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CUMULAÇÃO DE INVENTÁRIOS
HERANÇA PARCIALMENTE PARTILHADA
Sumário
Não obsta à admissibilidade da cumulação de inventários prevista no art. 1094.º do Cód. Civil a circunstância de uma das heranças já ter sido parcialmente partilhada.
Texto Integral
Acordam na 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa
A. Relatório A.A. Identificação das partes e indicação do objeto do litígio
AAA instaurou a presente ação declarativa, com processo especial de inventário, para partilha das heranças abertas por óbito de XXX e por óbito de YYY, seus pais.
Indicou como herdeiros, para além do cônjuge supérstite (YYY), os seus irmãos BBB, CCC, DDD e EEE, este último falecido após o óbito da inventariada e antes do óbito do inventariado, no estado de casado com FFF (no regime de comunhão geral de bens).
Em 18 de junho de 2024 (refs. 58225657 e 49229222), os interessados BBB, CCC e DDD requereram cumulação do inventário para partilha da herança aberta por óbito de EEE.
Em 4 de setembro de 2024 (refs. 5912719 e 49751528), a interessada FFF opôs-se ao pedido de cumulação do inventário aberto por óbito do seu falecido marido (EEE), alegando que a herança deste já foi partilhada por escritura pública.
Em 4 de setembro de 2024 (refs. 5913185 e 49574793), a cabeça-de-casal, AAA, opôs-se ao pedido de cumulação do inventário aberto por óbito do seu falecido irmão (EEE), alegando que a herança deste já foi partilhada.
Decidindo a questão, o tribunal a quo proferiu o seguinte despacho:
“Uma vez que já foi efetuada a partilha extrajudicial da herança deixada por óbito de YYY, conforme os documentos juntos aos autos (fls. 52 verso a 55 verso), impossível se torna que os presentes autos corram para o mesmo efeito.
Destarte, os presentes autos correrão apenas para partilha da herança deixada por óbito de XXX e de YYY”.
Inconformados, os interessados BBB, CCC e DDD apelaram desta decisão, concluindo, no essencial:
“4 – (…) [O] tribunal a quo fez uma análise inexata da Escritura de Partilha de EEE, (…) porquanto considerou estar perante uma partilha total do acervo hereditário daquele. (…)
7 – (…) [A] partilha efetuada por óbito de EEE reporta-se somente a uma partilha parcial,
8 – Encontrando-se por determinar e, consequentemente, por partilhar, o direito à herança de EEE na herança aberta por óbito da sua falecida mãe, XXX.
9 – Para além disto, e com o decesso do pai YYY, continua por determinar a quota-parte deste no direito de EEE à herança aberta por óbito da sua mãe, XXX, e que não foi objeto de partilha na respetiva escritura junta aos autos”.
Não foram apresentadas contra-alegações.
A.B. Questões que ao tribunal cumpre solucionar
A única questão a tratar é a da admissibilidade da requerida cumulação de inventários.
*
B. Fundamentação
B.A. Factos assentes (incluindo conclusivos não controvertidos)
1 – Em 3 de março de 2005, faleceu XXX, no estado de casada com YYY.
2 – Sucederam a XXX o seu cônjuge, YYY, e os filhos do casal AAA, BBB, CCC, DDD e EEE.
3 – Em 18 de outubro de 2008, EEE casou com FFF, no regime de comunhão geral de bens.
4 – Em 17 de junho de 2023, faleceu EEE, no estado de casado com FFF
5 – Sucederam a EEE o seu cônjuge, FFF, e seu pai, YYY.
6 – Em 13 de julho de 2023, foi outorgada escritura pública de “PARTILHA”, visando a partilha da herança aberta por óbito de EEE, sendo esta constituída por três verbas: um prédio rústico, um prédio urbano e 1/24 de um prédio misto.
7 – Em 9 de outubro de 2023, faleceu YYY, no estado de viúvo de XXX.
8 – Sucederam a YYY os seus filhos AAA, BBB, CCC e DDD.
B.B. Análise dos factos e aplicação da lei
São as seguintes as questões de direito parcelares a abordar: 1. Verificação dos requisitos da cumulação de inventários 2. Responsabilidade pelas custas
1. Verificação dos requisitos da cumulação de inventários
Apenas se discute a possibilidade de cumulação do inventário para partilha da herança deixada por EEE com os inventários para partilhas das heranças abertas por óbito de XXX e por óbito de YYY, seus pais.
Dispõe o art. 1094.º do Cód. Proc. Civil: Artigo 1094.º Cumulação de inventários 1 – É admissível a cumulação de inventários para a partilha de heranças diversas quando: a) As pessoas por quem tenham de ser repartidos os bens sejam as mesmas; b) Se trate de heranças deixadas pelos dois cônjuges; c) Uma das partilhas esteja dependente da outra ou das outras. 2 – No caso referido na alínea c) do número anterior: a) Se a dependência for total, a cumulação é sempre admissível, por não haver, numa das partilhas, outros bens a adjudicar além dos que ao inventariado tenham de ser atribuídos na outra; b) Se a dependência for apenas parcial, o juiz pode indeferir a cumulação quando a mesma se afigure inconveniente para os interesses das partes ou para celeridade do processo, por haver outros bens a partilhar.
A questão que nos ocupa resolve-se, assim, na resposta a dar à questão do preenchimento, ou não, dos pressupostos da cumulação descritos nas als. a) e c) transcritas.
Afigura-se-nos incontroverso que EEE sucedeu à inventariada XXX, sua mãe (arts. 2033.º, n.º 1, al. a), e 2157.º do Cód. Civil). O mesmo é dizer que o seu património era integrado por este ativo.
Tendo também falecido EEE, o seu património transmitiu-se para os seus herdeiros. Isto significa que a posição deste na herança de sua mãe transmitiu-se, indivisa, para o seu pai e para o seu cônjuge sobrevivo. E indivisa se mantém esta posição – que envolve a contitularidade em comunhão hereditária de todos os bens e direitos que integram a herança da sua progenitora.
Não procede, pois, a argumentação expendida pela cabeça-de-casal e pelo cônjuge do falecido EEE. A herança deste não se encontra totalmente partilhada.
Se alguma utilidade tem tal oposição é a de permitir subsumir o caso à citada al. a) do n.º 1 do art. 1094.º do Cód. Proc. Civil. Neste momento, “as pessoas por quem tenham de ser repartidos os bens” da herança de XXX são “as mesmas” que recebem bens da herança do filho desta: FFF recebe bens da herança do seu marido e da mãe deste – aqui por ser herdeira do falecido aceitante seu marido –; os restantes interessados recebem bens (ou direitos) da herança de sua mãe e do seu irmão – aqui por serem herdeiros do falecido aceitante seu pai.
Claro está que, até mais imediatamente, também se encontra preenchida a hipótese legal enunciada na al. c) do n.º 1 do art. 1094.º do Cód. Proc. Civil: “uma das partilhas esteja dependente da outra ou das outras”. Com efeito, a partilha do único ativo não partilhado da herança de EEE – com a adjudicação dos bens ou dinheiro que a vierem a integrar – só pode ser feita depois de realizada a partilha da herança de sua mãe. E considerando que apenas resta partilhar, da herança daquele, a titularidade de um quinhão na herança desta, devemos mesmo concluir que esta a dependência é hoje total, para os efeitos previstos na al. a) do n.º 2 do art. 1094.º do Cód. Proc. Civil.
O inventário para partilha adicional da posição de EEE na herança da inventariada XXX pode (e deve) ser cumulado com o inventário para partilha desta herança, tramitado neste processo. A apelação procede, sendo de autorizar a requerida cumulação de inventários, aqui se partilhando os ativos (bens ou diretos) ainda não partilhados que integram a herança aberta por óbito de EEE.
2. Responsabilidade pelas custas
A responsabilidade pelas custas cabe às apeladas AAA e FFF (art. 527.º do Cód. Proc. Civil), por terem ficado vencidas.
C. Dispositivo C.A. Do mérito do recurso
Em face do exposto, na procedência da apelação, acorda-se em revogar o despacho recorrido e admitir a cumulação do inventário para a partilha dos bens e direitos que integram herança aberta por óbito de EEE que ainda não tenham sido partilhados, realizando-se em conjunto com os inventários para partilha dos bens deixados por óbito de XXX e por óbito de YYY, seus pais. C.B. Das custas
Custas a cargo das apeladas AAA e FFF. * Notifique.
Lisboa, 04-11-2025
Paulo Ramos de Faria
Cristina Silva Maximiano
Rute Alexandra da Silva Sabino Lopes