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ACÇÃO EXECUTIVA
RECURSOS INTERLOCUTÓRIOS COM SUBIDA A FINAL
Sumário
1. Em matéria de recursos, ao processo executivo são aplicáveis os artigos 853.º e 854.º do CPC. 2. Não admitem recurso autónomo de apelação os despachos interlocutórios que não se subsumam aos n.ºs 1 a 3 do artigo 853.º do CPC. 3. O despacho que determinou que a execução deverá prosseguir os seus trâmites normais não se enquadra nos n.ºs 1 a 3 do referido artigo 853.º, pelo que não admite recurso autónomo de apelação. (Sumário da Relatora)
Texto Integral
Processo n.º 2749/17.0T8LLE-C.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Faro - Juízo de Execução de Loulé - Juiz 1
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Sumário: (…)
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Acordam os Juízes em conferência na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora(cfr. artigo 652.º, n.º 3, ex vi do artigo 643.º, n.º 4, do Código do Processo Civil, doravante CPC):
1. RELATÓRIO
(…), na qualidade de Executada nos autos de execução em apenso, dirigiu requerimento ao processo a 24 de setembro de 2024, pedindo que seja declarada extinta a instância executiva quanto à sua pessoa, com fundamento na inexigibilidade da obrigação exequenda.
A 18 de dezembro de 2024 o tribunal a quo apreciou e indeferiu a sua pretensão, determinando que a execução prossiga os trâmites legais, também contra a Executada, tendo a mesma recorrido de tal decisão.
A Exequente (…) – STC, S.A. apresentou contra-alegações, pugnando, além do mais, pela inadmissibilidade do recurso de apelação autónoma.
A 23 de abril do corrente ano o Sr. Juiz do Juízo de Execução de Loulé proferiu despacho de não admissão do recurso, por entender que o mesmo não se enquadra em nenhuma das circunstâncias previstas nos artigos 644.º, n.º 1 e 2 e 853.º do CPC. (…) reclamou deste despacho, ao abrigo do previsto no artigo 643.º do CPC), alegando, em síntese, o seguinte:
- ao não admitir o recurso, o tribunal alheou-se dos factos e interesses subjacentes ao requerimento e alegações de recurso interposto;
- a decisão proferida pelo tribunal não pôs termo ao processo, sendo passível de apelação autónoma ao abrigo do previsto nos artigos 852.º, 853.º, n.º 1, ex vi do artigo 644.º, n.º 1, alínea b), do CPC, conforme decidido no acórdão de uniformização de jurisprudência proferido pelo STJ a 19/02/2019;
- o tribunal ignorou o acórdão proferido pelo TRE de 21/12/2017, acerca do vencimento antecipado da obrigação relativa a terceiro não devedor na execução;
- a decisão do tribunal é ainda contrária ao entendimento jurisprudencial firmado pelo STJ a propósito do vencimento imediato e antecipado das obrigações pecuniárias no âmbito do processo executivo, na forma sumária, o que sempre viabilizaria o recurso de apelação autónoma, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 629.º, n.º 2, alínea c), do CPC;
- a decisão de indeferimento do recurso de apelação é infundada e carece de fundamento legal, padecendo de nulidade nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alíneas b), c), d) e e), do CPC.
Conclui, assim, que tal decisão deve ser revogada e, em consequência, admitido o seu recurso.
Não foi apresentada resposta à reclamação.
Foi proferida decisão singular que manteve o despacho reclamado.
Não se conformando com tal decisão, a Reclamante pediu a intervenção da conferência, apresentando, no essencial, os mesmos fundamentos da reclamação quanto à não admissão do recurso.
A Recorrida respondeu, pugnando pela confirmação da decisão de não admissão do recurso.
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A única questão a decidir é, pois, se o recurso da Reclamante / Executada deve ser admitido como apelação autónoma.
2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. Fundamentos de facto
Os factos a considerar são os que constam do relatório que antecede, relativos à tramitação processual da instância executiva.
2.2. Fundamentos de direito
Como se referiu, a Reclamante/Executada (…) não se conformou com a decisão que confirmou o despacho que não admitiu o recurso, relativo à decisão que indeferiu o seu pedido de extinção da instância executiva com fundamento na inexigibilidade da obrigação exequenda.
Desde logo e tendo presentes os argumentos avançados pela Reclamante, há que reafirmar que a mesma confunde a forma com a matéria, já que, neste momento processual, está em causa, tão só, decidir da admissibilidade ou não da apelação autónoma, pelo que o despacho em causa não tinha que se pronunciar quanto aos “factos e interesses subjacentes ao requerimento”, sendo, pois, irrelevantes as considerações acerca de jurisprudência relativa às questões que a Reclamante pretende ver analisadas em sede de recurso.
E, também por isso, não se compreende que a Reclamante aponte ao despacho mencionado a violação do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alíneas b), c), d) e e), do CPC (aplicável aos despachos, por via do previsto no artigo 613.º, n.º 3), já que ao Sr. Juiz do tribunal a quo impunha-se, naquele momento, admitir ou não o recurso, o que fez em despacho fundamentado de facto e de direito, lógico, coerente e perfeitamente inteligível.
Há, assim, que decidir se, à luz do quadro legal desenhado para os recursos, é ou não admissível apelação autónoma, como pretende a Reclamante.
Assim, o artigo 644.º do CPC regula as apelações autónomas, resultando do mesmo que apenas as decisões que se enquadrem no previsto nos n.ºs 1 ou 2 de tal preceito podem ser objeto de recurso autónomo. As demais decisões apenas podem ser impugnadas no recurso que venha a ser interposto das decisões previstas no n.º 1 (cfr. artigo 644.º, n.º 3, do CPC).
Prevê, pois, o artigo 644.º do CPC o seguinte:
“1 - Cabe recurso de apelação: a) Da decisão, proferida em 1ª instância, que ponha termo à causa ou a procedimento cautelar ou incidente processado autonomamente; b) Do despacho saneador que, sem pôr termo ao processo, decida do mérito da causa ou absolva da instância o réu ou algum dos réus quanto a algum ou alguns dos pedidos. 2 - Cabe ainda recurso de apelação das seguintes decisões do tribunal de 1ª instância: a) Da decisão que aprecie o impedimento do juiz; b) Da decisão que aprecie a competência absoluta do tribunal; c) Da decisão que decrete a suspensão da instância; d) Do despacho de admissão ou rejeição de algum articulado ou meio de prova; e) Da decisão que condene em multa ou comine outra sanção processual; f) Da decisão que ordene o cancelamento de qualquer registo; g) De decisão proferida depois da decisão final; h) Das decisões cuja impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil; i) Nos demais casos especialmente previstos na lei. 3 - As restantes decisões proferidas pelo tribunal de primeira instância podem ser impugnadas no recurso que venha a ser interposto das decisões previstas no n.º 1”.
Por seu turno, prevê o artigo 852.º do CPC que “Aos recursos de apelação e de revista de decisões proferidas no processo executivo são aplicáveis as disposições reguladoras do processo de declaração e o disposto nos artigos seguintes”, dispondo o artigo 853.º do CPC o seguinte:
“1 - É aplicável o regime estabelecido para os recursos no processo de declaração aos recursos de apelação interpostos de decisões proferidas em procedimentos ou incidentes de natureza declaratória, inseridos na tramitação da ação executiva. 2 - Cabe ainda recurso de apelação, nos termos gerais: a) Das decisões previstas no n.º 2 do artigo 644.º, quando aplicável à ação executiva; b) Da decisão que determine a suspensão, a extinção ou a anulação da execução; c) Da decisão que se pronuncie sobre a anulação da venda; d) Da decisão que se pronuncie sobre o exercício do direito de preferência ou de remição. 3 - Cabe sempre recurso do despacho de indeferimento liminar, ainda que parcial, do requerimento executivo, bem como do despacho de rejeição do requerimento executivo proferido ao abrigo do disposto do artigo 734.º. 4 - Sobem imediatamente, em separado e com efeito meramente devolutivo, os recursos interpostos nos termos dos n.ºs 2 e 3 de decisões que não ponham termo à execução nem suspendam a instância”.
Tal significa, pois, que, ao processo executivo é aplicável o regime geral estabelecido para o processo de declaração. Para além disso, cabe recurso de apelação das decisões previstas no n.º 2 do artigo 644.º do CPC quando aplicável à ação executiva e cabe ainda recurso das decisões enunciadas nas alíneas b) a d) do n.º 2 do citado artigo 853.º do CPC, do despacho de indeferimento liminar e do despacho de rejeição do requerimento executivo.
No presente caso, está em causa uma decisão que indeferiu o requerimento de extinção da execução quanto à Executada e Reclamante (…).
Em consonância com o regime estabelecido no processo de declaração, a decisão que determine a suspensão ou a extinção da execução é recorrível autonomamente (cfr. artigos 644.º, n.º 1, alínea a) e 2, alínea c) e 853.º, n.º 2, alínea b), do CPC). Logo, a contrario, a decisão que determine não haver lugar à suspensão ou à extinção da instância não é recorrível autonomamente.
Acresce que, alegando a Reclamante a falta de um pressuposto processual de que depende a regularidade da instância executiva, caso a sua falta fosse invocada em oposição à execução deduzida por embargos, no prazo legal (cfr. artigos 728.º, 729.º e 731.º do CPC), a decisão final proferida em sede de embargos seria objeto de recurso autónomo (cfr. artigos 853.º, n.º 1 e 644.º, n.º 1, alínea a), do CPC).
Aliás, o acórdão de 19/02/2019 do STJ (proferido no proc. n.º 3503/16.1T8VIS-A.C1.S1), citado pela Reclamante, tem por base despacho saneador proferido em ação de embargos de executado, justificando-se, por isso, a conclusão aí extraída de que “I - O despacho saneador em que se decidiu a excepção da inexequibilidade do título executivo deve ser impugnado em recurso de apelação autónoma e não no recurso da apelação final, por decidir do mérito da causa, quer se entenda que se trata de uma questão processual, quer de uma questão de direito material subjacente à emissão do título” – o que resulta da aplicação conjugada dos artigos 644.º, n.º 1, alínea b), 852.º e 853.º, n.º 1. Ora, no presente caso, não foi proferido despacho saneador em sede de ação de natureza declaratória.
Ainda na sequência do atrás exposto e porque o acórdão do STJ mencionado não é de uniformização de jurisprudência, não é aplicável ao caso o disposto no artigo 629.º, n.º 2, alínea c), do CPC, segundo o qual “Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso das decisões proferidas, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, contra jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça”.
Finalmente e no que diz respeito à jurisprudência indicada pela Reclamante no seu último requerimento, há a referir o seguinte:
- o acórdão do STJ de 11/07/2023 (proferido no processo n.º 3158/11.0TJVNF-N.G1-A.S1, relatora Ana Resende, in dgsi), versa sobre a não admissibilidade de recurso de revista e a parte por aquela transcrita não está completa, importando considerá-la na íntegra: “A rejeição do recurso deve resultar da análise do requerimento e respetivas alegações apresentados, tal como foram delineadas pelas partes, numa apreciação que passa pela sua leitura e atendimento dos preceitos legais atendíveis no concerne à admissibilidade do recurso particular em causa, e assim não pode necessariamente importar no conhecimento do mesmo, reservado para o Tribunal superior, sendo que em situações como a convocada pelos Reclamantes, isto é, em que está em causa uma situação de excecionalidade como resulta do artigo 629.º, n.º 2, a), a devida aferição do pedido recursório no concerne à sua admissibilidade, incumbe ao relator do Tribunal superior a quem o processo for distribuído, nos termos dos artigos 652.º, n.º 1, b) e 679.º, do CPC, que não se limitando ao simples assentimento, não implica de modo algum, o conhecimento do mérito do recurso” (sublinhado nosso);
- o acórdão do STJ de 3/07/2025 (proferido no processo n.º 1224/11.0TBABF-D.L1.S.1, relatora Maria de Deus Correia, in dgsi) trata da admissibilidade do recurso de revista com fundamento na contradição de julgados, tendo-se escrito no mesmo, efetivamente, que “Dado que a manifesta insuficiência do título executivo deve ser conhecida, mesmo oficiosamente, até ao primeiro ato de transmissão dos bens penhorados, nos termos do artigo 734.º, n.º 1, do CPC, não poderia o Tribunal deixar de conhecer tal questão, invocada pela Executada, ainda que no âmbito da oposição à penhora, pois nenhum impedimento legal existe para o efeito”. Porém, no presente caso, o tribunal a quo, no despacho de 18 de dezembro de 2024, apreciou e decidiu o pedido da Reclamante, analisando os pressupostos de validade da instância executiva quanto à mesma e indeferindo a sua pretensão;
- acórdão do TRC de 15/05/2018 (proferido no processo n.º 3773/12.4TJCBR-A.C1, relator Carlos Moreira, in dgsi), que trata da questão do erro na forma do processo e apresenta o seguinte sumário: “Instaurada oposição à penhora, se os factos alegados mais se compaginarem com a oposição à execução, e se outros óbices que possam obviar a tal inexistirem, deve o juiz operar a conversão para a forma/meio processual idóneo, rectius, a oposição à execução – artigos 6.º, 7.º, 193.º, 547.º e 590.º do CPC”.
Ora, mais uma vez, afirma-se, a Reclamante confunde questões distintas, como sejam, desde logo, a admissibilidade da arguição das questões processuais que, no seu entender, conduziriam à extinção da instância executiva quanto à sua pessoa, ainda que em requerimento no âmbito da ação executiva, e a admissibilidade de apelação autónoma.
Por conseguinte, resta concluir – como bem entendeu o Senhor Juiz da 1ª Instância – que a decisão recorrida não admite recurso autónomo (vide, neste sentido, o acórdão desta 2ª Secção Cível, de 25/10/2024, proferido no processo n.º 663/18.0T8LLE-F.E1, in DGSI).
Deve, assim, manter-se o despacho reclamado.
Porque ficou vencida na Reclamação, incumbe à Reclamante o pagamento das custas respetivas (cfr. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC).
3. DECISÃO
Nestes termos e pelo exposto, mantém-se o despacho reclamado, que não admitiu o recurso interposto por (…).
Custas a cargo da Reclamante.
Notifique.
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Évora, 16 de outubro de 2025
Anabela Raimundo Fialho (relatora)
Ana Margarida Pinheiro Leite (1ª Adjunta)
Maria Isabel Calheiros (2ª Adjunta)