SUSPEIÇÃO
INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE
Sumário

Tendo sido movimentado – no movimento judicial ordinário – o juiz que tinha a seu cargo o processo em questão, sem que ocorra a situação a que se reporta o artigo 605.º do CPC, com a referida movimentação cessa a intervenção no processo em questão do Sr. Juiz visado pela suspeição, pelo que se verifica que o objetivo pretendido alcançar pela requerente – o afastamento do Sr. Juiz da titularidade do processo que estava a seu cargo - foi já alcançado por via da efetivação da produção de efeitos do movimento judicial, mostrando-se patenteada situação de inutilidade superveniente da presente lide.

Texto Integral

Processo nº 870/21.9T8MFR-F.L1
8.ª Secção
*
I. AA…, requerida no processo de promoção e proteção, que corre termos sob o n.º 870/21.9T8MFR-D, no Juízo de Família e Menores de Mafra, veio, por requerimento apresentado em juízo em 25-03-2025, subscrito pela Advogada BB…, deduzir incidente de suspeição, relativamente ao Juiz de Direito CC….
No prosseguimento da tramitação dos autos, por decisão de 14-05-2025 foi proferida decisão singular que indeferiu a suspeição requerida e condenou a requerente como litigante de má fé, em multa de 5 (cinco) U.C.’s.
Por requerimento de 04-06-2025, a requerente veio deduzir pretensão de reclamação “para a Conferência, ao abrigo do disposto nos arts 652º e 542º do CPC, 20ºda CRP e 10º da Convenção Universal dos Direitos Humanos”, pretensão que foi indeferida por despacho de 06-06-2025.
Por requerimento de 06-06-2025, a requerente veio pretender “interpôr recurso de Revista para o Supremo Tribunal de Justiça da Decisão Singular que, decidindo da Suspeição, condena a Requerente em multa por litigância de má-fé, ao abrigo do artº 542º nº 3 do CPC, 20º da CRP e 6º da Convenção Universal dos Direitos Humanos”, pretensão que foi indeferida por despacho de 12-06-2025.
Dessa decisão, a requerente interpôs nova reclamação, dando origem ao apenso A.
Por requerimento de 28-08-2025, a requerente veio requerer a declaração de inutilidade superveniente da lide, em suma, em virtude de, por força do Movimento Judicial Ordinário de 2025, o Sr. Juiz visado ter sido movimentado para o Tribunal da Relação de Lisboa, deixando de ser titular do processo em causa.
*
II. Uma das causas de extinção da instância é a inutilidade superveniente da lide (cfr. artigo 277.º, al. e) do CPC).
A instância extinguir-se-á por inutilidade superveniente da lide quando, na pendência da causa, desapareça a sua razão de ser, ou mais precisamente quando sobrevenha a falta de interesse em agir.
“A inutilidade superveniente decorre em geral dos casos em que o efeito pretendido já foi alcançado por via diversa, sendo o caso mais típico o do pagamento da quantia peticionada ou, em geral, o cumprimento espontâneo da obrigação em causa ou a entrega do bem reivindicado” (assim, Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa; Código de Processo Civil Anotado; vol. I, 3.ª ed., Almedina, 2022, p. 356).
Conforme se sintetizou na decisão sumária, proferida pelo Tribunal da Relação de Coimbra de 05-12-2012 (Pº 1124/11.4TBTMR.C1, HENRIQUE ANTUNES) “a instância extingue-se sempre que se torne supervenientemente inútil, i.e., sempre que por facto ocorrido na pendência da instância, a continuação da lide não tenha qualquer utilidade (…). A instância extingue-se ou finda de forma anormal todas as vezes que, ou por motivo atinente ao sujeito, ou por motivo atinente ao objecto, ou por motivo atinente à causa, a respectiva relação jurídica substancial se torne inútil, i.e., deixe de interessar a sua apreciação. Não é suficiente, portanto, a existência de um facto que torne a lide inútil; exige-se, para que se verifique a causa de extinção da instância considerada, que o facto seja superveniente”.
E, nessa medida, “o art. 277.º, alínea e), do Código de Processo Civil deverá aplicar-se “quando em virtude de novos factos ocorridos na pendência do processo, for patente que a decisão a proferir pelo julgador deixou de ter interesse, seja porque não é possível dar satisfação à pretensão que o demandante quer fazer valer no processo (casos de impossibilidade), seja porque o escopo visado com a acção foi atingido por outro meio (casos de inutilidade)” (assim, o Acórdão do STJ de 07-11-2019, Pº 3150/07.9TVPRT.P1.S1, rel. CATARINA SERRA).
No caso em apreço, o Sr. Juiz visado na suspeição foi movimentado, por promoção, para o Tribunal da Relação de Lisboa, cessando as funções que vinha desempenhando no Juízo de Família e Menores de Mafra, com efeitos a partir da presente data (cfr., o Movimento Judicial Ordinário de 2025, aprovado pela deliberação n.º 1096/2025 do CSM, publicada no D.R., Séria II, de 29-08-2025).
Ora, não ocorrendo a situação a que se reporta o artigo 605.º do CPC, com a movimentação referida cessa a intervenção no processo em questão do Sr. Juiz visado pela suspeição, pelo que se verifica que o objetivo pretendido alcançar pela requerente – o afastamento do Sr. Juiz da titularidade do processo que estava a seu cargo - foi já alcançado por via da efetivação da produção de efeitos do movimento judicial, mostrando-se patenteada situação de inutilidade superveniente da presente lide, pelo que, cumpre declarar a extinção da lide do presente incidente em conformidade, ao que não obsta a decisão já proferida, atenta a circunstância de a mesma ainda não ter transitado em julgado (cfr. artigo 628.º do CPC) – cfr., neste sentido, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29-05-2024, Pº 1627/19.2T8VRL-C.G1.S1, rel. LUIS ESPÍRITO SANTO).
Considerando a não imputabilidade ao requerente ou ao visado, na ocorrência da causa que determinou a verificação da inutilidade, inexiste responsabilidade tributária a fixar – cfr. artigo 536.º do CPC.
*
III. De acordo com o exposto, julgo extinta a instância nos presentes autos de incidente de suspeição, por inutilidade superveniente da lide.
Sem custas.
Notifique.

Lisboa, 01-09-2025,
Carlos Castelo Branco.