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ARRENDAMENTO RURAL
RENOVAÇÃO DO CONTRATO
OPOSIÇÃO
CADUCIDADE
Sumário
I – Do confronto entre os artigos 19.º, n.º 9 e 30.º, nºs. 1 e 4, do DL n.º 294/2009, de 13-10, resulta que a própria lei regula quais sejam os fundamentos de oposição à não renovação do contrato de arrendamento rural, pelo que a caducidade do prazo para dedução da referida oposição apenas pode abranger tais fundamentos e não quaisquer outros que o arrendatário rural pretenda invocar. II – Assim, tudo o que não consubstancie tais fundamentos pode ser judicialmente apreciado, visto não ter sido objeto de caducidade, mesmo ultrapassados os 60 dias após a receção da comunicação escrita do senhorio de oposição à renovação do contrato. III – A invocação, por parte do arrendatário rural, de que o período de renovação do contrato de arrendamento rural é diverso daquele que o senhorio invocou, por não se integrar nos referidos fundamentos, não pode deixar de ser judicialmente apreciado, mesmo tendo ocorrido a caducidade do direito do arrendatário rural se opor à não renovação do contrato. IV – O prazo de renovação de um contrato de arrendamento decorre diretamente do que dispõe a lei, partindo do que se mostra vertido no contrato de arrendamento assinado pelas partes, pelo que, inexistindo divergências quanto ao que conste do contrato de arrendamento, trata-se de matéria exclusivamente jurídica. V – O tribunal, ao considerar que a data de renovação é diversa daquela que o senhorio indicou, não está a reconhecer a validade do contrato de arrendamento para além do prazo legal de renovação, apenas está a reconhecer a validade do referido contrato até que o termo legalmente previsto para a sua renovação se verifique. (Sumário da Relatora)
Texto Integral
Proc. n.º 175/24.3T8GDL.E1
2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora[1]
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Acordam os Juízes da 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório
… (Autor) intentou ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, de oposição à denúncia do contrato de arrendamento rural, contra “Sociedade Agrícola de (…), S.A.” (Ré), solicitando, a final que:
1) A Ré seja condenada a reconhecer a ineficácia da denúncia do contrato de arrendamento, através da carta enviada pela Ré ao Autor em 14 de março de 2024;
Ou, quando assim não se entenda:
2) A Ré seja condenada a reconhecer como válido e automaticamente renovado, até 01 de janeiro de 2027, o contrato de arrendamento rural celebrado em 02 de janeiro de 2003;
Ou ainda:
3) seja julgada válida a presente oposição à oposição à renovação, condenando-se a Ré a reconhecer que a mesma não pode efetivar-se por inválida e por pôr em risco a subsistência do Autor e do seu agregado familiar.
4) Ou, no caso de a ação não proceder – o que só por mera de cautela de patrocínio se admite –, seja a Ré condenada a pagar ao Autor:
a) Uma indemnização pelas benfeitorias necessárias, na quantia de € 8.000,00; e
b) Uma indemnização correspondente a 1/12 da renda anual, por cada ano de contrato, no montante de € 6.272.40.
Para o efeito alegou, em síntese, que, quanto ao que se reporta ao segundo pedido condenatório (e único a apreciar em sede de recurso), o Autor opôs-se à efetivação da oposição à renovação do contrato, por parte da Ré, por inexistência de fundamento para tal, visto que tendo o contrato de arrendamento tido início em 02-01-2003, pelo período de sete anos, renovável por períodos sucessivos de cinco anos, teve a primeira renovação de cinco anos em 02-01-2010 e a segunda renovação em 02-01-2015, sendo que esta, por força do disposto no artigo 39.º, n.º 2, alínea a), do DL n.º 294/2009, de 13-10, já por 7 anos, pelo que a terceira renovação, igualmente por sete anos, ocorreu em 02-01-2023, a qual, por ser também de sete anos, apenas termina em 01-01-2029.
…
A Ré contestou por exceção e impugnação, solicitando, a final, a procedência da exceção de caducidade invocada, absolvendo-se a Ré do pedido, ou, caso, assim não se entenda, que se julgue procedente a contestação, absolvendo-se a Ré do pedido.
Para o efeito, alegou, e no que ao segundo pedido diz respeito, que o prazo de 60 dias para que o Autor viesse invocar a inexistência de fundamento para a oposição à renovação do contrato já se mostrava caducado aquando da apresentação da petição inicial.
Mais alegou que o disposto no artigo 39.º, n.º 2, alínea a), do DL n.º 294/2009, de 13-10, não tem aplicação no contrato de arrendamento constante dos autos, por não se verificarem os requisitos impostos pelos artigos 41.º e 43.º, n.º 2, do mesmo Diploma Legal.
Concluiu, por fim, que, tendo a última renovação do contrato se verificado em 02-01-2020, a próxima renovação ocorrerá em 01-01-2025.
…
O Autor veio responder à exceção invocada, pugnando, a final, pela sua improcedência.
…
Proferido despacho saneador, foi apreciada da exceção de caducidade invocada pela Ré, nos seguintes termos:
O primeiro pedido do Autor é que a condenação da Ré em reconhecer a ineficácia da denúncia do contrato de arrendamento, através da carta enviada em 14-03-2024.
Em sede de contestação, refere a Ré que o Autor recebeu a comunicação de não renovação do contrato de arrendamento no dia 14-03-2024. De acordo com o entendimento que perfilha, tanto com base no artigo 19.º, n.º 1, do DL n.º 385/88, de 25 de outubro, assim como pelo artigo 30.º, n.º 4, do DL n.º 294/2009, de 13 de outubro, o Autor tinha 60 dias para a propositura ação. Todavia, somente intentou a referida ação judicial a 16-05-2024, já fora do prazo dos 60 dias, tendo caducado o respetivo prazo.
No seu entendimento, pese embora, o Autor ter intentado a presente ação já em período de multa, nos termos do artigo 139.º, n.º 5, do Código de Processo Civil, a mesma não pode ser considerada, uma vez que a natureza dos prazos é distinta: o prazo de 60 dias é um prazo substantivo, enquanto que o do artigo 139.º, n.º 5, do Código de Processo Civil é processual, motivo pelo qual ambos os prazos se reportam a situações distintas, não tendo aplicação no caso concreto o prazo processual.
Em resposta, o Autor refere que se aplica o DL n.º 294/2009, de 13 de outubro ao presente caso, ou melhor, para resolução do mesmo, mas na parte que concede à propositura da ação será de aplica o DL n.º 385/88, de 25 de outubro, uma vez que o artigo 30.º, n.º 4, do primeiro diploma é demasiado abrangente, motivo pelo qual a questão teria que ser decidida ao abrigo do segundo diploma legal.
Todavia, refere que os restantes pedidos realizados não estariam abrangidos pelo artigo 30.º, n.º 4, do Novo Regime do Arrendamento Rural, motivo pelo qual os mesmos tinham que seguir.
Apreciando.
A caducidade é genericamente definida como a extinção ou perda de um direito ou de uma ação pelo decurso do tempo, ou ainda, pela verificação de uma circunstância que, naturalmente (v.g. a morte), faz desencadear a extinção do direito. Por outras palavras, a caducidade não consiste num ato jurídico, mas é um efeito automático de extinção do negócio jurídico e da sua eficácia em consequência de ocorrer um facto jurídico (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 06-04-2017, Cons. António da Silva Gonçalves, processo n.º 1161/14.7T2AVR.P1.S1).
Contrariamente ao que ocorre com a prescrição, a caducidade pode ser conhecida oficiosamente, nos termos do artigo 333.º, n.º 1, do Código Civil e artigo 579.º do Código de Processo Civil, significando isto que, mesmo que aquele a quem ela aproveita não a invocar, pode o Tribunal ter dela conhecimento. E também, contrariamente àquilo que ocorre com a prescrição, o prazo da caducidade interrompe-se com a propositura da ação, enquanto que a prescrição é com a citação do Réu.
Entendida, na sua vertente adjetiva, como exceção perentória – na medida em que importa a absolvição total ou parcial do pedido, por consistir na invocação de factos que extinguem o direito do Autor – a caducidade funda-se, não só em razões objetivas de segurança jurídica, mas também na necessidade de definição de um prazo razoável para as situações jurídicas, por forma a evitar uma tendencial vinculação perpétua por parte do obrigado (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 06-04-2017, Cons. António da Silva Gonçalves, proc. n.º 1161/14.7T2AVR.P1.S1; Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 28-04-2017, Relator Felizardo Paiva, proc. n.º 176/16.5T8LMG.C1).
No caso dos autos, a norma que regula o prazo para a propositura da ação, nos termos do Arrendamento Rural, é o artigo 30.º, n.º 4, do Novo Regime do Arrendamento Rural (DL n.º 294/2009, de 13 de outubro). Ressalvados os casos do artigo 41.º do respetivo diploma, o Novo Regime do Arrendamento Rural revogou os Decreto-Lei n.º 385/88, de 25 de outubro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 524/99, de 10 de dezembro e o Decreto-Lei n.º 394/88, de 8 de novembro.
Portanto, não sendo, neste momento, discutida uma questão que importe a análise do artigo 41.º do Novo Regime do Arrendamento Rural, deverá ser aplicado ao presente caso o disposto no DL n.º 294/2009, de 13 de novembro, considerando o teor do artigo 43.º do mesmo diploma.
Nos termos do artigo 30.º, n.º 4, do Novo Regime do Arrendamento Urbano, o preceito refere que, “Em qualquer caso, o senhorio e o arrendatário podem opor-se à efetivação da denúncia do contrato pela outra parte desde que, em ação intentada no prazo de 60 dias após a comunicação prevista no n.º 1, provem a inexistência de fundamento para a denúncia”.
Os prazos substantivos podem ser considerados como aqueles que respeitam ao período de tempo exigido para exercício dos direitos materiais, sendo-lhes aplicados as regras da caducidade, excetuando os casos em que a lei refira expressamente que devem ser aplicadas as normas da prescrição, nos termos do artigo 298.º, n.º 2, do Código Civil. Enquanto que, os prazos judiciais destinam-se a determinar o período de tempo para se produzir um determinado efeito processual.
Todavia, e pese embora a distinta realidade, o prazo em causa, isto é, saber se é de natureza substantiva ou processual, deve resultar sempre da interpretação da norma em causa e compreender aquilo que a mesma pretende, considerando que pode ser apenas um prazo substantivo ou processual. Em particular no que respeita aos prazos de propositura de ação, em geral qualificados como prazos substantivos de caducidade por estas se reconduzirem a elemento integrante do regime jurídico da respetiva relação material, os mesmos podem ser também prazos judiciais (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 02-03-1994, Conselheiro Martins da Costa, processo n.º 076282).
Paralelamente, encontra-se o artigo 139.º do Código de Processo Civil.
É sabido que os prazos processuais podem assumir uma de duas vertentes: perentórios ou dilatórios, nos termos do artigo 139.º, n.º 1, do Código de Processo Civil. O dilatório difere a prática do ato para um certo momento a possibilidade de realização de um ato ou o início da contagem de um outro prazo, ao abrigo do artigo 139.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.
Enquanto que, o perentório extingue o direito de praticar o ato, para efeitos do artigo 139.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.
Todavia, os efeitos preclusivos do prazo dilatório podem ser evitados de dois modos: o primeiro, é aquele que se encontra no artigo 139.º, n.º 5, do Código de Processo Civil; e o segundo, uma situação de justo impedimento, nos termos do artigo 140.º do Código de Processo Civil.
No primeiro caso – aquele que nos interessa para a questão em análise – o legislador concedeu duas possibilidades às partes, podendo ser cumulativas.
O artigo 139.º, n.º 5, do Código de Processo Civil não pode ser visto como um acrescento ao prazo processual, mas uma tolerância processual, já que é permitido à parte praticar o ato, até ao 3.º dia, desde que pague de imediato multa processual. Todavia, e caso a parte não pague a respetiva multa, de forma imediata, ainda lhe é possível praticar o ato, não só pagando a multa processual que deve, como também uma penalização de 25% acrescida ao valor da multa.
Juridicamente os prazos da caducidade são de natureza substantiva, isto porque, o legislador pré-fixou normativamente um prazo, dentro do qual o direito pode ser exercido, sendo que se esse prazo se extinguir, o direito caduca, sendo que o prazo começa a contar quando o direito puder ser exercido (Abílio Neto, in Código Civil Anotado, 20.ª edição atualizada – abril-2018, Ediforum, Edições Jurídicas, Lda., Lisboa, 2018, págs. 241 e 272).
O nosso ordenamento jurídico contempla várias normas que estipulam um prazo de caducidade, sendo que se colocou, por várias vezes, a questão de saber se o prazo em causa seria de natureza substantiva ou processual. Seguindo o entendimento de Alberto dos Reis e de Aníbal de Castro, a jurisprudência nacional defende que o prazo para a propositura da ação, quando esteja em causa um prazo de caducidade, é de natureza substantiva e não processual, isto porque, o prazo em causa ainda diz respeito a um elemento integrante do regime jurídico da respetiva relação de direito substantivo ou material. É por isso, que se considera que os prazos de propositura das ações são de direito substantivo, não apenas por funcionarem antes do ingresso da ação, mas por regularem a eficácia de direito material (Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 14-07-2018, Relator Vítor Sequinho, processo n.º 943/17.2T8ABF.E1).
Ainda nesta senta, entende tal jurisprudência, assim como a doutrina, que os prazos processuais consistem para regular a distância entre os atos do processo motivo pelo qual o artigo 139.º, n.º 5 e 6, do Código de Processo Civil, não pode ser aplicado quando está em causa um prazo de caducidade.
No caso dos autos, a norma do artigo 30.º, n.º 4, do Novo Regime do Arrendamento Rural refere que o prazo para propositura da ação é de 60 dias. Se aplicarmos todas as considerações teóricas ao presente caso, podemos considerar que o prazo em causa é de natureza substantiva, isto porque, o próprio legislador definiu o limite temporal dentro do qual o direito podia ser exercido, neste caso, o direito de intentar a presente ação. Motivo pelo qual, não lhe podem ser acrescentados os prazos de tolerância do artigo 139.º, n.º 5, do Código de Processo Civil, considerando que são prazos de distinta natureza e que não se cumulam.
A comunicação de não renovação do contrato foi recebida pelo Autor a 14-03-2024 e a ação apenas intentada a 16-05-2024. Pese embora, o Autor tenha pago a multa do artigo 135.º, n.º 5, do Código de Processo Civil, o certo é que não beneficiava do prazo em questão, uma vez que o prazo para poder exercer o seu direito já tinha caducado. Logo, podemos considerar que o direito de ação do Autor se encontrava extinto pelo decurso do prazo e por não ter sido exercido no tempo correto.
Pelo exposto, absolvo a Ré do pedido formulado contra si, nos termos dos artigos 30.º, n.º 4, do Novo Regime do Arrendamento Rural, artigo 298.º, n.º 2, 329.º ambos do Código Civil, artigo 576.º, n.º 3 e 579.º, ambos do Código de Processo Civil, pelo direito de ação do Autor encontrar-se caducado.
Subsidiariamente, foi peticionado pela Autora que fosse a é condenada a reconhecer como válido e automaticamente renovado, até 01 de janeiro de 2029 (no articulado de resposta à Contestação), o contrato de arrendamento rural celebrado em 02 de janeiro de 2003. Ou ainda, e no caso de o primeiro e segundo pedidos não procederem, julgar-se válida a presente oposição à renovação, condenando-se a Ré a reconhecer que a mesma não pode efetivar-se por inválida e por pôr em risco a subsistência do Autor e do seu agregado familiar.
Tendo sido a Ré absolvida do primeiro pedido, o mesmo ocorre com o segundo, já que este é uma consequência jurídica do primeiro: não pode a Ré ser absolvida do presente pedido, mas depois ser condenada a reconhecer a validade do contrato de arrendamento, seria contraproducente.
No que concerne ao segundo pedido realizado. O 3.º pedido acaba por estar ligado ao 1.º e 2.º pedidos, já que o facto de se considerar o direito do Autor caducado no 1.º pedido, tem implicações em o Tribunal poder conhecer o 2.º (que é uma decorrência lógica do 1.º pedido) e implicações no 3.º, já que não é possível conhecer a oposição à oposição à renovação, depois de ter afirmado que o direito se encontra caducado. Tecnicamente, é como se todos os pedidos, pese embora serem subsidiários, estivessem todos interligados entre si, por causa do 1.º. Assim, se o primeiro é improcedente, os 2.º e 3.º também o serão, por serem corolários deste. Logo, é a Ré também absolvida nos termos dos artigos 30.º, n.º 4, do Novo Regime do Arrendamento Rural, artigo 298.º, n.º 2, 329.º, ambos do Código Civil, artigo 576.º, n.º 3 e 579.º, ambos do Código de Processo Civil, por causa do direito de ação do Autor ter caducado.
No despacho saneador foi ainda dispensada a audiência prévia, fixado o valor da causa em € 39.362,40, indicados os factos assentes, fixado o objeto do litígio, enunciado os temas da prova, apreciados os meios de prova e designada data para o julgamento.
…
Inconformado com o despacho de apreciação da exceção de caducidade, veio o Autor interpor recurso de apelação, apresentado as seguintes conclusões:
A – Por despacho proferido pelo Tribunal a quo datado de 23-10-2024, a que corresponde a referência Citius 100329513, foi o Réu absolvido dos primeiro, segundo e terceiro pedidos.
B – Por carta registada, recebida pelo A. no dia 14 de março de 2024, foi este notificado pela Ré do seguinte: “…serve a presente para comunicar a V. Ex.ª a nossa decisão de não renovar o contrato em vigor, pelo que no termo da renovação em curso queira entregar-nos a parcela objeto do dito arrendamento livre de pessoas e bens.”
C - O A. intentou ação judicial formulando quatro pedidos;
D – No primeiro e no terceiro pedido vem deduzir oposição à não renovação do contrato de arrendamento;
E - No segundo pedido o Réu não deduz qualquer oposição à não renovação do contrato de arrendamento, pretendo apenas que, o Tribunal fixe a data em que o contrato termina e o imóvel tem de ser entregue.
F - O que é pedido é segundo é exatamente que seja a Ré condenada a reconhecer como válido e automaticamente renovado, até 01 de janeiro de 2027 (retificado para 2029), o contrato de arrendamento rural celebrado em 02 de janeiro de 2003.
G – Reitera-se que, o segundo pedido por não se enquadrar numa oposição á não renovação, não está vinculado ao prazo de caducidade, devendo em consequência ser apreciado na ação.
Nestes termos, deve ser dado provimento à presente apelação e em consequência ser revogado o douto Despacho Saneador de que ora se recorre, decidindo-se em conformidade com o invocado. com o que V. Exas. farão a acostumada JUSTIÇA.
…
Não foram apresentadas contra-alegações.
…
O tribunal a quo admitiu o recurso como sendo de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
Após ter sido recebido o recurso neste tribunal nos seus exatos termos, foram os autos aos vistos, pelo que cumpre, agora, apreciar e decidir.
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II – Objeto do Recurso
Nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente ressalvada a matéria de conhecimento oficioso (artigo 662.º, n.º 2, do Código de Processo Civil).
Assim, no caso em apreço, a questão que importa decidir é se: 1) A declaração de caducidade do direito de oposição à não renovação do contrato de arrendamento afeta o segundo pedido deduzido pelo Autor na petição inicial.
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III – Matéria de Facto
A matéria de facto que releva é a que consta no relatório supra.
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IV – Enquadramento jurídico
Conforme supra mencionámos, o que importa analisar no presente recurso é a questão supra elencada.
…
1 – A declaração de caducidade do direito de oposição à não renovação do contrato de arrendamento afeta o segundo pedido deduzido pelo Autor na petição inicial
Considera a recorrente que o segundo pedido que formulou na petição inicial não se enquadra numa oposição à não renovação do contrato de arrendamento, pretendendo apenas que o Tribunal fixe a data em que o contrato termina e o imóvel tem de ser entregue.
Vejamos, então.
Consta do segundo pedido formulado pelo recorrente que a Ré deverá ser condenada a reconhecer como válido e automaticamente renovado, até 01 de janeiro de 2029,[2] o contrato de arrendamento rural celebrado em 02 de janeiro de 2003.
Na realidade, o que está em causa neste pedido é o prazo em que o contrato de arrendamento rural se renova.
Vejamos, então, se a dúvida sobre o final do prazo do contrato de arrendamento rural se insere no âmbito da matéria prevista para a oposição à não renovação desse contrato.
Dispõe o artigo 30.º, nºs. 1 e 4, do DL n.º 294/2009, de 13-10, que:
1 - A oposição à renovação ou a denúncia dos contratos de arrendamento devem concretizar-se mediante comunicação escrita, nos termos previstos nos artigos 26.º e 27.º e nas condições fixadas no artigo 19.º.
[…]
4 - Em qualquer caso, o senhorio e o arrendatário podem opor-se à efectivação da denúncia do contrato pela outra parte desde que, em acção intentada no prazo de 60 dias após a comunicação prevista no n.º 1, provem a inexistência de fundamento para a denúncia.
Por sua vez, consta do artigo 19.º, n.º 9, do referido Diploma Legal, que:
9 - O arrendatário pode opor-se à efectivação da oposição à renovação ou da denúncia, desde que reúna, cumulativamente, as seguintes condições:
a) Tenha mais de 55 anos e resida ou utilize o prédio há mais de 30 anos;
b) O rendimento obtido do prédio constitua a fonte principal ou exclusiva de rendimento para o seu agregado familiar.
Ora, do confronto entre estes dois artigos resulta que a própria lei regula quais sejam os fundamentos de oposição à não renovação do contrato de arrendamento rural, pelo que a caducidade do prazo para dedução da referida oposição apenas pode abranger tais fundamentos e não quaisquer outros que o arrendatário rural pretenda invocar. Assim, tudo o que não consubstancie os fundamentos expressamente definidos nas alíneas a) e b) do n.º 9 do artigo 19.º do DL n.º 294/2009, de 13-10, pode ser judicialmente apreciado, visto não ter sido objeto de caducidade, mesmo ultrapassados os 60 dias após a receção da comunicação escrita do senhorio de oposição à renovação do contrato.
No caso em apreço, a invocação, por parte do arrendatário rural, de que o período de renovação do contrato de arrendamento rural é diverso daquele que o senhorio invocou, por não se integrar nos referidos fundamentos, não pode deixar de ser judicialmente apreciado, mesmo tendo ocorrido a caducidade do direito do arrendatário rural se opor à não renovação do contrato. Deste modo, apesar de já não se poder opor à não renovação com os fundamentos supramencionados no artigo 19.º, n.º 9, do citado Diploma Legal, tal não renovação não terá de ocorrer na data indicada pelo senhorio, no caso de não ser esse o prazo decorrente da legislação aplicável. Aliás, o prazo de renovação de um contrato de arrendamento decorre diretamente do que dispõe a lei, partindo do que se mostra vertido no contrato de arrendamento assinado pelas partes, pelo que, inexistindo divergências quanto ao que conste do contrato de arrendamento, trata-se de matéria exclusivamente jurídica. Refira-se ainda que diferentemente do que decorre do despacho recorrido, o tribunal, ao considerar que a data de renovação é diversa daquela que o senhorio indicou, não está a reconhecer a validade do contrato de arrendamento para além do prazo legal de renovação, apenas está a reconhecer a validade do referido contrato até que o termo legalmente previsto para a sua renovação se verifique.
Sobre esta matéria, não deixaremos de citar, pela sua clareza, o acórdão do TRL, proferido em 12-10-2021:[3][4]
Serve isto para dizer que não é a circunstância de o réu/recorrente não ter deduzido oposição à denúncia nos termos do artigo 17.º do DLR 29/2008/A, de 24 de Julho que determina a data da extinção do contrato.
Com efeito, constitui jurisprudência estabilizada que a questão da data de extinção do contrato é matéria de direito a verificar e determinar pelo tribunal. Aquilo que desencadeia a extinção do contrato de arrendamento é a denúncia tempestiva, por parte do senhorio, isto é, com observância do prazo não inferior ao legalmente previsto para tal, sendo que a indicação da data concreta em que opera o despejo constitui apenas um efeito necessário dessa denúncia. Assim, a data em que se há-de situar o termo do respectivo contrato nada tem a ver com a essência do pedido; por isso, no caso de o senhorio pretender fazer cessar o arrendamento em certa data e se verificar que só poderá ser obtido para um momento ulterior, deverá o tribunal julgar em conformidade […].
Pelo exposto, é manifesto que o recorrente tem razão, visto que o segundo pedido por si formulado na petição inicial não caducou, por força de ter sido ultrapassado o prazo de caducidade de 60 dias para se opor à não renovação do contrato de arrendamento rural, nos termos do disposto no artigo 19.º, n.º 9, do DL n.º 294/2009, de 13-10, pelo que o presente recurso terá de proceder, revogando-se, nessa parte, o despacho recorrido.
…
Sumário elaborado pela relatora (artigo 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil): (…)
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V – Decisão
Pelo exposto, acordam os juízes da 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora em julgar o recurso procedente e, em consequência, determinar a revogação do despacho recorrido na parte em absolve a Ré do segundo pedido formulado pelo Autor na petição inicial (A Ré seja condenada a reconhecer como válido e automaticamente renovado, até 01 de janeiro de 2027, o contrato de arrendamento rural celebrado em 02 de janeiro de 2003), determinando o prosseguimento dos autos quanto a tal pedido.
Custas pela Apelada, ainda que não tenha apresentado contra-alegações[5] (artigo 527.º, nºs. 1 e 2, do Código de Processo Civil).
Notifique.
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Évora, 09 de Abril de 2025
Emília Ramos Costa (relatora)
Mário João Canelas Brás
Isabel de Matos Peixoto Imaginário
__________________________________________________
[1] Relatora: Emília Ramos Costa; 1.º Adjunto: Mário João Canelas Brás; 2.ª Adjunta: Isabel de Matos Peixoto Imaginário.
[2] Em face da retificação introduzida nas alegações de recurso.
[3] No âmbito do processo n.º 736/21.2T8PDL.L1-7, consultável em www.dgsi.pt.
[4] Vejam-se, em igual sentido, os acórdãos, do STJ proferido em 23-04-2002 no âmbito do processo n.º 01A4298; do TRE proferido em 23-04-2020 no âmbito do processo n.º 1773/18.0T8EVR.E1; e do TRL proferido em 27-06-2017 no âmbito do processo n.º 7086/15.1T8ALM.L1-7; todos consultáveis em www.dgsi.pt.
[5] Veja-se acórdão do TRG proferido em 15-06-2023 no âmbito do processo n.º 1845/15.2T8VNF-C.G1, consultável em www.dgsi.pt.