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CONFLITO DE DISTRIBUIÇÃO
DISTRIBUIÇÃO
PROCESSO PENAL
EXAME PRELIMINAR
INSTRUÇÃO DO RECURSO
COMPETÊNCIA
Sumário
I. A decisão que determinou a baixa dos autos à 1.ª instância para devida instrução do traslado a que se referem os autos de recurso, não determina alteração da competência atribuída por via da distribuição do recurso antes efetuada no Tribunal da Relação e, nessa medida, a ulterior remessa dos autos ao tribunal superior para o julgamento do recurso, por não se tratar de outro objeto recursório, que não se extinguiu, deverá ser apreciado pelo coletivo de juízes a quem o processo, inicialmente, foi distribuído. II. As peças processuais que resultam da remessa ultimamente efetuada ao Tribunal da Relação não configuram um “novo” traslado ou “novo” recurso e, nessa medida, não justificam que devesse ser efetuada nova operação de distribuição.
Texto Integral
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I.
1) Em ...-...-2024, nos autos que, com o n.º 3780/18.3T9LSB correm termos no Juízo Local Criminal de Lisboa - Juiz 11, foi proferido despacho onde se lê, nomeadamente, o seguinte: “(…) Referência Citius n.º 37364525: Req. Demandante Vem a E-Redes apresentar PIC, referindo que se trata de uma ampliação do anteriormente formulado, uma vez que a acusação se refere dois locais de consumo tendo o PIC sido deduzido apenas quanto a um desses locais. O arguido pronunciou-se pelo indeferimento. Cumpre apreciar e decidir. Nos presentes autos, deduziu a demandante PIC a fls. 310 a 318, datado de ... de ... de 2021. Foi requerida abertura de instrução pelo arguido tendo sido proferido despacho de pronúncia datado de ... de ... de 2022 (fls. 364 a 367). A pronúncia foi recebida e consequentemente admitido o PIC, por despacho datado de ... de ... de 2022 (fls. 375 a 376). Por vicissitudes diversas, documentadas em acta, a audiência de julgamento ainda não teve lugar. Deste modo, considerando o disposto no artigo 77.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, há muito que se mostra precludido o prazo para dedução de PIC. Aliás a solução criativa utilizada pela demandante, ao deduzir ampliação do pedido, mais não é do que contornar a Lei, a qual é expressa. Por outro lado, a ampliação do pedido poderia se verificar caso se estivesse a referir ao mesmo local de contagem, mas não, trata-se de um "novo" local de contagem, que já se mostrava referido na acusação e até na participação efectuada pela demandante. Nestes termos, indefere-se o requerido, determinando-se o seu desentranhamento, deixando-se cópia na contracapa. Notifique (…).”.
2) Por requerimento apresentado em juízo em ...-...-2024, não se conformando com a decisão referida em 1), a E-REDES, Distribuição de Eletricidade, S.A., veio dela interpor recurso, juntando a respetiva motivação.
3) O recurso referido em 2) foi admitido por despacho proferido em ...-...-2024.
4) Em ...-...-2024 foram criados os presentes autos – apenso A – e aí foi proferido, em ...-...-2024, o seguinte despacho: “Instrua-se o presente apenso com o requerimento e declaração eletrónica de adesão de ........2024 e ainda com o requerimento do arguido, de ........2024, apresentados nos autos principais. Aguarde-se o decurso do prazo de resposta ao recurso apresentado (artigo 413.º, n.º 1, do Código de Processo Penal) e, após, abra conclusão neste apenso.”.
5) Em ...-...-2024, no apenso A, foi elaborado o seguinte “TERMO DE JUNTADA”: “Nesta data juntei aos presentes autos a declaracão electrónica de adesão de ........2024 e o requerimento apresentado em ........2024 nos autos principais, em conformidade com o douto despacho que antecede.”.
6) Em ...-...-2024, no apenso A, foi proferido despacho a determinar a subida dos autos ao Tribunal da Relação de Lisboa.
7) Remetidos os autos, em ...-...-2025 foi efetuada operação de distribuição, por sorteio, tendo o recurso em questão sido distribuído a coletivo da 3.ª Secção: A Sra. Juíza Desembargadora AA, como relatora; a Sra. Juíza Desembargadora BB, como 1.ª adjunta; e o Sr. Juiz Desembargador CC, como 2.º adjunto.
8) Em ...-...-2025, a Sra. Juíza DesembargadoraAA proferiu o seguinte despacho: “O presente translado não tem aptidão para ser decidido porque não contem peças essenciais. Tem um requerimento repetido de DD em resposta a um requerimento de ........2023, cujo autor e conteúdo se desconhece, não tem o despacho recorrido, nem eventual resposta (ou respostas) ao recurso. Por outro o recurso que vem acoplado à certidão é indigitável, na medida em que tem um traço vertical em todas as folhas, o que, como se sabe impede a digitalização. Em suma, não estamos face a um verdadeiro translado mas a uma reunião de peças soltas inúteis para quaisquer fins neste Tribunal. Assim, por manifesta inexistência de translado relativo, determino a devolução do processado ao Tribunal de origem, para que, caso se venha a entender, formar um translado próprio de um recurso com subida em separado”.
9) Remetidos os autos à 1.ª instância, aí, em ...-...-2025, foi proferido o seguinte despacho: “Em cumprimento do determinado pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, e penitenciando-se, desde já este Tribunal, pelo lapso, instrua novamente o apenso juntando: - Despacho de acusação e sua notificação à demandante E-Redes – Distribuição de Energia, SA,, aqui recorrente; - Pedido de indemnização civil de ........2021; - Despacho de pronúncia e sua notificação à demandante; - Despacho de recebimento da decisão instrutória e de admissão do pedido de indemnização civil, de ........2022; - Requerimento de ........2023 (com a folha de rosto do documento - referência 46897489); - Certidão do despacho recorrido; - Certidão do requerimento de interposição de recurso (com a folha de rosto do documento - referência 49925317); - Despacho que admitiu o recurso; - Requerimento do arguido e declaração eletrónica de adesão de ........2024 (incluindo referências 50213738 e 50213857); - Requerimento do arguido de ........2024 e respetiva folha de rosto (referência 47750298). Certifique que não houve outras respostas ao recurso.”.
10) E, igualmente, na 1.ª instância, foi proferido, em ...-...-2025, despacho onde se lê o seguinte: “Pese embora seja entendimento deste Tribunal que, no seguimento do despacho proferido nos autos principais em ........2025, o recurso interposto pela demandante perdeu a sua utilidade, por não caber a esta instância, mas sim ao Venerando Tribunal da Relação de Lisboa pronunciar-se acerca das questões relacionadas com o recurso, em face da posição da demandante, que refere manter interesse no mesmo (cf. requerimento de ........2025), cumpra o despacho que antecede, juntando ainda: - Certidão do despacho proferido nos autos principais em ........2025 e sua notificação aos intervenientes processuais, com nota de que ainda não transitou em julgado ou nota de trânsito, caso, entretanto, transite; - Ata da audiência de julgamento de ........2025; - Requerimento da demandante de ........2025; D.N.”.
11) Junta a referida certidão e determinada a remessa dos autos ao Tribunal da Relação de Lisboa, aqui foi efetuada, em ...-...-2025, operação de distribuição, por sorteio, tendo os autos em questão sido distribuídos a coletivo da 5.ª Secção: A Sra. Juíza Desembargadora EE, como relatora; o Sr. Juiz Desembargador FF, como 1.º adjunto; e a Sra. Juíza Desembargadora GG, como 2.ª adjunta.
12) Após, em ...-...-2025, a Sra. Juíza Desembargadora EE proferiu despacho onde se lê o seguinte: “O presente recurso (do despacho proferido no processo principal em ........2024 - refª Citius ...) foi distribuído neste Tribunal da Relação, em ........2025, à 3ª secção, e não foi decidido, tendo-se determinado a baixa dos autos à 1ª instância para regularização do processado, como resulta do despacho proferido em ........2025 (refª Citius 22598985). Subidos novamente os autos, inexiste qualquer motivo para que se proceda a nova distribuição – não houve qualquer erro na distribuição, tendo o relator e os adjuntos sido sorteados nos termos legalmente previstos. Assim, remetam-se os autos à secção central, para que seja dada baixa da presente distribuição, sendo os autos posteriormente remetidos à 3ª secção, na qual pendem. D.N.”.
13) Dado que foi cumprimento ao despacho proferido em 12), em ...-...-2025, a Sra. Juíza Desembargadora AA proferiu despacho onde se lê o seguinte: “Distribuído que foi este processo verificou-se que aquilo que devia ser um translado com aptidão para permitir a apreciação do recurso não passava de uma série de folhas desconexas, inaptas a ser consideradas efectivamente um translado. Na altura escreveu-se que «O presente translado não tem aptidão para ser decidido porque não contem peças essenciais. Tem um requerimento repetido de DD em resposta a um requerimento de ........2023, cujo autor e conteúdo se desconhece, não tem o despacho recorrido, nem eventual resposta (ou respostas) ao recurso. Por outro o recurso que vem acoplado à certidão é indigitável, na medida em que tem um traço vertical em todas as folhas, o que, como se sabe impede a digitalização. Em suma, não estamos face a um verdadeiro translado mas a uma reunião de peças soltas inúteis para quaisquer fins neste Tribunal. Assim, por manifesta inexistência de translado relativo, determino a devolução do processado ao Tribunal de origem, para que, caso se venha a entender, formar um translado próprio de um recurso com subida em separado.» Tendo sido remetido novo translado e não estando em causa a única situação que determina a manutenção do mesmo colectivo, prevista no artigo 426º-A do CPP, que com reporte para o artigo 426º se reporta a situações de reenvio, entendo que o processo carece de ser distribuído, uma vez que a ausência de decisão por inaptidão do translado não produz os efeitos pretendidos no despacho que antecede. Assim, notifique deste despacho e após trânsito remeta à Exmª Srª Desembargadora a quem foi, desta feita, distribuído.”.
14) Após, em ...-...-2025, a Sra. Juíza Desembargadora EEproferiu despacho onde se lê o seguinte: “No despacho proferido em ........2025 (refª Citius 23134942), jamais se sugeriu que ao caso fosse aplicável o disposto no artigo 426º-A do Código de Processo Penal. E não é, precisamente porque o recurso interposto, admitido, e remetido a este Tribunal em ........2025, não foi decidido. O que então se disse, e agora se mantém, é que não deveria ter sido realizada uma segunda distribuição, para a qual inexiste fundamento legal, porque nada de errado ocorreu com a primeira. A considerar-se que a baixa dos autos à 1ª instância para regularização do processado (que foi o que aconteceu) corresponde, alternativamente, ao conhecimento do recurso, ou a uma inexistência da distribuição realizada neste Tribunal, está encontrada a fórmula para defraudar as regras da distribuição e, em última análise, o princípio do juiz natural. Nada temos, pois, a alterar à posição expressa no mencionado despacho de ........2025, mantendo o entendimento de que, inexistindo erro na distribuição efetuada em ........2025 (e não se vê que, em momento algum, tenha sido identificado qualquer erro), inexiste razão para proceder a nova distribuição, por não estar verificado o pressuposto a que alude o artigo 213º, nº 4, 1ª parte, do Código de Processo Civil. Os despachos proferidos (em ........2025 e ........2025) evidenciam a existência de um conflito negativo de distribuição (que consiste em saber se, remetidos os autos à 1ª instância para regularização do processado, a sua posterior remessa a este Tribunal corresponde a um novo recurso, apesar de não ter sido proferida qualquer decisão de mérito, devendo proceder-se a nova distribuição). Consequentemente, deverão os autos ser apresentados, para resolução de tal conflito, ao Exmo Senhor Juiz Desembargador Presidente deste Tribunal da Relação de Lisboa (artigos 111º e segs. do Código de Processo Civil, ex vi do artigo 205º, nº 2, do Código de Processo Civil, todos ex vi do artigo 4º do Código de Processo Penal). D.N.”.
15) Na sequência, em ...-...-2025, o Ministério Público pronunciou-se, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 112.º, n.º 2, do CPC, atento o disposto no artigo 114.º do CPC, nos seguintes termos: “ “O Ministério Público, em conformidade com o disposto nos artigos 112.º, n.º 2 e 114.º do Código de Processo Civil, e concordando com a fundamentação constante dos despachos de .../.../2025 e .../.../2025 da Mma. Juíza Desembargadora da 5ª Secção, pronuncia-se no sentido de que não deve haver lugar a nova (segunda) operação distributiva, antes se deve manter a competência do coletivo inicialmente designado por via do sorteio (3ª Secção), na medida em que, por um lado, o ato de distribuição inicialmente efetuado não padece de qualquer erro ou irregularidade e, por outro lado, a haver lugar a nova distribuição e à constituição do coletivo com novos juízes, na prática, tal situação configuraria uma situação de desaforamento ilegítimo (cfr. art. 39.º da LOSJ) face à designação legal dos juízes determinada pela primeira operação distributiva efetuada.”.
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II. Estamos perante um conflito negativo de distribuição, onde foram proferidos dois despachos, de teor conflituante no que à distribuição/afetação dos autos respeita, pelas Sras. Juízas Desembargadoras acima identificadas.
No despacho de ...-...-2025, a Sra. Juíza Desembargadora EE (5.ª Secção) concluiu, em suma, que, no caso dos autos, o recurso “foi distribuído neste Tribunal da Relação, em ........2025, à 3.ª Secção, e não foi decidido, tendo-se determinado a baixa dos autos à 1.ª instância para regularização do processado (…)”, pelo que, subindo novamente os autos, inexiste motivo para nova distribuição, não padecendo a primeira de erro.
Por seu turno, no despacho de ...-...-2025, a Sra. Juíza Desembargadora AA (3.ª Secção) considera que, por força da baixa dos autos, foi remetido novo translado, “não estando em causa a única situação que determina a manutenção do mesmo colectivo, prevista no artigo 426º-A do CPP, que com reporte para o artigo 426º se reporta a situações de reenvio”, pelo que, considerou que o processo carecia de segunda distribuição.
Vejamos:
Conforme se deu conta no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 05-07-2006 (Pº 835/06, rel. ATAÍDE DAS NEVES), “não cura a nossa lei adjectiva penal do instituto da distribuição, daí que, face ao art.º 4º do CPP, se deva recorrer às normas do CPC”.
Em semelhante sentido, expressou-se na decisão singular proferida pelo Tribunal da Relação de Évora em 21-07-2016 (Pº 410/09.8TAPTM.E2, rel. BERNARDO DOMINGOS) que, “[a] figura do conflito de distribuição não se encontra regulada na lei processual penal, pelo que teremos de lançar mão das correspondentes disposições do CPC, por via da remissão operada pelo art. 4º do CPP. A lei processual civil não contém norma expressa relativa aos conflitos de distribuição que surjam entre Juízes do mesmo Tribunal da Relação, porém o art.º 114º do CPC, estatui que «o disposto nos artigos 111º a 113º é aplicável a quaisquer outros conflitos que devam ser resolvidos pelas Relações ou pelo Supremo Tribunal de Justiça…»”.
Ora, nos termos do disposto no artigo 203.º do CPC, o ato processual da “distribuição” – designado pelo legislador como “especial” – tem a seguinte finalidade: “É pela distribuição que, a fim de repartir com igualdade o serviço judicial, se designa a secção, a instância e o tribunal em que o processo há de correr ou o juiz que há de exercer as funções de relator.”.
De harmonia com o previsto no artigo 204.º do CPC, as operações de distribuição e registo previstas nos números 2 a 6, são realizadas por meios eletrónicos, as quais devem garantir aleatoriedade no resultado e igualdade na distribuição do serviço, nos termos definidos na portaria prevista no n.º 2 do artigo 132.º (n.º 1).
A portaria a que se refere o referido normativo é – no que respeita aos tribunais judiciais -a portaria n.º 280/2013, de 26 de agosto (retificada pela declaração de retificação n.º 44/2013, de 25 de outubro), alterada pelas portarias n.ºs. 170/2017, de 25 de maio (cfr. retificação n.º 16/2017, de 6 de junho), 267/2018, de 20 de setembro, 86/2023, de 27 de março e 360-A/2023, de 14 de novembro.
De harmonia com o disposto no n.º 3 do artigo 204.º do CPC, a distribuição é presidida por um juiz, designado pelo presidente do tribunal de comarca e secretariado por um oficial de justiça, com a assistência obrigatória do Ministério Público e, caso seja possível por parte da Ordem dos Advogados, de um advogado designado por esta ordem profissional, todos em sistema de rotatividade diária sempre que, quanto àqueles, a composição do tribunal o permita.
A distribuição obedece às seguintes regras (cfr. artigo 204.º, n.º 4, do CPC):
a) Os processos são distribuídos por todos os juízes do tribunal e a listagem fica sempre anexa à ata;
b) Se for distribuído um processo a um juiz que esteja impedido de nele intervir, deve ficar consignada em ata a causa do impedimento que origina a necessidade de fazer nova distribuição por ter sido distribuído a um juiz impedido, constando expressamente o motivo do impedimento, bem como anexa à ata a nova listagem;
c) As operações de distribuição são obrigatoriamente documentadas em ata, elaborada imediatamente após a conclusão daquelas e assinada pelas pessoas referidas no n.º 3, a qual contém necessariamente a descrição de todos os atos praticados.
A lei regula outros aspetos acessórios, prescrevendo, em particular, no n.º 6 do artigo 204.º do CPC (com a redação conferida pelo D.L. n.º 97/2019, de 26 de julho e pela Lei n.º 55/2021, de 13 de agosto) que, “sem prejuízo do disposto nos números anteriores, nos casos em que haja atribuição de um processo a um juiz, deve ficar explicitada na página informática de acesso público do Ministério da Justiça que houve essa atribuição e os fundamentos legais da mesma”.
Por seu turno, estabelece o n.º 1 do artigo 205.º do CPC que, “a falta ou irregularidade da distribuição não produz nulidade de nenhum ato do processo, mas pode ser reclamada por qualquer interessado ou suprida oficiosamente até à decisão final”.
A lei processual prevê disposições particulares sobre o ato de distribuição nos tribunais superiores, a que se referem, em particular, os artigos 213.º a 218.º do CPC, que, em suma, se podem resumir ao seguinte:
- A distribuição que contém as espécies referidas no artigo 214.º do CPC, é efetuada uma vez por dia, de forma eletrónica;
- A distribuição é presidida por um juiz, designado pelo presidente do respetivo tribunal e secretariado por um oficial de justiça, com a assistência obrigatória do Ministério Público e, caso seja possível por parte da Ordem dos Advogados, de um advogado designado por esta ordem profissional, todos em sistema de rotatividade diária, podendo estar presentes, se assim o entenderem, os mandatários das partes;
- É correspondentemente aplicável o disposto no artigo 204.º, n.ºs. 4 a 6 do CPC, com as seguintes especificidades:
a) A distribuição é feita para apurar aleatoriamente o juiz relator e os juízes-adjuntos de entre todos os juízes da secção competente, sem aplicação do critério da antiguidade ou qualquer outro;
b) Deve ser assegurada a não repetição sistemática do mesmo coletivo;
- Quando tiver havido erro na distribuição, o processo é distribuído novamente, aproveitando-se, porém, os vistos que já tiver; mas se o erro derivar da classificação do processo, é este carregado ao mesmo relator na espécie devida, descarregando-se daquela em que estava indevidamente;
- A distribuição é efetuada por meios eletrónicos, nos termos previstos nos artigos 204.º e 213.º do CPC; e
- Na distribuição atende-se à ordem de precedência dos juízes, como se houvesse uma só secção.
O Regulamento nº 269/2021, de 22 de março, do Conselho Superior da Magistratura, Regulamento das Situações de Alteração, Redução ou Suspensão da Distribuição de Processos (publicado no DR nº 56/2021, Série II, de 22-03-2022) veio estabelecer, por seu turno, os princípios, critérios, requisitos e procedimentos a que deve obedecer a determinação pelo Conselho Superior da Magistratura das medidas a que aludem os artigos 149.º, n.º 1, alíneas n) e o), 151.º, alínea c), e 152.º -C, n.º 1, alíneas g) e h), do Estatuto dos Magistrados Judiciais, aplicáveis aos Tribunais Superiores e aos Tribunais de Primeira Instância, definindo diversas situações:
a) Distribuição: conjunto de operações de repartição automática, semiautomática e manual, por sorteio, dos processos entrados em Juízo, nos Juízos que integrem mais do que um Magistrado Judicial;
b) Alteração da distribuição: modificação das operações de repartição dos processos entrados em Juízo, nos Juízos que integrem mais do que um Magistrado Judicial, realizada no sistema informático de suporte à atividade dos Tribunais, através do modo manual por certeza;
c) Redução da distribuição: modificação das operações de repartição dos processos entrados em Juízo, realizada no sistema informático de suporte à atividade dos Tribunais, operada através da fixação de uma percentagem do número total de processos ou na limitação das espécies processuais a repartir, com os fundamentos previstos na alínea h) do n.º 1 do artigo 152.º -C do Estatuto dos Magistrados Judiciais, sendo que em caso de limitação quantitativa, a diferença entre o número de processos correspondente à percentagem fixada e o número total de processos que deveria ser repartido pelo Magistrado, de acordo com os modos de distribuição que comportem sorteio, é repartido pelos demais Magistrados que integrem a unidade orgânica, efetuando o sistema informático, de forma automática, as compensações nos contadores da distribuição;
d) Suspensão da distribuição: interrupção, por tempo determinado, das operações de repartição dos processos entrados em Juízo, nos Juízos que integrem mais do que um Magistrado Judicial, realizada no sistema informático de suporte à atividade dos Tribunais;
e) Redistribuição: repetição do conjunto de operações de repartição automática, semiautomática e manual, por sorteio, dos processos entrados em Juízo, nos Juízos que integrem mais do que um Magistrado Judicial, a qual pode comportar ou não a exclusão de um ou mais Magistrados Judiciais da nova repartição e pressupõe, em qualquer caso, que os processos objeto da mesma já tinham sido distribuídos em momento anterior, pela forma indicada em a).
Estabelece o artigo 4.º do referido Regulamento os princípios gerais nesta matéria: “A alteração, suspensão, redução da distribuição ou a consequente redistribuição de processos, pressupõe a impossibilidade de substituição por outro juiz, devendo garantir aleatoriedade no resultado e igualdade na distribuição do serviço, assegurando a salvaguarda dos princípios do juiz natural, da legalidade, da proibição do desaforamento, da independência e da imparcialidade dos tribunais”, regulando-se, nos artigos seguintes do Regulamento, as diversas situações que podem determinar a alteração, redução ou suspensão de distribuição.
Sobre situações de “segunda distribuição” dispõe o artigo 217.º do CPC, nos seguintes termos: “1 - Se no ato da distribuição constar que está impedido o juiz a quem o processo foi distribuído, é logo feita segunda distribuição na mesma escala; o mesmo se observa caso, mais tarde, o relator fique impedido ou deixe de pertencer ao tribunal. 2 - Se o impedimento for temporário e cessar antes do julgamento, dá-se baixa da segunda distribuição, voltando a ser relator do processo o primeiro designado e ficando o segundo para ser preenchido em primeira distribuição; se o impedimento se tornar definitivo, subsiste a segunda distribuição”.
Por seu turno, estabelece o artigo 218.º do CPC – com a epígrafe “Manutenção do relator, no caso de novo recurso” – que: “Se, em consequência de anulação ou revogação da decisãorecorrida ou do exercício pelo Supremo Tribunal de Justiça dos poderes conferidos pelo n.º 3 do artigo 682.º, tiver de ser proferida nova decisão no tribunal recorrido e dela for interposta e admitida nova apelação ou revista, o recurso é, sempre que possível, distribuído ao mesmo relator”.
Considerando que estamos em face de um processo penal, a referida norma do artigo 218.º do CPC apenas será aplicável, se e na medida, em que se verifique situação de “caso omisso”, ou seja, conforme dispõe o artigo 4.º do CPP, quando as disposições do Código de Processo Penal não puderem aplicar-se por analogia, caso em que se observam as normas do processo civil que se harmonizem com o processo penal e, na falta delas, aplicam-se os princípios gerais do processo penal.
Importa, atenta a natureza do processo em apreço, considerar, ainda, as seguintes disposições normativas do Código de Processo Penal: “Artigo 414.º Admissão do recurso 1 - Interposto o recurso e junta a motivação ou expirado o prazo para o efeito, o juiz profere despacho e, em caso de admissão, fixa o seu efeito e regime de subida. 2 - O recurso não é admitido quando a decisão for irrecorrível, quando for interposto fora de tempo, quando o recorrente não reunir as condições necessárias para recorrer, quando faltar a motivação ou, faltando as conclusões, quando o recorrente não as apresente em 10 dias após ser convidado a fazê-lo. 3 - A decisão que admita o recurso ou que determine o efeito que lhe cabe ou o regime de subida não vincula o tribunal superior. 4 - Se o recurso não for interposto de decisão que conheça, a final, do objecto do processo, o tribunal pode, antes de ordenar a remessa do processo ao tribunal superior, sustentar ou reparar aquela decisão. 5 - Havendo arguidos presos, deve mencionar-se tal circunstância, com indicação da data da privação da liberdade e do estabelecimento prisional onde se encontrem. 6 - Subindo o recurso em separado, o juiz deve averiguar se o mesmo se mostra instruído com todos os elementos necessários à boa decisão da causa, determinando, se for caso disso, a extracção e junção de certidão das pertinentes peças processuais. 7 - Se o recurso subir nos próprios autos e houver arguidos privados da liberdade, o tribunal, antes da remessa do processo para o tribunal superior, ordena a extracção de certidão das peças processuais necessárias ao seu reexame. 8 - Havendo vários recursos da mesma decisão, dos quais alguns versem sobre matéria de facto e outros exclusivamente sobre matéria de direito, são todos julgados conjuntamente pelo tribunal competente para conhecer da matéria de facto. (…) Artigo 417.º Exame preliminar 1 - Colhido o visto do Ministério Público o processo é concluso ao relator para exame preliminar. 2 - Se, na vista a que se refere o artigo anterior, o Ministério Público não se limitar a apor o seu visto, o arguido e os demais sujeitos processuais afectados pela interposição do recurso são notificados para, querendo, responder no prazo de 10 dias. 3 - Se das conclusões do recurso não for possível deduzir total ou parcialmente as indicações previstas nos n.ºs 2 a 5 do artigo 412.º, o relator convida o recorrente a completar ou esclarecer as conclusões formuladas, no prazo de 10 dias, sob pena de o recurso ser rejeitado ou não ser conhecido na parte afetada. Se a motivação do recurso não contiver as conclusões e não tiver sido formulado o convite a que se refere o n.º 2 do artigo 414.º, o relator convida o recorrente a apresentá-las em 10 dias, sob pena de o recurso ser rejeitado. 4 - O aperfeiçoamento previsto no número anterior não permite modificar o âmbito do recurso que tiver sido fixado na motivação. 5 - No caso previsto no n.º 3, os sujeitos processuais afectados pela interposição do recurso são notificados da apresentação de aditamento ou esclarecimento pelo recorrente, podendo responder-lhe no prazo de 10 dias. 6 - Após exame preliminar, o relator profere decisão sumária sempre que: a) Alguma circunstância obstar ao conhecimento do recurso; b) O recurso dever ser rejeitado; c) Existir causa extintiva do procedimento ou da responsabilidade criminal que ponha termo ao processo ou seja o único motivo do recurso; ou d) A questão a decidir já tiver sido judicialmente apreciada de modo uniforme e reiterado. 7 - Quando o recurso não puder ser julgado por decisão sumária, o relator decide no exame preliminar: a) Se deve manter-se o efeito que foi atribuído ao recurso; b) Se há provas a renovar e pessoas que devam ser convocadas. 8 - Cabe reclamação para a conferência dos despachos proferidos pelo relator nos termos dos n.ºs 6 e 7. 9 - Quando o recurso deva ser julgado em conferência, o relator elabora um projecto de acórdão no prazo de 15 dias a contar da data em que o processo lhe for concluso nos termos dos n.ºs 1, 2 ou 5. 10 - A reclamação prevista no n.º 8 é apreciada conjuntamente com o recurso, quando este deva ser julgado em conferência. (…) Artigo 426.º Reenvio do processo para novo julgamento 1 - Sempre que, por existirem os vícios referidos nas alíneas do n.º 2 do artigo 410.º, não for possível decidir da causa, o tribunal de recurso determina o reenvio do processo para novo julgamento relativamente à totalidade do objecto do processo ou a questões concretamente identificadas na decisão de reenvio. 2 - O reenvio decretado pelo Supremo Tribunal de Justiça, no âmbito de recurso interposto, em 2.ª instância, de acórdão da relação é feito para este tribunal, que admite a renovação da prova ou reenvia o processo para novo julgamento em 1.ª instância. 3 - No caso de haver processos conexos, o tribunal superior faz cessar a conexão e ordena a separação de algum ou alguns deles para efeitos de novo julgamento quando o vício referido no número anterior recair apenas sobre eles. 4 - Se da nova decisão a proferir no tribunal recorrido vier a ser interposto recurso, este é sempre distribuído ao mesmo relator, exceto em caso de impossibilidade. Artigo 426.º-A Competência para o novo julgamento 1 - Quando for decretado o reenvio do processo, o novo julgamento compete ao tribunal que tiver efectuado o julgamento anterior, sem prejuízo do disposto no artigo 40.º, ou, no caso de não ser possível, ao tribunal que se encontre mais próximo, de categoria e composição idênticas às do tribunal que proferiu a decisão recorrida. 2 - Quando na mesma comarca existir mais de um juízo da mesma categoria e composição, o julgamento compete ao tribunal que resultar da distribuição”.
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III. Conhecendo:
Conforme se refere no despacho de ...-...-2025, acima transcrito, não se afigura que a situação dos autos comporte a convocação do normativo do artigo 426.º-A do CPP, pois, não está em questão uma situação de reenvio dos autos para novo julgamento. Por esta circunstância, também não é de considerar o disposto no artigo 426.º do CPP.
A questão a apreciar centra-se, pois, em saber se, tendo baixado os autos, à 1.ª instância, para instrução correta das peças processuais do recurso remetido em separado dos autos principais, a ulterior subida dos autos à Relação comporta a manutenção do coletivo de juízes desembargadores determinado na primitiva distribuição, ou se, pelo contrário, se justifica nova operação distributiva.
Neste ponto, interessa apreciar, com maior detalhe, os termos em que teve lugar a primitiva intervenção no processo da Sra. Juíza Desembargadora AA.
De facto, a referida Sra. Juíza Desembargadora proferiu o despacho de ...-...-2025, como relatora e em sede do momento processual previsto no artigo 417.º do CPP: O exame preliminar do processo de recurso. “O Juiz relator do recurso, a quem o processo é distribuído, toma pela primeira vez contacto com o processo, para o sanear através do exame preliminar, não se encontrando vinculado ao decidido em 1.ª instância (v. art. 414-3) começando por aferir do cumprimento do disposto no art. 416, a seguir da conformidade legal, tempestividade e regime de subida do recurso, depois da existência e qualidade das conclusões do recurso apresentado (v. art. 412-1) no que respeita ao cumprimento das indicações previstas no art. 412-3-4-5 (as quais, não se encontrando respeitadas, implicam o convite ao aperfeiçoamento, sob pena de rejeição do recurso)” (assim, Fernando Gama Lobo; Código de Processo Penal Anotado; 2.ª ed., Almedina, 2017, p. 936).
Conforme decorre do artigo 417.º, n.º 6, do CPP, na sequência do exame preliminar, o relator tem os poderes de proferir decisão sumária sobre o recurso, comportando, de forma não exaustiva, o conhecimento das seguintes questões (cfr., sobre o ponto, Paulo Pinto de Albuquerque (Org.); Comentário do Código de Processo Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos Humanos, Vol. II, 5.ª Ed., UCP Editora, 2023, p. 691):
- As circunstâncias que obstem ao conhecimento do recurso, incluindo os pressupostos da ação penal e civil e a desistência;
- Os fundamentos de rejeição do recurso, previstos no artigo 420.º, n.º 1, do CPP;
- As causas extintivas do procedimento ou da responsabilidade criminal que ponham termo ao processo ou sejam os únicos motivos do recurso, incluindo a aplicação de amnistia ou de outras medidas de clemência previstas na lei;
- Os incidentes suscitados;
- A questão de mérito a decidir, quando a mesma já tenha sido apreciada, de modo uniforme e reiterado (cfr. artigo 417.º, n.º 6, al. d) do CPP).
Ora, não se afigura que, a decisão proferida em ...-...-2025 tenha comportado o conhecimento do mérito do recurso ou de circunstâncias que tenham determinado o conhecimento do objeto do mesmo, apenas tendo sucedido, como ocorre por vezes, que o recurso subiu ao Tribunal da Relação com deficiente instrução.
Nesse âmbito, designadamente, por força da consideração da disposição paralela do artigo 652.º, n.º 1, al. d), ao relator incumbirá deferir os termos do recurso até final, entre estes se encontrando o dever de ordenar as diligências que considere necessárias para o conhecimento do recurso.
Daí que, na sequência da decisão de ...-...-2025, se tenha determinado a devolução dos autos à 1.ª instância para que fosse formado “translado próprio de um recurso com subida em separado”.
Trata-se, no fundo, do conhecimento de uma questão prévia ao objeto do recurso, aliás, passível de exercitação dos poderes de promoção e saneamento do recurso pelo relator (cfr. artigo 6.º, n.º 3, do CPC, ex vi, do artigo 4.º do CPP).
O objeto recursório não se extinguiu, assim, com a decisão proferida em ...-...-2025. Antes, se gerou uma relação intraprocessual que determinou a baixa dos autos para completar a instrução do traslado de recurso primitivamente remetido.
Compreende-se, pois, que seja no coletivo a que a apreciação do recurso interposto foi inicialmente distribuído que radique a competência para a respetiva apreciação de mérito, que não se extinguiu por via da prolação da decisão de ...-...-2025.
As peças processuais que resultam da remessa ultimamente efetuada ao Tribunal da Relação não configuram um “novo” traslado ou “novo” recurso e, nessa medida, não justificam que devesse ser efetuada nova operação de distribuição.
O conhecimento do recurso radicava – e radica – no coletivo resultante da primitiva operação de distribuição, sem que tenha ocorrido qualquer erro de distribuição.
Assim, a distribuição ultimamente operada – em ...-...-2025 – não poderá subsistir.
Em suma:
- A decisão que determinou a baixa dos autos à 1.ª instância para devida instrução do traslado a que se referem os autos de recurso, não determina alteração da competência atribuída por via da distribuição do recurso antes efetuada no Tribunal da Relação e, nessa medida, a ulterior remessa dos autos ao tribunal superior para o julgamento do recurso, por não se tratar de outro objeto recursório, que não se extinguiu, deverá ser apreciado pelo coletivo de juízes a quem o processo, inicialmente, foi distribuído; e
- As peças processuais que resultam da remessa ultimamente efetuada ao Tribunal da Relação não configuram um “novo” traslado ou “novo” recurso e, nessa medida, não justificam que devesse ser efetuada nova operação de distribuição.
O presente conflito de distribuição deverá ser resolvido considerando-se como devidamente distribuídos os autos em ...-...-2025, determinando a competência do coletivo de juízes apurado por via de tal operação distributiva.
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IV. Nos termos expostos, decide-se o presente conflito de distribuição, no sentido de que, a competência para a tramitação dos autos, radica no coletivo de Juízes Desembargadores da 3.ª Secção, a quem os autos forma inicialmente distribuídos em ...-...-2025: A Sra. Juíza Desembargadora AA como relatora; a Sra. Juíza Desembargadora BB, como 1.ª adjunta; e o Sr. Juiz Desembargador CC, como 2.º adjunto.
Sem custas.
Notifique e d.n., determinando-se a remessa dos autos à secção central, para que seja dada baixa na distribuição ultimamente efetuada.
Após trânsito, publique-se na base de dados de acórdãos deste Tribunal da Relação de Lisboa (https://www.dgsi.pt), remetendo-se a mesma, por email, através do secretariado da Presidência, a todos os Srs. Juízes Desembargadores das Secções Criminais e da Secção da P.I.C.R.S.