Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
PROPRIEDADE INDUSTRIAL
PROCEDIMENTO CAUTELAR
NULIDADE DA PATENTE
Sumário
SUMÁRIO (da responsabilidade do Relator) I. Em sede de procedimento cautelar e relativamente à patente europeia n.º ...61 (EP ...61), deve ser julgada procedente a exceção de nulidade da patente, baseada em falta de novidade e falta de atividade inventiva, tendo fundamentalmente em conta a divulgação ao público, antes da data da prioridade, do estudo denominado .... II. O recurso é, assim, julgado improcedente e é mantida a sentença recorrida.
Texto Integral
Acordam na Secção da Propriedade Intelectual e da Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa
I. RELATÓRIO
Recorrentes/Requerentes:
i. EMP01... INTELLECTUAL PROPERTY GMBH, sociedade comercial devidamente organizada e em exercício ao abrigo da lei alemã, com sede em ..., ..., a seguir designada por Primeira Requerente,
ii. EMP01... AG, sociedade comercial devidamente organizada e em exercício ao abrigo da lei alemã, NIPC ...59, com sede em ..., ..., a seguir designada por Segunda Requerente,
iii. EMP01... PORTUGAL LDA, sociedade comercial devidamente organizada e em exercício o abrigo da lei portuguesa, NIPC ...56, com sede na Avenida ..., ..., adiante designada por Terceira Requerente,
Recorrida/Requerida: EMP02... LIMITED, sociedade comercial irlandesa, com sede em ... ..., adiante designada por Primeira Requerida
1. As Requerentes intentaram, em 27-03-2024, contra a Requerida, procedimento cautelar, ao abrigo do artigo 345.º do Código de Propriedade Industrial, no qual formularam os seguintes pedidos:
“a) A abstenção da Requerida de importar, armazenar, fabricar, manipular, embalar, disponibilizar no circuito de distribuição, vender ou colocar à venda, direta ou indiretamente, quer em Portugal, quer para exportação, os medicamentos "... EMP02... - Comprimidos revestidos por película – “10mg, 15mg, 20mg e (15mg + 20mg)”, até 19 de Janeiro de 2026;
b) A abstenção da Requerida de importar, armazenar, fabricar, manipular, embalar, disponibilizar no circuito de distribuição, vender ou colocar à venda, direta ou indiretamente, quer em Portugal, quer para exportação, qualquer medicamento que constitua infração ao CERTIFICADO COMPLEMENTAR DE PROTECÇÃO N.º ...46, até 2 de Abril de 2024 e à PATENTE EUROPEIA EP ...61, até 19 de Janeiro de 2026;
c) A abstenção da Requerida de vender ou ceder, por qualquer forma, a terceiros, as autorizações de introdução no mercado (AIM) dos medicamentos "... EMP02... - Comprimidos revestidos por película – “10mg, 15mg, 20mg e (15mg + 20mg)” (EMEA/H/C5600), concedidas por procedimento descentralizado em 12 de Novembro de 2021 ou quaisquer outras que venham a ser aprovadas, relativas a medicamentos que contenham a substância ativa ..., nas referidas dosagens, até 19 de janeiro de 2026;
d) Que a Requerida informe o Tribunal das quantidades importadas, fabricadas, embaladas, armazenadas, em distribuição, recebidas, encomendadas e comercializadas do medicamento "... EMP02... – Comprimidos revestidos por película - 10mg, 15mg, 20mg e (15mg + 20mg)”, até 19 de janeiro de 2026, bem como sobre o preço obtido com essas actividades, caso estas já tenham ocorrido;
e) A apreensão de todos os medicamentos na posse das Requerida e de terceiros (no caso de o produto já estar distribuído ou em stock que violem os direitos dos Requerentes;
f) O pagamento de uma sanção pecuniária compulsória de € 25.000,00 (vinte e cinco
mil euros) por cada dia, após a decisão final do presente procedimento cautelar, em que a Requerida não cumpra qualquer das medidas impostas;
g) A apresentação ao Tribunal de todos os documentos contabilísticos e comerciais (facturas, notas de encomenda, formulários, guias de remessa, documentos aduaneiros, etc.) relativos ao fabrico, compra, importação, armazenamento, comercialização e/ou utilização dos medicamentos "... EMP02... - Comprimidos revestidos por película - 10mg, 15mg, 20mg e (15mg + 20mg)”, até 19 de Janeiro de 2026, ao abrigo do artigo 339.º do C.P.I., caso essas actividades já se tenham realizado.”
2. Para tanto, as Requerentes alegaram, em síntese, que:
a) São titulares do Certificado de Proteção Complementar n.º ...46, doravante designado “CCP ...46”, concedido com base na patente europeia n.º ...06, ambos com a epígrafe " OXAZOLIDINONAS SUBSTITUÍDAS E A SUA UTILIZAÇÃO NA ÁREA DA COAGULAÇÃO SANGUÍNEA", relativo ao "...", que expirou no passado dia 2 de Abril de 2024, bem como da patente europeia n.º ...61, doravante designada “EP ...61”, com a epígrafe "Tratamento de Distúrbios Tromboembolicos com ...".
b) Na sequência da aprovação em 12.11.2021, ao abrigo do Procedimento Centralizado (EMEA), a Requerida obteve Autorizações de Introdução no Mercado (AIMs) para os seus medicamentos, "... EMP02... - Comprimido revestido por película - 10mg, 15mg, 20mg e (15mg) + (20mg)" contendo ..., como substância ativa, para serem comercializados em Portugal.
c) A Requerida tem vindo a envidar todos os esforços para lançar os referidos medicamentos no mercado português, antes do termo dos direitos da Primeira Requerente, sendo certo que os medicamentos ... EMP02... infringem os mencionados direitos, pelo que, com o presente procedimento cautelar, as Requerentes pretendem evitar “graves prejuízos” e a “ocorrência de danos irreparáveis”.
3. Regularmente citada (25.04.2024), a Requerida veio deduzir Oposição em 05.06.2024 alegando, em síntese, o seguinte:
a) O CCP ...46 invocado pelas Requerentes caducou, por limite de vigência, 02.04.2024 e a EMP02... não promoveu, ofereceu para venda ou vendeu os seus medicamentos ... EMP02..., comprimidos revestivos por película, antes da referida data.
b) A patente EP ...61 é manifestamente nula, por não cumprir os requisitos de patenteabilidade previstos na Convenção da Patente Europeia (CPE), pelo menos porquanto o seu objeto padece de novidade e de atividade inventiva face à informação disponível na data de prioridade sobre os ensaios clínicos de fase I e de fase II do ....
c) Além disso, e sem prejuízo, a comercialização dos medicamentos de ... da EMP02... não constituirá uma violação da patente EP ...61, uma vez que esta tem um âmbito de proteção limitado, abrangendo apenas um regime terapêutico específico do ..., e não o composto ... enquanto tal, e os medicamentos de ... da EMP02... não são abrangidos pelo âmbito de proteção dessa patente.
d) Mais concretamente, a EP ...61 protege o uso de um comprimido de libertação rápida do composto ... para o tratamento de um distúrbio tromboembólico, que é administrado uma vez ao dia, em que o composto tem uma concentração de semivida no plasma de 10 horas ou menos quando administrado por via oral a um paciente humano e os medicamentos de ... da EMP02... não têm uma concentração de semivida no plasma igual ou inferior a 10 horas quando são administrados oralmente aos pacientes.
4. Por requerimento de 04-07-2024, as Requerentes pronunciaram-se sobre as exceções invocadas pela Requerida na sua Oposição e desistiram de parte do pedido, designadamente do respeitante ao CCP ...46. Pediram a improcedência de todas as exceções alegadas pelas requeridas, impugnaram documentos juntos pelas mesmas e terminam pedindo que seja julgado totalmente procedente o procedimento cautelar, condenando-se as requeridas nos exatos termos peticionados.
5. Realizou-se audiência de julgamento, comportando várias sessões, em concreto:
i. 08-11-2024 (com início pelas 09:30 e terminus às 17:16),
ii. 09-12-2024 (com início pelas 09:30 e terminus às 17:10),
iii. 16-12-2024 (com início pelas 09:30 e terminus às 16:33),
iv. 10-01-2024 (com início pelas 09:30 e terminus às 15:52),
v. 17-01-2024 (com início pelas 09:30 e terminus às 16:45)
vi. 29-01-2024 (alegações orais, com início pelas 09:30 e terminus às 11:50).
6. Após julgamento, o tribunal a quo proferiu decisão final em 26-03-2025 (doravante sentença recorrida), julgando o procedimento cautelar totalmente improcedente e indeferindo todas as providências cautelares requeridas.
7. De tal sentença vieram interpor o presente recurso de apelação, contra a Requerida, inclusive, com pedido de reapreciação da prova gravada.
8. As Requerentes, em sede de recurso, pedem que a sentença recorrida seja “totalmente revogada” e “substituída por outra que defira todas as providências cautelares requeridas, com as legais consequências.”, para tanto apresentando as seguintes
conclusões do recurso (reprodução integral)
A. ENQUADRAMENTO: A presente providência cautelar tem por referência a EP ...61 (com data de limite de vigência de 19 de janeiro de 2026), tendo sido espoletada pelo início da comercialização da Recorrida dos seus medicamentos genéricos contendo ... durante a vigência daquele direito.
B. A Recorrida, na sua Oposição, invocou a invalidade da EP ...61 por falta de novidade e atividade inventiva, juntando, para o efeito, documentos do estado da técnica que, na sua maioria, se reportam a estudos clínicos de fase I (isto é, estudos clínicos em voluntários saudáveis).
C. A grande maioria dos documentos juntos pelas Recorridas foram analisados pela Câmara Técnica de Recursos do EPO, que, tendo de decidir as 15 (quinze) oposições apresentadas à EP ...61, concluiu pela validade desta, considerando que a eficácia e segurança clínica apenas pode ser aferida em ensaios de fase II (isto é, estudos clí- nicos em doentes) e não em ensaios de fase I.
D. No mesmo sentido (de validade da EP ...61) decidiu o nosso Tribunal da Propriedade Intelectual (Juiz ...), em sede da ação principal n.º 125/21...., no passado dia 24 de setembro de 2024, em 1.ª Instância (cfr. Doc. n.º 1 junto ao requerimento de 16 de outubro de 2024), bem como inúmeros tribunais europeus, cuja decisões abaixo abordaremos.
E. O cerne do ensinamento técnico da patente EP ...61 é a invenção de administrar uma forma de dosagem oral com um perfil de libertação rápida do ingrediente farma- cêutico ativo ... apenas uma vez por dia e, ainda assim, conseguir um tratamento eficaz e seguro das doenças tromboembólicas – cfr. depoimento da tes- temunha AA, min. [00:09:26]-[00:10:50] e [00:31:37] (pp. 10/50 e 22/55, respetivamente).
F. Impugnação da matéria de facto: As Recorrentes entendem que grande parte dos factos constantes dos Pontos 1.1 a 1.151 do capítulo referente à fundamentação de facto da decisão não encontram suporte na prova apresentada, devendo ter sido objeto de distinta apreciação, o mesmo se dizendo a propósito dos factos não provados constantes dos Pontos 2.14 e 2.16 a 2.31.
G. Impugnação Facto 1.63: As Recorrentes não encontram qualquer base para sustentar este facto, tendo resultado de todo o julgamento a complexidade subjacente a encontrar um regime de dosagem para um medicamento contendo .... Aliás, resultou do julgamento que os anticoagulantes de ação direta sobre o factor Xa apresentam um equilíbrio muito difícil entre sobredosagem (levando a hemorragias) e subdosagem (levando a coágulos), não sendo possível transferir resultados dos anticoagulantes convencionais para estes, atento o seu novo mecanismo de ação – cfr. depoimento Prof. BB [00:27:14]-[00:29:30] e [00:44:52]-[00:48:21] (pp. 39 e 43 de 124), devendo dar-se como provado que: Os ensaios clínicos com anticoagulantes traziam na data de prioridade especiais desafios, na medida em que a terapêutica com anticoagulantes é um acto de equilíbrio difícil que pode ser muito perigoso para os doentes, especialmente se - como era o caso do ... à data de prioridade da pa- tente EP ...61 em 2005 - se tratar de uma substância ativa completamente nova e clinicamente não desenvolvida.
H. IMPUGNAÇÃO FACTO 1.67: O Tribunal identifica neste facto 6 documentos como os docu- mentos da 45.ª Reunião Anual da American Society of Hematology, aí incluindo o “Poster de CC et al., intitulado "Effects of ...39, an Oral, Direct FXa Inhibitor, on Thrombin Generation in Healthy Volunteers". Ora, a Recorrida não provou, como era seu ónus, que o poster em questão corresponde à versão final e que foi efetiva- mente exposta na conferência em questão. O documento não está datado e nenhuma das testemunhas da Recorrida esteve presente no Congresso para atestar que o poster foi exposto com aquele conteúdo – cfr. depoimento da Dra. AA, min. [00:44:02], pág. 88 e ss. de 111). Deve dar-se por não provado que: O Poster de CC et al. foi apresentado na 45.ª Reunião Anual da “American Society of Hematology” em S. Diego, 2003.
I. Impugnação Facto 1.70: O poster de CC não se refere a um estudo clínico com vista a determinar a eficácia do ..., o que é impossível em fase I, como esclarece a testemunha da Recorrida, Prof. DD, minuto [02:10:07], p. 136/142. Além do mais, os estudos de CC são de cariz académico – cfr. Prof. BB, minuto [01:33:26] (p. 63/124). e Prof. EE, minuto [00:15:48] (p. 10/142). Como tal, a redação deste facto deverá contar com as eliminações a laranja e os acrescentos a azul: O Poster CC refere-se a um estudo clínico de fase I e de cariz acadé- mico patrocinado pela EMP01... para determinar a eficáciao comportamento do ... administrado oralmente na inibição da geração de trom- bina em sujeitos saudáveis do sexo masculino, através de testes experimentais.
J. Impugnação Facto 1.73: O Tribunal conclui que “PICT” é o tempo de coagulação indu- zida por plaquetas, contudo, decorreu claro do depoimento das testemunhas Professora BB e Prof. EE que CC se enganou na designação do teste PICT, pretendendo, na realidade designar “tempo de coagulação induzido por pro- trombinase” e não por “plaquetas”. Cfr. minutos [00:29:12]-[00:38:44] (p. 78/124) e mi- nutos [00:41:47]-[00:42:36] (p. 16/28), respetivamente. Tal é comprovado pela decla- ração de próprio CC junta pela Recorrida no seu requerimento de 30 de janeiro de 2025. Destarte, este facto deveria ser considerado não provado, ou, no mínimo,sujeito à redação seguinte com as eliminações a laranja e os acrescentos a azul: As avaliações sobre a eficáciainibição de geração de trombina do ... tal como analisadas no estudos de CC basearam-se em três testes: PITT (tempo de geração de trombina induzida por plaquetas), ETP (potencial endógeno de trombina) e PICT (tempo de coagulação induzida por plaquetasprotrombinase), que vem erroneamente descrito no Poster de CC.
K. IMPUGNAÇÃO FACTO 1.99: Não existe qualquer elemento probatório que justifique este facto. A testemunha da Recorrida, Prof. FF, em momento algum confirmou ter disponibilizado o Doc. n.º 12 da Oposição ao público. Aliás, o próprio documento é uma versão de trabalho, com marcas de alterações (track changes) na secção “insurance”, pelo que não é a versão final distribuída, não estando assinada ou preenchida. O documento não se destinava a ser divulgado ao público, nem tornado acessível; pelo contrário, era direcionado ao doente com eventual consulta do seu mé- dico (que está sujeito a confidencialidade): “Leia esta carta com atenção e não hesite em pedir mais explicações ao seu médico se algo não estiver claro para si”. O Prof. FF indicou que incluiu os primeiros pacientes no ensaio em Fevereiro de 2005 ([00:10:37]. Pág. 11/35), i. é, após a data de prioridade – 31 de Janeiro de 2005. Como tal, o facto 1.99 deverá ser dado como não provado.
L. Impugnação Facto 1.148: Este facto afigura-se irrelevante na medida em que o que é de valorar é o conteúdo da documentação – que é o que o perito analisará – e não a autoridade dos autores do documento.
M. IMPUGNAÇÃO FACTOS 1.117 E 1.118: O Tribunal a quo interpretou mal a semivida plasmática do ..., que é uma característica intrínseca do composto e não uma limi- tação adicional. A patente define-a como 4–6 horas em estado estacionário (par. [0017]) e essa é a semivida relevante para o intervalo de dosagem — não a semivida terminal, mais longa, usada indevidamente pelo Tribunal com base nos Docs. 16–18. O Prof. GG confirma que a semivida eficaz é inferior a 10h (em média 6,6h), no seu parecer junto como Doc. n.º 4 à Resposta à Oposição, em particular paras. 13-17, 23, 39-43, 47, 58 e 99 - 104. Mesmo os dados invocados pelo Tribunal estão maioritariamente dentro ou próximos desse intervalo. Além disso, documentos pós-publicados (como a Brochura do Investigador) não fazem parte do estado da técnica e não podem ser usados para avaliar atividade inventiva, como reafirmado pelo TBA na decisão sobre a EP ...61 – Doc. n.º 16 junto com o Requerimento Inicial. A análise deve basear-se apenas no conhecimento disponível à data de prioridade, sem interpretações retrospetivas. Como tal, os factos 1.117 e 1.118 deverão ser dados como não provados.
N. IMPUGNAÇÃO FACTOS 1.107, 1.119 E 1.120: O Tribunal baseia-se num estudo cujos resultados são pós-publicados, constantes de um artigo de 15 de setembro de 2008 (Doc. n.º 9 da Oposição) como confessa a Requerida no artigo 72.º da sua Oposição, pelo que não faz parte do estado da técnica. Em qualquer caso, os documentos não revelam nem sugerem o ensinamento técnico da patente de forma prejudicial à novidade – Declaração ajuramentada de Dr. HH, Doc. n.º 1 com o Requeri- mento de Resposta à Oposição.
O. O Documento 12 não divulga nenhuma das três características técnicas da invenção: (1) o ... como ingrediente ativo; (2) a formulação em comprimido de li- bertação rápida; e (3) a sua segurança e eficácia numa administração única diária:
· ... (característica 1)
O ingrediente ativo apenas surge sob o código interno “...39”, não ha- vendo prova de que este código fosse publicamente conhecido como ... à data de prioridade. Mesmo que fosse, seria necessário recorrer a ou- tro documento do estado da técnica, o que afasta a falta de novidade.
· Libertação rápida (característica 2):
A expressão “works quickly” no Documento 12 não equivale tecnicamente a “li- bertação rápida”, mas sim a um início rápido de ação. Isto é confirmado pelas declarações do Prof. GG (págs. 43 e ss./142; [01:49:01] a [01:52:00]), que distingue claramente entre início de ação e mecanismo de libertação do comprimido. Também a declaração do Dr. HH (Doc. 1, paras. 36, 37 e 39) reforça que a expressão é insuficiente para concluir tratar-se de libertação rápida.
· Segurança e eficácia (característica 3)
Não é divulgada qualquer informação fiável sobre a segurança ou eficácia do regime de toma única diária.
O próprio Documento 12 fala de “possíveis benefícios” e refere-se a um “novo medicamento” sem efeitos conhecidos.
A fase II do estudo ... estava em curso à data de prioridade, sem re- sultados disponíveis para médicos ou pacientes, tendo apenas 10 doentes ins- critos à data de prioridade. Isto é confirmado pela declaração do Dr. HH (Doc. 1, paras. 29, 41) e pelo Prof. GG (pág. 45/142; [01:52:12] a [01:52:44]).
Como tal, deveriam estes factos ser dados como não provados.
P. IMPUGNAÇÃO FACTOS 1.121, 1.126 E 1.127: O Tribunal a quo diz ter-se baseado no depoimento de três testemunhas (Drs. II, JJ e KK), con- cluindo que 99% das prescrições são para pessoas idosas e que o ... tem uma semivida superior a 10h nesses pacientes. Contudo, os Drs. II e KK são farmacologistas, sem prática de prescrição médica e o único prescritor, Prof. JJ, falou apenas da prevalência em fibrilação auricular, referindo que 70% dos casos ocorrem em maiores de 65 anos, e estimou que 95% das prescrições são para essa indicação específica (pág. 10/86, [00:07:18]-[00:08:46]). A indicação do ... é para todos os doentes, como confirmou a Dra. LL (p. 18/42 [00:30:02]-[00:31:25]).
Q. Quanto à alegada semivida plasmática superior a 10 horas em pessoas idosas, o Tri- bunal a quo não indica qualquer base técnica ou factual que a fundamente. Como foi claramente explicado pela Dra. AA no seu depoimento (pág. 17/51, [00:23:34]-[00:28:30]), a característica “semivida de 10 horas ou menos” é intrínseca ao .... Esta limitação funcional fazia sentido quando se pretendia proteger uma classe de compostos, mas tornou-se redundante com a limitação da reivindi- cação ao .... A referência à semivida não acrescenta qualquer restrição técnica ao objeto reivindicado. Como tal, devem estes factos ser dados como não provados.
R. Impugnação Facto 1.149: Este facto – que não foi alegado –, bem como a sua funda- mentação, não se compreendem. Não se encontra em causa qual a forma farmacêutica mais comum, nem qual a forma de libertação de qualquer uma dessas for- mas farmacêuticas mais utilizadas nos ensaios de fase I. A escolha da forma farmacêutica (e.g., comprimido, cápsula, saqueta) é independente da forma de libertação (e.g., libertação rápida, libertação modificada – como a sustentada ou retardada).
S. A EP ...61 trata-se de uma patente que protege a administração uma vez por dia de uma forma de dosagem oral de libertação rápida de ... para o trata- mento de doenças tromboembólicas. Nenhum dos documentos de última geração contém qualquer indicação, e muito menos justifica uma expetativa razoável de sucesso, de que o ..., com a sua curta semi-vida de apenas 4-6 h, possa ser eficaz e seguro num regime de dose única diária, e muito menos quando administrado como um comprimido de libertação rápida.
T. Aliás, analisando a documentação invocada, o perito chegaria a uma conclusão oposta, conforme o depoimento do Prof. GG (pág. 26 e 36 de 142), minutos [01:01:54]-[01:04:00] e [01:28:31]-[01:29:20]:
Prof. GG [tradução]: Então, nesse caso, é muito mais interessante ter um comprimido de libertação prolongada. O objetivo de uma formulação com a libertação sustentada é conseguir evitar tomas frequentes. Por exemplo, passar de 3 tomas por dia, duas to- mas por dia, para uma toma por dia ou até uma toma por semana, conforme se puder adaptar. Com uma formulação de libertação rápida toma-se a cápsula, o comprimido, o que seja. Dissolve-se quase imediatamente. E depois é então absorvido e vai para a circulação sistémica. O que geralmente demora uma, duas, três horas, depois da toma. Enquanto que com uma formulação de libertação sustentada conseguimos controlar essa absorção para que demore 8 horas, 10, 12 horas. Isto quer dizer que concentração ao longo do tempo com uma formulação de libertação sustentada será muito diferente de uma formulação de libertação rápida. Não podemos é esquecer que se tivermos uma formulação de libertação rápida de 30 mg com duas tomas por dia, para uma formulação de libertação sustentada, vamos precisar de 60 mg numa toma única.
(…)
Mandatária: Então, o senhor professor acha que podia basear-se nas informações di- vulgadas em CC, em particular o que já falámos anteriormente, para tomar uma decisão sobre um regime de dosagem de uma vez por dia para o primeiro teste em doentes de um novo tipo de anticoagulante?
Prof. GG [tradução]: Eu não o faria. Não vejo como é que seria possível. Temos uma dose única, tudo avaliado com parâmetros experimentais não validados, com um efeito máximo de 12 horas. Isto não me levaria a um regime de dosagem de apenas uma toma por dia, não vejo como é que é possível.
U. O sucesso clínico e a segurança da associação de um regime de dose única diária com a forma farmacêutica reivindicada, ou seja, o ... sob a forma de comprimidos de libertação rápida, não seriam de esperar e são particularmente não óbvios, devendo este facto ser considerado como não provado.
V. Reapreciação do Facto não provado 2.14: Não competia às Recorrentes provar o facto negativo em causa — a ausência de indicação ou justificação, nos documentos do estado da técnica, de que o ... pudesse ser eficaz e seguro numa toma única diária, em forma de libertação rápida. O ónus cabia às Recorridas de provar esse facto pela positiva, mas tal facto não foi dado como provado. A prova testemunhal demonstra que a solução técnica era, à data, surpreendente e não evidente. O Prof. GG afirmou que a escolha de uma dose única diária com libertação rá- pida foi “absolutamente surpreendente”, dado o perfil farmacocinético do ... ([01:33:20]–[01:34:00], p. 26/142). Já antes, rejeitara que os dados de CC pu- dessem fundamentar tal decisão ([01:28:31]–[01:30:26], p. 36/142). A Prof. BB corroborou: “só podíamos especular” sobre a eficácia e segurança de tal regime à data da invenção ([01:11:44]–[01:13:22], p. 90/124).
W. As três características distintivas (eficácia e segurança médicas, forma de dosagem de libertação rápida e regime de administração uma vez por dia) atuam em con- junto e de forma inseparável na obtenção dos efeitos técnicos, resolvendo sinergi- camente o problema técnico colocado pelo estado da técnica. Destarte, deve o factonão provado 2.14 ser dado como provado.
X. Reapreciação dos Factos não provados 2.16 e 2.17: O resumo MD (multiple dose) de MM (3004) relata um ensaio clínico de Fase I que avaliou a farmacodinâmica, se- gurança e farmacocinética de doses múltiplas de ... (...39) em 64 indivíduos saudáveis. O estudo foi realizado com doses de 5 mg a 30 mg duas vezes por dia, administradas com alimentos. Os principais resultados incluem (i.) a semi-vida terminal de 4 a 6 horas, (ii.) Cmax atingida após 2,5 a 4 horas e (iii.) efeitos farmacodinâmicos observados até 12 horas após a administração. O estudo conclui que ... foi seguro e bem tolerado até 30 mg duas vezes por dia.
Y. O perfil farmacodinâmico do ... foi considerado consistente com a sua semi-vida terminal curta de 4 a 6 horas, ou seja, a semi-vida terminal curta resulta em efeitos farmacodinâmico também de curta duração, observados por testes de coagulação padrão, o que implica a necessidade de doses diárias, pelo menos duas vezes ao dia - Prof. BB (pág. 51/124; [01:03:46]-[01:05:42]) e o Prof. GG (pág. 19/142; [00:44:55]-[00:45:50]).
Z. Em qualquer caso, a segurança descrita neste resumo refere-se a efeitos adversos gerais e não à segurança específica dos anticoagulantes em doentes, particular- mente em relação ao risco de hemorragias. A Prof. BB esclarece no seu pa- recer (Doc. 3 do requerimento resposta à Oposição) que os ensaios de Fase I com anticoagulantes “não são preditivos do risco de hemorragia em doentes” e “não podem dar qualquer indicação de eficácia clínica” (p. 51/124). No mesmo sentido, afirmou em audiência que “os voluntários saudáveis não têm risco de trombose nem de hemorragia” e que “não há qualquer expectativa quanto à janela terapêutica antes dos ensaios de Fase II” (p. 45/124 e 75/124; [00:48:21]-[00:49:23] e [00:21:00]- [00:23:00]).
AA. As próprias testemunhas da Recorrida confirmam este entendimento. O Prof. JJ admitiu que os ensaios de Fase I “não são eficácia clínica” (p. 19/86; [00:17:50]), e o Prof. KK sublinhou que a eficácia terapêutica “só pode ser avaliada com doentes, em Fase III” (p. 4/52; [00:03:04]-[00:03:59]). Também o Prof. GG afirmou que não é possível extrapolar dados de voluntários saudáveis para doentes, porque estes não apresentam os riscos clínicos relevantes (p. 22/142 e 30/142; [00:52:12]-[00:54:00] e [01:10:45]-[01:12:00]).
BB. A própria TBA reconheceu que MM (designado D2/D11) não foi concebido para avaliar eficácia ou segurança de regimes de dosagem em doentes (TBA, ponto 5.9.2, Doc. 16 do Requerimento Inicial). A ausência de hemorragias em Fase I é esperada, dada a seleção de indivíduos saudáveis. Como tal, os factos não provados 2.16 e 2.17 devem ser dados como provados.
CC. Reapreciação dos Factos não provados 2.18 e 2.19: A TBA concluiu que os testes laboratoriais descritos em CC não eram preditivos da eficácia clínica e segurança do ... (§§ 9.24.2-9.24.3, Doc. 16 do Requerimento Inicial). A Prof. BB (Doc. 6) e o Prof. GG (p. 22/142, [00:52:12]-[00:53:30]; p. 30/142, [01:11:15]-[01:12:30]) explicam que testes em plasma de voluntários saudáveis não têm valor para prever efeitos terapêuticos em doentes com risco de trombose. Os testes de geração de trombina usados em CC são experimentais, sem validação ou calibração, conforme o Prof. EE, que inventou um desses testes, o teste ETP (p. 15/124, [00:38:44]-[00:40:00]). Nem CC, nem os 15 oponentes perante a TBA apresentaram qualquer base que indicasse utilidade clínica destes dados.
DD. A duração do efeito no sangue de voluntários saudáveis não é, por conseguinte, re- levante para o tempo que o efeito correspondente teria durado no estado de base hipercoagulável no sangue de doentes que necessitam de tratamento com um an- ticoagulante (veja-se, nesse sentido, os Pareceres da Prof. BB II (cfr. “Doc. n.º 6”, junto com o Requerimento das Recorrentes em resposta à Oposição, paras. 24-28); do Prof. EE (cfr. “Doc. n.º 8”, junto com o Requerimento das Recorrentes em res- posta à Oposição), paras. 47, do Prof. NN (cfr. “Doc. n.º 7”, junto com o junto com o o Requerimento das Recorrentes em resposta à Oposição, pars. 43-44), bem como o Parecer da Prof. BB III (cfr. “Doc. n.º 9”, junto com o Requerimento das Re- correntes em resposta à Oposição), paras. 50-51; e paras. 8-10).
EE. Com efeito, os factos não provados 2.18 a 2.19 devem, com base em todo o exposto,ser aditados à lista de factos provados. Devendo, igualmente, constar da listagem de factos provados que O estudo de CC tratou-se de um estudo académico, que usou testes experimentais, não preditivos do efeito terapêutico do ... em doentes.
FF. Reapreciação dos Factos não provados 2.20 a 2.22: A invenção partiu da tarefa de desenvolver um medicamento eficaz e seguro com ... para doentes com risco tromboembólico — ou seja, de planear a transição da fase I para a fase II. O ponto de partida científico foram os dados fiáveis da fase I, nomeadamente o estudo de dose múltipla de MM, obrigatórios para iniciar estudos clínicos com doentes. CC, pelo contrário, era um estudo académico e exploratório, sem relevância clínica. Como explicam a Prof. BB, o Prof. GG e o Prof. EE, tratava-se de investigação básica, com testes experimentais, não validados nem reprodutíveis.
GG. O Prof. EE, inventor do teste ETP, foi categórico: o resumo de CC está “repleto de erros” e é “absolutamente insuficiente” para compreender ou reproduzir o que foi feito (p. 12 e 17/124; [00:25:46]-[00:42:00] e [00:47:26]-[00:47:59]). Indica, por exemplo, a confusão grave entre substratos fluorogénicos e cromogénicos — diferença técnica essencial — e erros na descrição do PICT. Comparou a ambiguidade do estudo com “dizer que a distância entre A e B é 12, sem indicar a unidade” (minuto [00:41:35]). Como tal, os estudos como CC não podem fundamentar decisões sobre dosagem clínica. Só podem, no máximo, ser revistos ex post com base nos dados robustos das fases II/III. Com efeito, devem ser aditados à matéria provada os factos 2.20 a 2.22.
HH. Reapreciação dos Factos não provados 2.23 a 2.27: O resumo de CC é uma divulgação curta, reportando de forma sintética os resultados dos testes conduzidos em 8 indivíduos saudáveis. No que respeita à leitura feita pelo Tribunal dos valores às 2h (com 5mg) e 12h (com 30mg), importa sublinhar que o documento apenas apre- senta dados recolhidos nesses dois momentos. A extrapolação de um suposto “efeito sustentado até 24 horas” carece de suporte nos dados concretos apresentados, sendo, nessa medida, meramente especulativa.
II. Com efeito, analisando a tabela infra, constata-se que a maioria dos parâmetros avaliados às 12 horas já não revela qualquer efeito estatisticamente significativo face ao valor basal:
JJ. A elevada variabilidade dos dados — em que os desvios-padrão (entre parênteses), muitas vezes, excedem a média — reforça a fragilidade dos resultados, tornando in- sustentável qualquer alegação de efeito persistente às 24 horas.
KK. Longe de apoiar a invenção, os dados de CC tenderiam antes a afastar dela o perito, uma vez que apontam para uma perda do efeito do ... às 12 horas. O perito concluiria, por isso, que seria necessário um regime de dosagem mais frequente (bid ou tid) para manter o efeito pretendido.
LL. Adicionalmente, os métodos utilizados para medir os parâmetros reportados não são descritos no documento, apenas mencionados. Como é prática estabelecida no EPO, uma divulgação técnica só pode integrar o estado da técnica se contiver informação suficiente para permitir ao perito executar a invenção, com base nos conhecimentos técnicos gerais da época. Sobre este ponto, o Professor EE (p. 12/124; [00:25:14]-[00:28:00] e pareceres juntos como documentos 8 e 10 da Resposta à Oposição) foi claro ao referir que o ensaio ETP não era conhecimento geral comum em 2005, estando restrito a alguns laboratórios e sem padronização entre eles. As testemunhas Prof.ª BB (p. 68/124 e 83/124; [00:03:27]-[00:07:53] e [00:51:29]- [00:55:13]) e Prof. GG (p 19/124; [00:53:56]-[00:56:07]) foram igualmente explícitas quanto a essa limitação.
MM. Os gráficos do poster #3010 mostram que, contrariamente ao sugerido no resumo, não há qualquer efeito estatisticamente significativo do ... às 24 horas comparado com o placebo. Na maioria dos testes, o efeito desaparece antes das 12 horas.
NN. Como bem resumiu a Prof.ª BB, a alegação de efeito sustentado até 24h é mera especulação otimista, com base em dados inconsistentes e sem qualquer poder demonstrativo. A conclusão do poster não se encontra sequer refletida no resumo e não sustenta qualquer decisão terapêutica.
OO. Além do mais, o enorme sucesso comercial e a aceitação a aceitação por parte de doentes e médicos devido à conveniência da administração de uma dose única diária e ao aumento esperado da adesão dos doentes contam como indícios secundários da existência de atividade inventiva (Eng.ª AA, p. 22/44; [00:55:40]-[00:57:30]). Em suma, os factos 2.23 a 2.27 devem ser dados como provados.
PP. Reapreciação dos Factos nãos provados 2.28 a 2.31: O ensaio de dose única fase I de ... (MM, publicado antes da data de prioridade) indicava uma semivida terminal de 4–6 horas, sugerindo claramente a necessidade de um regime BID (2x ao dia), senão TID (3x ao dia). Como explicou a Prof.ª BB, uma semivida tão curta implica que “o doente pode não estar protegido no final do dia” com uma única administração diária ([01:03:00]-[01:04:22], pág. 49/124). O Prof. GG corroborou: a administração uma vez por dia era “surpreendente”, sendo “normal” começar com doseamento duas vezes ao dia ([01:33:27]-[01:34:00], pág. 38/142).
QQ. A seleção da frequência de dose em ensaios de fase II para anticoagulantes seria guiada pela semivida conhecida do fármaco, com o objetivo de evitar flutuações plasmáticas. Nesse contexto, o parecer da Prof.ª BB é taxativo: com base no conhecimento técnico da altura, “não havia qualquer razão para desenvolver um regime de dosagem de uma vez por dia” (Doc. n.º 1 da Resposta à Oposição, §§143– 144). O primeiro ensaio de fase II com ... foi, de facto, planeado com regime BID, como confirma a Prof. BB, que fez parte da Comissão de Ética constituída para o desenvolvimento do ....
RR. A decisão de testar uma dose única diária foi descrita como excecional e arriscada, surgindo apenas numa fase já avançada do estudo e por proposta específica do Dr. OO (Doc. n.º 1 da Resposta à Oposição, §146). Tal opção foi vista como contrária à prática clínica habitual, sobretudo num contexto em que a segurança e eficácia não podiam ser comprometidas.
SS. O Prof. GG sublinha que, especialmente em medicamentos vitais, é preferível um regime duas vezes ao dia do que uma vez ao dia, para mitigar os riscos associados a esquecimentos (Parecer Doc. n.º 2 da Resposta à Oposição, §§61–63). Não havia, pois, qualquer automatismo em optar por uma dose única diária em 2005, especial- mente com uma forma de libertação rápida.
TT. Como ilustrado pelo Dr. OO através da imagem de uma “árvore de decisão” (Doc. n.º 5 da Resposta à Oposição, §§50–68), o caminho seguido implicou decisões não lineares e múltiplas opções técnicas, longe de uma “via de sentido único”. Nem sequer existia um modelo pré-definido para estudos de fase II com o ... (Doc. n.º 1 da Resposta à Oposição, §38; Doc. n.º 2 da Resposta à Oposição, §51).
UU. Assim, a ideia de uma posologia uma vez ao dia (OD) com forma de libertação rá- pida não era óbvia para o perito, nem emergiria de forma necessária ou automática no decurso de um ensaio de fase II. Como afirmaram as testemunhas, tal abordagem teria sido considerada “eticamente injustificável” e “irresponsável” com base apenas no estado da técnica na data de prioridade (BB I, §92; PP, §7; OO, §13), que não inclui as informações que o inventor possuía. Como tal, os factos 2.28 a 2.31 devem ser dados como provados.
VV. DO DIREITO – ÓNUS DA PROVA: A EP ...61 beneficia de uma presunção de validade nos termos do artigo 4.º do CPI, tendo sido concedida após um rigoroso exercício de exame e oposição, pelo que o ónus da demonstração da sua invalidade recai inteiramente sobre a Recorrida, tendo a mesma que demonstrar que a patente é ostensivamentenula, conforme fixou o Acórdão de 7 de julho de 2020 (ref.ª ...90) desta Relação de Lisboa.
WW. Ora, se naqueles autos o Tribunal da Relação de Lisboa considerou que a patente não seria exuberante e ostensivamente nula por existirem pareceres técnicos em sentidos opostos, então jamais se poderia dizer que a EP ...61 é ostensivamente nula, em face dos elementos de prova produzidos nestes autos. Mas mais:
• a concessão da EP ...61 foi precedida de uma avaliação minuciosa do Instituto Europeu de Patentes, que considerou os documentos - Abstract#3004 MM e Abstract#3003 CC - do estado da técnica mais próximo invocados pelas Recorridas nestes autos e decidiu pela concessão do direito.
• a Câmara Técnica de Recurso do EPO reiterou, depois de 15(!) oposições, o seu entendimento quanto à validade deste direito, mantendo a patente tal como concedida.
• a Sentença Recorrida não é única no panorama nacional, tendo sido profe-rida uma decisão em 24 de setembro de 2024 pelo Juiz ... do Tribunal da Propriedade Intelectual no âmbito de uma ação principal n.º 125/21...., queconcluiu pela validade da EP ...61 (Doc. n.º 1 junto ao requerimento de 3 de outubro de 2024, com a ref.ª ...90).
• muitos tribunais europeus que foram chamados a analisar este caso decidi-ram em sentido favorável à validade da EP ...61, rejeitando os argumentos queas Recorridas aqui esgrimem.
XX. No caso da EP ...61, para efeitos de novidade, o Tribunal a quo suporta-se, assim, na existência de um estudo realizado na data de prioridade (31 de janeiro de 2005) - o estudo ... - no qual três doses diárias (od) de 20mg, 30mg e 40mg de ... estavam a ser testadas em mais de 500 doentes com trombose venosa profunda (TVP).
YY. No entanto, nenhuma antecipação prejudicial à novidade consta nos documentos apresentados pela Recorrida relativos ao estudo ..., e muito menos do Formulário de Consentimento, junto pela Recorrida como “Doc.12” com a sua Oposição.
ZZ. A reivindicação 1 difere do Formulário de Consentimento em três caraterísticas técnicas:
• ...,
• comprimido de libertação rápida e
• tratamento de distúrbio tromboembólico (com eficácia e segurança implícitas).
AAA. Mesmo que o Formulário de Consentimento pudesse ser considerado estado da técnica nos termos do 54 (2) EPC (o que não acontece, por se tratar de um documento que não cumpre o standard de prova da data e conteúdo da divulgação “para além de qualquer dúvida razoável”), este documento não divulga de forma direta e inequívoca todas as características reivindicadas, pelo que não poria em causa a novidade da reivindicação 1 da EP ...61.
BBB. para efeitos de análise de atividade inventiva, o problema técnico-objetivo será como modificar os ensinamentos de MM #3004 de forma a proporcionar um regime de dosagem oral de ... que seja seguro, eficaz e conveniente para o tratamento profilático e terapêutico de distúrbios tromboembólicos. Este foi também o problema tal como formulado pela Câmara de Recurso do EPO na Decisão T 1732/18, que manteve a EP ...61.
CCC. Como o próprio EPO estabelece, para análise da actividade inventiva deverá ser seguida a abordagem could-would (Guidelines EPO G-VII-5.3). Partindo do CPA, o perito poderia (could) chegar à invenção, mas teria (would) efetivamente chegado à invenção, com razoável expectativa de sucesso.
DDD. Face ao exposto, partindo de MM #3004, e considerando os resultados positivos divulgados neste documento, o perito poderia decidir avançar para um ensaio de fase II com um comprimido de libertação rápida de ... administrado 1x por dia, durante 5 dias, e assim descobrir que esse seria um regime terapêutico eficaz, mas não existindo nenhum indicador (pointer) em MM #3004 que levasse o perito a seleccionar especificamente este regime de dosagem, e não um dos restantes testados, o perito não teria certamente motivação (would not) para o fazer, muito menos com razoável expetativa de sucesso. Pelo contrário, os ensinamentos de MM #3004, à luz do conhecimento geral comum na data de prioridade, constituem na verdade um teaching-away, que afastaria o perito da invenção tal como reivindicada na EP ...61.
EEE. O perito não teria qualquer motivação para chegar à invenção com razoável expectativa de sucesso partindo de MM #3004, considerado sozinho ou em combinação com o conhecimento geral comum, sem que tal implicasse um passo inventivo. Como tal, as reivindicações 1 e 2 são inventivas partindo de MM #3004, e em combinação com conhecimento geral comum.
FFF. Face à divulgação de CC, o perito não teria particular motivação para combinar os ensinamentos do estado da técnica mais próximo com este documento pois este não se refere a administração oral de ..., e muito menos a um regime de dosagem. Em todo o caso, mesmo que o perito, com o problema técnico objetivo em mente e procurando a sua resolução, combinasse os ensinamentos de MM #3004 com CC, não encontraria informação adicional em CC que o conduzisse à solução reivindicada pela invenção com razoável expectativa de sucesso.
GGG. MM #3010 (Doc.6, junto dom a Oposição da Recorrida) divulga, à semelhança de MM #3004, resultados de um ensaio de Fase I com ..., em indivíduos saudáveis, neste caso o ensaio de dose única que antecedeu o ensaio de escalona- mento de dose que constitui o CPA na presente análise.
HHH. A divulgação de MM #3010 é muito idêntica ao CPA, com excepção de que neste resumo é reportada uma semi-vida de 3-4 horas (ao invés de 3-6h reportadas no CPA). O modo de administração reportado em MM #3010 é através de uma solução oral.
III. Por conseguinte, os dados de MM #3010 não acrescentam, de facto, qualquer in- formação adicional aos conhecimentos já obtidos em função dos resultados do en- saio reportado em MM #3004.
JJJ. O resumo de CC (e respetivo poster, apesar de não fazer parte do estado da técnica porquanto não foi provado que foi efetivamente aquele o poster exibido na Conferência) é igualmente uma divulgação curta, com intuito meramente académico e reporta de forma sintética os resultados de um ensaio clínico de fase I sobre parâmetros farmacodinâmicos (ensaios EPT, PITT e PICT) para investigar o efeito do ... na produção de trombina em amostras de sangue de 8 (oito) indivíduos saudáveis. Este documento refere um suposto efeito sustentado até 24h, mas apre- senta unicamente o resultado das amostragens ao fim de 2h e 12h, o que torna a generalização às 24h meramente especulativa, para além de todas as outras imprecisões e/ou erros que tornam as conclusões infundadas e os resultados/testes inverificáveis/irreproduzíveis.
KKK. Não só a magnitude do efeito ao fim de 24h não é reportado (afirmar a existência de um “efeito sustentado” não indica se é um efeito grande ou pequeno), pelo que extrapolar os resultados ex vivo (em plasma) para um eventual efeito in vivo seria sempre um exercício de pura especulação, como a reduzida magnitude do efeito ex vivo ao fim de 12h dificilmente tornaria credível para o perito que ao fim de 24h pudesse manter-se um efeito suficientemente forte compatível com um efeito terapêutico significativo in vivo.
LLL. E pese embora o Poster CC refira, nas suas conclusões, que “alguns parâmetros (por exemplo, pico ETP) indicam um efeito farmacodinâmico duradouro do ...39, o que sugere adequação para um regime de dosagem uma vez por dia”, o perito não tomaria em consideração esta afirmação sem qualquer espírito crítico, e acima de tudo, sem olhar para os dados reportados para a interpretar.
MMM. É jurisprudência consolidada do EPO que aquilo que constitui a divulgação de um documento do estado da técnica é regido não apenas pelas palavras efetivamente utilizadas na sua divulgação, mas pelo que a publicação revelava ao perito como uma questão de realidade técnica (Caselaw BoA I-C-4.9).
NNN. O Formulário de Consentimento é um documento a ser fornecido aos participantes no ensaio, e é referente ao estudo ..., de fase II, com ....
OOO. O documento informativo refere também os possíveis benefícios do Estudo, indi- cando que “o tratamento com ...39 pode revelar-se mais eficaz que o trata- mento usual, mas também menos ou igualmente eficaz. O risco de hemorragia pode ser inferior, semelhante ou superior”, com a salvaguarda específica de que “não deve esperar qualquer benefício directo da sua participação”.
PPP. É ainda mencionada a duração do estudo e a confidencialidade das informações recolhidas. Não são referidos no documento quaisquer resultados.
QQQ. De acordo com a jurisprudência do EPO, saber se um protocolo de ensaio clínico fornece uma expectativa razoável de sucesso dependerá da existência ou não de preocupações de segurança significativas ou outros preconceitos no estado da técnica que constituam um teaching away da invenção. Uma mera esperança de sucesso não é suficiente como motivação para tornar óbvio o assunto reivindicado.
RRR. Isto significa que, de acordo com a prática do EPO, a divulgação do protocolo de um ensaio clínico, e que inclua todas as caraterísticas do regime de dosagem reivindi- cado, não é por si só suficiente para dar ao perito uma razoável expectativa de sucesso de eficácia e segurança terapêutica.
SSS. Ora, no presente caso, não é divulgado no Formulário de Consentimento que o com- primido usado no âmbito do ensaio estudo ... contém ... (ape- nas ...39) e apresenta libertação rápida.
TTT. Todas estas conclusões estão alinhadas com aquela que foi a decisão do EPO após análise das 15 oposições deduzidas contra a EP ...61, deste Tribunal da Propriedade Intelectual no âmbito da ação principal n.º 125/21.... e do Tribunal Distrital de Oslo, Tribunal Distrital de Haia, Tribunal de Patentes e do Comércio de Estocolmo, do Tribunal de Comércio de Bruxelas, do Tribunal Distrital de Munique, do Tribunal de Comércio de Valência, do Tribunal de Comércio Finlandês, do Tribunal Municipal de Praga, Tribunal do Condado de Harju, Tribunal de Recurso da Áustria, Tribunal de Recurso de Munique e Institutos de Propriedade Industrial da Croácia e da Eslováquia, constando as respetivas referências de junção destes documentos na última secção das alegações de recurso.
UUU. Em face de tudo quanto antecede, a sentença recorrida acabou por violar o dispostonos artigos 102.º, n.ºs 1 e 2 e 345.º do CPI, bem como os artigos 607.º, n.º 4, 608.º, n.º 2,do CPC, pelo que deve ser revogada, sendo substituída por decisão que julgue totalmente procedente o presente procedimento cautelar apresentado pelas ora Recorrentes, e defira todas as providências cautelares requeridas, com as legais consequências.
*
9. A Recorrida respondeu ao recurso pugnando, em suma, pela total improcedência do recurso e consequente manutenção do decidido. Mais pede, ao abrigo do artigo 636.º, n.º 1 e 2 do Código de Processo Civil, a ampliação do objeto do recurso, impugnando a decisão sobre a matéria de facto, relativamente aos factos provados n.ºs 1.60, 1.60.5 e 1.135.
10. As Recorrentes responderam à requerida ampliação pugnando, em suma, pela total improcedência da mesma.
*
11. Em sede do presente recurso de apelação, foi cumprido o disposto nos artigos 657.º, n.º 2 e 659.º, do Código de Processo Civil.
12. Tendo em conta a não oposição por parte da Recorrida, admite-se os documentos juntos pelas Recorrentes em sede de recurso.
*
II. QUESTÕES
13. Antes de enunciarmos as questões a que o presente tribunal cumpre responder, haverá que recordar que, segundo jurisprudência constante, são as conclusões que delimitam o objeto do recurso, não podendo o Tribunal ad quem conhecer de questão que delas não conste.
14. É também consensual na jurisprudência dos tribunais portugueses que importa não confundir questões, cuja omissão de pronúncia desencadeia nulidade da decisão nos termos da alínea d) do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil, com argumentos, razões ou motivos que são aduzidos pelas partes em defesa ou reforço das suas posições, aos quais o tribunal não tem obrigação de dar resposta especificada ou individualizada.
15. Feitos estes esclarecimentos prévios, vejamos as questões suscitadas no recurso em apreciação:
Em sede de impugnação da matéria de facto das Recorrentes: Os seguintes factos provados n.ºs devem ser dados como não provados ou alterados:
i. 1.63?
ii. 1.67?
iii. 1.70?
iv. 1.73?
v. 1.99?
vi. 1.148?
vii. 1.117 e 1.118?
viii. 1.107, 1.119 e 1.120?
ix. 1.121, 1.126 e 1.127?
x. 1.149? Em sede da reapreciação dos factos não provados n.ºs, os seguintes factos devem passar a provados ou sofrer alterações:
xi. 2.14?
xii. 2.16 e 2.17?
xiii. 2.18 e 2.19?
xiv. 2.20 a 2.22?
xv. 2.23 a 2.27?
xvi. 2.28 a 2.31?
Em sede de Direito:
xvii. Em sede de procedimento cautelar e tomando em conta a presunção de validade de que goza a EP ...61, esta deve ser declarada nula, por falta de novidade e atividade inventiva?
Subsidiariamente, em sede de impugnação da matéria de facto pedida pela Recorrida (ampliação de objeto do recurso):
xviii. Os factos provados n.ºs 1.60, 1.60.5 e 1.135, devem ser alterados?
*
FUNDAMENTAÇÃO
16. A sentença recorrida fixou a factualidade nos termos que se passa a expor.
1) Factos indiciariamente provados
1.1 As Requerentes fazem parte de um grupo farmacêutico multinacional - conhecido como EMP01... - fundado em 1 de agosto de 1863 em Wuppertal-Barmen, sob a designação "Friedr. EMP01... et. Comp.", resultado da amizade entre dois homens – …. EMP01... e ….
1.2 A EMP01... é a maior empresa farmacêutica alemã, que emprega mais de 100.000 pessoas em 83 países e distribui os seus produtos em todo o mundo. A EMP01... investiga, desenvolve, produz, comercializa e vende produtos farmacêuticos em todo o mundo, concentrando-se, em particular, nas áreas da saúde cardiovascular e da saúde da mulher, bem como em terapêuticas especializadas em oncologia, hematologia e oftalmologia.
1.3 A EMP01... investe recursos consideráveis na investigação e desenvolvimento de novos produtos farmacêuticos para melhorar o tratamento e os cuidados dos doentes em todo o mundo. Em 2021, por exemplo, a EMP01... investiu 5,4 mil milhões de euros em investigação e desenvolvimento, o que corresponde a um rácio de custos de I&D de 13% das vendas totais da empresa e de 17,3% das vendas da Divisão Farmacêutica.
1.4 Em 2022, a EMP01... aumentou mesmo o montante do investimento para 6,57 mil milhões de euros. Atualmente, a EMP01... tem em curso mais de 30 projetos com diferentes orientações médicas na sua carteira de produtos farmacêuticos.
1.5 O seu programa de investigação e desenvolvimento conduziu à produção e difusão de muitos produtos farmacêuticos, incluindo o que está em causa no presente processo, o ...®.
1.6 A EMP01... AG é titular da respetiva Autorização de Introdução no Mercado (EMEA/H/C/...4) do medicamento (de referência) que contém a referida substância ativa ... - ...®.
1.7 Através da sociedade portuguesa EMP01... PORTUGAL, LDA., o medicamento contendo a referida substância ativa ... - ...® - é comercializado no mercado português.
1.8 … é o nome genérico (DCI - Denominação Comum Internacional), utilizado em Farmácia, do composto cujo nome químico é 5-cloro-N-[[(5S)-2-oxo-3-[4-(3-oxomorfolin-4-il)fenil]oxazolidin-5-il]metil]tiofeno-2-carboxamida.
1.9 O ... é normalmente utilizado na forma livre (não sal) como substância ativa em medicamentos.
1.10 ... é a substância ativa do medicamento ... comercializada na forma farmacêutica de comprimidos revestidos por película (em blisters), nas doses de 2,5 mg, 10 mg, 15 mg e 20 mg, cujas AIMs foram concedidas à empresa EMP01... A.G., respetivamente, em 22 de maio de 2013, 30 de setembro de 2008 e 9 de dezembro de 2011.
1.11 Em Portugal, o volume de vendas do medicamento ...® atingiu entre os anos de 2019 e 2023 (31 de dezembro de 2023), os seguintes montantes (em euros):
2019
2020
2021
2022
2023
Vendas
operacionais ...
56.363.066 €
51.132.201 €
59.099.460 €
66.066.756 €
62.023.000 €
1.12 O medicamento ...® tem sido um sucesso comercial, representando o principal produto farmacêutico da EMP01..., sendo responsável por 53% das vendas totais da empresa em Portugal.
1.13 O ... é um inibidor direto do fator Xa, altamente seletivo, interrompendo as vias intrínsecas e extrínsecas da cascata de coagulação sanguínea e inibindo a formação de trombina e o desenvolvimento de tromboses.
1.14 ...® é utilizado na prevenção do tromboembolismo venoso, bem como no domínio das doenças tromboembólicas graves. É um medicamento reconhecido para o tratamento de doenças potencialmente fatais associadas a perturbações da coagulação sanguínea. Previne a formação de coágulos sanguíneos (trombos), que podem conduzir a oclusões de veias ou artérias ou causar embolismo pulmonar, ataques cardíacos e acidentes vasculares cerebrais, sendo por isso potencialmente fatais.
1.15 A utilização uma vez por dia está indicada para todas as formas de dosagem de ...® nas dosagens de 10 mg, 15 mg e 20 mg.
1.16 A patente portuguesa n.º ...61, da titularidade da Autora EMP01... Intellectual Property Gmbh, tem como epígrafe “Tratamento de Distúrbios Tromboembólicos com ...”
1.17 Foi pedida em 19 de janeiro de 2006 (reivindicando a prioridade da patente ...93, de 31.01.2005), tendo sido concedida em 22 de abril de 2015 e validada em Portugal em 31 de agosto de 2015.
1.18 Tem como data limite de vigência o dia 19 de janeiro de 2026.
1.19 A resumo da EP n.º ...61 é do seguinte teor: A presente invenção relaciona-se com o campo da coagulação do sangue, mais especificamente, relaciona-se com um método de tratamento de um distúrbio tromboembólico através da administração uma vez por dia de um inibidor direto do fator Xa numa forma farmacêutica oral a um paciente que dele necessite, em que o inibidor do fator Xa tem uma concentração de semivida no plasma indicativa de um intervalo de administração de bid ou tid, por exemplo de 10 horas ou menos.
1.20 Na descrição da EP ...61 lê-se:
[Imagem] [Imagem]
[Imagem] [Imagem]
[Imagem]
[Imagem]
[Imagem]
[Imagem]
[Imagem]
[Imagem]
[Imagem]
[Imagem]
[Imagem]
[Imagem]
[Imagem]
[Imagem]
1.21 São reivindicações da EP ...61:
REIVINDICACÕES
1. O uso de um comprimido de libertação rápida do composto ... para o fabrico de um medicamento para o tratamento de um distúrbio tromboembólico, administrado não mais do que uma vez por dia durante pelo menos cinco dias consecutivos, em que o referido composto tem uma concentração de semivida no plasma de 10 horas ou menos, quando administrado oralmente a um paciente humano.
2. A utilização, de acordo com o reivindicado na reivindicação 1, em que o distúrbio tromboembólico e o enfarto do miocárdio com elevação do segmento ST (STEMI), enfarto do miocárdio sem elevação do segmento ST (NSTEMI), angina instável, reoclusão após angioplastia ou bypass aortocoronário, embolia pulmonar, trombose venosa profunda ou acidente vascular cerebral.
1.22 A patente EP ...61 protege a administração uma vez por dia de uma forma farmacêutica oral, nomeadamente de comprimidos de libertação rápida de ... para o tratamento de doenças tromboembólicas.
1.23 O problema central no tratamento das doenças tromboembólicas é a perturbação do equilíbrio extremamente delicado de factores pró-coagulantes e anticoagulantes. A dicotomia notável entre hemorragia e trombose caracteriza, todos os anticoagulantes como uma classe especial de medicamentos (de risco).
1.24 Na data de prioridade da patente em causa, a terapia padrão para os distúrbios tromboembólicos consistia na administração de heparinas e derivados de heparina (em suma: heparinas, em que "HBPM" significa heparinas de baixo peso molecular) ou antagonistas da vitamina K.
1.25 As heparinas têm um efeito agudo, mas não são biodisponíveis por via oral e têm de ser administradas por via parentérica (i.e. injeção). Isto é doloroso e impraticável para muitos doentes e, por isso, muitas vezes não é uma opção, particularmente para a anticoagulação a longo prazo.
1.26 As heparinas são também biomoléculas complexas e o seu mecanismo de ação é multifatorial, indireto e complicado. Uma única molécula de heparina pode inativar irreversivelmente um grande número de moléculas de trombina (fator IIa) e de fator Xa, catalisando a ativação da antitrombina do próprio organismo. Neste contexto, irreversível significa que as moléculas de fator Xa e de trombina inativadas ficam permanentemente inativas e já não podem ser ativadas. O restabelecimento da coagulação exige, portanto, a formação de novas moléculas de fator Xa e de trombina.
1.27 As heparinas têm ainda outros efeitos, nomeadamente retardados, que se explicam, por exemplo, pelos metabolitos ativos, pela ligação às proteínas plasmáticas e endoteliais e pela libertação do mediador endógeno Tissue Fator Pathway Inhibitor (TFPI), induzida pela heparina.
1.28 Tudo isto já era bem conhecido na data de prioridade da EP ...61, em janeiro de 2005, uma vez que a descoberta da heparina foi há quase 90 anos.
1.29 Os antagonistas da vitamina K (AVK), como o Marcumar® (fenprocoumon), a varfarina e outros AVK com o mesmo mecanismo de ação, inibem competitivamente a biossíntese dependente da vitamina K de quatro fatores de coagulação no fígado e são utilizados principalmente para a anticoagulação a longo prazo. A vantagem dos AVK em relação às heparinas é o facto de poderem ser administrados por via oral.
1.30 As desvantagens graves dos AVK são o longo tempo para o início da ação e o tempo de decaimento muito longo, a sua influência no teor de vitamina K na dieta, a sua farmacocinética e farmacodinâmica imprevisíveis e a elevada variabilidade associada ao efeito com uma janela terapêutica muito estreita e um risco exponencialmente crescente de hemorragia no caso de apenas uma ligeira sobredosagem (EP ...61, parágrafo [0007]).
1.31 A "janela terapêutica" é o intervalo de dose em que o fármaco pode ser administrado de forma segura e eficaz, ou seja, no caso dos anticoagulantes, o intervalo em que a formação de trombos é evitada de forma segura (ou seja, a subdosagem é evitada) e, ao mesmo tempo, são evitados eventos hemorrágicos graves (ou seja, a sobredosagem é evitada).
1.32 O risco exponencialmente crescente de hemorragia no caso de apenas uma ligeira sobredosagem de AVKs exige um ajuste individualizado da dose e uma monitorização rigorosa de cada doente através de análises sanguíneas regulares e subsequente ajuste da dose.
1.33 Existiam opções de tratamento para as doenças tromboembólicas na data de prioridade, cada uma delas com desvantagens significativas. Ambas exigiam o envolvimento de profissionais de saúde na sua utilização (quer através da injeção necessária, quer através de uma monitorização atenta e do ajustamento da dosagem), de modo a gerir os riscos associados. Ambas eram não específicas devido ao respetivo mecanismo de acção, ou seja, actuavam em diferentes factores ao mesmo tempo, tinham janelas terapêuticas comparativamente estreitas e eram, por isso, difíceis de controlar.
1.34 Na data de prioridade da patente EP ...61, existia uma grande necessidade médica de um anticoagulante que pudesse ser administrado por via oral numa dose fixa e que não apresentasse as desvantagens referidas.
1.35 A substância ativa ... foi capaz de satisfazer esta necessidade pela primeira vez. O ... pode ser tomado por via oral e inibe o fator Xa de forma reversível, ou seja, o efeito do fator Xa para formar trombina a partir da protrombina só é inibido durante um determinado período de tempo. As moléculas de fator Xa existentes estão novamente disponíveis na sua forma ativa após o fim da inibição. No entanto, é também muito importante que o ... esteja sempre presente no plasma numa concentração terapêutica, de modo a garantir que a quantidade do ... presente no plasma é a necessária para produzir o efeito desejado de forma eficaz e segura contra a trombose.
1.36 Em comparação com os AVK, o ... tem um início de ação rápido e também um decaimento comparativamente rápido, o que o torna adequado para o tratamento agudo e frequentemente a longo prazo.
1.37 O ...® foi o primeiro medicamento oral aprovado contendo um inibidor direto de fator Xa ("primeiro na sua classe") e a sua aprovação em 2008 foi celebrada como um avanço e um marco na medicina e reconhecida com muitos prémios importantes. Como o prémio internacional ....
1.38 A Organização Mundial de Saúde (OMS) inclui a substância ativa ... na Lista Modelo de Medicamentos Essenciais.
1.39 Os inibidores diretos do factor Xa estavam ainda em fase inicial de desenvolvimento à data de prioridade do pedido de patente, em 31.01.2005 e, alguns deles enfrentaram grandes dificuldades.
1.40 No tratamento ou na profilaxia de doenças tromboembólicas, tem de haver sempre uma quantidade suficiente de substância ativa do inibidor do fator Xa no plasma sanguíneo para impedir eficazmente a formação de um trombo. Ao mesmo tempo, a quantidade de substância ativa não deve ser tão elevada que provoque hemorragias graves.
1.41 Em 2005, em particular, não havia antídoto para os novos anticoagulantes orais diretos que estavam a ser desenvolvidos na altura, o que significa que uma possível sobredosagem não podia ser facilmente tratada. Também não existiam dados de estudos sobre se o ... (ou outro inibidor direto do fator Xa) poderia ser administrado com segurança juntamente com heparinas de ação rápida, por exemplo, para poder tratar tromboses ou embolias em caso de uma subdosagem de ....
1.42 No caso de um medicamento que é administrado várias vezes em doses constantes, é estabelecido um estado estacionário constante após um determinado período de tempo, no qual as flutuações entre a concentração plasmática máxima do medicamento (o chamado "pico", ou seja o pico da curva de concentração plasmática) e as concentrações plasmáticas mais baixas no momento da dose seguinte (o vale) devem situar-se num intervalo de concentração plasmática que não seja demasiado elevado (risco de hemorragia potencialmente fatal) nem demasiado baixo (risco de tromboembolismo potencialmente fatal).
1.43 A extensão destas flutuações "pico a vale" é chamado tempo de semivida (t1/2).
1.44 A definição mais simples de semivida é o intervalo de tempo em que a concentração plasmática do fármaco diminui 50 %. Assim, a concentração após duas semi-vidas é um quarto do valor inicial (25 %), após três semividas um oitavo (12,5 %), após quatro semividas um décimo sexto (6,25 %), após cinco semividas um trigésimo segundo (3,13 %) e após seis semividas um sexagésimo quarto, ou seja, apenas cerca de 1,56 % do valor inicial.
1.45 Para um fármaco com uma semivida de 4 horas, a concentração apenas desce para cerca de 1,56% do valor inicial após 24 horas (semivida de 6 vezes). Este modelo simplificado de eliminação dependente da concentração (50 % de degradação por unidade de tempo) é apresentado no diagrama seguinte:
1.46 O verdadeiro significado clínico da semivida para o especialista reside no facto de ser um dos parâmetros a ter em consideração na determinação do regime de dosagem (frequência de administração e número de doses) de um medicamento com doses múltiplas, tendo em vista atingir a concentração de estado estacionário dentro da janela terapêutica, com baixas flutuações entre o pico máximo (Cmax) e mínimo (Cmin) (flutuações "pico a pico") durante as doses múltiplas.
1.47 Se existirem várias semividas, o que acontece, a semivida em concentrações plasmáticas que ainda são clinicamente eficazes é crucial, porque o objetivo é encontrar um intervalo de dosagem em que o doente tenha uma concentração plasmática que proporcione uma proteção eficaz contra acontecimentos adversos - neste caso, tromboembólicos.
1.48 A patente ...61 protege um regime de dosagem seguro e eficaz para o inibidor do fator Xa ..., para o tratamento profiláctico e terapêutico de perturbações tromboembólicas.
1.49 A forma farmacêutica oral de libertação rápida/imediata liberta o seu ingrediente ativo rapidamente após a administração, ao contrário da chamada libertação modificada (a qual liberta a substância ativa de forma contínua ao longo do tempo).
1.50 O ...®, contém ... como substância ativa e é comercializado sob a forma de comprimido de libertação imediata.
1.51 A patente ...61 estabelece que o ingrediente ativo ... pode ser utilizado de forma segura e eficaz em doentes, mesmo quando administrado uma vez por dia, num grande número de indicações.
1.52 A Requerida – – EMP02..., S.A. – é uma empresa comercial que se dedica à indústria e ao comércio de produtos farmacêuticos.
1.53 O Requerida é a titular das AIM de um medicamento genérico que contém ..., como substância ativa, aprovado ao abrigo de um procedimento centralizado, cujas AIMs foram aprovadas em 12 de Novembro de 2021.
1.54 As dosagens e as formas farmacêuticas são exatamente as mesmas que as do medicamento de referência (...®).
1.55 A Requerida requereu AIMs para medicamentos genéricos que contêm a substância activa ....
1.56 O medicamento de referência para o genérico que contém ... da Requerida é o ...®, o medicamento que contém a substância activa ..., sob a forma farmacêutica de comprimido revestido por película, cuja comercialização está autorizada nas dosagens correspondentes às AIMs da Requerida, ou seja, 10 mg, 15 mg, 20 mg e (15 mg + 20 mg).
1.57 Com a concessão das AIMs para os medicamentos genéricos contendo o princípio ativo ..., o INFARMED disponibilizou
- os Resumos das Características do Medicamento (RCM) e Folheto Informativo;
- o Relatório de Avaliação Pública (PAR) dos medicamentos genéricos ... EMP02... (inicialmente, “... EMP03...”) da Requerida.
1.58 O regime terapêutico aprovado para os medicamentos genéricos ... EMP02... da Requerida é o mesmo que o protegido pela patente EP ...61.
1.59 Os medicamentos genéricos da Requerida, ... EMP02..., nas dosagens de 10 mg, 15 mg e 20 mg, já receberam aprovação de preço.
1.60 Os medicamentos genéricos da Requerida, ... EMP02..., compreendem todas as características da patente EP ...61:
1.60.1 Característica 1 – ... - A caraterística 1 está preenchida, na medida em que, de acordo com os RCMs dos medicamentos genéricos em apreço, Secção 2 "Composição qualitativa e quantitativa", a forma de realização contestada contém o composto ativo ..., ou seja, ....
1.60.2 Característica 2 - Comprimido de libertação rápida - A caraterística 2 também está preenchida. Os medicamentos genéricos da Primeira Requerida, ... EMP02..., são fornecidos sob a forma de comprimido. Trata-se de um comprimido de libertação rápida/libertação imediata, como se pode ver no Relatório de Avaliação Pública (PAR) da forma de realização contestada. Os referidos medicamentos genéricos da Requerida, ... EMP02... foram autorizados para comercialização com referência aos documentos de aprovação do medicamento ...®. Parte desta autorização de comercialização é a bioequivalência do produto genérico ao ...®. Uma vez que os medicamentos genéricos em causa foram aprovados com referência à aprovação do ...®, também tem de ser bioequivalente. Por conseguinte, a concretização contestada também se refere aos dados farmacocinéticos do ...® e é autorizada na mesma dosagem e na mesma via de administração que o ...®.
1.60.3 Característica 3 - para o tratamento de uma doença tromboembólica - Esta caraterística é também obviamente concretizada pelos medicamentos genéricos da Requerida, ... EMP02.... Os medicamentos genéricos da Requerida, ... EMP02..., nas dosagens de 10 mg, 15 mg e 20 mg são, manifestamente preparados para o tratamento de trombose venosa profunda (TVP) e embolia pulmonar (EP), bem como para a profilaxia de TVP e EP recorrentes em adultos. Estas são doenças tromboembólicas na acepção da patente EP ...61.
A dosagem de 10 mg foi desenvolvida para a profilaxia do tromboembolismo venoso (TEV) em doentes adultos após cirurgia electiva de substituição da anca ou do joelho, as dosagens de 15 mg e 20 mg para a profilaxia do acidente vascular cerebral e da embolia sistémica em doentes adultos e para o tratamento do tromboembolismo venoso (TEV) e a profilaxia da sua recorrência em crianças e adolescentes. Todas estas doenças são também doenças tromboembólicas na aceção da patente EP ...61.
1.60.4 Característica 4 - administrada não mais do que uma vez por dia durante pelo menos cinco dias consecutivos - A caraterística 4 também está preenchida. Os medicamentos genéricos da Requerida, ... EMP02..., são adequadamente concebidos para administração uma vez por dia, ou noutras recomendações de dosagem aí apresentadas.Do mesmo modo, as dosagens de 10 mg, 15 mg, 20 mg e (15mg + 20mg) dos medicamentos genéricos da Requerida, ... EMP02..., estão manifestamente preparadas para administração diária durante pelo menos cinco dias consecutivos.
1.60.5 Característica 5 - semivida de concentração plasmática igual ou inferior a 10 horas - A característica 5 é inevitavelmente realizada porque os medicamentos genéricos da Requerida, ... EMP02..., contém o composto ativo ....
1.61 A EP ...61 sucede à Patente Europeia n.º ...06 (EP'...06), que era a patente de base que protegia o ingrediente ativo ... enquanto tal e a sua utilização no tratamento de distúrbios tromboembólicos.
1.62 EP ...61 refere-se essencialmente a um regime de dosagem, uma vez por dia do ingrediente ativo conhecido ... para o tratamento de distúrbios tromboembólicos, ou seja, o problema técnico objetivo é fornecer um regime de administração oral seguro e eficaz de ... para o tratamento profilático e terapêutico de doenças tromboembólicas.
1.63 Encontrar um regime de dosagem de medicamento adequado é de conhecimento comum na indústria farmacêutica e é efetuado rotineiramente através da realização de "estudos de determinação de dose", que geralmente envolvem uma equipa de especialistas.
1.64 O perito na técnica em relação à EP ...61 pode ser considerado uma equipa de especialistas composta por um farmacologista (com conhecimentos de farmacodinâmica e farmacocinética) e um médico/clínico especializado no desenvolvimento de medicamentos anticoagulantes para o tratamento de distúrbios tromboembólicos.
1.65 Antes da data de prioridade da EP ...61, tinham já sido realizados vários estudos clínicos sobre o ingrediente ativo ... por investigadores que trabalhavam com ou para a EMP01....
1.66 Alguns resultados desses estudos foram divulgados na 45ª Reunião Anual da “American Society of Hematology”, realizada em San Diego, EUA, entre 6 e 9 de dezembro de 2003 (a "Conferência ASH ").
1.67 Esses resultados foram publicados, entre outros, nos seguintes documentos:
− O Poster de CC et al., intitulado "Effects of ...39, an Oral, Direct FXa Inhibitor, on Thrombin Generation in Healthy Volunteers".
− O Abstract de CC et al. intitulado "Effects of ...39, an Oral, Direct Fator Xa Inhibitor, on Thrombin Generation in Healthy Volunteers", Blood, 2003, vol. 102, 16 de novembro de 2003, Abstract #3003.
− O Abstract de MM et al. intitulado "Multiple dose escalation study investigating the pharmacodynamics, safety, and pharmacokinetics of ...39, an oral, direct Fator Xa inhibitor, in healthy male subjects", Blood, 2003, vol. 102, 16 de novembro de 2003, Abstract #3004.
− O Abstract de MM et al. intitulado "Single dose escalation study investigating the pharmacodynamics, safety, and pharmacokinetics of ...39 an oral, direct factor Xa inhibitor in healthy male subjects", Blood, 2003, vol. 102, 16 de novembro de 2003, Abstract #3010.
− O Poster de MM et al., intitulado "Single dose escalation study investigating the pharmacodynamics, safety and pharmacokinetics of ...39 an oral, direct FXa inhibitor in healthy male subjects".
− O Poster de MM et al., intitulado "Multiple dose escalation study investigating the pharmacodynamics, safety and pharmacokinetics of ...39 an oral, direct FXa inhibitor in healthy male subjects".
1.68 O Poster CC deve ser lido em conjunto com o Abstract correspondente (Abstract #3003) e com os Posters e Abstracts de MM (Abstract #3004 e Abstract #3010).
1.69 Os estudos de fase I com ... cujos resultados foram disponibilizados ao público antes da data de prioridade da EP ...61 são o Estudo de CC (divulgado, entre outros, no Poster CC e no Abstract CC #3003), os dois Estudos de MM: um estudo de escalonamento de dose múltipla, em que os sujeitos receberam dosagens crescentes múltiplas ou um placebo (divulgado, entre outros, no Abstract MM #3004) e um estudo de escalonamento de dosagem única, em que os sujeitos receberam administração diária sucessiva do medicamento ou um placebo em dosagens ascendentes únicas durante o período do estudo.
1.70 O Poster CC refere-se a um estudo clínico de fase I patrocinado pela EMP01... pela para determinar a eficácia do ... administrado oralmente na inibição da geração de trombina em sujeitos saudáveis do sexo masculino.
1.71 O Poster CC afirma que o composto ...39 (...) é um inibidor direto do Fator Xa (FXa) seletivo, altamente potente, que está a ser desenvolvido para a prevenção e tratamento do distúrbio tromboembólicos, que mostrou ser bem tolerado em doses únicas e múltiplas até 30mg, e que é rapidamente absorvido após administração oral, com uma semivida terminal de 9-12 horas.
1.72 O estudo CC foi realizado em 12 indivíduos saudáveis do sexo masculino com idades entre os 27 e os 37 anos, que foram randomizados para receber ... (numa dose oral única de 5mg no dia 1 e numa dose oral única de 30mg no dia 14, ou vice-versa – 8 sujeitos) ou um placebo (4 sujeitos).
1.73 As avaliações sobre a eficácia do ... basearam-se em três testes: PITT (tempo de geração de trombina induzida por plaquetas), ETP (potencial endógeno de trombina) e PICT (tempo de coagulação induzida por plaquetas).
1.74 Em relação aos resultados, afirma-se o seguinte no Poster CC: "O ETP (pico ou AUC) foi reduzido significativamente (em comparação com os perfis placebo) por ambas as doses de 5mg e 30mg de ...39, com efeito máximo em 2-4 horas. A inibição do ETP-pico e ETP- AUC (induzida pelo fator tecidular ou colagénio) por 30mg de ...39 manteve-se durante 12 horas (Figura 3).”
1.75 E que: O PITT (Tc) foi prolongado significativamente (em comparação com os perfis placebo) com a dosagem de 30mg de ...39. O prolongamento máximo da Tc foi de, aproximadamente, 2 vezes por 5mg de ...39 e de, aproximadamente, 4 vezes pela dosagem de 30mg (em comparação com o grupo placebo), e foi observado 2-4 horas após a administração da dosagem. O aumento do PITT foi mantido com 30mg de ...39 durante 12 horas (Figura 4a).
1.76 E também: O PICT foi prolongado significativamente (em comparação com os perfis de placebo) com as dosagens de 5mg e 30mg de ...39. O prolongamento máximo foi de, aproximadamente, 2 vezes por 5mg de ...39 e 3 vezes pela dosagem de 30mg, e foi observado 2 horas após a administração. O PICT foi prolongado por mais de 12 horas após o tratamento com 5mg e 30mg de ...39 (Figura 4b).
1.77 O Poster CC afirma ainda, com referência aos estudos de fase I de MM et. al.: (Abstracts #3004 e #3010) que O FXa foi inibido dependente da dose após a administração de ...39. A inibição máxima foi observada 2 horas após tratamento (28% e 56% de inibição após tratamento com 5mg e 30mg de ...39, respetivamente). A inibição do FXa está estreitamente correlacionada com o ETP, tal como demonstram os valores do pico ETP.
1.78 O Poster CC apresenta as seguintes conclusões: - O ...39 administrado por via oral dependente da dose inibiu a geração de trombina tanto pela via intrínseca (colagénio) como extrínseca (fator tecidular). - O efeito do ...39 na geração de trombina foi demonstrado em ensaios sem plaquetas e em ensaios à base de PRP. Em contraste, os inibidores indiretos do FXa (ou seja, dependentes da antitrombina III) naturalmente inibem apenas o FXa que não é protegido pelo complexo plaquetas-protrombinase. - O ...39 não só inibiu o tempo de atraso da geração de trombina (PITT-Tc), como também teve um efeito profundo tanto na extensão máxima da geração de trombina (Pico ETP) como na quantidade total de trombina gerada (ETP-AUC). Esta observação sugere uma característica adicional do ...39, uma vez que os inibidores do FXa mais fracos prolongam apenas o tempo de atraso sem afetar a quantidade total de geração de trombina. - Alguns parâmetros (por exemplo, pico ETP) indicam um efeito farmacodinâmico duradouro do ...39, o que sugere adequação para um regime de dosagem uma vez por dia. - Os efeitos do ...39 oral na geração de trombina intrínseca e extrínseca e PICT, que são mediados pela inibição direta do FXa, indicam que o ...39 é um anticoagulante promissor que merece investigação clínica adicional.
1.79 O Resumo de CC # 3003 refere-se ao mesmo estudo que o Poster CC.
1.80 No Resumo de CC # 3003 são apresentados os seguintes dados:
1.81 Lê-se na conclusão, do Resumo de CC # 3003:
- … o ...39 exibiu inibição da geração de trombina dependente da dose, quer nas plaquetas, quer no plasma, utilizando estímulos extrínsecos (FT) ou intrínsecos (colagénio) para ativação plaquetária.
- - Uma dose única de 30 mg exerceu um efeito sustentado em certos testes de produção de trombina durante um período que foi até às 24 horas. O fator Xa foi inibido de uma forma dependente da dose após a administração de ...39. A inibição máxima, observada 2 horas após a administração do medicamento, foi de 28% e 56%para as doses de 5 mg e 30 mg, respetivamente.
1.82 O estudo de escalonamento de dose múltipla (Resumo MM # 3004), envolveu 64 sujeitos saudáveis do sexo masculino que foram randomizados para receber ..., em doses diárias múltiplas sucessivas de 5mg uma vez ao dia, 5mg duas vezes ao dia, 5mg três vezes ao dia e depois 10mg, 20mg e 30mg duas vezes ao dia, ou um placebo.
1.83 No Resumo MM #3004 é afirmado o seguinte: As mudanças relevantes nos parâmetros PD ainda estavam presentes após 12 horas. Os parâmetros de segurança padrão não foram afetados e não foram observados sinais ou sintomas de hemorragia em todo o intervalo posológico. Além disso, o ...39 não afetou o tempo de hemorragia em nenhuma dosagem. Foi observado um aumento proporcional à dosagem na AUC após a primeira dosagem e no estado estacionário. A Cmax foi atingida após 2,5-4 horas; A semivida terminal foi de 4 a 6 horas. Não houve indicação de acumulação indevida do fármaco para além do estado estacionário para todos os seis regimes posológicos. Este estudo demonstrou que o ...39 tem farmacodinâmica e farmacocinética dependentes de dose previsíveis sem sinais ou sintomas de hemorragia. Em conclusão, a administração oral de ...39 foi segura e bem tolerada em dosagens até 30mg duas vezes por dia.
1.84 O estudo escalonamento de dose única (Resumo MM # 3010) envolveu a administração a 103 sujeitos saudáveis do sexo masculino de diferentes dosagens únicas entre 1,25mg e 80mg de comprimidos de ..., ou soluções orais de 5mg e 10mg de ....
1.85 No Resumo MM # 3010 é afirmado o seguinte: Todos os perfis de FD eram dependentes de dose. O ...39 mostrou um rápido início de ação, observando-se os efeitos máximos após 2 horas. (...) O tempo de hemorragia não foi prolongado em nenhuma dosagem. (...).
1.86 A conclusão do Resumo MM # 3010 refere o seguinte: Neste estudo, o ...39 foi seguro e bem tolerado numa vasta gama de dosagens orais (1,25-80mg), com farmacodinâmica e farmacocinética dependentes de dose previsíveis. Estes dados sugerem que o ...39 proporciona uma anticoagulação previsível com um excelente perfil de segurança.
1.87 Os Posters MM referem-se aos mesmos estudos clínicos reportados nos Abstracts #3004 e #3010: um poster refere-se ao estudo de escalonamento de dosagem única e o outro poster refere-se ao estudo de escalonamento de dosagem múltipla.
1.88 No Poster MM (estudo de dose única), os resultados relatados em relação à farmacodinâmica foram os seguintes: Todos os parâmetros farmacodinâmicos tiveram curvas tempo-resposta dependentes da dose semelhantes, embora a magnitude das curvas variasse dependendo do parâmetro. No geral, os parâmetros farmacodinâmicos foram ligeiramente mais afetados após a administração da solução oral do que após a administração de comprimidos.
1.89 Em termos de atividade e especificidade do FXa é afirmado o seguinte: A inibição mediana do FXa variou entre 20% para os comprimidos de 5 mg a 61% para os comprimidos de 80 mg (Figura 1). O efeito inibitório máximo sobre a atividade do FXa foi observado 1-4 horas após a administração do comprimido e retornou ao intervalo normal (0,7-1,2 U/mL) dentro de 24 horas para dosagens de até 40mg. A atividade do FXa permaneceu elevada além de 24 horas para as dosagens de 60mg e 80mg. O ...39 foi específico para o FXa e não afetou a FIIa (Figura 2) ou a antitrombina III (Figura 3).
1.90 Os resultados relativos à farmacocinética foram os seguintes: A concentração plasmática de ...39 aumentou proporcionalmente à dose após a administração de soluções orais e dosagens de comprimidos até 10mg, e foi menos do que proporcional à dose em dosagens mais elevadas, muito provavelmente devido à baixa solubilidade e absorção incompleta (Figura 7). Os perfis de concentração plasmática-tempo mostraram uma rápida absorção após a administração da solução. As concentrações plasmáticas máximas foram atingidas após 30 minutos e o t1/2 foi estimado em 3-4 horas.
1.91 O Poster MM (estudo de dose única) apresenta as seguintes conclusões:
- O ... foi seguro e bem tolerado em todas as dosagens e formulações.
- O ... demonstrou inibir seletivamente o FXa sem afetar a FIIa ou a antitrombina III. Foram observados perfis tempo-efeito dependentes de dose e previsíveis para os parâmetros farmacodinâmicos. Foi observada uma estreita correlação entre os efeitos farmacodinâmicos e as concentrações plasmáticas do ....
- O bom perfil de segurança, a inibição seletiva do FXa e perfis farmacocinéticos e farmacodinâmicos promissores indicam ser necessária uma investigação adicional do ....
1.92 Em termos de farmacocinética, o Poster MM (estudo de dose múltipla) diz que a Cmax foi atingida 2,5-4 horas após a administração, e a [semivida] da dosagem de 5mg foi de 5,4 horas, e bem assim, que para as dosagens de 10mg e 30mg, a média [semivida] foi de 5,8 horas, e para a dosagem de 20mg foi de 3,7 horas.
1.93 O Poster MM (estudo de dose múltipla) apresenta as seguintes conclusões:
- O ... foi seguro e bem tolerado após administração de dosagens múltiplas em todas as dosagens testadas sem sinais ou sintomas de hemorragia. O ... inibiu a atividade do FXa e afetou de forma dependente da dose os parâmetros farmacodinâmicos PT, aPTT e HepTest.
- Foi demonstrada farmacodinâmica e farmacocinética previsíveis dependentes da dose, que indicaram que o ... é adequado para administração duas vezes por dia até 30 mg.
- Existe uma estreita correlação entre o prolongamento do TP e as concentrações plasmáticas
- O bom perfil de segurança, a inibição seletiva do FXa e perfis farmacocinéticos e farmacodinâmicos promissores indicam ser necessária uma investigação adicional do ....
1.94 À data de prioridade da EP ...61, já estavam a decorrer estudos clínicos de fase II com o ....
1.95 Um desses estudos de fase II com ... que estava a decorrer, à data de prioridade da EP ...61, é o chamado estudo ... (IMP ...28 - ...72), no qual foram testadas três doses uma vez ao dia (od) de 20 mg, 30 mg e 40 mg de ... em mais de 500 pacientes com trombose venosa profunda (TVP).
1.96 Os resultados desse estudo ... foram reportados num artigo de QQ et al. publicado na revista Blood, de 15 de setembro de 2008, Volume 112, Número 6, páginas 2242 a 2247.
1.97 O estudo ... teve início em dezembro de 2004 e terminou em dezembro de 2005, de acordo com o extrato do sítio web “...” relativo ao ensaio clínico ...72.
1.98 O tratamento do primeiro paciente do estudo ... teve início em 24 de dezembro de 2004.
1.99 O Formulário de Consentimento do paciente desse estudo ..., datado de 22 de novembro de 2004, mas aprovado ainda antes dessa data, foi disponibilizado ao público antes da data de prioridade da EP ...61.
1.100 O Comité de Revisão de Ética Médica do Hospital e da Faculdade de Medicina da Universidade ... emitiu um parecer sobre o estudo ... em 23 de novembro de 2004, com base, nomeadamente, no Formulário de Consentimento.
1.101 Os participantes no estudo ... receberam também, antes do início do estudo, um Folheto de Informação ao Paciente sobre o estudo, que é uma espécie de “passaporte médico” que o paciente deve trazer consigo por razões de segurança, para que os outros interessados (hospital, médico de família ou dentista) possam ser informados da participação do paciente no estudo.
1.102 Os pacientes do estudo ... não estavam sujeitos a restrições de confidencialidade.
1.103 Os participantes foram encorajados a discutir o estudo e o Formulário de Consentimento com familiares, amigos e o seu médico de família.
1.104 O estudo ... é um estudo de fase II, de determinação de dose com ....
1.105 O estudo ... envolveu a administração de três doses orais uma vez ao dia de 20 mg, 30 mg e 40 mg de ..., ou o comparador, a mais de 500 pacientes com trombose venosa profunda (TVP) aguda.
1.106 O estudo ... teve como objetivo determinar a dosagem de uma vez ao dia ótima de ... para o tratamento da TVP em comparação com o tratamento habitual.
1.107 As dosagens uma vez ao dia de ... foram administradas sob a forma de comprimidos de libertação rápida
1.108 Para conceber o estudo ... com a administração de uma vez ao dia de ... para o tratamento da TVP, a equipa de investigadores baseou-se na semivida da atividade anti-Xa conhecida e na inibição observada da geração de trombina em seres humanos até 24 horas.
1.109 A randomização dos pacientes teve início em dezembro de 2004 e o tratamento do primeiro paciente teve lugar em 24 de dezembro de 2004.
1.110 Foi obtido o Consentimento Informado por escrito de todos os pacientes que participaram no estudo ..., de acordo com a Declaração de Helsínquia.
1.111 A conceção do estudo ... e a aprovação do protocolo do estudo ocorreram, antes de dezembro de 2004 e, por conseguinte, antes da data de prioridade da EP ...61 (29 de janeiro de 2005).
1.112 Um dos principais parâmetros farmacocinéticos (PK) avaliados pelo perito na técnica é a semivida do fármaco.
1.113 A semivida de um fármaco é o tempo necessário para que a sua concentração no plasma sanguíneo diminua para metade.
1.114 Os dados de PK que mostram a semivida de um fármaco são o ponto de partida, juntamente com os dados de farmacodinâmica (PD), para prever e escolher um regime de dosagem do fármaco que se espera ser seguro e eficaz.
1.115 É prática corrente utilizar a semivida determinada nos estudos de fase I para desenvolver escolhas do regime de dosagem a testar nos estudos subsequentes de determinação da dose de fase II.
1.116 A patente EP ...61 indica que a semivida da concentração plasmática do ... foi determinada no estudo de fase I de escalonamento de dose múltipla de MM como sendo entre 4 e 6 horas e que era surpreendente que uma administração oral de uma vez por dia de um inibidor direto do fator Xa com uma semivida de concentração plasmática de 10 horas ou menos, como o ..., demonstrasse eficácia.
1.117 A EP ...61 foi concedida com base no facto de o ... ter uma semivida de concentração plasmática igual ou inferior a 10 horas.
1.118 Na altura do pedido da patente EP ...61, a titular da patente (EMP01...) já sabia que a semivida do ... nos pacientes não era, de facto, igual ou inferior a 10 horas, mas superior.
1.119 Todas as características da reivindicação 1 da EP ...61 são divulgadas no Formulário de Consentimento do estudo ....
1.120 O Formulário de Consentimento divulga que o ... foi administrado uma vez ao dia sob a forma de comprimidos de libertação rápida para o tratamento da TVP, uma doença tromboembólica.
1.121 Os medicamentos ... da EMP02... têm uma semivida de concentração plasmática superior a 10 horas na grande maioria dos pacientes a quem esses medicamentos são indicados.
1.122 A semivida depende do paciente específico a quem o composto é administrado e de vários fatores, incluindo o sexo, a idade e o estado de saúde.
1.123 O RCM do produto ...® da EMP01... refere, na secção 5.2 (página 45), que o ... tem uma semivida terminal de 5-9 horas em jovens e de 11-13 horas em idosos (Documento 27).
1.124 O RCM do medicamento ... EMP02... contém a mesma informação.
1.125 O grupo identificado como “jovens” no RCM abrange a faixa etária de 20-45 anos, enquanto o grupo identificado como “idosos” abrange a faixa etária de 60-76 anos, de acordo com o RCM do ...® vigente nos EUA, secção 13 (Documento 29), MM 2005b, página 873, e MM 2008, Tabela 1, página 2760.
1.126 O ... é quase exclusivamente prescrito a pessoas idosas (com 60 anos ou mais).
1.127 O ... tem uma semivida de concentração plasmática superior a 10 horas na grande maioria dos pacientes a quem é administrado.
1.128 A concessão de AIM constitui condição legal para a comercialização de um medicamento.
1.129 A apresentação dos pedidos de AIM em apreço pela Requerida e a sua concessão não constituem, por si só, uma violação dos direitos de propriedade industrial da Primeira Requerente.
1.130 A Requerida informou o Infarmed da sua intenção de lançar os seus medicamentos genéricos no mercado a partir de 1 de Abril de 2024, tendo requerido a comparticipação do preço para as dosagens de 2,5mg, 10mg, 15mg e 20mg, com os números de registo ...05, ...13, ...21, ...39 e ...47.
1.131 Em virtude da anterior aprovação do preço, a Terceira Requerente enviou uma carta à Requerida em 13 de Março de 2024, com o seguinte teor: Carta registada com aviso de receção RE: Possível e demonstrada intenção de comercializar os medicamentos "... EMP02... - Comprimidos revestidos por película - 2,5 mg, 10 mg, 15 mg, 20 mg e 15 mg + 20 mg" Caros Senhores, Estamos a contactá-lo em nome do grupo de empresas farmacêuticas a que pertencemos - o GRUPO EMP01.... Como é do seu conhecimento, a EMP01... INTELLECTUAL PROPERTY GMBH é titular dos seguintes direitos relacionados com a substância ativa "...".
(a) CERTIFICADO DE PROTECÇÃO SUPLEMENTAR N.º 346, concedido com base na patente PT n.º ...06 (validação em Portugal da PATENTE EUROPEIA N.º ...06), com o título "OXAZOLIDINONAS SUBSTITUÍDAS E SUA UTILIZAÇÃO NO DOMÍNIO DO SANGUE COAGULAÇÃO", a patente de base do "...", que protege, em síntese, a invenção de vários compostos de oxazolidinonas substituídas, incluindo o ..., o processo de obtenção desses compostos, as formulações que contenham esses produtos como substâncias activas e a utilização terapêutica das referidas formulações. A CCP ...46 está em vigor em Portugal e expira em 2nd de abril de 2024.
(b) Patente PT n.º ...70 (validação em Portugal da PATENTE EUROPEIA N.º ...70), com o título "MÉTODO PARA A PRODUÇÃO DE UMA COMPOSIÇÃO FARMACÊUTICA SÓLIDA, ORALMENTE APLICÁVEL, COMPOSTA POR ...", que protege um método de produção de uma composição farmacêutica contendo ..., bem como as composições farmacêuticas contendo ... obtidas através do referido método e a sua utilização para a produção de um medicamento, está em vigor e expira em 13t novembro de 2024. (c} A patente PT n.º ...66 (validação em Portugal da PATENTE EUROPEIA N.º ...66), com o título "MÉTODO DE PRODUÇÃO", que protege um método de produção de ..., está em vigor e expira a 31t * de dezembro de 2024. (g Patente PT n.º ...61 (validação em Portugal da PATENTE EUROPEIA N.º ...61), com o título "TRATAMENTO DE TROMBOEMBÓLICA DISORDERS WITH ...", que protege um regime terapêutico com ..., está em vigor e expira em 19*h janeiro de 2026. Estas patentes foram legalmente validadas em Portugal e encontram-se em pleno vigor e efeito e abrangem o princípio ativo ... e os produtos ... comercializados em Portugal, nomeadamente o medicamento de referência ...@, bem como o regime terapêutico de ...@ 10mg, 15mg e 20mg. A EMP01... AG é a titular da respectiva Autorização de Introdução no Mercado do medicamento que contém o referido princípio ativo "..." - .... Através da empresa portuguesa EMP01... PORTUGAL, LDA., o medicamento que contém o referido princípio ativo "..." - ...@ - é comercializado no mercado português. Na dose de 2,5 mg, ... co-administrado com ácido acetilsalicílico (AAS) isolado, ou com AAS e clopidogrel ou ticlopidina, é indicado para a prevenção de eventos aterotrombóticos em doentes adultos após síndrome coronária aguda (SCA) com biomarcadores cardíacos elevados. Nas doses de 10 mg, 15 mg e 20 mg, ...@ é utilizado para a prevenção do acidente vascular cerebral e da embolia sistémica em doentes adultos com fibrilhação auricular não valvular com um ou mais factores de risco, e para o tratamento da trombose venosa profunda (TVP) e da embolia pulmonar (EP) e para a prevenção da TVP e da EP recorrentes em adultos. Os produtos genéricos "... EMP02... - Comprimidos revestidos por película - 2,5mg, 10mg, 15mg, 20mg e 15 mg + 20 mg", que incorporam o ... como princípio ativo, estão indubitavelmente abrangidos pelo âmbito de proteção conferido pela CCP ...46 e os produtos genéricos "... EMP02... - Comprimidos revestidos por película - 10mg, 15mg, 20mg e 15 mg + 20 mg" também pelo âmbito de proteção conferido pela patente PT n.º ...61. De facto, os referidos medicamentos que contêm a substância ativa ... apresentam as características técnicas definidas nas reivindicações 1 a 12 da patente PT n.º ...06, uma vez que esta patente protege não só o ..., mas também um processo de preparação do ..., uma composição farmacêutica contendo ... e a utilização terapêutica do ... para a produção de um medicamento. Além disso, uma vez que o regime terapêutico aprovado para os produtos "... EMP02... - Comprimidos revestidos por película -10mg, 15mg, 20mg e 15 mg + 20 mg" com AIMs aprovadas é, de acordo com o seu RCM, o mesmo que o protegido pela patente, estes produtos possuem as características técnicas definidas nas reivindicações 1 e 2 da patente PT n.º ...61. Relativamente à patente PT n.º ...61, é importante sublinhar que existem, sem exceção, as designações nacionais/contrapartidas deste direito foram consideradas juridicamente válidas por vários tribunais de primeira instância em processos noutros países europeus, nomeadamente na ..., nos ..., na ... e, mais recentemente, na .... Por conseguinte, se a EMP02... Limited produzir ou comercializar de qualquer forma os seus medicamentos genéricos que contenham ..., sob qualquer forma, antes da data de expiração do CCP ...46, ou seja, antes de 2'* de abril de 2024, violará a CCP ...46, e o mesmo acontecerá no caso da patente PT n.º ...61 se a comercialização dos genéricos "... EMP02... - Comprimidos revestidos por película - 10 mg, 15 mg, 20 mg e 15 mg + 20 mg" com AIM aprovadas ocorrer antes de 19 de janeiro de 2026. A Patente PT n.º ...70 refere-se a um método de produção de uma composição farmacêutica contendo ..., bem como a composições farmacêuticas contendo ... obtidas através do referido método e a sua utilização para a produção de um medicamento. Assim, se se verificar que as composições que constituem os medicamentos da EMP02... Limited são sólidas, para administração oral e sob a forma de hidrolisado, e que são produzidas/produzíveis através do processo de granulação em leito fluidizado, esses medicamentos que contêm a substância ativa ... terão as características técnicas definidas nas reivindicações 1 a 19 da referida patente. A patente PT n.º ...66 refere-se a um método de produção de "...". Por conseguinte, se os medicamentos da EMP02... Limited forem obtidos directamente através do processo protegido pela patente, terão as características técnicas definidas nas reivindicações 1 a 13 da patente PT n.º ...66. EMP01... INTELLECTUAL PROPERTY GMBH, EMP01... AG e EMP01... PORTUGAL, LDA. têm um interesse legítimo em garantir que nem a EMP02... Limited nem qualquer outra empresa do seu grupo empresarial lance os produtos "... EMP02... - Comprimidos revestidos por película - 2,5mg, 10mg, 15mg, 20mg e 15 mg + 20 mg" no mercado português, enquanto o referido RCP e, se for caso disso, outros direitos estiverem em vigor. Em defesa dos nossos direitos legítimos, não hesitaremos em tomar as medidas necessárias contra quaisquer actos de violação dos nossos direitos durante o seu período de validade e já interpusemos injunções preliminares contra algumas empresas que demonstraram intenção de lançar os seus produtos genéricos contendo .... Face ao exposto, com o objetivo de evitar o recurso aos tribunais, evitando assim maiores prejuízos, custos e incómodos para ambas as partes, vimos por este meio solicitar formalmente que, no prazo improrrogável de 8 dias consecutivos a contar da receção da presente carta, confirmem que a EMP02... Limited e todas as restantes empresas do seu grupo empresarial se abstenham de fabricar, utilizar, colocar à venda e/ou comercializar, ou de importar ou possuir para esses fins, os medicamentos "... EMP02... - Comprimidos revestidos por película - 2.5mg, 10mg, 15mg, 20mg e 15 mg + 20 mg" enquanto vigorar o CCP ...46 e, consoante o caso, as patentes PT n.º ...61, PT n.º ...70 e PT n.º ...66. A eventual ausência de resposta será interpretada como um forte indício de falta de interesse da vossa parte na resolução extrajudicial deste assunto, caso em que seremos forçados a tomar as medidas legais adequadas sem qualquer outro aviso.
1.132 A Requerida não deu qualquer resposta à referida missiva da Terceira Requerente.
1.133 A Requerida obteve as suas AIMs com base nos dados publicados pela EMP01... relacionados com a farmacocinética, a farmacodinâmica, bem como com a eficácia e a segurança da substância activa.
1.134 A Autoridade reguladora não exigiu que a Requerida efectuassem quaisquer estudos clínicos ou estudos pré-clínicos para provar que o seu produto tinha a mesma segurança e eficácia que o ...®, porque a Autoridade reguladora assumiu que o "... EMP02... - Comprimido revestido por película - 10mg, 15mg, 20mg e (15mg) + (20mg)" teria o mesmo perfil de segurança e eficácia que o ...®.
1.135 Os referidos medicamentos genéricos da Requerida, que contêm a substância ativa ..., incluem as características técnicas definidas nas reivindicações 1 e 2 do EP ...61.
1.136 A Requerida não solicitou nem obteve autorização da Primeira Requerente para, por qualquer forma, explorar a invenção protegida pela PATENTE EUROPEIA EP ...61, validada em Portugal.
1.137 O medicamento ...® é o principal produto farmacêutico das Requerentes, tanto a nível nacional como mundial.
1.138 As requerentes ficarão privadas dos lucros relativamente ao medicamento ...®, em consequência de as necessidades do mercado virem a ser, em parte, satisfeitas pelas requeridas, com os medicamentos genéricos contendo a substância activa ....
1.139 Em Portugal, o volume de vendas do medicamento ...® atingiu, até à data, várias dezenas de milhões de euros.
1.140 As vendas (actuais e futuras) dos medicamentos que contêm a substância ativa ... pelas requeridas corresponderão, necessariamente, a outras tantas vendas que deixariam de ser feitas do ...®.
1.141 A presença no mercado dos medicamentos contendo a substância activa ... pelas requeridas irá diminuir, a margem de lucros das requerentes.
1.142 A comercialização dos medicamentos em causa pela requerida acabará por ter um impacto no preço do medicamento original ...®, na medida em que as requerentes, por razões de concorrência e de comercialização, serão obrigadas a reduzir também o preço deste medicamento.
1.143 Os hospitais podem adquirir os medicamentos genéricos "... EMP02... - Comprimido revestido por película - 10mg, 15mg, 20mg e (15mg) + (20mg)" através de ajustes directos que permitirão que a Requerida possa fornecer o referido medicamento contendo ... a estes hospitais.
1.144 A Requerida pode também fornecer os Hospitais, estabelecimentos do Sistema Nacional de Saúde, através de um concurso público, obtendo adjudicação para a comercialização dos seus medicamentos "... EMP02... - Comprimido revestido por película - 10mg, 15mg, 20mg e (15mg) + (20mg)", praticamente em regime de exclusividade, com a inerente redução dos lucros das Requerentes.
1.145 O facto de a Requerida poder praticar preços mais baixos resulta sobretudo do facto de não terem quaisquer custos de investigação e desenvolvimento de novos medicamentos, nem custos de marketing e promoção junto dos profissionais de saúde, uma vez que a substância ativa utilizada no seu medicamento genérico é bem conhecida (através da experiência do ...®) dos prescritores, não sendo necessário demonstrar a sua eficácia e segurança clínica através de estudos morosos e de custos elevados.
Mais se mostra indiciado que:
1.146 O estudo de MM et al. contém cinco autores dos quais quatro são autores do estudo de CC et al, concretamente MM, RR, SS; e TT.
1.147 Colaboraram ainda nos estudos de CC, UU, VV, OO, WW e XX.
1.148 Os estudos de MM et al e de CC et al (Abstract e Poster) foram elaborados por investigadores que incluem co-autores da própria EMP01....
1.149 Os comprimidos são a forma farmacêutica mais comum de libertação imediata.
1.150 O ... também foi designado no estado da arte (documentos técnicos) com o nome de código “...39”.
1.151 A validade da patente ...61 está a ser discutida nos tribunais, por todo o Mundo, com várias decisões proferidas em sentido contraditório.
*
2) Não se mostra indiciado que:
2.1. A Requerente tem recebido contactos de farmácias indicando que a Requerida as tem contactado com a informação de que começarão a comercializar os seus medicamentos genéricos contendo ... a partir de 1 de Abril de 2024.
2.2. A entrada dos medicamentos genéricos no mercado fará com que as farmácias, deixem de comprar ...® às Requerentes.
2.3. A entrada dos medicamentos genéricos no mercado fará com que as requerentes tenham prejuízos em muitas centenas de milhares de euros por ano, com perdas brutas que podem representar -26 049 660 euros no primeiro ano.
2.4. O impacto estimado nas vendas baseia-se no caso do medicamento genérico ... da EMP04..., que iniciou a comercialização em outubro de 2023 em Portugal, com importante perda de vendas do ...® (marca do ... da EMP05...).
2.5. O ...® foi afetado com uma perda de 62% das vendas no primeiro mês em relação ao mês anterior e uma perda cumulativa de 50% no terceiro mês em relação ao período antecedente.
2.6. E mesmo que o "... EMP02... - Comprimido revestido por película - 10mg, 15mg, 20mg e (15mg) + (20mg)" seja posteriormente retirado do mercado, o preço do ...® manter-se-á ao preço com desconto para evitar os problemas práticos e de reputação causados pela tentativa de aumentar o preço para o preço original.
2.7. Todos os investigadores do estudo ... estavam também sujeitos a um acordo de confidencialidade explícito.
2.8. Os participantes no estudo ... não são membros do público e estavam também sujeitos a uma obrigação de confidencialidade, pelo menos implícita, para com o público.
2.9. Devido ao carácter agudo do tratamento da TVP, os (potenciais) participantes no estudo tiveram apenas algumas horas para decidir sobre a sua participação e não tiveram oportunidade de discutir a participação no estudo com terceiros.
2.10. A utilização do código interno da EMP01... ...39 em vez do nome do ingrediente ativo é outra indicação clara da confidencialidade fundamental do conteúdo do estudo que pode ser reconhecida pelo doente.
2.11 O estudo ... também não se destinava "apenas" a encontrar a melhor dose, pelo contrário, tratava-se da prova de conceito para uma eficácia e segurança adequadas de uma dose única diária de ... numa forma de dose de libertação rápida.
2.12 Decidir se um fármaco é administrado em comprimidos de libertação rápida ou sustentada é um fator determinante da forma do perfil de concentração plasmática.
2.13 Este perfil de concentração plasmática é, por sua vez, o fator determinante da frequência de administração da dose.
2.14 Nenhum dos documentos de última geração contém qualquer indicação, e muito menos justifica uma expetativa razoável de sucesso, de que o ..., com a sua curta semi-vida de apenas 3-6 h, possa ser eficaz e seguro num regime de dose única diária, e muito menos quando administrado como um comprimido de libertação rápida.
2.15 O documento mais avançado exclui efetivamente o ensino de um regime de administração diária de uma dose, antecipando claramente um regime diário de duas doses, mostrando a curta semi-vida do ... e ensinando que os efeitos só se mantêm durante cerca de 12 horas.
2.16 Nem os resumos e posters de MM nem qualquer outro artigo de ponta, incluindo CC S et al: "Effects of ...39, an oral, direct fator Xa inhibitor, on thrombin generation in healthy volunteers" Blood, Vol. 102, 11, 2003: Abstract 3003 e o CC Poster, fornecem ao perito na área uma expetativa razoável de sucesso no que diz respeito à segurança e eficácia clínica do regime de administração da referida dosagem.
2.17 Como se trata de um ensaio de fase I em indivíduos saudáveis, MM não poderia ter "estabelecido" que um regime de 30 mg uma vez por dia de ... seria seguro e eficaz para os doentes.
2.18 CC não apresentou uma expetativa razoável de sucesso, de que o regime de administração da dose reivindicada seria terapeuticamente eficaz em doentes.
2.19 Os ensaios utilizados na CC não são preditivos da eficácia clínica de um regime de dosagem.
2.20 Estes testes foram de natureza altamente exploratória e não fornecem detalhes suficientes para permitir uma reprodução ou análise adequada dos resultados por um perito na matéria.
2.21 Estes testes, são totalmente inadequados para serem considerados na determinação da frequência de dosagem para um estudo de Fase II em doentes. Além disso, os dados e os gráficos apresentados no poster demonstram que a conclusão referida é insustentável e não tem apoio.
2.22 Nenhum clínico responsável teria alguma vez sugerido um regime de dosagem de uma vez por dia para um primeiro ensaio de Fase II com base em tais dados.
2.23 Mesmo que se considere o valor nominal, tanto a descrição escrita como a tabela de dados da CC apontam para a necessidade de um regime de administração de doses de, pelo menos, duas vezes por dia.
2.24 O sucesso clínico e a segurança da associação de um regime de dose única diária com a forma farmacêutica reivindicada, ou seja, o ... sob a forma de comprimidos de libertação rápida, não seriam de esperar e são particularmente não óbvios.
2.25 À data de prioridade, um regime de administração de dose única diária não seria uma opção óbvia nem haveria uma expetativa razoável de sucesso com tal regime de administração.
2.26 O facto de a dose única diária de ... sob a forma de um comprimido de libertação rápida ser tão segura e eficaz e até comparável à dose diária (duas vezes por dia) foi, de facto, inesperado e surpreendente.
2.27 Na altura da prioridade da patente, a escolha de um regime de dosagem de uma vez por dia para o ..., e muito menos sob a forma de um comprimido de libertação rápida, estava longe de ser óbvia.
2.28 Os próprios inventores não o fizeram inicialmente com base nos conhecimentos mais recentes aqui discutidos. O primeiro ensaio de fase II do ... foi, portanto, planeado com regimes de dosagem duas vezes por dia e até três vezes por dia.
2.29 Apenas a investigação levada a cabo pelos inventores conduziu à invenção tal como reivindicada, ou seja, apenas o ensaio excecionalmente grande de variação de 12 doses incluído na patente, juntamente com outros resultados da investigação interna da EMP01... que não estavam publicamente disponíveis na data de prioridade, proporcionou aos inventores o resultado de que poderia valer a pena experimentar um regime de administração uma vez por dia.
2.30 O especialista teria abordado a situação clínica com precaução, evitando administrar doses mais elevadas num regime de toma única diária, e muito menos sob a forma de um comprimido de libertação rápida, tendo em conta as complicações hemorrágicas conhecidas com os inibidores do fator Xa, como o ..., e porque não existe antídoto para o ....
2.31 O perito da especialidade teria tentado desenvolver um comprimido de libertação controlada, o que também foi tentado pela queixosa no início do desenvolvimento do ....
*
III. Do mérito do recurso
Impugnação da matéria de facto pelas Recorrentes
i. O facto provado n.º 1.63 deve ser considerado não provado?
17. Neste ponto, as Recorrentes em essência, que “não encontram qualquer base para sustentar este facto, tendo resultado de todo o julgamento a complexidade subjacente a encontrar um regime de dosagem para um medicamento contendo ....”.
18. Neste seguimento, as Recorrentes, destacando o depoimento de BB, propõem a seguinte redação para o facto em causa: “Os ensaios clínicos com anticoagulantes traziam na data de prioridade especiais desafios, na medida em que a terapêutica com anticoagulantes é um acto de equilíbrio difícil que pode ser muito perigoso para os doentes, especialmente se - como era o caso do ... à data de prioridade da pa- tente EP ...61 em 2005 - se tratar de uma substância ativa completamente nova e clinicamente não desenvolvida.”
19. Por seu turno, segundo a Recorrida, o facto provado 1.63 não se refere à determinação de um regime de dosagem do ..., mas sim à determinação do regime de dosagem de medicamento de um modo geral. Pelo que a argumentação da EMP01... que sustenta a impugnação deste facto é irrelevante. Este facto resulta comprovado, desde logo, do Manual do International Council for Harmonisation of Technical Requirements for Pharmaceuticals for Human Use (ICH), cujo Tópico E 4, Dose response Information to Support Drug Registration, na versão datada de 1994 se encontra junta aos autos como Documento n.º 20 da oposição da EMP02.... Por outro lado, os farmacologistas que prestaram depoimento na audiência final, KK, II e DD, confirmaram que a análise dos parâmetros de farmacodinâmica e farmacocinética é tarefa essencial, mas absolutamente rotineira, no desenvolvimento de qualquer fármaco.
Apreciação da questão por este tribunal
20. O facto em questão tem a seguinte redação “Encontrar um regime de dosagem de medicamento adequado é de conhecimento comum na indústria farmacêutica e é efetuado rotineiramente através da realização de "estudos de determinação de dose", que geralmente envolvem uma equipa de especialistas.”
21. Desde logo da forma como o facto se mostra redigido, é de se concluir que ele não se refere a quaisquer especificidades relativas ao medicamento contendo ..., mas refere-se a medicamentos em geral, tal como alega a Recorrida.
22. Esta conclusão mostra-se ainda mais evidente quando tomamos em conta a motivação do tribunal a quo subjacente a este facto “Os factos 1.62 a 1.65 não são controversos e decorrem da leitura da Patente, conjugada com as regras de experiência comum.”. Ou seja, quando o tribunal a quo fixou aquele facto, para si incontroverso, estava ainda longe de entrar em matéria de facto controversa relativamente ao medicamento contendo ....
23. Assim se compreende, no que concerne especificamente ao medicamento contendo ..., que tenha resultado, além do mais provado que: “1.34 Na data de prioridade da patente EP ...61, existia uma grande necessidade médica de um anticoagulante que pudesse ser administrado por via oral numa dose fixa e que não apresentasse as desvantagens referidas. 1.35 A substância ativa ... foi capaz de satisfazer esta necessidade pela primeira vez. O ... pode ser tomado por via oral e inibe o fator Xa de forma reversível, ou seja, o efeito do fator Xa para formar trombina a partir da protrombina só é inibido durante um determinado período de tempo. As moléculas de fator Xa existentes estão novamente disponíveis na sua forma ativa após o fim da inibição. No entanto, é também muito importante que o ... esteja sempre presente no plasma numa concentração terapêutica, de modo a garantir que a quantidade do ... presente no plasma é a necessária para produzir o efeito desejado de forma eficaz e segura contra a trombose.
24. Não se vê, pois, quaisquer razões para alterar o facto descrito, improcedendo o recurso neste ponto.
ii. Deve dar-se como não provado o facto n.º 1.67?
25. Nesta sede, as Recorrentes alegam, em essência, que “a Recorrida não provou, como era seu ónus, que o poster em questão corresponde à versão final e que foi efetivamente exposta na conferência em questão. O documento não está datado e nenhuma das testemunhas da Recorrida esteve presente no Congresso para atestar que o poster foi exposto com aquele conteúdo – cfr. depoimento da Dra. AA”.
26. Por seu turno a Recorrida discorda das Recorrentes, desde logo, porque “A EMP02... provou efetivamente as circunstâncias da divulgação do Poster de CC, pela voz do próprio autor. Com efeito, a EMP02... juntou aos autos quatro declarações escritas do próprio CC”. Mais acrescenta: “a EMP01... olvida, de forma muito conveniente, diga-se, que o Poster de CC junto como Documento n.º 3 da oposição não foi impugnado pela EMP01... nestes autos quando esta respondeu (de forma muito completa e detalhada, refira-se também) à matéria de exceção de invalidade da EP ...61!”
Apreciação da questão por este tribunal
27. O facto controverso ora em causa diz respeito a estudos clínicos realizados ainda antes da data de prioridade da EP ...61, sobre o ingrediente ativo ... por investigadores que trabalhavam com ou para a EMP01... (v. facto n.º 1.65 e ss.), entre os quais o “Poster de CC et al., intitulado "Effects of ...39, an Oral, Direct FXa Inhibitor, on Thrombin Generation in Healthy Volunteers”.
28. Nesta sede, o tribunal a quo sustentou a prova da factualidade ora em causa, desde logo com base nos seguinte: “O 1.66 a 1.93 decorrem directamente do teor dos documentos juntos com a Oposição, a saber o doc. n.º 3, doravante Poster CC, o documento n.º 4, doravante Abstract CC #3003, o documento 5, doravante Abstract MM #3004, o documento n.º 6, doravante Abstract MM #3010, o documento n.º 7 (Single Dose), o documento n.º 8 (multiple Dose) e o documento n.º 9 e que corresponde ao estudo ..., devidamente explicados e esclarecidos em audiência de julgamento pelas testemunhas DD, FF, JJ, KK e II a que acresce o teor dos Relatórios e Pareceres juntos aos autos em 18.10.2024 e 18.11.2024 do Prof. FF, confirmado em audiência pelo próprio e bem assim as quatro Declarações do próprio Dr. CC, juntas aos autos em 30.12.2024.” (sublinhados nossos).
29. Mais esclareceu o tribunal a quo o seguinte: “O Poster CC, o Abstract CC #3003 e o Abstract MM #3004 foram publicados na Conferência de Hematologia, de ASH, realizada em S. Diego, Califórnia, em Dezembro de 2003 e para além da informação científica que contêm, identificavam os seus autores e bem assim as instituições e laboratórios que os financiavam entre os quais as requerentes, o que também não se mostra controvertido.”
30. Ora, sobre o poster em causa, cuja cópia consta do doc. n.º 3 junto com a Oposição, pode ler-se na declaração de CC junto pela Recorrida em 30-12-2024 como doc. n.º 1, o seguinte: “7. O YY também me mostrou um poster intitulado “Effects of ...39, an oral, direct fator Xa inhibitor, on thrombin generation in healthy volunteers” (Efeitos do ...39, um inibidor oral direto do fator Xa, na produção de trombina em voluntários saudáveis) (o “Poster”). Este tem os mesmos autores que o #3003 (embora note que alguns dos nomes estão escritos de forma diferente). Este é o poster que apresentei na 45ª Reunião da ASH em San Diego. Lembro-me de estar com o Poster na sala principal da conferência durante a sessão de posters e de falar com os participantes da conferência sobre o Poster.” (sublinhados nossos).
31. Ou seja, resulta claro daquela declaração do próprio autor do documento, com data de 14 de março de 2023, que o documento apresentado na conferência de San Diego é o documento intitulado "Effects of ...39, an Oral, Direct FXa Inhibitor, on Thrombin Generation in Healthy Volunteers", que consta como doc. 3 da Oposição e se mostra descrito como tal no facto ora controverso.
32. Não podem, pois, haver dúvidas a este respeito, tal como entendeu e bem o tribunal a quo. Aliás, tal como salienta a Recorrida, o doc. n.º 3 da Oposição não foi objeto de qualquer impugnação da parte das Recorrentes na resposta a “excepções e documentos” que oportunamente apresentaram em 04-07-2024, note-se, num total de 83 páginas.
33. Aliás, em tal requerimento de 04-07-2024 as Recorrentes referem-se ao dito poster, além do mais, da seguinte forma: “As considerações acima, baseadas no resumo CC, aplicam-se igualmente ao poster de CC que a Requerida juntou como “Documento 3”, “O perito na especialidade não extrai do poster qualquer informação substancialmente nova em relação ao que já foi divulgado nos resumos da CC, que foram analisados em pormenor pelo IEP. A introdução do poster também não melhora os argumentos de invalidade da Requerida.” Ou seja, as Recorrentes aceitaram o documento n.º 3 da Oposição como aquele que tinha sido apresentado na conferência relevante. E realmente não se vislumbra qualquer razão para se entender de forma diversa.
34. É, pois, manifesto que este ponto do recurso deve improceder.
iii. Deve alterar-se a redação do facto n.º 1.70?
35. Antes do mais, recorde-se aqui o exato teor do facto ora controverso: “O Poster CC refere-se a um estudo clínico de fase I patrocinado pela EMP01... para determinar a eficácia do ... administrado oralmente na inibição da geração de trombina em sujeitos saudáveis do sexo masculino.”
36. Alegam aqui as Recorrentes, que o poster de CC não se refere a um estudo clínico com vista a determinar a eficácia do ..., o que é impossível em fase I, como esclarece a testemunha da Recorrida, Prof. DD, minuto [02:10:07], p. 136/142. Além do mais, os estudos de CC são de cariz académico – cfr. Prof. BB, minuto [01:33:26] (p. 63/124). e Prof. EE, minuto [00:15:48] (p. 10/142). Como tal, a redação deste facto deverá contar com as eliminações com sublinhado e acrescentos a negrito: O Poster CC refere-se a um estudo clínico de fase I e de cariz académico patrocinado pela EMP01... para determinar a eficáciao comportamento do ... administrado oralmente na inibição da geração de trombina em sujeitos saudáveis do sexo masculino, através de testes experimentais.
37. A EMP02... concorda que resultou provado: i) que o estudo realizado por CC et al. tem um cariz académico e que ii) esse estudo não pretendeu determinar a eficácia do ..., mas não concorda nem concede que tenha resultado provado que os testes realizados no âmbito do estudo de CC fossem experimentais. A considerar-se, assim, necessário alguma alteração ao facto em causa, propõe: “O Poster CC refere-se a um estudo clínico de fase I e de cariz académico patrocinado pela EMP01... pela para determinar os efeitos do ... administrado oralmente na inibição da geração de trombina em sujeitos saudáveis do sexo masculino.”
Apreciação da questão por este tribunal
38. Conforme se denota do enquadramento dos termos da questão supra exposta em 35-37, cremos que as partes apenas discordam quanto à natureza experimental do estudo efetuado por CC.
39. As partes estão de acordo que o estudo clínico em causa é de cariz académico e visava apurar, não a “eficácia” do ..., mas sim o comportamento ou os efeitos deste medicamento na inibição da geração de trombina em sujeitos saudáveis do sexo masculino.
40. Há, pois, que alterar o facto em causa, nestes dois pontos, precisando que o estudo tinha cariz académico e visava determinar os efeitos do ... administrado oralmente na inibição da geração de trombina em sujeitos saudáveis do sexo masculino. Esclarece-se que cremos que a expressão “os efeitos” é mais adequada que “comportamento” porquanto, como se sabe, a Ciência visa apurar, além do mais, relações de causa e efeito, como nos parece ser o caso. Parece-nos, pois, que o termo “efeitos” é o que traduz de forma mais clara e precisa a realidade em causa. Aliás, o próprio documento em causa, refere o seguinte: “The aim of this study was to evaluate the effect of orally administered ...39 on thrombin generation in healthy male volunteers.” (sublinhados nossos).
41. Já quanto à natureza “experimental” do dito estudo, as Recorrentes apenas sublinham na motivação do recurso que, segundo o depoimento de EE, este terá dito “Sim, creio que tenho uma boa ideia relativamente a esse teste, ao ETP, uma vez que fui eu que o inventei em 2000. E, aliás, para minha grande frustração, é um teste que ainda não se tornou rotina clínica a nível laboratorial e, aliás, em 2005 era de facto completamente desconhecido.” (cf. p. 28 das alegações de recurso).
42. Tais críticas do Professor EE foram objeto de refutação no doc. n.º 1 junto em 30-12-2024, supra aludido. Em tal documento, diz-nos o Professor CC, além do mais, o seguinte:
“58. O Professor EE descreve como o ensaio ÅÔÑ não era, de um modo geral, reconhecido, sendo necessário um elevado nível de competência e reagentes especializados para realizar o ensaio. Como resultado, havia muito poucos laboratórios que podiam realizar o ensaio. Afirma ainda que mesmo a interpretação dos resultados do ensaio ÅÔÑ não seria do conhecimento geral comum de um perito mediano na matéria em 2005, que, por conseguinte, teria tido muitos problemas em interpretar o significado dos dados contidos nos Resumos. 59. As críticas do Professor EE à fiabilidade e utilidade do ensaio ÅÔÑ parecem ser um pouco contraditórias com os seus próprios trabalhos publicados antes de 2005. Em primeiro lugar, noto que o Professor EE tinha estado a publicar o ensaio ÅÔÑ desde pelo menos 1995. 60. Em segundo lugar, noto que os artigos do Professor EE sugerem que o ensaio ÅÔÑ tem uma ampla aplicabilidade e pode ser utilizado para monitorizar anticoagulantes. Por exemplo, em 1997, o resumo de um artigo 8 na Thombosis & Haemostasßs afirmava que o ÅÔÑ “foi proposto como parâmetro para a hipercoagulabilidade plasmática e para monitorizar o tratamento anticoagulante'
… 67. Nem o Professor EE nem a Professora BB apresentam qualquer crítica específica ao ensaio PICT para além da falta de correlação/validação clínica. Como explicado pela Professora BB no parágrafo 39, o ensaio estava disponível comercialmente em 2005, e o Poster mostra que utilizámos esse kit comercial no Estudo. Tendo em conta essa disponibilidade comercial, o perito na técnica não teria tido qualquer dificuldade em reproduzir este ensaio. O perito na técnica também compreenderia facilmente o ensaio PICT.”
43. É neste contexto, portanto, que melhor se compreendem as seguintes asserções feitas na sentença recorrida:
“sobre as declarações de CC, a verdade é que a informação constante dos documentos científicos supra referidos e que eram públicos e conhecidos à data da prioridade da PT ...61, motivo pelo qual faziam parte do estado da técnica mais próximo, explicada e esclarecida em audiência pelas testemunhas Dr. DD, Dr. FF, Dr. JJ, Dr. KK e Dr. II, porquanto prestadas de forma espontânea, segura, clara, sem subterfúgios ou duplo sentido e, especialmente com recurso à razão de ciência, assente na sua experiência profissional e conhecimento dos factos de que falavam, conjugado com as declarações de CC, autor do Poster CC e do Abstract CC #3003, juntos aos autos em 30.12.2024, não deixou dúvidas ao tribunal quanto à matéria de facto indiciada.”
44. E ouvidas as gravações dos depoimentos referidos pelo tribunal a quo, não há como discordar de tais considerações e conclusões, em essência, que a informação constante dos documentos científicos em causa, eram públicos e conhecidos à data da prioridade da PT ...61, motivo pelo qual faziam parte do estado da técnica mais próximo. Neste contexto há que concluir, aliás, que o tribunal a quo procedeu a uma análise minuciosa e imparcial dos meios de prova produzidos, evidentemente complexos.
45. Assim sendo, não se vislumbram quaisquer razões para alterar o facto n.º 1.70 para aditar a expressão “através de testes experimentais”.
46. O facto provado n.º 1.70 passará, assim, a ter a seguinte redação: “O Poster CC refere-se a um estudo clínico de fase I e de cariz académico patrocinado pela EMP01... para determinar os efeitos do ... administrado oralmente na inibição da geração de trombina em sujeitos saudáveis do sexo masculino.”
iv. Deve considerar-se não provado o facto n.º 1.73 ou alterar-se a sua redação?
47. O facto controverso ora em causa é do seguinte teor: “As avaliações sobre a eficácia do ... basearam-se em três testes: PITT (tempo de geração de trombina induzida por plaquetas), ETP (potencial endógeno de trombina) e PICT (tempo de coagulação induzida por plaquetas).”
48. Nesta sede as Recorrentes entendem que o facto ora em causa deve ser considerado não provado ou, no mínimo, ser adotado com a seguinte redação (eliminações com sublinhado e os acrescentos a negrito): As avaliações sobre a eficáciainibição de geração de trombina do ... tal como analisadas no estudos de CC basearam-se em três testes: PITT (tempo de geração de trombina induzida por plaquetas), ETP (potencial endógeno de trombina) e PICT (tempo de coagulação induzida por plaquetasprotrombinase), que vem erroneamente descrito no Poster de CC.” Para tanto apoiam-se nos testemunhos da Prof. BB e Prof. EE, donde destacam que o teste PICT designa “tempo de coagulação induzida por protrombinase” e não, como referem o Poster CC e os respetivos Resumos, ao “Tempo de Coagulação Induzido por Plaquetas”.
49. Por seu turno, entende a Recorrida que “[a]o contrário do que a EMP01... invoca, o facto 1.73 resulta provado nos termos da redação dada pelo Tribunal, com base nos elementos de prova que fundamentaram a decisão quanto a esse facto.”. Mais acrescenta: “O facto de o nome do teste PITT conter um erro nestes documentos é irrelevante para o que está em causa na decisão do Tribunal quanto ao que deu como provado no facto 1.73, o qual tem por base tão-só o teor dos documentos juntos aos autos.”
Apreciação da questão por este tribunal
50. Conforme vimos na resposta à questão anterior, o tribunal a quo baseou-se para a prova deste facto numa análise imparcial e detalhada de um acervo probatório complexo, constituído pela documentação e depoimentos ali descritos. Inexistem, pois, razões para dar este facto como não provado.
51. Por seu turno, conforme se denota do enquadramento da questão, as partes estão de acordo que o teste PICT refere-se a “tempo de coagulação induzida por protrombinase” (e não plaquetas).
52. Aliás, tal erro de terminologia já tinha sido relevado pelo Prof. CC na declaração n.º 1, junto em 30-12-2024, nos seguintes termos (nota de rodapé n.º 4): “Nos Resumos e no Poster, o ensaio PICT é descrito como o tempo de coagulação induzido por plaquetas. No entanto, isto é incorreto, como confirma a descrição do ensaio PICT e, em particular, a referência na nota de rodapé 3, no Poster. A este respeito, concordo com o comentário no parágrafo 33 da declaração do Professor EE.”
53. Há, pois, que alterar o facto em conformidade.
54. Já quanto ao pedido de eliminação do termo “eficácia”, em harmonia com a resposta à questão precedente, julga-se que também deve ser deferido.
55. O facto em causa, passará, assim, a ter a seguinte redação: “As avaliações sobre os efeitos do ... basearam-se em três testes: PITT (tempo de geração de trombina induzida por plaquetas), ETP (potencial endógeno de trombina) e PICT (tempo de coagulação induzida por protrombinase).”.
v. Deve considerar-se não provado o facto n.º 1.99?
56. O teor do facto ora controverso é o seguinte: “O Formulário de Consentimento do paciente desse estudo ..., datado de 22 de novembro de 2004, mas aprovado ainda antes dessa data, foi disponibilizado ao público antes da data de prioridade da EP ...61.”.
57. Alegam aqui as Recorrentes que “Não existe qualquer elemento probatório que justifique este facto. A testemunha da Recorrida, Prof. FF, em momento algum confirmou ter disponibilizado o Doc. n.º 12 da Oposição ao público. Aliás, o próprio documento é uma versão de trabalho, com marcas de alterações (track changes) na secção “insurance”, pelo que não é a versão final distribuída, não estando assinada ou preenchida. O documento não se destinava a ser divulgado ao público, nem tornado acessível; pelo contrário, era direcionado ao doente com eventual consulta do seu médico (que está sujeito a confidencialidade)”. Por outro lado, segundo o testemunho do Prof. FF que os primeiros pacientes foram apenas incluídos no estudo em fevereiro de 2005, isto é, após a data da prioridade (31-01-2005).
58. Por seu turno, segundo a Recorrida, o facto em causa encontra respaldo nos elementos de prova indicados pelo tribunal a quo, em especial documentos 9 a 13 da Oposição, depoimento do Prof. FF e na declaração escrita datada de 14 de outubro de 2024, do Dr. QQ.
Apreciação da questão por este tribunal
59. Neste âmbito, pode ler-se na sentença recorrida: “os factos descritos de 1.94 a 1.120 e que se referem ao estudo ... decorrem dos documentos juntos aos autos com os n.ºs 9 a 13 e bem assim o documento “Webposting Clinical Trial Results Synopsis” para o estudo ..., disponível no sítio web da EMP01... .../ ...combinado com o formulário de consentimento informado que expressamente se refere ter como objectivo determinar a dose ideal, referindo-se à toma de um comprimido de libertação diário que funciona rapidamente, não deixam dúvidas de que, antes do pedido da patente ...61, já se sabia e se experimentava o ... como tratamento em doses únicas diárias (cfr. documento n.º 11 e Formulário de Consentimento sob o título “Objetivo do estudo”. Aliás, resulta ainda QQ 2008, página 2242, sob o título “Introdução” que para conceber o estudo ... com a administração de uma vez ao dia de ... para o tratamento da TVP, a equipa de investigadores se baseou na semivida da atividade anti-Xa conhecida e na inibição observada da geração de trombina em seres humanos até 24 horas (e, pese embora tenha sido publicado posteriormente, este artigo é válido na medida em que apenas confirma em que dados, existentes à data, se baseou a equipa de investigadores).”
60. E mais adiante, acrescenta a sentença recorrida: “O tribunal, nesta matéria, também se apoiou nas afirmações do Prof. FF, participante, na qualidade de investigador do estudo ... que esclareceu em que consistia (desenho) o Estudo ...”. Seguidamente, a sentença recorrida conjuga o depoimento do Prof. FF com inúmera documentação, em especial, os Pareceres constantes dos autos (cf. p. 58-59).
61. O dito “Formulário de Consentimento”, em bom rigor, trata do “Patient information and consent form” junto como doc. n.º 12 da Oposição (versão original em holandês e tradução para inglês). Neste doc. n.º 12 consta o seguinte: “The study is conducted to determine the optimal dosage of ...39 compared to the usual treatment with lnnohep and acenocoumarol. Three dosages are being studied: once-daily 20 mg, 30 mg and 40 mg. In several countries, 520 patients will participate in the study, about 50 of them at AZG.” Será, além do mais, a esta passagem que a sentença recorrida se refere quando alude ao título “Objetivo do Estudo” (em inglês, Purpose of the study). Resulta, portanto, deste documento que o estudo se referia ao medicamento conhecido como ... (...39). Mais resulta que estavam a ser feitos estudos sobre a dosagem recomendada, com a toma diária de 20 mg, 30 mg e 40 mg. A identificação deste documento é feita com a referência “AZG version 3.0. 22 November 2004”.
62. Por sua vez, do doc. 13 da Oposição resulta que aquele mesmo documento foi enviado, pelo Hospital Universitário (“Academic”) de ... a uma Comissão (ou Comité) de Ética Médica. Efetivamente, refere-se neste documento n.º 13, logo na primeira página, que a Comissão recebeu: “The written information for subjects entitled Study on the optimal dose of once-daily oral factor Xa inhibitor ...39 in patients with acute deep-vein thrombosis. ... dosefinding study (IMP1 1528) (AZG version 3.0, dated 22 November 2004) with the accompanying consent form” (com sublinhados nossos). Este documento tem a data de 23 de novembro de 2004 e é anterior, portanto, à data da prioridade da patente aqui em causa (31-01-2005).
63. A dita Comissão ou Comité de Ética, naquele mesmo documento n.º 13, emitiu um parecer positivo relativamente ao dito estudo, com base na documentação enviada pelo Hospital, incluindo-se aqui, portanto, o documento n.º 12 da Oposição. E quanto a este documento apenas fez uma observação relativa à parte do seguro: “The AZG/FMW METc has also established that ... obligation set out in Article 7 of the WMO, as further elaborated in the Dutch Medical Research (Human Subjects) Compulsory Insurance Decree (Bulletin of Acts and Decrees 2003, 266), has been correctly implemented.”. Esta observação explica, portanto, porque o documento n.º 12 da Oposição contém rasuras na parte relativa ao seguro. No mais, ou seja, na parte clínica do documento, inexistem quaisquer razões para concluir que o documento possa ter sido objeto de modificações.
64. Quanto à data da efetiva inclusão de pacientes no dito estudo, o depoimento do Prof. FF não é efetivamente claro, porquanto na primeira parte do seu depoimento declarou que os pacientes foram incluídos em fevereiro de 2004 (cf. 00:47:20 a 00:50:26 da instância), ou seja, antes da data de prioridade da EP ...61 (31-01-2005) e, num segundo momento, em fevereiro de 2005 (cf. 00:10:53 da respetiva gravação da contra instância).
65. Quanto à referida data de inclusão de doentes no estudo ... não podem, contudo, persistir dúvidas de que terá sido a 24 de dezembro de 2004, desde logo porque o próprio documento da EMP01... intitulado Clinical Study Synopsis – doc. 11 da Oposição -, assim o diz (“Study Period: Date of first subjects’ first visit: 24 Dec 2004”). Esta data também coincide com o mês indicado no documento n.º 10 da Oposição, disponível num site do governo dos EUA (...). Neste contexto, podemos ter por fidedigna a informação prestada pelo Dr. QQ, médico no Departamento de Medicina Vascular do Centro Académico de Medicina da Universidade ... e investigador principal e presidente do comité diretivo do estudo ..., quando diz: “6.1 Dr ZZ registered the first participant of the ... study on 24 December 2004. Three days later, on 27 December 2004, the first participant was registered at the Academic Medical Centre in ... (AMC). The final version of the patient information and informed consent form of 22 November 2004 was therefore given to patients and signed before January 2005.”
66. Podemos, assim, ter por certo que o documento n.º 12 da Oposição, com ligeiras modificações na parte aludida (relativo ao Seguro ou Insurance), terá sido entregue a pacientes em data anterior a 24 de dezembro de 2004, ou seja, em data anterior à inclusão efetiva do primeiro doente no estudo.
67. É certo que a testemunha AA AOPI e pessoa com experiência jurídico-técnica em matéria de patentes, declarou em audiência o seguinte: “O EPO entende que, mesmo tendo o composto, que é, no fundo, uma invenção da sua mão, o próprio doente não é considerado como um membro do público e que está sob aquele que é um dever de confidencialidade, no âmbito dos ensaios clínicos, e que se assume a priori na área médica.” (respetiva gravação aproximadamente a 00:50).
68. Ou seja, de acordo com aquele entendimento, poder-se-ia aqui discutir se a entrega do documento n.º 12 da Oposição a doentes constitui uma divulgação do estudo ao “público”. Ora, diferentemente das declarações prestadas pela AA, o entendimento do EPO nesta matéria depende das circunstâncias do caso concreto, devendo-se entender, em suma, que quando documentos como o ora em causa são entregues a um doente e este é incentivado a discutir o seu teor com qualquer outra pessoa, nomeadamente, amigos ou outros participantes no estudo, entende-se que há divulgação ao “público” (cf. decisão do Boards of Appeal EPO de 13-09-2017, caso T 0239/16).
69. Ora, se analisarmos a cláusula de confidencialidade constante do documento em referência (doc. 12 da Oposição), conclui-se que a confidencialidade aí descrita é para proteger o doente e não o estudo. Em tal cláusula prevê-se, inclusive, a informação da participação no estudo ao médico pessoal do doente (GP). Não se vislumbra, portanto, do dito documento, quaisquer precauções de confidencialidade do estudo em si mesmo.
70. Compreende-se, assim, a declaração do Dr. QQ do seguinte teor: “The (potential) participants were free to discuss the contents of the study and those documents with e.g. relatives, their general practitioner and other relevant care providers. They were told this. Especially in ..., where I practiced medicine, there were many outspoken patients who would like to consult with someone from their own circle beforehand. That was fine of course.” Tal declaração está em harmonia com o declarado neste âmbito pelo Prof. FF, quer em audiência, quer nas duas declarações escritas juntas aos autos datados de 15-05-2024 e 28-06-2024.
71. Neste contexto, tomando em conta que o referido documento n.º 12, como vimos, não contém quaisquer precauções de confidencialidade do estudo em si (mas apenas dos dados dos doentes), concluímos que inexistem razões para duvidar das declarações do Dr. QQ e Prof. FF nesta sede. As declarações e depoimentos em sentido contrário – Cf. Dr. HH, o Dr. GG e o Dr. ZZ –, não nos mereceram, por isso, credibilidade neste ponto.
72. É, pois, de concluir que a documentação em causa foi disponibilizada ao “público” antes da data de prioridade da EP ...61.
73. Neste contexto, o recurso deve ser aqui julgado improcedente.
vi. Deve considerar-se não provado o facto n.º 1.148?
74. O teor do facto controverso é o seguinte: “Os estudos de MM et al e de CC et al (Abstract e Poster) foram elaborados por investigadores que incluem co-autores da própria EMP01....”
75. Segundo as Recorrentes o facto ora descrito afigura-se irrelevante na medida em que o que é de valorar é o conteúdo da documentação – que é o que o perito analisará – e não a autoridade dos autores do documento.
76. A Recorrida discorda de tal entendimento, desde logo, porque, segundo a mesma e contrariamente ao que a EMP01... infundadamente alega, ao analisar os Posters e os Abstracts de CC e MM, divulgados simultaneamente na mesma Conferência de ASH e publicados no mesmo Livro de Resumos dessa conferência, o perito na técnica não deixaria de levar em conta os respetivos autores e de verificar que muitos deles são colaboradores da EMP01.... E a autoria dos estudos releva porquanto contribui para a credibilidade que o perito na técnica atribui a esses estudos e aos respetivos resultados que são divulgados nos Posters e nos Abstracts. Isto mesmo resulta demonstrado dos depoimentos do Prof. JJ, do Prof. KK e do Prof. II.
Apreciação da questão por este tribunal
77. Não vislumbramos quaisquer razões para eliminar o facto em causa. Sendo a EMP01... uma referência incontornável no mundo da Farmacêutica, a referência que é a si feita no facto controverso tenderá a reforçar a credibilidade dos estudos, tal como salienta a Recorrida.
78. Nestes termos, o facto deverá ser qualificado como um facto instrumental na aceção do artigo 5.º, n.º 2, al. a), do Código de Processo Civil. Tais factos devem ser tomados em conta pelo juiz.
79. Sem necessidade de outras considerações este ponto do recurso deve ser, pois, julgado improcedente.
vii. Devem considerar-se não provados os factos n.ºs 1.117 e 1.118?
80. Os factos ora controversos são os seguintes:
“1.117 A EP ...61 foi concedida com base no facto de o ... ter uma semivida de concentração plasmática igual ou inferior a 10 horas. 1.118 Na altura do pedido da patente EP ...61, a titular da patente (EMP01...) já sabia que a semivida do ... nos pacientes não era, de facto, igual ou inferior a 10 horas, mas superior.”
81. Nesta sede, alegam as Recorrentes, além do mais, que:
“[o] Tribunal a quo interpretou mal a semivida plasmática do ..., que é uma característica intrínseca do composto e não uma limitação adicional. A patente define-a como 4–6 horas em estado estacionário (par. [0017]) e essa é a semivida relevante para o intervalo de dosagem — não a semivida terminal, mais longa, usada indevidamente pelo Tribunal com base nos Docs. 16–18. O Prof. GG confirma que a semivida eficaz é inferior a 10h (em média 6,6h), no seu parecer junto como Doc. n.º 4 à Resposta à Oposição, em particular paras. 13-17, 23, 39-43, 47, 58 e 99 – 104. (…) A análise deve basear-se apenas no conhecimento disponível à data de prioridade, sem interpretações retrospetivas. Como tal, os factos 1.117 e 1.118 deverão ser dados como não provados.”
82. Já de acordo com a Recorrida, “[o] facto 1.117 (A EP ...61 foi concedida com base no facto de o ... ter uma semivida de concentração plasmática igual ou inferior a 10 horas) é um facto incontroverso e admitido pela EMP01... que não o impugnou, como aliás não poderia deixar de ser, porque resulta da leitura da própria patente.” Mais alega que o facto 1.118 deve manter-se ou “[q]uando muito, admite-se, sem conceder, a correção do facto 1.118 para a seguinte redação: “A EMP01... já sabia, antes da data de prioridade da EP ...61, que a semivida do ... era mais longa do que as 4-6 horas indicadas na patente, e que era superior a 10 horas na população de idosos.”
Apreciação da questão por este tribunal
83. Segundo a própria Descrição da patente EP ...61 constante dos autos, ““Semivida" é o tempo que leva para que a concentração no plasma ou a quantidade de fármaco no corpo seja reduzida em 50 %”.
84. Que a patente em causa foi concedida com base no facto de o ... ter uma semivida de concentração plasmática igual ou inferior a 10 horas resulta, tal como alega a Recorrida, da própria patente EP ...61.
85. Efetivamente, no Resumo da patente esta é caracterizada nos seguintes termos: “A presente invenção relaciona-se com o campo da coagulação do sangue, mais especificamente, relaciona-se com um método de tratamento de um distúrbio tromboembólico através da administração uma vez por dia de um inibidor direto do fator Xa numa forma farmacêutica oral a um paciente que dele necessite, em que o inibidor do fator Xa tem uma concentração de semivida no plasma indicativa de um intervalo de administração de bid ou tid, por exemplo de 10 horas ou menos.”.
86. Não se vislumbram, assim, razões para dar o facto n.º 1.117 como não provado. O mesmo resulta da própria patente tal como está registada.
87. Mas qual a importância deste marco temporal da substância no organismo humano, ou seja, da semivida? Vejamos.
88. O ... é referenciado como um inibidor do fator Xa. O fator Xa, tal como descrito na patente, é fundamental no processo de coagulação sanguínea, que é um mecanismo de defesa do organismo contribuindo para “selar” defeitos da parede dos vasos sanguíneos rapidamente e de forma fiável. O fator Xa liga as duas vias de coagulação, a intrínseca e extrínseca, em concreto: “A protéase serina Xa ativada cliva a protrombina em trombina. Por sua vez, a fibrina, trombina resultante, cliva o fibrinogénio em um coagulante fibroso / gelatinoso.” Ou seja, ao inibir o fator Xa bloqueia-se a formação de coágulos ou, mais rigorosamente, inibe-se o processo de clivagem da protrombina em trombina e do fibrogénio em fibrina, um coagulante.
89. Segundo o referido Resumo da patente, o inibidor do fator Xa, o ..., tem uma concentração de semivida no plasma indicativa de um intervalo de administração de bid (administração duas vezes/dia) ou tid (administração três vezes/dia), por exemplo de 10 horas ou menos.
90. Para melhor compreendermos o que aqui está em causa, convirá, ainda, recordar os problemas técnicos descritos na patente e a que este visava responder. Conforme resulta da respetiva Descrição, na terapêutica e profilaxia de distúrbios tromboembólicos é, em primeiro lugar, feito o uso da heparina, administrada por via intravenosa ou subcutânea. No uso da heparina são apontados outros dois problemas: “a heparina inibe uma pluralidade de fatores da cascata da coagulação do sangue ao mesmo tempo, a ação não é seletiva. Para além disso, existe um elevado risco de hemorragia.”
91. Ainda segundo a Descrição, “uma segunda classe de anticoagulantes são os antagonistas da vitamina K. Estes incluem, por exemplo, as 1,3-indanedionas, e em especial compostos tais como varfarina, fenprocoumon, dicumarol e outros derivados de cumarina que inibem a síntese de vários produtos de certos fatores de coagulação dependentes da vitamina K no fígado de uma forma não seletiva.” Contudo, nestes “o início da ação é muito lento (tempo de latência para o início de ação de 36 a 48 horas). É possível administrar os compostos por via oral; no entanto, devido ao elevado risco de hemorragia e ao limite do índice terapêutico, são necessários um ajuste individual demorado e monitorização do paciente.”
92. É, pois, neste contexto problemático que o ... é apresentado como solução técnica: “Surpreendentemente, verificou-se agora em pacientes de medicação frequente que a administração oral uma vez por dia de um inibidor direto do fator Xa com um tempo de concentração de semivida no plasma de 10 horas ou menos demonstrou eficácia quando comparada ao tratamento convencional e, ao mesmo tempo, foi tão eficaz como depois da administração duas vezes por dia (bid).”.
93. Mais resulta da Descrição: “De um modo geral, a aplicação oral é a via preferida de administração de um fármaco, e é desejável um regime de dosagem menos frequente. Em particular, é preferida a aplicação por via oral uma vez por dia devido à conveniência favorável para o paciente e, por razoes de conformidade. No entanto, este objetivo é, por vezes, difícil alcançar, dependendo do comportamento e de propriedades específicos da substância de fármaco, especialmente a sua concentração de semivida no plasma.”
94. Mais esclarece a Descrição: “Quando a substância de fármaco é aplicada em não mais do que em uma quantidade terapeuticamente eficaz, o que é geralmente preferido a fim de minimizar a exposição do paciente a essa substância de fármaco a fim de evitar possíveis efeitos secundários, o fármaco deve ser administrado aproximadamente a cada semivida”.
95. Resulta, portanto, destas considerações que a semivida é o tempo ideal aproximado em que geralmente deve ser administrado um medicamento. Tal conclusão é, aliás, intuitiva: se a semivida corresponde ao tempo que leva para que a concentração no plasma ou a quantidade de fármaco no corpo é reduzida em 50 %, em princípio deveria então tomar-se uma nova dose do medicamento em tal momento, ou seja, aproximadamente a meio da vida da substância absorvida pelo organismo e assim sucessivamente.
96. Estas considerações intuitivas assumem relevo. Aliás, nesta sede salienta a Recorrida: “Compreende-se a razão que levou a EMP01... a não informar o IEP sobre a correta semivida do ..., porque se o tivesse feito a patente EP ...61 não teria sido concedida pelo IEP, porque então tornar-se-ia óbvio que o ... seria adequado para uma administração de uma vez por dia, como reivindicado na patente!”
97. Em essência, pode-se concordar com esta última asserção. Efetivamente, perante uma semivida curta, uma solução técnica para o uso eficaz da substância em causa, passaria por tomas do tipo bid ou tid, ou seja, duas ou três vezes por dia. Em alternativa, poder-se-ia aventar a hipótese de um comprimido de libertação prolongada, para compensar a semivida curta. Já se a semivida fosse mais próxima das 12 horas, ou seja, metade de 24/h, uma toma diária seria logicamente dedutível de tal característica. Mas neste caso a “invenção” seria “óbvia” para um perito da especialidade, ou seja, careceria de “atividade inventiva”.
98. Neste contexto, guiando-nos pela Descrição da patente, era realmente surpreendente que o ... pudesse ser tomado apenas uma vez por dia, considerandoum tempo de concentração de semivida no plasma de 10 horas ou menos, sem perder a sua eficácia terapêutica.
99. E é neste contexto que tribunal a quo afirmou em sede de motivação do facto 1.118, o seguinte: “Aqui chegados é possível concluir que a EP ...61 foi concedida com base no facto de o ... ter uma semivida de concentração plasmática igual ou inferior a 10 horas, mas na altura do pedido da patente EP ...61, a titular da patente (EMP01...) já sabia que a semivida do ... nos pacientes não era, de facto, igual ou inferior a 10 horas, mas superior, motivo pelo qual realizou este estudo nesta data.” (sublinhados nossos).
100. E mais adiante refere a sentença recorrida: “Isto significa que a conclusão explícita no Poster CC de que o ..., com uma semivida terminal de 9-12 horas, parece ser adequado para uma dosagem de uma vez ao diz, teria sido seriamente considerada pelo perito na técnica, o que também leva à conclusão que a EMP01... já sabia, antes da data de prioridade da EP ...61, que a semivida do ... era mais longa do que as 4-6 horas indicadas na patente e já sabia que o ... era eficaz e seguro para ser administrado como um anticoagulante uma vez ao dia, sob a forma de comprimidos de libertação rápida, o que, aliás, também é consistente com o facto de o estudo ... não exigir injecções subcutâneas de lnnohep ou a monitorização pelo departamento de trombose nos primeiros dias de tratamento e do mesmo ter sido desenhado com doses únicas diárias de 20 mg, 30 mg e 40 mg, antes da data da prioridade.” (sublinhados nossos).
101. Para compreendermos a referência da sentença recorrida a um tempo de semivida de 4 - 6 horas, é necessário recordar que na Descrição da patente é dito: “Para o (I) uma concentraçao de semivida no plasma de 4 - 6 horas foi demonstrada no estado estacionário em seres humanos num estudo de escalonamento de dose múltipla (D. MM et al., Multiple dose escalation study investigating the pharmacodynamivs, safety, anda pharmacokinetics of ...39, na oral, directt Factor Xa inhibitor, in healthy male subjects, 102: Abstract 3004).”
102. Mas como é que o tribunal a quo concluiu que a EMP01... já sabia, antes da data de prioridade da EP ...61, que a semivida do ... nos pacientes não era, de facto, igual ou inferior a 10 horas, pelo menos em muitos casos?
103. Ora, o poster CC que, como sabemos, foi publicamente apresentado numa conferência em 2003, refere na Introdução, o seguinte: “uma semivida terminal de 9-12 horas”. Como vimos, esta referência foi tomada em conta na sentença recorrida. Note-se, por seu turno, que o poster CC, tal como indicado no respetivo canto inferior esquerdo, foi patrocinado pela própria EMP01....
104. Mais resulta, conforme alegado pela Recorrida, que na Declaração escrita do Prof. CC de 28-06-2024 (Doc. 4 do requerimento da EMP02... de 30.12.2024), é afirmado o seguinte: “19. Em segundo lugar, devo salientar que não calculámos a semivida a partir dos nossos próprios dados. A semivida é indicada na secção de introdução e não na secção de resultados, e a fonte desta citação foi a informação fornecida pela EMP01..., a partir de dados já disponíveis (embora não publicados).” Analisado este documento, confirma-se esta asserção. Ou seja, tudo indica que a EMP01... efetivamente sabia, antes da data da prioridade (31-02-2005), que a semivida podia ser superior a 10h.
105. E não se diga contra estas evidências, na esteira do alegado pelas Recorrentes, que o que estava em causa na patente era a semivida efetiva e não a terminal. A própria patente, tal como realça a Recorrida, quando faz referência a uma semivida de 4 – 6 horas, cita o Abstract 3004, da autoria da Prof.ª MM. Ora, em tal Abstract, as 4 – 6 horas de semivida, são relativas ao “terminal half life”.
106. E, se dúvidas ainda houvesse a respeito do conhecimento prévio de que a semivida do ... era mais próxima de 12h ou mais, pelo menos em alguns casos - principalmente nas pessoas mais idosas, pelas razões explicadas pelo Prof. DD no seu depoimento -, bastaria atentar-se, como atentou o tribunal a quo, nos demais estudos publicados em 2005 pela Prof.ª MM, investigadora da EMP01....
107. Como afirma a sentença recorrida: “Contribui ainda para esta convicção o teor dos artigos publicados no final de 2005, em que o próprio MM referiu o seguinte sobre a semivida terminal do ...: Entre 7 e 17 horas, após doses únicas de 10-80 mg em sujeitos jovens saudáveis (MM 2005 (single doses)), (cfr. Documento 16 [da Oposição]). Entre 5,7 e 9,2 horas após doses múltiplas de 5-30 mg em jovens saudáveis (MM 2005 (multiple doses)), (cfr. Documento 17 [da Oposição]).
108. É certo que tal documentação é já posterior à data da prioridade. Contudo, como diz e bem a sentença recorrida, “considerando que estes artigos de MM foram publicados pouco depois da data de prioridade da EP ...61 (ainda em 2005) e que a medição da semivida terminal do ... foi obviamente realizada muito antes dessa data, pode concluir-se que MM, que é um dos inventores da EP ...61, já tinha conhecimento dos resultados sobre a semivida do ... à data de prioridade da patente.”
109. Esclarecemos, ainda, que segundo o aludido depoimento do Prof. DD, os fármacos (entre outros) são expelidos do organismo humano, em importante medida, pela atividade dos rins ou fígado. E como esclarece o Senhor Professor: “a depuração do rim, feita através do rim, é mais lenta com o tempo. Quando se envelhece, como é o meu caso, esta depuração feita através do rim é mais lenta. Isto implica que a eliminação que nós fazemos neste caso do ..., ou seja, ele é depurado em 30% através dos rins, e esta eliminação, quando a pessoa fica mais idosa é excretada muito mais lentamente do que quando se é mais jovem” (cf. aproximadamente a 00:47 da respetiva gravação). Obviamente que este tipo de informação é de conhecimento de qualquer médico ou farmacólogo. Ou seja, qualquer especialista da área ao saber que a semivida de determinada substância é de X horas em jovens tenderia a conceber que a semivida em pessoas mais idosas seria significativamente superior.
110. Por fim, se dúvidas ainda houvesse, e para esclarecer o que quis dizer o tribunal a quo quando refere “a titular da patente (EMP01...) já sabia que a semivida do ... nos pacientes não era, de facto, igual ou inferior a 10 horas, mas superior, motivo pelo qual realizou este estudo nesta data”, há que atentarnos esclarecimentos prestados pelo Prof. FF.
111. Obviamente que o tribunal a quo está a referir-se aqui ao estudo .... Como vimos, o objetivo do dito estudo, conforme descrito no doc. 12 da Oposição, era determinar a dose recomendável de ... (...39), tendo o estudo incidido sobre tomas diárias de 20 mg, 30 mg e 40 mg. O estudo foi encomendado pela própria EMP01... e os primeiros doentes incluídos foram-no, como vimos, em 24 de dezembro de 2004 (cf. a nossa resposta supra, à impugnação do facto 1.99).
112. É, portanto, necessário compreender os conhecimentos de base, de que partiram os especialistas que conduziram aquele estudo, ou seja, o que um perito da área já sabia ou podia saber. Neste âmbito, o depoimento do Prof. FF afigura-se ser de uma importância elevada, porquanto, conforme alude a sentença recorrida, foi participante, na qualidade de investigador do estudo ....
113. De notar que este estudo ... era já de fase II, ou seja, feita em doentes reais, visando, neste caso, o tratamento efetivo de pacientes com distúrbios tromboembólicos. Ora, conforme esclarece o Prof. FF (v. gravação, aproximadamente a partir de 00:56), as condições de segurança num estudo de fase II têm de ser elevadas, sob pena de comprometer-se o futuro do medicamento. Ou seja, caso houvesse complicações derivadas do uso experimental do medicamento, por exemplo, embolias pulmonares, logicamente que tal complicaria, em muito, o futuro comercial do mesmo. Ora, três dos 4 braços do estudo envolviam a toma de uma única dose diária de ... (o quarto braço usava o tratamento convencional, nomeadamente, para comparação). Tal significa que a informação já existente naquele momento, providenciava já uma margem de segurança razoável para tal estudo. A informação que assegurava tal margem de segurança era, desde logo, um estudo anterior, também de fase II, chamado ... (no qual a testemunha não participou). Tal estudo anterior, apesar de não publicado, era do conhecimento dos investigadores do .... Inexistem razões para duvidar deste conhecimento porquanto, no documento n.º 12 da Oposição, ou seja, na informação que foi prestada aos participantes no estudo ..., consta o seguinte: “Another study determined the optimal dosage of ...39 for the prevention of thrombosis in patients, who underwent hip replacement surgery”. Tal referência a um estudo que envolveu doentes submetidos à substituição da anca só pode referir-se, portanto, ao estudo .... Por outro lado, como vimos na nossa resposta à impugnação do facto n.º 1.99, o Comité de Ética emitiu um parecer positivo relativamente ao estudo ..., o que reforça a convicção no sentido de já existir naquele momento margens de segurança razoáveis e uma expetativa de sucesso do estudo.
114. Os ditos investigadores sabiam, portanto, que uma toma diária tinha já sido experimentado no ..., revelando bons resultados (cf. aproximadamente a partir de 01:04 da respetiva gravação). Tais resultados eram, portanto, uma base importante para que o estudo ... incidisse, com uma razoável margem de segurança, sobre a toma de uma única dose diária de ... pelos doentes, variando apenas nas respetivas quantidades (20 mg, 30 mg e 40 mg).
115. É, pois, neste contexto probatório, admite-se, complexo, que o tribunal a quo pôde afirmar, com a certeza exigida pelo Direito, “a titular da patente (EMP01...) já sabia que a semivida do ... nos pacientes não era, de facto, igual ou inferior a 10 horas, mas superior, motivo pelo qual realizou este estudo nesta data”.
116. O raciocínio do tribunal a quo, numa matéria evidentemente complexa, afigura-se-nos, em essência, correto.
117. Admitimos, contudo, que a redação do facto provado n.º 1.118 proposta pela Recorrida, e pelas razões aqui expostas, é a que melhor retrata a realidade.
118. Concluímos, pois, que o facto provado n.º 1.118, deverá passar a ter a seguinte redação: “A EMP01... já sabia, antes da data de prioridade da EP ...61, que a semivida do ... era mais longa do que as 4-6 horas indicadas na patente, e que era superior a 10 horas na população de idosos”.
viii. Devem considerar-se não provados os factos n.ºs 1.107, 1.119 e 1.120?
119. Os factos ora em causa são os seguintes:
“1.107 As dosagens uma vez ao dia de ... foram administradas sob a forma de comprimidos de libertação rápida 1.119 Todas as características da reivindicação 1 da EP ...61 são divulgadas no Formulário de Consentimento do estudo .... 1.120 O Formulário de Consentimento divulga que o ... foi administrado uma vez ao dia sob a forma de comprimidos de libertação rápida para o tratamento da TVP, uma doença tromboembólica.”
120. A Recorrentes alegam aqui, em suma, que: “O Tribunal baseia-se num estudo cujos resultados são pós-publicados, constantes de um artigo de 15 de setembro de 2008 (Doc. n.º 9 da Oposição) como confessa a Requerida no artigo 72.º da sua Oposição, pelo que não faz parte do estado da técnica. Em qualquer caso, os documentos não revelam nem sugerem o ensinamento técnico da patente de forma prejudicial à novidade – Declaração ajuramentada de Dr. HH, Doc. n.º 1 com o Requerimento de Resposta à Oposição.”
121. Já segundo a Recorrida, “[n]a ausência de tal prova em contrário, perante as declarações de QQ e do Prof. FF, estas últimas corroboradas na audiência – cf. minutos 00:13:22 a 01:15:23 e 01:20:29 a 01:20:50 -, o Tribunal bem andou ao considerar provado que no estudo ... o ... foi administrado sob a forma de comprimidos de libertação rápida.” Acresce que o Formulário de Consentimento contém dados que divulgam implicitamente que a utilização do ... no tratamento da trombose venosa profunda seria segura e eficaz para os doentes.
Apreciação da questão por este tribunal
122. O facto 1.107 refere-se ao uso de ... no estudo ... administradas, portanto, através de comprimidos de libertação rápida.
123. Este facto é confirmado, pelo dito Formulário de Consentimento, mais rigorosamente, pelo documento de Informação do Paciente e formulário de consentimento (Patient information and consent form - doc. 12 da Oposição), quando refere “This anticoagulant, ...39, is available in tablet form, is taken once a day and works quickly.”. Já o poster CC descrevia na Introdução o ...39, ou seja, o ..., como de absorção rápida após ingestão oral (rapidly absorbed after oral administration). Sobre os referidos efeitos rápidos do comprimento, mais esclareceu o Prof. FF que tal levaria de imediato a concluir que se trata de um “comprimido de libertação rápida” (cf. 01:13:22 e ss. da respetiva gravação), o que nos parece de acordo com o conteúdo semântico normal da expressão “rápido”, inexistindo, assim, razões para duvidar desta conclusão.
124. Não vemos, pois, quaisquer razões para colocar em causa o facto 1.107.
125. No âmbito dos outros factos ora controversos, há que recordar o teor das reivindicações da patente:
REIVINDICACÕES
1. O uso de um comprimido de libertação rápida do composto ... para o fabrico de um medicamento para o tratamento de um distúrbio tromboembólico, administrado não mais do que uma vez por dia durante pelo menos cinco dias consecutivos, em que o referido composto tem uma concentração de semivida no plasma de 10 horas ou menos, quando administrado oralmente a um paciente humano.
2. A utilização, de acordo com o reivindicado na reivindicação 1, em que o distúrbio tromboembólico e o enfarto do miocárdio com elevação do segmento ST (STEMI), enfarto do miocárdio sem elevação do segmento ST (NSTEMI), angina instável, reoclusão após angioplastia ou bypass aortocoronário, embolia pulmonar, trombose venosa profunda ou acidente vascular cerebral.
126. Destas reivindicações retiram-se, portanto, as seguintes características:
a) Comprimido de libertação rápida;
b) Para o tratamento médico de um distúrbio tromboembólico;
c) Administrado não mais do que uma vez por dia,
d) Durante pelo menos cinco dias consecutivos;
e) Em que o composto tem uma concentração de semivida no plasma de 10 horas ou menos.
127. Nesta sede é curioso notar que o documento ora em causa, segue uma lógica muito próxima da Descrição da patente EP ...61 (veja-se a nossa resposta à impugnação dos factos n.ºs 1.117-1.118). Após descrever os distúrbios tromboembólicos (DVT ou deep-vein thrombosis), passa a enunciar os problemas associados aos medicamentos então usados, a saber uma heparina de baixo peso molecular – Innohep –, conjugado com acenocoumaral (um derivado de cumarina). Do uso destes medicamentos resultam dificuldades tais como a necessidade de administração subcutânea e efeitos muito variados do acenocoumaral com a consequente necessidade de monitorização regular (“it is measured regularly with a blood test”).
128. É, pois, neste contexto que seguidamente se descreve o já aludido objetivo do estudo já citado: “A new anticoagulant has been developed to treat deep-vein thrombosis. This anticoagulant, ...39, is available in tablet form, is taken once a day and works quickly. Subcutaneous injections of lnnohep during the first days of treatment and monitoring by the thrombos is service are not necessary.”.
129. Em primeiro lugar, não se diga aqui que a referência ao ...39 não seria percecionado por um potencial perito na especialidade como se referindo à substância ora em causa, ou seja, o .... Esta substância era conhecida, no meio científico-médico, por aquela designação desde, pelo menos, a conferência em 2003 onde foi apresentado o Poster CC e os Abstracts MM. A este propósito veja-se, ainda, Prous Science Drug Data Report de 2004 junta como Anexo 2 da segunda declaração escrita de FF (requerimento da Recorrida de 18.11.2024), onde sob o título “...” é, desde logo, referido o ...39 na nota 7.
130. Mais resulta do doc. 12 da Oposição que o estudo consistia na administração de comprimidos de 20 mg (Grupo 1), 30 mg (Grupo 2) e 40 mg (Grupo 3), uma vez por dia (cf. p. 2). Nas palavras do próprio documento: “To clarify, if you belong to group I, you will take 2 tablets daily, one containing 20 mg of ...39 and the other an inactive substance (called placebo). In group 2, one tablet contains 30 mg of ...39 and the other tablet placebo, while in group 3, both tablets each contain 20 mg (together 40 mg) of ...39.”
131. Nestes termos, é efetivamente de se concluir que o referido documento, divulga as características essenciais das reivindicações supra descritas em 106, als., a) a c).
132. É certo que ainda fica por demonstrar se o documento divulga a toma “durante pelo menos cinco dias consecutivos” e “que o composto tem uma concentração de semivida no plasma de 10 horas ou menos”.
133. Contudo, nestes dois últimos pontos, haverá que concordar com o tribunal a quo quando afirma “[o] facto de o tratamento durar pelo menos cinco dias consecutivos é uma característica implícita para o perito na técnica, uma vez que as doenças tromboembólicas, como a TVP, requerem sempre um tratamento mais prolongado” e, quanto à semivida de 10 horas ou menos, que tal característica é “redundante”.
134. Vejamos mais de perto estas últimas asserções.
135. No que toca à semivida, conforme já vimos aquando da resposta à impugnação dos factos n.ºs 1.117-1.118, o tempo de 10h ou menos é algo enganador, pelo menos quanto a pessoas mais idosas, o que já era do conhecimento da EMP01.... No mais, esta característica é redundante, conforme declarou em julgamento o Prof. GG (cf. 01:57:47 da gravação) e a Dr.ª AA (cf. a partir de 00:29:00 da gravação).
136. Quanto à dita redundância, a própria decisão do Boards of Appeal do EPO, na decisão de 27-01-2021, T 1732/18, junto com o Requerimento Inicial (e naturalmente disponível online: ...), refere o seguinte: “Based on its presentation in the patent in suit, it cannot be inferred that the half-life parameter is supposed to be an absolute criterion (i.e. that the half-life is required to be ten hours or less in all humans or in all patients with thromboembolic disorder under any circumstance). Nor can it be inferred that the plasma concentration half-life has any relevance for the implementation of the treatment in individual patients.” Neste seguimento, concluiu a Câmara Técnica do IPE que tal característica é efetivamente redundante, conclusão com a qual não podemos deixar de concordar.
137. No que concerne ao período de cinco dias de tratamento consecutivo, também se concorda com o tribunal a quo quando afirma que é uma característica implícita para o perito na técnica, uma vez que as doenças tromboembólicas, como a TVP, requerem sempre um tratamento mais prolongado. A este propósito o próprio estudo ... previa um período de tratamento de três meses, ou seja, 12 semanas (cf. doc. 12 da Oposição, p. 2). No estudo subjacente ao Abstract 3004 MM o ... foi também foi administrado por um período de cinco dias, o que também coincide com a informação do aludido Prous Science Drug Data Report de 2004.
138. Conclui-se, pois, que improcede o recurso nesta matéria.
ix. Devem considerar-se não provados os factos n.ºs 1.121, 1.126 e 1.127?
139. Os factos ora em causa são do seguinte teor:
“1.121 Os medicamentos ... da EMP02... têm uma semivida de concentração plasmática superior a 10 horas na grande maioria dos pacientes a quem esses medicamentos são indicados.
1.126 O ... é quase exclusivamente prescrito a pessoas idosas (com 60 anos ou mais).
1.127 O ... tem uma semivida de concentração plasmática superior a 10 horas na grande maioria dos pacientes a quem é administrado.”
140. Segundo as Recorrentes, esta factualidade devia ter resultado não provada. O Tribunal a quo diz ter-se baseado no depoimento de três testemunhas (Drs. II, JJ e KK), concluindo que 99% das prescrições são para pessoas idosas e que o ... tem uma semivida superior a 10h nesses pacientes. Contudo, os Drs. II e KK são farmacologistas, sem prática de prescrição médica e o único prescritor, Prof. JJ, falou apenas da prevalência em fibrilação auricular, referindo que 70% dos casos ocorrem em maiores de 65 anos, e estimou que 95% das prescrições são para essa indicação específica
141. Segundo a Recorrida: “Há que reconhecer que houve um lapso de escrita na sentença do TPI, dado que as testemunhas ouvidas em audiência que abordaram a prescrição do ... foram o Prof. JJ e o Prof. DD, não o Prof. II e o Prof. KK. De qualquer modo, esse mero lapso de escrita não interfere nem altera o correto julgamento feito quanto aos Factos Provados 1.121, 1.126 e 1.127.”
Apreciação da questão por este tribunal
142. Conforme se lê na sentença recorrida: “O descrito em 1.121, 1.122, 1.126 e 1.127 e 1.148 decorrem do documento n.º 25 junto com a oposição e dos depoimentos das testemunhas da requerida, ouvidas em audiência, designadamente o Dr. II, o Dr. JJ e o Dr. KK, unânimes em afirmar que na sua prática médica 99% das prescrições são para pessoas mais velhas e, nestas, a semivida do ..., seja de que marca for, apresenta uma concentração plasmática superior a 10 horas.”
143. Neste ponto, concordamos mais uma vez com a Recorrida. A factualidade em causa é sustentada pelos depoimentos do Prof. JJ e o Prof. DD, a que acresce o documento n.º 25 da Oposição.
144. Do depoimento do Prof. JJ resulta que as indicações terapêuticas mais frequentes para a administração de ... se referem a doenças típicas de pessoas idosas, como arritmia e embolia cerebral, em que os doentes tomam o ... para a vida toda. De acordo com o Prof. JJ, a população de idosos que toma ... representa cerca de 95% (cf. gravação a partir de 00:05:10). Estas declarações são consentâneas com as regras da experiência comum, donde resulta que as pessoas mais idosas são mais vulneráveis aos tipos de distúrbios descritos pelo Professor.
145. Do depoimento do Prof. DD confirma-se que a semivida do ... é superior a 10 horas nos pacientes idosos, o que não surpreende devido a alterações na capacidade de filtragem dos rins nos idosos. Veja-se, a este propósito, o que já deixamos consignado na resposta à impugnação dos factos n.ºs 1.117-1.118. Mais, o Prof. DD confirmou que, segundo informação estatística, na ... e na ... o ... é administrado a doentes em que em 90% dos casos têm mais de 60 anos (cf. respetiva gravação aproximadamente em 00:54:48), o que também está de acordo com as ditas regras da experiência comum.
146. No doc. 25 da Oposição (numerado como 26), intitulado The Influence of Age and Gender on the Pharmacokinetics and Pharmacodynamics of ...—An Oral, Direct Factor Xa Inhibitor, datado de 2013, são reportadas semividas terminais de 11.7 horas (mulheres jovens), 12.0 horas (mulheres idosas), 6.9 (homens jovens) e 11.1 (homens idosos) (Pág. 252, Tabela 2), o que atesta que nos idosos, que é grande maioria dos pacientes a quem é administrado ..., a semivida é superior a 11 horas, o que harmonioso com as nossas considerações supra na resposta à impugnação dos factos n.ºs 1.117-1.118.
147. Improcede, pois, o recurso.
x. Deve considerar-se não provado o facto n.º 1.149?
148. O facto controverso é do seguinte teor: “Os comprimidos são a forma farmacêutica mais comum de libertação imediata.”
149. Segundo as Recorrentes: “Este facto – que não foi alegado –, bem como a sua fundamentação, não se compreendem. Não se encontra em causa qual a forma farmacêutica mais comum, nem qual a forma de libertação de qualquer uma dessas formas farmacêuticas mais utilizadas nos ensaios de fase I.” O contrário deste facto é o que resulta do depoimento do Prof. GG. Concluem, portanto, que este facto deve ser considerado não provado.
150. Segundo a Recorrida: “Contrariamente ao que a EMP01... alega, o facto dado como provado 1.149 é um facto instrumental relevante à boa decisão da causa”. Mais resulta suportado pelo depoimento do Prof. FF.
Apreciação da questão por este tribunal
151. Cremos que o facto ora controverso pode assumir relevância quando lido com o facto n.º 1.107 e quando o percecionamos no âmbito da Descrição da patente e respetivas reivindicações que indubitavelmente referem um comprimido de “libertação rápida” (em inglês, “rapid-release”).
152. É, portanto, no contexto de tratamentos de condições médicas que visa a patente – distúrbio tromboembólico –, que devemos interpretar o facto ora em causa.
153. É neste contexto que se compreendem as respostas do Prof. FF, quando confrontado com a possibilidade de tratamentos em referência envolverem comprimidos de libertação rápida ou antes de libertação prolongada: “By definition, this medication has to act quickly. It must have a direct action, otherwise, you can bring patients into potential problems if it doesn't work instantly, you don't treat the underlying disease, so it must have the same direct action as low molecular weight heparins. As a first action in the conventional treatment.”
154. Mais se compreende as referências feitas no documento n.º 12 da Oposição, quando este descreve o que naquele momento como sendo os tratamentos convencionais – administração de uma heparina conjugado com um derivado de cumarina, por exemplo, o acenacoumorol. Efetivamente, enquanto a heparina é de ação rápida, o acenacoumorol era de ação lenta (“One drug is low molecular-weight heparin (lnnohep), which works quickly… The other drug (acenocoumarol or Sintrom), in the form of tablets, only works optimally after about a week”).
155. Assim, compreende-se e concorda-se com o depoimento do Prof. FF quando refere: “Do meu lado, então, não haveria qualquer estudo a decorrer na ... nem eu nem nenhum dos meus colegas iriam tratar um paciente que sofre de trombose venosa profunda aguda com um fármaco que não aja de forma instantânea. Porque o tratamento convencional na altura era uma combinação de um fármaco oral que não age de forma instantânea em combinação de baixo peso molecular que age de forma instantânea. Isto é o que nós precisamos para tratar estes pacientes. E nós ao administrar qualquer fármaco experimental então tem que ser um que possa agir de forma imediata.” (00:33:42).
156. Não se vislumbram, assim, quaisquer razões para eliminar este facto.
xi. Deve considerar-se provado o facto não provado n.º 2.14?
157. O facto não provado ora controverso tem o seguinte teor:
“Nenhum dos documentos de última geração contém qualquer indicação, e muito menos justifica uma expetativa razoável de sucesso, de que o ..., com a sua curta semi-vida de apenas 3-6 h, possa ser eficaz e seguro num regime de dose única diária, e muito menos quando administrado como um comprimido de libertação rápida.”
158. Segundo as Recorrentes este facto deve passar a constar dos factos provados por, desde logo, sustentado pelos depoimentos dos Professores GG e BB.
159. A Recorrida discorda de tal entendimento, salientando que trata “de matéria (conclusiva) que incumbia à EMP01... demonstrar e convencer o Tribunal do seu mérito e não, como a EMP01... procura agora em sede de recurso fazer crer, à EMP02....”
Apreciação da questão por este tribunal
160. Quando se refere “documentos de última geração” entendemos que estão aqui incluídos quaisquer documentos divulgados ao público até à data da prioridade, neste caso 31-01-2005.
161. Em tal documentação, portanto, inclui-se os documentos referentes ao estudo ... referidos nos factos provados 1.95 a 1.111.
162. Como vimos na resposta à impugnação do facto 1.99, o documento 12 da Oposição, relativo àquele estudo, deve considerar-se divulgado ao público, antes da data da prioridade, em concreto, a 24 de dezembro de 2004.
163. Ora, como já deixamos consignado, nomeadamente, na resposta à impugnação dos factos n.ºs 1.117 e 1.118, com o estudo ..., que se iniciou em data anterior à prioridade ora em causa (31-02-2005), visava-se apurar: “the optimal dosage of ...39 compared to the usual treatment with lnnohep and acenocoumarol. Three dosages are being studied: once-daily 20 mg, 30 mg and 40 mg.” Mais resulta, como já vimos, que estavam a ser feitos estudos sobre a dosagem ótima – toma diária de 20 mg, 30 mg ou 40 mg –, numa lógica muito próxima da Descrição da própria patente EP ...61.
164. Em tal contexto, na nossa resposta à impugnação dos factos n.ºs 1.117 e 1.118, concluímos que já havia uma razoável margem de segurança para efetuar o estudo, neste caso, em pessoas doentes e vulneráveis a distúrbios tromboembólicos.
165. É, pois, óbvio que havia uma “expetativa razoável de sucesso” na condução daquele estudo, se não o mesmo não teria sido patrocinado pela própria EMP01..., tal como já referimos supra na nossa resposta à impugnação dos factos n.ºs 1.117 e 1.118.
166. Inexistem, pois, razões para dar este facto como provado.
xii. Devem considerar-se provados os factos não provados n.º 2.16 e 2.17?
167. Os factos controversos são do seguinte teor:
“2.16 Nem os resumos e posters de MM nem qualquer outro artigo de ponta, incluindo CC S et al: "Effects of ...39, an oral, direct fator Xa inhibitor, on thrombin generation in healthy volunteers" Blood, Vol. 102, 11, 2003: Abstract 3003 e o CC Poster, fornecem ao perito na área uma expetativa razoável de sucesso no que diz respeito à segurança e eficácia clínica do regime de administração da referida dosagem. 2.17 Como se trata de um ensaio de fase I em indivíduos saudáveis, MM não poderia ter "estabelecido" que um regime de 30 mg uma vez por dia de ... seria seguro e eficaz para os doentes.”
168. As Recorrentes, baseando-se fundamentalmente nos depoimentos dos Professores GG e BB e no parecer desta, e no facto dos estudos em causa serem de fase I, ou seja, realizada com pessoas saudáveis, pugna pela prova destes factos.
169. A Recorrida, por sua vez, sustenta que a factualidade não provada controversa, não trata senão de conclusões de facto. Pugna, assim, pela manutenção do decidido, remetendo, em essência, para os fundamentos da sentença recorrida.
Apreciação da questão por este tribunal
170. No que é aqui pertinente, ou seja, no que toca a toda a documentação divulgada ao público até à data da prioridade, incluindo-se, portanto, a documentação referente ao estudo ..., cremos que já respondemos a esta questão na resposta anterior, para a qual remetemos.
171. Não vemos, assim, razões para não concordar com o tribunal a quo, devendo o recurso improceder.
xiii. Devem considerar-se provados os factos não provados n.º 2.18 e 2.19?
172. Os factos ora controversos são do seguinte teor:
“2.18 CC não apresentou uma expetativa razoável de sucesso, de que o regime de administração da dose reivindicada seria terapeuticamente eficaz em doentes.
2.19 Os ensaios utilizados na CC não são preditivos da eficácia clínica de um regime de dosagem.”
173. Segundo as Recorrentes, os factos não provados 2.18 a 2.19, fundamentalmente com base nos pareceres por si juntos, devem ser aditados à lista de factos provados. Devendo, igualmente, constar da listagem de factos provados que “O estudo de CC tratou-se de um estudo académico, que usou testes experimentais, não preditivos do efeito terapêutico do ... em doentes.”
174. A Recorrida, por sua vez, sustenta que a factualidade não provada controversa, não trata senão de conclusões de facto. Pugna, assim, pela manutenção do decidido, remetendo, em essência, para os fundamentos da sentença recorrida.
Apreciação da questão por este tribunal
175. Mais uma vez insistimos que o que é aqui pertinente, é a documentação divulgada ao público até à data da prioridade, incluindo-se, portanto, a documentação referente ao estudo ....
176. Nestes termos, cremos que já respondemos à essência desta questão na impugnação do facto não provado 2.14, para a qual remetemos.
177. Assim sendo, tendo em conta as nossas considerações feitas na resposta à questão anterior, julga-se que nada há aqui a alterar.
xiv. Devem considerar-se provados os factos não provados n.º 2.20 a 2.22?
178. Os factos ora controversos são do seguinte teor:
“2.20 Estes testes foram de natureza altamente exploratória e não fornecem detalhes suficientes para permitir uma reprodução ou análise adequada dos resultados por um perito na matéria. 2.21 Estes testes, são totalmente inadequados para serem considerados na determinação da frequência de dosagem para um estudo de Fase II em doentes. Além disso, os dados e os gráficos apresentados no poster demonstram que a conclusão referida é insustentável e não tem apoio. 2.22 Nenhum clínico responsável teria alguma vez sugerido um regime de dosagem de uma vez por dia para um primeiro ensaio de Fase II com base em tais dados.”
179. As Recorrentes mais uma vez pugnam pela prova destes factos. Para tanto baseiam-se nos depoimentos dos Professores BB, GG e EE.
180. Por sua vez, como já vimos, a Recorrida sustenta que a factualidade não provada controversa, não trata senão de conclusões de facto. Pugna, assim, pela manutenção do decidido, remetendo, em essência, para os fundamentos da sentença recorrida.
Apreciação da questão por este tribunal
181. Repetimos aqui o referido na resposta às questões anteriores em matéria de impugnação de factos não provados.
xv. Devem considerar-se provados os factos não provados n.º 2.23 a 2.27?
182. Os factos ora controversos são os seguintes: “2.23 Mesmo que se considere o valor nominal, tanto a descrição escrita como a tabela de dados da CC apontam para a necessidade de um regime de administração de doses de, pelo menos, duas vezes por dia. 2.24 O sucesso clínico e a segurança da associação de um regime de dose única diária com a forma farmacêutica reivindicada, ou seja, o ... sob a forma de comprimidos de libertação rápida, não seriam de esperar e são particularmente não óbvios. 2.25 À data de prioridade, um regime de administração de dose única diária não seria uma opção óbvia nem haveria uma expetativa razoável de sucesso com tal regime de administração. 2.26 O facto de a dose única diária de ... sob a forma de um comprimido de libertação rápida ser tão segura e eficaz e até comparável à dose diária (duas vezes por dia) foi, de facto, inesperado e surpreendente. 2.27 Na altura da prioridade da patente, a escolha de um regime de dosagem de uma vez por dia para o ..., e muito menos sob a forma de um comprimido de libertação rápida, estava longe de ser óbvia.
183. As Recorrentes mais uma vez pugnam pela prova destes factos. Para tanto baseiam-se, em essência, em pareceres e depoimentos dos Professores BB, GG, EE e Engª AA.
184. Por sua vez, como já vimos, a Recorrida sustenta que a factualidade não provada controversa, não trata senão de conclusões de facto. Pugna, assim, pela manutenção do decidido, remetendo, em essência, para os fundamentos da sentença recorrida.
Apreciação da questão por este tribunal
185. Repetimos aqui o referido na resposta às questões anteriores em matéria de impugnação de factos não provados.
xvi. Devem considerar-se provados os factos não provados n.º 2.28 a 2.31?
186. Os factos ora controversos são do seguinte teor:
“2.28 Os próprios inventores não o fizeram inicialmente com base nos conhecimentos mais recentes aqui discutidos. O primeiro ensaio de fase II do ... foi, portanto, planeado com regimes de dosagem duas vezes por dia e até três vezes por dia. 2.29 Apenas a investigação levada a cabo pelos inventores conduziu à invenção tal como reivindicada, ou seja, apenas o ensaio excecionalmente grande de variação de 12 doses incluído na patente, juntamente com outros resultados da investigação interna da EMP01... que não estavam publicamente disponíveis na data de prioridade, proporcionou aos inventores o resultado de que poderia valer a pena experimentar um regime de administração uma vez por dia. 2.30 O especialista teria abordado a situação clínica com precaução, evitando administrar doses mais elevadas num regime de toma única diária, e muito menos sob a forma de um comprimido de libertação rápida, tendo em conta as complicações hemorrágicas conhecidas com os inibidores do fator Xa, como o ..., e porque não existe antídoto para o .... 2.31 O perito da especialidade teria tentado desenvolver um comprimido de libertação controlada, o que também foi tentado pela queixosa no início do desenvolvimento do ....”
187. As Recorrentes mais uma vez pugnam pela prova destes factos. Para tanto baseiam-se, em essência, em depoimentos dos Professores BB e GG, e no doc. n.º 5 da Resposta à Oposição, da autoria do Sr. Dr. OO.
188. Como já vimos, a Recorrida sustenta que a factualidade não provada controversa, não trata senão de conclusões de facto. Pugna, assim, pela manutenção do decidido, remetendo, em essência, para os fundamentos da sentença recorrida.
Apreciação da questão por este tribunal
189. Também aqui julgamos que a essencialidade dos factos ora em causa simplesmente repete, por palavras diferentes, as ideias contidas nos factos analisados nas questões precedentes relativas a factos não provados.
190. Assim sendo, tendo em conta as nossas considerações feitas na resposta a tais questões anteriores, julga-se que nada há aqui a alterar.
Fundamentação de Direito
xvii. Em sede de procedimento cautelar e tomando em conta a presunção de validade de que goza a EP ...61, esta deve ser declarada nula, por falta de novidade e atividade inventiva?
191. Em sede de Direito, as Recorrentes sublinham, em primeiro lugar, que a EP ...61 beneficia de uma presunção de validade nos termos do artigo 4.º do CPI, tendo sido concedida após um rigoroso exercício de exame e oposição, pelo que o ónus da demonstração da sua invalidade recai inteiramente sobre a Recorrida, tendo a mesma que demonstrar que a patente é ostensivamente nula de acordo com jurisprudência deste mesmo Tribunal da Relação de Lisboa.
192. A Recorrida discorda de tal entendimento, sublinhando que “a conclusão pela invalidade da patente esgrimida para afastar o requisito fumus boni iuris não pressupõe prova exuberante e ostensiva sobre a invocada invalidade, a qual seria sempre uma exigência excessiva em sede cautelar onde a prova é indiciária.”
193. Sobre este primeiro ponto, conforme dispõe o artigo 345.º do Código de Propriedade Industrial: “O tribunal exige que o requerente forneça os elementos de prova para demonstrar que é titular do direito de propriedade industrial ou do segredo comercial, ou que está autorizado a utilizá-lo, e que se verifica ou está iminente uma violação.”
194. Mais resulta do artigo 4.º, n.º 2, do mesmo diploma legal: “Sem prejuízo do que se dispõe no número seguinte, a concessão de direitos de propriedade industrial implica mera presunção jurídica dos requisitos da sua concessão.”
195. Nesta sede, no Ac. TRL de 09-04-2025, processo 362/22.9YHLSB-A.L1-PICRS, pode ler-se: “A invocaçaÞo da nulidade da patente, a título de exceçaÞo, apenas se verificará, em sede cautelar, em situaçoÞes em que é flagrantemente óbvio que a patente é nula.”
196. Em sentido não totalmente coincidente ao referido Acórdão encontramos o voto de vencido proferido no Ac. TRL de 25-06-2025, processo n.º 97/24.8YHLSB.L1, também relativo à EP ...61 (em que o presente Relator interveio como adjunto e subscreveu a posição que fez vencimento).
197. Em tal voto, consignou-se, além do mais, o seguinte:
“27. Perguntar-se-á: então numa providência cautelar nunca se pode invocar e ponderar a validade de uma patente?»; 28. A resposta a esta questão é afirmativa mas complementada por algo que é manifesto e corolário lógico inafastável da consciência da estrutura do procedimento: pode ocorrer essa invocação mas só haverá procedência de tal vertente de defesa se os factos e o Direito relevantes forem atingíveis mediante o conhecimento ligeiro, superficial e sumário caracterizador da tutela cautelar; 29. A noção relevante para a aferição não é, pois, a de «ostensividade» mas a relativa à possibilidade de aquisição demonstrativa e linearidade da subsunção num quadro de avaliação necessariamente ligeira e marcada pela urgência; 30. Ora, neste contexto, uma questão de validade de patente muito fracturante ao nível de todo o mercado europeu de medicamentos, altamente complexa, severamente dependente do esgotamento de todos os argumentos, meios instrutórios e recursos disponíveis, não pode ser decidida através de uma mera «summaria cognitio»””
198. Da nossa parte cremos que é difícil fixar, em sede jurisprudencial, regras gerais rígidas sobre o conhecimento da (in)validade de uma patente em sede de procedimento cautelar. Como todas as decisões judiciais incidentes sobre casos concretos, cremos que a análise deve ser casuística.
199. Como o presente caso bem demonstra, este tipo de processos raramente se ficam por uma discussão ligeira e sumária das questões colocadas aos tribunais. Conforme resulta do Relatório supra, em sede de primeira instância o presente procedimento cautelar demorou um ano inteiro. A audiência de julgamento comportou 6 sessões. Em tais sessões os depoimentos foram prestados de forma demorada e exaustiva, como revelam as transcrições dos respetivos depoimentos amavelmente apresentadas a este Tribunal pelas Recorrentes. Tais transcrições totalizam 793 páginas. Foram, portanto, exaustivamente inquiridos, além de outros, diversos especialistas nas matérias em discussão, em concreto, os Senhores Doutores EE, BB, DD, LL, AA, FF, JJ, KK e II. Foram juntos muitos documentos. Só da Oposição contam-se 31 documentos e do Requerimento Inicial outros 35. Dentro da documentação junta, contam-se inúmeros pareceres e declarações escritas de especialistas, nomeadamente, dos Senhores Doutores BB, EE, GG, OO, AA, HH, AAA, ZZ, NN, CC, FF, QQ e BBB. Foram juntas diversas decisões de tribunais europeus incidindo sobre a mesma matéria Para um resumo de algumas recentes decisões judiciais nesta matéria, veja-se, https://www.juve-patent.com/cases/showdown-in-munich-federal-patent-court-revokes-xarelto-patent/ .
200. Este enorme manancial probatório foi detalhadamente analisado pelo tribunal a quo numa sentença com mais de 100 páginas. O Recurso tem 174 páginas e a Resposta 166 páginas.
201. Como é sabido, o processo é resultado do trabalho das partes e dos tribunais. Não se pode afirmar, neste caso, que em primeira instância a discussão tenha sido ligeira e sumária.
202. Neste contexto cremos, pois, que teria sido difícil senão mesmo impossível, mantermo-nos nesta instância por uma discussão ligeira e sumária das questões.
203. O que realmente importará, assim, é se a prova produzida nesta fase, cujo ónus obviamente recai sobre a Recorrida, enfermou de forma clara os requisitos de validade da patente aqui em causa, sem prejuízo, claro está, dos ulteriores desenvolvimentos processuais a que naturalmente está sujeito o presente procedimento cautelar.
204. Passemos, pois, a apreciar a exceção da nulidade da patente.
Dos requisitos da novidade e atividade inventiva
205. A sentença recorrida entendeu, nesta fase indiciária, que se verificava a nulidade da patente quer por falta de novidade, quer por falta de atividade inventiva. Nos dizeres da sentença: “Conclui-se assim, não só pela falta de novidade como pela falta de actividade inventiva da patente ...61, esta atendendo ao supra referido estado da técnica, o que determina a nulidade da PT ...61.”
206. Vejamos.
207. Como é sabido, para determinada invenção se apresentar como novo para efeitos de patenteabilidade, deve divergir, dir-se-ia quantitativamente, do estado da técnica no momento da respetiva prioridade (cf. artigo 54.º, n.º 1, do Código de Propriedade Industrial). Ou seja, a invenção deve representar um plus ou um acrescento, em relação a tudo que tudo que foi tornado acessível ao público (estado da técnica), na data da prioridade.
208. Tal diferença ou adição ao estado da técnica, a novidade, não deve ser confundida com o segundo requisito da patenteabilidade, ou seja, a atividade inventiva. Neste segundo requisito avalia-se se a invenção, em termos qualitativos, é não-óbvia no contexto do estado da técnica e do ponto de vista de um perito da especialidade, ou seja, se deve ser considerada suficientemente criativa para fundamentar o monopólio subjacente à concessão da patente (artigo 54.º, n.º 2, do Código de Propriedade Industrial) Neste sentido, Lionel Bently e Brad Sherman, Intellectual Property Law, 4. ed (Oxford Univ. Press, 2014), 529..
209. Recorde-se que, segundo o artigo 55.º, n.º 1, do mesmo diploma legal: “O estado da técnica é constituído por tudo o que, dentro ou fora do País, foi tornado acessível ao público antes da data do pedido de patente, por descrição, utilização ou qualquer outro meio.”
210. A EP ...61, aqui em causa, sucedeu à Patente Europeia n.º ...06 (EP'...06), que era a patente de base que protegia o ingrediente ativo ... enquanto tal e a sua utilização no tratamento de distúrbios tromboembólicos (facto n.º 1.61).
211. A EP ...61 trata, assim, de uma patente de uso secundário, concedida ao abrigo da regra especial prevista no artigo 54.º, n.º 5 da Convenção da Patente Europeia (CPE) e no artigo 53.º, n.º 1, al. b), do Código de Propriedade Industrial.
212. No âmbito da novidade, e para o que releva para o caso concreto, discute-se, em primeiro lugar, se as publicações que foram divulgados na 45.ª Reunião Anual da “American Society of Hematology”, realizada em San Diego, EUA, entre 6 e 9 de dezembro de 2003 (a "Conferência ASH "), são ou não suficientes para afetarem a novidade da EP ...61.
213. Referimo-nos, portanto, ao Estudo de CC (divulgado, entre outros, no Poster CC e no Abstract CC #3003), os dois Estudos de MM: um estudo de escalonamento de dose múltipla, em que os sujeitos receberam dosagens crescentes múltiplas ou um placebo (divulgado, entre outros, no Abstract MM #3004) e um estudo de escalonamento de dosagem única, em que os sujeitos receberam administração diária sucessiva do medicamento ou um placebo em dosagens ascendentes únicas durante o período do estudo (Abstract #3010).
214. Tais estudos estão devidamente descritos nos factos provados 1.66 a 1.93 e são anteriores à data da prioridade da EP ...61, que é 31-01-2005.
215. Neste ponto há que clarificar que, na questão de saber se determinada informação pertence ao estado da técnica, deve recorrer-se a documentos únicos, ou seja, não se deve combinar documentos separados (chamado método do mosaico). A única exceção que esta regra comporta, é quando um determinado documento é inextricavelmente lido em conjunto com outro ou outros, da perspetiva de um perito da especialidade.
216. Ora, no que aos estudos descritos em 212 e 213 diz respeito, julga-se que a referida exceção se verifica, desde logo, porque os documentos referidos foram todos apresentados em conjunto na dita conferência.
217. Mais se esclarece que, para que inexista novidade, todos os elementos técnicos da invenção reivindicada têm de estar presentes no estado da técnica. Uma fonte anterior só antecipa o pedido de patente se contiver todos os elementos essenciais da invenção. Contudo, tal divulgação tanto pode ser explícita como implícita. Neste último caso, como já fez notar o Boards of Appeal do EPO: “"implicit disclosure" means disclosure which any person skilled in the art would objectively consider as necessarily implied in the explicit content, e.g. in view of general scientific laws.” (decisão de 24-11-2009, T 1523/07). Ou seja, a divulgação implícita a ter aqui em conta, é aquela que um perito na especialidade tomaria objetivamente em consideração, por estar necessariamente implicado, segundo as leis científicas gerais, num determinado conteúdo explícito. Conforme esclarecido na mesma decisão do EPO: “The implicit disclosure means no more than the clear and unambiguous consequence of what is explicitly mentioned”.
218. Para responder à questão da novidade há, pois, que determinar quais os elementos essenciais da invenção subjacente à patente EP ...61.
219. A resposta a esta (sub)questão já foi dada, em certa medida, na nossa resposta à impugnação dos factos 1.117 e 1.118. Como é hoje reconhecido pelos estudos de metodologia mais atuais, na generalidade dos casos é difícil manter uma divisão estanque entre questão de facto e questão de direito Veja-se, entre outros, A. Castanheira Neves, Metodologia Jurídica: problemas fundamentais, Stvdia Ivridica 1 (Coimbra Ed, 1993); Reinhold Zippelius, Introduction to German Legal Methods, trad. Kirk W. Junker e P. Matthew Roy (Carolina Academic Press, 2008).. Aliás, em decisões do Boards of Appeal do EPO (European Patent Office) as questões essenciais, como a novidade ou a atividade inventiva, são tratadas diretamente com a análise de documentos e outros meios de prova, como declarações escritas (veja-se, por exemplo, a já aludida decisão de 13-09-2017, caso T 0239/16 ou a própria decisão proferida no âmbito da presente patente no caso T 1732/18), o que em muito contribui para a clareza da exposição. Infelizmente, a jurisprudência nacional, na sua generalidade, não partilha desta metodologia, que em muito simplifica o tratamento das questões, sem perder o rigor exigível.
220. De qualquer modo, tal como deixamos consignado na resposta à impugnação dos ditos factos 1.117 e 1.118, a invenção visa resolver os problemas subjacentes aos tratamentos de distúrbios tromboembólicos até então utilizados, a saber heparinas e antagonistas da vitamina K.
221. No uso da heparina eram apontados três problemas: i) era administrada por via intravenosa ou subcutânea; ii) a heparina não é seletiva e, assim, inibia uma pluralidade de fatores da cascata da coagulação do sangue ao mesmo tempo; iii) um elevado risco de hemorragia.
222. Ainda segundo a Descrição, “uma segunda classe de anticoagulantes são os antagonistas da vitamina K. Estes incluem, por exemplo, as 1,3-indanedionas, e em especial compostos tais como varfarina, fenprocoumon, dicumarol e outros derivados de cumarina que inibem a síntese de vários produtos de certos fatores de coagulação dependentes da vitamina K no fígado de uma forma não seletiva.” Contudo, nestes “o início da ação é muito lento (tempo de latência para o início de ação de 36 a 48 horas). É possível administrar os compostos por via oral; no entanto, devido ao elevado risco de hemorragia e ao limite do índice terapêutico, são necessários um ajuste individual demorado e monitorização do paciente.”
223. Neste contexto, a EP ...61 eliminava aqueles problemas técnicos, pois, segundo a Descrição, “Surpreendentemente, verificou-se agora em pacientes de medicação frequente que a administração oral uma vez por dia de um inibidor direto do fator Xa com um tempo de concentração de semivida no plasma de 10 horas ou menos demonstrou eficácia quando comparada ao tratamento convencional e, ao mesmo tempo, foi tão eficaz como depois da administração duas vezes por dia (bid).”.
224. Ou seja, com a administração do inibidor direto do fator Xa ora em causa – o ... – passava-se a poder tratar os doentes com distúrbios tromboembólicos com uma única dose diária de um comprimido, tomado por via oral, durante pelo menos cinco dias consecutivos, com efeitos eficazes e seguros. E isto sem incorrer naqueles inconvenientes, em concreto, a administração intravenosa, ação anticoagulante não seletiva, elevado risco de hemorragia, ajuste individual demorado e monitorização do paciente.
225. Compreende-se, assim, a decisão de 27-10-2021, do Boards of Appeal do EPO, no caso T 1732/18, relativa à mesma patente aqui em causa, quando refere: “The objective technical problem may thus be defined as providing a safe, effective and convenient oral dosage regimen of "...39" (i.e. ...) for the prophylactic and therapeutic treatment of thromboembolic disorders.”
226. Mais consta do Resumo da patente: “A presente invenção relaciona-se com o campo da coagulação do sangue, mais especificamente, relaciona-se com um método de tratamento de um distúrbio tromboembólico através da administração uma vez por dia de um inibidor direto do fator Xa numa forma farmacêutica oral a um paciente que dele necessite, em que o inibidor do fator Xa tem uma concentração de semivida no plasma indicativa de um intervalo de administração de bid ou tid, por exemplo de 10 horas ou menos.”
227. Assim também se compreendem melhor as reivindicações da patente:
“REIVINDICACÕES
1. O uso de um comprimido de libertação rápida do composto ... para o fabrico de um medicamento para o tratamento de um distúrbio tromboembólico, administrado não mais do que uma vez por dia durante pelo menos cinco dias consecutivos, em que o referido composto tem uma concentração de semivida no plasma de 10 horas ou menos, quando administrado oralmente a um paciente humano.
2. A utilização, de acordo com o reivindicado na reivindicação 1, em que o distúrbio tromboembólico e o enfarto do miocárdio com elevação do segmento ST (STEMI), enfarto do miocárdio sem elevação do segmento ST (NSTEMI), angina instável, reoclusão após angioplastia ou bypass aortocoronário, embolia pulmonar, trombose venosa profunda ou acidente vascular cerebral.”
228. Obviamente que as vantagens técnicas da toma de ... para os tratamentos referidos são importantes.
229. Note-se, contudo, que a substância ativa ... já tinha sido patenteada para efeitos de utilização no tratamento de distúrbios tromboembólicos (facto n.º 1.61). Assim sendo, a invenção subjacente à EP ...61 reduz-se à dosagem reivindicada, ou seja, um comprimido de libertação rápida daquele composto, administrado não mais do que uma vez por dia, durante pelo menos cinco dias consecutivos.
230. Recorde-se que, como vimos na resposta à impugnação dos factos provados n.ºs 1.107, 1.119 e 1.1120, a referência na patente a uma semivida de 10h ou menos, deve ser considerada redundante. Mais resulta daquela resposta que a referência a um tratamento de pelo menos cinco dias consecutivos é banal.
231. O problema passa, portanto, por saber se os referidos estudos divulgados na conferência de San Diego em 2003 e que, assim, indubitavelmente faziam parte do estado da técnica, já tinham tornado acessíveis ao público todos os elementos essenciais da invenção aqui em causa.
232. Admitimos, neste ponto, algumas dúvidas, diferentemente das certezas expressas na sentença recorrida (e do decidido no processo n.º 97/24.8YHLSB.L1).
233. Como vimos, e conforme se refere nos próprios factos provados (facto n.º 1.68), o Poster CC deve ser lido em conjunto com o Abstract correspondente (Abstract #3003) e com os Posters e Abstracts de MM (Abstract #3004 e Abstract #3010).
234. O Poster CC apresenta as seguintes conclusões (facto n.º 1.78, agora com sublinhados nossos): - O ...39 administrado por via oral dependente da dose inibiu a geração de trombina tanto pela via intrínseca (colagénio) como extrínseca (fator tecidular). - O efeito do ...39 na geração de trombina foi demonstrado em ensaios sem plaquetas e em ensaios à base de PRP. Em contraste, os inibidores indiretos do FXa (ou seja, dependentes da antitrombina III) naturalmente inibem apenas o FXa que não é protegido pelo complexo plaquetas-protrombinase. - O ...39 não só inibiu o tempo de atraso da geração de trombina (PITT-Tc), como também teve um efeito profundo tanto na extensão máxima da geração de trombina (Pico ETP) como na quantidade total de trombina gerada (ETP-AUC). Esta observação sugere uma característica adicional do ...39, uma vez que os inibidores do FXa mais fracos prolongam apenas o tempo de atraso sem afetar a quantidade total de geração de trombina. - Alguns parâmetros (por exemplo, pico ETP) indicam um efeito farmacodinâmico duradouro do ...39, o que sugere adequação para um regime de dosagem uma vez por dia. - Os efeitos do ...39 oral na geração de trombina intrínseca e extrínseca e PICT, que são mediados pela inibição direta do FXa, indicam que o ...39 é um anticoagulante promissor que merece investigação clínica adicional.
235. Lê-se na conclusão, do Resumo de CC # 3003 (facto n.º 1.81, agora com sublinhados nossos):
- … o ...39 exibiu inibição da geração de trombina dependente da dose, quer nas plaquetas, quer no plasma, utilizando estímulos extrínsecos (FT) ou intrínsecos (colagénio) para ativação plaquetária.
-- Uma dose única de 30 mg exerceu um efeito sustentado em certos testes de produção de trombina durante um período que foi até às 24 horas. O fator Xa foi inibido de uma forma dependente da dose após a administração de ...39. A inibição máxima, observada 2 horas após a administração do medicamento, foi de 28% e 56%para as doses de 5 mg e 30 mg, respetivamente.
236. O Poster MM (estudo de dose única) apresenta as seguintes conclusões (facto n.º 1.91, agora com sublinhados nossos): O ... foi seguro e bem tolerado em todas as dosagens e formulações. O ... demonstrou inibir seletivamente o FXa sem afetar a FIIa ou a antitrombina III. Foram observados perfis tempo-efeito dependentes de dose e previsíveis para os parâmetros farmacodinâmicos. Foi observada uma estreita correlação entre os efeitos farmacodinâmicos e as concentrações plasmáticas do .... O bom perfil de segurança, a inibição seletiva do FXa e perfis farmacocinéticos e farmacodinâmicos promissores indicam ser necessária uma investigação adicional do ....
237. Por fim, o Poster MM (estudo de dose múltipla) apresenta as seguintes conclusões (facto n.º 1.93): O ... foi seguro e bem tolerado após administração de dosagens múltiplas em todas as dosagens testadas sem sinais ou sintomas de hemorragia. O ... inibiu a atividade do FXa e afetou de forma dependente da dose os parâmetros farmacodinâmicos PT, aPTT e HepTest. Foi demonstrada farmacodinâmica e farmacocinética previsíveis dependentes da dose, que indicaram que o ... é adequado para administração duas vezes por dia até 30 mg. Existe uma estreita correlação entre o prolongamento do TP e as concentrações plasmáticas O bom perfil de segurança, a inibição seletiva do FXa e perfis farmacocinéticos e farmacodinâmicos promissores indicam ser necessária uma investigação adicional do ....
238. Ora, se as passagens ora sublinhadas a negrito efetivamente apontam para um potencial sucesso de uma dosagem única por dia, o certo é que os referidos estudos eram de fase I, envolvendo pessoas saudáveis. Cremos que não podemos extrapolar destes estudos de fase I, para o efetivo uso do medicamento em pessoas doentes. Como refere a decisão do EPO no caso T 1732/18: “As a consequence, the absence of bleeding in the subjects of a phase I trial would be expected but would not necessarily be indicative of clinical safety in patients. On the other hand, if bleeding nevertheless occurred, this would indicate a serious safety problem.”
239. Recorde-se aqui que o estudo CC foi realizado em 12 indivíduos saudáveis do sexo masculino com idades entre os 27 e os 37 anos, que foram randomizados para receber ... (numa dose oral única de 5mg no dia 1 e numa dose oral única de 30mg no dia 14, ou vice-versa – 8 sujeitos) ou um placebo (4 sujeitos).
240. O estudo de escalonamento de dose múltipla (Resumo MM # 3004), envolveu 64 sujeitos saudáveis do sexo masculino que foram randomizados para receber ..., em doses diárias múltiplas sucessivas de 5mg uma vez ao dia, 5mg duas vezes ao dia, 5mg três vezes ao dia e depois 10mg, 20mg e 30mg duas vezes ao dia, ou um placebo.
241. O estudo escalonamento de dose única (Resumo MM # 3010) envolveu a administração a 103 sujeitos saudáveis do sexo masculino de diferentes dosagens únicas entre 1,25mg e 80mg de comprimidos de ..., ou soluções orais de 5mg e 10mg de ....
242. Ora, como vimos supra em 217, uma fonte anterior só antecipa o pedido de patente se contiver todos os elementos essenciais da invenção. Tal divulgação tanto pode ser explícita como implícita. Neste último caso, como já fez notar o Boards of Appeal do EPO: “"implicit disclosure" means disclosure which any person skilled in the art would objectively consider as necessarily implied in the explicit content, e.g. in view of general scientific laws.” (decisão de 24-11-2009, T 1523/07). Ou seja, a divulgação implícita a ter aqui em conta, é aquela que um perito na especialidade tomaria objetivamente em consideração, por estar necessariamente implicado, segundo as leis científicas gerais, num determinado conteúdo explícito.
243. Ora, dos referidos estudos de fase I, cremos que a extrapolação da ausência de hemorragias verificadas em pessoas saudáveis para a ausência de hemorragias em pessoas doentes (com a inerente segurança e eficácia do medicamento), não está necessariamente contida nos ditos estudos. Tal conclusão está apenas potencialmente implicada naqueles estudos, carecendo, como os próprios estudos referem, de investigação adicional. Assim sendo, a divulgação destes estudos por si só, não se nos afigura suficiente para afetar a novidade da patente.
244. Já o mesmo não se pode dizer relativamente ao estudo ... que, como vimos na resposta à impugnação do facto n.º 1.99 foi, nas suas características essenciais, divulgado ao “público”, através da entrega de uma cópia equivalente ao documento n.º 12 da Oposição aos respetivos doentes.
245. É de notar que este estudo não foi tomado em consideração na já aludida decisão do EPO de 27-10-2021, caso T 1732/18.
246. Este estudo encontra-se descrito nos factos provados n.ºs 1.95 a 1.120, donde se salienta o seguinte:
“O estudo ... envolveu a administração de três doses orais uma vez ao dia de 20 mg, 30 mg e 40 mg de ..., ou o comparador, a mais de 500 pacientes com trombose venosa profunda (TVP) aguda. O estudo ... teve como objetivo determinar a dosagem de uma vez ao dia ótima de ... para o tratamento da TVP em comparação com o tratamento habitual. As dosagens uma vez ao dia de ... foram administradas sob a forma de comprimidos de libertação rápida. Para conceber o estudo ... com a administração de uma vez ao dia de ... para o tratamento da TVP, a equipa de investigadores baseou-se na semivida da atividade anti-Xa conhecida e na inibição observada da geração de trombina em seres humanos até 24 horas. A randomização dos pacientes teve início em dezembro de 2004 e o tratamento do primeiro paciente teve lugar em 24 de dezembro de 2004.”
247. É, pois, neste contexto que se compreende a nossa resposta à impugnação dos factos n.ºs 1.107, 1.119 e 1.120, no sentido de que este estudo coincide, em importante medida, com a própria Descrição da patente aqui em questão e replica as reivindicações da EP ...61.
248. Efetivamente, como vimos, a invenção da EP ...61 é, em essência, o tratamento de distúrbios tromboembólicos (em seres humanos), com a administração oral de ..., através de um único comprimido de libertação rápida por dia.
249. Ora, cremos manifesto que tal método de tratamento foi divulgado através do dito estudo, o que necessariamente implica a falta de novidade da patente. Como resulta dos factos provados, estavam a ser testados no estudo três doses únicas diárias de ... (20 mg, 30 mg e 40 mg), administradas por comprimidos de libertação rápida, a pacientes com trombose venosa profunda aguda. A única coisa que estava por determinar, portanto, era qual a dose diária ótima de ... (cf. facto n.º 1.95), mas tal especificidade não é reivindicada na EP ...61.
250. É certo que, poder-se-ia ainda argumentar aqui, em sede de novidade, que o que realmente importava era a divulgação dos resultados do dito estudo, e não apenas o conhecimento dos contornos essenciais do mesmo. Recorde-se, os resultados do estudo ... foram reportados num artigo de QQ et al. publicado na revista Blood, de 15 de setembro de 2008, Volume 112, Número 6, páginas 2242 a 2247 (facto n.º 1.95).
251. No entanto, mesmo que aceitássemos tal argumento – que não aceitamos pelas razões já expostas, em especial, em 248 e 249 –, o certo é que no momento do início do dito estudo ..., o tratamento de distúrbios tromboembólicos, com a administração oral de ... através de um único comprimido de libertação rápida por dia, apresentava-se, tal como deixamos consignado na resposta à impugnação dos factos 1.99 e 1.117 e 1.118, como razoavelmente seguro, o que explica que o estudo tenha sido, desde logo, aprovado pelo respetivo Comité Ético em 23 de novembro de 2004.
252. Inelutável se torna assim concluir que, com a divulgação deste estudo ao público, integrando assim o estado da técnica, da perspetiva de um perito da especialidade à data da prioridade – 31-01-2005 –, a invenção subjacente à EP ...61, ou seja, o tratamento de distúrbios tromboembólicos, com a administração oral de ... através de um único comprimido de libertação rápida por dia, se não era já óbvia (no seguimento dos aludidos estudos de fase I), manifestamente óbvia se tornou.
253. A solução técnica subjacente à EP ...61 carece, assim, de atividade inventiva.
254. Assim sendo, se bem que, com fundamentação um pouco diversa da sentença recorrida, o recurso deve ser julgado improcedente e o decidido deve ser mantido.
255. Nestes termos, o conhecimento das questões suscitadas a título subsidiário pela Recorrida, mostra-se prejudicado.
**
IV. DECISÃO
Pelo exposto, acorda-se em julgar parcialmente procedente a apelação e, em consequência, decide-se:
i. Alterar o facto provado n.º 1.70, para a seguinte redação: “O Poster CC refere-se a um estudo clínico de fase I e de cariz académicopatrocinado pela EMP01... para determinar os efeitosdo ... administrado oralmente na inibição da geração de trombina em sujeitos saudáveis do sexo masculino.”;
ii. Alterar o facto provado n.º 1.73, para a seguinte redação: “As avaliações sobre os efeitos do ... basearam-se em três testes: PITT (tempo de geração de trombina induzida por plaquetas), ETP (potencial endógeno de trombina) e PICT (tempo de coagulação induzida por protrombinase).”;
iii. Alterar o facto provado n.º 1.118, para a seguinte redação: “A EMP01... já sabia, antes da data de prioridade da EP ...61, que a semivida do ... era mais longa do que as 4-6 horas indicadas na patente, e que era superior a 10 horas na população de idosos”;
iv. No mais, julga-se o recurso improcedente e mantém-se o decidido na sentença recorrida.
Custas pelas Recorrentes (artigo 539.º, n.º 1 do Código de Processo Civil).
*
Lisboa, 17-09-2025
Alexandre Au-Yong Oliveira
Rui A. N. Ferreira Martins da Rocha
Carlos M. G. de Melo Marinho (com o voto de vencido que segue)
DECLARAÇÃO DE VOTO – VOTO DE VENCIDO
Não acompanho a decisão da qual esta declaração faz parte integrante, pela seguinte ordem de razões:
1. O processo em que se gerou o recurso apreciado corresponde a uma providência cautelar;
2. Os procedimentos cautelares em cujo grupo categorial se insere o encadeado de actos reapreciado em sede desta impugnação judicial têm um foco muito específico e um regime processual particular e limitado, condicionado pelos objectivos circunscritos que emergem do disposto na parte final do n.º 2 do art. 2.º do Código de Processo Civil (CPC);
3. A sua função exclusiva, à luz da norma invocada, é garantir a tutela cautelar, ou, conforme expressamente referido pelo legislador, «acautelar o efeito útil da ação»;
4. A protecção concedida pelo sistema não faz a declaração plena do direito brandido nem a sua avaliação global, compreensiva e final;
5. Apenas se garante que a declaração feita em sede da acção principal venha a produzir efeitos úteis por os mesmos terem sido protegidos a montante de maneira específica e limitada a essa finalidade;
6. Só não será assim se tiver ocorrido a dispensa judicial da interposição da acção declarativa principal, situação exclusiva em que poderá realizar-se a «composição definitiva do litígio» – cf. o disposto no n.º 1 do art. 369.º do encadeado normativo sob menção;
7. Nos presentes autos, não ocorreu a referida inversão de contencioso, pelo que estamos perante um procedimento sujeito às limitações específicas que emergem da sua particular e circunscrita forma de tutela e à necessidade de instauração de uma acção principal e definitiva incidente sobre todas as dimensões e abrangências associadas à afirmação e protecção ulterior dos direitos apenas protegidos pela providência;
8. Se o foco é específico, também são limitados os mecanismos e os critérios de intervenção: quanto à substância do apreciado, apenas se requer a materialização do perigo («periculum in mora») – «fundado receio» de «produção de lesão grave e dificilmente reparável do direito de propriedade industrial ou de segredo comercial», na redacção do n.º 1 do art. 345.º do Código da Propriedade Industrial;
9. Quanto aos critérios de intervenção do Tribunal, há que ter presente que se lhe reclama uma averiguação fáctica e jurídica mais ligeira (por comparação com a orientada para a tutela definitiva), menos funda, com menor encarniçamento instrutório e, sobretudo, com compressão dos tempos dispendidos, já que, aqui, a intervenção jurisdicional ocorre com estatuto de urgência – vd. o n.º 1 do art. 363.º do CPC;
10. Usa-se, para exprimir tais critérios, a expressão latina «summaria cognitio» que, com felicidade, aponta as noções de menor extensão, maior simplicidade e de abrangência afunilada pelos objectivos de tutela temporária, tudo orientado para um conhecimento também ele menos profundo e, de sobremaneira, mais inseguro e menos concistente;
11. De novo uma expressão latina exprime, com adequação, o resultado obtido: «fumus boni iuris”;
12. O «fumus» corresponde à mera possibilidade de existência, à aparência, à plausibilidade, ao entrevisto encoberto por um manto diáfano produtor de alguma cegueira;
13. E aparência de quê?
14. Justamente da bondade da tese espoletadora da intervenção, ou seja, da existência do direito a tutelar;
15. Daqui brota um elemento decisivo para a solução da questão a apreciar: os meios disponibilizados ao julgador nos procedimentos cautelares são os orientados para o conhecimento ligeiro, eles próprios frágeis e de menor concentração;
16. Este elemento, associado à urgência, afasta o encarniçamento instrutório, os procedimentos de prova extensa e maciça e prolongado no tempo;
17. Tudo aqui dever ser breve e menos profundo;
18. Emerge do dito até este ponto que é cognoscível nas providências o que é apreensível através de prova ligeira e que não gera, necessariamente, convicção absoluta;
19. Neste âmbito, surge algo lateralizada a palavra «ostensivamente» invocada mediante citação e usada nos autos;
20. Não é o que é ostensivo que se avalia nas providências mas o que se pode ponderar mediante um conhecimento ligeiro e sumário de elementos potencialmente demonstrativos;
21. No caso sob exegese, suscitou-se o conhecimento, em sede de defesa por excepção, da nulidade da Patente Europeia ...61 (também denominada nos autos como patente ...61);
22. As patentes afirmam-se de forma muito complexa (complexidade agravada em áreas científicas sofisticadas, de ponta, na perspectiva do percurso evolutivo da Humanidade, assentes em processos de aquisição de conhecimento altamente exigentes e assinalados por longos e dispendiosos processos de formação e investigação) em termos que impõem requisitos muito exigentes e bastas vezes apenas vislumbráveis com dificuldade e sem isenção de dúvidas) – cf. os arts. 50.º a 56.º do Código da Propriedade Industrial e os arts. 52.º a 57.º da Convenção de Munique sobre a Patente Europeia, aprovada para ratificação pelo Decreto n.º 52/91, de 26.07;
23. Essa dificuldade é muito visível na decisão que ora faz vencimento, sempre navegando entre «Cila e Caribdis» entre muito extensa e complexa factualidade, tudo nos termos aliás também espelhados pela divisão decisória sobre a matéria exibida um pouco por toda a Europa, conforme o próprio Tribunal se deu conta;
24. Sobretudo, tal ocorre relativamente ao estudo «...», essencial para a sustentação da decisão por referência à qual surge esta declaração de voto, que é aí aceite como tendo sido disponibilizado ao público antes da data de prioridade da EP ...61 com fundamento num muito discutível conceito de divulgação ao público reconduzido à «entrega de uma cópia equivalente ao documento n.º 12 da Oposição aos respetivos doentes» sujeitos da fase II de testes;
25. Com efeito, um estudo corresponde ao resultado de uma investigação técnica, aqui de nível científico muito elevado, muito complexa e de detalhe, que clama por um destinatário simultaneamente interessado em decifrá-lo e capaz de o compreender em todos os seus sentidos técnicos, consequências, percepções e conclusões, ou seja, alguém que possa ser considerado um perito da especialidade à data da prioridade sendo certo, como se diz na presente decisão, que o que se pretende definir é «o estado da técnica, da perspetiva de um perito da especialidade à data da prioridade»;
26. Em sede de assunção de tão delicada e relevante conclusão na direcção da invalidade da patente, era necessário muito mais, designadamente tentar entender as razões subjacentes aos depoimentos em sentido contrário dos Drs. HH, GG e o ZZ e superar a solução, que parece demasiado forçada, de confundir os doentes com o público presumindo a sua capacidade de difundir informação e conhecimento muito preciso e intrincado como o que se pondera e, em particular, com uma extraordinária eficácia e organização, id est, no curto período situado entre 24.12.2004 e 31.01.2005;
27. Aliás, reconhece a decisão ora proferida, no ponto 114, «contexto probatório, admite-se, complexo» o que está nos antípodas de uma «summaria cognitio», sendo particularmente decisivo, ao nível do fundo, entender e averiguar por que razão se defendeu nos autos que antes o referido estudo teve resultados «pós-publicados, constantes de um artigo de 15 de setembro de 2008»;
28. Neste quadro, como se pode cogitar sequer, que a complexa questão da validade de uma patente possa ser apreciada com base numa «summaria cognitio»?;
29. Aliás, afirmar a nulidade de uma patente está muito para além da detecção de um mero e simples «fumus»;
30. É o resultado de um muito complexo processo avaliativo de plena e alargada jurisdição e ponderação fina em sede declarativa;
31. Perguntar-se-á: «então numa providência cautelar nunca se pode invocar e ponderar a validade de uma patente?»;
32. A resposta a esta questão é negativa mas deve ser complementada por algo que é manifesto e corolário lógico inafastável da consciência da estrutura do procedimento: pode ocorrer essa invocação mas só haverá procedência de tal vertente de defesa se os factos e o Direito relevantes forem atingíveis mediante o conhecimento ligeiro, superficial e sumário caracterizador da tutela cautelar;
33. A noção relevante para a aferição não é, pois, a de «ostensividade» mas a relativa à possibilidade de aquisição demonstrativa e linearidade da subsunção num quadro de avaliação necessariamente ágil e marcado pela urgência;
34. Ora, neste contexto, uma questão de validade de patente muito fracturante ao nível de todo o mercado europeu de medicamentos, altamente difícil e marcada pela sofisticação científica, severamente dependente do esgotamento de todos os argumentos, meios instrutórios e recursos disponíveis, não pode ser decidida através de uma mera «summaria cognitio», particularmente de uma mera presunção de conhecimento científico intermediado e sua datação;
35. O oposto permitiria abalar, de forma menos sustentável e sustentada, a contento de qualquer demandado em sede cautelar, os efeitos rigorosos e muito sérios do exigente registo de patentes, consabidamente constitutivo, de relevo erga omnes, centrado no núcleo dos direitos de expressão individual e de actuação no mercado, corporizador da criação de novas respostas técnicas a problemas relevantes para os cidadãos, para a economia e para a própria Humanidade.
Face ao exposto, não posso acompanhar a decisão que faz vencimento sendo que, por tais razões, teria revogado a decisão posta em crise no recurso apreciado.
Lisboa, 17.09.2025
Carlos M. G. de Melo Marinho
_______________________________________________________
1. Para um resumo de algumas recentes decisões judiciais nesta matéria, veja-se, https://www.juve-patent.com/cases/showdown-in-munich-federal-patent-court-revokes-xarelto-patent/
2. Neste sentido, Lionel Bently e Brad Sherman, Intellectual Property Law, 4. ed (Oxford Univ. Press, 2014), 529.
3. Veja-se, entre outros, A. Castanheira Neves, Metodologia Jurídica: problemas fundamentais, Stvdia Ivridica 1 (Coimbra Ed, 1993); Reinhold Zippelius, Introduction to German Legal Methods, trad. Kirk W. Junker e P. Matthew Roy (Carolina Academic Press, 2008).