PRÉDIO RÚSTICO
BENFEITORIAS ÚTEIS
ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA
DESPESAS
VALOR DA INDEMNIZAÇÃO
VALORIZAÇÃO DO IMÓVEL
Sumário

1. A colocação de terras para nivelamento de um terreno e a construção de muros, tanque e ramada de ferro e arame nesse terreno, traduzindo despesas que se destinaram a conservar ou melhorar a coisa, constituem benfeitorias úteis, sendo despicienda a consideração de que o prédio rústico estava afecto à actividade florestal para daí concluir que não ocorreu qualquer aumento, nem melhoria, da produtividade económica do prédio.
2. O valor da indemnização por benfeitorias úteis não corresponde ao montante da quantia gasta para a sua implementação, mas antes à valorização que delas terá decorrido para o imóvel onde foram realizadas.
3. Sendo a decisão da 1.ª instância omissa sobre factualidade indispensável para a decisão da causa, que não está admitida por acordo, provada por documento ou por confissão reduzida a escrito, a consequência dessa omissão será a anulação dessa decisão, seguida da repetição do julgamento sobre tal questão de facto.
(Sumário elaborado pelo Relator)

Texto Integral

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Acordam na 3.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra,[1]

AA intentou acção declarativa de condenação, sob a forma do processo comum, contra BB e mulher, CC, todos identificados no processo, pedindo a final que a acção seja julgada provada e procedente e, em consequência, proferida sentença a:

“a) condenar-se os réus a pagarem ao autor a quantia de 61.400,00 Euros (sessenta e um mil e quatrocentos euros), acrescido de juros vencidos e vincendos, desde a citação até efetivo pagamento.

b) declarar-se que o autor beneficia do direito de retenção sobre o imóvel identificado no art.º 10, enquanto não for efetuado o pagamento das benfeitorias atrás alegadas, ou no montante que o Tribunal vier a decidir.” (sic).


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            Alegou, para tanto e em síntese, que por escritura pública de justificação e compra e venda celebrada em 12-06-2008, DD, então menor, representada pelos seus pais, AA (ora autor) e EE, adquiriu por compra a FF, o prédio rústico inscrito na matriz sob o artigo ...15, e que, em finais de Agosto de 2019, DD, então já maior de idade, propôs no Tribunal Judicial de Castro Daire, contra GG e mulher HH e contra os ora réus, acção declarativa para exercício do direito de preferência relativo a um prédio confinante com o prédio rústico atrás identificado de que era proprietária.

Essa acção foi contestada e os réus deduziram reconvenção em que pretendiam exercer o direito de preferência sobre o prédio adquirido por DD, em 12-06-2008, tendo sido proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente e procedente a reconvenção, reconhecendo aos réus BB e mulher, o direito de preferência na compra do prédio rústico inscrito na matriz de ... sob o artigo ...15, da qual foi interposto, pela autora, recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra o qual veio a ser julgado improcedente, mantendo-se a decisão recorrida.

Durante anos, nomeadamente enquanto menor representada por seu pai, DD realizou no prédio adquirido pelos réus, no exercício da preferência, benfeitorias úteis, que, não sendo indispensáveis para a conservação do prédio aumentaram significativamente o seu valor, que não podem ser levantadas pela sua própria natureza, nem sem detrimento das mesmas e do prédio onde foram efectuadas, ou sem sua perda total.

Foi o aqui autor AA quem adiantou à filha DD, os valores necessários à realização das obras referentes às benfeitorias de que a mesma ficou credora, tendo despendido na execução das benfeitorias € 61 400,00, tendo DD agido com inteira boa-fé, tal como quem a representava.

Posteriormente à cedência do crédito ao autor por DD, o autor enviou carta registada com AR ao réu BB, reclamando as benfeitorias, mas o mesmo recusou-se a recebê-la.


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Os réus contestaram, começando por alegar as excepções de caso julgado e litispendência, e invocaram que a cessão de créditos ao autor apenas foi feita para tornar mais difícil a sua posição e criar obstáculos processuais, pugnando pela improcedência do pedido formulado em segundo lugar. Alegaram, outrossim, que logo após a aquisição do prédio o ora autor procedeu ao corte e venda de todas as árvores e, após, deixou a parte superior desse prédio a monte ou mato e abandono, e que adaptaram para cultivo uma pequena parte intermédia do prédio onde fizeram um socalco, com que agravaram o declive da parte inferior do prédio, até pelo seu acentuado declive e por não ter água, tal prédio não tinha qualquer aptidão agrícola, mas sim florestal.

À data da entrega judicial aos réus o prédio não tinha valor superior a € 2000,00, e as obras realizadas não tem qualquer serventia ou mais valia para o destino que os réus pretendem dar ao prédio atenta a sua única finalidade a que se encontrava e pode ser destinado, a florestal, pelo que o autor pode e deve levantar todas essas obras que em nada prejudica o terreno, e que, pelo contrário, esse levantamento só valorizará o prédio tendo sobretudo em atenção o fim a que está apto e é destinado.


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            Seguido o formalismo legal, e realizada prova pericial, teve lugar a audiência, tendo sido proferida decisão final que julgou a acção totalmente improcedente.

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Inconformado o autor veio recorrer, tendo os réus suscitado, em contra-alegações que “nem na motivação do recurso nem nas suas conclusões assinalado qualquer norma ou princípio jurídico alegadamente violados pela douta sentença, deve o recurso se liminarmente rejeitado” (sic).

Nessa sequência, o relator proferiu despacho, a 03-07-25, referindo, entre o mais, que “[p]erlustradas as conclusões regista-se que, pese embora o recorrente tenha cumprido o estatuído no art. 640.º do CPC, no que tange à impugnação da decisão da 1.ª Instância sobre a matéria de facto, apenas aludiu, na conclusão 48.ª, ao artigo 216.º, n.º 3, do Código Civil, para invocar o enquadramento ou classificação das benfeitorias realizadas por si como benfeitorias úteis, não constando, todavia, qualquer outra referência a qualquer norma legal ou sequer princípio legal alegadamente violados pela sentença sob recurso”, convidando-o a completar as conclusões recursivas indicando, de modo sintético e discriminado, as normas jurídicas violadas.


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O autor/recorrente apresentou as seguintes conclusões aperfeiçoadas:

“1. O Recorrente não se conforma com a decisão proferida que julgou inteiramente improcedente a presente ação e absolveu os Recorridos dos pedidos formulados pelo mesmo.

2. Recorre, por isso, de tal decisão devendo alterar-se os pontos concretos da matéria de facto que adiante se indicarão, bem como, quanto à matéria de direito.

3. Ora, no que respeita ao facto dado como provado, na sentença proferida pelo Tribunal a quo, nº 10, alínea a), referente ao arranque dos toqueiros dos pinheiros que haviam sido cortados quanto à aquisição do prédio pelo Autor andou mal o Tribunal a quo, com todo o devido respeito, quando considerou não provado que o Autor tinha procedido ao pagamento de €950,00 (novecentos e cinquenta euros) para o arranque de tais toqueiros.

4. Isto porque, basta atentarmos ao teor do facto como provado nº10, alínea a) da sentença proferida pelo Tribunal a quo para verificarmos que, da parte inicial do mesmo consta que foi “com recurso a uma retroescavadora, foram arrancados os toqueiros dos pinheiros”.

5. Presumindo-se, deste modo, implicitamente que o serviço efetuado por uma retroescavadora terá, obrigatoriamente, de ser um serviço oneroso, ou seja, que implicou um custo para o Recorrente.

6. Além disso não atentou, o Tribunal a quo, na sentença proferida, do constante do relatório pericial junto aos presentes autos, nomeadamente na resposta ao quesito 1 indicado pelo Recorrente, se não veja-se.

7. Do quesito 1 indicado pelo Recorrente consta o seguinte: “Partindo do princípio que é exato que uma retroescavadora arrancou os toqueiros dos pinheiros que no prédio haviam sido cortados qual o valor provável do respetivo custo?”

8. Sendo a resposta do perito no seguinte sentido: “Tendo como referência o já referido acima, nomeadamente densidade ocupacional, povoamento, cobertura vegetal, DAP das espécies, localização, condições de execução e todos os outros fatores elegíveis, estima-se o seguinte custo – Total: €1.056,00”

9. Tratando-se, assim, de um valor muito superior ao peticionado pelo Recorrente na sua petição inicial, nomeadamente no artigo 18º, alínea a) da mesma, onde o mesmo requereu o pagamento de €950,00 pelo corte, por uma retroescavadora, dos toqueiros dos pinheiros que haviam sido cortados aquando a aquisição do prédio.

10. Não tendo a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo atentado ao valor constante do relatório pericial tendo feito tábua rasa de tal facto ainda que, conforme se mencionou e aqui se reitera, tenha dado como provado de que foi, efetivamente, com recurso a uma retroescavadora que foram arrancados os toqueiros dos pinheiros descritos.

11. Além disso, a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo também não atentou à prova produzida em audiência de julgamento, nomeadamente às declarações do Autor e de algumas testemunhas que tinham conhecimento direto da existência dos toqueiros dos pinheiros no terreno aqui em causa, bem como, do pagamento, por parte do Recorrente, a uma retroescavadora para arrancar os mesmos, se não veja-se as declarações do autor AA, prestadas na sessão de audiência de julgamento do dia 12 de fevereiro de 2025, gravadas no ficheiro 1699-23.5T8VIS_2025-02-12_10-12-30, de 00:00:00 a 00:32:46, tendo ocorrido o seu início pelas 10h12 e termo pelas 10h45, extrato da gravação de 00:15:03 a 00:16:03; depoimento da testemunha II, prestado na sessão de audiência de julgamento do dia 12 de fevereiro de 2025, gravado no ficheiro 1699-23.5T8VIS_2025-02-12_10-48- 06, de 00:00:00 a 00:09:59, tendo ocorrido o seu início pelas 10h48 e termo pelas 10h58, extrato da gravação de 00:02:55 a 00:03:06; depoimento da testemunha JJ, prestado na sessão de audiência de julgamento do dia 12 de fevereiro de 2025, gravado no ficheiro 1699- 23.5T8VIS_2025-02-12_10:59:11, de 00:00:00 a 00:15:16, tendo ocorrido o seu início pelas 10h59 e termo pelas 11h14, extrato da gravação de 00:02:28 a 00:02:55; depoimento da testemunha KK, prestado na sessão de audiência de julgamento do dia 12 de fevereiro de 2025, gravado no ficheiro 1699-23.5T8VIS_2025-02-12_11:38:58, de 00:00:00 a 00:10:28, tendo ocorrido o seu início pelas 11h38 e termo pelas 11h49, extrato da gravação de 00:02:59 a 00:03:18, depoimento da testemunha LL, prestado na sessão de audiência de julgamento do dia 12 de fevereiro de 2025, gravado no ficheiro 1699-23.5T8VIS_2025-02-12_11-50-30, de 00:00:00 a 00:06:13, tendo ocorrido o seu início pelas 11h50 e termo pelas 11h56, extrato da gravação de 00:05:50 a 00:06:06.

12. Assim sendo e, atendendo à prova produzida, nomeadamente às declarações do Autor e das testemunhas supramencionadas, nunca poderia a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo, na sentença proferida, ter dado como facto não provado o constante, parcialmente, do artigo 18º, alínea a) da petição inicial apresentada pelo Recorrente, respeitante ao pagamento pelo mesmo da quantia de €950,00 (novecentos e cinquenta euros) pelo arranque dos toqueiros dos pinheiros.

13. Razão pela qual deve tal facto não provado passar a integrar a factualidade provada por tudo quanto se expôs, devendo o facto dado como provado, nº 10, alínea a) da sentença proferida pelo Tribunal a quo, passar a ter a seguinte redação: “Com recurso a uma Retroescavadora, foram arrancados os toqueiros dos pinheiros que haviam sido cortados quando a aquisição do prédio tendo o Autor procedido ao pagamento de 950,00 por tal serviço.”

14. Também e no que respeita ao nivelamento do terreno com terra transportada através de camiões e, ainda, do arrendamento e respetivo pagamento de uma catrapiler e de uma máquina giratória para efetuar tal serviço, considerou a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo, como factos provados, os constantes do ponto nº 10, alíneas b) a d) da fundamentação da sentença proferida.

15. Constando de tal factualidade que, efetivamente, o terreno em causa foi nivelado com terra transportada por uma catrapiler de rastos, para arrastar e nivelar as terras, bem como, por uma máquina giratório para efetuar os

socalcos do terreno.

16. Contudo, na sentença proferida pelo Tribunal a quo consta como não provado os factos respeitantes aos pagamentos, por parte do Recorrente, dos valores respeitantes a tais serviços, nomeadamente dos camiões de terra e do serviço prestado pelas máquinas supramencionadas, valores esses que constam do artigo 18º, alíneas b) a e) da petição inicial apresentada pelo Recorrente.

17. Acontece que, mais uma vez, a factualidade provada constante da sentença proferida pelo Tribunal a quo, nomeadamente a respeitante ao ponto 10, alíneas b) a d) nada mais é do que um claro contrassenso com o que consta da factualidade não provada supramencionada.

18. Isto porque, por um lado, a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo considerou, na factualidade provada, nomeadamente no ponto 10, alínea c) e d) que tinha sido utilizada uma catrapiler para arrastar e nivelar as terras e, ainda, uma máquina giratória para efetuar os socalcos do terreno, mas, em contrapartida, considerou que não se tinha provado que o Recorrente tinha efetuado o pagamento de tais serviços.

19. Ora, tal situação configura um total contrassenso, com todo o devido respeito, uma vez que é de conhecimento comum que para além de tais serviços serem onerosos são, também, dispendiosos.

20. Além disso, da prova produzida resultou, efetivamente, que tais serviços tinham sido efetuados, bem como, que o Recorrente tinha efetuado o respetivo pagamento pelos mesmos, bastando, para comprovar tal factualidade atentarmos ao depoimento da testemunha II, para comprovarmos que houve, efetivamente, pagamento de tais serviços por parte do Recorrente, nomeadamente da terra transportada, depoimento prestado na sessão de audiência de julgamento do dia 12 de fevereiro de 2025, gravado no ficheiro 1699-23.5T8VIS_2025-02-12_10-48-06, de 00:00:00 a 00:09:59, tendo ocorrido o seu início pelas 10h48 e termo pelas 10h58, extratos da gravação de 00:05:20 a 00:05:53 e de 00:07:42 a 00:08:15.

21. Pelo que, da prova testemunhal produzida consta que, efetivamente, a terra transportada foi paga pelo Recorrente tendo a testemunha supramencionada, no depoimento prestado, transmitido o valor pago pelo Recorrente por tal serviço mencionando inclusive que, a inexistência de recibo por parte do mesmo se devia à testemunha não ter uma atividade lucrativa neste sentido.

22. Não valendo, deste modo, a tese de que o pagamento dos serviços apenas pode ser efetuado através de prova documental, nomeadamente do respetivo recibo uma vez que a testemunha supramencionada que, veja-se, foi quem

efetuou o serviço aqui em questão, justificou perfeitamente o motivo pelo qual não tinha sido emitido um recibo pese embora tal serviço tivesse sido pago pelo Recorrente.

23. No mesmo sentido e, também, no respeitante ao transporte da terra para nivelar o terreno, bem como, ao aluguer e pagamento de uma catrapiler e de uma máquina giratória não teve, a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo, em consideração a prova testemunhal produzida a este respeito que tinha conhecimento direto de tal factualidade, bem como, as declarações do Recorrente prestadas em sede de audiência de julgamento.

24. Veja-se nesse sentido as declarações do autor AA, prestadas na sessão de audiência de julgamento do dia 12 de fevereiro de 2025, gravadas no ficheiro 1699-23.5T8VIS_2025-02-12_10-12-30, de 00:00:00 a 00:32:46, tendo ocorrido o seu início pelas 10h12 e termo pelas 10h45, extrato da gravação de 00:18:06 a 00:19:05, da testemunha MM, prestado na sessão de audiência de julgamento do dia 12 de fevereiro de 2025, gravado no ficheiro 1699-23.5T8VIS_2025-02-12_11:15:52, de 00:00:00 a 00:08:44, tendo ocorrido o seu início pelas 11h15 e termo pelas 11h24, extrato da gravação de 00:02:27 a 00:03:48, da testemunha NN, prestado na sessão de audiência de julgamento do dia 12 de fevereiro de 2025, gravado no ficheiro 1699-23.5T8VIS_2025-02-12_11:25:28, de 00:00:00 a 00:12:31, tendo ocorrido o seu início pelas 11h25 e termo pelas 11h38, extrato da gravação de 00:03:53 a 00:06:43

25. Tendo desta forma sido produzida prova suficiente, nomeadamente a prova testemunhal supra mencionada, que confirmou que o Recorrente nivelou o terreno aqui em questão com toneladas de terra comprada, bem como, que para tal serviço, bem como, para efetuar os socalcos no terreno teve de alugar uma catrapiler, bem como, uma máquina giratória.

26. Assim sendo, deve a matéria de facto provada, nomeadamente a constante do ponto 10 alíneas b) c) e d) ser alterada no seguinte sentido: “ b) Foi nivelado o terreno com terra transportada por camiões, tratando-se de camiões de 10 toneladas, com um custo não inferior a €10.000,00 (dez mil euros), pago pelo Autor; c) Com um catrapiler de rastos, para arrastar e nivelar as terras tendo sido pago pelo Autor o valor de €5.000,00 (cinco mil euros); d) E com uma máquina giratória para efetuar 4 socalcos no terreno tendo sido pago pelo Autor o valor de €1.000,00 (mil euros)”

27. Devendo o facto não provado constante da sentença proferida pelo Tribunal a quo, respeitante ao artigo 18º, alínea d) da petição inicial apresentada pelo Recorrente passar a constar dos factos provados devendo, da matéria de facto provada passar a constar o seguinte: “Pagou o Autor ao Sr. II, cerca de 40 camiões de terra, para nivelamento dos terrenos, camiões esses de 10 toneladas, tendo pago cerca de €6.000,00 (seis mil euros).”

28. No que concerne à execução de 2 muros de betão e um tanque para reservatório de água também não teve o Tribunal a quo, na sentença que proferiu, em consideração a prova testemunhal produzida, bem como, as declarações de parte do Autor.

29. Isto porque, e apesar de resultar como factualidade provada, constante do ponto 10, alíneas e) a g) que o Recorrente, efetivamente, mandou construir dois muros em betão, bem como, um tanque para reservatório de água tendo, ainda sido erguido um muro de Blocos em cima do muro de betão decidiu o Tribunal a quo, considerar como factos não provados que:

a) para a execução dos dois muros em betão e para o tanque para reservatório de água foram contratados quatro homens ao dia sendo pago ferro, areia, cimento e gravilha e o respetivo transporte tendo nisso despendido, pelo menos, €30.000,00 (trinta mil euros);

b) o tanque tenha sido construído com pedra de granito;

c) tenha sido despendido, pelo Autor, a quantia de €1.500,00 (mil e quinhentos euros) para erguer um muro de blocos em cima de um muro de betão.

30. Contudo ao considerar tais factos como não provados não teve o Tribunal a quo, conforme se mencionou supra e aqui se reitera, as declarações do Autor, bem como, a prova testemunhal produzida que confirmou todos os factos não provados supra descritos, nomeadamente declarações do autor AA, prestadas na sessão de audiência de julgamento do dia 12 de fevereiro de 2025, gravadas no ficheiro 1699-23.5T8VIS_2025-02-12_10-12-30, de 00:00:00 a 00:32:46, tendo ocorrido o seu início pelas 10h12 e termo pelas 10h45, extrato da gravação de 00:19:41 a 00:24:18; depoimento da testemunha JJ, prestado na sessão de audiência de julgamento do dia 12 de fevereiro de 2025, gravado no ficheiro 1699-23.5T8VIS_2025-02-12_10:59:11, de 00:00:00 a 00:15:16, tendo ocorrido o seu início pelas 10h59 e termo pelas 11h14, extratos da gravação de 00:05:44 a 00:06:00 e de 00:06:26 a 00:07:05; depoimento da testemunha NN, prestado na sessão de audiência de julgamento do dia 12 de fevereiro de 2025, gravado no ficheiro 1699-23.5T8VIS_2025-02-12_11:25:28, de 00:00:00 a 00:12:31, tendo ocorrido o seu início pelas 11h25 e termo pelas 11h38, extratos da gravação de 00:02:22 a 00:03:00, de 00:03:35 a 00:03:52 e de 00:06:47 a 00:07:20; depoimento da testemunha KK, prestado na sessão de audiência de julgamento do dia 12 de fevereiro de 2025, gravado no ficheiro 1699-23.5T8VIS_2025-02-12_11:38:58, de 00:00:00 a 00:10:28, tendo ocorrido o seu início pelas 11h38 e termo pelas 11h49, extratos da gravação de 00:06:24 a 00:06:50 e de 00:07:29 a 00:08:17

31. Pelo que, e em face da prova testemunhal produzida, bem como, através das declarações do Recorrente resultou provado que, efetivamente, foram contratados homens ao dia para a construção dos muros e do tanque aqui em

discussão, tendo sido pago ferro, areia cimento e gravilha e o respetivo transporte tendo o Recorrente, de forma clara e inequívoca referido que tinha despendido o valor total de €30.000,00 (trinta mil euros) com tal serviço.

32. Além disso, resultou também provado em face da prova produzida que o muro em questão é constituído por granito, bem como, o tanque, tendo o muro uma sapata de 1,5 metros para cada lado e uma profundidade de 0,5 metros, bem como que em cima desse muro foi erguido um muro de betão no qual o Recorrente despendeu a quantia de €1.500,00 (mil e quinhentos euros).

33. Razão pela qual deve passar a constar da factualidade provada da sentença proferida pelo Tribunal a quo, nomeadamente do ponto 10, alíneas e) a h) o seguinte: “e) Execução de 2 muros em betão e um tanque para reservatório de água tendo, para o efeito, o Autor contratado 4 homens ao dia, e sendo pago ferro, areia, cimento, gravilha e o respetivo transporte, tendo nisso despendido pelo menos €30.000,00 (trinta mil euros). f) O muro é constituído por dois troços: Troço I, com o comprimento 10,00 metros e uma altura de 1,10 metros; Troço 2, com o comprimento de 18,70 metros e uma altura de 3,10 metros e são constituídos em betão armado e pedra de granito. Tem uma sapata de 1,5 metros para cada lado e uma profundidade de 0,5 metros. g) As paredes do tanque têm uma espessura de 25 cm, tem largura de 2,60 metros e comprimento de 4,80 m2 e tem uma altura de 1,10 metros. É constituído em ferro, cimento, areia e pedra de granito. h) Foi erguido um muro de blocos em cima do muro de betão tendo o Autor despendido a quantia de €1.500,00 (mil e quinhentos euros).”

34. Quanto à construção de um sistema de esgoto instalação da rota de transporte de água para o terreno, nomeadamente colocação de tubos, cimentos, sargetas e mão de obra para a instalação para a água da chuva em virtude de o terreno ser muito inclinado decidiu o Tribunal a quo, na sentença proferida considerar tais factos como não provados, mais concretamente os constantes das alíneas h) e n) do artigo 18º da petição inicial apresentada pelo Recorrente.

35. Tendo também considerado como facto não provado o contante da alínea o) da petição inicial apresentada pelo Recorrente respeitante ao facto do mesmo ter despendido €500,00 (quinhentos euros) em cubos de granito para melhor acesso à Estrada Nacional.

36. Contudo e, mais uma vez, não teve o Tribunal a quo em consideração as declarações do Recorrente, prestadas em sede de audiência de discussão e julgamento nem a prova testemunhal produzida, se não veja-se, declarações

do autor AA, prestadas na sessão de audiência de julgamento do dia 12 de fevereiro de 2025, gravadas no ficheiro 1699-23.5T8VIS_2025-02-12_10-12-30, de 00:00:00 a 00:32:46, tendo ocorrido o seu início pelas 10h12 e termo pelas 10h45, extratos da gravação de 00:24:20 a 00:24:54 e de 00:26:35 a 00:27:44; depoimento da testemunha II, prestado na sessão de audiência de julgamento do dia 12 de fevereiro de 2025, gravado no ficheiro 1699-23.5T8VIS_2025-02-12_10-48-06, de 00:00:00 a 00:09:59, tendo ocorrido o seu início pelas 10h48 e termo pelas 10h58, extrato da gravação de 00:06:50 a 00:07:27; depoimento da testemunha JJ, prestado na sessão de audiência de julgamento do dia 12 de fevereiro de 2025, gravado no ficheiro 1699- 23.5T8VIS_2025-02-12_10:59:11, de 00:00:00 a 00:15:16, tendo ocorrido o seu início pelas 10h59 e termo pelas 11h14, extratos da gravação de 00:05:54 a 00:06:15, de 00:07:06 a 00:07:25 e de 00:08:55 a 00:09:39; depoimento da testemunha MM, prestado na sessão de audiência de julgamento do dia 12 de fevereiro de 2025, gravado no ficheiro 1699-23.5T8VIS_2025-02-12_11:15:52, de 00:00:00 a 00:08:44, tendo ocorrido o seu início pelas 11h15 e termo pelas 11h24, extratos da gravação de 00:04:02 a 00:04:13 e de 00:06:00 a 00:06:11; depoimento da testemunha KK, prestado na sessão de audiência de julgamento do dia 12 de fevereiro de 2025, gravado no ficheiro 1699-23.5T8VIS_2025-02-12_11:38:58, de 00:00:00 a 00:10:28, tendo ocorrido o seu início pelas 11h38 e termo pelas 11h49, extrato da gravação de 00:09:20 a 00:10:00; depoimento da testemunha NN, prestado na sessão de audiência de julgamento do dia 12 de fevereiro de 2025, gravado no ficheiro 1699-23.5T8VIS_2025-02-12_11:25:28, de 00:00:00 a 00:12:31, tendo ocorrido o seu início pelas 11h25 e termo pelas 11h38, extrato da gravação de 00:07:35 a 00:07:59.

37. Razão pela qual deve a sentença proferida pelo Tribunal a quo, por tudo quanto se expôs, ser alterada dela passando a constar como factos provados, devendo os mesmos ser aditados, nomeadamente ao ponto 10, os seguintes: “- Foi construído um sistema de esgoto para a água da chuva, pelo Autor, em virtude do terreno ser muito inclinado tendo despendido em tubos, cimento, sargetas e mão de obra €1.700,00;- O autor gastou, em tubos e mão de obra para a instalação da rota de transporte de água para o terreno, o valor de €2.500,00;- O Autor despendeu em cubos de granito para melhor acesso à Estrada Nacional o valor de €500,00.”

38. Por último, e no que à factualidade provada concerne, decidiu o Tribunal a quo, na sentença proferida, no ponto 10 alíneas i), j) e k) considerar que o Recorrente tinha tornado cultivável, uma parte do prédio aqui em discussão com horta tendo também feito uma ramada em ferro e arame e plantado diversas árvores fruteiras no mesmo, nomeadamente para produzir kiwis, limoeiros, diospireiros.

39. Contudo, decidiu julgar como factos não provados, na sentença proferida, que o recorrente tinha adquirido 20 carradas de estrume caseiro, no valor de €800,00 para tornar a horta cultivável, que tinha pago a um trator o valor de €100,00 para lavrar os socalcos e que o valor despendido na ramada de ferro e arame havia sido de €750,00.

40. Além disso, decidiu também não considerar como facto provado que o Recorrente tinha, para além das árvores fruteiras supramencionadas, adquirido marmeleiros, castanheiros, ameixoeiras e pinheiros mansos despendendo no total o valor de €600,00

41. Contudo, mais uma vez, não atendeu o Tribunal a quo, na sentença proferida, às declarações prestadas pelo Recorrente, bem como à prova testemunhal produzida, se não veja-se, declarações do autor AA, prestadas na sessão de audiência de julgamento do dia 12 de fevereiro de 2025, gravadas no ficheiro 1699-23.5T8VIS_2025-02-12_10-12-30, de 00:00:00 a 00:32:46, tendo ocorrido o seu início pelas 10h12 e termo pelas 10h45, extrato da gravação de 00:24:55 a 00:26:30; depoimento da testemunha II, prestado na sessão de audiência de julgamento do dia 12 de fevereiro de 2025, gravado no ficheiro1699-23.5T8VIS_2025-02-12_10-48-06, de 00:00:00 a 00:09:59, tendo ocorrido o seu início pelas 10h48 e termo pelas 10h58, extrato da gravação de 00:06:30 a 00:06:45; depoimento da testemunha JJ, prestado na sessão de audiência de julgamento do dia 12 de fevereiro de 2025, gravado no ficheiro 1699-23.5T8VIS_2025-02-12_10:59:11, de 00:00:00 a 00:15:16, tendo ocorrido o seu início pelas 10h59 e termo pelas 11h14, extrato da gravação de 00:07:32 a 00:08:46; depoimento da testemunha NN, prestado na sessão de audiência de julgamento do dia 12 de fevereiro de 2025, gravado no ficheiro 1699-23.5T8VIS_2025-02-12_11:25:28, de 00:00:00 a 00:12:31, tendo ocorrido o seu início pelas 11h25 e termo pelas 11h38, extratos da gravação de 00:08:00 a 00:08:44 e de 00:09:08 a 00:09:57.

42. Pelo que, em face das declarações do Recorrente, bem como, em face da prova testemunhal produzida nunca poderia o Tribunal a quo ter considerado tal factualidade como não provada uma vez que quer o Recorrente, quer as testemunhas supramencionadas têm conhecimento direto de tal factualidade e confirmam esses mesmos factos.

43. Razão pela qual deve ser aditado ao ponto 10 dos factos provados, da sentença proferida pelo tribunal a quo, nomeadamente às alíneas i), j), k) o seguinte: “ - O Autor tornou cultivável com horta, uma parte do prédio, adquiriu 20 carradas de estrume caseiro gastando €800,00;- Fez uma ramada em ferro e arame despendendo €750,00;- Plantou diversas árvores fruteiras, nomeadamente para produzir kiwis, marmeleiros, diospireiros, castanheiros, ameixoeiras e pinheiros mansos, despendendo €600,00.”

44. Devendo, ainda, considerar-se como facto provado e, aditar-se o mesmo, à factualidade provada da sentença proferida pelo Tribunal a quo o seguinte: “O Autor pagou a um trator para lavrar os socalcos o valor de €100,00”

45. Assim sendo, existiu um claro erro de julgamento no que ao direito respeita uma vez que na sentença proferida o Tribunal a quo refere que “ (…) o Autor não goza do direito a receber dos Réus a quantia correspondente a qualquer enriquecimento dos Réus decorrente da realização daquelas obras levadas a cabo para alterar a aptidão florestal para hortícola daquela área do prédio rústico, pois que não logrou provar que em resultado da sua intervenção o prédio se tenha valorizado e que para além de o valorizar não pode levantar as obras.”

46. Ora, tal situação constitui um claro contrassenso com o facto provado no ponto 11 constante da sentença proferida pelo Tribunal a quo, uma vez que do mesmo consta que “A remoção do muro, tanque e ramada provoca a inutilização dos materiais.”

47. Isto porque, por um lado e conforme se mencionou supra, o Tribunal a quo refere que o Recorrente não provou que não podia levantar as obras, mas por outro, considerou como facto provado que a remoção do muro, tanque e ramada provoca a inutilização desses mesmos materiais o que configura um total contrassenso.

48. Violando-se totalmente o disposto no artigo 216º, nº3, do Código Civil que classifica como benfeitorias úteis as que, não sendo indispensáveis para a sua conservação lhe aumentam, todavia, o valor.

49. E, ainda, o disposto no artigo 1273º do Código Civil, que dispõe que “1-Tanto o possuidor de boa fé como o de má fé têm direito a ser indemnizados das benfeitorias necessárias que hajam feito, e bem assim a levantar as benfeitorias úteis realizadas na coisa, desde que o possam fazer sem detrimento dela. 2-Quando, para evitar o detrimento da coisa, não haja lugar ao levantamento das benfeitorias, satisfará o titular do direito ao possuidor o valor delas, calculado segundo as regras do enriquecimento sem causa.” (sublinhado nosso)

50. Isto porque, conforme se constatou supra, o Tribunal a quo ao ter decidido, na sentença proferida, nomeadamente no facto provado no ponto 11 que “A remoção do muro, tanque e ramada provoca a inutilização dos materiais” está claramente a violar os artigos supra mencionados uma vez que, por tudo o quanto aqui se expôs as benfeitorias existentes no local deveriam ter sido consideradas como benfeitorias úteis, ao abrigo do artigo 216º, nº3, do Código Civil devendo o recorrente ser indemnizado pelos recorridos uma vez que é o próprio Tribunal a quo, na sentença proferida, que considera que a remoção dos materiais ali existentes irá provocar a inutilização dos mesmos, o que equivale a decidir que não podem tais benfeitorias ser levantadas.

51. O que constitui necessariamente um enriquecimento para o prédio dos réus à custa do autor, que fica sem as benfeitorias e sem o valor correspondente às mesmas, existindo manifesto erro de julgamento e de direito aplicado, bem como a violação do artigo 473º do Código Civil, para além das normas aqui invocadas.

52. Devendo, a este respeito, ver-se o disposto no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 12 de Junho de 2012, processo nº 1119/10.5TBPBL-E.C2 e ainda, o disposto no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 10 de Fevereiro de 2015, processo nº 1289/12.8TBACB.C1.

53. Pelo que, e atento todo o exposto, nunca poderia o Tribunal a quo, na sentença proferida, ter considerado que o Recorrente não logrou provar que em resultado da sua intervenção o prédio se tenha valorizado, por toda a factualidade que aqui se expôs.

54. Devendo o Tribunal ad quem ter em consideração toda a factualidade aqui mencionada, na decisão a proferir, e considerar que o prédio aqui em discussão foi bastante valorizado em função da intervenção do Recorrente

devendo os Recorridos ser condenados a efetuar o pagamento ao Recorrente das benfeitorias por este realizadas.

55. Benfeitorias essas que, por tudo o que aqui se expôs, correspondem ao valor total de 61,400,00 (sessenta e um mil e quatrocentos euros) devendo os Recorridos ser condenados a efetuar o pagamento dessas mesmas benfeitorias ao Recorrente acrescido de juros vencidos e vincendos desde a citação até efetivo pagamento.

56. Deste modo, deverá a sentença proferida pelo Tribunal a quo ser revogada, julgando-se este recurso inteiramente procedente, atendendo à alteração da matéria de facto com base na reapreciação da prova gravada e ao erro de julgamento no que respeita à matéria de direito com a consequente condenação dos Recorridos a efetuar o pagamento ao Recorrente do valor de €61.400,00 respeitantes às benfeitorias realizadas pelo mesmo no prédio aqui em causa.

Assim, farão Vossas Ex.as JUSTIÇA”.


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Em sede de contra-alegações, os réus/recorridos referiram:

“1 - Não tendo o recorrente, nem na motivação do recurso nem nas suas conclusões assinalado qualquer norma ou princípio jurídico alegadamente violados pela douta sentença, deve o recurso se liminarmente rejeitado.

2 - O direito a indemnização por benfeitorias úteis pressupõe pelo menos:

a) A alegação e prova de que as benfeitorias o são, úteis, ou seja, que, apesar de dispensáveis, aumentam o valor objectivo da coisa, alegação e prova que o recorrente não fez.

b) A alegação e prova de que o possuidor não pode levantá-las sem detrimento da coisa principal, alegação (concreta) e prova que o recorrente não fez.

c) A alegação e prova do custo de cada uma delas e do valor que cada uma das despesas acrescentou à coisa e a medida do seu benefício no momento actual, alegação e prova que o recorrente não fez.

d) A alegação e prova de que o dono do prédio se opõe ao levantamento das mesmas com fundamento em detrimento da coisa benfeitorizada, alegação e prova que o recorrente não fez.

e) A alegação e prova de que o recorrente, afinal de contas, ainda era possuidor da coisa principal, prova que o recorrente não fez.

3 - Não tendo feito esta prova nem resultando que da decisão do recurso, com a âmbito definido pelo recorrente, tal prova venha a ser alcançada, nomeadamente ao nível da decisão em matéria de facto, deve improceder desde logo igualmente por esta razão o douto recurso.

4 - Quando a atribuição de credibilidade a uma fonte de prova pelo julgador se basear numa opção assente na imediação e na oralidade, o tribunal de recurso só a poderá criticar se ficar demonstrado que essa opção é inadmissível face às regras da experiência comum.

5 - Tendo a meritíssima juiz “a quo” explicado na douta sentença o seu juízo critico quanto à análise de fez da prova por declarações e testemunhal, não se revelando, sequer se indiciando dessa análise qualquer violação de princípios ou regras de direito probatório, sejam regras científicas, sejam regras ao nível da lógica das coisa ou da experiência de vida, não merece censura a resposta à matéria de facto nos termos e com o âmbito definido na douta sentença de primeira instância, pelo que deve improceder o recurso também neste âmbito.

Por tudo o exposto deve o presente recurso ser julgado totalmente improcedente por não provado, assim fazendo V.ªs Ex.ªs a costumada Justiça.”.


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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir, importando dirimir, no âmbito deste recurso, por ordem lógica, as seguintes questões:

1. Impugnação da matéria de facto:

1.1. Se deve ser alterada a matéria de facto constante do ponto n.º 10, alínea a) (conclusões 3 a 13);

1.2. Se deve ser alterada a matéria de facto constante do ponto n.º 10, alíneas b), c) e d), e se o facto não provado respeitante ao artigo 18.º, alínea d), da petição inicial deve passar a constar dos factos provados (conclusões 14 a 27);

1.3. Se deve ser alterada a matéria de facto constante do ponto n.º 10, alíneas e), f), g) e h) (conclusões 28 a 33);

1.4. Se os factos não provados respeitantes ao artigo 18.º, alíneas h), n) e o), da petição inicial devem passar a constar dos factos provados (conclusões 34 a 37):

1.5. Se deve ser dada como provada e aditada à matéria de facto do ponto 10 dos factos provados, nomeadamente às alíneas i), j), k) (conclusões 38 a 44).

2. Errada apreciação jurídica da causa:

Violação dos artigos 1273.º, 216.º, n.º 3 e 473.º do Código Civil, devendo os recorridos ser condenados a pagar ao recorrente o valor de € 61 400,00 atinente às benfeitorias realizadas no prédio.


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A. Fundamentação de Facto

Na decisão recorrida consignou-se:

Da discussão da causa resultaram provados os seguintes factos com relevo para a decisão do litígio (ordenados cronologicamente e logicamente):

1. Por escritura pública de justificação e compra e venda celebrada em 12.06.2008, no Cartório Notarial ..., sito na Rua ... em ..., DD, então menor, representada por seus pais AA e EE, adquiriu por compra a FF, o prédio rustico sito à Travessa, freguesia constituído por pinhal, com 1800 m2, inscrito na matriz sob o artigo ...15, e então não descrito na Conservatória do Registo .... – artigo 1º da petição inicial;

2. Posteriormente, em 28.07.2008, o prédio descrito em 1, foi inscrito a favor da compradora DD, na Conservatória do Registo Predial. – artigo 3º da petição inicial.

3. O autor casou civilmente com EE em 15.11.2015, no regime imperativo da separação de bens. – artigo 4º da petição inicial.

4. Em fins de agosto de 2019, DD, então já de maior idade, propôs no Tribunal Judicial de Castro Daire, contra GG e mulher HH e contra os aqui réus BB e mulher, ação declarativa com processo comum, para exercício do direito de preferência relativo ao prédio sito no mesmo lugar da Travessa inscrito na matriz rustica da freguesia ... sob o artigo ...14 e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o no ...50, confinante com o prédio identificado em 1. – artigo 5º e 6 da petição inicial.

5. A ação foi contestada e os réus deduziram reconvenção em que, pretendiam exercer o direito de preferência sobre o prédio adquirido pela DD em 12.06.2008, ou seja, adquirido e possuído pela mesma durante mais de 11 anos. – artigo 8º da petição inicial.

6. Procedeu-se a julgamento, e foi proferida sentença com data de 5.01.2022, em que foi decidido julgar a ação totalmente improcedente e julgar procedente a reconvenção, reconhecendo aos réus BB e mulher, o direito de preferência da compra do prédio descrito no ponto 1. – artigo 11º da petição inicial.

7. Desta sentença interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra a autora DD, recurso, que, no entanto, veio a ser julgado improcedente mantendo-se a decisão recorrida. – artigo 12º da petição inicial.

8. Quando DD adquiriu o prédio o mesmo era constituído por um pinhal frondoso, com árvores com mais de 30-40 anos e tem uma área de 2.580,00 metros e tinha um valor estimado de €7.150,00 (sendo €4343,69 o valor estimado do pinhal e €2805,75 o valor estimado da terra nua). – artigo 18º da contestação e teor do relatório pericial, resposta ao quesito 1 dos Réus, nos termos do disposto no artigo 5º, n.º 2 alínea b) do Código de Processo Civil.

9. Logo após a sua aquisição o aqui autor procedeu ao corte e venda de todas as árvores (pinheiros essencialmente) pelo valor de, pelo menos, €3.000,00 isto seguramente ainda em 2008 ou inícios de 2009. - artigo 19º da contestação;

10. Durante os anos de 2009 e 2011 nomeadamente enquanto menor, representada pelo seu pai, a DD efetuou, agindo de boa fé, tal como quem a representou, no prédio adquirido pelo Réus, no exercício da preferência as seguintes obras: – artigo 13º, 24º e 25º da petição inicial

a) Com recurso a uma Retroescavadora, foram arrancados os toqueiros dos pinheiros que haviam sido cortados quanto à aquisição do prédio. – artigo 18º, alínea a) do artigo 18º da petição inicial.

b) Foi nivelado o terreno com terra transportada. - alínea b) do artigo 18º da petição inicial;

c) E com um catrapiler de rastos, para arrastar e nivelar as terras. - alínea c) do artigo 18º da petição inicial;

d) E com uma máquina giratória para efetuar 4 socalcos no terreno. - alínea e) do artigo 18º da petição inicial;

e) Execução de 2 muros em betão e um tanque para reservatório de água. - alínea f) do artigo 18º da petição inicial;

f) O muro é constituído por dois troços: Troço 1, com o comprimento 10,00 metros e uma altura de 1,10 metros; Troço 2, com o comprimento de 18,70 metros e uma altura de 3,10 metros e são constituídos em betão armado. Tem uma sapata. - alínea f 1) do artigo 18º da petição inicial, com o teor dos esclarecimentos prestados pelo senhor perito.

g) As paredes do tanque têm uma espessura de 25 cm, tem largura de 2,60 metros e comprimento de 4,80m2 e tem uma altura de 1,10 metros. É constituído em ferro, cimento, areia. - alínea f) 2 do artigo 18º da petição inicial; com o teor dos esclarecimentos prestados pelo senhor perito.

h) Foi erguido um muro de blocos em cima do muro de betão. - alínea g) do artigo 18º da petição inicial;

i) Tornou cultivável com horta, uma parte do prédio (área de 292 m2). - alínea i) do artigo 18º da petição inicial e relatório pericial, nos termos do disposto no artigo 5º, n.º 2 alínea b) do Código de Processo Civil.

j) Fez uma ramada em ferro e arame. - alínea l) do artigo 18º da petição inicial;

k) Plantou diversas árvores fruteiras, nomeadamente para produzir kiwis, limoeiros, diospireiros. - alínea m) do artigo 18º da petição inicial;

11. A remoção do muro, tanque e ramada provoca a inutilização dos materiais. - artigo 16º da petição inicial e relatório pericial: resposta ao quesito 21 dos Autores, nos termos do artigo 5º, n.º 2 alínea b) do Código de Processo Civil;

12. Através de documento autenticado, DD cedeu o crédito pela realização das obras ao aqui Autor que havia adiantado o pagamento das mesmas. – artigo 28º da petição inicial.

Factos não provados

Da petição inicial:

Artigo 14º (que não sendo indispensáveis para a conservação do prédio, aumentaram significativamente o respetivo valor).

Artigo 16º com exceção da parte que teve assento nos factos provados (Benfeitorias que não podem ser levantadas pela própria natureza, nem podem ser levantadas sem detrimento das mesmas e do prédio onde foram efectuadas ou sem a sua perda total)

Artigo 18º, alínea a) parcialmente (O Autor procedeu ao pagamento de €950,00);

Artigo 18º, alínea b) parcialmente (… com algumas centenas de camiões …com um custo não inferior a €10.000,00, tratava-se de camiões de 10 toneladas);

Artigo 18º, alínea c) parcialmente (Arrendamento … durante 15 dias … tendo sido pago o valor de €5.000,001) [Trata-se de lapso de escrita. O valor indicado pelo autor/recorrente, na petição inicial, foi de € 1000,00]

Artigo 18º, alínea d) (Pagou ao Sr. II, cerca de 40 camiões de terra, para nivelamento dos terrenos, camiões esses de 10 toneladas, tendo pago cerca de €6.000,00).

Artigo 18º, alínea e) parcialmente (Pagamento … tendo pago €1.000,002) [Trata-se de lapso de escrita. O valor indicado pelo autor/recorrente, na petição inicial, foi de € 5000,00]

Artigo 18, alínea f) parcialmente (… para o que foram contratados 4 homens ao dia, e sendo pago ferro, areia, cimento e gravilha e o respetivo transporte, tendo nisso despendido pelo menos €30.000,00);

Artigo 18º, alínea f 1 parcialmente (…e pedra de granito… de 1.5 metros para cada lado e uma profundidade de 0,5 metros).

Artigo 18º, alínea f) 2 parcialmente (…e pedra de granito).

Artigo 18º, alínea g) parcialmente (… despendendo €1.500,00);

Artigo 18º, alínea h) (Foi construído um sistema de esgoto para a água da chuva, em virtude do terreno ser muito inclinado, tendo despendido em tubos, cimento, sargetas e mão de obra €1.700,00).

Artigo 18º, alínea i) parcialmente (…adquiriu 20 carradas de estrume caseiro gastando €800,00.)

Artigo 18º, alínea j) (Pagou a um trator para lavrar os socalcos €100,00);

Artigo 18º, alínea l) parcialmente (… despendendo €750,00);

Artigo 18º, alínea m) parcialmente (… marmeleiros, … castanheiros, ameixoeiras e pinheiros mansos, despendendo €600,00);

Artigo 18º, alínea n) (Gastou em tubos e mão de obra para a instalação da rota de transporte de água para o terreno, €2.500,00).

Artigo 18º, alínea o (Despendeu em cubos de granito para melhor acesso à Estrada Nacional, €500,00).

Artigo 26º (E sempre até à atualidade, DD tem mantido a posse legítima do terreno, destinando até ao presente uma larga área e terreno, com culturas hortícolas…);

Artigo 31º (Posteriormente à cedência do crédito ao Autor pela DD, o Autor enviou carta registada com a AR ao Réu BB, a reclamar o pagamento das obras, mas o mesmo recusou-se a recebê-la).

Da contestação

Artigo 5º (É manifesto que esta alegada cessão de crédito foi concretizada apenas e tão somente para tornar mais difícil a posição dos aqui réus e criar obstáculos processuais à realização da justiça quer nestes autos quer no processo de execução da sentença referida no art.º 11º da P.I.).


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B. Fundamentação de Direito

1. Impugnação da matéria de facto:

O n.º 1 do artigo 662.º do Código de Processo Civil (CPC) estabelece que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa, abrangendo situações de aplicação de regras vinculativas extraídas do direito probatório material – onde se inserem as regras relativas ao ónus de prova, à admissibilidade dos meios de prova, e à força probatória de cada um deles – bem como, naturalmente, as situações em que a reapreciação da prova é suscitada por via da impugnação da decisão sobre a matéria de facto feita pelo recorrente.

Na impugnação da matéria de facto, o recorrente tem de cumprir os requisitos prescritos, desde logo, no n.º 1 do artigo 640.º do CPC que prescreve que, quando haja sido feita essa impugnação, o recorrente deve obrigatoriamente e sob pena de rejeição especificar: a) os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) os concretos meios probatórios constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que impõem a decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) a decisão que no seu entender deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

Por sua vez, a alínea a) do n.º 2 do artigo 640.º do CPC prescreve que no caso de terem sido invocados meios probatórios gravados como fundamento do erro na apreciação da prova, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso nessa parte, indicar com exactidão as passagens gravadas em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.

In casu, mostram-se integralmente cumpridos os requisitos processuais e legais para apreciar a impugnação da decisão sobre a matéria de facto.

Antes de avançar nessa apreciação importa notar que os fundamentos de prova invocados pelo recorrente para a alteração da decisão de facto remetem para os critérios de convicção do julgador na apreciação da prova produzida, mormente prova por declarações de parte e prova testemunhal, sendo inequívoco que a análise e a valoração da prova, pelo tribunal ad quem, está sujeita às mesmas normas e princípios que regem o julgamento na primeira instância, nomeadamente, a regra da livre apreciação da prova e as respectivas excepções, nos termos previstos no artigo 607.º, n.º 5, do CPC.

Assim, a  extensão desta reapreciação, que o Tribunal da Relação realiza, coincide, em tese e na amplitude, com a da 1.ª instância, traduzindo-se na audição dos depoimentos indicados pelo apelante, e na avaliação da restante prova que se considere pertinente, atendendo aos meios probatórios que existam no processo destinados à demonstração dos concretos pontos de facto impugnados, apreciando-os criticamente de forma a responder-lhes, segundo critérios de razoabilidade e segurança, emitindo um juízo de concordância ou discordância com a matéria fixada pelo tribunal a quo e que foi impugnada, mantendo-a ou alterando-a.

Não obstante, mantendo-se em vigor os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova, e guiando-se o julgamento por padrões de probabilidade e não de certeza absoluta, a Relação só deve alterar a decisão sobre a matéria de facto quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente aos concretos pontos de facto impugnados pelo recorrente, razão pela qual, em caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela 1.ª Instância.

Isto posto, passemos a apreciar os concretos pontos da matéria de facto que o recorrente considera terem sido indevidamente julgados.

1.1. Se deve ser alterada a matéria de facto constante do ponto n.º 10, alínea a) (conclusões 3 a 13): Com recurso a uma Retroescavadora, foram arrancados os toqueiros dos pinheiros que haviam sido cortados quando a aquisição do prédio tendo o Autor procedido ao pagamento de 950,00 por tal serviço.

O tribunal a quo deu como provado que “Com recurso a uma Retroescavadora, foram arrancados os toqueiros dos pinheiros que haviam sido cortados quanto à aquisição do prédio. – artigo 18º, alínea a) do artigo 18º da petição inicial”.

Mas deu como não provado que “O Autor procedeu ao pagamento de €950,00”.

Entende o recorrente que a modificação deste ponto de facto assenta no relatório pericial e nos excertos dos depoimentos por si indicados prestados pelo autor, AA, e pelas testemunhas II, JJ, KK, e LL.

Apreciando.

Relativamente ao relatório pericial, o mesmo esclarece, apenas que “partindo do princípio que é exato que uma retroescavadora arrancou os toqueiros dos pinheiros que no prédio haviam sido cortados qual o valor provável do respetivo custo” e “tendo como referência o já referido acima, nomeadamente densidade ocupacional, povoamento, cobertura vegetal, DAP das espécies, localização, condições de execução e todos os outros fatores elegíveis, estima-se o seguinte custo – Total: €1.056,00” (sic).

Por seu turno, apenas o autor, confirmou o custo do serviço realizado.

Concretamente, esclareceu que o terreno era um “monte com muita inclinação” com um pinhal. Após a aquisição (pela filha, em 2008), o autor procedeu ao corte e venda de todos os pinheiros e para preparar o terreno para cultivo (uma “pequena quintita”), disse que foi necessário arrancar os toqueiros (tocos) que ficaram e que estavam a estorvar, tendo o serviço sido realizado por uma retroescavadora.

Questionado sobre o valor, o autor afirmou que a máquina andou lá mais ou menos 3 dias, mas não sabia ao certo o valor despendido tendo dito que foi “1000 e poucos euros”, desconhecendo os números exactos. Rectificou o valor apenas por intervenção do ilustre mandatário dizendo que era à beira de “1000, € 950, seria isso”.

Ouvida toda a prova regista-se que algumas das testemunhas confirmaram o uso de máquinas e a sua necessidade para nivelar o terreno inclinado:

II abordou a questão da retroescavadora – embora tenha dito que não foi o operador dessa máquina – e do trabalho no terreno, mas não confirmou, nem fez qualquer menção quanto ao serviço de arranque dos toqueiros dos pinheiros nem ao pagamento de € 950,00 por essa tarefa, centrando o seu testemunho na venda da terra.

JJ confirmou a necessidade de arrancar os toqueiros porque o terreno tinha uma inclinação bastante acentuada e era necessário nivelá-lo. Também referiu ter visto o uso de máquinas no local. Corroborou que o terreno era um pinhal e a madeira foi deitada abaixo e os toqueiros tiveram que ser arrancados para fazer uma horta.

KK atestou que o terreno era muito desnivelado e que o autor teria pago os trabalhos de uma retroescavadora para arrancar os toqueiros, pois havia os tocos dos pinheiros e era necessário tirá-los para o terreno ser cultivado.

LL não prestou informações sobre a utilização de uma retroescavadora para arrancar os toqueiros dos pinheiros, nem sobre o alegado pagamento de € 950,00 por esse serviço, tendo-se focado na compra da madeira e confirmado o estado inicial do terreno.

NN, tractorista, mencionou que o terreno tinha um “elevado grau com inclinação” e que agora já não tem porque as máquinas o terraplanaram, tendo visto uma retroescavadora no local e uma máquina giratória, confirmando a necessidade de arrancar os tocos.

MM confirmou que o terreno era completamente inclinado e que andou lá uma retroescavadora e “mais outras maquinetas”.

Em resumo, as testemunhas indicadas confirmaram que foi utilizada uma retroescavadora (ou outras máquinas) para arrancar os toqueiros no terreno recém-adquirido e cortado, mas apenas o autor alegou ter pago cerca de € 950,00 por este serviço, inexistindo qualquer outra prova que corrobore esse gasto, mormente de ordem documental (v.g. factura/recibo).

Conforme assinalou o tribunal a quo de forma certeira: “Alegou o Autor que realizou o pagamento de uma retroescavadora para arrancar os toqueiros dos pinheiros que haviam sido cortados quanto à aquisição do prédio, no valor de €950,00: Porém, da prova produzida ou da prova junta não resulta que o Autor tenha pago por tal serviço nem quanto; não tendo sido junto qualquer documentação de onde pudesse resultar comprovada a prestação de tal serviço, como um orçamento, uma fatura e/ou recebido, sendo que acerca da retirada dos toqueiros se referiu a testemunha OO, de forma bastante vaga e imprecisa, declarando que o Autor teve que tirar os toqueiros e questionado quanto tempo lá terá andado a máquina, declarou não saber; tal como declarou a testemunha KK, que declarou que o Autor teve que tirar os tocos, mas não declarou não saber o custo. Cremos que a prova de tal matéria impunha outros meios de prova usuais neste tipo de factualidade e de acordo com as normas comerciais que a prestação de serviço impõe, bem como, se possível, a inquirição do alegado prestador do serviço.

Cremos que não poderá restar dúvida de que, procedendo ao corte dos pinheiros, e uma vez que o Autor destinou uma parte do prédio para realizar um pequeno quintal, os toqueiros dos pinheiros terão sido removidos, mas nada mais nada resultou da prova junta aos autos e da prova realizada, ou seja, que tal remoção tenha sido onerosa, e em que medida e se foi suportada pelo Autor, razão pela qual o tribunal deu como não provada os factos alegados no artigo 18º, alínea a) da petição inicial” (sic).

Inexiste, assim, qualquer motivo que justifique a alteração da redacção conferida a este ponto da matéria de facto.

1.2. Se deve ser alterada a matéria de facto constante do ponto n.º 10, alíneas b), c) e d), e se o facto não provado respeitante ao artigo 18.º, alínea d), da petição inicial deve passar a constar dos factos provados (conclusões 14 a 27):

O tribunal a quo deu como provado que:

b) Foi nivelado o terreno com terra transportada. - alínea b) do artigo 18º da petição inicial;

c) E com um catrapiler de rastos, para arrastar e nivelar as terras. - alínea c) do artigo 18º da petição inicial;

d) E com uma máquina giratória para efetuar 4 socalcos no terreno. - alínea e) do artigo 18º da petição inicial.

Mas deu como não provado que:

Artigo 18º, alínea b) parcialmente (… com algumas centenas de camiões …com um custo não inferior a €10.000,00, tratava-se de camiões de 10 toneladas);

Artigo 18º, alínea c) parcialmente (Arrendamento … durante 15 dias … tendo sido pago o valor de €5.000,001).

Artigo 18º, alínea d) (Pagou ao Sr. II, cerca de 40 camiões de terra, para nivelamento dos terrenos, camiões esses de 10 toneladas, tendo pago cerca de €6.000,00).

Na perspectiva do recorrente a modificação destes pontos de facto assenta, desde logo, no testemunho de II, bem como nas declarações de parte do autor, AA, e nos depoimentos das testemunhas MM e NN.

Pretende, assim, que se dê como provado:

Ponto n.º 10

b) Foi nivelado o terreno com terra transportada por camiões, tratando-se de camiões de 10 toneladas, com um custo não inferior a €10.000,00 (dez mil euros), pago pelo Autor;

c) Com um catrapiler de rastos, para arrastar e nivelar as terras tendo sido pago pelo Autor o valor de €5.000,00 (cinco mil euros);

d) E com uma máquina giratória para efetuar 4 socalcos no terreno tendo sido pago pelo Autor o valor de €1.000,00 (mil euros)”,

Artigo 18.º, alínea d), da petição inicial: Pagou o Autor ao Sr. II, cerca de 40 camiões de terra, para nivelamento dos terrenos, camiões esses de 10 toneladas, tendo pago cerca de €6.000,00 (seis mil euros).

Apreciando.

Expendeu o tribunal a quo a este propósito:

“Quanto ao nivelamento do terreno:

As partes também não se encontram divididas que se o Autor procedeu à alteração da morfologia do terreno e para isso basta atentar na realidade objetivada nas fotografias juntas com o relatório pericial e com a petição inicial – vide documento 10.

E acerca desta matéria, o relatório pericial pronunciou-se na resposta ao quesito 2 dos Autores, nos seguintes termos:

Atualmente o prédio apresenta uma morfologia organizada por patamares e taludes; do levantamento topográfico realizado, concluiu-se que a superfície com a área de 1.558,00 m2 apresenta sinais de modelação topográfica, e que esta área integra 4 patamares limitados por taludes e muros e que a restante superfície não manifesta sinais de alteração topográfica.

A referida modelação apresenta um volume de escavação de 464,09 m3 e um volume de aterro de 1.753,01 m3, tendo o senhor perito concluído por um custo total de €3 527,15 por conta de transportes de terras, acomodação de terras e adaptação do solo, com retroescavadora e escavadora giratória de rastos.

Porém, da prova produzida nada resultou quanto ao pagamento de qualquer montante e qual o montante, impondo-se quanto a esta matéria as mesmas considerações acima referidas a propósito da limpeza dos toqueiros deixados após o corte de pinheiros. Não se mostra junto uma fatura, um recibo, nem tao pouco foram apresentadas testemunhas com conhecimento direto ou com intervenção acerca desta matéria, antes tendo sido prestadas declarações pelas testemunhas OO e MM, os quais apenas declararam que o Auto teve que nivelar o terreno, desconhecendo qual o valor despendido e por quanto tempo andaram no terreno as máquinas para esse efeito, pelo que o tribunal deu tal matéria deu como provado que o terreno foi nivelado com terra que necessariamente teve que ser trazida de outro lugar, mas não formou nenhuma convicção acerca do custo e quantidade alegadas no artigo 18º alínea b) e c) da petição inicial; e o mesmo se diga quanto ao alegado na alínea e) do mesmo artigo: não foi feita qualquer prova de que o Autor tenha pago uma máquina giratória no montante de €1.000,00, sendo que do relatório pericial resulta apenas a existência de 4 patamares e não de cinco como alegado, pelo que a resposta ao alegado teve essa retificação de acordo com a instrução da causa.

No que concerne ao pagamento da terra (preta) para nivelar o terreno:

Declarou a testemunha PP que vendeu cerca de 40 caimões de terra preta, para o Autor colocar no prédio para este ficar cultivável e que o Autor lhe pagou o montante de €6.000,00.

Ora, tal valor mostra-se completamente desproporcional como o valor estimado na perícia – vide resposta ao quesito 2 dos Autores, na qual foi estimado um valor de €2.607,15 para transporte de terras e em maior quantidade; pelo que o tribunal não criou a convicção de que esta testemunha tenha prestado declarações verdadeiras quanto ao valor por si declarado, tanto que o Autor não juntou qualquer documento do qual pudesse resultar esta materialidade, pelo que o tribunal deu como não provado que o Autor pagou ao Sr. II, cerca de 40 camiões de terra, para nivelamento dos terrenos, camiões esses de 10 toneladas, tendo pago cerca de € 6.000,00.

Vejamos.

Da audição integral da prova, não há dúvidas que o terreno foi nivelado com terra transportada por camiões. Porém, como salientado na sentença recorrida, nada se apurou sobre o invocado valor de € 10 000,00 alegadamente pago pelo autor, o que resulta da análise conjugada dos depoimentos do autor e das testemunhas. Na verdade, o custo total de € 10 000,00 é uma mera estimativa do autor para a totalidade do movimento de máquinas e terra, sem qualquer suporte adicional e as declarações prestadas pelo autor, nesse conspecto, não se encontram minimamente corroboradas por outros elementos de prova.

É certo que sobre a questão do nivelamento e da terra transportada ficou provado que o terreno era um monte com muita inclinação e que a sua aptidão natural era para pinhal e que para o nivelar foi colocada muita terra e empregues camiões; assim, II confirmou ter vendido e transportado cerca de 40 camiões de terra preta (terra de cultivo) e que os camiões levavam cerca de 10 m³ (metros cúbicos) de cada vez; MM confirmou a realização dos trabalhos de movimentação de terras e a utilização de máquinas de grande porte no terreno, embora não soubesse precisar os valores monetários alegados pelo autor, desconhecendo os valores ou a quantidade de terra transportada; NN considerou que 10 toneladas “não é nada” para o desnível do terreno e afirmou que o aterro deve ter levado mais de 100 toneladas de terra, concordando que 40 camiões é uma estimativa razoável; KK confirmou ter visto descarregar muita camioneta de terra e que andaram máquinas a nivelar o terreno, e JJ também deu conta de que houve necessidade de nivelar o terreno através de muros de suporte e encher a área para fazer socalcos, referindo que levou muito aterro.

Aliás, no relatório pericial enfatiza-se que “o prédio apresenta uma morfologia organizada por patamares e taludes” e que “do levantamento topográfico realizado conclui-se que a superfície com a área de 1558 m2 apresenta sinais de modelação topográfica” e “integra 4 patamares limitados por taludes e muros” (p. 14).

Sem prejuízo, no que tange especificamente aos gastos realizados apenas foi o autor quem afirmou que entre as máquinas e a terra, gastou “à beira de € 10 000,00”, do que resulta que esse valor englobaria o fornecimento da terra e os custos associados ao movimento das máquinas (caterpillar, retroescavadora, etc.).

Na verdade, inexiste qualquer meio probatório, mormente de ordem documental, que corrobore aquele gasto, não sendo plausível que não fosse emitida qualquer factura a documentar gastos tão significativos.

Nada há a assinalar, assim, relativamente à decisão deste ponto de facto.

De igual modo, relativamente à utilização de um caterpillar de rastos, para arrastar e nivelar as terras tendo sido pago o valor de € 5 000,00 (cinco mil euros), uma vez mais, apenas o autor declarou que, após a terra ficar no local, andou lá, durante cerca de 4 ou 5 dias, um caterpillar de rastos para arrastar a terra para o fundo e nivelar, tendo pago por esse serviço “à beira de € 5000,00”.

Na verdade, as testemunhas NN, JJ – que mencionou que era necessário arrastar a terra para baixo, já que o terreno não tinha acesso directo à estrada e os camiões descarregavam em cima – e KK apenas confirmaram ter visto um caterpillar no local, desconhecendo qualquer valor resultante da sua utilização.

Identicamente, no que se refere à utilização de uma máquina giratória para efectuar 4 socalcos no terreno, apenas o autor indicou ter pago “à beira de € 1000” para fazer os socalcos.

As testemunhas e o perito confirmaram que o terreno foi modelado em patamares ou socalcos (também chamados de calços) para permitir o cultivo, dado que o terreno era acidentado e inclinado; especificamente: MM afirmou que questionou o autor sobre o gasto com a máquina giratória, referindo-se a “cinco socalcos que lá estão”; NN confirmou ter visto uma máquina giratória no local; JJ confirmou que foram feitos muros de corte e depois teve que se encher para fazer socalcos (calços), embora não pudesse confirmar o gasto específico; KK também confirmou que andou máquina giratória no local; apenas a testemunha II, sobre o valor, referiu que € 1000 em despesas com uma máquina giratória é um custo plausível, embora desconhecesse, em concreto, se o autor pagou essa quantia.

Importa salientar que pese embora o autor tenha realizado os socalcos para cultivo, o perito concluiu que a área cultivada (cerca de 289 m²) tem uma produção reduzida e desprezível e que essa utilização é mais um prolongamento do quintal da habitação adjacente, não sendo a utilização mais adequada nem rentável para o prédio como superfície autónoma.

Destarte, não há qualquer prova dos gastos realizados com os serviços do caterpillar e da máquina giratória.

Por fim, já quanto à alegação de que o autor pagou cerca de € 6000,00 a II, relativamente a 40 camiões de terra para nivelamento dos terrenos, além do próprio autor ter afirmado que realizou o pagamento desse valor contratando II para o serviço, essa testemunha (II) corroborou, sem vacilar, que o autor lhe pagou € 6000,00 pelos 40 camiões de terra e que esse pagamento foi feito em dinheiro, por duas ou três vezes, não tendo, porém, passado factura, nem emitido qualquer recibo.

Nesta parte e pese embora o senhor perito tenha estimado um valor inferior para o transporte de terras – € 2607,15 –, consideramos que há prova suficiente desse facto.

Na realidade, a quantidade de 40 camiões de terra preta foi confirmada tanto pelo autor quanto pelo fornecedor, II: o autor disse que foi “à beira de 40 camiões de terra preta” porque a terra existente era “fraca” e a terra preta (terra de cultivo) era necessária porque a sua esposa gostava de agricultura; por sua vez, a testemunha II, confirmou que “vendi-lhe umas carradas de terra” e que o total “devia ser mais ou menos isso” em referência aos 40 camiões de terra. Por fim, a testemunha NN concordou que a estimativa de 40 camiões era razoável, pois o terreno levou “muita terra, muitos camiões”.

Ou seja, relativamente ao facto em apreço, o mesmo, além das declarações de parte, tem suporte na prova testemunhal, especificamente nos testemunhos de II e NN, sendo certo que não estando provado que o contrato de serviços de fornecimento de terra tenha sido reduzido a escrito é admissível a produção de prova testemunhal para fazer prova do pagamento pela prestação daquele serviço, podendo quanto a essa matéria o tribunal valorar livremente os depoimentos prestados, que se revelaram consistentes e sustentados – cf., em idêntico sentido, Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa, de 16-10-2008, Proc. n.º 6239/08-2, e do Tribunal da Relação do Porto, de 06-06-2024, Proc. n.º 197/22.9T8PVZ.P1.[2]

Nesta consonância, em face da análise probatória por nós empreendida, mantém-se a redacção do ponto de facto n.º 10, alíneas b), c) e d), mas dá-se por provado o facto alegado no artigo 18.º, alínea d), da petição inicial, que passa a ser o ponto de facto n.º 10, alínea l) com a seguinte redacção:

Para nivelamento dos terrenos, o autor pagou a II, por 40 camiões de terra, € 6000,00 (seis mil euros).

1.3. Se deve ser alterada a matéria de facto constante do ponto n.º 10, alíneas e), f), g) e h) (conclusões 28 a 33):

O tribunal a quo deu como provado:

“e) Execução de 2 muros em betão e um tanque para reservatório de água. - alínea f) do artigo 18º da petição inicial;

f) O muro é constituído por dois troços: Troço 1, com o comprimento 10,00 metros e uma altura de 1,10 metros; Troço 2, com o comprimento de 18,70 metros e uma altura de 3,10 metros e são constituídos em betão armado. Tem uma sapata. - alínea f 1) do artigo 18º da petição inicial, com o teor dos esclarecimentos prestados pelo senhor perito.

g) As paredes do tanque têm uma espessura de 25 cm, tem largura de 2,60 metros e comprimento de 4,80m2 e tem uma altura de 1,10 metros. É constituído em ferro, cimento, areia. - alínea f) 2 do artigo 18º da petição inicial; com o teor dos esclarecimentos prestados pelo senhor perito.

h) Foi erguido um muro de blocos em cima do muro de betão. - alínea g) do artigo 18º da petição inicial”

Mas deu como não provado:

Artigo 18º, alínea e) parcialmente (Pagamento … tendo pago €1.000,002).

Artigo 18, alínea f) parcialmente (… para o que foram contratados 4 homens ao dia, e sendo pago ferro, areia, cimento e gravilha e o respetivo transporte, tendo nisso despendido pelo menos €30.000,00);

Artigo 18º, alínea f 1 parcialmente (…e pedra de granito… de 1.5 metros para cada lado e uma profundidade de 0,5 metros).

Artigo 18º, alínea f) 2 parcialmente (…e pedra de granito).

Artigo 18º, alínea g) parcialmente (… despendendo €1.500,00);

Na óptica do recorrente a modificação destes pontos de facto alicerça-se nas suas declarações de parte, e nos testemunhos prestados por JJ, NN, e KK.

Pretende assim, que se dê como provada a seguinte factualidade:

e) Execução de 2 muros em betão e um tanque para reservatório de água tendo, para o efeito, o Autor contratado 4 homens ao dia, e sendo pago ferro, areia, cimento, gravilha e o respetivo transporte, tendo nisso despendido pelo menos € 30.000,00 (trinta mil euros).

f) O muro é constituído por dois troços: Troço I, com o comprimento 10,00 metros e uma altura de 1,10 metros; Troço 2, com o comprimento de 18,70 metros e uma altura de 3,10 metros e são constituídos em betão armado e pedra de granito. Tem uma sapata de 1,5 metros para cada lado e uma profundidade de 0,5 metros.

g) As paredes do tanque têm uma espessura de 25 cm, tem largura de 2,60 metros e comprimento de 4,80 m2 e tem uma altura de 1,10 metros. É constituído em ferro, cimento, areia e pedra de granito.

h) Foi erguido um muro de blocos em cima do muro de betão tendo o Autor despendido a quantia de €1.500,00 (mil e quinhentos euros).

Apreciando.

Neste conspecto, o tribunal a quo explanou que:

Quanto à construção do muro e reservatório de água:

O mesmo reparo acerca da falta de prova quanto ao pagamento vale quanto a esta matéria, pois que não foi junta qualquer prova documental de que o Autor tenha pago o alegado montante de €30.000,00, valor que se apresenta manifestamente exagerado em face do valor resultante da perícia – vide resposta ao quesito 6 dos Autores, na qual o senhor perito, fazendo uma descrição exaustiva de tais construções, concluiu que as mesmas tinham um custo total de execução de €8.224,00 (valor sem estar incluída a tava de IVA).

Quanto às características do muro, o tribunal considerou a descrição constante do relatório pericial e dos esclarecimentos solicitados pelo Autor à resposta dada ao quesito 7º (vide relatório pericial complementar junto aos autos a 8 de abril de 2024, que faz fls. 190) não existindo qualquer referencia a pedra de granito, nem resultou as medidas e profundidas das sapatas, sendo manifestamente frágeis as declarações, acerca desta matéria, prestadas pela testemunha NN, o qual declarou ter visto construir as sapatas, tentado fazer crer que sabia as suas extas medidas, sem que, contudo, o tribunal tenha acreditado nestas declarações, também elas genéricas e vagas;

Do relatório pericial e dos seus esclarecimentos resulta que o tanque tem 1,10 metros de altura ao invés dos alegados 2,20, uma espessura das paredes de 25 cm, com um cumprimento de 4,80m2 e largura de 3,60 metros não feita qual referencia à existência de pedra de granito.

Do relatório pericial resulta que o muro de betão encontra-se encimado com 4 fiadas de bloco no troço de maior extensão, e que o custo estimado de construção é de €216,00 (sem IVA), pelo que o montante alegado na alínea g) do artigo 18º da petição inicial mostra-se para além de excessivo não encontra qualquer respaldo na prova junta e na prova produzida, razões pelas quais, o tribunal deu como não provado o alegado custo.

Dilucidando.

Da audição integral da prova, emerge, uma vez mais, que só o autor elencou, de forma muito pouco sustentada e mesmo pouco credível, os valores alegadamente despendidos antes enunciados. Concretamente, o autor estimou que as obras dos muros e do tanque “ficaram um bocado caro” e disse que a sua mulher lhe deu € 30 000,00 “por duas, três vezes deu-me € 10 000,00, o resto paguei eu”.

No mais, nenhuma testemunha corroborou esse ou qual outro dos valores indicados. Com efeito, os depoimentos de JJ, NN e KK apenas confirmaram a execução dos muros em betão e do tanque reservatório de água, confirmando a dimensão e a robustez necessárias devido à inclinação do terreno. Mas, nenhuma das testemunhas atestou os valores de despesas – €30.000,00 ou € 1500,00 – avançados pelo autor.

Detalhando:

JJ confirmou ter conhecimento dos trabalhos, realçando a necessidade das estruturas para transformar o pinhal em terreno agrícola, confirmando a existência de muros e tanque, este destinado a armazenar a água que vinha de uma mina acima, ligada à antiga fábrica de serração do pai do autor. Enfatizou que os muros tinham que ser resistentes e não se comparavam a um muro de vedação, explicando que tinham que ter uma sapata em cimento. Porém, não mencionou o muro de blocos nem os valores específicos de € 30 000,00 ou € 1500,00.

NN confirmou ter visto grandes obras de construção e terraplanagem no local, descrevendo um muro “enorme” e resistente, essencial para suportar o aterro do terreno inclinado, estimando o seu comprimento em “à volta de 20 metros”, com “3 metros de altura” e “meio metro enterrado com 1,5 de sapata”, referindo que presenciou a obra e viu a sapata e a sua resistência. Confirmou, ainda, a existência de um tanque em betão com “2 metros e tal de altura”, estimando as suas dimensões em “aproximadamente 4 por 4 metros”.

Não fez referência ao muro de blocos erguido em cima do muro de betão, nem ao custo de € 1500,00 e não soube calcular os custos, dizendo ser “difícil o calcular”.

KK confirmou ter presenciado as obras, confirmando que existia um muro bastante alto e um tanque e que viu os homens a trabalhar nessas construções.

Descreveu o muro como “robusto” e com uma “sapata a bastante larga”, com cerca de “20 a 30 cm de largura” e confirmou que o tanque era para armazenar a água canalizada que vinha da mina/fábrica do pai do autor.

Não confirmou a construção de um muro de blocos por cima, nem soube precisar os custos, afirmando que “Isso aí só o senhor AA é que pode dizer. Eu não, eu não” (sic).

Em suma, nenhumas das testemunhas confirmou qualquer valor, seja a título de € 30 000,00 gastos na execução do muro, seja, muito menos, sobre o valor de € 1500,00 reportado ao muro de blocos ou valor do tanque.

Não obstante, no relatório pericial calculou-se, de forma tecnicamente sustentada, que o valor de execução do muro terá orçado em € 7282,00 e o tanque em € 942, totalizando o valor de € 8224,00 (sem IVA), e o senhor perito, nos seus esclarecimentos em sede de audiência final, confirmou um custo na ordem dos € 8200,00.

Ademais, o IVA não tem de ser atendido porquanto não houve emissão de qualquer factura.

Em conformidade, mantém-se, na íntegra, a redacção do ponto de facto n.º 10, alíneas f), g) e h) e altera-se a redacção do ponto de facto n.º 10, alínea e), nos seguintes termos:

Execução de 2 muros em betão e um tanque para reservatório de água, nos valores de € 7282,00 e de € 942,00, respectivamente, totalizando € 8224,00

1.4. Se os factos não provados respeitantes ao artigo 18.º, alíneas h), n) e o), da petição inicial devem passar a constar dos factos provados (conclusões 34 a 37):

Para o recorrente a modificação destes pontos de facto extrai-se das declarações de parte e dos testemunhos de II, JJ, MM, KK e NN, devendo-se dar-se como provado que:

- Foi construído um sistema de esgoto para a água da chuva, pelo Autor, em virtude do terreno ser muito inclinado tendo despendido em tubos, cimento, sargetas e mão de obra €1.700,00;

- O autor gastou, em tubos e mão de obra para a instalação da rota de transporte de água para o terreno, o valor de €2.500,00;

- O Autor despendeu em cubos de granito para melhor acesso à Estrada Nacional o valor de €500,00.

Apreciando.

O tribunal a quo enfrentou a questão como segue:

Quanto à alegada construção de um sistema de esgotos:

Tal matéria não teve qualquer respaldo na prova pré-constituída nem na prova produzida, nomeadamente no Relatório pericial: vide resposta ao quesito 12 do Autor: tendo o senhor perito respondido que não se verificaram trabalhos relacionados com esta matéria. (…)

Quanto à existência dos alegados tubos para instalação de uma rota de transporte de água, no montante de €2.500,00 e se o Autor despendeu em cubos de granito para melhor acesso à Estrada Nacional, €500,00.

Do teor do relatório pericial, e da resposta ao quesito 18 e 19 do Autor, o senhor perito declarou que “não se verificaram trabalhos relacionados com esta rubrica”, não tendo sido qualquer prova acerca da existência destes factos, nem da quantia e do pagamento, pelo que tal matéria teve assento nos factos provados.

Aquilatando.

Da audição integral da prova regista-se que nenhuma das testemunhas II, JJ, MM, KK e NN confirmaram os valores monetários de € 1700,00, € 2500,00 ou € 500,00, alegados pelo autor.

Especificamente sobre a criação de um sistema de esgoto, todas as testemunhas foram muito evasivas: NN ao ser questionado sobre o sistema de esgoto, não foi capaz de confirmar a sua edificação apenas referindo que “Sim. Para botar a água da chuva” (?); JJ também foi evasivo na sua resposta e disse que sim e “que servia para a água da chuva ser conduzida”; porém, II, MM e KK nada disseram a propósito de qualquer sistema de esgoto da água da chuva.

O mesmo se diga quanto à instalação da rota de transporte de água para o terreno, em que as testemunhas apenas referiram a que a água era canalizada para o terreno, não tendo concretizado qualquer valor.

Finalmente no que concerne aos cubos de granito apenas JJ disse que viu os materiais: “para melhorar a estrada”, sendo certo que o próprio autor asseverou que não os tinha colocado no momento do depoimento.

Com efeito, só o autor disse, de forma pouco densificada, ter gasto “à beira de 2000 e poucos euros” em tubos e mão de obra para a instalação da água e ter comprado “à beira de 500 € de cubos” que “ainda lá estão no terreno”.

De resto, a prova pericial foi claríssima ao afirmar que não se verificam quaisquer trabalhos relacionados com a construção de um sistema de esgoto ou colocação de tubos, cimento e sarjetas, o que desqualifica aquelas declarações de parte e testemunhais.

Em sintonia, julga-se improcedente a pretensão do recorrente de dar como provados os factos respeitantes ao artigo 18.º, alíneas h), n) e o) da petição inicial.

1.5. Se deve ser dada como provada e aditada à matéria de facto do ponto 10 dos factos provados, nomeadamente às alíneas i), j) e k) (conclusões 38 a 44), a seguinte factualidade:

O tribunal a quo deu como provado, apenas:

i) Tornou cultivável com horta, uma parte do prédio (área de 292 m2). - alínea i) do artigo 18º da petição inicial e relatório pericial, nos termos do disposto no artigo 5º, n.º 2 alínea b) do Código de Processo Civil.

j) Fez uma ramada em ferro e arame. - alínea l) do artigo 18º da petição inicial;

k) Plantou diversas árvores fruteiras, nomeadamente para produzir kiwis, limoeiros, diospireiros. - alínea m) do artigo 18º da petição inicial;

Mas deu como não provado:

Artigo 18º, alínea i) parcialmente (…adquiriu 20 carradas de estrume caseiro gastando €800,00.)

Artigo 18º, alínea j) (Pagou a um trator para lavrar os socalcos €100,00);

Artigo 18º, alínea l) parcialmente (… despendendo €750,00);

Pugna o recorrente pela modificação destes pontos de facto atentas as declarações de parte e os testemunhos de AA, II, JJ e NN.

De harmonia, sustenta que deve dar-se por provado:

- O Autor tornou cultivável com horta, uma parte do prédio, adquiriu 20 carradas de estrume caseiro gastando €800,00;

- Fez uma ramada em ferro e arame despendendo €750,00;

- Plantou diversas árvores fruteiras, nomeadamente para produzir kiwis, marmeleiros, diospireiros, castanheiros, ameixoeiras e pinheiros mansos, despendendo €600,00

- O Autor pagou a um trator para lavrar os socalcos o valor de €100,00

Sobre esta matéria o tribunal a quo referiu:

“Quanto à parte cultivável:

Entre as partes não se mostra controvertido que o Autor, numa pequena área, que o senhor perito mediu em 289,00 m2, ocupou com uma horta, porém, a prova acerca das quantidades de estrume caseiro e qual o seu custo é que se revelou frágil e nos termos que temos vindos a expor; sendo manifestamente perene as declarações prestadas pela testemunha NN, que declarou ter levado 3 carradas de estrume tendo cobrado 100 euros por cada uma, sem qualquer junção de uma prova documental a suportar tais declarações; Acresce que o senhor perito na resposta ao quesito 12 do Autor fez constar que ”não se verificam sinais relacionados com a incorporação de estrume ou outro fertilizantes”.

Quanto aos factos alegados no artigo 18º, alínea j) da petição inicial, não existe qualquer respaldo na prova que se analisa que o Auto pagou a um trator para lavrar os socalcos €100,00), sendo que resulta do relatório pericial à resposta dada ao quesito 15º que “os socalcos encontram-se revestidos com coberto de vegetal espontâneo e rasteiro. Não se verificam sinais relacionados com a prática de lavragem”.

Quanto aos factos alegados no artigo 18º alínea l) da petição inicial, resulta do relatório pericial que existe uma ramada composta por 6 perfis de aço em T 50x30 e guias de arame, vulgarmente chamada de ramada, pelo que o tribunal considerou provado que a mesma existe.

Porém quanto ao mais alegado, pagamento da quantia de €750,00 pelo Autor, não se fez qualquer prova do pagamento nem tão pouco da quantia alegada.

Quanto às árvores que se encontram plantadas na área destinada a horta:

O tribunal valorizou o teor do relatório pericial, quanto à resposta ao quesito 17, da qual resulta a descrição das árvores plantadas e que tiveram respaldo nos factos provados e as demais alegadas não foi realizada qualquer prova de que existam no prédio; quanto ao valor, o senhor perito estimou o valor das árvores que observou no prédio em €250,00, sendo que o Autor não logrou fazer qualquer prova de que comprou tais árvores e que pagou por elas o alegado montante de €600,00, pelo que tal factualidade teve assento nos factos não provados”.

Vejamos.

O autor disse que transformou o pinhal numa pequena “quintita”, referindo que a sua falecida esposa gostava muito da agricultura e por isso fez as obras. Confirmou que comprou estrume, que “foram lá levar”, e embora não se recordasse do preço exacto por carga – referiu, com dúvidas, cerca de € 40,00 por carga – adiantou que “é capaz” de ter gasto cerca de € 800,00 em estrume caseiro.

A testemunha NN confirmou ter levado estrume do gado (esterco do gado) ao terreno, no tractor, para o cultivar e que cada carrada custou € 100,00 totalizando € 300,00. Distinguiu que o estrume que levou era de gado, não de aviário, mas admitiu a possibilidade de terem sido colocadas mais carradas de estrume, concordando que o terreno precisava dele para as plantações de legumes, indicando a grande necessidade de material para o aterro e cultivo.

II, pese embora tenha vendido e transportado terra preta (terra de cultivo) para o terreno para o nivelar, afirmou que não levou estrume para lá.

JJ confirmou que o terreno foi transformado em terreno agrícola e que era necessário colocar estrume caseiro ou estrume de aviário para que a terra produzisse.

Atendendo à divergência dos depoimentos do autor e da testemunha NN considera-se que o tribunal a quo ajuizou bem este facto, sendo certo que o senhor perito fez constar do relatório que “não se verificam sinais relacionados com a incorporação de estrume ou outros fertilizantes”.

Relativamente ao dispêndio de € 750,00 numa ramada em ferro e arame por parte do autor, o mesmo confirmou que gastou “para aí 500 ou € 600 €” com a ramada onde tem o cultivo de kiwis. Por sua vez, a testemunha JJ deu conta de lá ter visto uma ramada em ferro e arame. Não há, assim, qualquer prova consistente do pagamento da quantia de € 750,00 pelo autor.

Todavia, conforme consta do relatório pericial, “na face do muro acima referido, encontra-se fixada uma ramada composta por 6 perfis de aço em T 50x30 e guias de arame”, com um “custo estimado de construção de € 600” (p. 20).

Relativamente à alegação da plantação de diversas árvores fruteiras, nomeadamente para produzir kiwis, marmeleiros, diospireiros, castanheiros, ameixoeiras e pinheiros mansos, despendendo € 600,00, o autor declarou que a sua mulher andava sempre a plantar árvores de fruto, referindo especificamente limoeiros, marmeleiros, castanheiros e pinheiros mansos e que a horta também tinha kiwis e que foi a sua mulher quem procedeu àquela plantação.

II confirmou ter visto diversas árvores fruteiras no terreno, como limoeiros, castanheiros, ameixeiras, tendo também mencionado a presença de pinheiros mansos. JJ lembrava-se de ter visto limoeiros, diospireiros e kiwis plantados. NN disse que o terreno estava “em início de plantações” e que viu lá kiwis e árvores. Nenhum destes confirmou o valor de € 600,00 gasto nas plantações.

Ademais, quanto à alegação de que o autor pagou o valor de € 100,00 para um tractor lavrar os socalcos, também não existe qualquer prova.

Desde logo, o autor asseverou que mandou lavrar os socalcos mas nada disse sobre o pagamento do valor de € 100,00 para este serviço no seu depoimento.

NN, tractorista, apenas aludiu ao transporte de estrume ao terreno, em três carradas, mas não confirmou ter lavrado os socalcos por € 100, enquanto que II e QQ não fizeram quaisquer declarações sobre esse assunto.

Em conformidade, mantém-se, na íntegra, a redacção do ponto de facto n.º 10, alíneas i) e k), e altera-se a redacção do ponto de facto n.º 10, alínea j), que passa a ser:

 Fez uma ramada em ferro e arame no valor de € 600,00 (seiscentos euros).


*

            Em resumo, relativamente à matéria de facto impugnada, mantêm-se na totalidade as respostas da 1.ª Instância, aditando-se/modificando-se, os seguintes pontos de facto da matéria provada (pela devida ordem):

N.º 10, alínea e) - Execução de 2 muros em betão e um tanque para reservatório de água, nos valores de € 7282,00 (sete mil duzentos e oitenta e dois euros) e de € 942,00 (novecentos e quarenta e dois euros), respectivamente, totalizando € 8224,00 (oito mil duzentos e vinte e quatro euros).

N.º 10, alínea j) - Fez uma ramada em ferro e arame no valor de € 600,00 (seiscentos euros).

N.º 10, alínea l) - Para nivelamento dos terrenos, o autor pagou a II, por 40 camiões de terra de 10 toneladas, € 6000,00 (seis mil euros).


*

            2. Errada apreciação jurídica da causa:

Violação dos artigos 1273.º, 216.º, n.º 3 e 473.º do Código Civil, devendo os recorridos ser condenados a pagar ao recorrente o valor de € 61 400,00 atinente às benfeitorias realizadas no prédio.

Entende o recorrente que “existiu um claro erro de julgamento no que ao direito respeita uma vez que na sentença proferida o Tribunal a quo refere que «(…) o Autor não goza do direito a receber dos Réus a quantia correspondente a qualquer enriquecimento dos Réus decorrente da realização daquelas obras levadas a cabo para alterar a aptidão florestal para hortícola daquela área do prédio rústico, pois que não logrou provar que em resultado da sua intervenção o prédio se tenha valorizado e que para além de o valorizar não pode levantar as obras» o que “constitui um claro contrassenso com o facto provado no ponto 11 constante da sentença proferida pelo Tribunal a quo, uma vez que do mesmo consta que «A remoção do muro, tanque e ramada provoca a inutilização dos materiais».”.

Sustenta, nessa medida, que foram violadas as disposições legais insertas nos artigos 216.º, n.º 3 e 1273.º do Código Civil, uma vez que o tribunal a quo ao dar como provado que a remoção do muro, tanque e ramada provoca a inutilização dos materiais, devia o recorrente ser indemnizado pelo valor daquelas benfeitorias úteis, tendo, outrossim, feito prova que o prédio foi bastante valorizado em função da sua intervenção, devendo os recorridos ser condenados a realizar o pagamento de todas as benfeitorias realizadas no valor total de € 61 400,00 (sessenta e um mil e quatrocentos euros), acrescido de juros vencidos e vincendos desde a citação até pagamento.

Contra-alegaram os recorridos, por seu turno, sustentando que o recorrente não fez prova de que as benfeitorias são úteis ou aumentaram o valor da coisa; não fez prova de que não pode levantá-las sem detrimento da coisa principal; não fez prova de cada uma delas e do valor que cada uma das despesas acrescentou à coisa e a medida do seu benefício no momento actual; não fez prova de que o dono do prédio se opõe ao levantamento das mesmas com fundamento em detrimento da coisa benfeitorizada; não fez prova de que era o possuidor da coisa principal.

Vejamos.

Na sentença recorrida, após se enquadrar a questão jurídica, expendeu-se, na parte aqui pertinente:

“No caso presente, torna-se crucial saber se a obras realizadas e implantadas no prédio constituem obras indispensáveis à conservação e normal funcionamento do prédio em que foram incorporados, como um prédio com apetência florestal, atendendo ao seu estado de conservação, aquando da celebração da escritura de compra e venda, e, se, por conseguinte, a falta de tais obras se traduziria em deteriorações do prédio em que foram incorporadas, na perspetiva dinâmica do normal aproveitamento das suas potencialidades económicas.

As obras realizadas foram, como provado, efetuadas ao longo dos anos, e destinaram-se a dotar uma área do terreno, que tem aptidão florestal, para o cultivo hortícola, com o nivelamento do terreno, com a colocação de terra com características para a agricultura, a construção de um muro de suporte de terras, de um tanque para armazenar a água para a rega, sendo que, antes e logo após a compra, foram cortados os pinheiros.

Estamos claramente no campo dos atos materiais de obras realizadas que não eram necessárias em razão da utilização que estava a ser dada, ao tempo da celebração da escritura de compra e venda, pois que à data de tal negócio jurídico, a área do prédio estava toda afetada à exploração florestal, e nem era essa a própria aptidão do prédio (que tinha aptidão florestal e não para a prática da agricultura), pelo que é, óbvio, não estamos perante obras que se destinem a evitar a perda ou deterioração do prédio - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido a 12.07.2011, no âmbito do Processo 3769/07.8TBVCD.P1.S1. 

As obras realizadas foram determinadas por razões de conveniência do Autor e da sua filha, os quais optaram reservar uma área do pinhal, e após o seu corte, para a prática de uma horta, interesse que a lei não tutela para efeitos de qualificação das benfeitorias e indemnizações do possuidor seu autor. Veja-se que, resulta da factualidade provada, que as obras realizadas visaram alterar a aptidão florestal de uma área do prédio para aptidão hortícola e para o qual, o prédio, não estava, manifestamente, predestinado ou a ser utilizado como tal, para nele ser continuada essa destinação económica, ou se se perfilasse em termos de, perante a entrega do terreno aos Réus, no âmbito da ação de preferência, os Réus, e caso tal prédio já tivesse essa afetação, se propusessem manter-lhe o mesmo destino, mantendo o terreno a ele definitivamente afetado.

Então, porque se estaria já perante uma área do terreno destinado aos fins agrícolas e o restante aos fins florestais, poderia ser de ponderar a existência de despesas de conservação indispensáveis à preservação da função e destinação económica do prédio suscetíveis de integração no conceito de benfeitorias necessárias.

Face à factualidade provada nos autos resulta manifesto que nenhuma das obras realizadas no prédio em causa serão essenciais para evitar o detrimento da coisa ou para evitar a perda de qualidades essenciais do imóvel, não podendo, por isso, merecer a qualificação como benfeitorias necessárias.

Neste enquadramento, atendendo exclusivamente à essencialidade das obras para garantir a conservação do próprio imóvel, resulta inequívoco do quadro factual enunciado nos autos que as despesas/obras não podem ser classificadas como necessárias, posto que estão fora da função conservatória que as normas dos n.º 1 e 3 do citado artigo 216º do Código Civil reservam para as benfeitorias necessárias.

Vejamos se tais benfeitorias devem ser qualificadas de úteis:

No caso presente, torna-se crucial saber se as obras implantadas no prédio constituem obras de melhoramento do funcionamento do prédio em que foram incorporados, como um prédio com apetência florestal, atendendo ao seu estado de conservação, aquando da celebração da escritura de compra e venda, no ano de 2008, e, se, por conseguinte, a realização de obras se traduziram numa maior valorização do prédio em que foram incorporadas, na perspetiva dinâmica do normal aproveitamento das suas potencialidades económicas.

Por contraposição às necessárias, as benfeitorias úteis aumentam o nível de aptidão funcional ou o nível de conforto da coisa (por confronto com o nível funcional ou conservação anterior) e, por isso, aumentam o seu valor.

As obras realizadas serão sem dúvida, fundamentais, para a persecução do fim que a filha do Autor pretendia desenvolver numa determina área do prédio.

Mas o que se pretende apreciar é se tais despesas e obras na coisa, essenciais para o fim visado pela filha do Autor, acrescentou qualquer valor ao próprio imóvel, mesmo que nele deixe de ser exercida a atividade que aí veio a ser exercida.

O aumento de valor, para efeitos de qualificação de benfeitorias úteis, se reporta ao valor objetivo ou venal da coisa, também designado de valor comum ou real, sendo que o aumento de valor subjetivo, que represente apenas ornatos ou embelezamento de modo a tornar a coisa mais aprazível, conforme as preferências do possuidor, ou mesmo vantagens particulares, ainda que de ordem patrimonial, não revelam como benfeitorias úteis mas como benfeitorias volutuárias - Manuel de Andrade, Teoria Geral da Relação Jurídica, Vol. 1º Coimbra, 1974, página 274-275.

Isto é, o que importa é saber se se trata de benfeitorias que se tornaram essenciais para a coisa (para o fim a que esta se destinou e/ou destina) ou simplesmente úteis, com critério objetivo, à margem do fim específico a que a coisa de destina ou a que, temporariamente, está afetada.

Nestas judiciosas considerações encontra-se bem refletida a ideia de que a aferição de melhoramentos em prédios desta natureza e destino económico (florestal), para efeitos de qualificação das benfeitorias, se deve pautar por critérios normativos que enquadrem a coisa benfeitorizada sob um prisma de compreensão dinâmica em torno da sua função económica, como unidade produtiva, e do inerente aproveitamento das suas potencialidades, em detrimento de uma visão meramente estruturalista ou estática com mero enfoque nas exigências de conservação do corpus predial.

Com o respeito devido pela opinião em contrário, e atento ao que vem sendo dito, não podemos concluir que as despesas feitas com as referidas obras visaram e criaram um real benefício da atividade florestal do prédio, e que no qual se encontrava plantado um frondoso pinhal, o qual não aumenta nem melhora a sua produtividade económica – vide factos não provados.

Neste contexto, as referidas despesas e obras não se traduzem em fatores que valorizem o prédio benfeitorizado, nem se revelam indispensáveis aos seu normal desempenho e aproveitamento económico, pelo que terão ser consideradas benfeitorias voluptuárias, ou seja, aquelas obras que, não sendo indispensáveis para a sua conservação nem lhe aumentado o valor, servem apenas para recreio do benfeitorizante.

Mas mesmos que assim fosse, ou seja, mesmo que se traduzissem numa valorização do prédio, sempre se trataria de benfeitorias suscetíveis de serem levantadas sem detrimento da coisa supostamente benfeitorizada (prédio rústico), o que retira ao Autor o direito a receber o valor delas (ao invés, gozaria do direito a levantar as benfeitorias).

A coisa sobre a qual haveria de se verificar o “detrimento” é um terreno com afetação florestal (pinhal), cuja a reposição, esta sim, dada a natureza da coisa, será em regra, notoriamente possível e facilmente realizável.

O reconhecimento de um crédito por benfeitorias exige, assim, a alegação e prova de factos que permitam classificar as obras como benfeitorias necessárias ou úteis, o custo de cada uma delas, o valor que as despesas acrescentaram à coisa e a medida do seu benefício no momento atual - Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra proferido a 10.02.2015, no âmbito do processo n.º 1289/12 -  prova que o Autor não logrou (nos termos do disposto no artigo 342º, nº1 do Código Civil) fazer.

A conclusão a retirar do que fica dito é que, o Autor não goza do direito a receber dos Réus a quantia correspondente a qualquer enriquecimento dos Réus decorrente da realização daquelas obras levadas a cabo para alterar a aptidão florestal para hortícola daquela área do prédio rústico, pois que não logrou provar que em resultado da sua intervenção o prédio se tenha valorizado e que para além de o valorizar não pode levantar as obras porquanto tal levamento causa prejuízo ao prédio dos Réus, o que conduz à inevitável improcedência desta pretensão indemnizatória bem como, como consequência inelutável, ao não reconhecimento de qualquer direito de retenção, o qual, sempre estaria votado ao fracasso porquanto o Autor não logrou provar que o prédio rústico ainda estivesse na posse de DD, nos termos impostos no artigo 755º do Código Civil” (sic).

Façamos, antes de mais, um breve excurso pelos dispositivos a convocar na apreciação do caso concreto.

Nos termos do artigo 216.º, n.º 1 do Código Civil, “[c]onsideram-se benfeitorias todas as despesas feitas para conservar ou melhorar a coisa”, distinguindo-se, de acordo com o n.º 2 desse preceito, as benfeitorias necessárias, úteis e voluptuárias.

Emerge do n.º 3 do normativo em causa que:

– São benfeitorias necessárias as que têm por fim evitar a perda, destruição ou deterioração da coisa;

– São benfeitorias úteis as que, não sendo indispensáveis para a sua conservação, lhe aumentam, todavia, o valor;

– São benfeitorias voluptuárias as que, não sendo indispensáveis para a sua conservação nem lhe aumentando o valor, servem apenas para recreio do benfeitorizante.

Da factualidade provada, alcança-se, além do mais, que:

– Quando a filha do autor adquiriu o prédio rústico, por escritura pública de justificação e compra e venda celebrada em 12-06-2008, este era constituído por um pinhal frondoso, com árvores com mais de 30/40 anos, tendo uma área de 2580,00 metros e tinha um valor estimado de € 7150,00 – sendo € 4343,69 o valor estimado do pinhal e € 2805,75 o valor estimado da terra nua (pontos de facto n.ºs 1 e 8).

– Após aquela aquisição, em 2008 ou inícios de 2009, o autor procedeu ao corte e venda de todas as árvores (pinheiros essencialmente) pelo valor de, pelo menos, € 3000,00 (ponto de facto n.º 9).

– Durante os anos de 2009 e 2011, e enquanto menor, representada pelo seu pai, DD efectuou, agindo de boa fé, tal como quem a representou, no prédio adquirido pelos réus, as seguintes obras:

a) Com recurso a uma retroescavadora, foram arrancados os toqueiros dos pinheiros que haviam sido cortados aquando da aquisição do prédio.

b) Foi nivelado o terreno com terra transportada.

c) E com um caterpillar de rastos, para arrastar e nivelar as terras.

d) E com uma máquina giratória para efetuar 4 socalcos no terreno.

e) Execução de 2 muros em betão e um tanque para reservatório de água, nos valores de € 7282,00 (sete mil duzentos e oitenta e dois euros) e de € 942,00 (novecentos e quarenta e dois euros), respectivamente, totalizando € 8224,00 (oito mil duzentos e vinte e quatro euros).

f) O muro é constituído por dois troços: Troço 1, com o comprimento 10,00 metros e uma altura de 1,10 metros; Troço 2, com o comprimento de 18,70 metros e uma altura de 3,10 metros e são constituídos em betão armado. Tem uma sapata.

g) As paredes do tanque têm uma espessura de 25 cm, tem largura de 2,60 metros e comprimento de 4,80m2 e tem uma altura de 1,10 metros. É constituído em ferro, cimento, areia.

h) Foi erguido um muro de blocos em cima do muro de betão.

i) Tornou cultivável com horta, uma parte do prédio (área de 292 m2).

j) Fez uma ramada em ferro e arame no valor de € 600,00 (seiscentos euros).

k) Plantou diversas árvores fruteiras, nomeadamente para produzir kiwis, limoeiros, diospireiros.

l) Para nivelamento dos terrenos, o autor pagou a II, por 40 camiões de terra, € 6000,00 (seis mil euros) (ponto de facto n.º 10).

– A remoção do muro, tanque e ramada provoca a inutilização dos materiais (ponto de facto n.º 11).

Nada mais consta da factualidade provada e não provada, mormente no que tange à valorização (ou não) do prédio rústico e em que medida.

Perante esta factualidade, quid juris?

Salvo o devido respeito pela posição assumida pelo tribunal a quo, temos para nós que, contrariamente ao vertido na sentença, o recorrente realizou benfeitorias úteis sobre o prédio rústico, sendo despicienda a consideração da 1.ª Instância de que o prédio estava afecto, até 2008, à actividade florestal, com um frondoso pinhal, não se acompanhando o raciocínio da decisão recorrida que equaciona o valor das obras realizadas – muros, tanque, ramada de ferro e arame  e colocação de terras  para nivelamento do terreno – por referência àquela actividade, concluindo, assim, que não ocorreu qualquer aumento nem melhoria da produtividade económica do prédio, classificando, inclusive, aquelas benfeitorias como voluptuárias, servindo, apenas, para recreio do benfeitorizante.

Como se dirimiu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 30-11-2021, Proc. n.º 6438/15.1T8GMR.G1.S1: “O que releva particularmente, no que tange ao aumento de valor, para efeito de qualificação de benfeitorias úteis, é um critério objectivo, no sentido de se tratar de despesas que se destinaram a conservar ou melhorar a coisa (benfeitorias úteis para a coisa, em si mesma). Ou seja, importa é o valor objectivo ou venal da coisa (valor real) e independentemente do específico fim a que possa estar temporariamente afectada: que tais benfeitorias tenham aumentado a funcionalidade e o nível de conforto do imóvel, mesmo que nele deixe de ser exercida a actividade que em qualquer altura aí esteja a ser exercida”.

A verdade é que as obras realizadas no prédio rústico em apreço não só se traduziram num custo económico como o terão  valorizado objectivamente: a colocação de terra no prédio, envolvendo a alteração da forma do terreno e o seu nivelamento, mesmo que parcial, não pode deixar de ser considerada uma benfeitoria, especialmente por ter sido acompanhada da construção dos muros em betão, do tanque em cimento e da colocação da ramada de ferro e arame, beneficiando a utilização do imóvel.

Ficou provado, em concreto, que o terreno foi nivelado com terra transportada por 40 camiões, o que importou um custo de € 6000,00; foram executados 2 muros em betão armado, sendo um com o comprimento de 10,00 metros e uma altura de 1,10 metros e o outro com o comprimento de 18,70 metros e uma altura de 3,10 metros, assentes sobre uma sapata, com um custo de € 7282,00; foi construído um tanque, para reservatório de água, em ferro e cimento, cujas paredes têm uma espessura de 25 cm, com a largura de 2,60 metros, comprimento de 4,80m, e uma altura de 1,10 metros, com o custo de € 942,00; e foi feita uma ramada em ferro e arame no valor de € 600,00.

Por conseguinte, o emprego de terra para nivelar o terreno, acompanhado da construção de muros, de um tanque e da ramada de ferro e arame, traduzindo despesas que se destinaram a conservar ou melhorar a coisa, constituem benfeitorias úteis do prédio rústico, sendo despicienda a consideração de que o mesmo estava afecto à actividade florestal (pinhal).

É, pois, inequívoco que o recorrente incorreu em despesas com as indicadas benfeitorias perfazendo as mesmas o valor total de € 14 824,00 (catorze mil oitocentos e vinte e quatro euros), importando verificar se o recorrente tem ou não direito a ser indemnizado.

A respeito da indemnização pelas benfeitorias úteis cumpre verificar o estatuído no artigo 1273.º do Código Civil que preceitua:

“1. Tanto o possuidor de boa fé como o de má fé têm direito a ser indemnizados das benfeitorias necessárias que hajam feito, e bem assim a levantar as benfeitorias úteis realizadas na coisa, desde que o possam fazer sem detrimento dela.

2. Quando, para evitar o detrimento da coisa, não haja lugar ao levantamento das benfeitorias, satisfará o titular do direito ao possuidor o valor delas, calculado segundo as regras do enriquecimento sem causa.”.

No Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 12-06-2012, Proc. n.º 1119/10.5TBPBL-E.C2, consignou-se: “O direito prioritário de levantamento das benfeitorias úteis apenas cede quando esse exercício prejudicar a coisa benfeitorizada e não quando dele resultar prejuízo para a benfeitoria, cabendo ao autor da benfeitoria a alegação e prova de que esse levantamento só se pode efectuar com detrimento da coisa benfeitorizada”.

In casu, ficou demonstrado que a remoção do muro, tanque e ramada provocará a inutilização desses materiais, o que é compreensível por se tratarem de estruturas fixas em betão, cimento e ferro, respectivamente, sem qualquer tipo de possibilidade de levantamento do local onde estão implementadas, sem perda do seu valor, mas, igualmente, acrescentamos nós, com compromisso do valor económico do prédio onde foram implantadas.

Acresce, ademais, que, notoriamente, haveria um detrimento do valor do prédio rústico se a terra ali colocada pelo recorrente, para nivelar o terreno – em quantidade equivalente a 40 camiões –, fosse dali retirada.

Contudo, o valor de uma eventual indemnização pelas benfeitorias úteis não corresponde ao montante da quantia gasta para sua implementação – como se provou, ascendendo a € 14 824,00 –, mas antes à valorização que delas terá decorrido para o imóvel onde foram realizadas.

Por isso, não podendo ocorrer o levantamento das benfeitorias, a fim de obstar ao detrimento do prédio, haverá que indagar se os recorridos terão de ressarcir o recorrente pelo valor das benfeitorias (úteis) ali realizadas e já assinaladas, mediante recurso às regras do artigo 479.º do Código Civil, atinentes ao enriquecimento sem causa:

“1. A obrigação de restituir fundada no enriquecimento sem causa compreende tudo quanto se tenha obtido à custa do empobrecido ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente.

2. A obrigação de restituir não pode exceder a medida do locupletamento à data da verificação de algum dos factos referidos nas duas alíneas do artigo seguinte.”.

Como se explanou no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 10-02-2015, Proc. n.º 1289/12.8TBACB.C1: “Nas benfeitorias úteis – que são as que, apesar de dispensáveis, aumentam o valor objectivo da coisa – o possuidor é admitido a levantá-las se o puder fazer sem detrimento da coisa principal; e, quando não haja lugar a tal levantamento, deve ser satisfeito segundo as regras do enriquecimento sem causa, o que significa que o despendido funciona apenas como limite máximo, tendo, porém, o proprietário que pagar tão só (dentro de tal limite máximo) o valor que as benfeitorias aportam para a coisa. Significa tudo isto, para ser processualmente reconhecido um crédito por benfeitorias, que têm que estar reunidos (alegados e provados) elementos factuais que permitam classificá-las como necessárias ou úteis; que permitam estabelecer o custo de cada uma delas, o valor que cada uma das despesas acrescentou à coisa e a medida do seu benefício no momento actual (data da entrega)”.

A propósito do crédito de indemnização por benfeitorias, nos Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 01-06-1999, Proc. n.º 99A431 e de 10-01-2013, Proc. n.º 1346/10.5TBTMR.C1.S1, após se considerar que esse crédito é calculado nos termos de enriquecimento sem causa, decidiu-se que o facto de não haver elementos para determinar a medida do exacto empobrecimento não leva, só por si, à improcedência da acção fundada em enriquecimento sem causa, podendo relegar-se a sua liquidação para fase subsequente se apenas se apurar o valor das benfeitorias e não apurar o empobrecimento do credor.

Acontece que na situação vertente, na própria fundamentação de facto – pese embora não o tenha consignado na factualidade provada –, o tribunal a quo exarou, no que ora releva e além do mais:

“(…) Uma vez que o prédio aquando da data da celebração da escritura tinha um valor de mercado de € 7.150,00 e atualmente tem um valor de mercado cerca € 6.938,34, ou seja, não se verificou qualquer valorização do prédio dos Réus, com a realização das obras, daqui que o tribunal teve considerado como não provado que tais obras aumentaram significativamente o prédio.

Em jeito de remate, o senhor perito compareceu em sede de audiência final na qual declarou que o tanque é totalmente inútil para o prédio, que tem uma aptidão florestal; se tal prédio estivesse a pinhal o terreno valia mais do que o valor que tem atualmente após a realização das obras” (sic, sublinhado nosso).

Reiteramos, todavia, no que à matéria de facto diz respeito, que nada ficou vertido na decisão recorrida, em concreto, a respeito da valorização (ou não) do prédio rústico.

Acontece que as considerações do tribunal a quo, em sede de fundamentação de facto, a respeito do relatório pericial, mormente no que tange à valorização do prédio, a pp. 16 a 19, são absolutamente essenciais para o enquadramento jurídico da causa, por consubstanciarem factualidade que devia ter sido reflectida pelo tribunal a quo, no local próprio – cf. artigo 607.º, n.º 4, 1.ª parte, do CPC: “Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados (…)” – e não o foi.

Dispõe o artigo 662.º, n.º 1, do CPC: “A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.

Porém, in casu, não se está perante uma situação que autorize o tribunal ad quem a socorrer-se dessa faculdade legal.

            Segundo decorre do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 05-03-2024, Proc. n.º 2941/20.0T8VIS.C1: “Não cabe à Relação, perante impugnação da decisão de facto, proceder ao aditamento à matéria assente de factos que (embora articulados) não tenham sido objeto de pronúncia/julgamento pela 1.ª instância, exceto se a matéria em questão estiver admitida por acordo, provada plenamente por documentos ou por confissão reduzida a escrito”.

            Explica-se de forma desenvolvida no citado aresto:

            “(…) Este deficit referente à própria factualidade relevante alegada torna insuficiente o quadro fáctico da decisão recorrida, comprometendo a solução jurídica do litígio, termos em que se impõe a anulação da sentença em crise, seja para – desde logo – ampliação da matéria de facto, seja para, na sequência, cabal e clara fundamentação (com justificação da convicção, à luz de todas as provas pertinentes) da decisão da matéria de facto.

Dir-se-á ainda que se concorda com o entendimento explicitado no Ac. TRC de 10/05/2022 ([Proc. 1932/19.8T8FIG.C1]) quanto ao aditamento à matéria assente de factos que (embora articulados) não tenham sido objeto de pronúncia/julgamento pela 1.ª instância, podendo ler-se na fundamentação deste aresto:

«Resulta do n.º 1 do artigo 662.º do CPC combinado com a parte final da alínea c) do n.º 2 do mesmo preceito que o dever de a Relação reapreciar a prova produzida, formar a sua convicção e julgar provados ou não provados os pontos de facto indicados pelo recorrente só existe em relação aos factos sobre os quais se tenha pronunciado o tribunal a quo.

Na verdade, só em relação a esta pronúncia é que tem sentido dizer, como faz o n.º 1 do artigo 662.º, do CPC, que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. Depõe a favor desta interpretação o artigo 640.º do CPC, relativos aos ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, ao impor ao recorrente o ónus de especificar os pontos de facto que considera incorrectamente julgados.

Se o tribunal de 1.ª instância omitir a pronúncia sobre uma determinada questão de facto e se a resposta a ela for indispensável para a decisão da causa, a consequência de tal omissão será a anulação da decisão proferida em 1.ª instância, seguida da repetição do julgamento sobre tal questão. É a solução que resulta da alínea c) do n.º 2 do artigo 662.º do CPC, na parte em que dispõe que a Relação deve mesmo oficiosamente anular a decisão proferida em 1.ª instância, quando considere indispensável a matéria de facto, combinada com a alínea c) do n.º 3 do mesmo diploma.

            Só assim não será se a matéria em questão estiver admitida por acordo, provada por documentos ou por confissão reduzida a escrito. Nestas hipóteses, cabe ao tribunal da Relação tomar em consideração tais factos, sem necessidade de anulação do julgamento. É o que resulta da 2.ª parte do n.º 4 do artigo 607.º do CPC – aplicável ao acórdão da Relação por remissão do n.º 2 do artigo 663.º do CPC. Precise-se que quando o n.º 4 do artigo 607.º fala em factos provados por documentos quer dizer factos provados plenamente por documentos.»”.

Em suma, sendo a decisão da 1.ª instância omissa sobre factualidade indispensável para a decisão da causa – que não está admitida por acordo, provada por documento ou por confissão reduzida a escrito, o que inviabiliza a intervenção do tribunal ad quem – a consequência dessa omissão será a anulação dessa decisão, seguida da repetição do julgamento sobre tal questão de facto.

No caso dos autos, como logo se retira da própria enunciação dos temas da prova, regista-se que o tribunal a quo, correctamente, elegeu como um dos temas indagar se as despesas/obras aumentaram o valor do imóvel e em que medida.

Porém, analisada a factualidade provada e não provada em sede de decisão final, repete-se, nada foi transmitido a esse propósito, sendo a sentença totalmente omissa na parte dos factos provados, apesar das considerações que fez e da análise minuciosa da prova pericial, o que determina que o Tribunal ad quem tenha de lançar mão, oficiosamente, do disposto no artigo 662.º, n.º 2, alínea c), do CPC.

Segundo esse preceito a Relação deve anular a decisão proferida na 1.ª instância quando repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, sem que constem do processo todos os elementos necessários à alteração da decisão, e/ou considere indispensável a ampliação da matéria de facto.

Importa, assim, com base nas provas já produzidas, proceder à ampliação da matéria de facto – mantendo-se toda a restante factualidade, nos termos ora decididos neste Acórdão –, de modo a ficar retratada a questão do valor do prédio rústico, o que obriga à anulação parcial da sentença recorrida.

Destarte, com base nas provas já obtidas no processo, e sem prejuízo de eventuais diligências adicionais que a 1.ª instância possa reputar necessárias, determina-se que o tribunal a quo amplie a matéria de facto atinente ao tema da prova consistente em indagar “se despesas/obras aumentaram o valor do imóvel e em que medida”, ficando prejudicada, logicamente, a apreciação da questão recursiva relativa à determinação concreta da valorização (ou não) do imóvel e do seu quantum.


*

 Sumário (artigo 663.º, n.º 7, do CPC): (…).

Decisão:

Nestes termos, acordam os Juízes Desembargadores deste Tribunal da Relação em anular parcialmente a decisão proferida em 1.ª instância por forma a que – com base na prova já produzida, e sem prejuízo de eventuais diligências adicionais que possa reputar necessárias – seja ampliada a matéria de facto atinente ao tema da prova relativo a indagar se despesas/obras aumentaram o valor do imóvel e em que medida.

 Custas a fixar a final a cargo da parte que ficar vencida.


Coimbra, 14 de Outubro de 2025


Luís Miguel Caldas
Hugo Meireles
Francisco Costeira da Rocha


[1] Juiz Desembargador relator: Luís Miguel Caldas /Juízes Desembargadores adjuntos: Dr. Hugo Meireles e Dr. Francisco Costeira da Rocha.
[2] Todos os Acórdãos citados nesta decisão estão acessíveis em http://www.dgsi.pt.