HORÁRIO DE TRABALHO
SUSPENSÃO
PROVIDÊNCIA CAUTELAR COMUM
Sumário


I – Se o acordo celebrado entre um Sindicato e a empresa empregadora, que estabelece premissas para a elaboração do horário de trabalho, não proíbe a empregadora de alterar o horário de trabalho praticado, tal significa que a decisão unilateral de alteração deste horário, assumida pela empregadora, não viola o referido acordo.
II- Tendo ficado indiciariamente demonstrado que a suspensão do novo horário de trabalho, unilateralmente determinado pelas empregadoras, que havia sido pedida na providência cautelar comum, causaria consideráveis danos pecuniários para as empregadoras, quando comparado ao dano que o novo horário produz no direito de descanso dos trabalhadores, por redução, leve e mitigada, do número de fins de semana completos de folga no ano civil, justifica-se a recusa da providência, de harmonia com o disposto no artigo 368.º, n.º 2 do Código de Processo Civil.
(Sumário elaborado pela relatora)

Texto Integral


P. 43/24.9T8SNS.E1


Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora

I. Relatório
Em 31-01-2024, o Sindicato... intentou providência cautelar comum contra P...,SA e L... Unipessoal Lda., formulando os seguintes pedidos:
A) Deverão as requeridas ser condenadas a suspender de imediato a decisão unilateral da alteração do horário de trabalho e a entrada em vigor do mesmo, por ser evidente a ilegalidade e o prejuízo elevado e irreparável que causa a todos os trabalhadores no setor das operações, constante da CI de 16/1/2024 e na CI de 31/1/2024.
B) Deverão as requeridas ser condenadas a abster-se da prática de atos ilegais no que diz respeito à alteração unilateral do horário de trabalho dos trabalhadores no setor das operações, em violação dos acordos anteriormente celebrados, e demais legislação, mantendo -se em vigor o horário atual.
C) Deverá a presente providencia ser decretada sem audiência das requeridas, devido ao risco sério relativamente ao fim e eficácia da providencia, atendendo à data de produção de efeitos da decisão de alteração do horário e a sua entrada em vigor, nos termos do disposto no artigo 366.º, n.º 6, do CPC.
A título subsidiário:
D) Deverão as requeridas ser citadas, seguindo-se os ulteriores termos até final.
E) Deverá em qualquer dos casos, ser fixada uma sanção pecuniária compulsória em montante não inferior a €4.000,00/dia, atenta a dimensão financeira das requeridas, que é elevada, por forma a tornar eficaz a execução da decisão e a tutela do direito dos trabalhadores associados da requerente, e bem assim de todos os trabalhadores no sector das operações que exercem funções no Terminal XXI.
Alegou, em brevíssima síntese, que por via de uma comunicação interna de 16-01-2024, as requeridas decidiram alterar o horário de trabalho que se encontrava em vigor, pretendendo aplicar o novo horário a partir de 01-02-2024. O requerente comunicou a sua oposição à pretendida alteração, mas as requeridas mantiveram a decisão de alterar o horário, com efeitos a partir de 08-02-2024. A alteração unilateral do horário, afirmou, configura uma violação do acordo celebrado em 2017 e constitui uma inadmissível retirada de direitos aos trabalhadores, o que se visa acautelar com a propositura da providência cautelar.

-
Por despacho datado de 02-02-2024 foi liminarmente admitida a providência cautelar, foi determinada a citação das requeridas e foi designada a data para a realização da audiência final.
-
As requeridas apresentaram a oposição à providência, alegando, no essencial, que o novo horário de trabalho não viola qualquer norma legal ou convencional, tendo as requeridas apenas exercido o direito, que possuem, de determinar o horário de trabalho dos seus trabalhadores. Mais referiram que o novo horário foi uma medida absolutamente vital para a viabilidade económica e financeira das requeridas, razão pela qual o decretamento da providência poderia pôr em causa a manutenção da atividade em Local 1 ou, pelo menos, a manutenção de centenas de postos de trabalho. Ademais, a existir qualquer direito decorrente do acordo celebrado em 2017, o mesmo revelar-se-ia abusivo em face das circunstâncias.
-
Depois de realizada a audiência, foi proferida sentença que rejeitou a providência cautelar.
-
Inconformado, o requerente interpôs recurso, extraindo das suas alegações as conclusões que, seguidamente, se transcrevem:
«A) O Tribunal A Quo proferiu decisão a rejeitar a providencia cautelar requerida pelo recorrente, relativamente aos pedidos formulados de suspender a decisão unilateral de alteração do horário de trabalho, por parte das requeridas, e de se absterem da prática de atos ilegais relativos à alteração unilateral do horário de trabalho dos trabalhadores das operações, em violação do acordo celebrado, entendendo o Sindicato ... e ora recorrente não poder conformar-se com a decisão proferida.
B) O presente recurso tem por objeto várias questões: a primeira se o acordo celebrado em 11/5/2017 com efeitos a partir de 1/1/2018 e que vigorou até 7/2/2024, com os fundamentos e premissas constantes do mesmo, reconhecendo o Tribunal A Quo a sua validade, deve produzir plenamente os seus efeitos quanto às mesmas;
C) A outra questão será, se a retirada de 5 fins de semana por ano e retirar um dia de folga na transição do período de rotação reduzindo o intervalo maior entre cada rotação com maior intervalo nas rotações das noites para as manhãs, reduzindo o direito ao descanso, bem como o direito de as férias serem marcadas individualmente, enquanto premissas do acordo de 2017 constituem violação de direitos, podendo ser retiradas ou eliminadas pelas requeridas, no novo horário.
E por último, se as razões ou fundamentos invocados pelas recorridas constituem fundamento bastante para não ser decretada a providência, quando contrapostas à violação dos direitos invocados.
D) Antes de mais importa ter em consideração a factualidade dada como indiciariamente provada e com interesse para o objeto do presente recurso.
E) Constam dos factos sob os pontos 14, 18, 20, 13 e 14 (os quais se encontram transcritos nas respetivas alegações e para as quais respeitosamente se remete) que por acordo celebrado em 2017 entre as partes, resultou um novo horário que tinha como premissa: «garantir ciclos M/T/N (Manhãs/Tardes/noites) garantir o mesmo ciclo durante todo o ano; intervalos maiores entre cada rotação (M/T/N); maior intervalo a acontecer entre a rotação N/M, pelo menos o mesmo número de folgas em fins de semana existentes no horário atual e férias marcados individualmente» (facto provado 14).
F) Resultando assim um novo horário em vigor que as férias seriam marcadas individualmente, que seria garantido os mesmos ciclos todo o ano, os intervalos entre cada rotação, maior no da noite/manhã, mais a folga, compreendendo os 5 turnos.
G) Resultando igualmente do novo horário que tal horário está assente num ciclo de 35 dias (5 semanas), onde o trabalhador faz as manhas (T2), tardes (T3) e noites (T1) por esta ordem (facto provado 21) e neste ciclo de 35 dias, o trabalhador tem 12 dias de folga, trabalhando 23 dias (facto provado 22),
H) E que nesse horário tem 2 fins de semana por mês completos nesse ciclo, 3 dias de folga sempre após os trabalhos nas noites e nesse ciclo de 35 dias o trabalhador tem 12 dias folga, trabalhando 23 dias (factos provados em 22 e 23) conseguindo ver reconhecido e aplicado nos últimos 5 anos estes direitos, adaptando a sua vida familiar e pessoal, representando direitos que devem ser tidos em conta e que merecem a tutela do direito.
I) Por sua vez, introduzido o novo horário pelas requeridas, através da comunicação interna CI de 16/1/2024 e na CI de 31/1/2024, o qual entrou em vigor em 8/2/2024, resultou que, como constam dos factos dados como provados nos pontos 33 a 37, (transcritos nas presentes alegações e para as quais respeitosamente se remete) que há um efetivo aumento de carga horária por mais de 40 horas, chegando a ser atingidas 48 horas por semana no período de Maio a Setembro, em que nos dias trabalhados de segunda-feira a domingo estarão a ser realizar 44 a 48 horas (factos provados em 34 e 35),
J) E que o novo horário retira e diminui o período de descanso, 5 fins de semana completos por mês e que haverá equipas que com o novo horário não tem um único fim de semana completo por mês, sábados e domingos no período de verão (factos provados em 36 e 37).
K) Tendo em conta os factos provados supra referidos, resulta que a alteração levada a efeito unilateralmente pelas requeridas, tem como consequência a violação do acordo de 2017, e as suas premissas, violando dessa forma o direito ao descanso quando procede a retirada dos 5 fins de semanas por ano, e quando retirados um dia de folga no período da passagem da noite para as manhãs, introduzindo períodos com uma carga horária superior a 48 horas por semana com a frequência e a intensidade no período de verão, com o novo horário.
L) O Tribunal A Quo reconhece corretamente a validade do acordo de 2017, quando refere: «constitui uma forma de contratação atípica que produz efeitos jurídicos, ficam os seus outorgantes vinculados ao reconhecimento dos direitos e cumprimentos das obrigações assumidas em tal acordo, máxime quanto às premissas fixadas visando a elaboração de horário de trabalho» (pag.14, Vºda sentença).»
M) Assim, aceitando-se a validade e os efeitos resultantes do referido acordo de 2017, ainda que atípico, deve-se concluir que existe uma violação do acordo firmado e que para efeitos da presente providencia, tal resulta no preenchimento dos requisitos do procedimento cautelar – a possibilidade séria do direito invocado e o fundado receio que outrem cause lesão grave e dificuldade irreparável a esse direito.
N) Reconhecendo o direito invocado e a sua extrema relevância enquanto acordo que regula as relações laborais e reconhecendo igualmente a sua violação, mas ao não reconhecer na prática os efeitos decorrentes do acordo celebrado, quanto a estes pressupostos, (fins de semana, carga horária e férias), o Tribunal A Quo comete um erro de julgamento.
O) Assim, os factos provados constantes dos pontos 13, 14, 18 a 20, 21 a 24 devidamente interpretados, o que não fez o Tribunal A Quo, permitem uma outra decisão, desde logo, no sentido da procedência da providencia, devendo por esse motivo a douta decisão ser revogada e substituída por outra que ordene a providencia requerida.
P) O acordo de 2017 estabelecia o direito às férias serem marcadas individualmente, o que acontecia em slots em que eram marcados 11/12 dias no período entre 1/5 e 31/5 e 16/9 a 31/10, mas existia um regime de prioridades em que os trabalhadores sem prioridade ou prioridade inferior, podiam marcar férias nas slots que os trabalhadores com prioridade ou prioridade superior não pretendiam (factos provados em 91 e 92), podendo marcar os seus restantes dias ao longo do ano.
Q) Da leitura dos factos provados 38,39,43 e 44, para os quais respeitosamente se remete, verifica-se que, com a introdução do novo horário pelas requeridas, passaram estas a marcar férias em 15 dias no período de verão (1/6 a 15/9) em vez dos 11/112 dias anteriores, e em que os restantes 7 dias são igualmente pré-marcados pelas requeridas, podendo ainda as regras que as estabelecem vir a ser alteradas pelas requeridas e em que as mesmas impõem que o máximo de trabalhadores ausentes nesses dias seja de 2 trabalhadores por dia, no total de todos os trabalhadores de cada equipa (180 a 190 trabalhadores por equipa).
R) Com a introdução deste novo horário e do regime de férias que o acompanha, resulta, salvo melhor opinião, que é retirada a liberdade de escolha individual que existia no anterior horário e no acordo de 2017, não se encontrando refletida no novo horário essa liberdade, a qual, na prática, desaparece!
S) A interpretação que o Tribunal A Quo faz, quando refere que existindo a possibilidade de remarcação dos 7 dias de férias, reflete, enquanto marcação individual, o corolário desse direito é errada, uma vez que na prática é uma impossibilidade a remarcação e altera de um modo substancial e relevante esvaziando por completo o conteúdo prático do direito que existia.
T) Pelo exposto, existindo uma violação do acordo de 2017, também quanto à possibilidade das férias serem marcadas individualmente, impõe-se, salvo melhor opinião, a revogação da decisão proferida e o reconhecimento da probabilidade séria da existência do direito, quanto a essa possibilidade de marcação individual das mesmas.
U) O Tribunal A Quo na decisão proferida, relativamente à questão dos tempos de trabalho, repouso e respetiva carga horária, entendeu: «(…) que a média de 40 horas não é excessiva. Que por forma a concluir que a concentração horária verificada excede as 40 horas semanais no período de referência, tal teria de se encontrar alegado, o que não ocorreu e por consequência também não se encontra indiciariamente demonstrado.» E igualmente refere o Tribunal A Quo que não restam dúvidas que existindo uma concentração de horas de trabalho importaria que o requerente alegasse e demonstrasse que em qualquer dos 3 períodos dos 4 meses de referência identificados na Cláusula 10º do AE, seja excedida a média mensal de 40 horas por semana.
V) O Recorrente alega na sua PI, nos artigos 52, 57 e 60, para os quais respeitosamente se remete para as presentes alegações, é referido que as equipas estão a realizar 44 e 48 horas semanais, contabilizando os dias trabalhados de 2ª feira a domingo, no período de referência entre Maio e 15/9, inclusive dando o exemplo de num período de 14 dias trabalham 12, com 4 noites e apenas 2 folgas.
W) O respetivo AE, na sua Clausula 10ª-nº2 e nº3, para a qual respeitosamente se remete para as presentes alegações, dispõe quais são os meses dos períodos de referência e que mesmo no período de referência não deve ser excedida a média de 40 horas semanais.
X) O Recorrente alegou e demonstrou que no período de verão, Maio a Setembro, há várias semanas que são excedidas as 48 horas (facto provado em 34 e 35) e inclusive fora até dos períodos de referência estabelecidos no AE.
Y) Pelo que a conclusão a que chega o Tribunal A Quo, na parte em que refere que não foi demonstrado que são excedidas as médias mensais de 40 horas, é errada resultando ainda uma evidente contradição quando conclui pela inexistência de violação do AE.
Z) Ou seja, existe uma violação reconhecida pelo Tribunal A Quo, um incumprimento do que foi acordado em 2017, e que vigorava nos últimos 5 anos (quanto aos 5 fins de semana e folgas), mas o entendimento que tais violações podem ser admitidas pois na verdade estão mitigadas ou atenuadas, é incompreensível à luz do direito e das normas dos artigos invocados (estabelecidas pelos artº 59 nº1-b) e d) da Constituição da República Portuguesa e Artº127 nº3 do Código de Trabalho), e consequentemente não pode proceder este entendimento.
AA) Pois de outra maneira ao concluir-se que o incumprimento de um acordo que, violado, retira direitos que ambas as partes acordaram e mantiveram durante 5 anos, pode ser admitido, desde que amenizado, atenuado ou mitigado esvaziando o mesmo completamente de efeitos práticos, não é de todo admissível.
BB) Pelo que, em face do incumprimento e da violação do acordo celebrado em 2017, constitutivo de direitos para os trabalhadores, em matérias como a redução dos 5 fins de semana completos, a redução dos 3 dias de folga após as noites, a impossibilidade prática de marcação individual das férias, e a concentração excessiva da carga horária superior a 48 horas nos períodos de verão, constituem lesão efetiva dos direitos dos trabalhadores, estabelecidas pelos artº 59 nº1-b) e d) da Constituição da República Portuguesa e Artº127 nº3 do Código de Trabalho, já anteriormente invocados.
CC) Pelo que se entende, salvo melhor opinião, que o tribunal, atentos os factos provados, interpretou e aplicou erradamente o direito aos factos pois a violação das referidas disposições legais efetivamente ocorreram, devendo considerar-se verificados os requisitos para o decretamento da providencia, impondo-se que seja proferida decisão que corrija este erro de julgamento, por parte do Tribunal A Quo.
DD) O Tribunal A Quo entendeu que a situação financeira e económica das requeridas (factos provados em 47 a 67) as exigências do mercado em que se inserem, e as dos clientes que não terão satisfação com o anterior horário (facto provado em 68 a 81) e a finalidade do mesmo (factos provados em 69, 82 a 86 e 98) bem como o impacto da sua suspensão (factos provados em 99 a 102) constituem fundamento bastante para o não decretar da providencia.
EE) As requeridas quanto à sua situação económica ou financeira não apresentaram qualquer documento contabilístico, designadamente, balancetes atualizados, nem qualquer declaração modelo 22 de IRC, pelo que não estando minimamente espelhada a situação fiscal e contabilística, a mesma é insuscetível de conduzir à conclusão a que chega o Tribunal A Quo de que tal situação económica ou financeira das recorridas é de molde a motivar a decisão de indeferimento da providencia.
FF) Relativamente às condições do mercado em que atua e as necessidades do cliente ou necessidades operacionais, demonstradas sob os pontos 68 a 81 como vimos em infra, ao contrário do decidido pelo Tribunal A Quo, não serão obtidos pela alteração unilateral do horário, representando uma impossibilidade face ao número de gruas instaladas (12), a mão de obra contratada, e a própria volatilidade dos mercados, face ao modelo de negócio escolhido pelas requeridas (cliente único com 95% dos movimentos).
GG) Não se coadunando a tese das requeridas (De que o cliente quer 8/9 gruas quando estas já estão a funcionar) com o documento nº 6 apresentado por estas na sua contestação, pretendendo afinal aumentar os movimentos sem aumentar os custos com o pessoal, o que constitui uma impossibilidade.
HH) Ademais, atentas as notícias mais recentes e que constam transcritas nas presentes alegações, para as quais respeitosamente se remete, constituindo factos públicos e notórios que são do conhecimento geral, são referidos factos que contradizem a tese das requeridas, quando estas referem que desde há 4 anos não tem havido crescimento, mas que efetivamente tem havido crescimento com o segundo maior ganho de carga contentorizada de 2007 a 2023 e o 3º maior crescimento europeu no período 2022-2023.
II) Pelo que também por esta razão falha o argumento e a conclusão a que chega o Tribunal A Quo, de que com as exigências do mercado e as necessidades do cliente preconizadas, não logram satisfação com o horário anterior.
JJ) Para além de que a finalidade que o novo horário visa alcançar, segundo as requeridas, o funcionamento de 8 gruas, que em rigor já está alcançado, (pois regularmente funcionam 8/9 gruas), não será o verdadeiro objetivo das requeridas.
KK) Mas sim alcançarem 10/11 gruas em funcionamento, não havendo quaisquer garantias do cliente em que tal assim sucederá, sendo que verdadeiramente os números apresentados não constituem prejuízos, mas sim não receita, o que é algo bem diferente, a qual se verificará sempre com a capacidade instalada acima da disponibilidade do número de operadores para as operarem!
LL) Em suma, demonstrado que fica que, quer a situação financeira descrita, quer as exigências de mercado ou necessidades do cliente finalidades do novo horário e o impacto para as requeridas, salvo melhor opinião, não são ou não constituem motivação suficiente para que a providencia não seja decretada, pelos factos e enquadramento referidos em supra, nas presentes alegações e conclusões (e para as quais aqui respeitosamente se remete), pelo que mal andou o Tribunal A Quo quando considera verificadas as referidas circunstancias e que estas excedem consideravelmente o dano que com ela o requerimento pretende evitar.
MM) Porque as mesmas ou decorrem das circunstancias de mercado e da não colocação de mais movimentos por parte do principal cliente, ou da comparação com a capacidade instalada de 10/12 e não de 6/7, como erradamente as recorridas enquadram a situação, e finalmente verifica-se de facto o aumento dos movimentos, atento o facto publico e notório (que não carece de prova) contrariamente ao cenário apresentado pelas requeridas.
NN) O recorrente demonstrou, de um modo claro e evidente, a existência do direito por si invocado, tendo resultado provados factos suficientes (ainda que indiciariamente) para que, por si só, possam conduzir ao decretamento da providência.
OO) De facto, o recorrente conseguiu mesmo, senão com quase certeza e segurança jurídica completa, pelo menos uma forte e convincente probabilidade da existência do seu direito e que existe fundado receio de que esse direito sofra lesão grave e de difícil reparação, o que também foi demonstrado (sendo certo que lhe bastaria que demonstrasse que a existência do seu direito é provável ou verosímil), sendo suficiente a aparência do direito, ou seja, o fumus bónis júris.
PP) A interpretação de que esse direito pode ser mitigado, atenuado, conduz-nos na prática à sua completa exclusão ou desconsideração, o mesmo será dizer, que o mesmo não existe.
QQ) Ora existindo esse direito, como inequivocamente existe e é até reconhecido pelo Tribunal A Quo, ocorre um erro de julgamento na interpretação e na aplicação do direito aos factos, quando o tribunal reconhece esse direito e não o aplica aos factos, na sua plenitude, devendo a decisão, por esse motivo, ser revogada e substituída por outra que ordene o decretamento da providencia.
RR) Por outro lado, o dano ou prejuízo pelo decretamento de uma providencia existirá sempre. A questão é se o referido dano ou prejuízo é superior à salvaguarda dos direitos dos trabalhadores aqui invocados quando contrapostos ao pretendido pelas requeridas, de aumento de movimentos sem aumentar o custo com os trabalhadores, o que se mostra impossível.
SS) O Recorrente entende que a decisão recorrida violou as normas jurídicas constantes dos Artº368 nº1 do Código de Processo Civil e artº 59 nº1-b) e d) da Constituição da República Portuguesa e Artº127 nº3 do Código de Trabalho.».
-
Contra-alegaram as requeridas, pugnando pela improcedência do recurso.
-
A 1.ª instância admitiu o recurso como apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito devolutivo.
-
O processo subiu à Relação e a exma. procuradora-geral adjunta emitiu o seu parecer.
As requeridas responderam ao mesmo.
Após, e no âmbito da apreciação liminar dos autos feita pela ora relatora, constatou-se que a 1.ª instância não havia fixado o valor da causa. Foi, então, proferido despacho que determinou a descida dos autos para suprimento dessa omissão.
A 1.ª instância, na sequência, e por despacho que transitou em julgado, fixou o valor da causa em € 30.001,00.
O processo retornou à Relação e o recurso foi mantido nos seus precisos termos.
Elaborado o projeto de acórdão e colhidos os vistos legais, cumpre, agora, em conferência, decidir.
*
II. Objeto do Recurso
É consabido que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, com a ressalva da matéria de conhecimento oficioso (artigos 635.º n.º 4 e 639.º n.º 1 do Código de Processo Civil, aplicáveis por remissão do artigo 87.º n.º 1 do Código de Processo do Trabalho).
Em função destas premissas, importa apreciar as seguintes questões:
1.ª Será que o novo horário de trabalho que foi unilateralmente fixado pelas requeridas, com entrada em vigor em 08-02-2024, viola o acordo anteriormente celebrado ou quaisquer normas legais ou direitos dos trabalhadores?
2.ª Deveria a providência cautelar ter sido decretada?
*
III. Matéria de Facto
Pela 1.ª instância foram considerados indiciariamente provados os seguintes factos:
1. O Sindicato ... é uma associação sindical constituída pelos trabalhadores portuários que exercem a sua atividade profissional em empresa de estiva, nos terminais de carga contentorizada no Porto ..., representando os trabalhadores seus associados que exercem funções no terminal de contentores ....
2. A Requerida P...,SA tem por objeto o planeamento, conceção, construção, equipamento, gestão, exploração e desenvolvimento do Terminal de Contentores em Local 1, no âmbito do contrato de concessão celebrado com o Estado Português, bem como a realização de todas as atividades com ela relacionadas.
3. A Requerida L... Unipessoal Lda é uma empresa de trabalho portuário cujo objeto é o desenvolvimento da atividade de cedência temporária de trabalhadores portuários a empresas de estiva e a quaisquer outras entidades que movimentem cargas na zona portuária do Porto ..., ou noutros portos do continente.
4. No âmbito da sua atividade, a Requerida P...,SA é a empresa que gere e opera o Terminal de contentores...), desenvolvendo a atividade de movimentação de carga contentorizada (estiva) em regime de concessão, utilizando para o efeito mão de obra portuária.
5. Neste contexto, a Requerida P...,SA recorre à cedência de mão de obra portuária por parte da Requerida L... Unipessoal Lda, licenciada para o efeito, cuja atividade consiste exclusivamente na cedência de trabalhadores qualificados para o exercício das diferentes tarefas portuárias de movimentação de cargas (operadores portuários).
6. A Requerida L... Unipessoal Lda é detida a 100% pela Requerida P...,SA, sendo empresas que se encontram em relação de domínio.
7. No âmbito da atividade desenvolvida, a Requerida P...,SA tem atualmente ao serviço no seu estabelecimento, Terminal de Contentores ... (..., cerca de 1210 trabalhadores, sendo 230 trabalhadores vinculados à Requerida P...,SA e 980 trabalhadores cedidos pela Requerida L... Unipessoal Lda.
8. As relações laborais estabelecidas entre os associados do requerente e as requeridas encontram-se reguladas, para além do mais, por um Acordo de Empresa (AE), celebrado entre P...,SA e Sindicato ..., publicado no BTE n.º 18, de 15.05.2011.
9. O horário de trabalho no Terminal XXI, o qual é aplicado, para além do mais, ao sector das operações, compreende três turnos com cobertura de sábados, domingos e feriados, das 8h00 as 16h00, das 16h00 as 00h00 e das 00h00 as 8h00.
10. O horário de turnos com cobertura de sábados, domingos e feriados será normalmente organizado em turnos de 7 horas e trinta minutos de trabalho diário, com um intervalo de trinta minutos, não podendo haver mais de 5 horas de trabalho seguidas e em cada período de sete dias de calendário, um dia de descanso semanal obrigatório e um dia de descanso complementar, o qual deve ser concedido imediatamente antes ou depois do dia de descanso obrigatório, sempre que possível.
11. Podendo vigorar um regime de flexibilidade de modo a permitir um máximo de 10 horas diárias desde que em cada período de referência não seja excedido a média de 40 horas por semana, tendo os períodos de referência a duração de 4 meses, com início, em princípio, nos meses de Janeiro, Maio e Setembro ou alternativamente na 1ª, 18ª e 35ª semana de cada ano.
12. Estes pressupostos estabelecidos em 2011 vigoraram e até 31.12.2017 compreenderam quatro turnos.
13. Na sequência da greve decretada a partir das 00h00 de 29.04.2017 até às 00h00 de 13.05.2017, com paralisação total das operações realizadas nas duas últimas horas de cada período de trabalho de cada turno e da greve decretada a partir das 00h00 de 29.04.2017 até às 00h00 de 29.04.2018, com paralisação total das operações realizadas em qualquer período de trabalho suplementar (antecipação, prolongamento e serviço extraordinário), em 11.05.2017 foi alcançado entre a P...,SA, L... Unipessoal Lda e o Sindicato ..., apenas com subscrição a final também da APS-Administração dos Portos de Local 1 e do Algarve, um Acordo sobre várias matérias, entre as quais sobre o novo horário de trabalho e a criação do 5.º turno e eliminação do horário de transição dos novos trabalhadores.
14. Resulta do referido Acordo quanto ao horário de trabalho, que seria aplicado um horário de trabalho que levasse em conta os seguintes pressupostos: garantir ciclos M/T/N (manhã, tarde e noite) garantir o mesmo ciclo durante todo o ano; intervalos maiores entre cada rotação (M/T/N); maior intervalo a acontecer entre a rotação N/M, pelos menos o mesmo número de folgas em fins de semana existentes no horário atual e férias marcadas individualmente.
15. Na sequência do acordo, foi contratada pela Requerida P...,SA uma empresa de consultoria de Recursos Humanos para criar horários alternativos que tivessem em conta os pressupostos elencados no acordo.
16. Todas as propostas elaboradas foram rejeitadas pelo Requerente, não tendo sido possível até 01.08.2017 encontrar uma solução por acordo.
17. Por isso, tal como previsto também no acordo para essa eventualidade, entrou em vigor de forma transitória o horário já discutido para o Departamento de Engenharia.
18. Este horário, denominado horário de 2017 vigorou desde 01.01.2018 até 07.02.2024 tendo por base os pressupostos acordados para o sector das operações, ou seja, férias marcadas individualmente, garantia os mesmos ciclos todo o ano, os intervalos entre cada rotação, maior no da noite/manhã (mais a folga), compreendendo os 5 turnos.
19. Em 2023 foi proposto pelas requeridas proceder a um esclarecimento de modo a tornar mais clara a regulação do horário quanto ao dia de M/T dia de sobreposição tendo, tendo sido alcançado um novo acordo denominado acordo de M/T o qual não alterou a matriz de horário.
20. Do horário de 2017 e desse ajustamento para o dia de M/T em 2023 resultou que o horário em vigor entre 01.01.2018 e 07.02.2024 estava desenhado para 5 equipas, turno A, B, C, D e E, e contemplava a laboração continua de 24 horas por dia, 7 dias por semana e 365 dias por ano, existindo 4 feriados obrigatórios (Ano Novo, Páscoa; Dia do Trabalhador e Natal).
21. Este horário assenta num ciclo de 35 dias (5 semanas) onde o trabalhador faz as manhas (T2), tardes (T3) e noites (T1), por esta ordem. (acordo)
22. Neste ciclo de 35 dias o trabalhador tem 12 dias de folga, trabalhando 23 dias.
23. Tem igualmente 2 fins de semanas de folga nesse ciclo, 3 dias de folga sempre após os dias de trabalhos nas noites (T1), as folgas são designadas por folga complementar (CD) ou folga obrigatória (MD).
24. No ciclo de 35 dias existem 2 dias designados de M/T em que ocorre sobreposição de equipas e o trabalhador está escalado para ou ir de manhã (T2) ou de tarde (T3), acontecendo esta situação apenas à segunda-feira ou sexta-feira.
25. Em Agosto de 2023 as requeridas encetaram negociação com a Direção do Sindicato ... e com a Comissão de Trabalhadores visando introduzir uma alteração naquele horário.
26. A versão de horário a alterar foi submetida à votação dos trabalhadores no dia 29.12.2023, tendo sido recusada pela maioria dos trabalhadores, com o resultado da votação: votos não (453), votos sim (78), votos nulos (1), votos em branco (5).
27. Face a essa não aceitação, as Requeridas trabalharam num novo horário de trabalho.
28. E convocaram uma reunião com o Requerente e a Comissão de Trabalhadores da Requerida P...,SA, onde foi apresentada a proposta de horário e prestados esclarecimentos de que forma o mesmo iria introduzir melhorias na produtividade e disponibilidade de mão de obra nas operações do terminal e a essencialidade dessas melhorias e disponibilidade no contexto atual da empresa.
29. Após esta reunião, em 16.01.2024, as requeridas apresentaram á Direção do Requerente e á Comissão de Trabalhadores uma comunicação acompanhada de um novo horário, informando da sua pretensão de implementar tal horário aos Operadores Portuários que exercem a sua atividade em regime de turnos rotativos, com efeitos a partir de 01.02.2024, aguardando o prazo de 3 dias a contar da receção da missiva, que comunicassem o que tivessem por conveniente.
30. Em 16.01.2024 as requeridas efetuaram uma comunicação interna, com a refª CI/MD 01/24, com o novo horário de trabalho a aplicar ao sector das operações, constando da comunicação a alteração aos pressupostos do horário em termos de horas médias no período de Verão (Maio a Setembro), bem como as diferenças existentes entre os dois horários, o atual e o que pretendem aplicar a partir de 01.02.2024.
31. Com data de 24.01.2024, o Requerente apresentou a sua resposta, opondo-se ao novo horário.
32. Por comunicação Interna com a referência CI/MD 02/24 de 31.01.2024[2], as requeridas comunicaram aos trabalhadores o novo horário de trabalho, a aplicar a partir de 08.02.2024.
33. O novo horário de trabalho, nos meses de Janeiro, Fevereiro, Março, Abril, Novembro e Dezembro corresponde á mesma matriz do horário de 2017, com a alteração dos dias de M/T serem considerados como dias de folga “CD”.
34. Embora mantenha a média semanal de 37 horas de trabalho no ano, aumenta a carga horária de 37 horas (em média) para 40 horas ou mais (em média) no período entre Maio e 15 de Setembro.
35. Com efeito, nesse período, os dias trabalhados de 2ª a Domingo, existem momentos no horário em que as equipas/turnos estão a realizar 44 e 48 horas semanais.
36. Este novo horário diminui o período de descanso dos trabalhadores em cinco fins de semana completos por ano.
37. Há equipas/turnos que com o novo horário não têm um único fim de semana completo (sábado e domingo) de folga num mês, que são:
a. - mês de junho equipas B e C;
b. - mês de julho equipas A e E;
c. - mês de agosto equipas C e E;
d. - mês de setembro equipas B e D.
38. O novo horário introduz alteração do período de gozo de férias com a introdução de janelas temporais (slots) obrigatórias de 15 dias no período de Verão (1 de Junho a 15 de Setembro).
39. Como tal, aumentou de 11/12 dias para 15 dias a obrigatoriedade de marcação de dias de férias, de acordo com regras tais como as especializações de cada trabalhador (skills), funções principais e secundarias desempenhadas.
40. A marcação definida pelas Requeridas de 15 dias de férias implicará, como princípio, que todos os trabalhadores de cada uma das 5 equipas/Turnos (A, B, C, D e E), no seu período de tempo correspondente, estejam ausentes do terminal em gozo de férias.
41. Para este efeito, neste período, as restantes equipas que não se encontrem no período de gozo de ferias, terão de cumprir um ciclo de 4 manhãs (08:00-16:00), 1 dia de folga, 4 tardes (16:00-00:00), 1 dia de folga, 4 noites (00:00-08:00), 2 dias de folga e retorna ao início do ciclo.
42. Nos meses de Maio, segunda quinzena de Setembro e Outubro passou a existir uma pré-marcação pelas requeridas dos restantes 7 dias de férias, podendo os trabalhadores alterar estes dias de férias, para qualquer um dos restantes dias do ano.
43. Para o efeito de remarcação destes 7 dias, as requeridas poderão vir a alterar as regras existentes para a marcação e remarcação de férias, impondo que o máximo de trabalhadores ausentes, seja de 2 trabalhadores por dia, no total de todos os trabalhadores de cada equipa.
44. Esta regra, num universo cerca de 180/190 de trabalhadores por equipa/turno dificultará a possibilidade de remarcação destes sete dias de férias e, para além do mais, visa garantir que não haverá férias a transitar de uns anos para os outros.
45. A pré-marcação de 7 dias de férias pode sobrepor-se a dias que seriam de gozo de folga, mas quando um trabalhador tem a pretensão de realizar uma remarcação destes dias de férias poderá ser realizada troca e trabalhará em T2 (08:00-16:00).
46. Durante o período de consulta foram realizadas várias reuniões/sessões de esclarecimento onde estiveram presentes elementos das operações e dos recursos humanos da Requerida P...,SA, tendo sido explicado ao Requerente que a alteração do horário de trabalho se trata de uma medida indispensável à sobrevivência das Requeridas e à manutenção dos postos de trabalho de centenas de trabalhadores, em particular, o seu cash-flow, com referência a março de 2024, nos termos do quadro Documento 5 da oposição.
47. Os movimentos de transhipment constituem 85% da atividade da P...,SA, sendo os outros cerca de 15% inerentes à exportação e importação, denominada “carga local”.
48. Em 2023 as exportações diminuíram 31,2%, tendência que já se verificava desde 2020, mas agravada pelo impacto da suspensão de atividade da “Indorama” (que exportava cerca de 90% da sua atividade pelo Porto ...) devido à perda de competitividade com os mercados dos EUA e América do Sul relativamente aos produtos concorrentes do Extremo Oriente.
49. E pelo aumento da concorrência de outros portos, nomeadamente Lisboa e L2, que conseguiram atrair linhas regulares de diversas companhias de navegação com a movimentação de carga local, anteriormente movimentada no Terminal XXI, como é o caso da Navigator, que exportava através do Porto ... e têm vindo a reduzir os seus volumes neste porto.
50. Embora as importações tenham aumentado em 2023, relativamente a 2022, continuam abaixo dos níveis registados em 2020 e 2021:
Moves 2020 2021 var. 2022 var. 2023 var.
Export 135,715 134,953 -0.6% 127,091 -5.8% 87,3883 -31.2%
Import 68,526 68,376 -0.2% 62,541 -8.5% 67,192 7.4%
51. O volume de contentores movimentados nos anos de 2022 e 2023 foi de 1.6 M TEUS, abaixo da capacidade instalada de 2 M TEUS.
52. Desde há 4 anos os volumes de contentores movimentados estão abaixo da capacidade instalada.
53. Para tal contribui, para além da falta de capacidade do Porto ... de potenciar a sua capacidade instalada, a existência de uma elevada concorrência de portos/terminais muito próximos de Local 1 e que facilmente permitem um desvio de movimentos, nomeadamente, Valência e Barcelona que têm vindo a assumir uma abordagem muito agressiva e competitiva.
54. Estes Terminais disponibilizam ao cliente custos de mão de obra mais baratos e melhores níveis de eficiência de escala, para além de terem acesso a carga local (exportação/importação) para compensar a perda de receitas.
55. Os principais clientes como a MSC ou a Maersk já desviam carga para Valência e Barcelona (no caso da MSC) ou outros portos/terminais no sul de Espanha, como Algeciras, e Norte de África, como Casablanca e Tânger (no caso da Maersk), opção que podem acentuar se o ... não se tornar mais atrativo, ao nível da sua capacidade de movimentação, tendo por base a sua mão de obra.
56. Os custos operacionais de pessoal, de 2022 para 2023 aumentaram cerca de 15%, por força da aplicação automática do Índice de Preço do Consumidor (IPC), 7,8%, para além dos aumentos inerentes ao acordo de progressão de carreiras.
57. De 2023 para 2024, o aumento decorrente da aplicação automática do IPC ascendeu a 4,3%.
58. As taxas de juro (bancárias) aumentaram cerca de 7-9%,
59. Os custos com a segurança cibernética, nomeadamente, ao nível de seguros, tiveram um acréscimo de cerca de 10-12%.
60. O custo da energia em 2022 comparativamente a 2021, teve um aumento de cerca de 300%.
61. As novas políticas europeias e consequentes obrigações no âmbito da ESG (ambiente, sustentabilidade e governação) agravaram os custos dos clientes em cerca de 20%, nomeadamente, o novo regime de taxas de carbono, o que leva a que os clientes procurem os portos onde não estão sujeitos a essas taxas.
62. Os custos de imobilizado, investimento da expansão e substituição aumentaram entre 30% de 2022 para 50% em 2023.
63. Os clientes, nomeadamente a MSC, não aceitam aumentos de tarifas na proporção do aumento de custos e procuram outros portos dentro e fora da EU que se mostram mais competitivos.
64. A situação económico financeira da Requerida P...,SA, em particular, o seu cash-flow, com referência a Março de 2024, contém a seguinte informação relativa às receitas vs custos anuais:
+ 13M de cash flow operacional;
- 21M de investimento;
- 31M fase 3;
- 24M Banca,
- 5M juros.
65. Em Março de 2024, a Requerida P...,SA e por inerência a Requerida L... Unipessoal Lda, não tinha liquidez para fazer face às suas obrigações.
66. Em final de Dezembro de 2023 a Requerida P...,SA solicitou um empréstimo de 55 milhões de euros, tendo apenas obtido um empréstimo de 44 milhões de euros.
67. O recurso aos acionistas para obter o empréstimo, constitui um agravamento da dívida que já ascende a cerca de 100 milhões de euros e decorre da circunstância de a Requerida P...,SA não cumprir com os rácios de solvabilidade exigidos para obtenção de crédito bancário.
68. Das 10 gruas (em Fevereiro ficaram prontas mais duas) que tinha instaladas no Terminal, a P...,SA apenas conseguiu colocar em funcionamento 6/7 gruas, muito esporadicamente 8 com recurso a trabalho suplementar.
69. Para tal contribuía o horário de trabalho, o nível de absentismo, quer aos períodos normais de trabalho, agravado com a medida que possibilita aos trabalhadores faltar sem apresentar um documento médico justificativo de suporte, bastando uma declaração de honra, quer a recusa de prestação de trabalho suplementar e a escassez de mão de obra, em particular na zona de Local 1, pois embora abertas candidaturas, não aparecem candidatos.
70. A percentagem de absentismo ronda os 7,1% por turno.
71. A percentagem de recusa de prestação de trabalho suplementar ascende a 45%.
72. Em 2023, apenas 351 trabalhadores dos 1126 das Requeridas, adquiriram dias de majoração de férias, conforme previsto no Acordo de Empresa e desses 351, apenas 298 adquiriram o máximo de 3 dias, o que significa que apenas 298 trabalhadores não faltaram ou faltaram apenas 1 dia, justificadamente.
73. Com o anterior horário de trabalho, em vigor desde 01.01.2018 até 07.02.2024, verificava-se o seguinte: 199 operadores por equipa/turno; 995 operadores no total (distribuídos por 5 equipas); 23 trabalhadores de férias por turno; 20 ausências não planeadas por turno, em média; 156 trabalhadores disponíveis por turno, em média.
74. Para trabalharem 6 gruas são precisos 139 operadores e para trabalharem 7 gruas são precisos 157 operadores
75. Com este horário, em regra, apenas era possível operar 6/7 gruas.
76. Neste horário existiam 2 dias de sobreposição (M/T), em que havia uma equipa e meia disponível nas manhãs e uma equipa e meia disponível nas tardes, todas as segundas e sextas-feiras, no entanto, isso não se refletia no alinhamento dos navios, pois nesses dias havia mais mão de obra, mas não havia necessariamente mais navios, o que criava um excedente de mão de obra nesses turnos e falta da mesma nos restantes.
77. Uma das exigências dos clientes e em especial do principal cliente, a MSC (cerca de 95% dos volumes movimentados), para ter confiança e manter os que já estão ou trazer mais movimentos para o ..., é que seja garantido aumento do número de gruas a funcionar durante a escala dos navios. (Documento 6 oposição).
78. Quanto mais gruas estiverem em funcionamento menores serão os tempos de espera dos navios decorrentes da falta de gruas em funcionamento e menor o risco de cancelamento de escalas, com deslocação para outro porto.
79. Existindo já atualmente uma capacidade instalada de 12 gruas (10 + 2 acabadas de estar operacionais), a segurança do cliente para trazer os movimentos para Local 1 exigia pelo menos 9 gruas em funcionamento. (cfr. documento 6).
80. As Requeridas implementaram um conjunto de benefícios ou incentivos à prestação de trabalho suplementar e à assiduidade:
-em Junho de 2023 e para vigorar no período de Julho a Outubro foi comunicado aos colaboradores um incentivo à prestação de trabalho suplementar e um incentivo à assiduidade. (doc. 7 oposição)
-em Agosto de 2023 foi comunicado incentivo, para vigorar de Agosto a Dezembro de 2023, tendo por base objetivos de produtividade e segurança. (doc. 8 oposição)
81. Tais incentivos não surtiram o efeito útil pretendido pelas Requeridas.
82. Neste contexto e perante a impossibilidade de chegar a um acordo com o Requerente para a alteração do horário de trabalho, as Requeridas avançaram com uma alteração unilateral dos horários.
83. Com o novo horário, será possível garantir o funcionamento de 8/9 gruas: 199 operadores por equipa/turno; 995 operadores no total (divididos por 5 equipas); 22 ausências por turno, em média (20 não planeadas e 2 correspondentes à quota de férias); 177 operadores disponíveis por turno, em média.
84. Para trabalhar com 8 gruas são necessários 175 operadores por turno, sendo muitas vezes suficiente para trabalhar normalmente 9 gruas quando não há serviço de comboio ou alocando pessoal do lashing/unlashing (quando não necessário).
85. Tal permite aumentar a receita decorrente do acréscimo de volumes de contentores movimentados sem aumentar os custos com pessoal.
86. As Requeridas implementaram um incentivo para 2024 e que terá por base os volumes no ano de 2024.
87. No período de Junho a Setembro, os trabalhadores fazem 48 horas, num período de 7 dias consecutivos, seguido de mais 48 horas, num período de 7 dias consecutivos, seguido de 32 horas, num período de 7 dias consecutivos, seguido mais 32 horas num período de 7 dias consecutivos, o que perfaz uma média de 40 horas nesse período.
88. Os turnos são de 8 horas, existindo um intervalo de 30 minutos para pausa de descanso/refeição, para a denominada “bucha”, que é considerado tempo efetivo de trabalho.
89. No anterior horário também existiam situações ao longo do ano em que, num período de 7 dias consecutivos, os trabalhadores prestavam um total de 48 horas.
90. No novo horário, existem mais 3 fins de semana de 3 dias (em que há uma folga junto ao fim de semana) e mais 2 situações de 2 folgas em dias consecutivos.
91. No anterior horário, os trabalhadores eram obrigados a marcar 11/12 dias úteis no período de 1 de Maio (início das slots) a 31 de Maio e de 16 de Setembro a 31 de Outubro (fim das slots).
92. Em face do regime de prioridades então estabelecido, trabalhadores sem prioridade ou prioridade inferior apenas podiam marcar férias nas slots que os trabalhadores com prioridade ou prioridade superior não pretendiam.
93. O novo horário prevê a possibilidade de troca direta do período de 15 dias de férias entre trabalhadores da mesma skill.
94. Relativamente à remarcação dos 7 dias de férias, a quota máxima de férias por turno ainda não foi partilhada com os trabalhadores, tendo apenas sido mencionado numa reunião com o Requerente que, em princípio, seria de 2 trabalhadores ausentes por motivo de férias.
95. A lógica do novo horário é garantir que as férias de uma equipa decorrem num período em que as restantes 4 equipas estão a fazer uma rotação que permita cobrir essa ausência, de forma a não haver ausências por motivo de férias quando essa cobertura não existe.
96. Após o período de Inverno, a rotação começa gradualmente a mudar no início de Maio até ao final de Outubro, existindo neste período duas rotações distintas.
97. No período de Verão, todas as equipas têm folgas de 1 dia ao fim de semana.
98. O facto de 15 dias de férias estarem previamente agendados e não serem passíveis de alteração (exceto por troca direta com outro trabalhador da mesma skill), faz com que diariamente, o número de ausências seja reduzido de 43 para 22, o que se traduz em mais 1/2 gruas a trabalhar em cada turno.
99. Suspender a aplicação do novo horário significaria uma diferença de menos 356 a 404 contentores movimentados por dia, por grua, decorrente do funcionamento de 6/7 gruas por turno em vez das 8/9 gruas garantidas pelo novo horário.
100. O que representaria cerca de 10 686 a 12 129 contentores não movimentados por mês, por grua e cerca de 128 160 a 145 555 contentores não movimentados por ano, por grua.
101. O que implicaria uma não receita das Requeridas nos seguintes valores:
i) Receita correspondente aos contentores movimentados por mês por uma grua = entre 971.880,00 € e 1.103.793,60 €;
ii) Receita correspondente aos contentores movimentados por ano por uma grua = entre 11.662.560,00 € e 13.245.505,00 €.
102. O que para 2 gruas, implicaria um não ganho de receita que ascenderá a cerca de 26 M de euros por ano.
-
E foi considerada a seguinte matéria de facto indiciariamente não provada:
A. A alteração do horário de trabalho acarreta inevitavelmente riscos de segurança dos trabalhadores pelo cansaço acumulado e consequentemente até da operação portuária.
B. Acarreta também menor produtividade
C. As requeridas não apresentam quaisquer razões objetivas e sindicáveis para justificar esta alteração, não logrando apresentar aos trabalhadores factos concretos que liguem estes á alteração de horário preconizada.
*
IV. Enquadramento jurídico
Conforme anteriormente referido, o objeto do recurso traduz-se em duas questões que importam analisar e decidir:
1.ª Será que o novo horário de trabalho, unilateralmente fixado pelas requeridas, com entrada em vigor em 08-02-2024, viola o acordo anteriormente celebrado ou quaisquer normas legais ou direitos dos trabalhadores?
2.ª Deveria a providência cautelar ter sido decretada?
Apreciemos.
Principia o recorrente por argumentar que o acordo de 11 de maio de 2017, com o ajustamento feito em 2023 exclusivamente para o dia M/T, que esteve na base do horário de trabalho que vigorou desde 01-01-2018 até 07-02-2024, e que foi considerado, na sentença recorrida, uma forma de contratação atípica, válida, foi manifestamente violado pela decisão de alterar o horário de trabalho a partir de 08-02-2024, unilateralmente assumida pelas requeridas.
Vejamos o que sobre esta matéria ficou escrito na sentença recorrida:
«(i) Do Acordo de 11 de Maio de 2017
O requerente motiva o procedimento cautelar na violação pelas requeridas quer do Acordo de Empresa, bem como do Acordo de 11.05.2017, ao implementarem unilateralmente um novo HT em substituição do vigente, contrário ás premissas definidas por esse acordo.
Por seu turno, entendem as requeridas que o Acordo celebrado em 11.05.2017 consubstancia um acordo “ad hoc”, cuja natureza não se encontra prevista na lei e que não assume caráter vinculativo. Não revestindo natureza de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, por lhe faltarem os aspetos formais essenciais e indispensáveis, no entender das Requeridas não se pode retirar qualquer consequência jurídica do seu não cumprimento, equivalendo à figura jurídica do “Acordo de Cavalheiros”, que não é considerada fonte vinculativa de deveres e obrigações.
Em todo o caso, ainda que este acordo fosse qualificado como uma fonte formal de obrigações para efeitos legais, sempre seria de atender-se ao princípio da livre denúncia dos contratos, que possibilita que qualquer uma das partes, no âmbito de uma relação contratual sem duração definida, proceda, a qualquer momento, à sua cessação.
Como escreve Maria do Rosário Palma Ramalho, in Tratado do Direito do Trabalho, Parte III – Situações Laborais Coletivas, 2.ª ed. Almedina, p. 184 «[a] convenção coletiva de trabalho é o acordo celebrado entre um empregador ou uma associação de empregadores e uma ou mais associações sindicais, em representação dos trabalhadores membros, com vista á regulação das situações juslaborais individuais e coletivas numa determinada profissão ou sector de atividade e numa certa área geográfica ou empresa.
A convenção coletiva de trabalho tem como modalidades gerais o contrato coletivo de trabalho, o acordo coletivo de trabalho e o acordo de empresa (CCT, ACT e AE), previstos no art. 2.º n.º 3 e regulados nos arts. 485.º e ss. do CT.»
Especificamente quanto aos AE, estes são outorgados por associações sindicais e um empregador, para uma empresa ou estabelecimento.
No caso dos autos, fica indiciariamente demonstrado que na sequência da greve decretada a partir das 00h00 de 29.04.2017 até às 00h00 de 13.05.2017, com paralisação total das operações realizadas nas duas últimas horas de cada período de trabalho de cada turno e da greve decretada a partir das 00h00 de 29.04.2017 até às 00h00 de 29.04.2018, com paralisação total das operações realizadas em qualquer período de trabalho suplementar (antecipação, prolongamento e serviço extraordinário), em 11.05.2017 foi alcançado entre a P...,SA, L... Unipessoal Lda e o Sindicato ..., apenas com subscrição a final também da APS-Administração dos Portos de Local 1 e do Algarve, um Acordo sobre várias matérias, entre as quais sobre o novo horário de trabalho e a criação do 5.º turno e eliminação do horário de transição dos novos trabalhadores (13).
O Acordo firmado entre as Requeridas entidades empregadoras e o Sindicato Requerente, ainda que com a intervenção/subscrição apenas da APS (não tendo a mesma qualquer expressa vinculação aos vários pontos relativamente aos quais apenas as Requeridas e o Requerente expressamente se vincularam), enquanto não publicado, omitindo aspetos formais essenciais, não teve eficácia normativa, não tornou as cláusulas nele contidas em cláusulas inderrogáveis pelo AE, contratos de trabalho, nem as mesmas se substituíram automaticamente às estipulações individuais menos favoráveis. No entanto, o seu conteúdo passou a ter eficácia contratual imediata entre as partes. Neste sentido, cfr. Abílio Neto, in Contrato de Trabalho, Notas Práticas, 1998, p. 1109, anotação 3 ao artigo 10.° do Decreto-Lei n.° 519-C1/79, de 9 de Dezembro, onde escreve que «A falta de publicidade prevista no n.° 1 deste artigo 10.° não contende com a validade das convenções inter partes, porquanto elas caem na previsão dos «demais atos», a que se refere o n.° 3 do artigo 122.° da Constituição e daí que a falta de publicidade não implique a inexistência da convenção coletiva de trabalho».
Com efeito, o referido Acordo, na medida em que é suscetível de ser caracterizado como uma forma atípica de contratação coletiva, produz efeitos jurídicos.
Quanto à contratação coletiva atípica, A. Nunes de Carvalho, in Primeiras Notas Sobre Contratação Coletiva Atípica, Revista de Direito e de Estudos Sociais, Outubro-Dezembro de 1999, ano XXXX, n.° 4, p. 353 e seguintes refere que «no mundo das relações de trabalho em organizações empresariais é frequente depararmos com a outorga, por entidades empregadoras e associações sindicais de documentos (com o título de protocolo, aditamento, acordo intercalar ou outro), que, muito embora não sejam objeto de depósito no Ministério do Trabalho e da Solidariedade ou de publicação no Boletim do Trabalho e Emprego, funcionam, no que toca ao desenvolvimento das relações de trabalho a que se pretendem aplicar, como convenções coletivas». E o mesmo autor considera que estas realidades, usualmente designadas por formas atípicas, impróprias ou informais de contratação coletiva, desenvolvidas fora dos canais delimitados pelo então em vigor Decreto-Lei n.° 519-C179, de 29 de Dezembro, são formas legítimas de contratação, por constituírem uma emanação dos princípios de liberdade sindical e da liberdade de contratação coletiva, consagrados nos artigos 55.° e 56.° da CRP, não podendo as mesmas deixar de produzir efeitos jurídicos.
Na mesma linha, Mário Pinto in Direito do Trabalho, 1996, págs. 282 a 285, ao abordar a questão do monopólio sindical da contratação coletiva, alude à contratação coletiva atípica, nos seguintes moldes: «(...) parece resultar limpidamente do texto constitucional que a autonomia coletiva dos trabalhadores vai para além das formas específicas previstas e garantidas, a título exemplificativo, nas disposições constitucionais dos artigos 55.° e 56.° (e, desde logo, existem disposições constitucionais que especificam outras formas de exercício da liberdade sindical (v. g. o artigo 54.°). Essa liberdade é, em suma, objeto de um reconhecimento constitucional genérico, o que significa que ela radica nos princípios fundamentais da liberdade. Com consequência, quer quanto às expressões organizativas do exercício de liberdade sindical, como também à autonomia coletiva em sentido restrito, isto é, quanto ao direito de autoregulamentação das relações coletivas e das relações individuais de trabalho (que é ainda uma manifestação dessa liberdade), as formas de exercício de liberdade sindical não estão constitucionalmente restritas ou monopolizadas naquelas que expressamente se consagram como garantidas, sim, mas não exclusivas.». Este autor adianta ainda: «[v]ertendo este princípio no disposto nos n.ºs 3 e 4 do artigo 56.º da CRP, a conclusão é que não pode defender-se um monopólio constitucional da contratação coletiva de trabalho concedido aos sindicatos, embora só deva reconhecer a garantia que a Constituição lhes atribui, e que a lei ordinária regulamenta. Haverá, assim, sem dúvida, uma contratação coletiva sindical que é garantida constitucionalmente e regulada por expressa devolução constitucional; como poderá haver uma outra contratação coletiva, que se não contenha no quadro desta forma de exercício de liberdade sindical, mas ainda se contenha no âmbito geral fundamental da liberdade sindical dos trabalhadores. A essa contratação se pode fazer, e sobretudo em alguns países, referência com expressões como contratação inominada, ou atípica; outras vezes, em alguns países, fala-se de contratação de direito comum. Sempre, contudo, para significar que estamos perante formas de exercício de liberdade sindical que não correspondem à forma típica de contratação, mas são, ainda assim, formas legítimas, ainda que atípicas, de contratação».
Neste mesmo sentido e citando tais autores, veja-se o Acórdão do STJ de 27.11.2002, proc. 02S2237, consultável em www.dgsi.pt.
Note-se que esta atipicidade não se confunde com o fenómeno de negociação coletiva atípica e dos acordos coletivos atípicos que Maria do Rosário Palma Ramalho, in ob. cit. p. 217 define em sentido amplo «como a negociação tendente à celebração e um acordo sobre condições de trabalho de um determinado universo de trabalhadores, celebrado no âmbito de uma empresa de modo relativamente informal, e diretamente outorgado pelo empregador e os trabalhadores, representados por uma comissão ad hoc ou pela comissão de trabalhadores, mas posteriormente aceite pelos trabalhadores». Veja-se também a mesma autora em Negociação Coletiva Atípica, Almedina, 2009, p. 56-70.
Ora, constituindo o Acordo de 11.05.2017 uma forma de contratação atípica, que produz efeitos jurídicos, ficam os seus outorgantes vinculados ao reconhecimento dos direitos e ao cumprimento das obrigações assumidas em tal Acordo, máxime quanto às premissas fixadas visando a elaboração de horário de trabalho.
Esclareça-se ainda que, o Acordo em causa é efetivamente transitório no que concerne ao concreto HT que supletivamente veio a entrar em vigor em 01.01.2018, conforme decorre da sua letra, mas no mais, não está prevista qualquer transitoriedade dos pressupostos subjacentes à sua elaboração.».
E mais adiante… depois de expostas corretas considerações sobre o regime legal da elaboração e alteração do horário de trabalho, para as quais remetemos.
«(…) Em suma, o legislador rodeou a matéria da alteração do horário de trabalho de especiais cautelas, pelo que desde que observadas todas as condições impostas para tanto (quer ao nível legal, quer de IRCT) e desde que a alteração seja motivada, não discricionária e arbitrária, a regra será a da possibilidade de alteração unilateral do horário de trabalho pela empregadora e só assim não poderá ser quando o trabalhador tenha sido contratado para um especifico horário de trabalho vertido no seu contrato individual de trabalho, ou quando IRCT proíba expressamente a alteração.
No caso dos autos, ficou indiciariamente demonstrado que resulta do acordo de 11.05.2017 quanto ao horário de trabalho, que seria aplicado um horário de trabalho que levasse em conta os seguintes pressupostos: garantir ciclos M/T/N (manhã, tarde e noite) garantir o mesmo ciclo durante todo o ano; intervalos maiores entre cada rotação (M/T/N); maior intervalo a acontecer entre a rotação N/M, pelos menos o mesmo número de folgas em fins de semana existentes no horário atual e férias marcadas individualmente (14).
Na sequência do acordo, foi contratada pela Requerida P...,SA uma empresa de consultoria de Recursos Humanos para criar horários alternativos que tivessem em conta os pressupostos elencados no acordo (15).
Ocorre que, todas as propostas elaboradas foram rejeitadas pelo Requerente, não tendo sido possível até 01.08.2017 encontrar uma solução por acordo (16). Por isso, tal como previsto também no acordo para essa eventualidade, entrou em vigor de forma transitória o horário já discutido para o Departamento de Engenharia (17).
Este horário, denominado horário de 2017 vigorou desde 01.01.2018 até 07.02.2024, tendo por base os pressupostos acordados para o sector das operações, ou seja, férias marcadas individualmente, garantia os mesmos ciclos todo o ano, os intervalos entre cada rotação, maior no da noite/manhã (mais a folga), compreendendo os 5 turnos (18).
Em Agosto de 2023 as requeridas encetaram negociação com a Direção do Sindicato ... e com a Comissão de Trabalhadores visando introduzir uma alteração naquele horário (25). A versão de horário a alterar foi submetida à votação dos trabalhadores no dia 29.12.2023, tendo sido recusada pela maioria dos trabalhadores, com o resultado da votação: votos não (453), votos sim (78), votos nulos (1), votos em branco (5) (16).
Face a essa não aceitação, as Requeridas trabalharam num novo horário de trabalho (27) e convocaram uma reunião com o Requerente e a Comissão de Trabalhadores da Requerida P...,SA, onde foi apresentada a proposta de horário e prestados esclarecimentos de que forma o mesmo iria introduzir melhorias na produtividade e disponibilidade de mão de obra nas operações do terminal e a essencialidade dessas melhorias e disponibilidade no contexto atual da empresa (28). Após esta reunião, em 16.01.2024, as requeridas apresentaram á Direção do Requerente e á Comissão de Trabalhadores uma comunicação acompanhada de um novo horário, informando da sua pretensão de implementar tal horário aos Operadores Portuários que exercem a sua atividade em regime de turnos rotativos, com efeitos a partir de 01.02.2024, aguardando o prazo de 3 dias a contar da receção da missiva, que comunicassem o que tivessem por conveniente (29).
Em 16.01.2024 as requeridas efetuaram uma comunicação interna, com a refª CI/MD 01/24, com o novo horário de trabalho a aplicar ao sector das operações, constando da comunicação a alteração aos pressupostos do horário em termos de horas médias no período de verão (Maio a Setembro), bem como as diferenças existentes entre os dois horários, o atual e o que pretendem aplicar a partir de 01.02.2024 (30).
Com data de 24.01.2024, o Requerente apresentou a sua resposta, opondo-se ao novo horário (31).
Por comunicação Interna com a referência CI/MD 02/24 de 31.03.2024, as requeridas comunicaram aos trabalhadores o novo horário de trabalho, a aplicar a partir de 08.02.2024 (32).
Durante o período de consulta foram realizadas várias reuniões/sessões de esclarecimento onde estiveram presentes elementos das operações e dos recursos humanos da Requerida P...,SA, tendo sido explicado à Requerente que a alteração do horário de trabalho se trata de uma medida indispensável à sobrevivência das Requeridas e à manutenção dos postos de trabalho de centenas de trabalhadores, em particular, o seu cash-flow, com referência a março de 2024, nos termos do quadro Documento 5 da oposição (46). As necessidades das (re)queridas que motivaram a alteração do HT encontram-se indiciariamente demonstradas sob os pontos 47 a 86.
Em conclusão, podiam as requeridas alterar unilateralmente o HT, pelas seguintes ordens de razões: (i) por lhes competir, em regra, a elaboração do HT e, por conseguinte, a sua alteração; (ii) por de acordo com a cláusula 10.ª, n.º 1 do AE competir à empresa no exercício do seu poder diretivo determinar os horários de trabalho com respeito das normas legais imperativas em vigor quanto a esta matéria o qual se encontrava em vigor de forma transitória; (iii) por este AE não só não prever qualquer horário de trabalho, como não proibir expressamente a sua alteração; (iv) por segundo o Acordo de 11.05.2017, o HT em vigor desde
01.01.2018 ter carácter transitório, podendo, por isso, ser alterado; (v) pelo facto de as requeridas terem lançado mão de procedimento visando a alteração do HT, máxime por exposição da motivação inerente e pela consulta, tendo mesmo proposto mais do que um HT, o que não foi aceite, inviabilizando o acordo; (vi) porque a alteração foi motivada, não discricionária e arbitrária, no preciso contexto económico financeiro das requeridas e das suas necessidades gestionárias ao nível dos seus recursos humanos e operacionais.»
Desde já se adianta que a fundamentação exposta e consequente decisão merecem a nossa absoluta concordância.
Primeiramente, importa referir que o acordo celebrado em 2017, com o posterior esclarecimento quanto ao dia M/T, não abrangia nenhum concreto horário de trabalho.
Ou seja, a vinculação negocial a que se obrigaram as requeridas não implicou qualquer renúncia ao poder diretivo que detém o empregador e que lhe permite determinar e alterar o horário de trabalho dos trabalhadores ao seu serviço – cf. artigos 97.º, 212.º e 217.º, todos do Código do Trabalho e cláusula 10.ª, n.º1, do Acordo de Empresa publicado no BTE n.º 18, 1.ª série, de 15-05-2011.
Logo, a alteração unilateral do horário de trabalho que estava a ser praticado, que foi promovida pelas requeridas, não viola o acordo celebrado porque este acordo não proibia que as requeridas procedessem a tal alteração.
Essa alteração estava apenas sujeita aos condicionalismos previstos no artigo 217.º do Código do Trabalho.
Estatui esta norma legal:
1 - À alteração de horário de trabalho é aplicável o disposto sobre a sua elaboração, com as especificidades constantes dos números seguintes.
2 - A alteração de horário de trabalho deve ser precedida de consulta aos trabalhadores envolvidos e à comissão de trabalhadores ou, na sua falta, à comissão sindical ou intersindical ou aos delegados sindicais, bem como, ainda que vigore o regime de adaptabilidade, ser afixada na empresa com antecedência de sete dias relativamente ao início da sua aplicação, ou três dias em caso de microempresa.
3 - Excetua-se do disposto no número anterior a alteração de horário de trabalho cuja duração não seja superior a uma semana, desde que seja registada em livro próprio, com a menção de que foi consultada a estrutura de representação coletiva dos trabalhadores referida no número anterior, e o empregador não recorra a este regime mais de três vezes por ano.
4 - Não pode ser unilateralmente alterado o horário individualmente acordado.
5 - A alteração que implique acréscimo de despesas para o trabalhador confere direito a compensação económica.
6 - Constitui contraordenação grave a violação do disposto neste artigo.
Ora, conforme decorre da factualidade assente, designadamente dos pontos 25 a 32, as requeridas não só respeitaram a obrigação de consulta legalmente exigida, como observaram a obrigatória antecedência temporal de comunicação do novo horário (salienta-se que não estão em causa horários de trabalho individualmente acordados).
Ademais, o novo horário de trabalho introduzido a partir de 08-02-2024 encontra-se perfeitamente justificado pela conjuntura económico-financeira atual das requeridas que se infere dos pontos 47 a 85 e 99 a 102 do acervo dos factos indiciariamente provados.
Repare-se que as requeridas se esforçaram, como evidenciam os factos, por obter um acordo quanto a um concreto horário de trabalho - cf. pontos 25 a 31 dos factos indiciariamente provados.
Implementaram medidas alternativas que solucionassem os problemas com que se deparavam, mas essas medidas não lograram obter efeito útil– cf. pontos 80 a 81.
A alteração unilateral do horário tornou-se, pois, uma medida de gestão inevitável e que se mostra motivada e justificada.
A cláusula 10.ª, n.º1, do Acordo de Empresa publicado no BTE n.º 18, 1.ª série, de 15-05-2011, também não proíbe expressamente a alteração do horário de trabalho pelo empregador.
Bem pelo contrário, aí se refere expressamente:
«Compete à empresa no exercício do seu poder diretivo determinar os horários de trabalho com respeito das normas legais imperativas em vigor quanto a esta matéria».
Em suma, a alteração unilateral do horário realizada não viola o acordo celebrado, como bem decidiu a 1.ª instância, porque o mesmo não previu a impossibilidade de ocorrer tal alteração.
Também não viola normas legais, pois, como vimos, respeita o estatuído no artigo 217.º do Código do Trabalho e o estipulado no instrumento de regulamentação coletiva aplicável.
E será que viola direitos adquiridos pelos trabalhadores decorrentes do acordo de 2017?
A resposta a esta questão, adiante-se, só pode ser negativa.
Essencialmente, o recorrente argumentou que o novo horário viola o adquirido direito de os trabalhadores marcarem individualmente as suas férias e o direito ao descanso, que ficaram garantidos pelo acordo de 2017.
Ora, sobre esta matéria, concordamos inteiramente com a análise, lúcida e minuciosa, efetuada pela 1.ª instância, pelo que, para evitar tautologias, subscrevemos, sem reservas, os fundamentos expostos que passamos a transcrever:
« (iii) Das Férias
O Requerente alega que a alteração pelas requeridas, constitui um retirar de direitos dos trabalhadores, nomeadamente pela violação do AE, pois impõe um período pré-estabelecido pela empresa para a marcação de férias, já que no período de Verão (1 de Junho a 15 de Setembro) introduz slots obrigatórios de 15 dias, aumentando a obrigatoriedade de marcação (que era de 11/12 dias), retirando a possibilidade aos trabalhadores de marcar noutros meses, ou seja, impede na prática a marcação de férias por opção individual dos trabalhadores. Considera inadmissível este excesso de dias marcados, vezes as 5 equipas, perfazendo um aumento de duração deste segmento de mais 20 dias que o necessário.
Acresce que nos meses de Maio, segunda quinzena de Setembro e Outubro as requeridas realizaram uma pré-marcação dos restantes 7 dias de férias, alegando que os trabalhadores podem realizar a alteração destes dias de férias, para qualquer um dos restantes dias do ano. Contudo, para o efeito da sua, as requeridas alteraram ainda as regras existentes para a marcação e remarcação de férias, impondo que o rácio máximo de trabalhadores ausentes, seja de 2 trabalhadores por dia, no total de todos os trabalhadores de cada equipa, o que torna impossível a alteração destes dias para a maioria dos trabalhadores, e regulamentou ainda para os que venham a ter a possibilidade de realizar a troca, terem de ir trabalhar para outra equipa num dia que seria suposto estar de folga.
Contrapõem as requeridas inexistir qualquer violação das regras referentes a férias, quer no CT, quer no AE.
O direito de férias deve ser exercido de modo a proporcionar ao trabalhador a recuperação física e psíquica, condições de disponibilidade pessoal, integração na vida familiar e participação social e cultural, cfr. n.º 4 do art.º 237.º, do CT.
Com tal desiderato, o trabalhador tem direito, em cada ano civil a um período de férias retribuídas, que se vence em 1 de Janeiro, reportando-se, em regra este direito ao ano civil anterior (artigo 237.º, n.º 1 e 2 CT).
O direito a férias é irrenunciável, o seu gozo não pode ser substituído, ainda que com o acordo do trabalhador, por qualquer compensação económica ou outra (art.º 237.º, n.º 3 CT). Excetua-se a possibilidade de o trabalhador poder renunciar ao gozo de dias de férias que excedam 20 dias úteis, ou a correspondente proporção no caso de férias no ano de admissão, sem redução da retribuição e do subsídio relativos ao período de férias vencidos, que cumulam com a retribuição do trabalho prestado nesses dias (art.º 238.º, n.º 5 CT).
O período anual de férias tem a duração mínima de 22 dias úteis (art.º 238.º, n.º 1 CT), podendo o gozo do período de férias ser interpolado, por acordo entre empregador e trabalhador, desde que sejam gozados, no mínimo, 10 dias úteis consecutivos (n.º 8 do art.º 241.º, do CT)
O período de férias é marcado por acordo entre empregador e trabalhador, sendo que na falta de acordo, o empregador marca as férias (art.º 241.º, n.º 1 CT) e em caso de pequena, média ou grande empresa, o empregador só pode marcar o período de férias entre 1 de Maio e 31 de Outubro, a menos que o instrumento de regulamentação coletiva de trabalho ou o parecer dos representantes dos trabalhadores admita época diferente.
Por seu turno, a Cláusula 15.ª do AE regula as férias e o subsídio de férias, estipulado que o período anual de férias tem a duração mínima de 11 dias úteis (n.º 1), sendo que, para os trabalhadores com cobertura de sábados, domingos e feriados são úteis os dias de trabalho calendarizados na escala de rotação de turnos.
E nos termos do n.º 4, a duração do período de férias é aumentada no caso de o trabalhador não ter faltado ou ter apenas faltas justificadas no ano a que as férias se reportam, nos seguintes termos:
a) Três dias de férias, até uma falta ou dois meio dias;
b) Dois dias de férias, até duas faltas ou quatro meio dias;
c) Um dia de férias, até três faltas ou seis meio dias.
No que concerne ao planeamento do período de férias, regula a cláusula 23.ª que o mesmo é da atribuição das entidades empregadoras, tendo em conta, se possível, as preferências manifestadas pelos trabalhadores, e garantindo sempre o regular funcionamento das entidades empregadoras (n.º 1) e a indicação do período preferencial de férias por parte dos trabalhadores terá lugar até 15 de Março de cada ano, findo o qual se presume ausência de especial conveniência (n.º 2).
O Acordo de 11.05.2016[3] contempla a regra de «férias marcadas individualmente».
No anterior horário, isto é, aquele que vigorou de 01.01.2018 até 07.02.2024, os trabalhadores eram obrigados a marcar 11/12 dias úteis no período de 1 de Maio (início das slots) a 31 de Maio e de 16 de Setembro a 31 de Outubro (fim das slots) (91).
Em face do regime de prioridades então estabelecido, trabalhadores sem prioridade ou prioridade inferior apenas podiam marcar férias nas slots que os trabalhadores com prioridade ou prioridade superior não pretendiam (92).
Por conseguinte, mesmo no contexto do Acordo de 11.05.2016[4], a marcação de férias individualmente não significava uma total liberdade do trabalhador em escolher o(s) seus(s) período(s) de férias, pois obedecia a regras pré-impostas pelas Requeridas e que, conforme se depreende, eram aceites pelos trabalhadores e pelo Requerente. Ou seja, conforme supra consignado, podendo a empregadora estipular unilateralmente o período de férias dos trabalhadores, mas tendo este de legalmente ficar contido entre 1 de Maio e 31 de Outubro, existiam duas janelas temporais pré-definidas pelas requeridas para tanto, compreendidas naquele período: (a) de 1 a 31 de Maio; e (b) de 16 de Setembro a 31 de Outubro, no total de dois meses e 16 dias.
O novo horário, ou seja, o implementado pelas requeridas em 08.02.2024, introduz alteração do período de gozo de férias com a introdução de janelas temporais (slots) obrigatórias de 15 dias no período de Verão (1 de Junho a 15 de Setembro) (38).
Como tal, aumentou de 11/12 dias para 15 dias a obrigatoriedade de marcação de dias de férias, de acordo com regras tais como as especializações de cada trabalhador (skills), funções principais e secundarias desempenhadas, (39).
A marcação definida pelas Requeridas de 15 dias de férias implicará, como princípio, que todos os trabalhadores de cada uma das 5 equipas/Turnos (A, B, C, D e E), no seu período de tempo correspondente, estejam ausentes do terminal em gozo de ferias (40). No entanto, o novo horário prevê a possibilidade de troca direta do período de 15 dias de férias entre trabalhadores da mesma skill (93), ou seja, introduz alguma flexibilidade que se traduz ainda em possibilidade de alguma escolha individual.
No antigo horário, o Requerente não alegou em concreto como era feita a marcação dos restantes dias de férias (para além dos 11/12), mas ainda assim, depreende-se que existiriam regras, tais como as que presidiam à escolha dos períodos de 11/12 dias.
Apura-se que no novo HT, nos meses de Maio, segunda quinzena de Setembro e Outubro passou a existir uma pré-marcação pelas requeridas dos restantes 7 dias de férias, podendo os trabalhadores alterar estes dias de férias, para qualquer um dos restantes dias do ano (42).
Para o efeito de remarcação destes 7 dias, as requeridas poderão vir a alterar as regras existentes para a marcação e remarcação de férias, impondo que o máximo de trabalhadores ausentes, seja de 2 trabalhadores por dia, no total de todos os trabalhadores de cada equipa (43).
Esta regra, num universo cerca de 180/190 de trabalhadores por equipa/turno dificultará a possibilidade de remarcação destes sete dias de férias e, para além do mais, visa garantir que não haverá ferias a transitar de uns anos para os outros (44).
A pré-marcação de 7 dias de férias pode sobrepor-se a dias que seriam de gozo de folga, mas quando um trabalhador tem a pretensão de realizar uma remarcação destes dias de férias poderá ser realizada troca e trabalhará em T2 (08:00-16:00) (45).
Relativamente à remarcação dos 7 dias de férias, a quota máxima de férias por turno ainda não foi partilhada com os trabalhadores, tendo apenas sido mencionado numa reunião com o Requerente que, em princípio, seria de 2 trabalhadores ausentes por motivo de férias (94).
Ora, no pressuposto de que o período anual de férias tem a duração mínima de 22 dias úteis, podendo o gozo do período de férias ser interpolado, por acordo entre empregador e trabalhador, desde que sejam gozados, no mínimo, 10 dias úteis consecutivos; de que o período de férias é marcado por acordo entre empregador e trabalhador, sendo que na falta de acordo, o empregador marca as férias, neste caso, apenas podendo marcar o período de férias entre 1 de Maio e 31 de Outubro, a menos que o instrumento de regulamentação coletiva de trabalho
ou o parecer dos representantes dos trabalhadores admita época diferente; que segundo a Cláusula 15.ª do AE o período anual de férias tem a duração mínima de 11 dias úteis (n.º 1), sendo que, para os trabalhadores com cobertura de sábados, domingos e feriados são úteis os dias de trabalho calendarizados na escala de rotação de turnos, teremos que concluir que:
a) No anterior HT os trabalhadores eram obrigados a marcar 11/12 dias úteis no período de 1 de Maio (início das slots) a 31 de Maio e de 16 de Setembro a 31 de Outubro (fim das slots), ao passo que no novo HT as requeridas marcaram janelas temporais (slots) obrigatórias de 15 dias no período de Verão (1 de Junho a 15 de Setembro), o que representa o aumento dos dias seguidos de gozo de férias, respeitando a imposição dos 11 no mínimo e, por outro lado, contem-se no período no qual a empregadora pode marcar unilateralmente férias (de 1 de Maio a 31 de Outubro).
b) No novo HT, nos meses de Maio, segunda quinzena de Setembro e Outubro passou a existir uma pré-marcação pelas requeridas dos restantes 7 dias de férias, podendo os trabalhadores alterar estes dias de férias, para qualquer um dos restantes dias do ano. Para o efeito de remarcação destes 7 dias, as requeridas alteraram ainda as regras existentes para a marcação e remarcação de férias, impondo que o máximo de trabalhadores ausentes, seja de 2 trabalhadores por dia, no total de todos os trabalhadores de cada equipa.
Destarte, a marcação individual de férias consignada no Acordo de 11.05.2017 encontrava-se claramente mitigada no HT de 2017 (em vigor desde 01.01.2018), o que continua a verificar-se no novo HT (em vigor desde 08.02.2024), pois em ambos resultam períodos de férias pré-definidos.
Muito embora os trabalhadores tenham direito ao gozo de 22 dias úteis de férias, destes, conforme o AE, apenas 11 terão de ser obrigatoriamente gozados de forma seguida/não interpolada, o que não significa que não possam ser gozados nestes termos mais que 11 dias, nomeadamente os 15 fixados pelas requeridas. E assim sendo, não há neste particular aspeto qualquer violação do AE e/ou do Acordo de 11.05.2017.
Relativamente à pré-marcação pelas requeridas dos restantes 7 dias de férias, verifica-se que a mesma também se encontra compreendida no período temporal dentro do qual a empregadora o pode fazer de forma unilateral, isto é, de 1 de Maio a 31 de Outubro. Por outro lado, poderá haver remarcação desses dias por parte dos trabalhadores, o que reflete, ainda assim, a marcação individual prevista no Acordo de 11.05.2017 que nos sobreditos termos já definimos como mitigada. E embora esta remarcação se compreenda ser de difícil execução, caso as requeridas venham efetivamente a impor a regra de 2 trabalhadores por dia, no total de todos os trabalhadores de cada equipa, apura-se que tal regra foi apenas mencionada numa reunião com o Requerente, como em princípio a ser aplicada, todavia, a quota máxima de férias por turno ainda não foi partilhada pelas requeridas com os trabalhadores. Note-se quanto a qualquer regra imposta pelas requeridas a este propósito, apenas consta da Comunicação Interna com a ref.º CI/MD02/24, de 31.01.2024, quanto ao HT que a remarcação terá de ser feita “sempre de acordo com a quota disponível”.
Assim, quanto a estes 7 dias de férias teremos de concluir que inexiste violação do AE e/ou do Acordo de 11.05.2017.
(iv) Dos tempos de trabalho e repouso
Alega ainda o Requerente que o novo HT configura uma violação do acordo celebrado em 2017 e dos pressupostos aí estabelecidos, designadamente garantir o mesmo ciclo durante todo o ano; intervalos maiores entre cada rotação (M/T/N); maior intervalo a acontecer entre a rotação N/M, pelos menos o mesmo número de folgas em fins de semana existentes no horário atual. Com efeito, aumenta a carga horária de 37 horas (em média) para 40 horas ou mais (em média), no período do verão, contra as 37 horas atuais (em média), e diminui em 5 os fins de semanas completos de descanso por ano, sendo menos cinco fins de semana.
As requeridas entendem que a alteração pretendida não viola o AE, pois no período de Junho a Setembro, os trabalhadores fazem efetivamente 48 horas, num período de 7 dias consecutivos, seguido de mais 48 horas, num período de 7 dias consecutivos, seguido de 32 horas, num período de 7 dias consecutivos, seguido mais uma vez de 32 horas num período de 7 dias consecutivos, o que perfaz uma média de 40 horas nesse período, sendo os turnos são de 8 horas e existindo um intervalo de 30 minutos para pausa de descanso/refeição, para a denominada “bucha”, que é considerado tempo efetivo de trabalho. No horário em vigor até 07.02.2024, tal situação também se verificava, ou seja, também existiam situações em que, num período de 7 dias consecutivos, os trabalhadores prestavam um total de 48 horas.
Decorre do novo horário, comparativamente com o anterior, uma redução do número de fins de semana por ano (5 fins de semana), mas existem mais 3 fins de semana de 3 dias (isto é, em que há uma folga junto ao fim de semana) e mais 2 situações de (2) folgas em dias consecutivos (ou seja, menos folgas isoladas denominadas de “folgas macacas”), mas tal não significa a violação de qualquer norma legal e ou convencional.
Nos termos do disposto pelo art.º 59.º, n.º 1, al. d), da CRP, todos os trabalhadores têm direito «ao repouso e aos lazeres, a um limite máximo da jornada de trabalho, ao descanso semanal e a férias periódicas pagas», e o n.º 2, al. b), do mesmo preceito acrescenta que incumbe ao Estado «a fixação, a nível nacional, dos limites da duração do trabalho». Tal espelha a necessidade de limitar o tempo de trabalho, proteger o equilíbrio físico e psíquico do trabalhador, tutelar a sua saúde, garantir-lhe períodos de repouso, salvaguardar a sua autodisponibilidade, assegurar a conciliação entre o trabalho e a vida pessoal e familiar, criar e preservar a noção de tempo livre, de tempos de não trabalho durante a vigência do contrato que não se reduzam aos períodos indispensáveis ao descanso.
Aquela conciliação entre o trabalho e a vida pessoal e familiar é assumida como um fim constitucional, nos termos do art.º 59.º, n.º 1, al. b), da CRP, consubstanciando um dos deveres do empregador na relação laboral, cfr, art.º 127.º, n.º 3, segundo o qual «o empregador deve proporcionar ao trabalhador condições de trabalho que favoreçam a conciliação da atividade profissional com a vida familiar e pessoal».
Por sua banda, a lei ordinária assenta na dicotomia tempo de trabalho/período de descanso, compreendendo aquele o tempo de trabalho efetivo (art.º 197.º, n.º 1, do CT) e os períodos de inatividade equiparados a tempo de trabalho (as interrupções e os intervalos previstos no n.º 2 do art.º 197.º, do CT). E o tempo de trabalho efetivo corresponde, ao desempenho da prestação, isto é, ao «período durante o qual o trabalhador exerce a atividade», bem como ao tempo de disponibilidade para o trabalho, o que é espelhado no segmento «ou permanece adstrito a realização da prestação». Quanto ao período de descanso, a sua noção é definida pela lei, por exclusão do que não se considere tempo de trabalho, consistindo, nos termos do art.º 199.º, do CT, em todo aquele que não seja tempo de trabalho.
Definido assim o que se entende por tempo de trabalho e por período de descanso, recorrendo a vários conceitos, a lei organiza a dimensão temporal da prestação, destacando-se aqui dois desses conceitos:
i) Período normal de trabalho (art.º 198.º) - tempo de trabalho que o trabalhador se obriga a prestar, medido em número de horas por dia e por semana (o quantum da prestação, a determinação do volume de trabalho);
ii) Horário de trabalho (art.º 200.º) - determinação das horas de início e termo do período normal de trabalho diário e do intervalo de descanso, bem como do descanso semanal (a distribuição das horas que compõem o período normal de trabalho ao longo do dia.
Como refere Francisco Liberal Fernandes, in O Tempo de Trabalho Comentário aos artigos 197.º a 236.º do Código do Trabalho [revisto pela Lei n.º 23/2012, de 25 de Junho], Coimbra Editora, 1.ª Ed. p.38, «[o]s conceitos de período normal de trabalho e de horário de trabalho não são confundíveis; embora relacionados, cada um possui um conteúdo próprio e autónomo. Assim, enquanto o período normal de trabalho fixa, como se disse, o número de horas que o trabalhador se compromete a trabalhar em cada dia e em cada semana, o horário de trabalho determina a distribuição dessas horas por cada período de vinte e quatro horas, e por cada período de sete dias. Ora, esta não coincidência entre as duas noções possibilita que a distribuição do período semanal de trabalho não seja fixada em termos uniformes; porém, essa variabilidade ou irregularidade deve ser pré-estabelecida aquando da determinação do horário de trabalho, sem prejuízo das regras que admitem a sua alteração.»
Nos termos do Código do Trabalho, o período normal de trabalho não pode exceder 8 horas por dia e 40 horas por semana, sendo delimitado pelo horário de trabalho, cfr. artigos 200.º e 203.º, do CT.
Prevê, no entanto, o n.º 1 do art.º 204.º, do CT que por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, o período normal de trabalho pode ser definido em termos médios, caso em que o limite diário estabelecido no n.º 1 do artigo 203.º pode ser aumentado até quatro horas e a duração do trabalho semanal pode atingir sessenta horas, só não se contando nestas o trabalho suplementar prestado por motivo de força maior.
A cláusula 10.º do AE vai ao encontro disso mesmo, ao prever no seu n.º 2 que poderá vigorar um regime de flexibilidade de modo a permitir um máximo de 10 horas de trabalho diário, desde que, em cada período de referência, não seja excedida a média de 40 horas por semana.
E de acordo com o seu n.º 3, os períodos de referência no número anterior terão uma duração de quatro meses, com início, em princípio, nos meses de Janeiro, Maio e Setembro ou alternativamente na 1.ª, 18.ª e 35.ª semana de cada ano. Ou seja, a duração dos períodos de referência é obrigatória (4 meses), podendo ainda assim o seu ser distinto como previsto.
Resulta do seu n.º 4 alínea c) que na empresa conforme as características dos serviços, entre outros praticar-se-á o Horário de turnos com cobertura de sábados, domingos e feriados — normalmente organizado em turnos de sete horas e trinta minutos de trabalho diário, com um intervalo de trinta minutos, não podendo haver mais de cinco horas de trabalho seguidas e em cada período de sete dias de calendário, um dia de descanso semanal obrigatório e um dia de descanso complementar, o qual deve ser concedido imediatamente antes ou depois do dia de descanso obrigatório, sempre que possível.
E do n.º 6 quando, após semanas em que um trabalhador tenha excedido as 40 horas de trabalho, se torne necessário reduzir o horário das semanas de trabalho seguintes, com vista a manter uma média de 40 horas no período de referência referido no n.º 2, serão tais reduções feitas em dias inteiros, mas sem perda do correspondente subsídio de alimentação ou outro subsídio que venha a ser aplicado.
Relativamente ao descanso semanal dispõe o n.º 1 do artigo 232.º, do CT que o trabalhador tem direito a, pelo menos, um dia de descanso por semana, podendo nos termos do n.º 2 o dia de descanso semanal obrigatório deixar de ser o domingo, para além do mais, quando o trabalhador presta atividade em empresa ou sector de empresa dispensado de encerrar ou suspender o funcionamento um dia completo por semana (alínea a) ou cujo funcionamento não possa ser interrompido (alínea b).
Neste caso, o trabalhador não perde o direito ao descanso, o qual será gozado num outro dia da semana e constituirá o seu período de descanso semanal obrigatório, sendo que, por outra banda, o domingo será dia normal de trabalho, sem prejuízo do disposto por IRCT.
O trabalhador terá direito a outro período de descanso, nos termos do n.º 3 do artigo 232.º se previsto por IRCT ou no contrato individual de trabalho, designado por descanso semanal complementar, podendo ser contínuo ou descontínuo, em todas ou algumas semanas no ano. A existir, o descanso semanal complementar é em regra gozado ao sábado, mas pode ser distribuído pela semana de trabalho, podendo ser gozado de modo descontínuo/interpolado. Assim sendo, o dia de descanso complementar tem claramente cunho contratual.
No AE encontra-se estipulado um dia de descanso semanal obrigatório e um dia de descanso complementar, o qual deve ser concedido imediatamente antes ou depois do dia de descanso obrigatório, sempre que possível.
Por fim, e no que aos períodos de trabalho e descanso importa, no Acordo 11.05.2017 o HT a elaborar deve levar em conta os seguintes pressupostos: garantir ciclos M/T/N (manhã, tarde e noite) garantir o mesmo ciclo durante todo o ano; intervalos maiores entre cada rotação (M/T/N); maior intervalo a acontecer entre a rotação N/M, pelos menos o mesmo número de folgas em fins de semana existentes no horário atual (14).
A propósito da alteração unilateral do HT, pode ler-se no Código do Trabalho Anotado, 12.ª Ed. Almedina, p. 554, por Pedro Romano Martinez, e outros que «crê-se que quando seja substancial, isto é, quando determine perturbação visível na vida do trabalhador, a modificação carecerá de assentimento deste. O mesmo sucede com a alteração do período de descanso semanal, quer quanto à sua distribuição pela semana de calendário, quer quanto ao seu quantum.»
Os pressupostos do HT antigo encontram-se demonstrados sob os pontos 20 a 24.
Quanto ao novo HT apura-se que nos meses de Janeiro, Fevereiro, Março, Abril, Novembro e Dezembro corresponde á mesma matriz do horário de 2017, com a alteração dos dias de M/T serem considerados como dias de folga “CD” (3).
Embora mantenha a média semanal de 37 horas de trabalho no ano, aumenta a carga horária de 37 horas (em média) para 40 horas ou mais (em média) no período entre Maio e 15 de Setembro (34). Com efeito, nesse período, os dias trabalhados de 2ª a Domingo, existem momentos no horário em que as equipas/turnos estão a realizar 44 e 48 horas semanais (35).
No período de Junho a Setembro, os trabalhadores fazem 48 horas, num período de 7 dias consecutivos, seguido de mais 48 horas, num período de 7 dias consecutivos, seguido de 32 horas, num período de 7 dias consecutivos, seguido mais 32 horas num período de 7 dias consecutivos, o que perfaz uma média de 40 horas nesse período (87).
Os turnos são de 8 horas, existindo um intervalo de 30 minutos para pausa de descanso/refeição, para a denominada “bucha”, que é considerado tempo efetivo de trabalho (88).
No anterior horário também existiam situações ao longo do ano em que, num período de 7 dias consecutivos, os trabalhadores prestavam um total de 48 horas (89).
Não restam dúvidas de que no período de Verão Junho a Setembro, existe uma concentração de horas de trabalho que não é idêntica à do restante período do ano. Importaria, no entanto, que o Requerente alegasse e demonstrasse que em qualquer dos três períodos de quatro meses de referência, identificados na Cláusula 10.ª do AE, máxime no período com início em Maio e termo em Agosto, ou alternativamente na 1.ª à 34.ª semana do ano, ou qualquer eventualmente estipulado desde que em respeito pelos 4 meses, seja excedida a média mensal de 40 horas por semana.
Com efeito, ainda que em determinados períodos temporais no período entre Maio e 15 de Setembro se encontre aumentada a carga horária de 37 horas (em média) para 40 horas ou mais (em média), pois nesse período, os dias trabalhados de 2ª a Domingo, existem momentos no horário em que as equipas/turnos estão a realizar 44 e 48 horas semanais, certo é que esse não é o período de referência que à luz da cláusula 10.ª do AE importa, pois desde logo respeita a 5 meses, como não tem início de Maio a Agosto, já quem Setembro se enceta um novo período, ou alternativamente na 18.ª à 34.ª semana do ano. Por outro lado, apurando-se que no período de Junho a Setembro, os trabalhadores fazem 48 horas, num período de 7 dias consecutivos, seguido de mais 48 horas, num período de 7 dias consecutivos, seguido de 32 horas, num período de 7 dias consecutivos, seguido mais 32 horas num período de 7 dias consecutivos, o que perfaz uma média de 40 horas nesse período, tal não correspondendo a um período de referência, cfr. cláusula 10.ª do AE (o início dos períodos de referência são os meses de Janeiro, Maio e Setembro ou alternativamente aa 1.ª, 18.ª e 35.ª semana de cada ano), ainda assim respeita a média mensal de 40 horas.
Por forma a que se pudesse concluir que a concentração horária verificada excede as 40 horas semanais no período de referência, tal teria de se encontrar alegado, o que não ocorreu e, por consequência, também não se encontra indiciariamente demonstrado.
Diga-se ainda que quanto ás 37 horas semanais por ano, as mesmas não eram praticadas no antigo HT ao longo de todo o ano, pois existiam variações, com alguma concentração horária, pelo que também neste particular aspeto, as permissas estipuladas no Acordo de 11.05.2017 se encontravam mitigadas. De todo o modo, no novo HT é respeitada aquela média anual de 37 horas/semana.
Quanto aos períodos de descanso semanal, fica demonstrado que o novo HT diminui o período de descanso dos trabalhadores em cinco fins de semana completos por ano (36).
Há equipas/turnos que com o novo horário não têm um único fim de semana completo (sábado e domingo) de folga num mês, que são:
a. - mês de junho equipas B e C;
b. - mês de julho equipas A e E;
c. - mês de agosto equipas C e E;
d. - mês de setembro equipas B e D (37).
No período de Verão, todas as equipas têm folgas de 1 dia ao fim de semana (97).
Conforme analisado, no caso, o dia de descanso obrigatório não terá necessariamente de coincidir com o Domingo, podendo ser, como foi contratualizado dia de descanso complementar, na medida em que no AE se encontra estipulado um dia de descanso semanal obrigatório e um dia de descanso complementar, o qual deve ser concedido imediatamente antes ou depois do dia de descanso obrigatório, sempre que possível, isto é, não torna o gozo nesses termos absolutamente obrigatório.
Ocorre que, pelo Acordo de 11.05.2017, as partes se vincularam a “pelo menos o mesmo número de folgas em fim de semana existente no horário atual”.
E muito embora no novo horário, existam mais 3 fins de semana de 3 dias (em que há uma folga junto ao fim de semana) e mais 2 situações de 2 folgas em dias consecutivos (90), não menos certo é que o novo HT diminui o período de descanso dos trabalhadores em cinco fins de semana completos por ano.
Assim sendo, verifica-se a violação do contratualmente estipulado entre as partes e, neste particular aspeto, a aparência do direito alegada pelo requerente.
Ainda assim, a gravidade desta lesão encontra-se mitigada, na medida em que o período temporal a que se reporta coincide com o período em que as equipas vão entrando rotativamente em período de férias.
Acresce que não ficou demonstrado que a alteração do horário de trabalho acarrete inevitavelmente riscos de segurança dos trabalhadores pelo cansaço acumulado e consequentemente até da operação portuária (A) e que acarrete também menor produtividade (B).
Concluindo, verificado o direito das requeridas a unilateralmente procederem à alteração do HT e verificado que não violaram o AE, nem o Acordo de 11.05.2017 quanto à marcação e gozo de férias e não tendo ficando demonstrada a sua violação quanto á concentração horária de trabalho, atento o regime de adaptabilidade, subsiste a aparente violação do direito a “pelo menos o mesmo número de folgas em fim de semana existente no horário atual”, cuja gravidade se encontra mitigada, na medida em que o período temporal a que se reporta coincide com o período em que as equipas vão entrando rotativamente em período de férias.»
Enfim, em face do referido, a única aparente violação aos direitos decorrentes do acordo de 2017, foi a redução do número de fins de semana (completos) de folga, em cada ano civil.
Todavia, tendo em consideração as demais soluções resultantes do novo horário (mais 3 fins de semana de 3 dias e mais 2 situações de 2 folgas em dias consecutivos; o período do gozo das férias) e atendendo a que o dia de descanso dos trabalhadores representados não tinha de coincidir necessariamente com o domingo, afigura-se-nos que o direito ao descanso dos trabalhadores foi apenas ligeiramente afetado.
Portanto, a primeira questão suscitada no recurso apenas procede parcialmente, mas com reduzido efeito, como veremos mais adiante.

Importa agora apreciar a segunda questão apresentada no recurso:
Deveria a providência cautelar ter sido decretada?
Vejamos.
Estamos perante um procedimento cautelar comum.
De harmonia com o disposto no artigo 32.º do Código de Processo do Trabalho, aos procedimentos cautelares aplica-se o regime estabelecido no Código de Processo Civil, para o procedimento cautelar comum.
Prescreve o n.º 1 do artigo 362.º do Código de Processo Civil:
Sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer a providência conservatória ou antecipatória concretamente adequada a assegurar a efetividade do direito ameaçado.
A providência é decretada desde que haja probabilidade séria da existência do direito e se mostre suficientemente fundado o receio da sua lesão – artigo 368.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
Por seu turno, estatui o n.º 2 do artigo 368.º:
A providência pode, não obstante, ser recusada pelo tribunal , quando o prejuízo dela resultante para o requerido exceda consideravelmente o dano que com ela o requerente pretende evitar.
Uniformemente, a jurisprudência tem identificado como pressupostos do decretamento da providência cautelar comum:
(a) A probabilidade séria da existência do direito invocado (fumus boni juris);
(b) O fundado receio de que outrem, antes da ação ser proposta ou na pendência dela, cause lesão grave e dificilmente reparável do direito invocado (periculum in mora);
(c) A adequação da providência à situação de lesão iminente;
(d) Não ser o prejuízo resultante da providência superior ao dano que com ela se pretende evitar e a não existência de providência específica que acautele aquele direito.
Estes requisitos são apreciados na base de um juízo de verosimilhança ou de probabilidade[5].
No caso que nos ocupa, a providência cautelar não foi decretada, com base na seguinte fundamentação:
«(v) Do decretamento da providência
Por último, caberá aferir se não obstante o concluído, a providência pode ser recusada pelo tribunal se o prejuízo dela resultante para o requerido exceda consideravelmente o dano que com ela o requerente pretende evitar.
Ora, no caso, face à aparência da violação do direito nos estritos moldes definidos, mas também à sua mitigação concreta e tendo presente, por confronto, a situação económica e financeira das requeridas como apurada sob os pontos 47 a 67, bem como as exigências do mercado em que actua e as necessidades de clientela/operacionais que não logram satisfação com o cumprimento do HT anterior, como demonstrado sob os pontos 68 a 81, a finalidade que o novo HT visa alcançar, pontos 69 e 82 a 86 e 98 e o impacto para as requeridas da suspensão do novo horário, como enunciado sob os pontos 99 a 102, não restam dúvidas de que o decretamento da presente providência implica para as requeridas um prejuízo que excede consideravelmente o dano que com ela o requerente pretende evitar.
Com efeito, face á situação económica e financeira das requeridas, às necessidades do mercado em que actua e da clientela/operacionais, às dificuldades com que se deparam quer com a gestão do absentismo, quer com a contratação de trabalhadores verifica-se a existência de sólida motivação para rejeitar a presente providência.».
Ora, também nesta parte, entendemos que a sentença recorrida não merece reparo.
De facto, o novo horário de trabalho, que entrou em vigor a partir de 08-02-2024, visa fazer face a um difícil contexto económico-financeiro vivido pelas requeridas.
Com o novo horário visa-se aumentar a capacidade de resposta do sector das operações, viabilizando o aumento das receitas que se mostram necessárias e importantes.
Repare-se que em março de 2024 a requerida P...,SA e por inerência a requerida L... Unipessoal Lda, não tinha liquidez para fazer face às suas obrigações- ponto 65 dos factos indiciariamente provados. E, em final de dezembro de 2023, a requerida P...,SA teve de solicitar um empréstimo de 55 milhões de euros, apenas tendo obtido 44 milhões – ponto 66. A dívida da requerida P...,SA ascende a cerca de 100 milhões de euros e a mesma nem sequer reune os rácios de solvabilidade exigidos para a obtenção de crédito bancário– ponto 67.
Mais resultou indiciariamente demonstrado que a suspensão do novo horário de trabalho implicaria uma não receita para as requeridas nos seguintes valores:
i) Receita correspondente aos contentores movimentados por mês por uma grua = entre 971.880,00 € e 1.103.793,60 €;
ii) Receita correspondente aos contentores movimentados por ano por uma grua = entre 11.662.560,00 € e 13.245.505,00 €.
102. O que para 2 gruas, implicaria um não ganho de receita que ascenderá a cerca de 26 M de euros por ano (cf. pontos 99 a 102 do acervo fáctico).
Ora, se compararmos o prejuízo que decorreria para as requeridas com a suspensão do novo horário de trabalho e o dano, leve e mitigado, respeitante ao direito ao descanso que o novo horário produziu na vida dos trabalhadores ao mesmo sujeitos, parece-nos resultar inquestionável que estamos, desde logo, perante uma justificada situação de recusa da providência, de harmonia com o disposto no n.º 2 do artigo 368.º do Código de Processo Civil.
Efetivamente, num juízo de probabilidade ínsito nesta norma o prejuízo resultante do deferimento da providência excede consideravelmente o dano que com ela o requerente pretende evitar.
Assim sendo, sufragamos a decisão recorrida que recusou a providência cautelar requerida.
Consequentemente, e concluindo, o recurso improcede na totalidade.
As custas do recurso são da responsabilidade do recorrente, nos termos previstos pelo artigo 527.º do Código de Processo Civil, sem prejuízo da isenção de que beneficia.
*
V. Decisão
Nestes termos, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar o recurso improcedente, e, em consequência, confirmam a decisão recorrida.
Custas do recurso pela recorrente, sem prejuízo da isenção de que beneficia.
Notifique.

Évora, 12 de setembro de 2024
Paula do Paço
João Luís Nunes
Mário Branco Coelho
__________________________________________________
[1] Relatora: Paula do Paço; 1.º Adjunto: João Luís Nunes; 2.º Adjunto: Mário Branco Coelho
[2] Na fundamentação de facto da sentença recorrida, por manifesto lapso material que se corrigiu, estava escrito “31-03-2024”, ao invés de “31-01-2024”.
[3] Seguramente que se pretendia escrever “11-05-2017”, com evidencia o ponto 13 dos factos indiciariamente provados.
[4] Idem.
[5] Neste sentido, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09-04-2019, processo n.º 7/19.4YFLSB, acessível em www.dgsi.pt.