I. A previsão do o art.º 21º, nº 1 do DL 15/93, de 22/01, constitui o tipo base do crime de tráfico de estupefacientes, integrando as seguintes modalidades de acção (bastando, para o respectivo preenchimento, a prática não autorizada de alguma delas): cultivar; produzir; fabricar; extrair; preparar; oferecer; puser à venda/vender; distribuir; comprar; ceder; receber; proporcionar a outrem/propício; transportar; importar; exportar; fazer transitar/transitar; ilicitamente detiver/deter, produtos estupefacientes;
II. Na avaliação da ilicitude — embora façam parte do tipo —, não é irrelevante que só uma, ou mais, sejam preenchidas; deve ainda ter-se em conta as circunstâncias da acção, os meios utilizados, quantidade e espécie de substância traficadas;
III. Na determinação da pena, deve também avaliar-se as exigências preventivas especiais e gerais.
No Tribunal Judicial da Comarca dos Açores – ... – JC Cível e Criminal – Juiz ..., processo supra-referido, em que é arguido AA — e co-arguidos BB e CC —, foi proferido Acórdão com o seguinte dispositivo:
“Pelo exposto, acordam os Juízes que compõem este Tribunal Coletivo:
1. Condenar AA pela prática de um crime de tráfico de substâncias estupefacientes, previsto no artigo 21º, nº 1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro, com referência às Tabelas I-A e II-A, na pena de 6 (seis) anos de prisão;
2. Condenar BB pela prática de um crime de tráfico de substâncias estupefacientes, previsto no artigo 21º, nº 1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro, com referência às Tabelas I-A e II-A, na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão;
3. Condenar CC pela prática de um crime de tráfico de substâncias estupefacientes de menor gravidade, previsto no artigo 25º, nº 1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro, com referência às Tabelas I-A e II-A, na pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo, com regime de prova, com sujeição a tratamento à toxicodependência com realização de rastreios inopinados aos consumos, a manutenção da atividade laboral, bem como o afastamento do grupo de pares com idênticas problemáticas.”
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Deste Acórdão foi em representação do arguido/condenado, interposto recurso para este Supremo Tribunal, formulando-se as seguintes conclusões:
“1. O presente recurso prende-se unicamente com apenas um especto: a concreta medida da pena.
2. O Recorrente foi condenado pela prática de um crime de tráfico de substâncias estupefacientes, previsto no artigo 21º, no 1 do Decreto-Lei no 15/93, de 22 de janeiro, com referência às Tabelas I-A e II-A,, na pena de 6 (seis) anos de prisão.
3. Na verdade, e salvaguardado o devido respeito, o ora recorrente com a presente condenação não se pode conformar, porquanto, salvo melhor opinião, a medida concreta da pena aplicada ao aqui recorrente, é desproporcional e excessiva, atentas as circunstâncias concretas do caso.
4. Dito isto, e salientando que o limite do necessário para assegurar a proteção dessas expetativas será encontrado de um modo mais justo e equitativo de molde a saciar por um lado, o absolutamente imprescindível para realizar a necessidade de prevenção geral sob a forma de defesa da ordem jurídica, e por outro, de modo a satisfazer as necessidades de prevenção especial. Pelo que à luz destes critérios, a pena de 6 (seis) anos afigura-se bastante excessiva.
5. O recorrente entende que, encontrada a moldura da pena, fixada em função das exigências de prevenção geral positiva, devem então funcionar as exigências de prevenção especial, em particular, as
exigências de prevenção especial positiva ou de socialização, para a determinação concreta da pena, tendo sempre presente que a culpa representa o limite inultrapassável da mesma.
6. O disposto no artigo 50º do Código Penal, o tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
7. O sistema sancionatório do nosso Código Penal assenta na concepção básica de que a pena privativa de liberdade, constitui verdadeiramente a última ratio da política criminal. Desta conceção derivam consequências a dois níveis, que o Código procura levar tão longe quanto possível. Consequências, desde logo, quanto à reconfirmação da própria pena de prisão, no sentido de, em toda a medida possível, limitar o seu efeito negativo e criminógeno e oferecer-lhe um sentido positivo, prospetivo e socializador: por isso o Código consagra uma pena de prisão única e simples; consequências, por outro lado, quanto à limitação da aplicação concreta da prisão, advogando a sua substituição, sempre que possível, por penas não institucionais.
8. A finalidade político-criminal que a lei visa através do instituto da suspensão é o afastamento do delinquente, no futuro, da prática de novos crimes, carecendo, a aplicação medida, de ser adequada a uma prognose de prevenção especial, já que os fins da prevenção geral aqui devem fazer-se sentir unicamente sob a forma do conteúdo mínimo de prevenção de integração indispensável à defesa do ordenamento jurídico.
9. Assim, no nosso entender, o douto acórdão do tribunal a quo, violou, entre outros, o disposto no artigo 40.º, 70.º, 71.º, todos do Código Penal, razão pela qual, salvaguardado o devido respeito pela douta decisão e que é muito, ousamos discordar da medida da pena aplicada, e pugnamos no essencial, por outra mais adequada aos critérios de justiça que o caso em concreto reclama, aplicando-se uma pena inferior àquela que foi aplicada”.
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Em resposta ao recurso, em 1.ª Instância, o M.º P.º pronunciou-se pela sua total improcedência.
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Neste Tribunal, o Sr. Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se, igualmente, pela improcedência do recurso.
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Em consequência do decidido no Acórdão de que se pretende recorrer, são os seguintes os factos provados:
“Com interesse para a causa, provaram-se os seguintes factos:
1. Os arguidos AA e BB são irmãos.
2. Por sua vez, o arguido CC é filho do arguido AA e sobrinho de BB.
3. Desde pelo menos março de 2019, até à presente data, os arguidos AA e BB, com vista a obter proveitos financeiros, decidiram dedicar-se, mediante comunhão de esforços e vontades à venda de produtos estupefacientes, designadamente de heroína, e (alfa)-PHP, a consumidores que os procuram.
4. As transações são realizadas diariamente com consumidores das mencionadas substâncias estupefacientes, que abordam os arguidos BB e AA, na sua residência sita na 1ª Travessa da ..., freguesia de ..., concelho de ....
5. AA, e BB decidiram, então, distribuir tarefas entre ambos, ficando a realização dos contatos, do acondicionamento do produto, da sua entrega aos consumidores e recebimento dos pagamentos a cargo destes.
6. O lucro obtido com a venda do produto estupefaciente é dividido entre os arguidos AA e BB.
7. Com tal atividade os arguidos AA e BB auferem rendimentos que constituem a sua única fonte de obtenção de rendimentos.
8. O arguido BB partilhou a residência acima referida com AA, até à reclusão deste último, onde guardaram o produto estupefaciente que comercializavam e que lhes era fornecido diariamente.
9. Desde 01 de fevereiro de 2024, AA encontra-se recluso no Estabelecimento Prisional de ..., em cumprimento de pena aplicada no Processo n.º 32/19.5..., que corre termos no Juízo Central Criminal e Cível de ... – Juiz ..., de quatro anos e seis meses, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes.
10. Desde pelo menos a data de 01 de fevereiro de 2024, na sequência da reclusão do arguido AA, BB tem vindo a ser auxiliado pelo seu sobrinho, CC, passando este a assumir as funções asseguradas, até então pelo seu pai.
11. Os arguidos BB e CC não possuem qualquer atividade remunerada, encontrando-se na condição de desempregados.
12. Durante o ano de 2023, os arguidos AA e BB entregaram ao consumidor DD um número indeterminado de pacotes individuais de (alfa)-PHP, para consumo daquele e dele receberam, em pagamento, e pelo menos uma vez, a quantia de €5,00.
13. Desde início do ano de 2022, até à presente data, o arguido AA entregou ao consumidor EE, mais de cem pacotes individuais de pacotes de (alfa)-PHP, para consumo daquele e dele recebeu, em pagamento, a quantia de €5,00, por cada pacote.
14. Em datas não concretamente apuradas, mas ocorridas entre o início do ano de 2023 e até ao dia 31 de janeiro de 2024, o arguido AA e BB entregaram cerca de 10 pacote de (alfa)-PHP a FF, para consumo daquele, e dele receberam, em pagamento, a quantia de €5,00, por cada pacote.
15. Em datas não concretamente apuradas, mas ocorridas entre o início do ano de 2023 e até à presente data, os arguidos AA, BB e CC entregaram cerca de 20 pacote de (alfa)-PHP a GG, para consumo daquele, e dele receberam, em pagamento, a quantia de €5,00, por cada pacote.
16. Em datas não concretamente apuradas, mas ocorridas entre o início do ano de 2023 e até à presente data, os arguidos AA e BB entregaram cerca de quatro pacotes de (alfa)-PHP a HH, para consumo daquele, e dele receberam, em pagamento, a quantia de €5,00, por cada pacote.
17. Desde datas não concretamente apuradas, mas ocorridas entre meados do ano de 2023 e a presente data, os arguidos BB e AA venderam a II, cerca de dez vezes, quantidades não concretamente apuradas de pacotes de (alfa)-PHP, para consumo daquela e dela receberam, em pagamento, a quantia de €5,00, por cada pacote.
18. Desde datas não concretamente apuradas, mas ocorridas entre meados do ano de 2023 e inícios do ano de 2024, os arguidos BB e AA venderam a JJ, cerca de seis vezes, quantidades não concretamente apuradas de pacotes de (alfa)-PHP, para consumo daquela e dela receberam, em pagamento, a quantia de €5,00, por cada pacote.
19. Desde meados do mês de agosto de 2023, até à presente data, os arguidos BB e AA e CC venderam ao consumidor KK, cerca de cinquenta pacotes de (alfa)-PHP, para consumo daquele, e dele receberam, em pagamento, a quantia de €5,00, por cada pacote.
20. No dia 31 de janeiro de 2024, pelas 14h20, junto à residência dos arguidos, FF detinha um panfleto, contendo no seu interior 0,056 gramas de (alfa)-PHP e um panfleto, contendo no seu interior 0,084 gramas de heroína. A (Alpha)-PHP havia adquirido, momentos antes, aos arguidos BB e AA, para seu consumo, tendo pago o valor de €5,00.
21. No dia 3 de junho de 2023, pelas 18h55, na Rua do ..., freguesia de ..., GG detinha um panfleto de plástico, contendo no seu interior 0,081 gramas de (alfa)-PHP, que havia adquirido momentos antes ao arguido BB, na residência deste, em troca do pagamento da quantia de €5,00.
22. No dia 3 de junho de 2023, pelas 18h55, na Rua do ..., freguesia de ..., LL detinha um panfleto de plástico, contendo no seu interior 0,383 gramas de (alfa)-PHP, que havia adquirido momentos antes ao arguido BB, na residência deste, em troca do pagamento da quantia de €20,00.
23. No dia 3 de junho de 2023, pelas 21h30, na Estrada ..., freguesia de ..., concelho de ..., o arguido BB detinha: i. 4 (quatro) panfletos em plástico, contendo no seu interior 0,269 gramas de (alfa)-PHP; ii. A quantia de €60,00 (sessenta euros), repartida em notas 5 (cinco) notas com o valor facial de €10,00 (dez euros) e 10 (dez) moedas com o valor facial de €1,00 (um euro).
24. No dia 21 de junho de 2023, pelas 23h00, na Rua do ..., freguesia de ..., MM adquiriu um panfleto de (alfa)-PHP, em quantidade não concretamente apurada, ao arguido BB, que consumiu no interior da residência deste, pelo preço de €5,00.
25. No dia 3 de julho de 2023, pelas 19h00, na Rua do ..., freguesia de ..., NN detinha um panfleto de plástico, contendo no seu interior 0,067 gramas de (alfa)-PHP, que havia adquirido momentos antes ao arguido AA, na residência deste, em troca do pagamento da quantia de €5,00.
26. No dia 3 de julho de 2023, pelas 19h05, na Rua do ..., freguesia de ..., HH detinha um panfleto de plástico, contendo no seu interior 0,233 gramas de (alfa)-PHP, que havia adquirido momentos antes ao arguido BB, na residência deste, em troca do pagamento da quantia de €10,00.
27. No dia 04 de julho de 2023, pelas 20h00, na Rua do ..., freguesia de ..., OO detinha dois panfletos de plástico, contendo no seu interior 0,124 gramas de (alfa)-PHP, que havia adquirido momentos antes ao arguido BB, na residência deste, em troca do pagamento da quantia de €5,00, por cada pacote.
28. No dia 23 de julho de 2023, pelas 18h30, na Estrada ..., freguesia de ..., PP transportava no interior do veículo de matrícula ..-..-XP, dois panfletos em plástico, contendo no seu interior 0,092 gramas de (alfa)-PHP e um panfleto de plástico, contendo no seu interior 0,107 gramas de heroína.
29. No dia 16 de agosto de 2023, pelas 17h30, na 1ª Travessa da ..., freguesia de ..., II e JJ detinham um panfleto de plástico, contendo no seu interior 0,867 gramas de (alfa)-PHP, que haviam adquirido momentos antes ao arguido BB, na residência deste, em troca do pagamento da quantia de €90,00.
30. No dia 31 de agosto de 2023, pelas 16h10, na Rua do ..., freguesia de ..., DD detinha dois panfletos de plástico, contendo no seu interior 0,109 gramas de (alfa)-PHP, que havia adquirido momentos antes ao a AA, na residência deste, em troca do pagamento da quantia de €5,00 por cada pacote.
31. No dia 31 de janeiro de 2024, pelas 14h20, na Rua do ..., freguesia de ..., FF detinha, no interior do veículo de matricula ..-..-VE, um panfleto de plástico, contendo no seu interior 0,056 gramas de (alfa)-PHP, e um panfleto de plástico, contendo no seu interior 0,084 gramas de heroína. A (alfa)-PHP havia adquirido momentos antes aos arguidos BB e a AA, na residência destes, em troca do pagamento da quantia de €5,00 pelo pacote de (alfa)-PHP.
32. No dia 28 de fevereiro de 2024, pelas 08h30, no interior da residência id. em 4., o arguido BB detinha, em cima da sua cama:
i. 1 (uma) balança de precisão;
ii. 1 (um) saco de plástico com recortes;
iii. 4 (quatro) panfletos de plástico, contendo no seu interior 0,211 gramas de (alfa)-PHP;
iv. 1 (um) pacote de plástico, contendo no seu interior 0,677 gramas de resina de canábis, suficientes para duas doses individuais;
v. 1 (um) pacote de plástico, contendo no seu interior 1,218 gramas de folhas de canábis;
vi. 3 (três) comprimidos de buprenorfina;
vii. 1 (um) cartão SIM;
viii. a quantia monetária de €15,00 (quinze euros).
33. No dia 28 de fevereiro de 2024, cerca das 08h30, no interior da residência id. em 4., o arguido CC detinha, no interior do seu quarto:
i. 1 (uma) balança de precisão, em funcionamento;
ii. 1 (um) telemóvel de marca Redmi, de cor preto, com os IMEI .............00/78 e .............18/78;
iii. 1 (um) telemóvel, de marca Nokia, com o IMEI .............58;
iv. 16 (dezasseis) panfletos em plástico, contendo no seu interior 0,757 gramas de (alfa)-PHP;
v. 1 (um) panfleto, em plástico, contendo no seu interior 5,579 gramas de (alfa)-PHP;
vi. 1 (um) panfleto, em plástico, contendo no seu interior 0,392 gramas de (alfa)- PHP;
vii. 1 (um) panfleto, em plástico, contendo no seu interior 0,330 gramas de resina de canábis, suficientes para uma dose individual;
viii. 10 (dez) embalagens, em plástico, contendo no seu interior 1,218 gramas de folhas de canábis, suficientes para uma dose individual;
ix. 15 (quinze) comprimidos alprazolam;
x. 1 (um) comprimido de cloridrato de tramadol;
xi. 1 (um) saco de plástico onde foram subtraídos recortes, para acondicionamento de estupefaciente;
xii. A quantia de €630,00 (seiscentos e trinta euros), repartida em 4 (quatro) notas com o valor facial de €50,00 (cinquenta euros), 14 (catorze) notas com o valor facial de €20,00 (vinte euros), 11 (onze) notas com o valor facial de €10,00 (dez euros), 6 (seis) notas com o valor facial de €5,00 (cinco euros) e 10 (dez) moedas com o valor facial de €1,00.
34. No dia 24 de junho de 2024, cerca das 07h30, no interior da residência id. em 4. arguido BB detinha:
i. 1 (uma) balança de precisão, de marca M2-Tec, sem pilhas colocadas;
ii. 9 (nove) círculos de plástico;
iii. 1 (um) telemóvel de marca Doro, com o IMEI .............34;
iv. A quantia de €40,00 (quarenta euros).
35. Os arguidos BB, AA e CC destinavam as substâncias estupefacientes lhe foram apreendidas, nas circunstâncias descrita supra, e que lhe pertenciam, à venda ou cedência a terceiros, mediante contrapartida económica, sempre em comunhão de esforços e de vontades, mediante um plano previamente gizado.
36. As quantias monetárias apreendidas aos arguidos BB e CC, nas circunstâncias descrita supra, eram provenientes das vendas dos produtos estupefacientes realizadas em data anterior às intervenções policiais e destinava-se a ser repartida entre estes e o arguido AA.
37. Os objetos apreendidos a BB e CC, nas circunstâncias descrita supra, destinavam-se a acondicionar produto estupefaciente que estes, conjuntamente com AA comercializavam a terceiros.
38. Os telemóveis apreendidos aos arguidos eram por estes utilizados para estabelecerem contactos na atividade de tráfico que vêm desenvolvendo.
39. Os arguidos conhecem a natureza dos produtos estupefacientes que comercializam, bem como que detêm e não ignoram que não os podem adquirir, deter, vender e ou ceder a terceiros.
40. Os arguidos não estavam legalmente autorizados a deter ou vender as substâncias identificadas, conheciam os factos descritos e quiseram agir como agiram.
41. Apesar de estarem cientes da natureza estupefaciente dos produtos em causa, os arguidos lograram possuí-los e vendê-los a troco de dinheiro, obtendo assim lucros financeiros, o que representaram e quiseram.
42. Os arguidos atuaram de forma livre, concertada, deliberada e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.
43. Por acórdão proferido em 08.03.2023, no âmbito do processo n.º 32/19.5..., do Juízo Central Criminal e Cível de ..., Juiz ..., transitado em julgado em 13.07.2023, o arguido AA foi condenado, pela autoria material de um crime de tráfico de estupefacientes (art.º 21.º, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22.01) na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão efetiva, por factos praticados entre inícios do ano de 2018 e 04.04.2022.
44. Pelo mesmo acórdão, BB foi condenado, em autoria material, entre o mais, na prática de um crime de tráfico de menor gravidade (artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22.01) na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmo período e com regime de prova voltado para a sua consciencialização para o cumprimento das regras da sociedade e respeito pelo direito vigente, com obrigação de ter um comportamento proactivo no sentido da sua integração laboral e que integrará, obrigatoriamente, plano de tratamento à sua toxicodependência com testes de abstinência periódicos, tudo sob a supervisão da DGRS (artº.50º, nº.5 e 53º, ambos do Código Penal), por factos praticados entre inícios desde pelo menos março de 2019 e 04.04.2022.
45. Não decorreram mais do que 5 anos entre a data da prática do crime pelos quais os arguidos BB e AA foram condenados e a prática dos factos aqui descritos.
46. Ao praticarem o crime pelo qual vêm agora acusados, os arguidos demonstraram não ter atribuído qualquer valor à decisão judicial que anteriormente já os tinha condenado por crime da mesma natureza, não tendo aquela produzido, ao nível da prevenção especial, o almejado efeito, uma vez que os arguidos BB e AA permanecem insensíveis aos valores que a incriminação que agora lhes é imputada visam proteger.
47. As condenações anteriormente sofridas não foram advertência suficiente para os demover de continuarem na prática de atos desta natureza, pois volvidos poucos meses cometeram o novo crime.
Das condições pessoais de AA:
48. À data dos factos, o arguido residia no contexto familiar de origem, após ter-se separado da companheira, relação que durou cerca de 14 anos. O agregado familiar de origem era constituído pela progenitora e 2 irmãos, um dos quais coarguido no presente processo. Posteriormente e de forma temporária, o filho do arguido, CC, coarguido neste Processo, integrou também este agregado.
49. A habitação está integrada numa zona caracterizada por diversas problemáticas sociais. Socialmente o arguido detém uma imagem de associação à problemática dos estupefacientes, assim como um dos irmãos.
50. À data dos factos, o arguido não desenvolvia qualquer atividade profissional, nem tinha ocupação estruturada, dependendo economicamente do suporte dos familiares, nomeadamente da pensão de viuvez da progenitora e do salário do irmão, num total mensal de cerca de 1000€.
51. Ao arguido foi aplicada medida de coação de obrigação de permanência na habitação com vigilância eletrónica, à ordem do processo 32/19.5..., a qual decorreu entre 18.4.2022 e 1.2.2024, encontrando-se presentemente em cumprimento efetivo de pena à ordem desse processo.
52. No período que antecedeu a medida de coação, o arguido refere que passava o tempo na rua, na companhia de pares associados ao consumo de estupefacientes, adotando um estilo de vida de características marginais.
53. À data dos factos, o arguido apresentava dificuldades de contenção aditiva, com recaídas no consumo de haxixe e heroína, pese embora se encontrasse com acompanhamento terapêutico, através da Associação ..., ainda que sem aderir à toma de qualquer antagonista. Já em meio prisional veio a apresentar resultados positivos no despiste de estupefacientes.
54. AA iniciou o consumo de estupefacientes com cerca de 19 anos, haxixe e com cerca de 22 anos, passou a consumir heroína, tendo vivenciado ciclos de abstinência e recaídas. Apesar de ter sido alvo de intervenção no âmbito da saúde, quer em ambulatório, na Associação ..., quer em regime de internamento (em 2007, 2008, 2009, 2013, 2018, 2019, e 2022) na Clínica de ... e em clínica privada em território continental português, foi registando sucessivas recaídas.
55. O arguido considera um período mais estável ao nível dos consumos, no período de vivência marital, contudo a problemática aditiva e as recaídas, determinariam a separação do casal.
56. O arguido é o quinto de 6 filhos, originário dum contexto familiar, cuja dinâmica familiar foi descrita como positiva, tendo o arguido referido manter relação afetiva gratificante com a família, situação que resulta, no seu entender, dum contexto afetuoso e organizado e adequada imposição de regras. Tal facto não invalidou, no entanto, os constrangimentos associados à precariedade material da família, sendo o pai, já falecido, único suporte económico do agregado (trabalhador rural, com parcos rendimentos).
57. AA realizou um percurso escolar com a idade regular, marcado por acentuadas dificuldades de aprendizagem e pelo absentismo, tendo concluído o 6º ano de escolaridade com cerca de 17 anos de idade.
58. Iniciou o percurso laboral, na construção civil, como pintor. O percurso laboral foi, entretanto, condicionado não só pela baixa escolaridade, como também pela problemática da toxicodependência, com que se confronta, desde os 19 anos de idade, com consumos de haxixe e, posteriormente, de heroína. Assim, foi remetido para um enquadramento laboral muito precário, realizando tarefas de pintor da construção civil, a título ocasional, cuja irregularidade foi definida como muito acentuada e cujos rendimentos foi revertendo para a alegada aquisição de produtos estupefacientes. Desde o regresso a casa da progenitora, que se acentuou a inatividade do arguido, sem perspetivas de melhoria ao nível da inserção laboral.
59. Com cerca de 21 anos constituiu uma relação marital com QQ, contexto em que tem 3 filhos.
60. Apesar da relação ter terminado (em 2017) por questões relacionadas com a toxicodependência e do estilo de vida a ela associado assumido pelo arguido, os filhos com 20 anos, gémeos e o mais novo de 14 anos, mantiveram contacto regular com o pai.
61. Presentemente AA encontra-se em cumprimento duma pena de prisão de 4 anos e 6 meses à ordem do processo 32/19.5..., em reclusão desde fevereiro passado.
62. Em contexto prisional indiciou dificuldades quanto à contenção aditiva, denotando, no entanto, alguma capacidade de adaptação ao meio prisional, tendo, entretanto, iniciado frequência do 3º ciclo.
63. O arguido é um indivíduo que indicia algumas limitações em termos de competências pessoais e sociais, com desvalorização da problemática aditiva na estruturação da sua situação e com uma frágil consciência crítica e lacunas em termos de descentração.
64. Em meio livre manifesta intenção de retomar a atividade laboral na construção civil, eventualmente deslocando-se para a Bélgica.
65. Já foi julgado e condenado:
a) por sentença de 18.11.2008, por crime de furto qualificado praticado em 3.2.2003, na pena de 2 anos de prisão suspensa na sua execução;
b) por sentença de 15.6.2009, por crime de tráfico de estupefacientes praticado em 19.2.2008, na pena de 1 ano e 2 meses de prisão suspensa na sua execução;
c) por sentença de 26.5.2011, por crime de condução sem habilitação legal praticado em 16.7.2009, na pena de 10 meses de prisão substituída por trabalho;
d) por sentença de 18.3.2013, por crime de falsidade de testemunho praticado em 12.4.2012, na pena de 200 dias de multa;
e) por sentença de 7.11.2014, por crime de furto qualificado praticado em 6.3.2013, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão suspensa na sua execução;
f) por sentença de 18.6.2018, por crime de furto qualificado praticado em 8.6.2017, na pena de 1 ano de prisão suspensa na sua execução;
g) por acórdão de 08.03.2023, pelo crime de tráfico de estupefacientes praticado em 2022, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão.
*
Determinação da pena
“Cumpre determinar a medida das penas a aplicar aos arguidos, uma vez que a todo o crime corresponde uma reação penal, pela qual a comunidade expressa o seu juízo de desvalor sobre os factos e a conduta realizada pelo agente.
A determinação definitiva da pena é alcançada através de um procedimento que decorre em três fases distintas: na primeira investiga-se e determina-se a moldura penal aplicável ao caso (medida abstrata da pena); na segunda investiga-se e determina-se a medida concreta (dita também individual ou judicial); na terceira escolhe-se (de entre as penas postas à disposição do legislador e através dos mecanismos das penas alternativas ou penas de substituição) a espécie de pena que, efetivamente, deve ser cumprida (Figueiredo Dias, Direito Penal – As consequências jurídicas do crime, Tomo II, Coimbra Editora, pág. 229).
Vejamos, em concreto, estas diversas etapas, para os crimes praticados pelos arguidos.
O crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo artigo 21º, nº1do Decreto-Lei nº15/93, de 22 de janeiro, é punido com pena de 4 a 12 anos de prisão.
Já o crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, previsto e punido no artigo 25º, alínea a), do Decreto-Lei 15/93, de 22 de janeiro, é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos.
Contudo, e tendo os arguidos AA e BB sido condenados por sentença transitada em julgado a 27/07/2023, por factos praticados entre março de 2019 e o ano de 2022, consubstanciadores do crime de tráfico de estupefacientes, teremos necessariamente de aplicar a norma do artigo 79º, nº2 do Código Penal: se, depois de uma condenação transitada em julgado, for conhecida uma conduta mais grave que integre a continuação, a pena que lhe for aplicável substitui a anterior.
Sendo os factos do processo 32/19.5... contemporâneos com os que aqui se julgam, dúvidas inexistem que estamos perante uma continuação, pelo que tais factos serão tidos aqui em consideração na fixação das penas que irão substituir as anteriores, o que impede a aplicação do regime da reincidência.
Atendendo a que à data da prática dos factos o arguido CC era menor de 21 anos, cabe averiguar se existem razões para lhe aplicar o regime especial para jovens com idade compreendida entre os 16 e os 21 anos, criado pelo Decreto-Lei nº 401/82, de 23 de setembro.
A atenuação especial prevista no artigo 4º do citado diploma tem como pressuposto a existência de sérias razões para crer que da atenuação resultam vantagens para a reinserção social do jovem condenado.
Porém, a atenuação não é de aplicação automática, requerendo um juízo de alta probabilidade de que o abrandamento da pena irá favorecer a reinserção dos jovens condenados. Isto porque a aplicação deste regime especial passa pela reinserção do agente e pela sua responsabilização em função da sua culpa, não pela sua “desculpabilização”.
E, efetivamente, atenta a gravidade dos factos e a sua condenação criminal, tudo aliado ao teor do relatório social (onde se escreve que revela Perante um eventual desfecho judicial que promova a restituição do arguido à liberdade, é manifestada a preocupação dos familiares face ao seu eventual regresso ao meio vicinal, nomeadamente da mãe do arguido, QQ, que não se encontra disponível para receber o filho, caso este seja restituído à liberdade a curto prazo), nada nos factos nos faz concluir pela existência de circunstâncias que diminuam de forma particularmente relevante as exigências de prevenção geral.
Em face do exposto, entende este Tribunal não estarem reunidos os pressupostos necessários para que se faça uma prognose suficientemente favorável no que concerne à ressocialização do arguido, razão pela qual se considera não ser de proceder à atenuação especial da pena, prevista pelo artigo 4º do Decreto-Lei 401/82, de 23 de setembro.
Uma vez que o crime de tráfico é apenas punível com pena de prisão, não há que proceder à escolha da pena nos termos explanados no artigo 70º, nº 1 do Código Penal, passando-se, de imediato, à determinação da medida daquela pena, que se mostre adequada ao comportamento do arguido, atendendo-se, nos termos do artigo 71º, nº 1, do Código Penal, à culpa do agente e às exigências de prevenção, não olvidando que a medida da pena jamais pode ultrapassar a medida da culpa (artigo 40º, nº 2 do Código Penal).
(…)
No caso em análise, as exigências de prevenção geral são extremamente elevadas, devido à frequência com que este tipo de crime é praticado. Segundo o Relatório Anual de Segurança Interna de 2023, o tráfico de estupefacientes continua a ser um dos crimes mais frequentes no nosso país. Acresce referir que, em particular nesta comarca dos Açores, o tráfico de estupefacientes assume valores cada vez mais preocupantes, sendo do conhecimento geral da população esta realidade. Dada a grande incidência deste tipo de crime, como são expressão os dados referidos, são acentuadas as exigências de prevenção geral no sentido de fazerem apelo a uma maior necessidade de sancionamento para que se restabeleça a confiança, validade e eficácia na norma jurídico-penal violada, sendo ainda premente uma eficaz proteção e tutela do bem jurídico violado.
No que concerne às exigências de prevenção especial ou individual, e quanto aos arguidos AA e BB há que atender ao grau de ilicitude da conduta, que, para além do que já é valorado pelo tipo legal de crime e respetiva moldura abstrata, é acentuado em face das quantidades e qualidade vendidas e do período de tempo em que procederam à venda, suscetível de lesar a saúde de número indeterminado de consumidores. Quanto à intensidade da culpa, a mesma é elevada, porquanto os arguidos agiram com dolo direto e, mesmo após julgamento e buscas policiais (aqui quanto ao arguido BB), continuaram as respetivas atividades. Acresce que os mesmos não desempenham qualquer atividade licitamente remunerada há diversos anos, sendo o apoio familiar inexistente. Não podemos ainda ignorar os já longos antecedentes criminais do arguido AA, sendo que os do arguido BB se referem ao crime cuja continuação aqui se verifica.
No que diz respeito ao arguido CC, há que atender ao dolo com que agiu – direto e intenso – e ao grau de ilicitude que é elevado, se atendermos que ao período de tempo que durou a atividade, bem como à persistência da atividade após as buscas. A seu favor abona unicamente a sua juventude.
Face ao exposto, decide o Tribunal condenar os arguidos nas seguintes penas:
• AA: 6 anos de prisão,
• BB: 5 anos e 6 meses de prisão,
• CC: 3 anos e 6 meses de prisão.”
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Colhidos os Vistos, efectuada a Conferência, cumpre apreciar e decidir.
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Das conclusões, delimitadoras do respectivo objecto, extrai-se que o recurso do arguido/condenado AA se circunscreve à medida da pena, pedindo a sua redução.
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Em síntese, encontra-se provado que o aqui recorrente AA, em conjunto com o seu irmão BB, pelo menos desde Março de 2019, até 01/02/2024, dedicaram-se à venda de produtos estupefacientes — designadamente heroína, e uma substância denominada “(alfa)-PHP” —, na sua residência, na ...-Açores, onde guardavam o estupefaciente que vendiam, e lhes era fornecido diariamente.
Em concreto, durante o ano de 2023, entregaram ao DD “um número indeterminado de pacotes individuais de (alfa)-PHP” (e pelo menos uma vez receberam a quantia de 5€).
Desde 2022, o AA entregou ao EE mais de cem pacotes individuais “de (alfa)-PHP”, recebendo €5,00, por cada pacote.
Desde 2023, entregaram ao RR cerca de 10 pacotes de “(alfa)-PHP”, recebendo €5,00, por cada pacote.
Desde 2023, entregaram ao GG cerca de 20 pacotes de “(alfa)-PHP”, recebendo €5,00, por cada pacote.
Desde 2023, entregaram ao HH cerca de 4 pacotes de “(alfa)-PHP”, recebendo €5,00, por cada pacote.
Desde 2023, entregaram à II cerca de “dez vezes, quantidades não concretamente apuradas de pacotes de (alfa)-PHP”, recebendo €5,00, por cada pacote.
Entre meados de 2023 e início de 2024 venderam ao JJ “cerca de seis vezes, quantidades não concretamente apuradas de pacotes de (alfa)-PHP”, recebendo €5,00, por cada pacote.
Desde meados de Agosto de 2023, venderam ao KK, cerca de 50 pacotes de “(alfa)-PHP”, recebendo €5,00, por cada pacote.
Em 31/01/24 o FF detinha “0,056 gramas de (alfa)-PHP e 0,084 gramas de heroína. A (Alpha)-PHP”, tendo pago €5,00.
Em 03/06/23, o GG detinha “0,081 gramas de (alfa)-PHP” que havia adquirido ao BB, por €5,00.
Em 03/06/23 o LL detinha “0,383 gramas de (alfa)-PHP” que havia adquirido ao BB, por €20,00.
Em 03/06/23 o BB “detinha: 4 panfletos em plástico, contendo no seu interior 0,269 gramas de (alfa)-PHP, e a quantia de €60,00, repartida em notas 5 notas de €10,00 e 10 moedas de €1,00)”.
Em 21/03/23 o MM adquiriu um panfleto de (alfa)-PHP ao BB, por €5,00.
Em 03/07/23, o NN “detinha um panfleto de plástico, contendo no seu interior 0,067 gramas de (alfa)-PHP”, adquirido ao AA por €5,00.
Em 03/07/23 o HH “detinha um panfleto de plástico, contendo no seu interior 0,233 gramas de (alfa)-PHP”, adquirido ao BB por €10,00.
Em 04/07/23 a OO “detinha dois panfletos de plástico, contendo no seu interior 0,124 gramas de (alfa)-PHP”, adquirido ao BB por €5,00.
Em 16/08/23 a II e o JJ “detinham um panfleto de plástico, contendo no seu interior 0,867 gramas de (alfa)-PHP”, adquirido ao BB por €90,00.
No dia 31/08/23 o DD “detinha dois panfletos de plástico, contendo no seu interior 0,109 gramas de (alfa)-PHP”, adquiridos ao AA por €5,00, cada pacote.
No dia 31/01/24 o FF detinha no seu automóvel “um panfleto de plástico com 0,056 gramas de (alfa)-PHP, e um panfleto de plástico, com 0,084 gramas de heroína. A (alfa)-PHP, ao BB e ao AA, na residência destes, por €5,00 cada”.
Após a detenção do aqui recorrente em 01/02/2024, o BB passou a ser auxiliado pelo filho do recorrente e seu sobrinho, CC.
O AA foi condenado, por decisão de 08/03/23, pela prática entre 2018 e 04/04/2022 de um crime de tráfico de estupefacientes, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão, efectiva.
Encontra-se em cumprimento desta pena, desde 01/02/24.
Não tinha “qualquer actividade profissional”, nem “ocupação estruturada”, esteve sujeito à medida “de obrigação de permanência na habitação”, entre 18/04/22 e 01/02/24, no âmbito do processo em que se encontra em cumprimento de pena.
Apresentou hábitos de consumo de drogas desde os 19 anos.
Tem outras condenações pela prática anterior de 3 crimes de furto qualificado, 2 crimes de tráfico de estupefacientes, 1 crime de falsidade de testemunho e 1 crime de condução sem habilitação legal.
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O recorrente encontra-se condenado pela prática de um tráfico de substâncias estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21º, nº 1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22/01, com referência às Tabelas I-A e II-A — numa moldura entre 4 e 12 anos —, na pena de 6 anos de prisão.
No recurso, circunscrito à medida da pena, escreve-se que “o limite do necessário para assegurar a proteção dessas expectativas será encontrado de um modo mais justo e equitativo de molde a saciar por um lado, o absolutamente imprescindível para realizar a necessidade de prevenção geral sob a forma de defesa da ordem jurídica, e por outro, de modo a satisfazer as necessidades de prevenção especial. Pelo que à luz destes critérios, a pena de 6 (seis) anos afigura-se bastante excessiva”.
Acrescenta-se que “encontrada a moldura da pena, fixada em função das exigências de prevenção geral positiva, devem então funcionar as exigências de prevenção especial, em particular, as
exigências de prevenção especial positiva ou de socialização, para a determinação concreta da pena, tendo sempre presente que a culpa representa o limite inultrapassável da mesma”.
Termina-se pedindo a redução da pena “para uma pena inferior”, “em ordem a que seja mais adequada aos critérios de justiça que o caso em concreto reclama”.
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Vejamos:
O sintetizado argumentário é composto por asserções genéricas, destituídas da necessária concretização, que, por isso, nada acrescentam.
Não obstante isso, referencie-se, de forma breve, a ilicitude da provada conduta do recorrente e as exigências preventivas especiais e gerais.
Começando pela ilicitude, e partindo da previsão típica, o art.º 21º, nº 1 do DL 15/93, de 22/01 — constitui o tipo base do crime de tráfico de estupefacientes —, verificamos que integra as seguintes modalidades de acção (bastando, para o respectivo preenchimento, a prática não autorizada de alguma delas): cultivar; produzir; fabricar; extrair; preparar; oferecer; puser à venda/vender; distribuir; comprar; ceder; receber; proporcionar a outrem/propício; transportar; importar; exportar; fazer transitar/transitar; ilicitamente detiver/deter, produtos estupefacientes.
Como é evidente, embora façam parte do tipo, não é irrelevante que só uma, ou mais, sejam preenchidas.
Assim, a provada actividade do AA inscreve-se nas seguintes modalidades da acção:
— Detenção ilícita para venda;
— Distribuição e venda, consubstanciada em mais de 20 acções de venda ou entrega directa.
Na avaliação da ilicitude deve ainda ter-se em conta as circunstâncias da acção: constata-se que a detenção ilícita, distribuição e venda de estupefacientes, durou por um alargadíssimo período de tempo (desde Março de 2019, até 01/02/2024), sendo concretamente descritas — como já referido — mais de 20 vendas e entregas directas.
Deve, também, ter-se em conta os meios utilizados: verificamos que o AA dispunha da colaboração do irmão BB, efectuava a actividade na residência de ambos, onde, posteriormente, foram encontrados vários artefactos destinados à divisão da droga e à preparação da mesma para consumo.
Por último e quanto à espécie das drogas traficadas, verificamos que se traficava heroína e, principalmente, uma substância denominada “(alfa)-PHP”, preparado químico à base de (Catinona (—) aminopropiofenona), incluída na tabela II-A, conhecida na gíria da droga por “bloom”; droga de alto poder aditivo e viciante, gravemente danosa para a saúde e despoletadora de uma alta potencialidade criminosa.
Todos estes indicadores de tráfico representam um tráfico frequente e duradouro, e comportam um significativo grau de ilicitude.
Em conjugação, as exigências preventivas especiais mostram-se considerávelmente elevadas, registando-se aqui uma recorrência na actividade de tráfico (a que se junta a prática de outros crimes contra o património e as pessoas) e, mais grave ainda, o tráfico aqui sob punição foi efectuado quando o arguido estava sujeito a uma medida de coacção de permanência na habitação, num outro processo por tráfico de estupefacientes.
Revela, assim, um total desrespeito e indiferença pela medida de coacção a que estava sujeito (o que não só agrava as exigências preventivas, como também funciona como agravante ao nível da culpa).
As exigências preventivas gerais são elevadas, o tráfico de droga é uma das fontes principais de criminalidade, directa e indirecta no nosso País, gerando grande insegurança e intranquilidade na Comunidade, nomeadamente na dos Açores, onde os crimes foram praticados.
Considerando todos estes factores de medida da pena, mostra-se evidente que a pena de 6 anos de prisão, não requer qualquer diminuição.
Em conclusão, o recurso mostra-se improcedente.
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Nos termos relatados, decide-se julgar improcedente o recurso interposto em representação do AA.
Mantém-se, na íntegra, o Acórdão recorrido.
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Custas pelo recorrente, fixando-se a Taxa de Justiça em 5 UC’s.
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Lisboa, 15/05/2025
José Piedade (relator)
Ernesto Nascimento
Jorge Jacob