ser necessário a realização de qualquer outra diligência prévia à decisão e o cidadão Brasileiro condenado em Portugal pela prática de um crime de violência doméstica, está dispensado de prestar o seu consentimento, neste procedimento relativo à formulação de pedido de vigilância ao Estado Brasileiro (artº 143º/2 da Lei nº 144/99 de 31.8).
Colhidos os vistos, foram os autos à conferência, cumprindo apreciar e decidir.
II. OBJECTO DA DECISÃO
A única questão a conhecer e decidir, é saber se nestes autos, estão reunidos os pressupostos gerais e específicos, para ser possível formular à República Federativa do Brasil, um pedido de Vigilância, já devidamente autorizado pelo Sr. Procurador Geral da Republica, por despacho proferido no âmbito de competências delegadas pela Srª Ministra da Justiça, por despacho nº 7317/2025 de 24.6.2025 publicado no DR nº 25 I série de 2.7.2025.
III. FUNDAMENTAÇÃO
Definida a questão a tratar, a partir da prova documental reunida nestes autos e que acompanha o requerimento inicial apresentado em 17.10.2025, considero assentes os seguintes factos :
1. O identificado foi condenado, por sentença transitada em julgado em 21/02/2024, proferida em 22/01/2024 no processo no 1183/22...., …, como autor de um crime de violência doméstica previsto e punido pelo artigo 152º, nº 1, alínea b), e nº 2 , alínea a), do código penal português, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão de prisão, que ficou suspensa na respectiva execução por igual período de tempo, acompanhada de regime de prova e subordinada à obrigação de frequência de programas destinados ao controlo da violência, especialmente direccionados para o concreto problema da violência doméstica, em horário e locais a articular com a Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais e sob o acompanhamento desta entidade.
2. Foi elaborado e judicialmente homologado, o plano de reinserção social que se mostra junto aos autos.
3. O condenado regressou ao Brasil, após a prolação da condenação no nosso país, onde se encontra novamente a residir e na morada acima indicada, pelo que o regime de prova e o seu condicionalismo imposto na sentença condenatória proferida em Portugal ainda não foram cumpridos.
4. A pena de prisão aplicada acima referida, suspensa na sua execução, não se mostra extinta por efeito da prescrição.
5. O cumprimento na República Federativa do Brasil das medidas impostas em sede de regime de prova, na sentença condenatória, permitir-lhe-á uma melhor reinserção social.
6. A transmissão à República Federativa do Brasil do pedido de vigilância foi considerado admissível por despacho de Sua Excelência o Conselheiro Procurador-Geral da República, proferido no exercício das competências que lhe foram delegadas pela alínea c) do Despacho no 7317/2025, de 24/06/2025, publicado no Diário da República no 125, II Série, de 2/07/2025, de Sua Excelência a Ministra da Justiça, nos termos do disposto nos artigos 104º nº 1, alíneas a), c), d) e f), 107º e 143º da Lei no 144/99, de 31 de Agosto.
7. As autoridades brasileiras informaram que, nos termos da lei interna, poderão aceitar o nosso pedido, porquanto “o instituto de vigilância de pessoas condenadas do ordenamento jurídico português guarda similitude com a figura jurídica denominada período de prova admitida no direito brasileiro.”
Fundamentação da matéria de facto :
Os factos acima descritos basearam-se na análise crítica e conjugada de todos os documentos juntos aos autos, com o requerimento inicial do MP, a saber.
…
IV. APRECIAÇÃO DA VIABILIDADE DO PEDIDO DE VIGILÂNCIA a SER EFECTUADO E PROSSEGUIDO NO ESTRANGEIRO, RELATIVO A CONDENAÇÃO DE SENTENÇA PENAL PORTUGUESA em PENA de PRISÃO SUSPENSA na SUA EXECUÇÃO, COM REGIME DE PROVA
Atentemos pois que a pretensão formulada nestes autos – verificação da viabilidade e condições para transmissão do pedido de vigilância à República Federativa do Brasil de cidadão nacional brasileiro condenado por um Tribunal Português, em território nacional - baseia-se na Lei nº 144/99 de 31 Agosto – Lei da Cooperação Judiciária Internacional em Matéria Penal .
O Tribunal da Relação é competente - artº 107º/3 da Lei nº 144/99 de 31.8 previsto para o processo de delegação de execução de sentença, mas aplicável a este procedimento de pedido de vigilância, por expressa remissão feita pelo artº 141º/2 da citada Lei, que manda aplicar ao instituto da vigilância, solicitado por Portugal ao Estado estrangeiro, com as necessárias adaptações, as disposições dos capítulos anteriores.
Em resumo, nos termos do artº 107º/3 da Lei 144/99 de 31.8, no âmbito da cooperação judiciária firmada entre o Estado Português e o Estado Brasileiro, assente no princípio da reciprocidade (artº 4º da citada Lei) está em causa nestes autos, como a seguir será melhor apreciado, o interesse do Estado Português na formulação de um pedido de vigilância à República Federativa do Brasil Brasileira, relativo a uma condenação imposta a um cidadão de nacionalidade Brasileira, traduzida em pena de prisão suspensa na sua execução, por sentença proferida em Portugal em 22.1.24 e transitada em julgado em 21.2.24 no âmbito do processo nº 1183/22.....
Este cidadão, …, actualmente a residir no Brasil, sendo a sua morada no Brasil conhecida nos autos, foi na realidade condenado como autor de um crime de violência doméstica, em pena de prisão suspensa na sua execução, mediante sujeição a regime de prova, por sentença proferida em Portugal em 22.1.24, nos termos já mencionados.
A pena aplicada a este cidadão, pela prática desse crime, foi de 2 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução, por igual tempo, com regime de prova e subordinada á obrigação de frequência de programas destinados ao controlo da violência doméstica.
Em virtude da sua residência no Brasil, o regime de prova e o condicionalismo imposto na referida sentença, no âmbito do regime de prova, ainda não foram cumpridos, pelo que se pretende que naquele país da sua actual residência, no âmbito do instituto da vigilância acima mencionado, o condenado possa ser efectivamente vigiado, nos termos previstos na citada lei 144/99 de 31.98, de molde que se possa de alguma forma, cumprir o plano já elaborado pela reinserção social em Portugal (devidamente homologado por despacho judicial e constante dos autos) e possa cumprir as obrigações contidas nesse plano, nomeadamente, no que respeita à frequência de programas destinados ao controlo da violência doméstica.
O MP na Relação de Lisboa, tem legitimidade para desencadear o procedimento com vista a formular esse pedido, tendo para o efeito fundamentado a sua pretensão de forma suficiente em termos factuais, no requerimento entrado em juízo em 17.10.25.
A vigilância de pessoas condenadas ou libertadas condicionalmente, surge no nosso ordenamento com o Decreto Lei nº 43/91 de 22.1 cujo regime se inspira na Convenção 051, Relativa à vigilância de pessoas condenadas, datada de 1964, ratificada pelo Estado Português em 1994 (Decreto do Presidente da República nº 65/94 de 12.8) aplicável apenas aos países que integram o Conselho da Europa.
Para Países não abrangidos por essa Convenção, esse instituto é admissível com base no princípio da reciprocidade, nos termos do artº 4º e 126º e segs da Lei nº 144/99 de 31.8. e pode revestir 3 modalidades, de acordo com o preceituado no artº 127º desta mesma lei:
a) Vigilância de pessoa condenada;
b) Vigilância e eventual execução de sentença;
c) Execução integral de sentença;
Deste modo, uma vez verificados os factos assentes acima elencados, a partir da prova documental reunida nos autos, resulta claro para nós - ao contrário do que parece resultar do referido no ponto 6 do requerimento inicial do MP que deu início a este processo- que não está em causa neste procedimento, nenhuma pretensão de delegação na República Federativa do Brasil, da execução naquele país, da sentença proferida em 22.1.2024 e transitada em julgado em 21.2.202, no processo comum singular nº 1183/22.... do juízo local criminal de Viseu (Juiz 2) e junta a estes autos, contra …, natural do Brasil, onde se encontra a residir.
Aquilo que se pretende nestes autos, é apenas verificar se estão reunidos todos os pressupostos para se poder transmitir à República Federativa do Brasil um pedido de vigilância na modalidade prevista no artº 127º/1 a) da referida lei, sendo que tal modalidade do instituto da vigilância se encontra regulado especificamente no artº 133º a 136º da Lei nº 144/99 de 31.8, porquanto foi apenas essa forma de cooperação que foi já devidamente autorizada pelo Sr Procurador Geral da Republica, por despacho proferido no âmbito de competências delegadas por Sua Exª a Srª Ministra da Justiça, através do despacho nº 7317/2025 de 24.6.2025 publicado no DR nº 25 I série de 2.7.2025.
Dispõe nomeadamente o artº 133º/1 da Lei 44/99 de 31.8, aplicável de acordo com o artº 141º da mesma lei, ao caso da formulação de um pedido de cooperação de Portugal ao Estado estrangeiro (Brasil no caso presente):
1- O Estado Português que solicitar apenas a vigilância (leia-se em vez de “estado estrangeiro que solicitar apenas a vigilância” por força do estipulado no artº 141º/2 da lei 144/99) dá conhecimento das condições impostas ao condenado e sendo caso disso das medidas com que este deve conformar-se durante o período de prova;
2- Aceite o pedido, o Tribunal adopta se necessário, as medidas prescritas às previstas na lei portuguesa;
3- Em nenhum caso as medidas aplicadas no país estrangeiro (em vez de Estado Português) podem agravar, quer pela sua natureza, quer pela sua duração, as prescritas na decisão proferida pelo Estado Português requerente (leia-se requerente em vez de Estado estrangeiro cfr artº 141º/2 da citada lei).
Dispõe ainda o artº 134º/1, aplicável com as necessárias adaptações, de acordo com o artº 141º da referida lei, ao caso de formulação do pedido de cooperação de Portugal ao Estado estrangeiro (Brasil):
“A aceitação do pedido de vigilância implica os seguintes deveres:
a) De assegurar a colaboração das autoridade e organismos que em território do estado estrangeiro tiverem por função vigiar e assistir as pessoas condenadas;
b) De informar o Estado requerente de todas as medidas tomadas e sua aplicação;
Em consequência, não se verifica com a formulação desse pedido de vigilância, quando o mesmo for aceito pelo Brasil, a renúncia de Portugal à execução da sentença em Portugal (artº 106º/1 da referida Lei nº 144/99 de 31.8), como sucederia se estivesse em causa um pedido de delegação da execução da sentença regulado no artº 104º da mencionada, nem se torna necessário obter o consentimento do condenado (artº 143º/2 da referida Lei).
Ou seja, tal como resulta especificamente da lei 144/99 de 31.8, uma vez aceite pelo Estado Brasileiro, o pedido de vigilância - nos termos que serão formulados oportunamente pela entidade portuguesa competente -, o Estado Português (através do Tribunal da condenação na 1ª instância) continuará a ser o responsável para decidir no processo comum singular nº 1183/22.... do juízo local criminal de Viseu (Juiz 2), se é de revogar a suspensão (artº 56º do C.P) ou declarar extinta a pena suspensa, nos termos previsto no artº 57º do CP (artº 136º e 141º/2 da Lei 144/99 de 31.8), devendo para o efeito, serem transmitidas a esse Tribunal da condenação, todas as informações pertinentes para esse efeito, relativas ao desenrolar da vigilância, quando a mesma for colocada em marcha no Brasil.
| Dispõe assim o artigo 104º da Lei nº 144/99 de 30.11 - preceito que regula as condições da delegação no estrangeiro da execução de uma sentença penal portuguesa, mas é aqui aplicável por remissão expressa do artº 141º/2 da referida Lei: |
| 1 - Pode ser delegada num Estado estrangeiro a execução de uma sentença penal portuguesa (não é esta a pretensão efectivamente aqui concretamente prosseguida, como já vimos) quando, para além das condições gerais previstas neste diploma:
a) O condenado for nacional desse Estado, ou de um terceiro Estado ou apátrida e tenha residência habitual naquele Estado; b) O condenado for português, desde que resida habitualmente no Estado estrangeiro; c) Não for possível, ou não se julgar aconselhável obter a extradição para cumprimento da sentença portuguesa; d) Existirem razões para crer que a delegação permitirá melhor reinserção social do condenado; e) O condenado, tratando-se de reacção criminal privativa da liberdade, informado das consequências da execução no estrangeiro, der o seu consentimento; f) A duração da pena ou medida de segurança impostas na sentença não for inferior a um ano ou, tratando-se de pena pecuniária, o seu montante não for inferior a quantia equivalente a 30 unidades de conta processual, podendo, no entanto, mediante acordo com o Estado estrangeiro, dispensar-se esta condição em casos especiais, designadamente em função do estado de saúde do condenado ou de outras razões de ordem familiar ou profissional. |
E por sua vez dispõe o artº 142º da referida Lei:
nº 1 – O pedido de cooperação é instruído nos termos do artº 23º com as especialidades constantes dos números seguintes:
nº 2 – O pedido de vigilância deve conter:
a) Menção das razões que motivam a vigilância;
b) Especificação das medidas de vigilância decretadas;
c) Informação sobre a natureza e a duração das medidas de vigilância cuja aplicação seja requerida;
d) Informações sobre a personalidade do condenado e o seu comportamento no Estado requerente, antes e depois de proferida decisão relativa à vigilância,
nº 3 – O pedido de vigilância e execução é acompanhado da decisão que impôs a reacção criminal e da decisão que determinar a revogação da condição suspensiva da condenação ou da sua execução.
(…)
Ora analisando a factualidade apurada, constatamos que se verificam todos os requisitos legais acima enunciados, ou seja a pretensão formulada pelo MP foi instruída com os elementos necessários nos termos legais e encontra-se suficientemente fundamenada em termos factuais.
Ou seja, está comprovado documentalmente que o cidadão visado no pedido de vigilância a formular ao Brasil, é cidadão brasileiro condenado em Portugal pela prática de crime de violência doméstica, (ilícito também criminalizado no ordenamento do Brasil), em pena de prisão suspensa na sua execução, com sujeição a regime de prova, pena essa que não se mostra prescrita.
Tal cidadão encontra-se a residir no Brasil e não pode ser extraditado para Portugal, pelo que tal regime de prova e condições fixadas no plano de reinserção social, já elaborado e homologado por decisão judicial, ficaram por cumprir, havendo ainda interesse em que as medidas contidas no regime de prova possam ter aplicação no país onde se encontra a viver, por tal situação lhe permitir uma melhor reinserção social uma vez que facilita um contacto mais próximo com os seus familiares e pessoas do seu meio social.
Sublinha-se que em qualquer caso, a vigilância a que será sujeito o condenado no Brasil, ficará subordinada, nos termos dos artigos 133°/3 da Lei nº 144/99 de 31 de Agosto, a que as medidas e obrigações a cumprir por ele no Brasil, não agravem as prescritas na sentença condenatória portuguesa, no âmbito do plano de reinserção social já traçado pela DGRSP e à obrigação do Estado Brasileiro comunicar ao Estado Português requerente, qualquer decisão que implique cessação ou alteração da execução dessa pena (artº 136º e 141/2 º da Lei acima mencionada).
Por fim, deverá ser efectuado o mencionado pedido de vigilância, em formulário adequado (porquanto aquele formulário já preenchido, que se mostra junto aos autos, denominado de “pedido de apoio judiciário em matéria penal” - regulado no título VI desta lei 144/99 de 31.8, não se revela adequado para os fins aqui pretendidos) e a PGR deverá diligenciar pela sua transmissão à República Federativa do Brasil, de acordo com as disposições legais acima mencionadas.
V. DECISÃO
Nestes termos e pelos fundamentos expostos, se decide:
a) Por se mostrarem reunidas todas as condições gerais e específicas do instituto da vigilância previsto no artº 133º a 136º da Lei nº 144/99 de 31.8, defere-se a pretensão do MP, mas apenas no que respeita à confirmação por este Tribunal da viabilidade do pedido de vigilância do cidadão brasileiro …, condenado em Portugal como autor de um crime de violência doméstica, em pena de prisão suspensa na sua execução, com sujeição a regime de prova, por se mostrarem verificados todos os pressupostos legais para esse efeito.
b) Esse pedido de vigilância, deverá ser endereçado à República Federativa do Brasil, em formulário próprio, que observe o disposto no artº 142º da Lei nº 144/99 de 31.8 (artº 128º da mesma Lei), devendo a PGR diligenciar nesse sentido e bem assim pela sua transmissão ao Estado Brasileiro – com a expressa advertência de que:
- as medidas que vierem a ser aplicadas no Brasil no âmbito dessa vigilância, nunca poderão agravar, quer pela sua natureza, quer pela sua duração, a natureza e conteúdo do regime de prova previsto na sentença condenatória proferida em Portugal em 22.1.2024 e transitada em julgado em 21.2.2024, no âmbito do processo comum singular nº 1183/22.... do juízo local criminal de Viseu (Juiz 2) – artº 133º/3 da referida Lei;
- O Estado Brasileiro ficará sujeito à obrigação de comunicar ao Estado Português requerente, qualquer decisão ou ocorrência factual no Brasil, que implique cessação ou alteração da execução dessa pena (artº 136º e 141/2 º da Lei acima mencionada), ou seja e deverão ser transmitidas a Portugal todas a informações relativas à vigilância para efeitos de verificação do cumprimento das condições de suspensão e de decisão, pelo Tribunal da condenação, sobre a eventual revogação da suspensão ou declaração de extinção da pena.
Sem custas.
Notifique, dando-se nomeadamente conhecimento à Procuradoria Geral da República, de todo o conteúdo deste Acórdão para os devidos efeitos legais, acima mencionados.
(Ana Grandvaux)
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(Rosa Pinto)
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(Helena Lamas)