GREVE
AVISO PRÉVIO
SERVIÇOS MÍNIMOS
RESPONSABILIDADE CIVIL
Sumário

1. Na Região Autónoma da Madeira, na ausência de acordo entre a associação sindical e os empregadores abrangidos pelo aviso prévio de greve ou a respectiva associação de empregadores, quanto à definição dos serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações e quanto aos serviços mínimos indispensáveis à satisfação de necessidades sociais impreteríveis, bem como aos meios necessários para os assegurar, não está devidamente regulado um procedimento administrativo tendente a solucionar definitivamente o impasse, pelo que a falta de envio directo do aviso de greve aos órgãos ou serviços regionais da área laboral constitui mera irregularidade, por não ter cabimento legal a sua intervenção no processo em apreço, podendo, quando muito, viabilizar uma conciliação das partes nos termos gerais das suas competências.
2. Tendo o Sindicato que convocou as greves, nos respectivos avisos prévios, proposto, relativamente à definição de serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações o funcionamento normal de todos, e relativamente à definição de serviços mínimos indispensáveis à satisfação de necessidades sociais impreteríveis que nenhuns fossem estabelecidos (atenta a justificação apresentada), é de entender que o mesmo efectuou propostas expressas e suficientes sobre as matérias exigíveis, atendendo a que a lei não prescreve qualquer grau de detalhe e concretização e as mesmas não inviabilizavam a definição daqueles serviços pelos mecanismos legalmente previstos, que acabou por não ocorrer por razões alheias ao conteúdo daquelas propostas.

Texto Integral

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:

1. Relatório
RODOESTE TRANSPORTADORA RODOVIÁRIA DA MADEIRA, LDA. intentou acção declarativa de condenação, com processo comum, contra SINDICATO NACIONAL DOS MOTORISTAS E OUTROS TRABALHADORES, pedindo que seja judicialmente reconhecida a ilegalidade das greves convocadas pelo R., por não observância dos requisitos legais para o efeito, nomeadamente ausência de “Proposta de Serviços Necessários à Segurança e Manutenção de Equipamentos e Instalações” (1.ª parte do n.º 3 do art. 534.º do Código do Trabalho) e ausência de “Proposta de Serviços Mínimos” (segunda parte do n.º 3 do art. 534.º do Código do Trabalho), e que o R. seja condenado a pagar à A. o montante de € 23.950,10, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais causados por tais greves ilegais.
O R. não apresentou contestação.
Após, foi proferida sentença, considerando confessados os factos articulados pela A., ao abrigo do disposto no art. 57.º, n.º 1, do CPT, e julgando a acção parcialmente procedente, com a declaração de ilegalidade das greves levadas a cabo pelo R. nos dias 13/03/2023, 17/04/2024 e 14/05/2024, por violação das formalidades previstas no art. 534.º do Código do Trabalho, e a absolvição do R. do demais pedido.
A A. interpôs recurso da sentença, formulando as seguintes conclusões:
«A) FUNDAMENTO ESPECÍFICO DA RECORRIBILIDADE – O presente recurso prende-se com o facto da Sentença emitida pelo Tribunal a quo padecer dos seguintes Erros na Aplicação do Direito:
Erro na Aplicação do Direito n.º 1 – pelo facto do Tribunal a quo ter, em nosso entender, erroneamente, aplicado o art.º 5.º do CPC ao não considerar o cumprimento do Ónus de Alegação;
Erro na Aplicação do Direito n.º 2 - pelo facto do Tribunal a quo ter, em nosso entender, erroneamente, aplicado o art.º 5.º do CPC ao considerar que a A. não cumpriu o Ónus de Alegação quanto os danos patrimoniais no montante total de € 8.950,10 (oito mil novecentos e cinquenta euros e dez cêntimos) causados por ter desconsiderado o alegado nos art.º 54.º a 65.º da PI e os Documentos n.º 7 a n.º 9 juntos com a PI.
Erro na Aplicação do Direito n.º 3 – peo facto do Tribunal a quo ter, em nosso entender, erroneamente, aplicado o art.º 5.º do CPC ao considerar que a A. não cumpriu o Ónus de Alegação quanto os danos não patrimoniais no montante total de € 15.000,00 (quinze mil) causados por ter desconsiderado o alegado nos art.º 54.º a 65.º da PI e os Documentos n.º 7 a n.º 9 juntos com a PI.
Erro na Aplicação do Direito n.º 4 – pelo facto do Tribunal a quo ter, em nosso entender, aplicado de forma errada o Direito, ao não considerar os danos resultantes das greves como facto notório, em face da conjugação das declarações do próprio Tribunal a quo e do disposto no art.º 412.º n.º 1 do CPC;
Erro na Aplicação do Direito n.º 5 – pelo facto do Tribunal a quo ter, em nosso entender, aplicado de forma errada o Direito, ao não considerar que a ausência de alegação de factos complementares não dispõe de efeito preclusivo e não ter convidado a A. ao aperfeiçoamento nos termos al al. b) do n.º 2 do art.º 590.º do CPC ou ter realizado a audiência de discussão e julgamento;
Erro na Aplicação do Direito n.º 6 – pelo facto do Tribunal a quo ter, em nosso entender, aplicado de forma errada o Direito, nomeadamente o art.º 496.º do CC, por não considerar os danos sofridos pela A. como merecedores de tutela jurídica;
Erro na Aplicação do Direito n.º 7 – pelo facto do Tribunal a quo ter, em nosso entender, aplicado de forma errada o Direito, ao afastar ilegitimamente o efeito da revelia nos termos do art.º 57.º CPC quanto aos danos peticionados, fazendo uma aplicação errada da referida disposição;
Erro na Aplicação do Direito n.º 8 – pelo facto do Tribunal a quo ter, em nosso entender, aplicado de forma errada o Direito, nomeadamente o art.º 527 CPC ao ter condenado a A. no pagamento das custas, quando, na verdade, ao convocar greves ilegais foi a R. que lhes deu azo à presente causa.
B) IDENTIFICAÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA - Nos presentes autos estamos perante uma “decisão estranha”, porquanto:
• A ora A. peticionou que fosse judicialmente reconhecido a ilegalidade das greves convocadas pela R. por não observância dos requisitos legais para o efeito, nomeadamente a ausência de Proposta de Serviços necessários à Segurança e Manutenção de Equipamento e Instalações (1.ª parte do n.º 3 do art.º 534.º do Código do Trabalho), assim como, pela ausência de Proposta de Serviços Mínimos (segunda parte do n.º 3 do art.º 534.º do Código do Trabalho e em consequência ser o SNMOT condenado a pagar à Rodoeste o montante de € 23.950,10 a título de danos patrimoniais e não patrimoniais causados em decorrência das greves convocadas de forma ilegal e ilegítima;
• Regularmente citada a R. não contestou – consequentemente, considerando-se confessados todos os factos articulados pela A. nos termos do n.º 1 do art.º 57.º do CPT (conforme é reconhecido pelo próprio Tribunal a quo);
• Deste modo, e não obstante todos os factos articulados se encontrarem confessados pela R., o Tribunal a quo julgou apenas parcialmente procedente por não provada a presente ação e, em consequência, decidiu no seguinte sentido:
“- declaro a ilegalidade das greves levadas a cabo pela Ré nos dias 13.03.2023, 17.04.2024 e de 14.05.2024, por violação das formalidades previstas no artigo 534º, do Código do Trabalho;
- absolvo a Ré do demais pedido, por não provado.”
• Condenando igualmente a A. nas custas.
C) ESPECIFICAÇÃO DA PARTE A QUE O RECURSO SE RESTRINGE - O presente Recurso circunscreve-se e restringe-se ao facto do Tribunal a quo não ter dado por provados os danos patrimoniais e não patrimoniais que foram peticionados nos art.ºs 54.º a 65.º da PI e ter, ilegitimamente, desconsiderado os Documentos n.º 7 a n.º 9 que os suportam e que foram dados por integralmente reproduzidos no âmbito da PI apresentada pelo A., o que se faz nos termos e para os efeitos do disposto do n.º 1 do art.º 81.º do CPT.
D) ERRO NA APLICAÇÃO DO DIREITO N.º 1 – ÓNUS DE ALEGAÇÃO DOS DANOS ART.º 5.º CPC - não é verdade que a A. nada tenha alegado factualmente quanto à existência de danos, porquanto a A. “deu-se ao trabalho” de individualizar todo um capítulo da sua PI (mais propriamente o Capítulo IV da PI denominado “Dos Danos” – conferir com PI) dedicado à alegação da factualidade relativamente aos danos causados pelas greves ilegalmente convocadas pela R. e que constam dos art.ºs 54.º a 65.º da PI e que se transcreveu acima para facilidade de referência;
E) Só pelo disposto pelo alegado entre os art.ºs 54.º a 59.º da PI, o ónus de alegação que impende sobre a A. já se devia ter sido dado como devidamente cumprido, cujo reconhecimento se requer por parte do Tribunal ad quem, e, em consequência, a revogação da Sentença do Tribunal a quo e sua substituição por outra que reconheça que o Ónus de Alegação foi efetivamente cumprido pela A. e que proceda à condenação da R. de todos os danos patrimoniais e não patrimoniais causados pela convocação das greves ilegais que se encontram na base da discussão dos presentes autos.
F) ERRO NA APLICAÇÃO DO DIREITO N.º 2 – ÓNUS DE ALEGAÇÃO DOS DANOS PATRIMONIAIS ART.º 5.º CPC - no âmbito do art.º 60.º da PI, a A. quantificou, de forma individualizada e por greve, todos os danos patrimoniais causados pelas greves convocadas, e mais ainda (!!!), na medida em que no âmbito do art.º 60.º da PI procedeu à junção do Documento n.º 7, sendo este um quadro, por intermédio do qual, a A. individualiza todas as viagens não realizadas, todos os passageiros afetados e todas as receitas perdidas;
G) Nesta conformidade, o Tribunal a quo errou na aplicação do Direito, nomeadamente o art.º 5.º CPC, na medida em que o Ónus de Alegação que incide sobre a A. sobre os danos patrimoniais sofridos pela A. teria sempre de se dar por cumprido para todos os devidos efeitos legais, em decorrência do disposto no art.º 60.º da PI e do Documento n.º 7 junto com a PI;
H) ERRO NA APLICAÇÃO DO DIREITO N.º 3 – ÓNUS DE ALEGAÇÃO DOS DANOS NÃO PATRIMONIAIS ART.º 5.º CPC - a A. cumpriu escrupulosamente a alegação dos danos não patrimoniais que lhe incumbia, pois logo no art.º 59.º da PI a A. alude que a convocação das greves ilegais por parte da R. causou à A. “danos patrimoniais e reputacionais elevadíssimos” e foi mais além a A., na medida em que no art.º 61.º a A. faz alusão clara à cobertura negativa que os meios de comunicação social fizeram às greves ilegais convocadas e no art.º 62 para os danos reputacionais, remetendo para a amostragem do Documento n.º 8 e n.º 9 juntos com a PI;
I) Nesta conformidade, o Tribunal a quo errou na aplicação do Direito, nomeadamente o art.º 5.º CPC, na medida em que o Ónus de Alegação que incide sobre a A. sobre os danos não patrimoniais sofridos pela A. teria sempre de se dar por cumprido para todos os devidos efeitos legais, em decorrência do disposto no art.ºs 59.º, 61.º e 62.º da PI e dos Documentos n.º 8 e n.º 9 juntos com a PI;
J) ERRO NA APLICAÇÃO DO DIREITO N.º 4 – ART.º 412.º N.º 1 CPC - o próprio Tribunal a quo profere a seguinte expressão: “E é certo e até decorre das regras de experiência comum e da normalidade que uma greve pode causar danos(…)” – conferir com segundo parágrafo da página 9 da Sentença ora em crise.
K) Ou seja, o Tribunal reconheceu que os danos causados por uma greve constitui um facto notório, e como tal, não carecem de prova, nem de alegação, nos termos do Art.º 412.º do CPC. Não tendo aplicado este artigo e impondo o ónus de alegação à A., aplicou de forma errónea o art.º 412.º do CPC o que importa a revogação da Sentença do Tribunal a quo e sua substituição por outra que condene a R. no pagamento dos danos patrimoniais e não patrimoniais peticionados;
L) ERRO NA APLICAÇÃO DO DIREITO N.º 5 – AUSÊNCIA DE EFEITO PRECLUSIVO DOS FACTOS COMPLEMENTARES - os danos patrimoniais e não patrimoniais causados constituem factos complementares, ou seja, factos que concretizam ou complementam os factos que integram a causa de pedir (no caso concreto – a ilegalidade das greves), logo, mesmo considerando uma ausência de alegação (o que sempre sem conceder apenas se admite por mero raciocínio) caberia ao Tribunal a quo (i) convidar a A. a alegar esses factos nos termos do art.º 590.º n.º 2 al. b) e n.º 4 do CPC ou (ii) realizar a audiência de discussão e julgamento, de modo a permitir que esses factos fossem adquiridos durante a instrução e discussão da causa.
M) Não tendo feito nenhuma destas ações o Tribunal a quo não aplicou como deveria o art.º 590.º CPC o que importa a revogação da Sentença do Tribunal a quo e sua substituição por outra que condene a R. no pagamento dos danos patrimoniais e não patrimoniais peticionados;
N) ERRO NA APLICAÇÃO DO DIREITO N.º 6 – DA TUTELA JURÍDICA ART.º 496.º CPC - em decorrência das greves convocadas ilegalmente pela R., a A. sofreu os seguintes danos:
• Supressão de inúmeras viagens – conferir Documento n.º 7 junto com a PI;
• Perda de receitas – conferir Documento n.º 7 junto com a PI);
• Cobertura mediática negativa na comunicação social – conferir Documento n.º 8 junto com a PI)
• Danos reputacionais desproporcionais e desnecessários na reputação da empresa como sendo um prestador de serviços confiável – conferir art.º 62.º da PI e Documento n.º 9 junto com a PI.
O) Os danos descritos supra são graves (muito graves até) e são, sem dúvida nenhuma, merecedores da tutela do Direito nos termos do art.º 496.º CC, pelo que não tendo merecido tutela, como deveria, tal importa a revogação da Sentença do Tribunal a quo e sua substituição por outra que condene a R. no pagamento dos danos patrimoniais e não patrimoniais peticionados
P) ERRO NA APLICAÇÃO DO DIREITO N.º 7 – APLICAÇÃO ERRADA DO ART.º 57.º CPT – em nosso entender este mal o Tribunal a quo quando refere o seguinte:
E é sobre a Autora que incide o ónus da prova no tocante à verificação dos demais elementos/pressupostos da responsabilidade civil: o dano e a existência de nexo de causalidade entre a conduta e o dano (artigo 342º, n.º 1, do Código Civil).
Ora, em face do que se deixa dito, resulta à saciedade que a matéria factual apurada não permite concluir pela ocorrência de um dano e de nexo de causalidade entre as greves e os danos.” Conferir com último parágrafo da página 8 da Sentença emitida pelo Tribunal a quo.
Q) Porquanto, a R., tendo sido regularmente citada e estando presente na audiência de partes, não contestou!!! E consequentemente, consideram-se confessados os factos articulados pelo autor nos termos do art.º 57.º do CPT.
R) Termos pelos quais deve a Sentença do Tribunal a quo ser revogada e substituída por outra que outra que reconheça que dê como provados, por confessados, a existência dos danos patrimoniais e não patrimoniais peticionados e, assim, se proceda à condenação da R. de todos os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pela A. e causados pela convocação das greves ilegais por parte da R., que se encontram na base da discussão dos presentes autos.
S) ERRO NA APLICAÇÃO DO DIREITO N.º 8 – CONDENAÇÃO DA A. EM CUSTAS NOS TERMOS DO ART.º 527 CPC - As greves convocadas pela R. foram ilegais por não serem cumprirem as regras e formalidades previstas para o efeito e nesta conformidade, foi a R., e não a A., que deu causa à presente ação, termos pelos quais deve a Sentença do Tribunal a quo ser revogada e substituída por outra que outra que reconheça que a R. como responsável pelo pagamento das custas judiciais nos termos do art.º 527.º do CPC.
T) Considerando o acima exposto, forçoso será então também concluir pela revogação da Sentença do Tribunal a quo e emitir nova sentença que conclua pelo pagamento dos danos patrimoniais e não patrimoniais peticionados pela A. para todos os devidos efeitos legais, fazendo-se assim a costumada JUSTIÇA!!!»
O R. apresentou resposta ao recurso da A., pugnando pela sua improcedência.
O R. também interpôs recurso da sentença, formulando as seguintes conclusões:
«1. Veio o Tribunal a quo proferir decisão no sentido de julgar parcialmente procedente o pedido formulado nos autos pela Autora, declarando “a ilegalidade das greves levadas a cabo pela Ré nos dias 13.03.2023, 17.04.2024 e de 14.05.2024, por violação das formalidades previstas no artigo 534º, do Código do Trabalho”.
2. Contudo, não resulta da sentença recorrida, nem da sua fundamentação, quais as formalidades previstas no artigo 534.º do Código do Trabalho que considera terem sido violadas, limitando-se a, genericamente, considerar que as mesmas não foram observadas.
3. Ora, tal circunstância impediu o Recorrente compreender as razões que levaram à decisão proferida, razão pela qual se interpôs o presente recurso, o qual assenta, desde logo, na nulidade da sentença proferida, à luz do artigo 615.º, n.º 1, alínea c) do Código do Processo Civil.
4. Veio a Autora alegar que os pré-avisos de greve eram omissos quanto à apresentação de uma proposta de serviços mínimos e de segurança de equipamentos e instalações. (Quanto a estes formalismos, a sentença até parece concordar que os mesmos foram observados, porquanto podemos ler, a fls. 5 da sentença que “Consideraram-se as convocatórias de greve, as quais constituem cumprimento de formalidade legal, valendo enquanto tal.”, ou a fls. 7 da sentença que “Da factualidade apurada resulta que do aviso de greve consta apenas que “a Associação Sindical signatária considera que, face às atuais circunstâncias, nomeadamente o número de trabalhadores abrangidos pelo aviso-prévio efetuado e a sua ampla divulgação, e as características desta greve, apenas se mostra necessário assegurar, à priori, os seguintes serviços mínimos: Funcionamento normal de todos os serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações.”, e a fls. 8 “O aviso das greves não ignorou os serviços mínimos; defendeu, sim – bem ou mal - que se tornava desnecessário tal fixação.”)
5. Pelo que não se compreende, como conclui a douta sentença recorrida nos seguintes termos: “Pelo exposto, resulta à saciedade o não cumprimento das formalidades legais de que depende a convocação de uma greve, o que se decide, procedendo o primeiro pedido da Autora.” Mas quais são as formalidades legais em causa? O que foi que o Réu não observou? Isso a sentença não o diz, e o Réu não o pode adivinhar!
6. E nem se diga que o Tribunal a quo considerou as três greves ilegais, por entender que faltou a comunicação ao ministério responsável pela área laboral, conforme dita o artigo 534.º, n.º 1 do Código do Trabalho, porquanto só levanta essa questão (e a nosso ver, mal) quanto à primeira greve, ocorrida em 12 de março de 2024. (A esse respeito, refere a sentença recorrida que “E quanto aos formalismos, a greve depende de comunicação ao ministério responsável pela área laboral um aviso com a antecedência mínima de cinco dias úteis ou, em situação referida no n.º 1 do art.º 537º, 10 dias úteis. E quanto à greve de dia 12 de março, tal não ocorreu, pois que da factualidade apurada não resulta ter a greve sido comunicada à Inspecção Regional do Trabalho e da Acção Inspectiva, entidade com essas competências nesta região. Já quanto às greves de dia 17 de abril e de 14 de maio, tal comunicação ocorreu.”)
7. Portanto, se foi este o formalismo incumprido pelo Réu, só o foi relativamente à primeira greve (segundo afirma o tribunal), donde não se percebe a razão de terem sido julgadas ilegais as três greves convocadas, já que é o Tribunal a quo que, (e bem) reconhece que no caso das greves de 17 de abril e de 14 de maio, tal comunicação ocorreu.
8. Pelo que, salvo o devido respeito, que é muito, pelo Tribunal a quo, impõe-se que seja declarada a nulidade da sentença recorrida, à luz do artigo 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC, devendo a mesma ser devidamente fundamentada.
9. Sucede que, o Réu cumpriu com as formalidades legalmente exigíveis, nomeadamente quanto à apresentação de proposta de serviços mínimos, e proposta de serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações, ao contrário do invocado pela Autora.
10. Aliás, o Réu considerou que a presente ação era de tal modo infundada e descabida, que nem a contestou, pretendendo poupar ao Tribunal os seus recursos, já que considerou que dos próprios documentos juntos pela Autora resultava a prova para a sua absolvição quanto aos pedidos formulados, porquanto para chegar a esta conclusão, basta analisar os documentos juntos pela Autora, correspondentes aos pré-avisos de greve (que a Autora intencionalmente não reproduz na totalidade no texto da ação, mas que junta como documentos 1 e 3 com a petição inicial), para chegarmos à conclusão que o Réu cumpriu com as suas obrigações legais, nomeadamente de apresentação de proposta para realização de serviços necessários à segurança e manutenção de Equipamento e Instalações, e proposta de realização de serviços mínimos.
11. Isto porque, dos documentos juntos pela Autora com a douta petição inicial, como Doc. 1 e Doc. 3, resulta que o Réu, no seu pré-aviso de greve, alegou o seguinte: “Pelo exposto, a associação sindical signatária considera que, face às atuais circunstâncias, nomeadamente o número de trabalhadores abrangidos pelo pré-aviso efetuado, e a sua ampla divulgação, e as características desta greve, apenas se mostra necessário assegurar, a priori, os seguintes serviços mínimos:
O Funcionamento normal de todos os serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações;
A associação sindical signatária declara, porém, que assegurará ainda, no decorrer da greve, todos e quaisquer serviços que, em função de circunstâncias concretas e imprevisíveis, venham a mostrar-se necessários para suprir todas as necessidades sociais impreteríveis que se venham a verificar.”
12. Salvo o devido respeito, que é muito, a proposta que o Réu apresentou, como sendo serviços mínimos que considerou necessários e garantindo ainda a segurança e manutenção dos equipamentos e instalações NÃO PODE SER ENTENDIDA como ausência de proposta de serviços mínimos e de ausência de proposta para realização de serviços necessários à segurança e manutenção de Equipamento e Instalações, porque efetivamente, não o é.
13. A Autora não pode ignorar que estamos a falar de apenas três greves, com um período de duração de apenas 24 horas, cada uma delas, realizadas espaçadamente num período de três meses (uma greve de um dia, por cada mês). E que o universo de trabalhadores filiado no SNMOT – que poderiam aderir à greve - não é expressivo ao ponto de inviabilizar a sua exploração, mesmo que as greves em causa pudessem ter adesão máxima por parte dos trabalhadores filiados no Réu. Ou seja, mesmo que todos os trabalhadores filiados no SNMOT aderissem à greve, a Autora tinha outros tantos trabalhadores que não são filiados no SNMOT, para gerir a sua exploração, e minimizar os seus (não) alegados prejuízos.
14. A verdade, é que, porém, o próprio Réu manifestou a sua disponibilidade para assegurar o funcionamento normal de todos os serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações, que considerou ser suficiente, atendendo à duração de cada período de greve, e universo dos trabalhadores abrangidos, atendendo à universalidade de trabalhadores da Autora, e além disso comprometeu-se a assegurar, no decorrer da greve, todos e quaisquer serviços que, em função de circunstâncias concretas e imprevisíveis, viessem a ser necessários para suprir todas as necessidades sociais impreteríveis que pudessem surgir. (Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 24.02.2021, de onde emerge que “I - O direito à greve constitui um direito fundamental dos trabalhadores, previsto no art.º 57.º da Constituição da República Portuguesa, por via do qual podem os mesmos recusar a prestação laboral contratualmente devida, sem que tal acarrete qualquer consequência jurídica desfavorável nas suas esferas jurídicas; II – Não sendo, contudo, o direito à greve um direito absoluto, sofre o mesmo os limites resultantes da necessária conciliação com outros direitos constitucionalmente protegidos. É-lhe aplicável o disposto no art.º 18.º da CRP, pelo que apenas se admitem restrições a esse direito, para salvaguarda de outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos, com respeito pelos princípios da necessidade, e adequação e proporcionalidade. III – Com a previsão da obrigação de prestação de serviços necessários à manutenção e segurança de equipamentos e instalações por parte das Associações Sindicais e dos trabalhadores durante a greve (artigos 534.º n.º 3 e 537.º n.º 2, do Código do Trabalho), pretende-se obstar a que a greve atinja ou afete a aptidão funcional da empresa ou do estabelecimento para a retoma da laboração normal depois de finalizada a paralisação, e, mediatamente, salvaguardar o princípio da iniciativa económica privada (art.º 61.º da CRP), na perspetiva da “liberdade de organização, gestão e atividade da empresa. IV - A ponderação relativa de interesses entre o direito à greve e outros direitos fundamentais, face à paridade abstrata de uns e de outros, deve ser feita em concreto. V – Assim, não se considera ilegal a greve declarada e comunicada à ré mediante aviso prévio emitido por Associação Sindical de que são associados os autores, onde não consta uma proposta de definição de serviços necessários à segurança e manutenção de equipamento e instalações, quando se ignora, de todo, se a dita greve implicou (ou não) a paralisação completa dos serviços da ré, se todos os trabalhadores a ela aderiram (ou não) e/ou se não havia outros trabalhadores não aderentes que pudessem realizar as prestações em causa. VI - A posição da ré, ao considerar ilegal a greve a que aderiram os autores, aplicando-lhes faltas injustificadas, no apontado contexto e face à natureza dos direitos em presença, consubstancia clara inobservância dos apontados princípios necessidade, adequação e proporcionalidade, colocando em causa o núcleo essencial do direito fundamental à greve de que são titulares os autores, razão pela qual não pode manter-se. VII - Não se concluindo pela ilegalidade da greve, não podem considerar-se injustificadas as ausências ao serviço por parte dos autores nos aludidos dias, sendo os efeitos da greve os decorrentes do art.º 536.º do Código do Trabalho.)
15. Daqui resulta que, nem que o pré-aviso de greve do Réu fosse omisso quanto a proposta de serviços mínimos e serviços para garantia da segurança e manutenção de equipamentos e instalações (que não era) mesmo assim a greve não poderia ser considerada ilegal, se em concreto não fosse demonstrado se a dita greve implicou (ou não) a paralisação completa dos serviços da ré, se todos os trabalhadores a ela aderiram (ou não) e/ou se não havia outros trabalhadores não aderentes que pudessem realizar as prestações em causa. (Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 01.07.2008: “1. A proposta de definição de serviços mínimos, prevista no art.º 595º, nº 3, do Código do Trabalho, a incluir no aviso prévio de greve declarada por associações sindicais inseridas em sectores de atividade que satisfaçam ‘necessidades sociais impreteríveis’, visa garantir que essas associações, apesar de envolvidas num conflito laboral agudo, como é a greve, não deixem de assumir uma postura de responsabilidade no que toca à satisfação de necessidades básicas da população. 2. Não será assim de considerar por essa razão ilegal, à luz do princípio enunciado no art.º 604º, nº 1, do referido Código, uma greve cujo aviso prévio não foi acompanhado de uma proposta concreta e minuciosa de definição de serviços mínimos, mas na qual se manifesta inequivocamente a disponibilidade dos trabalhadores para assegurar esses serviços mínimos, e para fazê-lo à semelhança do sucedido por ocasião de anteriores greves.”
16. Aliás, se atendermos a fundamentação deste acórdão, percebemos o porque desta decisão: “Afigura-se-nos, porém, que nem a letra nem o espírito da lei consentem uma tão exigente interpretação. Com efeito, o que a lei pretende acima de tudo garantir é que em sectores essenciais de actividade a greve não venha a pôr em causa necessidades básicas da população, cujo incumprimento seria certamente muito mais gravoso que o sacrifício de alguns dos interesses laborais que a greve pretende prosseguir, e cujo êxito dependerá naturalmente do grau de adesão que a mesma possa obter junto dos trabalhadores destinatários. Por isso, e bem vistas as coisas, não se exige naquele art.º 595º, nº 3, uma proposta concreta e minuciosa de definição de serviços mínimos. O que parece fundamental é sim que as entidades sindicais que convocam a greve manifestem claramente a sua vontade e a sua disponibilidade para assegurar esses serviços mínimos, de uma forma que viabilize que os mesmos venham depois a ser definidos na prática.” (Cfr. Ac. Tribunal da Relação de Évora de 01.07.2008) 17.
Ou seja, a mera disponibilidade para assegurar os serviços mínimos é, em si, já uma proposta de serviços mínimos, pelo que inexistem dúvidas de que o Réu cumpriu com as formalidades no seu pré-aviso de greve.
18. Sendo falso o alegado pela Autora, de que o Réu não tenha apresentado proposta de serviços mínimos e proposta de serviços necessários à segurança e manutenção de Equipamento e Instalações, que apresentou, e que estão juntos aos autos, e que o Tribunal a quo não avaliou concretamente, o que se esperava que fosse feito, concluindo-se pela sua perfeita legalidade!
19. Mas mais, resulta, ainda, das comunicações remetidas pela Autora ao Réu (Docs. 2 e 4 juntos com a PI), que o que aconteceu foi que a Autora, do alto da sua sapiência, decidiu não avançar com proposta concreta de serviços mínimos e serviços de segurança dos equipamentos e instalações, limitando-se a considerar que a proposta do Réu era insuficiente – apelidando-a inclusivamente de “não séria”.
20. E não veio, como lhe competia, apresentar qualquer contraproposta, ou solicitar mediação nesse sentido.
21. Aliás, a Autora, ao invés de ter enviado cartas ao Réu a qualificar os pré-avisos de greve de ilegais e as propostas de serviços mínimos e de serviços necessários à segurança e manutenção de Equipamento e Instalações como “não sérias”, deveria era ter dado início às negociações nos termos previstos no artigo 538.º, n.º 1 do Código do Trabalho, o que preferiu não fazer, para astuciosamente arranjar “fundamento” para intentar contra o Réu uma ação judicial, sem qualquer fundamento, e ainda pedir para ser indemnizada pelos (não) alegados danos que as greves sempre causam.
22. Portanto o Réu apresentou a proposta que, no seu entender, era adequada a salvaguardar que se satisfizessem “necessidades sociais impreteríveis”, e garantir o funcionamento normal de todos os serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações.
23. E na ausência de qualquer proposta, cumpriu-se com o pré-aviso nos seus exatos termos, tendo os trabalhadores, em todas as greves estado absolutamente disponíveis para assegurar o funcionamento normal de todos os serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações, que considerou ser suficiente, atendendo à duração de cada período de greve, e universo dos trabalhadores abrangidos, atendendo à universalidade de trabalhadores da Autora, e além disso comprometeu-se a assegurar, no decorrer da greve, todos e quaisquer serviços que, em função de circunstâncias concretas e imprevisíveis, viessem a ser necessários para suprir todas as necessidades sociais impreteríveis que pudessem surgir.
24. Na verdade, a Autora bem sabe que as greves convocadas pelo Réu o foram com observância dos requisitos legais, e que apenas não houve negociação quanto à realização de serviços mínimos porque ela própria preferiu atacar o Réu – por fazer o seu trabalho em defesa dos seus associados – ao invés de cumprir com as suas obrigações legais, constantes do artigo 538.º, n.º 1 do CT.
25. E, não satisfeita com o ataque dirigido ao Réu, ainda ameaça expressa e explicitamente os seus próprios trabalhadores, querendo limitar-lhes o direito à greve, o que faz nas duas comunicações juntas como Documento 2 e 4, com a PI, afirmando que fará: “… incorrer os trabalhadores grevistas no regime de faltas injustificadas com as respetivas responsabilidades e consequências disciplinares que se venham a verificar, nos termos conjugados do nº 2 e nº 3 do artº 534º e nº 1 e nº 3 do artº 537º e artº 541 do Código do Trabalho”.
26. Em clara obstrução ao direito constitucional dos trabalhadores à greve, por um lado, e numa tentativa de intimidação e exercício de coação, por outro, ao Sindicato Réu, tentativa esta que não podia deixar de ser relevada pelo Tribunal a quo, como foi, nem que fosse com uma advertência de que tal tipo de conduta é uma clara obstrução ao exercício de direitos, liberdades e garantias, intolerável e inaceitável sob todos os pontos de vista.
27. Acresce que, curiosamente, a Autora acabou por implicitamente reconhecer legitimidade e legalidade às greves ocorridas, porquanto:
O Não instaurou qualquer procedimento disciplinar (como anunciou aos 4 ventos que faria) contra nenhum dos trabalhadores aderentes à greve;
O Não efetuou sequer qualquer desconto salarial aos trabalhadores que aderiram à greve de 12.03.2024;
O Efetuou um desconto salarial aos trabalhadores que aderiram às greves de 17.04.2024 e 14.05.2024, tendo qualificado (e bem, na verdade) esse desconto como “GREVE” no recibo de vencimento dos trabalhadores, e não o fazendo como “falta injustificada”, como alegou que faria.
Sendo evidente que a Autora, apesar de ter “discordado” das greves convocadas pelo Réu, um primeiro momento, e ter tentado amedrontá-lo e impedir o desempenho da sua atividade sindical, ameaçando inclusivamente os trabalhadores nele filiados com processos disciplinares e faltas injustificadas, acabou por reconhecer implicitamente que não se verificou qualquer ilegalidade.
28. Já quanto às comunicações obrigatórias, nomeadamente ao ministério responsável pela área laboral, refere a douta sentença recorrida que quanto à greve de 12 de março, a mesma não foi comunicada à Inspeção Regional do Trabalho e da Acão Inspetiva, entidade com essas competências nesta região, sendo que quanto às greves de dia 17 de abril e de 14 de maio, tal comunicação ocorreu.
29. Contudo, não estamos em crer que seja a “congénere da ACT na Região Autónoma da Madeira”, a entidade com competência de ministério da área laboral no Arquipélago da Madeira.
30. Ora, a Lei não determina que seja feita qualquer comunicação – seja de que tipo for – às entidades fiscalizadoras das relações do trabalho, sejam estas a Inspeção Regional do Trabalho e da Ação Inspetiva ou a ACT – Autoridade para as Condições do Trabalho. O que a Lei determina é que essa comunicação seja feita ao Ministério responsável por essa área.
31. Salvo melhor entendimento, nem a DRTAI - Direção Regional do Trabalho e da Ação Inspetiva, nem a Autoridade para as Condições do Trabalho não se podem confundir, nem são considerados Ministérios.
32. Mas mesmo que afinal, as ilegalidades das três greves se devessem ao facto de o Réu incumprir com o dever de comunicar a realização da greve ao ministério responsável pela área laboral, e ainda que considerássemos como Ministério a “congénere da ACT na Região Autónoma da Madeira”, também não percebíamos porque, afinal, se consideram ilegais as três greves, se apenas a primeira não foi comunicada…
33. Mas, terá o Réu, obrigação de comunicar à “congénere da ACT na Região Autónoma da Madeira”, denominada por DRTAI (Direção Regional do Trabalho e da Ação Inspetiva) a intenção de realização de greves? Das atribuições legais da DRTAI, não resulta, salvo o devido respeito, que seja esta a entidade competente para regular as questões relativas às greves, até porque tal seria estar a atribuir funções ministeriais (que têm cariz político), a uma entidade de cariz fiscalizador.
34. Em Portugal continental, é à ACT que as associações sindicais comunicam os pré-avisos de greve? Pois, não é. Porque é que nas ilhas se comunicará à sua congénere, como avança a douta sentença recorrida? A lei ordena que se comuniquem ao ministério responsável pela área laboral, o qual inexiste, efetivamente na Madeira.
35. Na ausência de disposição legal que indique qual o ministério competente, o Réu entendeu que deveria comunicar as greves, o que fez, para a Secretaria Regional de Equipamentos e Infraestruturas (Cfr. Doc. 1 e 3 juntos com a petição inicial), sendo que este organismo é o organismo governamental, na área dos transportes, estando dele dependente, inclusivamente, a Direção Regional dos Transportes e da Mobilidade Terrestre (Cfr. https://www.madeira.gov.pt/srei).
36. Sendo que, quanto às greves realizadas em 17 de abril e 14 de maio, a questão nem se coloca, como bem reconhece o Tribunal a quo, pois o próprio tribunal reconhece que foram comunicadas a quem de direito.
37. Mas, se fosse esta a causa da decisão tomada quanto à ilegalidade das greves, apenas o poderia ser quanto à greve de 12 de março, e não as restantes duas greves, devidamente comunicadas.
38. Face ao que se expôs supra, impõe-se que o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, confrontado com os pré-avisos de greve juntos aos autos pela Autora, se pronuncie sobre a sua legalidade (ou não), dizendo expressamente em que medida os mesmos incumprem ou não o disposto no artigo 534.º do Código do Trabalho.
39. Tal tomada de posição é essencial, porquanto o Réu tem de saber que ilegalidades cometeu, até para não cair no erro de as voltar a cometer, sendo que tal não resulta de forma evidente (nem não evidente, na verdade) da sentença recorrida, que se limita a julgar as três greves ilegais, só porque sim.
40. A nosso ver, o Tribunal a quo equivocou-se na interpretação que fez ao documento emitido pela Direção regional do Trabalho, porquanto a mesma não diz que os aludidos avisos prévios não tinham uma proposta de serviços mínimos, apenas diz – e muito bem – que o aviso prévio deve contar, obrigatoriamente uma proposta de serviços mínimos que defina inequivocamente as condições a observar por forma a assegurar a satisfação das evidentes necessidades sociais impreteríveis, neste importante setor de atividade sócio económico regional.
41. Ora, as necessidades sociais impreteríveis só poderão ser supridas após o conhecimento da sua existência e nunca, antes, sob pena de se desvirtuar um Direito Constitucionalmente consagrado, pois as necessidades sociais impreteríveis são pertença dos cidadãos que possam ser afetados de forma irremediável pela Greve e não o setor de atividade atingido, muito menos uma qualquer atividade sócia económica de uma qualquer região, seja esta autónoma ou não.
42. O Tribunal a quo equivocou-se na sua decisão, ao considerar que a Inspeção Regional do Trabalho, tinha ou tem autoridade para se manifestar sobre eventuais irregularidades plasmadas nos avisos prévios de greve. Essa competência não é sua, sendo que era ao Tribunal que incumbia determinar as razões de legalidade ou ilegalidade das greves.
43. Ora, dizendo-se na douta sentença recorrida que resulta à saciedade que as greves são ilegais, sem que se indique o motivo ou motivos que considera estarem na base dessa constatação alegadamente tão óbvia, e que, ao Réu, assentando na jurisprudência por si analisada, escapa na totalidade, a mesma torna-se completamente ininteligível.
44. Importa, por isso, responder às seguintes questões:
a) Que formalidades foram violadas?
b) Não foram respeitados os prazos legais para a convocação da greve?
c) O aviso prévio não foi feito por meio idóneo?
d) O Aviso prévio não continha uma proposta de serviços mínimos e de garantia da segurança dos equipamentos e instalações?
e) O que é que, de transversal, se pode apontar aos três pré-avisos de greve, que tornem as greves realizadas, ilegais?
45. É que, salvo melhor entendimento, e atendendo à jurisprudência citada, os formalismos para a convocação das greves foram devidamente cumpridos.»
A A. apresentou resposta ao recurso do R., pugnando pela sua inadmissibilidade e improcedência.
Admitidos os recursos, e remetidos os autos a esta Relação, observou-se o disposto no art. 87.º, n.º 3 do CPT, tendo o Ministério Público emitido parecer no sentido da procedência do recurso do R., com a consequente absolvição do pedido, ficando prejudicado o conhecimento do recurso da A..
Cumprido o previsto no art. 657.º do CPC, cabe decidir em conferência.
2. Questões a resolver
Tal como resulta das conclusões dos recursos, que delimitam o seu objecto, as questões que se colocam a este Tribunal, por ordem de precedência lógica, são as seguintes:
- Recurso do R.: se a sentença padece de nulidade, nos termos do art. 615.º n.º 1, al. c) do CPC, por não especificar quais as formalidades que o R. inobservou ao decretar as greves; se o R. observou essas formalidades, não sendo as greves decretadas ilegais;
- Recurso da A.: se o R. devia ter sido condenado na indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais que a A. reclamou.
Previamente, cumpre apreciar a questão da inadmissibilidade do recurso do R., suscitada pela A..
Por força dos arts. 79.º do CPT e 629.º, n.º 1 do CPC, o recurso ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal, atendendo-se, em caso de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, somente ao valor da causa.
No presente caso, na petição inicial, a A. pediu que fosse judicialmente reconhecida a ilegalidade das greves convocadas pelo R. e que o R. fosse condenado a pagar à A. o montante de 23.950,10 €, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais causados por tais greves ilegais, indicando como valor da acção 23.950,10 €.
Por seu turno, na sentença, julgou-se a acção parcialmente procedente, com a declaração de ilegalidade das greves levadas a cabo pelo R. nos dias 13/03/2023, 17/04/2024 e 14/05/2024 e a absolvição do R. do demais pedido, fixando-se o valor da acção em 23.950,10 €.
Temos, assim, que o valor da acção – 23.950,10 € – é superior à alçada do tribunal de que se recorre – 5.000,00 € –, e que, apesar de a acção ter sido julgada parcialmente procedente, o valor da sucumbência da A. corresponde à totalidade do valor fixado à acção, desconhecendo-se o valor da sucumbência que o R. inequivocamente sofreu, correspondente à parte da sentença que lhe é desfavorável, isto é, a declaração de ilegalidade das greves levadas a cabo pelo mesmo nos dias 13/03/2023, 17/04/2024 e 14/05/2024.
Trata-se, pois, de situação em que, nos termos da parte final do n.º 1 do art. 629.º do CPC, se atende somente ao valor da causa.
Assim, uma vez que o valor da causa excede o valor da alçada do tribunal de que se recorre, tanto basta para que, no presente caso, o recurso do R. seja legalmente admissível, o que se declara.
3. Fundamentação
3.1. Os factos considerados provados são os seguintes:
1. A Rodoeste é uma empresa constituída em Março de 1967, na sequência da fusão entre a Empresa Automobilística da Ribeira Brava, Lda., com a Sociedade Automobilística de Câmara de Lobos, Lda. e a Sociedade de Automóveis do Estreito de Câmara de Lobos, Lda., dedicando-se a Rodoeste, tais como as empresas que a antecederam, à prestação do Serviço Público de Transporte de Passageiros na Zona Oeste da Ilha da Madeira.
2. É uma empresa detentora de alvará para a actividade de transporte nacional público rodoviário de passageiros, tem vindo a operar, ao longo da sua história de 54 anos, carreiras regulares entre o Funchal e os concelhos de Câmara de Lobos, Ribeira Brava, Ponta do Sol, Calheta, Porto Moniz, São Vicente e Santana, assim como, carreiras de circuito concelhio em Câmara de Lobos, Ribeira Brava, Ponta do Sol, Calheta e São Vicente
3. E dedica-se ao transporte público de passageiros, nomeadamente em áreas rurais e inter-urbanas para a cidade do Funchal.
4. Fruto desta natureza, apresenta uma fortíssima pendularidade, com uma concentração de viagens/passageiros às primeiras horas da manhã (entre por volta das 6h e as 10h), correspondente ao fluxo diário de passageiros de centros rurais / interurbanos, onde residem, para a cidade do Funchal, de modo a dar início às respectivas jornadas de trabalho, e vice-versa, com o regresso dos passageiros aos centros onde habitam, no final do dia (entre por volta das 17h e das 20h30).
5. No dia 23 de Fevereiro de 2024, o R. remeteu para a ACIF – Câmara de Comércio e Indústria, a Direcção Regional da Economia e dos Transportes e a Secretaria Regional do Equipamento e Infraestruturas um Aviso Prévio de Greve, por intermédio do qual convocou uma greve “desde as 00 horas e 00 minutos do dia 12 de Março de 2024 até ao último serviço alocado a esse mesmo dia”.
6. E nesta fez constar que “a Associação Sindical signatária considera que, face às atuais circunstâncias, nomeadamente o número de trabalhadores abrangidos pelo aviso-prévio efetuado e a sua ampla divulgação, e as características desta greve, apenas se mostra necessário assegurar, à priori, os seguintes serviços mínimos: Funcionamento normal de todos os serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações. A Associação Sindical signatária declara, porém, que assegurará ainda, no decorrer da greve, todos e quaisquer serviços que, em função de circunstâncias concretas e imprevisíveis, venham a mostrar-se necessários para suprir todas as necessidades sociais impreteríveis que se venham a verificar”.
7. No dia 7 de Março de 2024, a Rodoeste remeteu uma carta ao R., por intermédio da qual referiu que o R. “não remeteu a comunicação com o aviso prévio de greve às entidades responsáveis pela área laboral na Região Autónoma da Madeira (….) não procede à fixação de quaisquer serviços mínimos socialmente relevantes e destinados a assegurar os interesses que o regime legal da greve, no caso de empresas e/ou estabelecimentos que respondem às aludidas necessidades impreteríveis, visa salvaguardar e assegurar” e “o recurso lícito à greve passa necessariamente pelo observância dos requisitos e formalismos constantes dos art.º 534º e 537º do Código do Trabalho”. E “ser evidente que o SNMOT estava obrigado à definição e realização de serviços mínimos” e “proposta de serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações” (…) “e não tendo o formalismo legal referente ao pré-aviso de greve sido respeitado pelo SNMOT, a greve é, para todos os devidos efeitos legais, ilícita, o que faz incorrer os trabalhadores grevistas no regime de faltas injustificadas com as respectivas responsabilidades e consequências disciplinares”.
8. O R. avançou com a realização da greve nos termos definidos.
9. No dia 27 de Março de 2024, o R. remeteu para a ACIF – Câmara de Comércio e Indústria, para a Direcção Regional do Trabalho e dos Transportes e para a Secretaria Regional do Equipamento e Infraestruturas, novo Aviso-Prévio de Greve, por intermédio do qual procedeu convocou greves:
• “Desde as 00 horas e 00 minutos do dia 17 de Abril de 2024 até ao último serviço alocado a esse mesmo dia;
• Desde as 00 horas e 00 minutos do dia 14 de Maio de 2024 até ao último serviço alocado a esse mesmo dia”.
10. E nesta fez constar que “a Associação Sindical signatária considera que, face às atuais circunstâncias, nomeadamente o número de trabalhadores abrangidos pelo aviso-prévio efetuado e a sua ampla divulgação, e as características desta greve, apenas se mostra necessário assegurar, à priori, os seguintes serviços mínimos: Funcionamento normal de todos os serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações. A Associação Sindical signatária declara, porém, que assegurará ainda, no decorrer da greve, todos e quaisquer serviços que, em função de circunstâncias concretas e imprevisíveis, venham a mostrar-se necessários para suprir todas as necessidades sociais impreteríveis que se venham a verificar”.
11. No dia 8 de Abril de 2024, a Rodoeste remeteu carta ao R., por intermédio da qual referiu “não remeteu a comunicação com o aviso prévio de greve às entidades responsáveis pela área laboral na Região Autónoma da Madeira (….) não procede à fixação de quaisquer serviços mínimos socialmente relevantes e destinados a assegurar os interesses que o regime legal da greve, no caso de empresas e/ou estabelecimentos que respondem às aludidas necessidades impreteríveis, visa salvaguardar e assegurar” e “o recurso lícito à greve passa necessariamente pelo observância dos requisitos e formalismos constantes dos art.º 534º e 537º do Código do Trabalho”. E “ser evidente que o SNMOT estava obrigado à definição e realização de serviços mínimos” e “proposta de serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações” (…) “e não tendo o formalismo legal referente ao pré-aviso de greve sido respeitado pelo SNMOT, a greve é, para todos os devidos efeitos legais, ilícita, o que faz incorrer os trabalhadores grevistas no regime de faltas injustificadas com as respectivas responsabilidades e consequências disciplinares”.
12. A DRTAI remeteu carta ao R.: “(…) convocamos V/Ex.as para a imperiosa necessidade da observância das regras do Direito do Trabalho aplicáveis. Assim, nos termos do artigo 534.º, n.º 1 e 3, e artigo 537.º, n.º 2, al h) do Código do Trabalho, o aviso prévio deve conter, obrigatoriamente, uma proposta de serviços mínimos que defina inequivocamente as condições a observar por forma a assegurar a satisfação das evidentes necessidades sociais impreteríveis, neste importante setor de atividade sócio económico regional. No pressuposto de que através da ponderação e do diálogo é sempre possível encontrar a justa e adequada composição dos diferendos, no legítimo interesse de todas as partes, o que se impõe fazendo a leitura na sociedade contemporânea.”
13. O R. avançou com a realização da greve nos termos definidos.
14. A A. Rodoeste, em Dezembro de 2023, foi alvo de um incêndio de grandes dimensões que provocou a destruição de 5 autocarros, uma empilhadora e estragos nos escritórios.
3.2. No seu recurso, o R. invoca a nulidade da sentença a que se refere o art. 615.º n.º 1, al. c) do CPC por, alegadamente, a mesma não especificar quais as formalidades que o R. inobservou ao decretar as greves.
Estabelece o n.º 1 do art. 615.º do CPC que é nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.
Ora, no que toca à falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, nos termos da alínea b), sublinha-se que, como diz Fernando Amâncio Ferreira1, “[a] falta de motivação susceptível de integrar a nulidade de sentença é apenas a que se reporta à falta absoluta de fundamentos, quer estes respeitem aos factos, quer ao direito (…)”.
No mesmo sentido, pronunciou-se Artur Anselmo de Castro2, afirmando que “[t]ambém a falta de fundamentação constitui causa de nulidade da sentença, quer a omissão respeite aos fundamentos de facto, quer aos de direito. Da falta absoluta de motivação jurídica ou factual – única que a lei considera como causa de nulidade – há que distinguir a fundamentação errada, pois esta, contendendo apenas com o valor lógico da sentença, sujeita-a a alteração ou revogação em recurso, mas não produz nulidade (…)”.
Quanto à nulidade a que respeita a alínea c), a contradição entre os fundamentos e a decisão ocorre quando, na fundamentação da sentença, o julgador segue determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, e, em vez de a extrair, decide noutro sentido, oposto ou divergente. Trata-se duma contradição lógica, que também aqui se distingue do erro de julgamento, o qual se reporta a uma errada consideração dos factos como provados ou não provados, ou a uma errada subsunção destes ao direito aplicável. Quando o entendimento do juiz, embora errado, é expresso na fundamentação, ou dela decorre, e do mesmo é retirada uma conclusão conforme, não ocorre a oposição lógica geradora de nulidade da sentença, mas sim erro de julgamento3.
Por outro lado, como ensina José Alberto dos Reis, “[a] sentença é obscura quando contém algum passo cujo sentido seja ininteligível; é ambígua quando alguma passagem se preste a interpretações diferentes. Num caso não se sabe o que o juiz quis dizer; no outro hesita-se entre dois sentidos diferentes e porventura opostos. É evidente que, em última análise, a ambiguidade é uma forma especial de obscuridade. Se determinado passo da sentença é susceptível de duas interpretações diversas, não se sabe, ao certo, qual o pensamento do juiz.”4. Não obstante, como resulta expressamente da norma em análise, só releva como causa de nulidade da sentença a ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível, e não também a que afecte apenas a fundamentação. A ininteligibilidade da parte decisória da sentença ocorre quando um declaratário normal não possa retirar da mesma um sentido unívoco, ainda que por recurso à fundamentação para a interpretar5.
Ora, compulsada a sentença recorrida, verifica-se que a mesma refere, para além dos factos provados pertinentes à questão, quais as formalidades da decretação de greve que considera não cumpridas, a saber: quanto à greve de 12 de Março, a falta de comunicação à Direcção Regional do Trabalho e da Acção Inspectiva; quanto às greves de 17 de Abril e de 14 de Maio, a consideração por esta entidade de que era obrigatória a fixação de serviços mínimos, ao contrário do entendido pelo R..
Conclui-se, pois, que não ocorre falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, sem prejuízo de erro de julgamento quanto aos mesmos, sendo certo que o R. também não invocou expressamente a al. b) do n.º 1 do art. 615.º do CPC.
Por outro lado, à luz da alínea c), a que o R. apela, constata-se que também não ocorre: contradição entre os fundamentos e a decisão, posto que na sentença se aprecia e afirma a inobservância das formalidades já aludidas e na consequente decisão se extrai a conclusão lógica da ilegalidade das greves; ou ininteligibilidade da parte decisória da sentença, ao julgar-se a acção parcialmente procedente, com a declaração da ilegalidade das greves e a absolvição do R. do demais pedido, posto que tal enunciado é claro e inequívoco.
Ora, nos termos explicitados, tanto basta para que não se verifique a nulidade da sentença que o R. arguiu e que, assim, se julga improcedente.
Vejamos, então, se as greves decretadas pelo R. não são ilegais, conforme este sustenta no seu recurso.
O direito à greve está garantido no art. 57.º da Constituição da República Portuguesa, o qual estabelece que compete aos trabalhadores definir o âmbito de interesses a defender através da greve, não podendo a lei limitar esse âmbito, e que cabe à lei definir as condições de prestação, durante a greve, de serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações, bem como de serviços mínimos indispensáveis para ocorrer à satisfação de necessidades sociais impreteríveis.
Nesta conformidade, veio estabelecer o Código do Trabalho, no que ora interessa:
Artigo 534.º
Aviso prévio de greve
1 - A entidade que decida o recurso à greve deve dirigir ao empregador, ou à associação de empregadores, e ao ministério responsável pela área laboral um aviso com a antecedência mínima de cinco dias úteis ou, em situação referida no n.º 1 do artigo 537.º, 10 dias úteis.
2 - O aviso prévio de greve deve ser feito por meios idóneos, nomeadamente por escrito ou através dos meios de comunicação social.
3 - O aviso prévio deve conter uma proposta de definição de serviços necessários à segurança e manutenção de equipamento e instalações e, se a greve se realizar em empresa ou estabelecimento que se destine à satisfação de necessidades sociais impreteríveis, uma proposta de serviços mínimos.
4 - Caso os serviços a que se refere o número anterior estejam definidos em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, este pode determinar que o aviso prévio não necessita de conter proposta sobre os mesmos serviços, desde que seja devidamente identificado o respectivo instrumento.
Artigo 537.º
Obrigação de prestação de serviços durante a greve
1 - Em empresa ou estabelecimento que se destine à satisfação de necessidades sociais impreteríveis, a associação sindical que declare a greve, ou a comissão de greve no caso referido no n.º 2 do artigo 531.º, e os trabalhadores aderentes devem assegurar, durante a mesma, a prestação dos serviços mínimos indispensáveis à satisfação daquelas necessidades.
2 - Considera-se, nomeadamente, empresa ou estabelecimento que se destina à satisfação de necessidades sociais impreteríveis o que se integra em algum dos seguintes sectores:
a) Correios e telecomunicações;
b) Serviços médicos, hospitalares e medicamentosos;
c) Salubridade pública, incluindo a realização de funerais;
d) Serviços de energia e minas, incluindo o abastecimento de combustíveis;
e) Abastecimento de águas;
f) Bombeiros;
g) Serviços de atendimento ao público que assegurem a satisfação de necessidades essenciais cuja prestação incumba ao Estado;
h) Transportes, incluindo portos, aeroportos, estações de caminho-de-ferro e de camionagem, relativos a passageiros, animais e géneros alimentares deterioráveis e a bens essenciais à economia nacional, abrangendo as respectivas cargas e descargas;
i) Transporte e segurança de valores monetários.
3 - A associação sindical que declare a greve, ou a comissão de greve no caso referido no n.º 2 do artigo 531.º, e os trabalhadores aderentes devem prestar, durante a greve, os serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações.
4 - Os trabalhadores afectos à prestação de serviços referidos nos números anteriores mantêm-se, na estrita medida necessária a essa prestação, sob a autoridade e direcção do empregador, tendo nomeadamente direito a retribuição.
Artigo 538.º
Definição de serviços a assegurar durante a greve
1 - Os serviços previstos nos n.ºs 1 e 3 do artigo anterior e os meios necessários para os assegurar devem ser definidos por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho ou por acordo entre os representantes dos trabalhadores e os empregadores abrangidos pelo aviso prévio ou a respectiva associação de empregadores.
2 - Na ausência de previsão em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho ou de acordo sobre a definição dos serviços mínimos previstos no n.º 1 do artigo anterior, o serviço competente do ministério responsável pela área laboral, assessorado sempre que necessário pelo serviço competente do ministério responsável pelo sector de actividade, convoca as entidades referidas no número anterior para a negociação de um acordo sobre os serviços mínimos e os meios necessários para os assegurar.
3 - Na negociação de serviços mínimos relativos a greve substancialmente idêntica a, pelo menos, duas greves anteriores para as quais a definição de serviços mínimos por arbitragem tenha igual conteúdo, o serviço referido no número anterior propõe às partes que aceitem essa mesma definição, devendo, em caso de rejeição, a mesma constar da acta da negociação.
4 - No caso referido nos números anteriores, na falta de acordo nos três dias posteriores ao aviso prévio de greve, os serviços mínimos e os meios necessários para os assegurar são definidos:
a) Por despacho conjunto, devidamente fundamentado, do ministro responsável pela área laboral e do ministro responsável pelo sector de actividade;
b) Tratando-se de empresa do sector empresarial do Estado, por tribunal arbitral, constituído nos termos de lei específica sobre arbitragem obrigatória.
5 - A definição dos serviços mínimos deve respeitar os princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade.
6 - O despacho e a decisão do tribunal arbitral previstos no número anterior produzem efeitos imediatamente após a sua notificação às entidades a que se refere o n.º 1 e devem ser afixados nas instalações da empresa, estabelecimento ou serviço, em locais destinados à informação dos trabalhadores.
7 - Os representantes dos trabalhadores em greve devem designar os trabalhadores que ficam adstritos à prestação dos serviços mínimos definidos e informar do facto o empregador, até vinte e quatro horas antes do início do período de greve ou, se não o fizerem, deve o empregador proceder a essa designação.
Resulta do exposto que, tratando-se de empresa do sector privado que se destina à satisfação de necessidades sociais impreteríveis – como é o caso da A. por força do art. 537.º, n.ºs 1 e 2, al. h) –, as greves dos respectivos trabalhadores devem observar, em regra, os seguintes requisitos procedimentais de declaração e execução:
- a associação sindical deve dirigir ao empregador ou à associação de empregadores, e ao ministério responsável pela área laboral um aviso com a antecedência mínima de 10 dias úteis, devendo conter uma proposta de definição de serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações e uma proposta de serviços mínimos indispensáveis à satisfação de necessidades sociais impreteríveis;
- seguidamente, cabe à associação sindical e aos empregadores abrangidos pelo aviso prévio ou à respectiva associação de empregadores definir por acordo os serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações e os serviços mínimos indispensáveis à satisfação de necessidades sociais impreteríveis, bem como os meios necessários para os assegurar;
- na ausência de acordo sobre a definição dos serviços mínimos indispensáveis à satisfação de necessidades sociais impreteríveis, o serviço competente do ministério responsável pela área laboral, assessorado sempre que necessário pelo serviço competente do ministério responsável pelo sector de actividade, convoca a associação sindical e os empregadores abrangidos pelo aviso prévio ou a respectiva associação de empregadores para a negociação de um acordo sobre os serviços mínimos e os meios necessários para os assegurar;
- na falta de acordo nos três dias posteriores ao aviso prévio de greve, os serviços mínimos e os meios necessários para os assegurar são definidos por despacho conjunto, devidamente fundamentado, do ministro responsável pela área laboral e do ministro responsável pelo sector de actividade, o qual produz efeitos imediatamente após a sua notificação à associação sindical e aos empregadores abrangidos pelo aviso prévio ou à respectiva associação de empregadores, devendo ser afixado nas instalações da empresa, estabelecimento ou serviço, em locais destinados à informação dos trabalhadores;
- seguidamente, a associação sindical deve designar os trabalhadores que ficam adstritos à prestação dos serviços mínimos definidos e informar do facto o empregador, até vinte e quatro horas antes do início do período de greve ou, se não o fizerem, deve o empregador proceder a essa designação.
A A. peticionou que as greves convocadas pelo A. sejam declaradas ilegais por duas ordens de razões: quanto à 1.ª greve, por não ter sido dirigido aviso prévio à Secretaria Regional responsável pela área laboral; quanto a todas as greves, por ausência de “Proposta de Serviços Necessários à Segurança e Manutenção de Equipamentos e Instalações” e de “Proposta de Serviços Mínimos”.
Vejamos.
Como é sabido, o ministério responsável pela área laboral é o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social e o respectivo serviço competente para os efeitos acima referidos é a Direcção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho, concretamente através da Direcção de Serviços para as Relações Profissionais nas Regiões Norte e Centro e da Direcção de Serviços para as Relações Profissionais nas Regiões de Lisboa e Vale do Tejo, Alentejo e Algarve, a quem compete, nas respectivas áreas de actuação (art. 2.º, n.º 4, als. d) e e) do Decreto Regulamentar n.º 40/2012, de 12 de Abril, e arts. 1.º, als. e) e f) e 6.º, als. g) e h) da Portaria n.º 633/2007, de 30 de Maio):
- Registar os avisos prévios de greve e promover a negociação de acordo sobre os serviços mínimos a prestar em situação de greve em empresa ou estabelecimento susceptível de afectar a satisfação de necessidades sociais impreteríveis, bem como dos meios necessários para os assegurar;
- Preparar despachos conjuntos sobre a definição de serviços mínimos a prestar em situações de greves, bem como dos meios necessários para os assegurar.
Estabelece o art. 11.º, n.º 1 da Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, que aprovou o Código do Trabalho, que na aplicação do Código do Trabalho às Regiões Autónomas são tidas em conta as competências legais atribuídas aos respectivos órgãos e serviços regionais.
Ora, à data da declaração e execução das greves a que se reportam os presentes autos, na Região Autónoma da Madeira estavam em vigor os seguintes diplomas legais pertinentes:
- Decreto Regulamentar Regional n.º 15/2023/M, de 10 de Outubro de 2023, que aprovou a organização e funcionamento do XIV Governo Regional da Madeira, prevendo para a área laboral e outras a Secretaria Regional de Inclusão e Juventude;
- Decreto Regulamentar Regional n.º 4/2024/M, de 22 de Janeiro de 2024, que aprovou a orgânica da Secretaria Regional de Inclusão e Juventude, integrando para a área laboral a Direcção Regional do Trabalho, cuja orgânica era então regulada pelo Decreto Regulamentar Regional n.º 14/2016/M, de 2 de Maio de 2016 (entretanto revogado pelo Decreto Regulamentar Regional n.º 2/2025/M, de 3 de Janeiro de 2025).
Compulsados tais diplomas legislativos, contata-se que o Secretário Regional de Inclusão e Juventude não tinha competência para, conjuntamente com o Secretário Regional responsável pelo sector de actividade, proferir despacho a definir serviços mínimos e os meios necessários para os assegurar. Por outro lado, a Direcção Regional do Trabalho não tinha competência para, assessorada se necessário pelo serviço competente da Secretaria Regional responsável pelo sector de actividade, convocar a associação sindical e os empregadores abrangidos pelo aviso prévio ou a respectiva associação de empregadores para a negociação de um acordo sobre os serviços mínimos e os meios necessários para os assegurar.
Assim sendo, afigura-se de menor relevância que o R. tenha dirigido o aviso prévio relativo à greve do dia 12 de Março de 2024 à Direcção Regional da Economia e dos Transportes e à Secretaria Regional do Equipamento e Infraestruturas, e não à Secretaria Regional de Inclusão e Juventude ou à Direcção Regional do Trabalho, posto que estas não tinham as competências legais pressupostas no Código do Trabalho para estabelecer a exigência de envio do aviso prévio de greve ao “ministério responsável pela área laboral”. Note-se que também de nada serviria dirigir o aviso de greve a este ministério, uma vez que o mesmo não dispõe de competência nem de serviço competente para, na área de actuação das Regiões Autónomas, convocar a associação sindical e os empregadores abrangidos ou a respectiva associação de empregadores para a negociação de um acordo sobre os serviços mínimos e os meios necessários para os assegurar.
De qualquer modo, atendendo a que o aviso de greve pode ser dirigido aos destinatários por qualquer meio idóneo (inclusive através dos meios de comunicação social), é de presumir, segundo um padrão de normalidade, que o envio à Direcção Regional da Economia e dos Transportes e à Secretaria Regional do Equipamento e Infraestruturas tenha permitido o pertinente encaminhamento para as entidades congéneres da área laboral. Acresce que a carta que a A. remeteu ao R. a que se refere o ponto 7. da factualidade provada foi também dirigida à Secretaria Regional de Equipamentos e Infraestruturas, à Secretaria Regional de Inclusão e Juventude, à Direcção Regional do Trabalho e à Direcção Regional da Economia e Transportes Terrestres, pelo que também desse modo o aviso de greve e respectivo conteúdo acabou por ser levado ao conhecimento da Secretaria Regional e da Direcção Regional responsáveis pela área laboral.
Veja-se que, numa ratio similar, o legislador previu que o aviso prévio de greve possa ser dirigido ao empregador ou à associação de empregadores, apesar de o primeiro ser o interessado directo e imediato na minimização dos prejuízos da greve, considerando que dar conhecimento à segunda é suficiente para que o primeiro venha a saber do propósito dos trabalhadores.
Como refere Pedro Romano Martinez6, “[o] aviso prévio deve ser feito de modo a poder ser conhecido pelo empregador e pelo Ministério do Trabalho. O legislador não impôs requisitos de forma, seguindo o disposto no art. 219.º do CC.”
Também Maria do Rosário Palma Ramalho7 refere que não será meio idóneo “(…) uma comunicação que, com probabilidade, possa não ser recebida pelos destinatários”, ou seja, “(…) o critério de avaliação da idoneidade do meio utilizado para a emissão do aviso prévio da greve não pode deixar de ser o da sua recepção e cognoscibilidade pelos respectivos destinatários”, o que, nas circunstâncias do presente caso, leva a que deva entender-se que foi utilizado um meio capaz de chegar ao conhecimento de todos os destinatários, inclusive a Secretaria Regional de Inclusão e Juventude.
Repete-se, contudo, que, salvo melhor opinião, é de entender que, na Região Autónoma da Madeira, na ausência de acordo entre a associação sindical e os empregadores abrangidos pelo aviso prévio ou a respectiva associação de empregadores – a quem cabe, em 1.ª linha, definir os serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações e os serviços mínimos indispensáveis à satisfação de necessidades sociais impreteríveis, bem como os meios necessários para os assegurar –, não está devidamente regulado o procedimento administrativo tendente a solucionar definitivamente o impasse, pelo que a falta de envio directo do aviso de greve aos órgãos ou serviços regionais acima aludidos sempre constituiria mera irregularidade, por não ter cabimento legal a sua intervenção no processo em apreço, podendo, quando muito, viabilizar uma conciliação das partes nos termos gerais das suas competências.
Em face do exposto, entende-se que ambos os avisos prévios de greve foram dirigidos tempestivamente e por meios idóneos a quem se impunha legalmente, sendo certo que o segundo foi também endereçado à Secretaria Regional de Inclusão e Juventude e à Direcção Regional do Trabalho.
Quanto à alegada ausência de “Proposta de Serviços Necessários à Segurança e Manutenção de Equipamentos e Instalações” e de “Proposta de Serviços Mínimos”, consta dos avisos de greve que “a Associação Sindical signatária considera que, face às atuais circunstâncias, nomeadamente o número de trabalhadores abrangidos pelo aviso-prévio efetuado e a sua ampla divulgação, e as características desta greve, apenas se mostra necessário assegurar, à priori, os seguintes serviços mínimos: Funcionamento normal de todos os serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações. A Associação Sindical signatária declara, porém, que assegurará ainda, no decorrer da greve, todos e quaisquer serviços que, em função de circunstâncias concretas e imprevisíveis, venham a mostrar-se necessários para suprir todas as necessidades sociais impreteríveis que se venham a verificar”.
Por outras palavras, o R. propôs:
- relativamente à definição de serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações: o funcionamento normal de todos;
- relativamente à definição de serviços mínimos indispensáveis à satisfação de necessidades sociais impreteríveis: que nenhuns fossem estabelecidos (atenta a justificação apresentada).
Conforme refere António Monteiro Fernandes8, “[n]a prática, os pré-avisos seguem dois padrões distintos: ou deles consta a declaração de que não se consideram necessários quaisquer “serviços mínimos” (ou seja, no respeito pela lei, uma proposta de “zero serviços”), ou se afirma que serão cumpridas certas prestações correspondentes à concepção que o sindicato naturalmente tem da necessidade de preservação máxima da eficácia da greve. De um modo mais ou menos cabal, a exigência da lei acaba por ser aparentemente satisfeita, o que explica que a não inclusão de “uma proposta concreta e minuciosa de definição de serviços mínimos” seja considerada irrelevante, quanto à validade do aviso prévio”9.
Esta realidade nada tem de estranho, uma vez que está em causa uma mera proposta da parte interessada na maior amplitude possível dos efeitos da greve, e, por conseguinte, é do empregador ou associação de empregadores que, na defesa do respectivo interesse na minimização de tais efeitos, é de esperar que apresente uma contraproposta alargada e expressiva quanto aos serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações e serviços mínimos indispensáveis à satisfação de necessidades sociais impreteríveis, bem como aos meios necessários para os assegurar, de modo a promover o almejado acordo a que se refere o n.º 1 do art. 538.º do Código do Trabalho, ou, embora inviável na Região Autónoma da Madeira, pelas razões apontadas, o acordo previsto nos n.ºs 2 e 3 da mesma disposição legal, ou ainda, não se alcançando qualquer acordo, a definição por despacho ministerial nos termos dos n.ºs 4, al. a) e 6 do mesmo preceito.
Com efeito, como decorre de tudo quanto já se disse, à associação sindical cabe simplesmente a apresentação duma proposta sobre as matérias em causa, mas a sua efectiva definição, bem como dos meios necessários, estando em causa uma empresa do sector privado, faz-se através dos seguintes mecanismos, na terminologia utilizada por Maria do Rosário Palma Ramalho10:
i. Determinação em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho (art. 538.º, n.º 1);
ii. Determinação por acordo directo entre a associação sindical ou a comissão de greve e o empregador ou a associação patronal destinatários do aviso prévio (art. 538.º, n.º 1, parte final);
iii. Determinação por acordo entre a associação sindical ou a comissão de greve e o empregador ou a associação patronal destinatários do aviso prévio, intermediado pelo serviço competente do Ministério responsável pela área laboral (art. 538.º, n.ºs 2 e 3);
iv. Determinação por despacho conjunto do Ministro responsável pela área laboral e do Ministro da tutela, na falta do acordo referido no ponto anterior (art. 538.º, n.ºs 4, al. a) e 6).
Retornando ao caso dos autos, não pode deixar de concluir-se que o R. efectuou propostas expressas e suficientes sobre as matérias exigíveis, atendendo a que a lei não prescreve qualquer grau de detalhe e concretização e as mesmas não inviabilizavam a definição dos serviços em apreço pelos mecanismos legalmente previstos, que acabou por não ocorrer por razões alheias ao conteúdo daquelas propostas.
Em suma, verifica-se que resulta da factualidade provada, mormente sob os pontos 5., 6., 7., 9., 10., 11. e 12., que o ora R. dirigiu às entidades legalmente previstas avisos prévios de greve por meios idóneos, nos termos já apreciados, e contendo propostas expressas e suficientes, nos termos também já explicitados, sobre os serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações e sobre os serviços mínimos indispensáveis à satisfação de necessidades sociais impreteríveis.
Ao invés, não resulta da factualidade provada que a A. tenha apresentado ao R. qualquer contraproposta quanto a tais serviços e aos meios necessários para os assegurar, ou tenha promovido por qualquer outro modo o acordo visado pelo n.º 1 do art. 538.º do Código do Trabalho, com excepção das comunicações às Secretarias Regionais e às Direcções Regionais responsáveis pela área laboral e com a tutela no sector, a que se referem os pontos 7. e 11., assim como, sem prejuízo do acima dito quanto à limitação das respectivas competências legais, não resulta provado que tais órgãos e serviços regionais, na ausência de acordo, tenham tido qualquer intervenção, com excepção da “exortação” dirigida pela Direcção Regional do Trabalho exclusivamente ao R., a que reporta o ponto 12..
Pelo exposto, não pode considerar-se que o R. não observou as formalidades exigíveis legalmente na declaração das greves em apreço, para efeitos do disposto no art. 541.º, n.º 2 do Código do Trabalho, em consequência do que necessariamente procede o seu recurso e fica prejudicado o conhecimento do recurso da A..

4. Decisão
Nestes termos, acorda-se em julgar procedente a apelação do R. e prejudicado o conhecimento da apelação da A., absolvendo-se o R. de todos os pedidos.
Custas da acção e dos recursos pela A..

Lisboa, 26 de Março de 2025
Alda Martins
Paula Doria C. Pott
Paula Santos
_______________________________________________________
1. Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 6.ª edição, p. 52.
2. Direito Processual Civil Declaratório, vol. III, pp. 141-142.
3. José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, vol. 2.º, Almedina, 2017, pp. 736-737.
4. Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, Coimbra Editora, 1984 (reimpressão), p. 151.
5. José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, op. cit., pp. 734-735.
6. Direito do Trabalho, Almedina, 2013, p. 1132.
7. Tratado de Direito do Trabalho, Parte III – Situações Laborais Colectivas, Almedina, 2.ª edição, p. 464.
8. A lei e as greves, Almedina, 2013, p. 72.
9. Citando o Acórdão da Relação de Évora de 1/07/2008, processo n.º 2725/07-2, disponível em www.dgsi.pt.
10. Op. cit., pp. 503-504.