RECURSO DE REVISÃO
DOCUMENTO
ACÓRDÃO
Sumário


I - Como fundamento do recurso de revisão, nos termos do art.º 696, alínea c) do CPC, quanto ao documento referenciado exige-se a verificação cumulativa de dois requisitos: novidade do documento, no sentido de não ter sido apresentado no processo no qual foi proferida a decisão, quer por não existir, quer por a parte não poder dele dispor; suficiência, no entendimento que seja suscetível de levar a uma alteração do decido a rever, em termos diversos como o foi, no sentido mais favorável à parte . 
II –  Uma sentença, ou acórdão no caso de decisões de tribunais colegiais,  enquanto ato pelo qual o juiz decide a causa principal ou algum incidente que apresente a estrutura de uma causa não podem ser qualificados como documento, para constituírem fundamento do recurso de revisão.

Texto Integral




REVISTA n.º 206/14.5T8OLH-S.E1-B.S1

 

ACORDAM NA 6ª SECÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

I - Relatório

1. AA veio ao abrigo do disposto no art.º 696, alínea c), do CPC, apresentar recurso extraordinário de revisão, do Acórdão da Relação de Évora de 10.09.2020, transitado em julgado. 

1.1. Alega em conformidade, que interpôs ação declarativa com processo comum, a correr em apenso aos autos de insolvência n.º 206/14.5T8OLH, contra massa insolvente da sociedade comercial Multitur – Turismo Internacional, SA., BB, CC, DD, EE, FF, Caixa Geral de Depósitos, GG, HH, tendo explanado a factualidade e apresentado a respetiva prova, por forma a demonstrar que tinham sido cometidas irregularidades e condutas dolosas que lhe causaram avultados danos e que seriam impeditivos da prossecução do processo de insolvência, pedindo a condenação dos RR, solidariamente, a pagar-lhe a importância de 395.822,46€ a título de danos patrimoniais e 30.000,00€, por danos morais, acrescidos dos juros vencidos, desde 2010, e vincendos até integral pagamento.

Foi proferida sentença que julgou verificada a exceção da incompetência em razão da matéria, absolveu os RR e condenou o A. como litigante de má fé, por se configurar negligência grosseira, pois vinha instaurar nova ação quando já fora indeferido noutras ações o peticionado, mencionando-se que perante a falta de factos não podia concluir-se pela existência da exceção de caso julgado, embora peticionasse a soma dos pedidos formulados nas várias ações instauradas, o que implicaria a análise de cada uma delas, mas não tendo os factos sido alegados não havia como confrontá-los.

Interposto recurso para o Tribunal da Relação de Évora, em 10.09.2020, foi proferida a decisão a rever, que confirmou a incompetência em razão da matéria, e a condenação por litigância de má fé, tendo como fundamentação a transcrição do fundamento da primeira instância.

Entende o Recorrente que esse fundamento não é suficiente para concluir pela verificação do caso julgado, nem pela litigância de má fé, até porque a decisão da primeira instância não concretizou a alegada verificação do caso julgado.

O Recorrente interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, que não foi admitido, de igual modo não o sendo a reclamação apresentada.

Apresentou ainda reclamação para o Tribunal Constitucional, que proferiu decisão de 31 de março de 2022 e notificada a 4 de abril de 2022, decisão esta que consubstancia o novo documento que determina a interposição do recurso de revisão, porquanto demonstrou que não foi possível verificar o interlocutório com o poder judicial por forma a apreciar e aclarar a decisão a rever quanto às questões supra mencionadas.

1.2. Conclui assim, o Recorrente:

I –  A condenação do Recorrente como litigante de má fé assenta numa eventual verificação da exceção de caso julgado.

II – O Tribunal da primeira instância não julgou procedente a exceção de caso julgado nem dispunha de elementos que permitissem concluir com segurança sobre tal verificação, pelo que não tinha fundamento suficiente para que o Recorrente fosse condenado como litigante de má fé.

III – O Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, que constitui a decisão a rever confirma a decisão da primeira instância fundamentando com a transcrição de uma parte da respetiva sentença que se limita a referir que o “(…) já obteve o indeferimento do peticionado noutras ações (…)”.

IV – Tal fundamento não é suficiente para concluir nem pela verificação do caso em julgado nem pela verificação dos pressupostos da litigância de má-fé porque nada foi concretizado.

V – O Tribunal não julgou procedente, por verificada e provada, a exceção do caso julgado. O próprio Tribunal manifestou dúvidas, as quais não podem servir de fundamento à decisão proferida, a qual foi confirmada em segunda instância.

VI – Não existindo caso julgado, não poderiam estar verificados os pressupostos para a condenação como litigante de má-fé.

VII – O Tribunal teria que, obrigatoriamente, fundamentar ao abrigo de que alínea do art.º 542.º n.º2 do CPC deveria a sua conduta ser classificada como litigância de má fé, o que não sucedeu, verificando-se apenas uma breve alusão à alínea a) mas sem enquadramento no caso concreto.

VIII – Nem poderia haver enquadramento porque o próprio Tribunal considerou: “Daqui decorre que, perante a falta de factos não podemos concluir que se verifica a exceção de caso julgado pese embora o Autor peticione a soma dos pedidos formulados nas várias ações instauradas. Isto porque, tal conclusão implicaria analisar cada uma das ações”.

IX – Para invocar o caso julgado, teria que ser explanado na decisão final de que forma se verificaram os pressupostos constantes no artigo 581, do CPC no que se refere à tríplice identidade.

X – A decisão do Tribunal Constitucional proferida no dia 31 de março de 2011 e notificada a 4 de abril de 2022 foi o novo documento que determinou a interposição do presente recurso, porquanto demonstrou que não houve nem jamais haveria qualquer pronúncia ou interlocutório sobre o mérito das questões supra alegadas.

XI – Uma questão gravosa e causadora de danos como é a condenação por litigância de má-fé nos autos em apreço e nas condições de lacuna legal em que tal condenação ocorreu deve ser submetida a uma análise judicial ponderada, tendo por base as questões supra invocadas às quais nunca foi dada resposta concreta pelo poder judicial.

XII – Também não houve resposta ou análise concreta aos argumentos do Recorrente quando defendeu não se verifica a exceção da incompetência em razão da matéria, atendendo a que nas ações de falência, os processos que têm conexão com essa causa correm por apenso. Assim o determina o artigo 160.º do CPEREF e também o artigo 89, n.º 2 do CIRE, e ainda o art.º 3, do CIRE faz uma referência nesse sentido.

XIII – O Recorrente considera que não foi cumprido o texto do legislador, deve o Tribunal fundamentar essa alteração ao sentido do espírito da lei, de outra forma haverá inconstitucionalidade.

XIV – As pretensões do Recorrente sempre se revelaram legítimas, porquanto lhe assiste o Direito de que a Justiça aprecie as irregularidades subjacentes à falência em causa nos autos.

XV – Tais irregularidades mostram-se evidentes na tramitação do próprio de falência.

XVI – Veja-se por exemplo que na audiência de partes realizada em 7 de maio de 2019, o Sr. Liquidatário admitiu que a documentação contabilística da falida desapareceu e nunca foram realizadas diligências tendentes à sua localização.

XVII – Foram efetivamente intentadas as ações inumeradas na p.i. cuja existência o A. e ora Recorrente nunca omitiu, precisamente por estar de boa fé e nada ocultar ao Tribunal.

A decisão a rever deve ser substituída por outra, na qual sejam sanados os vícios legais supra invocados.

2. Foi proferida Decisão Sumária, que entendendo ser manifesta inexistência de fundamento para a revisão, não admitiu o recurso de revisão.

2.1. Considerando o Recorrente que o novo documento não admitido, decisão do Tribunal Constitucional indicada, embora não se pronunciando sobre o mérito da questão, demonstrou que não foi possível verificar o interlocutório com o poder judicial, por forma a apreciar e aclarar a decisão a rever, quanto as questões que suscitara, requereu  a apresentação à Conferência, sendo proferido Acórdão da Relação de Évora que não admitiu o recurso de revisão.

3. Inconformado veio o Recorrente interpor recurso de revista, formulando nas suas alegações as seguintes conclusões:

1. A decisão do Tribunal Constitucional proferida a 31 de Março de 2022, embora não se pronunciando sobre o mérito da questão, demonstrou que não foi possível verificar o interlocutório com o poder judicial por forma a apreciar e aclarar a decisão a rever quanto às questões não apreciadas.

2. Foi no momento em tomou conhecimento da decisão do Tribunal Constitucional proferida a 31 de Março de 2022 que tomou conhecimento de que a condenação por litigância de má-fé com tão nefastas consequências não seria submetida a uma análise judicial ponderada.

3. O Recorrente não se limita a discutir de novo os pressupostos da condenação como litigante de má-fé, mas exerce o seu legítimo direito para que sejam revistos os pontos que considera incorretamente julgados.

4. A sentença de primeira instância pressupôs um caso julgado não comprovado que foi confirmado na segunda instância.

5. Para condenar de forma tão gravosa é necessária uma verificação dos respetivos pressupostos que não ofereça qualquer dúvida, o que não ocorreu in casu.

6. Não sendo cumprido o texto do legislador, deve o Tribunal fundamentar essa alteração ao sentido do espírito da lei, pois, de outra forma, haverá inconstitucionalidade.

7. A colisão com o espírito normativo viola o disposto nos Artigos 2º, 147º, 161º, c), 202º, nº 1 e 2, e 20º, nºs. 1, 2 e 5 da Constituição da República Portuguesa.

Termos em que o Acórdão recorrido deve ser revogado e substituído por outro que admita o recurso de revisão.

4. Cumpre apreciar e decidir.

*

II – Enquadramento facto-jurídico

Factualidade tida por relevante no Acórdão sob recurso:

AA, veio instaurou ação comum contra, Massa Insolvente da sociedade comercial Multitur - Turismo Internacional, S. A., BB, CC, DD,  EE, FF, Caixa Geral de Depósitos, GG, HH peticionando a condenação solidária dos RR no pagamento das quantias de 395.822,46 euros e 30.000,00 euros a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, respetivamente com fundamento na prática pelos RR, no âmbito do processo de insolvência, de irregularidades e condutas dolosa que seriam impeditivas da prossecução do processo de insolvência.

Foi proferida decisão que julgou verificada a exceção de incompetência em razão da matéria e em consequência absolveu os RR da instância.

Mais se decidiu condenar o A. como litigante de má-fé no pagamento de multa fixada no valor de 30 UC.

Inconformado recorreu o A. para esta Relação.

Em 10-9-2020 foi proferido acórdão por esta Relação que julgou o recurso improcedente e em consequência confirmou a decisão recorrida.

O A. interpôs então recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça que não foi admitido.

Apresentada reclamação do despacho de não admissão do recurso foi a mesma indeferida.

Inconformado com o despacho que não admitiu o recurso de revista do acórdão do Tribunal da Relação, confirmativo da decisão de primeira instância sobre a respetiva condenação como litigante de má-fé, interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b), do n.º 1 do art.º 70 da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional que foi indeferida por despacho do relator.

Deste despacho reclamou para o Tribunal Constitucional.

Foi proferido acórdão que indeferiu a reclamação, mantendo a decisão de não admissão do recurso para o Tribunal Constitucional.

Deste acórdão o reclamante interpôs recurso para o Pleno do Tribunal Constitucional que não foi admitido.

Apresentou o ora recorrente nova reclamação que foi indeferida.

Do direito.

1. A questão a apreciar nos autos tal como surge delineada, prende-se em saber se deve, ou não, ser admitido o recurso de revisão no que concerne ao Acórdão da Relação de Évora de 10.09.2020, que confirmou a sentença prolatada, no sentido da incompetência material do tribunal do comércio, e considerou verificados os pressupostos da condenação por litigância de má fé, considerando que a posição do ali autor, ora Recorrente, consubstanciava uma negligência grosseira, porquanto instaurava uma ação, quando já obtivera o indeferimento do peticionado noutras ações, chegando a ser nelas condenado como litigante de má fé, como aliás era confessado na própria petição inicial, a que acrescia que muitas dessas ações tinham sido indeferidas por se verificar a exceção do caso julgado, com um uso manifestamente reprovável do processo.

Com efeito, no decidido pelo Tribunal da Relação quanto à admissibilidade pretendida do recurso de revisão de tal Acórdão de 10.09.2022, e a conhecer, foi entendido que apresentado como fundamento para tanto a existência de um documento, a decisão do Tribunal Constitucional de 31.03.2022, não se vislumbrava como a mesma, quer nos seus fundamentos, quer no seu dispositivo, podia se ter pronunciado sobre a questão suscitada no recurso de revista.

Insurge-se o Recorrente contra tal entendimento, invocando a confiança que os seus fundamentos fossem apreciados de forma a não permitir o dano da condenação sofrida, sendo no momento que teve conhecimento da aludida decisão do Tribunal Constitucional que soube que aquela condenação por litigância de má fé não seria submetida a uma análise judicial ponderada, com a pronúncia sobre as questões suscitadas.

Mais alega que não se limita a discutir, de novo, os pressupostos da litigância de má fé, mas sim exercer o legítimo direito para que sejam revistos os pontos que considera incorretamente julgados, pois e prosseguindo, não tendo sido julgada procedente a exceção de caso julgado por, segundo o consignado em sede de sentença, não havia elementos necessários para concluir pela sua existência, não havia fundamento suficiente para a condenação por má fé.

Refere, afinal, que não sendo feita essa perceção, no cumprimento dos normativos, e observação do respetivo espírito, haverá inconstitucionalidade, genericamente mencionada, com a violação dos artigos indicados da Constituição da Republica.

2. Apreciando.

2.1. Enquanto recurso extraordinário, o recurso de revisão, previsto nos artigos 696 e seguintes do CPC, incidente sobre qualquer decisão judicial, consubstancia-se como um meio excecional impugnativo, visando a destruição do caso julgado, em situações taxativamente previstas na lei, justificando-se a sua existência na particular prevalência da exigibilidade da justiça material, sobre as razões de segurança e certeza jurídica que subjazem ao caso julgado[1], cuja justificação se encontrada nas razões impostas por tal justiça, nomeadamente tendo em conta o evoluir da consciência jurídica, numa procura de uma configuração social do direito, em termos hodiernamente prevalentes[2].

Como fundamento do recurso de revisão, para o caso que nos interessa, consta do art.º 696, alínea c) do CPC, que “ Se apresente documento de que a parte não tivesse conhecimento, ou de que não tivesse podido fazer uso, no processo em que foi proferida a decisão a rever e que, por si só, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida”.

Face à questão em concreto delineada, e conforme melhor à frente se verá, em termos breves, do normativo apontado resulta evidenciado quanto ao documento referenciado, a verificação cumulativa de requisitos, a saber, novidade do documento, no sentido de não ter sido apresentado no processo no qual foi proferida a decisão, quer por não existir, quer por a parte não poder dele dispor, e a suficiência, no entendimento que seja suscetível de levar a uma alteração do decido a rever, em termos diversos como o foi, no sentido mais favorável à parte[3].  

No entanto, antes de se avançar na apreciação de tais pressupostos taxativamente delineados, de forma necessária avulta determinar no que se consubstancia o “documento” a atender, acolhendo-se o entendimento que corporizando uma declaração de verdade ou de ciência, ou um estado de coisas, deverá, em conformidade ser um documento nesse sentido estrito, e desse modo, por natureza, uma sentença ou acórdão no caso de decisões de tribunais colegiais,  enquanto ato pelo qual o juiz decide a causa principal ou algum incidente que apresente a estrutura de uma causa, art.º 152, n.º2 e 3, do CPC,  não podem assim ser qualificados como documento, para constituírem fundamento do recurso de revisão, como, aliás, se vem decidindo neste Tribunal[4].

2.2. Reportando-nos aos autos, como foi considerado no Acórdão sob recurso, e resulta dos mesmos, o Recorrente instaurou uma ação de condenação visando ser ressarcido das quantias peticionados, sendo proferida decisão que julgou verificada a exceção de incompetência em razão da matéria, com a consequente absolvição dos RR da instância, e a condenação daquele como litigante de má-fé.

Dessa decisão foi interposto recurso para a Relação, proferindo o Acórdão de 10.09.2020, decisão a rever, que o julgou improcedente, confirmando a decisão recorrida, interposto recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, não foi o mesmo admitido, sendo indeferida a respetiva reclamação.

Inconformado com o despacho que não admitiu o recurso de revista do acórdão do Tribunal da Relação, confirmativo da decisão de primeira instância sobre a respetiva condenação como litigante de má-fé, interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b), do n.º 1 do art.º 70 da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional que foi indeferida por despacho do Relator.

Deste despacho reclamou para o Tribunal Constitucional, sendo proferido o Acórdão n.º 928/2021 que indeferiu a reclamação, mantendo a decisão de não admissão do recurso para esse Tribunal, mantendo a decisão de não admissão do recurso, proferida no Supremo Tribunal de Justiça.

Deste Acórdão o reclamante interpôs recurso para o Peno do Tribunal Constitucional que não foi admitido, tendo apresentando nova reclamação que foi indeferida, pelo Acórdão n.º 239/2022, proferido em 31 de Março de 2022.

Ora, o Recorrente apresenta como fundamento para a revisão pretendida, esta última decisão proferida pelo Tribunal Constitucional, junta com o requerimento inicial, constando da respetiva “Fundamentação”, “ Subentendendo-se que o reclamante, não obstante reiterar a sua insatisfação sobre a decisão das instâncias que o condenou como litigante de má fé, vem reagir ao despacho que indeferiu o seu requerimento de recurso para o Pleno do Tribunal Constitucional, sobre o Acórdão n.º 928/2021, encontramos fundamento da sua admissibilidade, ao abrigo do artigo 78.º-B, n.º2, da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional. Contudo, não se encontra no despacho reclamado, fundamentação que mereça sofrer qualquer alteração, atenta a sua assertividade e apoio legal chamado à colação”, e no dispositivo “Decisão, Nesta conformidade indefere-se a reclamação.”

2.3. Avulta do explanado, e desde logo, que o Acórdão do Tribunal Constitucional oferecido como fundamento para a pretendida revisão do Acórdão da Relação, carece, por si, de qualidade que a tal permita.

Ainda assim, para além da razão redutora apontada, declinando a pretensão formulada pelo Recorrente, da leitura do requerimento recursivo e respetivas conclusões, decorre a manifesta discordância com o decidido no que concerne à sua condenação como litigante de má fé, sem a verificação dos necessários pressupostos, na pressuposição da existência de um caso julgado não confirmado, que o Tribunal da Relação também acolheu na decisão a rever, numa manifesta formulação de uma nova reapreciação do decidido, no sentido desejado pelo Recorrente, desse modo se realizando, segundo o mesmo, a observância do direito aplicável.

Tendo em conta, para além do já mencionado, que o Acórdão do Tribunal Constitucional em causa, surge na sequência da inadmissibilidade dos recursos para o Supremo Tribunal de Justiça e para o Tribunal Constitucional, não sendo conhecidos os respetivos objetos, mais do que a perceção que foram esgotados os recursos normais que o Autor/recorrente dispunha, não se divisa como pudesse, de algum modo, permitir a alteração do que foi decidido pelo Tribunal da Relação de Évora de 10.09.2020, maxime, nos termos requeridos, de admissão do recurso de revisão interposto. 

Uma última nota ex abudantis, tal como as considerações acima efetuadas, também se dirá, que a formulação de uma eventual inconstitucionalidade passa por parca, sem apontar quais os princípios que possam estar em causa, sendo certo que o acesso ao direito e tutela jurisdicional, art.º 20, da Constituição da Republica, não se mostra contrariado, face até ao enunciado feito, não se confunde, nem se determina, com uma solução querida por quem recorreu aos Tribunais, no exercício desse direito.

Improcedem, assim, as conclusões formuladas pelo Recorrente.

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III – DECISÃO

Nestes termos, decide-se negar a revista, mantendo o decidido no Acórdão recorrido.

Custas pelo Recorrente.

Lisboa, 17.01.2022

Ana Resende (Relatora)

 Maria José Mouro

Graça Amaral

                                                          

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Sumário, art.º 663, n.º 7, do CPC.

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[1] Cf. Acórdão do STJ de 12.12.2017, processo n.º 2178/04.5TVLSB-E.L1.S1, in www.dgsi.pt. mencionando “Com o caso julgado protege-se o interesse substancial da estabilidade da ordem jurídica,  (…). A segurança é, pois, uma das exigências feitas ao Direito, pelo que, em última análise, representa também uma tarefa ou missão contida na própria ideia de Direito (…). Justiça e segurança acham-se numa relação de tensão dialética (havendo que salientar este ponto: a segurança jurídica como tal é um atributo da juridicidade; de modo que a tensão ou conflito entre justiça material e segurança jurídica é uma tensão dialética permanente e indesvanecível que se situa no interior mesmo da juridicidade)” apud, J. Baptista Machado, “Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador”, 1991, p. 55.
[2] Cf. Ac. do STJ de 14.01.2021, processo n.º 84/07.0TVLSB.L1.S1.-A, in www.dgsi.pt,.
[3] Vejam-se, entre outros, para além do já referenciado Ac. do STJ de 14.01.2021, Ac. STJ, de 19.09.2013, processo n.º 663/09.1TVLSB.S1, 29.06.2017, processo n.º 90/13.6T2VGS-A.P1.S1 e de 19.12.2018, processo n.º 179/14.4TTVNG-B.P1.S1 e de 29.09.2022, processo n.º 325/17.0T8VNG.P1-A.S1, todos consultáveis em www.dgsi.pt. Na Doutrina cf. Lebre de Freitas, Ribeiro Mendes, Isabel Alexandre, in Código de Processo Civil Anotado, 3.ª edição, vol. III, fls. 305 e seg., com ampla nota Jurisprudencial.
[4] Cf. Ac. do STJ de 14.12.2021, processo n.º 1012/15.5T8VLR-AU-A.S1, reportando outros Arestos, caso dos proferidos à luz da anterior versão do CPC, mantendo a mesma atualidade, consultável em www.dgsi.pt. Também na Doutrina, veja-se  Lebre de Freitas, Ribeiro Mendes, Isabel Alexandre, obra citada, pág. 306, e  Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, 2.ª edição, vol. I, pág. 859.