DUPLA CONFORME PARCIAL
NULIDADE PROCESSUAL
ADMISSIBILIDADE
QUESTÃO NOVA
DECISÃO JUDICIAL
SUCUMBÊNCIA
VALOR DA AÇÃO
OBRA
ALTERAÇÃO
ABUSO DO DIREITO
VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM
ALEGAÇÕES DE RECURSO
PRINCÍPIO DA PRECLUSÃO
PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Sumário


Sumário (art.º 663º, nº7 do CPC):
I. O critério principal para se aferir da existência de dupla conforme é a confirmação da decisão (e não da fundamentação), o que quer dizer que, se estivermos perante uma hipótese em que a Relação revogou parcialmente a decisão da 1ª instância, não podemos pois dizer que existe dupla conforme plena.
II. Há no entanto situações concretas onde estão em causa diversos pedidos, nas quais se impõe apurar se algum ou alguns dos pedidos formulados são autónomos e cindíveis em relação a outros, hipóteses em que a dupla conforme se pode formar quanto a uns e não quanto a outros.
III. Nos casos em que existe fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, passa a valer a solução pragmática que privilegia o critério principal assente unicamente no valor do processo no qual a decisão foi proferida.
IV. Nas situações típicas abarcadas pelo preceituado na 1ª parte do nº1 do art.º 671º é inequívoco que o ponto de referência para a admissibilidade da revista é o teor do acórdão da Relação e não o teor da decisão da 1ª instância sobre o qual incidiu.
V. Os recursos são meios de obter a reponderação das questões já anteriormente colocadas e a eventual reforma de decisões dos Tribunais inferiores, e não de alcançar decisões novas, só assim não acontecendo nos casos em que a lei determina o contrário, sujeitando os mesmo ao conhecimento oficioso por parte do tribunal de recurso.

Texto Integral


Acordam no Supremo Tribunal de Justiça


I. Relatório:

Notificada que foi da decisão sumária entretanto proferida nos autos, veio a recorrente Quercasa – Construção, Compra e Venda de propriedades Lda. reclamar para a conferência tendo por fundamento o artigo 652º, nº3, do Código de Processo Civil, indicando do seguinte modo as questões de direito a resolver:

I – O que não está nos autos (deck poente)

II – Decisão surpresa

III – Violação do princípio do contraditório (artigo 3º nº 3 do CPC)

IV – Violação do direito a uma tutela jurisdicional efectiva consagrada constitucionalmente no artigo 20 nº 4 do CRP.

Perante tal pretensão não se pronunciaram os reclamados AA e mulher, BB.

Apreciando:

É a seguinte a redacção do nº3 do art.º 652º do CPC: “Salvo o disposto no nº6 do artigo 641º, quando a parte se considere prejudicada por qualquer despacho do relator, que não seja de mero expediente, pode requerer que sobre na matéria do despacho recaia um acórdão; o relator deve submeter o caso à conferência, depois de ouvida a parte contrária.”

Como se verifica, nos autos a recorrente ora reclamante Quercasa – Construção, Compra e Venda de propriedades Lda., veio reiterar a admissibilidade da revista que tinha interposto.

E traz no fundo à colação a argumentação na qual sustentou a admissibilidade de tal recurso e que na decisão sumária antes proferida se entendeu por bem não acolher.

Face ao acabado de expor, impõe-se dizer que ao colectivo se afigura que a decisão a proferir deverá ser algo diversa daquela que foi proferida pela Relator em decisão sumária e na qual se considerou que se estava perante a figura da dupla conforme que atento o disposto no nº3 do art.º 671º do CPC, o que inviabiliza a admissibilidade do recurso aqui interposto.

Vejamos, pois.

AA e mulher, BB, residentes na Avenida 1 Vila Nova de Gaia, intentaram a presente acção declarativa de condenação, sob a forma comum de processo, contra QUERCASA – Construção, Compra e Venda de Propriedades Lda. com sede na Rua da Rasa, nº 281, 4400 - 272 Vila Nova de Gaia, pedindo:

a) A condenação da Ré na eliminação dos defeitos identificados na petição inicial no prazo de 60 dias, findos os quais se deverá considerar por definitivamente não cumprida por parte da Ré a eliminação dos defeitos,

b) A condenação da Ré no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória de €250,00 por cada dia de atraso na eliminação das irregularidades;

c) Ou, no caso de não cumprimento por parte da Ré ou de recusa de cumprimento na eliminação dos defeitos supra peticionada, deverá ser atribuído aos Autores o direito de eliminarem as irregularidades e a Ré ser condenada a pagar aos Autores o valor da eliminação de tais irregularidades, valor esse a ser liquidado em execução de sentença;

d) A condenação da Ré no pagamento de quantia não inferior a €10.000,00, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos.

Para tanto, e em síntese, alegam que a Ré levou a cabo a construção de um edifício e que no início da construção do mesmo começou a comercializar as fracções autónomas que deste faziam parte, apresentando-as em planta e através de prospectos.

Nesse contexto, contactaram a Ré para obter informações nomeadamente sobre as condições das fracções a construir, preços, materiais e prazos de conclusão, tendo a Ré apresentado a construção como sendo de luxo, fornecendo-lhes um prospecto, do qual resultava como seria o produto final.

Após a outorga de contrato-promessa, que foi alterado por acordo das partes no que à garagem respeita, veio a ser celebrada em 11.12.2015 a escritura de compra e venda, tendo nessa mesma data sido entregues o certificado energético e a ficha técnica da habitação.

Mais alegam que até meados de Junho de 2017 foram surgindo vários problemas no andar, reparações necessárias e trabalhos por realizar e acabar, que a Ré foi fazendo algumas reparações que, todavia, nunca solucionaram definitivamente os problemas surgidos.

Por esse motivo, em meados de Junho de 2017 procederam ao levantamento das patologias existentes, que comunicaram à Ré por carta registada com aviso de recepção recebida por esta em 30.06.2017, tendo nessa sequência sido feitas reparações, sem que fossem as anomalias detectadas reparadas.

Descrevem os defeitos e anomalias que entendem existir no imóvel nos mesmos termos que as indicaram na missiva remetida em 30.06.2017.

Alegam ainda que toda a situação lhes causou danos de natureza não patrimonial, que descrevem.

Tramitado o processo foi proferida em 1ª instância sentença onde se decidiu:

a) Julgar parcialmente procedente a excepção de caducidade invocada pela Ré e, em consequência, absolver a Ré do pedido quanto à colocação dos toalheiros nas casas de banho;

b) Condenar a Ré na eliminação das desconformidades existentes, que se traduzem nas descritas nas alíneas i) a v), viii), ix), xi) a xvii), xxi) a xxiii), este último excepto quanto à orla, xxiv) a xxx), xxxiv) a xxxvi), xxxviii) e xl) a xlii) do facto 22º, no prazo de sessenta dias;

c) Condenar a Ré a entregar aos Autores os projetos e manuais de utilizador de equipamento de aquecimento das águas sanitárias, equipamento de aquecimento (bomba de calor Delonghi) e refrigeração do ambiente interior, equipamento do sistema de painel solar e domótica,

d) Condenar a Ré no pagamento aos Autores da quantia de €7.500,00, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos;

e) Absolver, no mais, a Ré do pedido;

f) Julgar improcedente a reconvenção deduzida e, em consequência, absolver os Autores do pedido reconvencional.

Interposto recurso de Apelação pela Ré foi proferido acórdão pela Relação no qual se decidiu julgar parcialmente procedente o recurso, sendo a fundamentação, no essencial, a mesma, e, em conformidade, em revogar parcialmente a sentença proferida, nos seguintes termos:

Na alínea b) passará a ler-se o seguinte:

“Condenar a Ré na eliminação das desconformidades existentes, que se traduzem nas descritas nas alíneas (nos termos sobreditos):

i) a v): a R. aprumará a porta, colocará fechos superiores adequados, corrigirá as diferentes folgas entre os painéis e substituirá o painel que se encontra lascado, viii), ix), xi a xvii), xxi a xxii), xxiv) a xxx), xxxiv) a xxxvi), xxxviii) e xl) a xlii), num prazo de 120 dias”.

No mais (excertos c) e d) do dispositivo), mantemos a decisão recorrida.

Notificada desta decisão veio a Ré interpor recurso de Revista, concluindo do seguinte modo as suas alegações:

1 - Há fundamento para a presente revista ao abrigo do disposto nas alíneas a), b) e c) do nº 1 do artigo 674º do CPC.

2 - Dito isto, e porque o Supremo Tribunal de Justiça conhece da matéria de direito, a recorrente não concorda com a aplicação ao abrigo do disposto no art.º 5.º, n.º 2 al. b), do NCPCiv em clara violação do artigo 3º nº 3 do CPC. (ver alínea xxix da sentença)

3 - É verdade que o Tribunal pode agora, ao abrigo do dito art.º 5.º, n.º 2 al. b), do NCPCiv., acolher para a decisão factos que, embora ainda essenciais, já não são os nucleares, mas antes complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, mas desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar, ISTO É, com sujeição à possibilidade de exercício do contraditório.

Vejamos:

4 - O deck poente não fazia parte do objecto da perícia.

5 - Quem aditou tais factos (novos) nas suas respostas no relatório pericial (ponto 32) foram os senhores peritos, por sua livre e exclusiva iniciativa, aditaram facto novo (em relação ao que constava da perícia) sem que qualquer das partes tal lhe tivesse solicitado e sem qualquer tipo de aviso prévio ou possibilidade de contradição.

6 - Trata-se de uma prática profundamente ilegal e altamente desrespeitadora dos direitos e interesses processuais da parte afectada, com especial ênfase para a violação do princípio do contraditório, provocando incontornavelmente a fulminante nulidade do acórdão recorrido.

7 - Em audiência de discussão e julgamento a recorrente e os senhores peritos deram conta do excesso de alegação e a determinada altura o Sr. perito do Tribunal Arq. CC disse “então retire-se lá o deck poente” não se tendo procedido ao contraditório quanto ao deck poente, pelo que foi com surpresa a condenação na reparação do deck poente constante da douta sentença. (ver alínea xxix da sentença)

8 - Com efeito, o Tribunal “a quo” , no decorrer da produção da prova - apesar de alertado – mas antes da prolação da sentença –, também não emitiu despacho com recorte do facto em discussão (ali claramente identificado/delimitado), dando nota de se tratar de facto não alegado, e concedendo às partes a oportunidade de se pronunciarem, nos termos previstos no “art.º 5.º, n.º 2, al. b), in fine, do novo CPC”.

9 - Aliás, a recorrente e o seu mandatário assistiram “in loco” à realização da perícia, em tempos de Covid 19, e na sua presença não foi feita vistoria ao deck poente.

10 - E cabe ao Juiz respeitar e fazer observar o princípio do contraditório ao longo de todo o processo, não lhe sendo lícito conhecer de questões sem dar a oportunidade às partes de, previamente, sobre elas se pronunciarem, sendo proibida decisão-surpresa (a solução efetivamente dada a uma questão que, embora previsível, não tenha sido configurada pela parte, sem que a mesma tivesse obrigação de a prever – nº3, do art. 3º, do CPC), o caso, pois que se trata de decisão de questão, oficiosamente suscitada, fundada em prova, para tanto, determinada pelo juiz, sem, sequer, disso ter sido dado conhecimento às partes.

11 - A inobservância do contraditório constitui uma omissão grave, representando uma nulidade processual sempre que seja susceptível de influir no exame ou na decisão da causa, sendo nula a decisão (surpresa) quando à parte não foi dada possibilidade de se pronunciar sobre factos e respectivo enquadramento jurídico (designadamente seu alcance e efeitos).

12 - Ao decidir como decidiu o Tribunal de primeira instância cometeu nulidade processual passível de influir – como influiu – na decisão da causa, nulidade que, antes de mais, aqui se deixa invocada, com a consequente nulidade também da decisão recorrida – que aqui também, por cautela, se arguiu.

13 - Consubstanciando a decisão proferida em primeira instância verdadeira decisão surpresa, proibida por lei, e assim nula, que deverá ser revogada.

14 - O que não está nos autos não está no mundo, pelo que é nula a decisão na condenação da R. na eliminação da desconformidade quanto ao deck poente constante da alínea xxix.

15 - Pelo que, salvo o devido respeito, se nos afigura claro ocorrer violação do princípio do contraditório, tal como previsto no art.º 3.º, n.º 3, do C.C..

Sem prescindir,

16 – No acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto consta: “ Os AA. não permitiram o necessário para uma correta instalação da porta, com as furações necessárias, tendo privilegiado a opção estética em detrimento da funcional; de outro modo, cremos, e estaríamos a dar guarida a um abuso do direito nos termos expostos.”

17 - Alíneas i a v será mantida a decisão mas confinada ao seguinte: à ré aprumará a Porta colocará fechos superiores adequados, corrigirá as diferentes folgas entre os painéis e substituirá o painel que se encontra lascado.

Dito isto,

18 – Os AA. alegaram no artigo 26º nº 1 da P.I.: Já que, na presente data o imóvel apresenta as seguintes irregularidades:

1. A porta da sala, articulável (tipo livro), encontra-se empenada, não funcionando correctamente em termos de abertura e fecho. Os fechos embutidos existentes não têm qualquer função por má conceção. Acresce ainda referir que as folgas verticais entre os diversos elementos que constituem a porta são anormais, por folga excessiva que permite a visualização da sala para a copa ou vice-versa, quando a porta se encontra fechada. Mais ainda se acrescenta que a porta tem o revestimento em folha de madeira lascada.

19 - O A. marido omitiu de forma consciente e censurável que não permitiu que perfurasse o piso, tendo apenas o confessado em depoimento de parte/declarações de parte.

20 - As testemunhas da Ré (DD encarregado geral, EE electricista e FF) confirmaram que o cliente/A. não quis que furasse o pavimento para colocar os fechos em baixo. Tal facto impeditivo, teve como consequência, o desalinhamento/desaprumo/folgas da porta causa que é imputável aos AA..

22 - Ou seja, desta factualidade ressalta que os AA. deram autorização à Ré para alteração da obra primitiva projectada, apesar de avisados das implicações futuras na porta, o que se veio a verificar e, mesmo assim, conscientes disso, vêm peticionar a condenação da Ré na reparação do mesmo, o que constitui um abuso de direito.

23 - Não se trata de uma questão de estética em detrimento da funcional. Trata-se de uma opção consciente dos AA. que teve como efeito/causa o defeito, ou seja, a causa da “avaria”/desconformidades se deveu a culpa do comprador/consumidor na não inclusão de fecho na parte inferior da porta, é de considerar afastada a presunção da falta de conformidade.

24 - Há abuso por parte dos AA. ao não permitir as furações para fixar a porta o que levou ao descambar/desalinhamento/folgas da mesma, apesar de terem sido devidamente avisados, tendo ficado conscientes desse facto, e mesmo peticionar a condenação da Ré na sua reparação, prática abusiva e censurável e que só em Tribunal confessou ter impedido a colocação das furações necessárias para o fecho.

25 - O venire contra factum proprium pressupõe duas atitudes antagónicas, sendo a primeira (factum proprium) contrariada pela segunda atitude, com manifesta violação dos deveres de lealdade e dos limites impostos pelo princípio da boa-fé.

26 - É ilegítimo o exercício de um direito em contradição com o comportamento assumido anteriormente pelo exercente, por ser contrário aos princípios impostos pela boa fé.

27 - Pelo que também quanto a este aspecto não andou bem o Tribunal “a quem” ao decidir como decidiu.

28 - O Acórdão recorrido, violou, por erro de interpretação ou aplicação, nomeadamente as normas dos artigos 3º, 5º do CPC e Artigo 334º do C.C..

Termos em que deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se a decisão recorrida e substituindo-se por uma outra:

a) Que conheça da nulidade da sentença por violação do princípio do contraditório.

b) Que conheça do Instituto do abuso do direito supra alegado.


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Não foram apresentadas contra alegações.

No despacho que admitiu o recurso foi apreciada e considerada não verificada a nulidade invocada.


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Por se suscitarem dúvidas quanto à admissibilidade da Revista foi dado cumprimento ao disposto no art.º 655º do CPC.

Só a Ré/Recorrente veio responder reiterando a tese da admissibilidade da revista.

Cumpre pois apurar da admissibilidade do recurso aqui interposto.

E desde logo quanto à verificação de dupla conforme:

Como antes já vimos, na tese da Ré/Recorrente há fundamento para a presente revista ao abrigo do disposto nas alíneas a), b) e c) do nº 1 do artigo 674º do CPC.

Caber no entanto não esquecer que o conhecimento de tal pretensão está dependente da verificação dos pressupostos gerais que condicionam a admissibilidade do recurso de revista, nomeadamente o pressuposto expressamente previsto no nº3 do art.º 671º do CPC.

A este propósito e pela pertinência das considerações que no mesmo ficaram a constar, chamamos aqui à colação a decisão proferida no Acórdão do STJ de 06.07.2021, proferido no processo 583/16.3T8FND.C1.S2, dado a conhecer em www.dgsi.pt., cujo respectivo sumário passamos a transcrever:

I - A admissibilidade do recurso de revista, no caso de o acórdão da Relação ter confirmado, por unanimidade, a decisão da 1ª instância, está dependente do facto de ter sido empregue fundamentação substancialmente (essencialmente) diferente.

II - É irrelevante a invocação da violação da lei substantiva e processual e do disposto no art.º 674.º, n.º 1, do CPC, onde estão indicados os fundamentos da revista, visto que, para poderem ser apreciados, era necessário que a revista fosse admissível e, como vimos, não é, face à existência de dupla conforme.

III - E a invocação da nulidade do acórdão também é irrelevante, para este efeito, visto que ela não prejudica a existência de dupla conformidade (cfr., neste sentido, Conselheiro Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5ª ed., pág. 369).”

Perante tal entendimento a que também aderimos, cabe pois apreciar se nos autos se verifica (ou não) uma situação de dupla conforme.

A propósito desta questão foi o seguinte o entendimento subscrito no recente Acórdão do STJ de 28.01.2025, no processo 34326/15.4T8LSB-D.L1.S1, em www.dgsi.pt:

“Conforme jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal de Justiça, o conceito de fundamentação essencialmente diferente não se basta com qualquer modificação ou alteração da fundamentação no iter jurídico que suporta o acórdão do tribunal a quo em confronto com a sentença de 1.ª instância, sendo antes indispensável que, naquele aresto, ocorra uma diversidade estrutural e substancialmente diferente no plano da subsunção do enquadramento normativo da mesma matéria litigiosa.

A alusão à natureza essencial da diversidade da fundamentação claramente nos induz a desconsiderar, para o mesmo efeito, discrepâncias marginais, secundárias, periféricas, que não representa, efetivamente um percurso jurídico diverso. O mesmo se diga quando a diversidade de fundamentação se traduza apenas na recusa, pela Relação, de uma das vias trilhadas para atingir o mesmo resultado ou, do lado inverso, no aditamento de outro fundamento jurídico que não tenha sido considerado ou que não tenha sido admitido, ou no reforço da decisão recorrida através do recurso a outros argumentos, sem pôr em causa a fundamentação usada pelo tribunal de 1.ª instância.

Estaremos perante uma fundamentação essencial diversa “quando a solução jurídica do pleito prevalecente na Relação tenha assentado, de modo radicalmente ou profundamente inovatório, em normas, interpretações normativas ou institutos jurídicos perfeitamente diversos e autónomos dos que haviam justificado e fundamentado a decisão proferida na sentença apelada – ou seja, quando tal acórdão se estribe decisivamente no inovatório apelo a um enquadramento jurídico perfeitamente diverso e radicalmente diferenciado daquele em que assentara a sentença proferida em 1ª instância”27.

Assim, “verifica-se fundamentação essencialmente diferente quando o acórdão da Relação, embora confirmativo da decisão da 1.ª instância, sem vencimento, o faça com base em fundamento de tal modo diferente que possa implicar um alcance do caso julgado material diferenciado do que viesse a ser obtido por via da decisão recorrida”.

Sendo este o critério geral que deve ser seguido na maior parte das situações em que se discute a verificação (ou não) da dupla conforme, outros existem, como o dos autos, que se revestem de particularidades que devem ser consideradas.

Ora é consabido que o critério principal para se aferir da existência de dupla conforme é a confirmação da decisão (e não da fundamentação), o que quer dizer que, se estivermos perante uma hipótese em que a Relação revogou parcialmente a decisão da 1ª instância, não pode pois dizer-se que existe dupla conforme plena.

Há no entanto situações concretas, como a dos autos, nas quais estamos perante diversos pedidos.

E nestas impõe-se apurar se algum ou alguns dos pedidos formulados são autónomos e cindíveis em relação a outros, já que nestes casos a dupla conforme se pode formar quanto a uns e não quanto a outros (neste sentido cf. o AUJ 7/2022 de 20.09.2022, publicado no DR., nº 201, 1ª série de 18.10.2022).

Ou seja, o que caberá fazer nestes casos é ver, um a um, se o pedido ou pedidos são autónomos e cindíveis em relação com os demais.

Assim, nestes, os autónomos e cindíveis em que a Relação tenha confirmado a decisão de 1ª instância, há dupla conforme.

Já os outros, também eles autónomos e cindíveis mas nos quais a Relação alterou a decisão da 1ª instância, não haverá dupla conforme.

Aplicando tais regras ao caso concreto o que se impõe desde logo salientar é o seguinte:

Como de forma expressa foi dito no acórdão recorrido, a Relação decidiu julgar parcialmente procedente o recurso de apelação interposto pela Ré, tendo por base e no que toca à grande maioria dos pedidos formulados pelos Autores, uma fundamentação em tudo idêntica à que sustentou a sentença proferida pela 1ª instância.

O que de diferente foi decidido pela Relação, foi o que resulta do segmento do acórdão que agora se passa a transcrever:

Posto isto, tendo em conta a decisão da matéria de facto, vejamos alínea por alínea.

O dispositivo da sentença, nesta parte, é do seguinte teor:

“b) Condenar a Ré na eliminação das desconformidades existentes, que se traduzem nas descritas nas alíneas i) a v), viii), ix), xi) a xvii), xxi) a xxiii), este último exceto quanto à orla, xxiv) a xxx), xxxiv) a xxxvi), xxxviii) e xl) a xlii) do facto 22º, no prazo de sessenta dias”.

Por tudo quanto vimos expondo, passamos então a decidir.

Alíneas:

i) a v): Será mantida a decisão mas confinada ao seguinte: a R. aprumará a porta, colocará fechos superiores adequados, corrigirá as diferentes folgas entre os painéis e substituirá o painel que se encontra lascado.

Assim será porque, pois os AA. não permitiram o necessário para uma correta instalação da porta, com as furações necessárias, tendo privilegiado a opção estética em detrimento da funcional; doutro modo, cremos, estaríamos a dar guarida a um abuso do direito, nos termos expostos.

Procede assim, parcialmente, esta pretensão recursória.

viii): Será mantida a decisão, procedendo-se ao alinhamento e afinação necessários.

ix): Tal blackout será substituído e os demais afinados.

xi a xvii): Será mantida a decisão.

xxi a xxiii): Será mantida a decisão apenas no atinente às alíneas xxi e xxii).

Quanto à xxiii A) consideramos que as prateleira do roupeiro não foram utilizadas para o fim a que normalmente se destinam (colocar roupa) e, quanto à xxiii B) não é exigível que a parte de trás de uma prateleira, que não se vê por estar encostada ao fundo, esteja orlada.

Procede assim, parcialmente, esta pretensão recursória.

xxiv) a xxx): Será mantida a decisão.

xxxiv) a xxxvi): Será mantida a decisão.

xxxviii): Será mantida a decisão.

xl) a xlii): Será mantida a decisão.

A recorrente insurge-se quanto ao prazo concedido, de 60 dias, para eliminar as desconformidades, pretendendo 210 (grosso modo, 7 meses).

A lei tem como critério, no caso de um imóvel, um “prazo razoável”. Considerando a amplitude da condenação, consideramos exíguo o prazo de 60 dias e como sendo razoável o de 120 dias.

Nesta parte, procederá parcialmente a pretensão recursória.

Ainda quanto aos manuais respeitantes à fração: se é verdade que hoje em dia existem manuais na internet, tal não impede que a R. não os tenha que entregar, tanto mais que, já que assim é, mais um motivo para os imprimir e entregar…

A alínea c) do dispositivo será mantida, esclarecendo-se que apesar de o sistema de painéis solares ser comum e de a bomba de calor Delonghi (que funciona para aquecimento e para arrefecimento), podem interferir com a utilização ou eventual reparação que seja necessário fazer no interior da fração, seja no termoacumulador de água, seja numa saída de ar condicionado, isto a título exemplificativo.

Improcede assim a pretensão recursória constante da conclusão n.º 77.

(…)

Pelo exposto, o presente recurso será julgado parcialmente procedente.

III – DECISÃO

Pelos motivos expostos, e nos termos das normas invocadas, acordam os juízes destes autos no Tribunal da Relação do Porto em julgar parcialmente procedente o recurso de apelação interposto pela ré, sendo a fundamentação, no essencial, a mesma, e, em conformidade, em revogar parcialmente a sentença proferida, nos seguintes termos:

Na alínea b) passará a ler-se o seguinte:

“Condenar a Ré na eliminação das desconformidades existentes, que se traduzem nas descritas nas alíneas (nos termos sobreditos):

i) a v): a R. aprumará a porta, colocará fechos superiores adequados, corrigirá as diferentes folgas entre os painéis e substituirá o painel que se encontra lascado, viii), ix), xi a xvii), xxi a xxii), xxiv) a xxx), xxxiv) a xxxvi), xxxviii) e xl) a xlii), num prazo de 120 dias”.

No mais (excertos c) e d) do dispositivo), mantemos a decisão recorrida.

Custas na primeira instância como ali decidido e da apelação pela ré, nos termos do art.º 527.º, n.º 1, e n.º 2, do C.P.C.”

Face ao exposto o que resulta de modo claro, é que se está quanto ao pedido de reparação dos defeitos, perante pedido autónomo e cindível, relativamente ao qual a Relação alterou a decisão proferida pela 1ª instância.

E sendo assim e atento o antes exposto, deve pois concluir-se que não há, quanto a este pedido, dupla conformidade na decisão proferida e agora objecto de recurso.

Por isso, nada obsta ao conhecimento de tal pedido.

E quanto ao valor:

Dispõe o art.º 629º, nº 1, do CPC que o recurso ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal, atendendo-se, em caso de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, somente ao valor da causa.

Portanto, à luz desta norma, para que seja admissível o recurso de Revista é necessário que se verifiquem, cumulativamente, dois requisitos:

1) O valor da causa tem de ser superior a € 30.000,00, por ser esse o valor da alçada do tribunal recorrido;

2) O valor da sucumbência tem de ser superior a € 15.00,00, correspondente a metade do valor dessa alçada.

Existindo uma fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, deverá, porém, atender-se somente ao valor da causa.

Como é sabido, a sucumbência (ou decaimento) é o prejuízo ou desvantagem que a decisão implica para a parte e que, por isso, se designa parte vencida; esta é, portanto, aquela a quem a decisão prejudica, que com ela sofreu gravame ou a quem ela foi desfavorável, em suma, quem perdeu a acção.

Com este requisito, que foi introduzido com a reforma processual de 1985, pretendeu-se filtrar as questões susceptíveis de serem submetidas à reapreciação dos tribunais superiores, impedindo a possibilidade de recurso em casos em que a parte ficasse vencida em escassa dimensão, com vista a que as energias se concentrem naquilo que é importante, como forma de erradicar instrumentos potenciadores de morosidade da resposta judiciária e levando ainda em linha de conta o interesse de dignificar a actividade dos tribunais superiores (neste sentido cf. Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 8ª Edição, pág. 53).

Sabe-se, no entanto, que para que funcione esta solução não basta que seja suscitada alguma controvérsia sobre o valor da sucumbência, não sendo tão pouco suficiente a verificação de uma situação de dúvida subjectiva.

Assim, a dita solução deve ficar reservada para os casos em que o regular funcionamento dos mecanismos processuais não permite quantificar com razoável segurança o valor do decaimento.

Estamos, pois, perante uma solução destinada aos casos em que se verifique uma dúvida objectiva que não possa ser sanada mediante o simples confronto entre o valor de referência (“metade da alçada”) e o resultado declarado na sentença ou no acórdão recorrido (cf. autor e obra citados, pág.54).

No caso dos autos o que se verifica é o seguinte:

Desde logo que à causa foi fixado o valor de 149.500,01 €.

A ser assim, dúvidas não restam quanto ao preenchimento do requisito antes referido na alínea a).

Já quanto ao valor da sucumbência a resposta não se afigura tão clara.

Senão vejamos:

Sabemos todos que o acórdão recorrido revogou parcialmente a sentença proferida pela 1ª instância, nos termos antes descritos.

Perante o conteúdo de tal decisão o que resulta evidente é que estamos perante uma hipótese que o Conselheiro Abrantes Geraldes na obra supra citada a pág.54 trata como “uma dúvida objectiva que não pode ser sanada mediante o simples confronto entre o valor de referência (“metade da alçada”) e o resultado declarado no acórdão recorrido.”

Isto por manifesta dificuldade na atribuição de valor aos trabalhos de reparação cuja realização foi ordenada pela Relação.

Sendo assim e estando nós perante “fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, passa a valer a solução pragmática que privilegia o critério principal assente unicamente no valor do processo no qual a decisão foi proferida” (cf. autor, obra e local supra citados).

Ou seja, também por aqui o recurso dos autos terá que ser admitido.

Nestes termos, deve pois ser deferida a reclamação apresentada pela Ré.


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Face ao decidido cabe chamar à colação o disposto no nº4 do art.º 652º do CPC, segundo o qual, “A reclamação deduzida é decidida no acórdão que julga o recurso, salvo quando a natureza das questões suscitadas impuser decisão imediata, sendo, neste caso, aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto nos nºs 2 a 4 do art.º 657º.”

Cabe pois apreciar e decidir o recurso em apreço.


*


II. Enquadramento de facto e de direito: É consabido que o objecto do recurso, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso obrigatório, está definido pelo conteúdo das conclusões vertidas pelo recorrente nas suas alegações (cf. artigos 608º, nº2, 635º, nº4 e 639º, nº1 do CPC).

Nos autos é o seguinte o teor das conclusões da ré Quercasa Lda.:

1 - Há fundamento para a presente revista ao abrigo do disposto nas alíneas a), b) e c) do nº 1 do Artigo 674º do CPC.

2 - Dito isto, e porque o Supremo Tribunal de Justiça conhece da matéria de direito, a recorrente não concorda com a aplicação ao abrigo do disposto no art.º 5.º, n.º 2 al. b), do NCPCiv em clara violação do artigo 3º nº 3 do CPC. (ver alínea xxix da sentença)

3 - É verdade que o Tribunal pode agora, ao abrigo do dito art.º 5.º, n.º 2 al. b), do NCPCiv., acolher para a decisão factos que, embora ainda essenciais, já não são os nucleares, mas antes complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, mas desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar, ISTO É, com sujeição à possibilidade de exercício do contraditório.

Vejamos:

4 - O deck poente não fazia parte do objecto da perícia.

5 - Quem aditou tais factos (novos) nas suas respostas no relatório pericial (ponto 32) foram os senhores peritos, por sua livre e exclusiva iniciativa, aditaram facto novo (em relação ao que constava da perícia) sem que qualquer das partes tal lhe tivesse solicitado e sem qualquer tipo de aviso prévio ou possibilidade de contradição.

6 - Trata-se de uma prática profundamente ilegal e altamente desrespeitadora dos direitos e interesses processuais da parte afectada, com especial ênfase para a violação do princípio do contraditório, provocando incontornavelmente a fulminante nulidade do acórdão recorrido.

7 - Em audiência de discussão e julgamento a recorrente e os senhores peritos deram conta do excesso de alegação e a determinada altura o Sr. perito do Tribunal Arq. CC disse “então retire-se lá o deck poente” não se tendo procedido ao contraditório quanto ao deck poente, pelo que foi com surpresa a condenação na reparação do deck poente constante da douta sentença. (ver alínea xxix da sentença)

8 - Com efeito, o Tribunal “a quo”, no decorrer da produção da prova - apesar de alertado – mas antes da prolação da sentença –, também não emitiu despacho com recorte do facto em discussão (ali claramente identificado/delimitado), dando nota de se tratar de facto não alegado, e concedendo às partes a oportunidade de se pronunciarem, nos termos previstos no “art.º 5.º, n.º 2, al. b), in fine, do novo CPC”.

9 - Aliás, a recorrente e o seu mandatário assistiram “in loco” à realização da perícia, em tempos de Covid 19, e na sua presença não foi feita vistoria ao deck poente.

10 - E cabe ao Juiz respeitar e fazer observar o princípio do contraditório ao longo de todo o processo, não lhe sendo lícito conhecer de questões sem dar a oportunidade às partes de, previamente, sobre elas se pronunciarem, sendo proibida decisão-surpresa (a solução efectivamente dada a uma questão que, embora previsível, não tenha sido configurada pela parte, sem que a mesma tivesse obrigação de a prever – nº3, do art.º 3º, do CPC), o caso, pois que se trata de decisão de questão, oficiosamente suscitada, fundada em prova, para tanto, determinada pelo juiz, sem, sequer, disso ter sido dado conhecimento às partes.

11 - A inobservância do contraditório constitui uma omissão grave, representando uma nulidade processual sempre que seja susceptível de influir no exame ou na decisão da causa, sendo nula a decisão (surpresa) quando à parte não foi dada possibilidade de se pronunciar sobre factos e respectivo enquadramento jurídico (designadamente seu alcance e efeitos).

12 - Ao decidir como decidiu o Tribunal de primeira instância cometeu nulidade processual passível de influir – como influiu – na decisão da causa, nulidade que, antes de mais, aqui se deixa invocada, com a consequente nulidade também da decisão recorrida – que aqui também, por cautela, se arguiu.

13 - Consubstanciando a decisão proferida em primeira instância verdadeira decisão surpresa, proibida por lei, e assim nula, que deverá ser revogada.

14 - O que não está nos autos não está no mundo, pelo que é nula a decisão na condenação da R. na eliminação da desconformidade quanto ao deck poente constante da alínea xxix.

15 - Pelo que, salvo o devido respeito, se nos afigura claro ocorrer violação do princípio do contraditório, tal como previsto no art.º 3.º, n.º 3, do C.C..

Sem prescindir,

16 – No acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto consta: “ Os AA. não permitiram o necessário para uma correta instalação da porta, com as furações necessárias, tendo privilegiado a opção estética em detrimento da funcional; de outro modo, cremos, e estaríamos a dar guarida a um abuso do direito nos termos expostos.”

17 - Alíneas i a v será mantida a decisão mas confinada ao seguinte: à ré aprumará a Porta colocará fechos superiores adequados, corrigirá as diferentes folgas entre os painéis e substituirá o painel que se encontra lascado.

Dito isto,

18 – Os AA. alegaram no artigo 26º nº 1 da P.I.: Já que, na presente data o imóvel apresenta as seguintes irregularidades:

1. A porta da sala, articulável (tipo livro), encontra-se empenada, não funcionando corretamente em termos de abertura e fecho. Os fechos embutidos existentes não têm qualquer função por má conceção. Acresce ainda referir que as folgas verticais entre os diversos elementos que constituem a porta são anormais, por folga excessiva que permite a visualização da sala para a copa ou vice-versa, quando a porta se encontra fechada. Mais ainda se acrescenta que a porta tem o revestimento em folha de madeira lascada.

19 - O A. marido omitiu de forma consciente e censurável que não permitiu que perfurasse o piso, tendo apenas o confessado em depoimento de parte/declarações de parte.

20 - As testemunhas da Ré (DD encarregado geral, EE eletricista e FF pintor) confirmaram que o cliente/A. não quis que furasse o pavimento para colocar os fechos em baixo. Tal acto impeditivo, teve como consequência, o desalinhamento/desaprumo/folgas da porta causa que é imputável aos AA..

22 - Ou seja, desta factualidade ressalta que os AA. deram autorização à Ré para alteração da obra primitiva projectada, apesar de avisados das implicações futuras na porta, o que se veio a verificar e, mesmo assim, conscientes disso, vêm peticionar a condenação da Ré na reparação do mesmo, o que constitui um abuso de direito.

23 - Não se trata de uma questão de estética em detrimento da funcional. Trata-se de uma opção consciente dos AA. que teve como efeito/causa o defeito, ou seja, a causa da “avaria”/desconformidades se deveu a culpa do comprador/consumidor na não inclusão de fecho na parte inferior da porta, é de considerar afastada a presunção da falta de conformidade.

24 - Há abuso por parte dos AA. ao não permitir as furações para fixar a porta o que levou ao descambar/desalinhamento/folgas da mesma, apesar de terem sido devidamente avisados, tendo ficado conscientes desse facto, e mesmo peticionar a condenação da Ré na sua reparação, prática abusiva e censurável e que só em Tribunal confessou ter impedido a colocação das furações necessárias para o fecho.

25 - O venire contra factum proprium pressupõe duas atitudes antagónicas, sendo a primeira (factum proprium) contrariada pela segunda atitude, com manifesta violação dos deveres de lealdade e dos limites impostos pelo princípio da boa-fé.

26 - É ilegítimo o exercício de um direito em contradição com o comportamento assumido anteriormente pelo exercente, por ser contrário aos princípios impostos pela boa-fé.

27 - Pelo que também quanto a este aspeto não andou bem o Tribunal “a quem” ao decidir como decidiu.

28 - O Acórdão recorrido, violou, por erro de interpretação ou aplicação, nomeadamente as normas dos artigos 3º, 5º do CPC e artigo 334º do C.C..

Termos em que deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se a decisão recorrida e substituindo-se por uma outra:

a) Que conheça da nulidade da sentença por violação do princípio do contraditório.

b) Que conheça do instituto do abuso do direito supra alegado.


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Como resulta do acabado de expor, o objecto do recurso foi circunscrito pela Ré às seguintes questões:

1ª) A nulidade que decorre do incumprimento das regras do contraditório expressamente previstas na parte final da alínea b) do nº2 do art.º 5º do CPC;

2ª) O abuso de direito por parte dos Autores

Vejamos, pois, da pertinência de tais pretensões.

Como resulta dos autos na sentença proferida em 1ª instância foram considerados como provados os seguintes factos:

1) A Ré é uma sociedade comercial que tem por objeto a construção, administração, compra e venda de propriedades e gestão de imóveis próprios;

2) No exercício da sua atividade, a Ré propôs-se construir, construiu e comercializou, nos prédios urbanos de sua propriedade inscritos na respetiva matriz sob os artigos ..00, ..28, ..29, e descritos na respetiva conservatória sob os nºs ...50, ...51 e ...78, da freguesia de Mafamude, em Vila Nova de Gaia, um imóvel com o projeto de obras aprovado com o nº ..81/08, para construção de um bloco composto por 8 habitações (uma por cada andar), comércio e aparcamento, sito na Avenida 1, em Vila Nova de Gaia;

3) A Ré começou a comercializar as frações logo no início da construção do imóvel;

4) Apresentando, nessa altura, as diversas frações em planta.

5) No âmbito dessa comercialização, os Autores contactaram a Ré para saber das condições das frações a construir, preços, tipo de materiais, prazos, etc.;

6) Estando os Autores interessados nas condições da fração que se localizaria no último piso, com terraço;

7) A Ré apresentou aos Autores uma construção com carácter de luxo, exclusividade e raridade que era a “essência de uma obra de arte”, com oito apartamentos tipo T4 e T5, com cerca de 260 m2 de beleza e valor inalteráveis, preservando o ambiente e com racionalização do consumo de energia”,

8) Essas negociações decorreram durante vários meses;

9) Tendo as partes chegado a acordo, a 12.08.2009 foi assinado o contrato-promessa de compra e venda do 9º andar do imóvel e uma garagem fechada para dois carros, pelo valor total de €347.500,00 (cfr. documento n.º 3, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);

10) Tendo-se celebrado um aditamento ao contrato-promessa em 09.02.2011 (cfr. documento n.º 4 anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);

11) O responsável da Ré forneceu aos Autores, em data não concretamente apurada, a descrição que constitui o documento n.º 2, bem como o prospeto que constitui o documento n.º 1, anexos à petição inicial e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;

12) As características apresentadas garantiriam uma elevada qualidade de construção e conforto do imóvel.

13) Ao longo da execução do edifício foi decidido pela Ré a inclusão de gerador de corrente elétrica para as partes comuns; a colocação de bomba de calor; a montagem do sistema de ar condicionado com condutas e ventiloconvectores ( vcs ) ocultos e não com aparelhos à vista, o revestimento a material cerâmico do pavimento das garagens e paredes (até cerca de 1,20m de altura), com vantagem na estética e na limpeza, o fornecimento e aplicação de máquina de secar roupa e a substituição do soalho em madeira por pavimento em Vinylconfort, da marca Wincanders;

14) O que estava previsto no documento n.º 2, anexo à petição inicial era a aplicação de uma placa vitrocerâmica e a iluminação era embutida na sala e nos quartos;

15) A Ré, após a conclusão da obra, explicou e deu instruções sobre o funcionamento dos vários equipamentos, incluindo todos os eletrodomésticos, sendo que quanto aos da marca Miele foi por um técnico da própria marca;

16) Em 11.12.2015 foi celebrada a escritura de compra e venda (cfr. documento n.º 5 anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido),

17) Tendo sido entregues aos Autores pela Ré nesse dia o certificado energético e a ficha técnica da habitação, que correspondem aos documentos n.ºs 6 e 7 anexos à petição inicial;

18) Até meados de junho de 2017 os Autores reportaram à Ré a existência de problemas no andar e esta deslocou-se ao imóvel, onde procedeu a intervenções/reparações,

19) Em meados de junho de 2017 os Autores comunicaram à Ré, por carta registada com aviso de receção recebida por esta em 30.06.2017, as patologias do imóvel, nos seguintes termos:

(…) somos a denunciar os mesmos defeitos, exigindo a sua eliminação no prazo máximo de um mês após a receção da presente missiva, nos seguintes termos:

1. A porta da sala, articulável (tipo livro), encontra-se empenada, não funcionando corretamente em termos de abertura e fecho. Os fechos embutidos existentes não têm qualquer função por má conceção. Acresce ainda referir que as folgas verticais entre os diversos elementos que constituem a porta são anormais, por folga excessiva que permite a visualização da sala para a copa ou vice-versa, quando a porta se encontra fechada. Mais ainda se acrescenta que a porta tem o revestimento em folha de madeira lascada.

2. A porta contígua à porta articulável da sala não pode ser fechada nesta porque não existe abertura para a língua da fechadura.

3. A caixilharia de todos os vãos exteriores, está cortada interiormente no perfil da padieira, onde tem colocado um elemento aparafusado com características amovíveis. Este corte, no perfil da padieira, é inadmissível de acordo com o estado da arte pois elimina de forma drástica as características de corte térmico e acústico do perfil utilizado, originando um aumento significativo do consumo energético nos períodos estivais e invernais para manter o conforto térmico da habitação, bem como provoca o aumento de ruido no interior da habitação;

Acresce ainda referir que durante o verão o calor é insuportável no interior da habitação e no inverno é insuportável o frio se respetivamente o arrefecimento e o aquecimento não estiverem em funcionamento, pelo que cumulativamente poderemos estar em presença de deficiente isolamento térmico nas paredes e vidros da caixilharia de alumínio.

4. As portas da caixilharia de alumínio estão empenadas e as da lavandaria e dos (2) quartos Poente deixa passar ar para o interior, de tal forma que quando está vento ouve-se um zumbido nos quartos devido á pressão exercida pelo vento na zona em que a porta não veda / não é estanque.

5. Os estores “black out” que funcionam no interior da caixilharia de alumínio encravam frequentemente provocando a avaria dos motores elétricos que os movimentam. Acresce referir que um dos 2black out da suite Nascente/Norte encontra-se rasgado.

6. O revestimento do piso não se encontra executado em soalho, mas em flutuante.

7. O pavimento flutuante apresenta algumas folgas anormais entre alguns elementos que o compõem o que não é admissível de acordo com o estado da arte, nomeadamente no hall de entrada, junto ao escritório, na cozinha e nos wc’s.

8. O pavimento flutuante na cozinha quando pisado range, o que indicia deficiente assentamento e/ou falta de nivelamento na laje de pavimento.

9. As portas de correr (cassetes) da cozinha e do quarto suite Nascente encontram-se empenadas não permitindo um funcionamento e fecho corretos. Acresce ainda referir que o empeno está a provocar o rompimento das borrachas verticais e o fecho metálico redondo não cobre o espaço que para ele foi criado na porta.

10. A porta de vidro entre a cozinha e copa/sala de jantar está desafinada e bate no rodapé, marcando-o, antes de bater na ferragem superior.

11. A porta de entrada na cozinha está empenada e quando é fechada bate com imensa força, o que é inadmissível de acordo com o estado da arte.

Acresce ainda referir que não possui qualquer batente de borracha e apresenta-se com o revestimento de folheado lascado junto ao batente, bem como também está lascado o apainelado da parede contíguo.

12. A grelha exterior da lavandaria não tem qualquer funcionalidade uma vez que foi tapada exteriormente por um painel acrílico não permitindo ventilação normal. Também existe um teto falso em gesso cartonado no interior daquela, não permitindo por isso qualquer entrada de ar.

13. Todas as portas das diferentes divisões apresentam-se sem qualquer acabamento nos topos superior e inferior.

14. As portas interiores apresentam uma folga, quando fechadas, completamente anormal em toda a sua altura, o que é inadmissível de acordo com as regras da arte.

15. Os guarda-fatos embutidos nos quartos encontram-se deficientemente executados porque as portas de correr estão empenadas não permitindo o seu fechamento de forma integral, as prateleiras apresentam flecha pelo peso próprio e não estão completamente orladas, sendo por isso visíveis partes em aglomerado de madeira e sem revestimento.

Existem ainda gavetas dos guarda-fato com medidas desajustadas, abanando muito e com as corrediças deficientemente aplicadas e a fazerem barulho.

16. O rodapé das diferentes divisões, na zona em que encostam à caixilharia de alumínio, apresentam vestígios de humidade.

17. Existem muitos remates de madeira deficientemente executados e em desconformidade com as regras da arte, nomeadamente nos rodapés que para além disso se encontram com manchas escuras dispersas.

18. Nas casas de banho que possuem base de chuveiro constata-se a existência de vestígios de infiltração de humidade no piso flutuante, junto à base de chuveiro, uma vez que aquele está a levantar, indiciando também não ser apropriado para zonas de grande humidade como casas de banho e cozinha.

19. Na casa de banho da suite Nascente/Norte a ferragem (chapa testa) que permite a lingueta do fecho trancar encontra-se solta.

20. Na casa de banho da suite Nascente/Norte quando se abre a água quente, esta sai a uma temperatura inferior comparativamente com as restantes.

21. O defeito indicado em 20 pode ser devido ao mau funcionamento do sistema de águas quentes sanitárias (sistema integrado com painel solar e termoacumulador “Proteu” incluindo todos os acessórios e controladores que os compõem).

22. Os espelhos das chaves das portas interiores soltam-se frequentemente.

23. Uma parte substancial dos elementos (réguas) do deck da varanda a Nascente (fachada principal) encontram-se empenados e outros estão fixados com parafusos para evitar que o empeno os faça saltar dos fixadores, o que é inadmissível de acordo com as regras da arte.

24. A rega do jardim exterior (varanda), na fachada principal (Nascente) não se encontra a funcionar porque a válvula de rega e/ou o programador de rega encontram-se avariados.

25. Nas casas de banho não existem toalheiros alimentados pelo aquecimento central.

26. O piso da cozinha não se apresenta em granito, mas em flutuante.

27. A cozinha não está toda equipada com eletrodomésticos Miele. O exaustor é da marca Elica.

28. A porta da máquina de lavar louça quando é aberta não fixa na posição pretendida, o que indicia que as molas/amortecedores das dobradiças estão avariadas.

29. O fogão da marca Miele, quando tem os quatro discos/ setores ligados, provoca o disparo do Disjuntor /limitador de potência da EDP porque sendo o fogão trifásico deveria ter um circuito trifásico a alimentá-lo. Acontece, porém, que só existe um circuito monofásico no quadro elétrico (disjuntor unipolar n.º 12) para alimentação ao fogão, razão e fundamento para que dispare o disjuntou da EDP por falta de seletividade nas proteções da instalação elétrica. Acresce ainda referir que quando o disjuntor da EDP dispara a habitação fica sem energia elétrica.

30. Na suite Nascente/Sul não foi executada sanca para os cortinados.

31. O sistema de alarme não funciona.

32. Na separação da sala com o hall dos quartos não foi executada a porta.

33. Não existem, nem nunca foram fornecidos, projetos e manuais de utilizador, sem os quais se desconhecem as funcionalidades e o modus operandi de todos os equipamentos, nomeadamente de domótica, equipamento de aquecimento das águas sanitárias, equipamento (bomba de calor Delonghi) de aquecimento e refrigeração do ambiente interior, equipamento do sistema de painel solar.” (cfr. documento n.º 8 anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).

20) A Ré respondeu com a carta datada de 10.07.2017, que constitui o documento n.º 9 anexo à petição inicial, a solicitar o agendamento de uma visita ao andar, que foi combinada, por acordo, para 21 de setembro de 2017;

21) Após a visita ao andar, a Ré respondeu com a carta de 28 de dezembro de 2017, a qual tem o seguinte teor:

“A escritura de compra e venda da habitação foi celebrada no dia 19 de dezembro de 2015. A manutenção da mesma tem de ser feita pelo titular do direito de propriedade. A maior parte das denúncias (reclamações) não são defeitos.

Na data da escritura V.Excias não fizeram qualquer reclamação. Os defeitos aparentes têm de ser reclamados no prazo de 1 ano, não o fazendo caducaram.

Foi feita uma visita técnica, com os representantes das várias especialidades, à Vossa habitação no dia 21 de setembro pelas 17h30m, após acordo de agendamento.

Por uma questão de cortesia, entretanto, temos vindo a proceder graciosamente a algumas afinações e continuaremos sempre disponíveis, mas tal não significa o reconhecimento de qualquer defeito.

Assim,

1. É uma questão de afinação. Entretanto, já foi feita, pelo carpinteiro.

2. Já foi executada uma ranhura para permitir o fecho da porta.

3/4 Caixilharia: de qualidade elevada foi bem instalada e foram verificados todos os pontos de regulação. Quanto aos isolamentos acústico e térmico, cumprem as normas regulamentares.

5. Após observação, entretanto o técnico dos estores verificou o seu regular funcionamento tendo-se constatado que uma tela se apresentava picada – vai ser objeto de intervenção.

6. O revestimento do piso foi executado em flutuante de acordo com a vontade do proprietário, sendo adequado ao aquecimento por piso radiante. V.Excias escolheram, viram, acompanharam, verificaram, aceitaram e outorgaram a escritura sem qualquer reclamação.

7/8. O técnico que aplicou o flutuante, entretanto, já esteve na vossa habitação.

9. Embora não se constatasse qualquer defeito, já se procedeu à sua afinação.

10. O técnico das portas de vidro irá marcar uma data para verificação.

11. Já foi verificada pelo carpinteiro e será afinada, se necessário.

12. A grelha faz a exaustão de aspiração central e está devidamente aplicada.

13 e 14. As portas foram verificadas por V.Excias antes da escritura que aceitaram e não reclamaram.

15. As portas e as gavetas foram bem executadas e V.Excias aceitaram e nada reclamaram. Enretanto o carpinteiro já afinou.

16/17. Já foi visto pelo carpinteiro e intervencionado na sala, entretanto, foi novamente visto pelo carpinteiro.

18. O piso flutuante nas casas de banho indicia pouco cuidado na utilização das mesmas.

19. A lingueta estava a funcionar. Entretanto o carpinteiro já afinou.

20. O picheleiro vai verificar e afinar novamente, se necessário.

21. O sistema funcionou e funciona devidamente.

22. Não é defeito. É necessária uma utilização prudente, Entretanto o carpinteiro já verificou.

23. O deck está devidamente fixado. Relembramos que é necessário fazer a manutenção de meio em meio ano.

24. Vai ser verificado pelos técnicos competentes.

25. Aceitou a nada reclamou. Como sabe não podia ter toalheiros porque a climatização do ambiente é feita por VCs com saídas em grelhas no teto e por piso radiante. Não havendo radiadores não há toalheiros aquecidos.

26. Escolheram o tipo de flutuantes, aceitaram, fizeram a escritura e nada reclamaram. Nunca referiram o granito.

27. A Miele não tem exaustor que funcione com o sistema de ventilação mecânica. Não é considerado eletrodoméstico. Viram, aceitaram e nada reclamaram. A Élica é uma marca de prestigio.

28. A porta abre e fecha. Com o uso pode não fixar na posição pretendida. Mais uma vez o técnico vai afinar. Solicita-se prudente utilização dos equipamentos.

29. É preciso aumentar a potência. Tendo em atenção que a potência contratada por V.Excias não corresponde ao instalado e certificado pela Certiel deverá ser feito o aumento de potência em qualquer loja comercial da EDP para o valor de 17,25Kwa que corresponde ao aumento de 7,5 em cada fase.

30. Nem podia ser dado que existe uma viga rasa. VExcias viram, aceitaram e nada reclamaram.

31 Vai ser verificado.

32. Não era para ser executada. V.Excias viram, aceitaram e nada reclamaram.

33. Foram fornecidos os manuais dos equipamentos. Quanto à domótica, pode ser apresentado um manual de instruções simplificado. (cfr. documento n.º 1 anexo à contestação, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);

22) Na presente data, o imóvel está no seguinte estado:

i) A porta da sala, articulável (tipo livro) não fecha corretamente porque os fechos superiores não são apropriados e por isso não fixam corretamente;

ii) Os fechos inferiores da porta da sala, articulável (tipo livro) não possuem quaisquer elementos no pavimento que os permitam fixar, pelo que a porta não fixa nem em cima, nem em baixo;

iii) A porta da sala, articulável (tipo livro) apresenta folgas de diferente dimensão entre os painéis que constituem a porta, 5mmm em duas situações e 2mm noutra, quando as folgas deveriam ser iguais em todos os elementos.

iv) Existe ainda um ligeiro desaprumo dos painéis dessa porta;

v) Na parte inferior de um dos painéis, a porta tem o revestimento em folha de madeira lascada.

vi) A caixilharia de todos os vãos exteriores, está cortada interiormente no perfil da padieira, onde tem colocado um elemento aparafusado com características amovíveis. para fixar a calha dos blackout;

vii) Durante os dias mais quentes, se estiver calor, a temperatura é elevada junto dos envidraçados e na casa de banho do quarto da suite nascente/sul o calor é insuportável, se o arrefecimento não estiver em funcionamento.

viii) As portas da caixilharia de alumínio da lavandaria e dos dois quartos Poente estão ligeiramente desalinhadas, deixando passar ar para o interior, e quando está vento ouve-se ventar nos quartos e na lavandaria;

ix) Os estores “black out” que funcionam no interior da caixilharia de alumínio não funcionam perfeitamente, sendo que no quarto nascente/norte o estore não possui comprimento suficiente para fechar na totalidade;

x) O revestimento do piso não se encontra executado em soalho, mas em flutuante;

xi) O pavimento flutuante apresenta folgas pontuais e dispersas de cerca de 3mm entre alguns elementos que o compõem, nomeadamente no hall de entrada, junto ao escritório, na cozinha e nos wc’s.

xii) O piso flutuante na cozinha, nalguns pontos, quando pisado range, o que indicia deficiente assentamento e/ou falta de nivelamento na laje de pavimento;

xiii) As portas de correr (cassetes) da cozinha e do quarto suite Nascente encontram-se desalinhadas/desaprumadas, não permitindo um funcionamento e fecho corretos.

xiv) Esse desalinhamento/desaprumo está a provocar o rompimento dos batentes de borracha laterais;

xv) A porta de vidro entre a cozinha e copa / sala de jantar está desafinada e bate no rodapé, marcando-o, antes de bater na ferragem superior;

xvi) A porta de entrada na cozinha quando é fechada bate com força excessiva.

xvii) Acresce ainda referir que se apresenta com o revestimento de folheado lascado junto ao batente;

xviii) A grelha exterior da lavandaria não tem qualquer funcionalidade na ventilação da lavandaria uma vez que foi tapada exteriormente por um painel acrílico

xix) Também existe um teto falso em gesso cartonado no interior da lavandaria, não permitindo por isso qualquer entrada de ar;

xx) O topo superior de três portas interiores apresentam-se sem acabamento de verniz;

xxi) Algumas das portas interiores apresentam folgas quando fechadas, sendo que as portas do escritório da frente e a porta de entrada do escritório não fecham corretamente, carecendo de afinação as portas do quarto suite, quarto de banho, entrada do quarto do meio, incluindo esta porta a correção nas dobradiças, e porta da cozinha;

xxii) Nos guarda-fatos embutidos nos quartos, as portas de correr estão desaprumadas e desafinadas não permitindo o seu fechamento de forma integral;

xxiii) As prateleiras apresentam flecha pelo peso próprio e não estão completamente orladas;

xxiv) Existem ainda gavetas dos guarda fatos que carecem de ser afinadas e ajustadas, abanando muito e com as corrediças apresentando folgas e a fazerem barulho;

xxv) Os rodapés, no quarto nascente/norte, quarto nascente/sul, quarto poente/norte, sala, copa da cozinha, cozinha e lavandaria, na zona em que encostam à caixilharia de alumínio apresentam vestígios de humidade

xxvi) Quanto aos remates de madeira, existem situações pontuais do rodapé a descolar e numa extensão de 5,40m o mesmo é feito por três elementos diferentes;

xxvii) Na casa de banho nascente-norte, que possui base de chuveiro ,constata-se a existência de vestígios de infiltração de humidade no piso flutuante, junto à base de chuveiro, uma vez que aquele está a levantar;

xxviii) No quarto nascente/sul o espelho das chaves da porta interior encontra-se solto;

xxix) Vários elementos (réguas) que constituem o deck da varanda a nascente e a poente encontram-se empenados e outros estão fixados com parafusos para evitar que o empeno os faça saltar dos fixadores.

xxx) A rega do jardim exterior (varanda), na fachada principal (nascente) não se encontra a funcionar porque a programação e as funções do sistema de rega instalado não estão reguladas;

xxxi) Nas casas de banho não existem toalheiros alimentados pelo aquecimento central.

xxxii) O piso da cozinha não se apresenta em granito, mas em flutuante;

xxxiii) A cozinha não está toda equipada com eletrodomésticos Miele já que o exaustor é da marca Elica;

xxxiv) O fogão da marca Miele, quando tem os quatro discos / setores ligados, provoca o disparo do Disjuntor / limitador de potência da EDP porque sendo o fogão trifásico deveria ter um circuito trifásico a alimentá-lo;

xxxv) Acontece, porém, que só existe um circuito monofásico no quadro elétrico (disjuntor unipolar nº 12) para alimentação ao fogão, razão e fundamento para que dispare o disjuntor da EDP por falta de seletividade nas proteções da instalação elétrica.

xxxvi) Quando o disjuntor da EDP dispara, a habitação fica sem energia elétrica.

xxxvii) Na suite nascente/sul não foi executada sanca para os cortinados.

xxxviii) O sistema de alarme não funciona;

xxxix) Na separação da sala com o hall dos quartos não foi executada a porta;

xl) Existem maus cheiros na despensa vindos da lavandaria;

xli) No chão do WC do quarto/escritório nascente/sul o aquecimento do piso radiante não funciona, por problemas de programação e regulação;

xlii) A lacagem da porta da despensa e lavandaria e o rodapé da cozinha não está em condições, apresentando mau acabamento;

xliii) O frigorífico pequeno não está fixo ao armário;

23) Não foram fornecidos projetos e manuais de utilizador de equipamento de aquecimento das águas sanitárias, equipamento (bomba de calor Delonghi) de aquecimento e refrigeração do ambiente interior, equipamento do sistema de painel solar e domótica, sem os quais os Autores desconhecem as funcionalidades e o modus operandi desses equipamentos;

24) No decurso da obra, a Ré decidiu a substituir o soalho em madeira por pavimento da gama Vinylcomfort, da marca Wincanders;

25) O revestimento do piso em Vinylcomfort da Wikanders, consta na ficha técnica da habitação e foi utilizado em toda a habitação incluindo cozinha e casas de banho;

26) Na altura da escolha dos acabamentos, este material foi apresentado e devidamente explicadas aos Autores, as suas vantagens e garantias comparativamente a outros materiais;

27) Os Autores aceitaram a aplicação daquele material, tendo mesmo escolhido a sua cor, que é o que foi aplicado.

28) Os Autores têm dois filhos que à data da celebração da escritura tinham 6 e 8 anos de idade;

29) Pretendiam com a compra do imóvel viver com os seus filhos em paz e sem problemas;

30) A Ré deslocou-se inúmeras vezes ao imóvel, a pedido dos Autores, a fim de realizar intervenções.

31) Essas deslocações ocorriam em horário de trabalho dos Autores, tendo estes que faltar ao trabalho para abrir a porta do apartamento à Ré para as reparações/intervenções;

32) Perturbando a vida familiar dos Autores;

33) Provocando desgaste psicológico aos Autores,

34) Os Autores andam tristes, desanimados e desiludidos não só com o imóvel como com os comportamentos da Ré,

35) Na data da escritura, a habitação dos Autores estava concluída com todos os trabalhos realizados e acabados;

36) Não houve qualquer reclamação por parte dos Autores na data da escritura pública de compra e venda;

37) O prédio urbano onde se insere a fração dos Autores é constituído por 12 pisos sendo a cave e a sub-cave destinadas a estacionamento, o rés-do-chão e o primeiro piso, destinados a comércio e os restantes pisos, do 2º ao 9º, destinados a habitação.

38) As técnicas construtivas, os equipamentos e os materiais aplicados são os mesmos ou similares em todas as frações deste empreendimento;

39) Os Autores, conjuntamente com a testemunha GG, proprietário do 6º andar, são os únicos proprietários que no empreendimento em causa instauraram ações, invocando defeitos que mais nenhum adquirente do empreendimento divisaram;

40) A Ré contratou a empresa de Carpintaria A...Unipessoal, Lda, com sede em ..., Oliveira de Azeméis Para executar a empreitada de carpintaria (fornecimento de material e mão-de-obra) para o andar dos Autores;

41) A Ré contratou a empresa A...., S.A., com sede na Rua 1 Paio de Oleiros, para fornecer o material de revestimento do pavimento (flutuante vinylcomfort) e para fazer o acompanhamento e a fiscalização da aplicação do referido material no empreendimento;

42) A Ré contratou a empresa A...., Lda, com sede Rua 2, ..., Vila Nova de Gaia, para fornecimento e aplicação da caixilharia metálica;

43) A Ré contratou a empresa E..., Lda, com sede na Rua 3, Vila Nova de Gaia, para fornecimento e aplicação do deck em madeira no terraço e nas varandas exteriores e para aplicação do piso flutuante da Wicanders no pavimento interior das habitações.

44) A Ré contratou a empresa Co...., Lda, com sede Rua 4 – Ap. ... Santo Tirso, para fornecimento e aplicação dos vidros exteriores;

45) A Ré contratou a empresa J..., Lda, com sede na Rua 5, Vila Nova de Gaia, para fornecimento e aplicação de estores (tipo blackout) com funcionamento elétrico;

46) A Ré tem marca nacional nº 486529 registada e logotipo nº 24729 devidamente registados no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI);

47) A Interveniente A...., S.A.. não procedeu a qualquer instalação e/ou colocação do material fornecido;

48) Os trabalhos executados pela A...., Lda foram acompanhados pela Ré, que os supervisionou;

49) A Ré aceitou a entrega da obra fornecimento e aplicação da caixilharia metálica executada pela sociedade A...., Lda;

50) Os vidros fornecidos pela Interveniente Co...., Lda foram selecionados e aprovados pela Ré, correspondendo rigorosamente ao encomendado;

51) A Ré conhecia perfeitamente as características dos vidros que encomendou e tinha plena consciência do seu desempenho;

52) A montagem levada a cabo pela Co...., Lda consistiu na retirada dos bites da caixilharia, inserção dos vidros nos perfis e colocação de vedantes exteriores e interiores;

53) O tipo de montagem dos vidros foi determinado pelo sistema de caixilharia concebido por terceiros;

54) Os vidros aplicados no local são duplos (com câmara de árgon 14 mm), laminados e temperados, constituindo produtos de topo, de gama superior e preço elevado comparativamente com outras soluções existentes no mercado;

55) Na fachada nascente ou principal do edifício, voltada para a Avenida 1, foram aplicados vidros duplos 6 mm Plantherm Ultra N II 6mm + 14mm de árgon + Stadip Silence 44.1 8mm, sendo o coeficiente de transmissão térmica de U = 1,01 W(m2.ºC), de atenuação acústica reforçada com vista mitigar o ruído proveniente do tráfego rodoviário e potenciadores de adequado conforto térmico devido à sua baixa emissividade;

56) Na fachada poente, foram colocados vidros duplos incolores de baixa emissividade 6 mm Cool-Lite Skin + 14mm de árgon + Stadip Silence 44.1 8 mm, sendo o coeficiente de transmissão térmica de U = 1,01 (m2.ºC), igualmente eficazes em matéria de controlo solar, como resulta da ficha técnica também junta, não sendo todavia necessário um grau de proteção acústica semelhante ao lado oposto do prédio;

57) O coeficiente de transmissão térmica das soluções vidreiras aplicadas no local é de 1,01 W/ (m 2.° C) quer na fachada nascente, quer na fachada poente;

58) Os vidros colocados no local apresentam o fator solar de 0,27 na fachada poente (isto é, o dobro do isolamento de controlo térmico exigível no ponto onde tal era necessário) e 0,56 na fachada nascente;

59) Nenhuma anomalia ou defeito foram denunciados à Interveniente Co...., Lda, fosse pela Ré ou pelos próprios Autores;

60) No atual estado da ciência e engenharia, não existe nenhuma espécie de solução, a nível de vidros e caixilharia, que dispense por completo alguma climatização dos edifícios, particularmente nos picos de frio ou calor.

61) A presente ação foi proposta no dia 15.06.2018;


*


Foram dados como não provados os seguintes factos.

a) A Ré apresentou as diversas frações, no início da comercialização, através do prospeto que constitui o documento n.º 1 anexo à petição inicial, do qual consta que não têm caráter vinculativo;

b) A comercialização da fração com os Autores logo no início da construção ocorreu apenas por insistência destes, por pretendiam unicamente o último piso, com terraço;

c) Antes da assinatura do contrato-promessa foi explicado pelo responsável da Ré aos Autores que as janelas e portas das varandas seriam de alumínio com duplo corte térmico e vidros duplos, temperados e laminados, assim como todos os vidros da habitação teriam uma câmara de ar interior cheia de gás árgon,

d) Antes da assinatura do contrato-promessa foi explicado pela Ré aos Autores que as janelas e as portas das varandas seriam de alumínio com vidros duplos;

e) Antes da assinatura do contrato-promessa foi explicado pela Ré aos Autores que o piso radiante seria isolado do piso inferior com material apropriado, a água quente circulante seria aquecida por bomba de calor, as águas sanitárias seriam aquecidas por painéis solares comuns a todos os condóminos e por bomba de calor, que o apartamento teria placa de indução e iluminação toda em led;

f) O pavimento da gama Vinylcomfort, da marca Wincanders é mais apropriado ao piso radiante do que o soalho em madeira;

g) Antes da assinatura do contrato-promessa, não estava definido o tipo de aparelho que iria alimentar o piso radiante, sendo que posteriormente se optou pela bomba de calor mais funcional e com economia no consumo energético;

h) Depois da celebração da escritura havia trabalhos por realizar e acabar na fração autónoma;

i) As folgas verticais entre os diversos elementos que constituem a porta da sala articulável permitem a visualização da sala para a copa ou vice-versa, quando a porta se encontra fechada;

j) A porta contígua à porta articulável da sala não pode ser fechada nesta porque não existe abertura para a língua da fechadura;

k) O corte da caixilharia, no perfil da padieira, elimina de forma drástica as características de corte térmico e acústico do perfil utilizado, originando um aumento significativo do consumo energético nos períodos estivais e invernais para manter o conforto térmico da habitação, bem como provoca o aumento de ruido no interior da habitação;

l) Durante o Verão, se o arrefecimento não estiver em funcionamento, o calor é insuportável no interior de toda a habitação;

m) No inverno, se o aquecimento não estiver em funcionamento, o frio é insuportável no interior de toda a habitação;

n) As temperaturas elevadas no verão e as baixas no inverno devem-se ao deficiente isolamento térmico nas paredes e vidros da caixilharia de alumínio;

o) O encravamento dos estores black-out provoca a avaria dos motores elétricos que os movimentam;

p) O fecho metálico redondo das portas de correr (cassetes) da cozinha e do quarto suite Nascente não cobre o espaço que para ele foi criado na porta;

q) A porta da entrada cozinha não possui qualquer batente de borracha e apresenta o puxador / maçaneta não fixa;

r) A lavandaria não possui ventilação normal;

s) O topo inferior de todas as portas interiores das diferentes divisões apresentam-se sem qualquer acabamento;

t) Nas prateleiras dos guarda-fatos embutidos são visíveis partes em aglomerado de madeira e sem revestimento;

u) O piso flutuante aplicado não é apropriado para zonas de grande humidade como casas de banho e cozinha;

v) Na casa de banho da suite nascente/norte a ferragem (chapa testa) que permite a lingueta do fecho trancar encontra-se solta;

w) Na casa de banho da suite nascente/norte quando se abre a água quente, esta sai a uma temperatura inferior comparativamente com as restantes.

x) O problema a que se alude no facto anterior pode ser devido ao mau funcionamento do sistema de águas quentes sanitárias (sistema integrado com painel solar e termoacumulador “Proteu” incluindo todos os acessórios e controladores que o compõem);

y) Os espelhos das chaves das portas interiores soltam-se frequentemente;

z) A válvula de rega do jardim exterior não está a funcionar;

aa) A porta da máquina de lavar louça quando é aberta não fixa na posição pretendida, o que indicia que as molas/amortecedores das dobradiças estão avariadas;

bb) Os projetos e manuais de utilizador de domótica nunca foram fornecidos aos Autores;

cc) O termoacumulador não sai pela porta em caso de avaria;

dd) A banca da cozinha não dá escoamento suficiente e entope facilmente entre a banca e o sifão;

ee) Os Autores começaram a fazer uma depressão;

ff) Os problemas que os Autores reclamavam ter surgido no andar a que se alude no facto 18º não passavam de meras afinações e alguns retoques originados pela instalação do mobiliário e decoração e uma imprudente utilização dos equipamentos por parte daqueles, chegando mesmo a entupir a banca da cozinha com um rolhão parecido com sabão;

gg) A Ré deslocou-se de per si muitas vezes ao imóvel e muitas outras com os empreiteiros a solicitação dos Autores sem motivo justificado, tendo-se constatado que se tratava de rebates falsos;

hh) A Ré deslocou-se ao andar para fazer retoques derivados de danos em consequência da mudança de casa, para eliminar dedadas dos filhos dos Autores nas paredes, para desentupir a banca, exigindo tudo para além do razoável e do possível, como por exemplo colocar a madeira natural exatamente com a mesma cor (tipo fotocópia) e o mármore à mesma cor (tipo fotocópia) assim como a banca da cozinha com polimentos atrás de polimentos;

ii) Esta ação insere-se numa estratégia acertada e conjugada com a testemunha GG, proprietário do 6º andar, para obter proveitos que não resultam da contratação;

jj) A Ré nasceu, como pessoa jurídica, há 28 anos e é uma empresa de prestígio no sector da construção civil;

kk) A família do representante legal da Ré dedica-se à construção civil há quatro gerações;

ll) A Ré é bastante conhecida no mercado de imobiliário de prestígio (construção e reabilitação), tendo como fornecedores e parceiros as melhores marcas do sector quer nacionais quer internacionais;

mm) Contra a Ré não foi proposta qualquer ação judicial até ao dia 9.10.2017;

nn) Os Autores têm procurado ridicularizar e denegrir a imagem da Ré e as fotografias juntas pelos Autores são prova disso mesmo;

oo) Os Autores vêm afirmando e difundindo defeitos que não existem para desprestigiar e prejudicar o bom nome da empresa Ré;

pp) Chegando ao conhecimento de fornecedores, de clientes e colaboradores seus, familiares, amigos e público em geral;

qq) Por causa da presente ação, a Ré vê referenciada, nos relatórios das empresas que fornecem informação a terceiros, a existência de ações judiciais em que é Ré e que, para além de denegrir a sua imagem, mostrando-a como litigante, ainda a afetam nas suas relações comerciais e financeiras perante clientes, fornecedores e bancos, impondo-lhe justificações adicionais e retardamento na análise dos seus processos;

rr) Provocando o aumento da taxa de risco de crédito e financeiro, dificultando ou até impedindo o acesso ao financiamento bancário e onerando a taxa de juro de empréstimo para a construção, bem como dificultando o acesso e onerando o custo e as condições de compra das matérias-primas, materiais e equipamentos;

ss) Que tem como consequência o aumento do custo da construção e a diminuição da capacidade de competir com as empresas concorrentes;

tt) Tal comportamento dos Autores tem prejudicado a estabilidade financeira da Ré, a sua participação no mercado quer financeiro quer comercial, com reflexo no custo dos empreendimentos e na consequente dificuldade nas vendas dos imóveis em construção e a construir, pondo em causa a sobrevivência da empresa e dos seus postos de trabalho;

uu) Até à presente data, nunca foi reclamado à Interveniente A...., S.A. qualquer defeito no pavimento fornecido à Ré, quer por parte desta ou dos Autores;

vv) A Ré não apresentou qualquer reclamação ou alegou qualquer defeito perante a A...., Lda

ww) O índice de isolamento sonoro [Rwc] dos vidros aplicados no local é de 38 dB na fachada nascente e 33 dB na fachada poente;


*


Fez-se ainda constar que o tribunal não se pronunciou sobre o demais alegado, por conter matéria de direito e como tal conclusiva, ou irrelevante para a decisão da causa.

*


Na sequência do recurso de apelação entretanto interposto nos autos, a Relação procedeu às seguintes alterações na decisão da matéria de facto:

Alterou da seguinte forma a redacção de várias alíneas do facto provado nº22):

Na presente data, o imóvel está no seguinte estado:

i) e ii) A porta da sala, articulável (tipo livro ou fole) não fecha corretamente e está desnivelada, desaprumada, porque os fechos superiores não são apropriados e porque em baixo os fechos não possuem quaisquer elementos no pavimento que os permitam fixar porque os AA. não quiseram furações no chão.

iii) Tal porta é composta por 4 painéis, havendo folgas diferentes entre si, quando deveriam ser iguais, variando entre os 5 mm. e os 2 mm.

iv) Eliminado.

v) Na parte inferior de um dos painéis, a porta tem o revestimento, de folha de madeira, lascado porque se descolou do restante material.

vi) A caixilharia de todos os vãos exteriores, está cortada interiormente no perfil da padieira, onde tem colocado um elemento aparafusado com características amovíveis. para fixar a calha dos blackout;

vii) Durante os dias mais quentes, se estiver calor, a temperatura é elevada junto dos envidraçados e na casa de banho do quarto da suite nascente/sul o calor é insuportável, se o arrefecimento não estiver em funcionamento.

viii) Por falta de afinação e de manutenção, as portas da caixilharia de alumínio da lavandaria e de dois quartos estão ligeiramente desalinhadas, deixando passar ar para o interior, e quando está vento ouve-se ventar nos quartos e na lavandaria.

ix) O estore blackout, do quarto nascente – norte, tem comprimento insuficiente, não chegando ao fundo, e outros, por vezes, não funcionam.

x) O revestimento do piso não se encontra executado em soalho, mas em flutuante;

xi) O pavimento flutuante apresenta folgas pontuais e dispersas de cerca de 3mm entre alguns elementos que o compõem, nomeadamente no hall de entrada, junto ao escritório, na cozinha e nos wc’s.

xii) O piso flutuante na cozinha, nalguns pontos, quando pisado range, o que indicia deficiente assentamento e/ou falta de nivelamento na laje de pavimento;

xiii) Por falta de manutenção e afinação, as portas de correr tipo cassete, da cozinha e do quarto suite – nascente, encontram-se desalinhadas/desaprumadas, não permitindo um funcionamento e fecho corretos.

xiv) Esse desalinhamento/desaprumo está a provocar o rompimento dos batentes de borracha laterais;

xv) A porta de vidro entre a cozinha e copa / sala de jantar está desafinada e bate no rodapé, marcando-o, antes de bater na ferragem superior;

xvi) A porta de entrada na cozinha quando é fechada bate com força excessiva porque a mola tem de ser afinada e, se necessário, reparada.

xvii) Acresce ainda referir que se apresenta com o revestimento de folheado lascado junto ao batente;

xviii) A grelha exterior da lavandaria não tem qualquer funcionalidade na ventilação da lavandaria uma vez que foi tapada exteriormente por um painel acrílico

xix) Também existe um teto falso em gesso cartonado no interior da lavandaria, não permitindo por isso qualquer entrada de ar;

xx) O topo superior de três portas interiores apresentam-se sem acabamento de verniz;

xxi) Algumas das portas interiores apresentam folgas, carecendo de afinação.

xxii) Nos roupeiros embutidos nos quartos, as portas de correr estão desaprumadas e desafinadas não permitindo o seu fechamento de forma integral.

xxiiiA) As prateleiras do roupeiro do quarto usado como escritório estão abauladas porque não são utilizadas para colocar roupa.

xxiiiB) As prateleiras dos roupeiros não estão orladas na superfície que encosta ao fundo e que não é visível.

xxiv) Existem ainda gavetas dos guarda fatos que carecem de ser afinadas e ajustadas, abanando muito e com as corrediças apresentando folgas e a fazerem barulho;

xxv) Os rodapés, no quarto nascente/norte, quarto nascente/sul, quarto poente/norte, sala, copa da cozinha, cozinha e lavandaria apresentam manchas provocadas por humidade.

xxvi) Quanto aos remates de madeira, existem situações pontuais do rodapé a descolar e numa extensão de 5,40m o mesmo é feito por três elementos diferentes;

xxvii) Na casa de banho nascente-norte, que possui base de chuveiro, constata-se a existência de vestígios de infiltração de humidade no piso flutuante, junto à base de chuveiro, uma vez que aquele está a levantar por má instalação da válvula de escoamento do mesmo.

xxviii) No quarto nascente/sul o espelho das chaves da porta interior encontra-se solto;

xix) Vários elementos (réguas) do deck das varandas, a nascente e a poente, encontram-se uns empenados, outros estão fixados com parafusos para evitar que o empeno os faça saltar dos fixadores e outros já estão a lascar.

xxx) A rega do jardim exterior (varanda), na fachada principal (nascente) só funciona manualmente e não automaticamente porque a programação e as funções do sistema de rega instalado não estão reguladas.

xxxi) Nas casas de banho não existem toalheiros alimentados pelo aquecimento central.

xxxii) O piso da cozinha não se apresenta em granito, mas em flutuante;

xxxiii) A cozinha não está toda equipada com eletrodomésticos Miele já que o exaustor é da marca Elica;

xxxiv) O fogão da marca Miele, quando tem os quatro discos / setores ligados, provoca o disparo do Disjuntor/limitador de potência da EDP porque sendo o fogão trifásico deveria ter um circuito trifásico a alimentá-lo;

xxxv) Acontece, porém, que só existe um circuito monofásico no quadro elétrico (disjuntor unipolar nº 12) para alimentação ao fogão, razão e fundamento para que dispare o disjuntor da EDP por falta de seletividade nas proteções da instalação elétrica.

xxxvi) Quando o disjuntor da EDP dispara, a habitação fica sem energia elétrica.

xxxvii) Na suite nascente/sul não foi executada sanca para os cortinados.

xxxviii) O sistema de alarme não funciona;

xxxix) Na separação da sala com o hall dos quartos não foi executada a porta;

xl) Existem maus cheiros na despensa vindos da lavandaria;

xli) No chão do WC do quarto/escritório nascente/sul o aquecimento do piso radiante não funciona, por problemas de programação e regulação;

xlii) A lacagem da porta da despensa e lavandaria e o rodapé da cozinha não está em condições, apresentando mau acabamento;

xliii) O frigorífico pequeno não está fixo ao armário;

Nos factos não provados eliminou os seguintes:

J), porque já existe língua na fechadura.

R), porque independentemente de a grelha da lavandaria estar tapada existe uma porta oscilo-batente.


*


Analisemos a primeira das questões suscitadas pela Ré neste seu recurso, recordando aqui de forma sintética a argumentação que a sustenta.

Segundo nos é dado perceber a Ré nas suas alegações de recurso, insurge-se contra a circunstância de a 1ª instância e quanto à decisão da matéria de facto, ter recorrido ao regime previsto no art.º 5º, nº2, alínea b) do CPC sem lhe ter sido dada a possibilidade de se pronunciar sobre os factos que na mesma decisão vieram a ser considerados.

Perante tal alegação, o que cabe dizer é o seguinte:

Segundo o disposto no art.º 195.º do Código de Processo Civil a prática de um acto que a lei não admita, bem como a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva, produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa (n.º 1), mais prescrevendo que, quando um acto tenha de ser anulado, anulam-se também os termos subsequentes que dele dependam absolutamente (n.º 2).

A arguição da nulidade processual faz-se na própria instância em que é cometida, salvo o disposto no n.º 3 do art.º 199.º do Código de Processo Civil, de imediato ou no prazo geral de 10 dias, nos termos melhor explicitados neste mesmo preceito.

As nulidades de que se vem falando distinguem-se das nulidades, erros materiais ou erros de julgamento de que podem enfermar os despachos ou sentenças, na medida em que estes são vícios de conteúdo de decisões judiciais, enquanto as nulidades processuais respeitam à própria existência ou às formalidades dum acto processual.

Assim, se é proferido um despacho judicial a apreciar uma nulidade processual, designadamente sob requerimento de alguma das partes, a questão deixa de ter o tratamento das nulidades processuais para seguir o regime do erro de julgamento, por a infracção praticada passar a estar coberta pela decisão proferida, ficando esgotado, quanto a ela, o poder jurisdicional, nos termos do art.º 613.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.

Daí o aforismo “das nulidades reclama-se; dos despachos recorre-se”. (neste sentido cf. José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 1.º, 3.ª ed., pág. 3841)

É certo que a questão da escolha do meio processual adequado – recurso ou requerimento de arguição de nulidade – nem sempre encontra resposta que se afigure evidente quando o juiz, ao proferir a sentença, se abstenha de apreciar uma nulidade processual de conhecimento oficioso ou que tenha sido arguida, ou omita uma formalidade imposta por lei, tendo vindo a admitir-se que, nessas situações, a parte vencida possa reagir através da interposição de recurso fundado em omissão de pronúncia, nos termos do art.º 615.º, n.º 1, al. d) do Código de Processo Civil.

Regressando ao caso concreto, verificamos que a Ré utilizou o presente recurso de Revista para arguir a nulidade processual em apreço enquanto tal, ou seja, nos termos do art.º 195.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil, e não enquanto nulidade da decisão proferida, nos termos do art.º 615.º, n.º 1, al. d) do mesmo diploma.

Mas o que também podemos verificar é que de forma que não se compreende, no recurso de apelação que interpôs para a Relação do Porto não suscitou a questão.

Ora sabemos todos que segundo o disposto no artigo 671º nº1 do CPC, “cabe revista para o supremo Tribunal de Justiça do acórdão da Relação, proferido sobre decisão da 1ª instância, que conheça do mérito da causa, ou que ponha termo ao processo, absolvendo da instância o réu ou alguns dos réus quanto ao pedido ou reconvenção deduzidos.”

Como afirma A. Abrantes Geraldes, “… sendo certo que, em regra, está assegurado o segundo grau de jurisdição mediante recurso de apelação dirigido ao Tribunal da Relação verificado o requisito previsto no art.º 629º, nº1 (valor do processo superior à alçada da 1ª instância e sucumbência superior a metade dessa alçada), já o mesmo não ocorre relativamente ao terceiro grau de jurisdição que, para além daquele requisito formal, sofre ainda o forte condicionalismo que o art.º 671º reflete (cf. Recursos em Processo Civil, Almedina, 8ª Edição Atualizada, a pág.455).

E logo a seguir (cf. pág.456), quando refere que “para estas e outras situações, o objecto do recurso de revista há de incidir necessariamente sobre um “acórdão” da Relação”.

Por último (cf. pág. 457), ao defender o seguinte que “No que concerne às situações típicas abarcadas pelo preceituado na 1ª parte do nº1 do art.º 671º resulta inequívoco que o ponto de referência para a admissibilidade da revista é o teor do acórdão da Relação e não o teor da decisão da 1ª instância sobre o qual incidiu. (sublinhado nosso)

Sendo assim, conclui-se, pois, pela impossibilidade de conhecimento da questão agora suscitada.

Cabe agora apreciar e decidir a segunda questão suscitada e que é como já vimos a do pretenso abuso de direito por parte dos Autores.

Recordemos de forma sintética o que pela Ré e nas suas conclusões foi alegado para sustentar esta sua pretensão:

“18 – Os AA. alegaram no artigo 26º nº 1 da P.I.: Já que, na presente data o imóvel apresenta as seguintes irregularidades:

1. A porta da sala, articulável (tipo livro), encontra-se empenada, não funcionando corretamente em termos de abertura e fecho. Os fechos embutidos existentes não têm qualquer função por má conceção. Acresce ainda referir que as folgas verticais entre os diversos elementos que constituem a porta são anormais, por folga excessiva que permite a visualização da sala para a copa ou vice-versa, quando a porta se encontra fechada. Mais ainda se acrescenta que a porta tem o revestimento em folha de madeira lascada.

19 - O A. marido omitiu de forma consciente e censurável que não permitiu que perfurasse o piso, tendo apenas o confessado em depoimento de parte/declarações de parte.

20 - As testemunhas da Ré (DD encarregado geral, EE eletricista e FF pintor) confirmaram que o cliente/A. não quis que furasse o pavimento para colocar os fechos em baixo. Tal acto impeditivo, teve como consequência, o desalinhamento/desaprumo/folgas da porta causa que é imputável aos AA..

22 - Ou seja, desta factualidade ressalta que os AA. deram autorização à Ré para alteração da obra primitiva projectada, apesar de avisados das implicações futuras na porta, o que se veio a verificar e, mesmo assim, conscientes disso, vêm peticionar a condenação da Ré na reparação do mesmo, o que constitui um abuso de direito.

23 - Não se trata de uma questão de estética em detrimento da funcional. Trata-se de uma opção consciente dos AA. que teve como efeito/causa o defeito, ou seja, a causa da “avaria”/desconformidades se deveu a culpa do comprador/consumidor na não inclusão de fecho na parte inferior da porta, é de considerar afastada a presunção da falta de conformidade.

24 - Há abuso por parte dos AA. ao não permitir as furações para fixar a porta o que levou ao descambar/desalinhamento/folgas da mesma, apesar de terem sido devidamente avisados, tendo ficado conscientes desse facto, e mesmo peticionar a condenação da Ré na sua reparação, prática abusiva e censurável e que só em Tribunal confessou ter impedido a colocação das furações necessárias para o fecho.

25 - O venire contra factum proprium pressupõe duas atitudes antagónicas, sendo a primeira (factum proprium) contrariada pela segunda atitude, com manifesta violação dos deveres de lealdade e dos limites impostos pelo princípio da boa-fé.

26 - É ilegítimo o exercício de um direito em contradição com o comportamento assumido anteriormente pelo exercente, por ser contrário aos princípios impostos pela boa-fé.

27 - Pelo que também quanto a este aspeto não andou bem o Tribunal “a quem” ao decidir como decidiu.”

Segundo o disposto no artigo 334º do Código Civil, “é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.”

Perante esta alegação o que cabe dizer desde logo é o seguinte, citando os ensinamentos de A. Abrantes Geraldes, obra supra citada, pág.163 e seguintes:

“A natureza do recurso, como meio de impugnação de uma anterior decisão judicial, determina outra importante limitação ao seu objecto decorrente do facto de, em termos gerais, apenas pode incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo confrontar-se o tribunal ad quem com questões novas.

Na verdade, os recursos constituem mecanismos destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando, nos termos já referidos, estas sejam de conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha os elementos imprescindíveis.”

No mesmo sentido o Acórdão do STJ de 18.09.2025, processo nº 874/23.7T8LSB.L1.S1, relatado pelo Conselheiro Oliveira Abreu, onde se fez constar o seguinte:

“Os recursos são meios de obter a reponderação das questões já anteriormente colocadas e a eventual reforma de decisões dos Tribunais inferiores, e não de alcançar decisões novas, só assim não acontecendo nos casos em que a lei determina o contrário, ou relativos a matéria indisponível, sujeita por isso a conhecimento oficioso, estando o Tribunal de recurso, sublinhamos, limitado nos seus poderes de cognição às questões que, tendo sido ou devendo ter sido objeto da decisão recorrida, sejam submetidas à sua apreciação, isto é, constituam objeto da impugnação, neste sentido, Castro Mendes, in, Recursos, 1980, página 27; Armindo Ribeiro Mendes, in, Recursos em Processo Civil, 1992, páginas 140 e 175, Miguel Teixeira de Sousa, in, Estudos Sobre O Novo Processo Civil, página 395, António Abrantes Geraldes, in, Recursos Em Processo Civil - Novo Regime, Almedina, 2ª Edição, páginas 25 e seguintes e 94 e seguintes, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de Julho de 2008 (Processo n.º 08B1846), de 18 de Novembro de 2008 (Processo n.º 08B2758), de 15 de Setembro de 2010 (Processo n.º 322/05.4TAEVR.E1.S1), de 29 de Outubro de 2013 (Processo n.º 1410/05.2TCSNT.L1.S1), de 14 de Janeiro de 2015 (Processo n.º 2881/07.8TTLSB.L1.S1), e de 23 de Maio de 2019 (Processo nº 424/13.372AVR.P1.S1), por nós relatado, in, www.dgsi.pt.”.

Em suma, as questões novas não podem ser apreciadas no recurso, quer por respeito pelo principio da preclusão, quer porque tal apreciação desvirtuaria a finalidade dos recursos, quer por se saber que estes se destinam a reapreciar questões, e não a decidir questões novas, dado que tal apreciação equivaleria a suprimir um ou mais órgãos de jurisdição.

Voltando ao caso concreto, o que verificamos é o seguinte:

Em nenhum momento do processo, seja nos articulados seja nas alegações do recurso de Apelação, foi suscitada pela Ré esta questão do abuso de direito que imputa aos Autores.

E a ser assim e face a tudo aquilo que ficou dito, resulta evidente que a mesma não pode ser agora conhecida no âmbito deste recurso de Revista.

Em conclusão, também nesta parte não merecem ser acolhidas as pretensões recursivas da ré/recorrente Quercasa Lda.


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III. Decisão:

Face ao exposto, nega-se a revista e confirma-se a decisão recorrida.


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Custas a cargo da ré/recorrente (cf. art.º 527º, nºs 1 e 2 do CPC).

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Notifique.

Lisboa, 23 de Outubro de 2025

Relator: Carlos Portela

1ª Adjunta: Ana Paula Lobo

2ª Adjunta: Maria da Graça Trigo