DIREITO DE REGRESSO DA SEGURADORA
PRAZO DE PRESCRIÇÃO
Sumário

1. O prazo de prescrição do direito do lesado é o previsto no n.º 1 do art.º 498º do CC e pode ser alongado nos termos do seu n.º 3.
2. O direito de regresso da seguradora que satisfez uma indemnização decorrente de contrato de seguro, direito esse fundado no art.º 27º, n.º 1, alínea c), do DL n.º 291/2007, de 21.8, está sujeito ao prazo de prescrição de três anos, previsto no n.º 2 do art.º 498º do CC, não se aplicando a extensão do seu n.º 3.
3. O instituto jurídico da prescrição tem como fundamento a reação da lei contra a inércia ou o desinteresse do titular do direito, que o torna não merecedor de proteção jurídica, visando assim sancionar o credor pouco diligente, no interesse da clarificação, estabilização e segurança das relações jurídicas, quando não exerça o seu direito dentro de determinado prazo fixado por lei.
(Sumário elaborado pelo Relator)

Texto Integral

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Relator: Fonte Ramos
Adjuntos: Carlos Moreira
              Alberto Ruço

           

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:        

           I. Em 27.3.2024, A..., S. A. - Sucursal em Portugal, intentou a presente ação declarativa comum contra AA, pedindo que seja condenado a pagar-lhe € 17 693,26 e respetivos juros de mora.

           Alegou, em síntese: celebrou um contrato de seguro automóvel assumindo a responsabilidade civil decorrente da circulação do veículo automóvel com a matrícula ..-GG-..; no dia 13.10.2018, ocorreu um acidente de viação, no qual foram intervenientes o veículo automóvel seguro na A., conduzido pelo Réu, e o veículo automóvel com a matrícula ..-IG-.., conduzido por BB; o Réu foi submetido a teste de pesquisa de álcool no sangue, tendo acusado uma taxa de 0,99 g/l; o Réu foi o único e exclusivo culpado pela produção do acidente descrito nos autos, por ter exercido a condução com uma taxa de álcool no sangue superior ao limite legalmente permitido e, por via disso, por conduzir totalmente desatento e alheado às características e condições da via e ao trânsito que se processava ao seu redor, com os reflexos e discernimento altamente diminuídos, perdendo o controlo do veículo que conduzia, despistando-se e embatendo naquele outro veículo; para regularização do referido sinistro, despendeu a quantia global de € 17 693,26; pelo facto de o Réu circular com uma TAS de 0,99 g/l, superior ao máximo permitido por lei, estão preenchidos todos os requisitos previstos no artigo 27º, n.º 1, alínea c), do DL n.º 291/2007, de 21.8 e do artigo 25º, alínea c), das Condições Gerais da Apólice, assistindo à A. o direito de regresso sobre o Réu da totalidade das quantias despendidas para regularização do sinistro.

            O Réu contestou, designadamente, por exceção, alegando, além do mais, que a A. dispunha do prazo de três anos para instaurar a presente ação, tendo proposto a ação quando tal prazo já havia decorrido integralmente, pelo que um eventual direito da A., de ser reembolsada pelas quantias que despendeu para a regularização do acidente de viação, se encontra prescrito.

           No exercício do contraditório, a A. referiu, nomeadamente: o prazo de prescrição apenas se iniciou na data em que foi efetuado o último pagamento a que se reporta o direito de regresso exercitado nos autos; em conformidade com o regime excecional decorrente do disposto nos art.ºs 4º e 6º-B, da Lei n.º 4-B/2021, de 01.02, a contagem do prazo de prescrição dos valores peticionados nesta ação beneficia ainda de um acréscimo de 74 (setenta e quatro) dias, em que vigorou a suspensão do prazo; os factos articulados integram diversos ilícitos criminais, estabelecendo a lei prazo de prescrição mais longo para os mesmos, nos termos do disposto no art.º 118º do Código Penal, pelo que, à luz do n.º 3 do art.º 498º do Código Civil, são aplicáveis os prazos ali previstos; o comportamento do Réu consubstanciou, nomeadamente, a prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo art.º 292º do Código Penal, de um crime de condução perigosa de veículo rodoviário, previsto e punido pelo art.º 291º do Código Penal e de três crimes de ofensa à integridade física simples, previstos e punidos pelo art.º 143º, n.º 1, do Código Penal, situações em que o prazo de prescrição é de 5 (cinco) anos, conforme dispõe o art.º 118º, n.º 1, alínea c), do Código Penal; a conduta do arguido integra igualmente a prática de um crime de ofensa à integridade física grave, previsto e punido pelo art.º 144º do Código Penal, situação em que o prazo de prescrição passa a ser de 10 (dez) anos, nos termos do artigo 118º, n.º 1, alínea b), do Código Penal; o direito de indemnização apenas prescreve no prazo mais longo de prescrição do respetivo procedimento criminal, que é aplicável aos responsáveis meramente civis como o comitente e a seguradora; o prazo de prescrição a convocar no presente caso é de 5 (cinco) anos ou de 10 (dez) anos, devendo julgar-se improcedente, nessa decorrência, a invocada exceção perentória de prescrição.

           Por saneador-sentença de 22.11.2024, o Tribunal a quo julgou procedente a exceção perentória de prescrição, absolvendo o Réu do pedido (por inexigível).

           Inconformada, a A.[1] apelou formulando as seguintes conclusões:

            1ª - No dia 13.10.2018, pelas 19.10 horas, na Avenida ..., ... ..., concelho ..., distrito ..., ocorreu um acidente de viação.

           2ª - No referido acidente foram intervenientes os seguintes veículos: o veículo automóvel (V1), ligeiro de passageiros, de matrícula ..-GG-.., conduzido por AA/Recorrido/Réu; e o veículo automóvel (V2), ligeiro de passageiros, de matrícula ..-IG-.., conduzido por BB.

           3ª - O Recorrido foi submetido a teste para despiste de álcool no sangue, tendo acusado a 0,99 g/l.

           4ª - Do acidente resultaram danos materiais nos veículos, nomeadamente no veículo n.º 2 e dois feridos leves.

           5ª - Por força do contrato de seguro existente entre a A./recorrente e o veículo ..-GG-.., a Recorrente procedeu ao ressarcimento dos danos verificados em sequência deste sinistro.

           6ª - Com os danos do veículo n.º 2 de matrícula ..-IG-.., que resultou em perda total, a Recorrente despendeu a quantia de € 8 900. Com despesas de saúde/ médicas, a Recorrente despendeu a quantia de € 2 344,44. Com indemnizações salariais, a Recorrente despendeu a quantia de € 2 944,18. Com a indemnização ao sinistrado (condutor do veículo n.º 2), a Recorrente despendeu a quantia de € 2 726,05. Com a Indemnização danos materiais - estabelecimento das condições de segurança rodoviária, com inerente limpeza/lavagem da via e remoção e tratamento dos resíduos, a Recorrente despendeu a quantia de € 240. Com indemnização por Paralisação/Lucro Cessante, a Recorrente despendeu a quantia de € 195. Com averiguações e peritagem, a A. despendeu a quantia de € 253,59.

            7ª - A Recorrente efetuou o último pagamento para regularização do sinistro em 11.01.2021.

           8ª - Nos termos dos art.ºs 27º n.º 1 alínea c) do DL n.º 291/2007, de 21.8 e 25º alínea) c das Condições Gerais da Apólice do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, estão preenchidos todos os pressupostos necessários para se considerar como verificado o direito de regresso que tem a Recorrente contra o Recorrido enquanto condutor do veículo seguro, porquanto realizava a sua condução sob a influência do álcool.

           9ª - A pretensão da Recorrente faleceu apenas devido ao entendimento de que o prazo de prescrição aplicável ao direito de regresso da seguradora, não é passível de ser alargado por via da aplicação do disposto no art.º 498º, n.º 3 do Código Civil (CC).

            10ª - A presente ação foi intentada em 27.3.2024 e o Recorrido foi citado em 03.4.2024.

           11ª - O tribunal a quo limitou-se a sustentar a decisão do não alargamento do prazo de prescrição por referência ao acórdão da RC de 12.4.2011-processo 1372/10.4T2AVR.C1, disponível em www.dgsi.pt.

           12ª - Não existem razões de forma e substância para que a extensão do prazo de prescrição concedido no âmbito do estatuído no art.º 498º, n.º 3 CC não lhe seja aplicável.

           13ª - O Recorrido na sequência do sinistro dos presentes autos não só cometeu um ilícito, civil, violando o disposto no art.º 81º do Código da Estrada entre outros, como praticou factos passiveis de serem enquadrados como crimes, designadamente os previstos e punidos nos art.ºs 291º e 292º, n.º 1 do Código Penal.

            14ª - Estão assim preenchidos os requisitos do disposto no art.º 498º, n.º 3 do CC.

            15ª - O Legislador no art.º 498º do CC começou, no seu n.º 1, por desenhar aquele que será o regime regra para a contagem do prazo de prescrição no que à responsabilidade civil extracontratual diz respeito.

            16ª - No seu n.º 2, estabeleceu o regime regra para a contagem do prazo de prescrição nos casos em que, cumprida a obrigação, exista direito de regresso entre os responsáveis.

           Ora, o n.º 3 do art.º 498º do Código Civil surge como uma exceção aos prazos anteriormente indicados, estabelecendo um desvio aos regimes regra.

           17ª - Tudo o que é referido pela Recorrente tem respaldo Jurisprudencial, nos Acórdãos da RC de 11.12.2009-processo 4811/07.8TBAVR.C1 e de 12.7.2011-processo 444/07.7BFVN.C1.

           18ª - Não tendo havido qualquer alteração ao disposto no art.º 498º do CC, não se entende como pode ser afastado o alargamento do prazo de prescrição às situações de Direito de Regresso.

           19ª - Face ao exposto, resulta da lei e é jurisprudência assente que em casos como o sub judice o direito de indemnização apenas prescreve no prazo mais longo de prescrição do respetivo procedimento criminal, previsto no n.º 3 do art.º 498º, aplicável aos responsáveis meramente civis como o comitente e a seguradora, conforme tem decidido a Jurisprudência do STJ.

           20ª - Sendo assim, o alongamento do prazo prescricional do direito à indemnização estabelecido no n.º 3 do artigo 498º do CC assenta numa base de caráter inegavelmente pessoal, porque radica na especial gravidade do facto ilícito danoso praticado pelo agente.

           21ª - Conclui-se, por isso, que no presente caso o prazo de prescrição é de 5 anos - por força do n.° 3 do art.° 498º do CC -, pelo que torna-se imperioso concluir que, à data de apresentação da presente ação, encontrava-se a Recorrente em tempo para reclamar o reembolso dos montantes despendidos com a regularização do acidente dos presentes autos, prazo que iniciou a sua contagem no último pagamento em 12.01.2021.

           22ª - A Recorrente encontra-se a exercer o direito de regresso, direito esse que é tempestivo, posto que o prazo prescricional a que está sujeita é o de cinco anos, sendo certo que este prazo só deve contar-se a partir do momento em que a Recorrente fez os pagamentos que reclama.

           23ª - O direito de regresso funda-se em responsabilidade extracontratual por facto considerado crime.

           24ª - O Recorrido, com a sua conduta, obrigou a Recorrente a assumir uma obrigação perante um terceiro que extrapola aquela que foi pela mesma assumida, sendo que essa mesma conduta decorre da violação de normativos que o fazem incorrer em ilícitos civis e criminais.

           25ª - A Recorrente com a conduta do Recorrido sofreu danos, tendo de ser, por essa evidente razão, considerada como lesada, pelo que é difícil aceitar o afastamento do direito de regresso às situações abrangidas pelo art.º 498º, n.º 3 do CC, quando no mesmo passo, decisões existem em que tal extensão do prazo de prescrição é aceite para situações onde o conceito de lesado só existe por via de interpretação jurisprudencial, como é o caso do Acórdão da RG de 08.02.2018-processo 1852/17.0T8GMR-A.G1.

           26ª - Assim, a ação de direito de regresso beneficia do alargamento do prazo prescricional de 5 anos, devendo improceder a exceção de prescrição.

           27ª - A decisão recorrida deverá ser revogada porque não respeita uma correta subsunção dos factos alegados ao direito aplicável, enfermando do vicio de má interpretação da lei, em violação do disposto no art.° 498º, n.º 3, do CC.

            28ª - Deverá ser concedido provimento ao recurso, revogando a decisão do Tribunal de 1ª Instância e condenando o Recorrido a pagar a indemnização peticionada pela Recorrente.

            O Réu respondeu concluindo pela improcedência do recurso.

           Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objeto do recurso[2], importa apreciar e decidir se o direito de regresso invocado pela A. se encontra prescrito e, neste contexto, se é aplicável às ações de regresso o alongamento do prazo previsto no art.º 498º, n.º 3 do Código Civil.


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            II. 1. A 1ª instância deu como provados os seguintes factos:

           1) A autora demandou o réu, pedindo a sua condenação a pagar-lhe a importância de € 17 693,26, acrescida de juros de mora vencidos desde a data de citação, até integral pagamento, invocando, para esse efeito, assistir-lhe direito de regresso sobre o réu da totalidade dos montantes despendidos para regularização do acidente descrito nos presentes autos.

            2) A presente acção foi proposta em 27.3.2024.

           3) O último pagamento efetuado pela autora para regularização do acidente descrito nos presentes autos, no montante de € 790,90, ocorreu em 11.01.2021.

            4) O réu foi citado para contestar os termos da presente ação no dia 03.4.2024.

            2. Cumpre apreciar e decidir.

           Satisfeita a indemnização, a empresa de seguros apenas tem direito de regresso - entre outras situações tipificadas neste normativo - contra o condutor, quando este tenha dado causa ao acidente e conduzir com uma taxa de alcoolemia superior à legalmente admitida, ou acusar consumo de estupefacientes ou outras drogas ou produtos tóxicos (art.º 27º, n.º 1, alínea c), do DL n.º 291/2007, de 21.8, sob a epígrafe “Direito de regresso da empresa de seguros”).[3]         

            3. São nulos os negócios jurídicos destinados a modificar os prazos legais da prescrição ou      a facilitar ou dificultar por outro modo as condições em que a prescrição opera os seus efeitos (art.º 300º do CC).

           O tribunal não pode suprir, de ofício, a prescrição; esta necessita, para ser eficaz, de ser invocada, judicial ou extrajudicialmente, por aquele a quem aproveita, pelo seu representante ou, tratando-se de incapaz, pelo Ministério Público (art.º 303º).

            Completada a prescrição, tem o beneficiário a faculdade de recusar o cumprimento da prestação ou de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito (art.º 304º, n.º 1).

           O prazo da prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido (art.º 306º, n.º 1, 1ª parte).

            O direito de indemnização prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respetivo prazo a contar do facto danoso (art.º 498º, n.º 1). Prescreve igualmente no prazo de três anos, a contar do cumprimento, o direito de regresso entre os responsáveis (n.º 2). Se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo, é este o prazo aplicável (n.º 3).

           4. A nossa lei prevê a regra de que todos os direitos estão sujeitos a prescrição e admite a distinção entre prescrição e caducidade, ao dispor, designadamente, que estão sujeitos a prescrição, pelo seu não exercício durante o lapso de tempo estabelecido na lei, os direitos que não sejam indisponíveis ou que a lei não declare isentos de prescrição (art.º 298º, n.º 1 do CC).

            Não importando aqui considerar as diferenças de regime entre os referidos institutos, dir-se-á ainda que a prescrição extintiva dirige-se fundamentalmente à realização de objetivos de conveniência ou oportunidade e, diversamente da caducidade, parte, também, da ponderação de uma inércia negligente do titular do direito em exercitá-lo e que se conjuga com o interesse objetivo numa adaptação da situação de direito à situação de facto, ao passo que, na caducidade, só o aspeto objetivo da certeza e segurança é tomado em conta.[4]

            5. A questão do recurso dividiu a jurisprudência, mas, a partir do final da primeira década deste século, encontrou orientação uniforme no Supremo Tribunal de Justiça (STJ).

           Assim, analisada a jurisprudência - do STJ e das Relações -, vejamos as linhas fundamentais da orientação prevalecente, que se afigura conforme à teleologia das normas aplicáveis e, naturalmente, aos interesses que ao direito cumpre regular e harmonizar:

           - Independentemente da natureza contratual ou extracontratual do direito de regresso, este tem uma disposição expressa a fixar o prazo de prescrição e que é o previsto no n.º 2 do art.º 498º do CC, pelo que se não lhe aplica o prazo ordinário de prescrição previsto no art.º 309º do CC que apenas tem aplicação aos casos em que a lei expressamente não tenha fixado prazo diverso.

            - Foi com o propósito de obviar ao enriquecimento infundado à custa da seguradora - que garantiu a indemnização devida aos lesados em acidente de viação -que o 27º, n.º 1, alínea c), do DL n.º 291/2007, de 21.8 (anteriormente, o art.º 19º do DL n.º 522/85, de 31.12) instituiu a possibilidade de exercício de direito de regresso contra o segurado.

           - Efectivamente, e à luz da instituição da obrigatoriedade da contratação de seguro de responsabilidade civil contra terceiros, sentiu o legislador a necessidade de contrabalançar a eventual iniquidade da imposição, à seguradora, do pagamento de indemnizações resultantes de uma ação dolosa ou gravemente negligente por parte do segurado ou de outrem.

           - A seguradora responde pela indemnização que caberia ao seu segurado e queda titular de um direito de regresso contra ele cuja extensão será definida pela sua responsabilidade na eclosão do acidente e dos subsequentes danos, sempre que este tenha agido em violação do referido art.º 27º, n.º 1, do DL n.º 291/2007, de 21.8.

           - Desta forma, a matriz genérica da configuração do direito da seguradora é um mero reflexo do processamento do acidente e da própria atuação do segurado (em sede de culpa e das respetivas consequências em que o seu segurado o é). Com o que o direito de regresso, a desencadear, existirá em moldes similares à responsabilidade extracontratual do seu segurado que a obrigou a indemnizar os demais intervenientes.

            - A ratio do art.º 498º, n.º 1, do CC, mantém plena pertinência em face do direito de regresso exercido pela seguradora - “o direito à indemnização está sujeito a um prazo curto de prescrição (três anos). A prova dos factos que interessam à definição da responsabilidade (´an debeatur` e ´quantum debeatur`) em regra feita através de testemunhas, torna-se extremamente difícil e bastante precária a partir de certo período de tempo sobre a data dos acontecimentos e, por isso, convém apressar o julgamento das situações geradoras de dano ressarcível (Antunes Varela, Direito das Obrigações, Vol. I, Almedina, 10ª edição, 2000, pág. 625)”.

           - A conjugação do disposto nos art.ºs 3º e seguintes do DL n.º 291/2007, de 21.8 (sobre o “seguro obrigatório”) e 27º do mesmo diploma legal com a figura da prescrição (art.º 300º do CC), bem como a circunstância de inexistir qualquer menção, quer na legislação do seguro obrigatório, quer ao nível das condições particulares e gerais da apólice, de prazos prescricionais especiais ou concretos, faz-nos cair na aplicação daquele que se mostra previsto pelo regime geral, a saber, o do art.º 498º, n.º 2, do CC (3 anos) - ou seja, está previsto na lei um prazo geral de prescrição e vários casos especiais, entre os quais se conta o relativo ao direito de regresso.

           - Não estando previsto no diploma regulador do seguro obrigatório qualquer outro prazo de natureza excecional para o direito de regresso nele previsto não há fundamento para afastar a aplicação da norma do art.º 498º, n.º 2, do CC.

            - Não se justifica o alargamento do prazo prescricional do n.º 2 do art.º 498º do CC, pois, na ação de regresso, através da qual se pretende reaver as quantias indemnizatórias pagas aos lesados, não está já em causa, em termos diretos e imediatos, a responsabilidade civil extracontratual derivada do facto voluntário, culposo, ilícito, causal e lesivo, que, em rigor, já estará definida mas antes um segundo momento, subsequente à definição, em concreto, da dita responsabilidade.

           - Importa interpretar as disposições em causa utilizando os critérios do art.º 9º do CC. À primeira vista e utilizando o elemento literal de interpretação, podia-se dizer que a extensão do prazo prevista no n.º 3 do art.º 498º do CC, tanto se aplica ao prazo do n.º 1 (de prescrição do direito do lesado) como ao prazo previsto no n.º 2 (do direito de regresso), embora a interpretação contrária também seja admissível com aquela redação da lei. Porém, pela utilização do elemento lógico de interpretação (elemento racional) teremos de chegar a entendimento contrário.

           - A razão de ser da introdução do preceito do n.º 3 em causa visou alargar o prazo de prescrição do lesado quando o facto lesante constituía crime de gravidade acentuada que leve a que o prazo de prescrição do crime seja superior aos três anos fixados no n.º 1 - atento o princípio da adesão da dedução da indemnização civil no processo criminal, se o prazo de prescrição criminal ainda não decorreu, não se compreenderia que se extinguisse o direito à indemnização civil (conexa com o crime) e ainda estivesse a decorrer o prazo para a prescrição penal operar, onde o legislador entendeu dever ser deduzido o pedido de indemnização civil (dentro de certas limitações) (art.ºs 71º e 72º do CPP).

           - Daqui parece apontar para que a extensão do prazo de prescrição do n.º 3 referido apenas se justifica no prazo de prescrição do direito do lesado e não do direito de regresso.

           - Por outro lado, o direito de regresso em causa tem natureza diversa, é um direito autónomo em relação ao direito do lesado, nascido «ex novo”, com o pagamento do direito à indemnização ao ofendido, que assim se extinguiu fazendo nascer aquele direito de regresso.

           - Além disso, o momento a partir do qual começa a correr o prazo de prescrição é diverso, sendo no caso do direito do lesado o momento em que este teve conhecimento do direito que lhe compete, enquanto no direito de regresso começa a correr na data do cumprimento da obrigação para com o lesado.
           - A prescrição é um instituto jurídico pelo qual a contraparte pode opor-se ao exercício de um direito, quando este exercício não se verifique durante certo tempo indicado na lei e que varia consoante os casos (art.º 304º do CC) e este instituto tem como fundamento a reação da lei contra a inércia ou o desinteresse do titular do direito que o torna indigno de proteção jurídica (cf. M. J. de Almeida Costa, Direitos das Obrigações, 12ª edição (4ª reimpressão), Almedina, 2016, pág. 1123).

           - No caso do direito de regresso, este nada tem a ver com a fonte da obrigação extinta pela seguradora, cuja satisfação pela seguradora o fez nascer, direito de regresso este que a mesma veio exercer, sendo este direito de regresso independentemente da fonte do daquela obrigação extinta que pode ter origem em mera responsabilidade civil (nomeadamente pelo risco) ou pode resultar da prática de um crime grave com prazo alongado de prescrição penal.

          - Esta autonomia justifica que o interesse da lei em sancionar o credor pouco diligente - no interesse da clarificação, estabilização e segurança das relações jurídicas que está subjacente à adoção daquele instituto - leva a que a extensão do prazo de prescrição do n.º 3 mencionado se não justifique aplicar-se ao caso do direito de regresso em face da sua natureza diversa do direito do lesado em relação ao direito de regresso e da autonomia deste em relação à causa ou fonte daquele direito do lesado.

            - Desta forma se afigura que a melhor interpretação dos n.ºs 1, 2 e 3 do art.º 498º do CC aponta para que o prazo de prescrição do direito do lesado é o previsto no n.º 1 e pode ser alongado nos termos do seu n.º 3, mas que o prazo de prescrição do direito de regresso é sempre o previsto no seu n.º 2, mas não se lhe aplica a extensão prevista no n.º 3.[5]

           6. Não obstante, afigura-se que poderão existir situações cuja resposta razoável e materialmente justa aos interesses em presença implique uma especial ponderação das respetivas particularidades/especificidades (inclusive, a concreta atuação das partes), com uma porventura menor relevância (ou diferente leitura) daquelas orientações adotadas pela jurisprudência.[6]

           7. No caso em análise, a A. dispunha, há muito, de todos os elementos necessários à instauração da ação.

           A A. efetuou o último pagamento para regularização do sinistro no dia 11.01.2021; o prazo de prescrição do direito de regresso começou a correr no dia seguinte; a prescrição do direito de regresso invocado pela A. ocorreria, caso não houvesse quaisquer causas de interrupção ou de suspensão, no dia 12.01.2024; os prazos de prescrição estiveram suspensos entre os dias 22.01.2021 e 05.4.2021 (cf. art.ºs 6º-B, n.ºs 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, de 19.3 - na redação introduzida pela Lei n.º 4-B/2021, de 01.02 - e 4º da Lei n.º 4-B/2021, de 01.02; a Lei n.º 13-B/2021, de 05.4, revogou os art.ºs 6º-B e 6º-C, da Lei n.º 1-A/2020, de 19.3), num total de 74 dias. Retomada a contagem do prazo de prescrição do direito de regresso em 06.4.2021, conclui-se que o direito invocado pela A. se encontra prescrito desde 26.3.2024; a presente ação foi instaurada em 27.3.2024 - cf. II. 1. 2), supra - e o Recorrido/Réu foi citado no dia 03.4.2024.

           Esta a realidade temporal que não se questiona (cf., v. g., “conclusão 9ª”, ponto I., supra) e permite concluir pela prescrição (e consequente extinção) do direito que aqui se pretendia fazer valer (art.ºs 304º, n.º 1 e 498º, n.º 2, do CC e 576º, n.ºs 1 e 3, do CPC).      

           8. Improcedem, desta forma, as “conclusões” da alegação de recurso.


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           III. Face ao exposto, julga-se improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida.

            Custas pela A./apelante.


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29.4.2025


[1] Sob a denominação “B..., S. A. - Sucursal em Portugal”.

[2] Admitido “com subida imediata, nos próprios autos e com efeito devolutivo”.

[3] Preceitua o referido art.º (sob a epígrafe “Direito de regresso da empresa de seguros”): «1 - Satisfeita a indemnização, a empresa de seguros apenas tem direito de regresso: a) Contra o causador do acidente que o tenha provocado dolosamente; b) Contra os autores e cúmplices de roubo, furto ou furto de uso do veículo causador do acidente, bem como, subsidiariamente, o condutor do veículo objecto de tais crimes que os devesse conhecer e causador do acidente; c) Contra o condutor, quando este tenha dado causa ao acidente e conduzir com uma taxa de alcoolemia superior à legalmente admitida, ou acusar consumo de estupefacientes ou outras drogas ou produtos tóxicos; d) Contra o condutor, se não estiver legalmente habilitado, ou quando haja abandonado o sinistrado; e) Contra o responsável civil por danos causados a terceiros em virtude de queda de carga decorrente de deficiência de acondicionamento; f) Contra o incumpridor da obrigação prevista no n.º 3 do artigo 6.º; g) Contra o responsável civil pelos danos causados nos termos do n.º 1 do artigo 7.º e, subsidiariamente à responsabilidade prevista na alínea b), a pessoa responsável pela guarda do veículo cuja negligência tenha ocasionado o crime previsto na primeira parte do n.º 2 do mesmo artigo; h) Contra o responsável civil por danos causados a terceiros em virtude de utilização ou condução de veículos que não cumpram as obrigações legais de carácter técnico relativamente ao estado e condições de segurança do veículo, na medida em que o acidente tenha sido provocado ou agravado pelo mau funcionamento do veículo; i) Em especial relativamente ao previsto na alínea anterior, contra o responsável pela apresentação do veículo a inspeção periódica que, na pendência do contrato de seguro, tenha incumprido a obrigação de renovação periódica dessa apresentação, na medida em que o acidente tenha sido provocado ou agravado pelo mau funcionamento do veículo. 2 - A empresa de seguros, antes da celebração de um contrato de seguro de responsabilidade automóvel, deve esclarecer especial e devidamente o eventual cliente acerca do teor do presente artigo.»
[4] Vide C. A. Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, Coimbra Editora, 4ª edição (2ª reimpressão), 2012, págs. 373 e seguintes e Manuel de Andrade, Teoria Geral da Relação Jurídica, Almedina, 1974, págs. 445 e seguintes.
    Cf. ainda, de entre vários, o acórdão do STJ de 09.7.1998, in BMJ, 479º, 572.

[5] Cf., neste sentido, de entre vários, acórdãos do STJ de 06.5.1999-processo 99B356 [concluindo-se: «I - O seguro obrigatório não perdeu a natureza pessoal, sendo, por isso, a medida da responsabilidade da seguradora a responsabilidade do seu segurado. II - A medida do direito de regresso da seguradora será aferida pela não responsabilidade do segurado nos danos causados a terceiro. III - O direito de regresso da seguradora em relação ao condutor que agiu sob a influência do álcool - pode ser o próprio segurado - é um direito de um devedor solidário em relação ao outro. IV - Está sujeito ao prazo de prescrição prevista no artigo 498º, n.º 2 do CCIV. V - O direito de regresso surge no momento do pagamento da indemnização.»], 04.11.2008-processo 08A3199 [com o sumário: «O direito de regresso da seguradora que satisfez uma indemnização decorrente de contrato de seguro, direito esse fundado na al. c) do art.º 19º do Decreto-Lei n.º 522/85 de 31/12, tem o prazo de prescrição de três anos, previsto no n.º 2 do art.º 498º do Cód. Civil, não se aplicando a este prazo a extensão do seu n.º 3.»], 27.10.2009-processo 844/07.2TBOER.L1 [assim sumariado: «I - O direito de regresso contra o segurado, consagrado no art.º 19º do DL n.º 522/85, de 31-12, justifica-se à luz da instituição da obrigatoriedade da contratação de seguro de responsabilidade civil contra terceiros, como necessidade de contrabalançar a eventual iniquidade da imposição, à seguradora, do pagamento de indemnizações resultantes de uma acção dolosa ou gravemente negligente por parte do segurado ou de outrem. II - O carácter obrigatório do seguro sobre a circulação de veículos automóveis não influi no carácter pessoal (não real) do contrato celebrado: o que transfere para o segurador é a responsabilidade do segurado, enquanto detentor de um dado veículo e não o próprio veículo. III - As razões que justificam o prazo de prescrição previsto no art.º 498º, n.º 1, do CC, subsistem mesmo em face do direito de regresso da seguradora. Apresenta-se destituído de fundamento ou de lógica admitir que uma acção de regresso motivada nos precisos factos em que assenta a responsabilidade civil do segurado pudesse prescrever num outro prazo temporalmente mais dilatado e indexado ao tempo ordinário de prescrição. IV - O carácter imperativo das normas que regulam, em geral – art.º 10º do DL n.º 522/85 – e nesta específica matéria, o contrato de seguro – art. 19º do mesmo diploma legal – e a figura da prescrição – art.º 300º do CC –, bem como a circunstância de inexistir qualquer menção, quer na legislação do seguro obrigatório, quer ao nível das condições particulares e gerais da apólice, de prazos prescricionais especiais ou concretos, faz-nos cair irremediavelmente na aplicação daquele que se mostra previsto pelo regime geral, a saber, o do art.º 498º, n.º 2, do CC (3 anos). V - Na acção de regresso, a circunstância do facto ilícito constituir crime não justifica o alargamento do prazo prescricional do n.º 2 do art.º 498º do CC, nos moldes previstos no n.º 3 desse preceito legal, pois não está já em causa, em termos diretos e imediatos, a responsabilidade civil extracontratual derivada do facto voluntário, culposo, ilícito, causal e lesivo, que, em rigor, já estará definida, mas antes um segundo momento, subsequente, à definição, em concreto, da dita responsabilidade, não se vislumbrando necessidade ou motivo, quer em termos fácticos como jurídicos, para proceder a tal ampliação do prazo de 3 anos previsto para o direito de regresso.»], 04.11.2010-processo 2564/08.1TBCB.A.C1.S1, 16.11.2010-processo 2119/07.8TBLLE.E1.S1, 17.11.2011-processo 1372/10.4T2AVR.C1.S1, 29.11.2011-processo 1507/10.7TBPNF.P1.S1, 05.6.2012-processo 32/09.3TBSRQ.L1.S1, 18.10.2012-processso 56/10.8TBCVL-A.C1.S1, 07.5.2014-processo 8304/11.0T2SNT-Al1.S1, 22.9.2015-processo 255/14.3T8SCR.L1.S1, 19.5.2016-processo 645/12.6TVLSB.L1.S1, 18.01.2018-processo 1195/08.0TVLSB.E1.S1, 03.7.2018-processo 2445/16.5T8LRA-A.C1.S, 02.4.2019-processo 2142/16.1T8PTM-A.E1.S1 e 14.01.2025-processso 949/20.4T8VFR-A.P1.S1, da RC de 07.9.2010-processo 329/06.4TBAGN.C1, 12.4.2011-processo 1372/10.4T2AVR.C1, 24.01.2012-processo 644/10.2TBCBR-A.C1, 21.01.2014-processo 100/12.4TBTMR.C1 (com intervenção do aqui relator como 2º adjunto), 28.01.2014-processo 199/12.3TBALD.C1 e 26.4.2016-processo 25/15.1T8FIG.C1, RP de 24.01.2022-processo 6252/18.2T8PRT.P1, RG de 03.11.2022-processo 2996/20.7T8VNF.G1 e RL de 28.9.2023-processo 980/21.2T8AMD.L1-6, publicados no “site” da dgsi.
   Com o entendimento de que se o facto ilícito constituir crime abstratamente sujeito a prazo de prescrição superior a três anos, o alargamento do prazo de prescrição estabelecido no n.º 3 do art.º 498º do CC também se aplica ao direito de regresso, cf., nomeadamente, acórdãos do STJ de 01.6.1999-processo 99A305, 13.4.2000-processo 00B200, 13.5.2003-processo 03A430, 26.6.2007-processo 07A1523, 16.6.2009-processo 43/07.3TBPTL.S1, 03.11.2009-processo 2665/07.3TBPRD.S1, 09.3.2010-processo 2270/04.6TBVNG.P1.S1 e 07.7.2010-processo 142/08.4TBANS-A.C1.S1 (os Exmos. Adjuntos vieram a rever a sua posição/cf., v. g., acórdão de 29.11.2011-processo 1507/10.7TBPNF.P1.S1), da RC de 31.10.2006-processo 1208/05.8TBTMR.C1 (o Exmo. Relator veio a alterar a sua posição, v. g., ao subscrever o acórdão de 12.4.2011-processo 1372/10.4T2AVR.C1), 16.12.2009-processo 4811/07.8TBAVR.C1 e 12.7.2011-processo 444/07.7TBFVN.C1, RL de 25.10.2012-processo 10237/11.1T2SNT.L1-2  e RG de 08.02.2018-processo 1852/17.0T8GMR-A.G1, publicados no mesmo “site”.

[6] Assim, por exemplo, cremos, o caso decidido pelo acórdão da RC de 09.01.2017-processo 3988/15.3T8LRA-A.C1 (publicado no “site” da dgsi, intervindo o mesmo relator) - acidente de trabalho de que resultou a morte da vítima, por inobservância das regras de segurança por parte da entidade patronal, cuja responsabilidade veio a ser apurada no foro criminal (e não no foro laboral - em virtude do acordo quanto às indemnizações e pensão devidas), após o que a autora/seguradora concretizou a intenção de exercer o direito de regresso contra o tomador do seguro -, concluindo-se ter sido salvaguardado o “interesse da lei na rápida definição da situação” e que não ocorrera “inércia da seguradora” que devesse ser sancionada, porquanto: a) a ação foi instaurada pela Seguradora (contra a empresa arguida, contraparte no contrato de seguro de acidentes de trabalho) em 30.11.2015; b) o acidente de trabalho ocorreu em 18.6.2010; c) a Ré foi condenada como autora material de um crime de violação de regras de segurança, p. e p. pelo art.º 152º-B, n.º 4, alínea a) conjugado com o n.º 1 do mesmo art.º e o art.º 11º, n.º 2, alínea a), do Código Penal; d) na tentativa de conciliação no Tribunal do Trabalho, em 27.4.2011, a A. e a Ré não se conciliaram quanto à factualidade que deu causa ao evento dos autos, referindo a Seguradora que “não aceita (…) a responsabilidade pela reparação do sinistro, uma vez que o mesmo ficou a dever-se a falta de observação das regras de segurança por parte da Entidade Patronal”, e que “aceita, porém, nos termos do disposto no artigo 79º, n.º 3 da Lei n.º 98/2009, de 04 de Setembro, satisfazer o pagamento das prestações requeridas pela beneficiária legal, conciliando-se com a mesma nos termos que reclamou, sem prejuízo do exercício do direito de regresso em relação à Entidade Patronal”, enquanto a Entidade Patronal disse que “Não aceita conciliar-se porque entende que os motivos invocados pela seguradora não se verificam, considerando que não houve violação das regras de segurança (…)”; e) em consequência do evento correu seus termos processo-crime em que foram arguidos a sociedade Ré e outros e, a final, foi proferido acórdão, a 16.5.2014, que condenou aquela sociedade como autora de um crime de violação de regras de segurança, p. p. pelo art.º 152º-B, n.ºs 1 e 4, alínea a) e o art.º 11, n.º 2, alínea a), do Código Penal, conjugado com os art.ºs 3º, 4º e 10º do DL n.º 324/95, de 29.11 e 3º, 8º, 24º e 32º da Portaria n.º 198/96, de 04.6, decisão confirmada por acórdão da Relação de Coimbra, transitado em julgado em 21.9.2015; f) foi efetuada a notificação judicial avulsa da Ré requerida pela A. a 31.01.2015.

   Tendo em vista uma resposta razoável e materialmente justa aos interesses em presença e partindo do entendimento de que “o objeto problemático da interpretação jurídica não é a norma como objetivação cultural (…), mas o caso decidendo, o concreto problema prático que convoca normativo-interpretativamente a norma com seu critério judicativo (…), o que significa, evidentemente, que é o caso e não a norma o ´prius` problemático-intencional e metódico” (vide A. Castanheira Neves, O Actual Problema da Interpretação Jurídica, in RLJ, 118º, págs. 257 e seguinte), verificava-se, designadamente, que só a partir de 16.5.2014 viu a A. “reforçada” a posição manifestada na audiência conciliatória laboral, concretizando, depois, a intenção de exercer o direito, sendo certo que, no foro laboral, nada se efetivara no sentido de um cabal apuramento da responsabilidade pela produção do sinistro - salientando-se que a jurisprudência que afasta o alargamento do prazo prescricional do n.º 2 do art.º 498º do CC, dá especial relevância à circunstância de na hipótese de exercício do direito de regresso só estar em aberto o direito da seguradora ao reembolso do que pagou ao lesado e não a determinação da responsabilidade extracontratual do lesante, ponto já assente e indiscutido nesse momento/está suposto no surgimento do direito de regresso que a discussão e o apuramento da medida da responsabilidade civil estão feitos” [cf., por ex.º, acórdãos do STJ de 27.10.2009-processo 844/07.2TBOER.L1, 29.11.2011-processo 1507/10.7TBPNF.P1.S1, 07.5.2014-processo 8304/11.0T2SNT-AL1.S1 e 19.5.2016-processo 645/12.6TVLSB.L1.S1 e da RC de 12.4.2011-processo 1372/10.4T2AVR.C1, publicados no “site” da dgsi] - e, por outro lado, que inexistia fundamento bastante para afirmar ou fazer prevalecer um qualquer “interesse da lei na rápida definição da situação e na consequente punição da inércia da seguradora num lapso de tempo mais curto” (o do n.º 2 do art.º 498º do CC)  [não havendo assim lugar para atuar a perspetiva exposta, v. g., no acórdão do STJ de 29.11.2011-processo 1507/10.7TBPNF.P1.S1].