CONDUÇÃO SEM HABILITAÇÃO LEGAL
ANTECEDENTES CRIMINAIS
PREVENÇÃO GERAL
PREVENÇÃO ESPECIAL
PENA DE PRISÃO
REGIME DE PERMANÊNCIA NA HABITAÇÃO
Sumário

I. Tendo o arguido sido anteriormente condenado por oito crimes de natureza rodoviária entre 2011 e 2020, evidencia uma preocupante indiferença perante os valores da comunidade e pelos bens jurídicos tutelados e as anteriores penas de multa (primeiro) e de prisão suspensa na sua execução (depois) não se mostraram suficientes para refrear o seu ímpeto criminal.
II. A pena necessária e adequada à punição do mais recente ilícito criminal, por razões de prevenção geral e de prevenção especial é a de prisão em regime de permanência na habitação (artigo 43.º CP).

Texto Integral


ACORDAM OS JUÍZES, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÂO DE ÉVORA


1. RELATÓRIO


A – Decisão Recorrida


No processo sumário nº 447/22.1GEALR, do Tribunal Judicial da Comarca ..., Juízo de Competência Genérica ..., o arguido AA, foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, p.p., pelo Artº 3 nsº1 e 2 do D.L. 2/98 de 03/01, na pena de 6 (seis) meses de prisão a cumprir em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, por igual período de tempo, condicionado à reunião pelo arguido dos pressupostos previstos pelos Artsº 4 nº4 e 7 nº2, da Lei n.º 33/2010, de 2 de Setembro, estando autorizadas as ausências do arguido estritamente necessárias à prossecução da sua actividade laboral dentro do horário respectivo, bem como, para a frequência de aulas teóricas e práticas de condução e sujeição aos respectivos exames, tudo a comprovar junto da Equipa de Vigilância da DGRSP (Artº43 nsº1, 2 e 3, do Código Penal)

B – Recurso

Inconformado com o assim decidido, recorreu o arguido, tendo concluído as respectivas motivações da seguinte forma (transcrição):

1) Desde logo porque, pelo recorrente foi referido e foi provado que a pena de 6 (seis) meses de prisão, a cumprir em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância é completamente desacuada,
2) O recorrente aquando da interceção doas agentes de autoridade, encontrava-se a conduzir por necessidade, conforme se provou na audiência de julgamento, bem como nas declarações do Senhores Agentes de Autoridade,
3) Daí que, salvo devido respeito pelo tribunal “a Quo”, não podia decidir como decidiu, ao proceder desse modo significa coatar os direitos que o recorrente possui.
4) Andou mal novamente este tribunal, porquanto não fundamentou devidamente a sua decisão, aplicando a seu belo prazer a pena de 6 (seis) meses de prisão, a cumprir em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meio técnicos de controlo à distância.
5) Inexiste fundamento de facto e de direito para que o tribunal a quo tenha decidido como decidiu e, consequentemente, para a condenação do Recorrente numa a pena de 6 (seis) meses de prisão, a cumprir em regime de permanência na habitação com fiscalização por meio técnicos de controlo à distância.
6) Ora, não pode efetivamente o recorrente concordar com a douta sentença, desde logo porque, a pena aplicada é completamente desproporcional aos factos cometido pelo recorrente.
7) Salvo devido respeito pelo tribunal “a quo”, andou mal este tribunal ao decidir da forma como decidiu.
8) E como tal, e do exposto, não pode o tribunal “a Quo”, decidir pela aplicação da pena de 6 (seis) meses de prisão, cumprir em regime de permanência na habitação com fiscalização por meio técnicos de controlo à distância.
9) Assim, ao decidir da forma supra descrita errou na apreciação dos factos, não se mostrando assim que o tribunal “a Quo” tenha sido suficientemente exigente na formação da sua convicção, sendo certo que, sem que para isso, tivesse suporte documental para o efeito, muito pelo contrário,
10) Todas estas circunstâncias supra elencadas só poderiam conduzir a um resultado distinto daquele que veio a ser considerado pelo Tribunal “a Quo”,
11) Igualmente, perante o supra exposto, e porquanto não resulta da motivação da sentença, não se percebe de que forma é que o Tribunal “a Quo” formou uma certeza absoluta relativamente à decisão proferida.
12) Assim, deverá ser revogada a sentença recorrida impugnada e substituída por outra que considere o recurso procedente.

13) Termos em que o presente recurso deve ser julgado provado e procedente e por via disso, revogada a sentença recorrida e substituída por outra que difira o recurso.
Nestes termos, e no mais que V. EXAS, doutamente se dignarão suprir, deve ser concedido provimento ao recurso, e, consequentemente julgar-se a apelação procedente.

C – Resposta ao Recurso

O M. P, junto do tribunal recorrido, com as seguintes conclusões (transcrição):

1. As conclusões e respectiva motivação recursivas são de tal modo omissas quanto à delimitação da impugnação da matéria de facto, que nem nos é possível constatar que o recorrente se limita a suster a sua própria interpretação da prova produzida em audiência de discussão e julgamento, simplesmente apresenta uma impugnação de matéria factual que, em rigor, não o é, de tal modo que deverão V. Exas. concluir que nada há a apreciar nessa sede, porque irremediavelmente incumprido o disposto no artigo 412.º, n.º 3 do Código de Processo Penal.
2. Não merece qualquer censura a decisão recorrida, devendo improceder totalmente o recurso interposto pelo recorrente.
3. A sentença recorrida encontra-se bem fundamentada e é elucidativa das razões que presidiram à não formulação de um juízo de prognose favorável em que se antevisse que a mera ameaça de prisão era suficiente ou adequada para corresponder às necessidades de prevenção geral e especial que no caso se fazem sentir (artigo 50.º a contrario sensu do Código Penal).
4. A medida da pena (6 meses de prisão) mostra-se adequada, suficiente e proporcional para acautelar as destacadas necessidades preventivas, de forma enquadrada com o grau de culpa e principalmente considerando os antecedentes criminais do arguido.

D – Tramitação subsequente

Aqui recebidos, foram os autos com vista à Exmª Procuradora-Geral Adjunta, que pugnou pela manutenção da decisão recorrida.
Observado o disposto no Artº 417 nº2 do CPP, foi apresentada resposta pelo arguido, dando por reproduzido o teor do seu recurso.
Efectuado o exame preliminar, determinou-se que o recurso fosse julgado em conferência.
Colhidos os vistos legais e tendo o processo ido à conferência, cumpre apreciar e decidir.

2. FUNDAMENTAÇÃO

A – Objecto do recurso

De acordo com o disposto no Artº 412 do CPP e com a Jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19/10/95, publicado no D.R. I-A de 28/12/95 (neste sentido, que constitui jurisprudência dominante, podem consultar-se, entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12 de Setembro de 2007, proferido no processo n.º 07P2583, acessível em HYPERLINK "http://www.dgsi.pt/" HYPERLINK "http://www.dgsi.pt/" www.dgsi.pt, que se indica pela exposição da evolução legislativa, doutrinária e jurisprudencial nesta matéria), o objecto do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extraiu da respectiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.
Na verdade e apesar de o recorrente delimitar, com as conclusões que retira das suas motivações de recurso, o âmbito do conhecimento do tribunal ad quem, este contudo, como se afirma no citado aresto de fixação de jurisprudência, deve apreciar oficiosamente da eventual existência dos vícios previstos no nº2 do Artº 410 do CPP, mesmo que o recurso se atenha a questões de direito.
As possibilidades de conhecimento oficioso, por parte deste Tribunal da Relação, decorrem, assim, da necessidade de indagação da verificação de algum dos vícios da decisão recorrida, previstos no nº 2 do Artº 410 do CPP, ou de alguma das causas de nulidade dessa decisão, consagradas no nº1 do Artº 379 do mesmo diploma legal.
Do seu exame, não ocorre qualquer falha na avaliação da prova feita pelo Tribunal a quo, revelando-se a mesma como coerente com as regras de experiência comum e conforme à prova produzida, na medida em que os factos assumidos como provados são suporte bastante para a decisão a que se chegou, não se detectando incompatibilidade entre eles e os factos dados como não provados ou entre a fundamentação e a decisão.
x
Impõe-se aqui uma nota para dizer que o recorrente, ainda que pareça enunciar que também recorre da matéria de facto, a verdade é que, quer em sede de motivações, quer no que toca às conclusões do seu recurso, omite, por completo, as exigências decorrentes do Artº 412 nº3 do CPP, já que em nenhum daqueles segmentos indica os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados e as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida, limitando-se, de forma genérica, a dizer que o tribunal a quonão podia decidir como decidiu” e que “errou na apreciação dos factos”.
Nesta medida, sendo o recurso completamente omisso quanto à delimitação da impugnação da matéria de facto – pelo que, como bem nota o MP na sua resposta, nem sequer é possível dizer que o recorrente se limita a suster a sua própria interpretação da prova produzida nos autos – há que concluir que, em sede factual, nada há a apreciar, considerando-se definitivamente fixada a decisão proferida pela 1ª instância sobre a matéria de facto.
Também não se verifica a inobservância de requisito cominado sob pena de nulidade que não deva considerar-se sanada (Artº 410 nº3 do CPP).
Posto isto, inexistindo qualquer questão merecedora de aferição oficiosa, o objecto do recurso cinge-se às conclusões do recorrente, onde reclama a revogação da sentença ao nível da pena que lhe foi aplicada, ainda que não peticione, em concreto, qualquer outra pena.

B – Apreciação

Definida a questão a tratar, importa considerar o que se mostra fixado, em termos factuais, pela instância recorrida.
Aí, foi dado como provado e não provado, o seguinte (transcrição):

II – Fundamentação de facto
A – Matéria de facto provada
Apreciada a prova produzida em audiência de julgamento, resultaram como provados os seguintes factos, com relevância para a boa decisão da causa:
Da acusação pública
1. No dia 2022/06/22, pelas 11h00m, o arguido conduzia o veículo automóvel ligeiro de mercadorias de marca ..., modelo ..., com a matrícula ..-LG-.., na Rua ..., via pública do concelho ..., sem ser titular de qualquer título que o habilitasse a tal condução.
2. O arguido sabia não ser titular de carta de condução que o habilitasse a conduzir tal veículo e que tal conduta lhe estava vedada, no entanto, não se inibiu de agir nos termos descritos.
3. O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, querendo atuar da forma descrita, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punível por lei.
Da audiência de julgamento
4. O arguido confessou os factos de forma livre, integral e sem reservas em audiência de
julgamento.
5. (…) declarou, em audiência de julgamento, consentir no cumprimento em regime de
permanência na habitação de eventual pena de prisão que lhe venha a ser aplicada nos presentes autos.
6. (…) é solteiro e não tem filhos.
7. (…) tem atualmente 31 anos de idade.
8. (…) possui, como habilitações literárias, o 9.º ano de escolaridade.
9. (…) é ajudante de mecânico, auferindo o salário mensal de cerca de € 705,00.
10. (…) integra agregado familiar composto, além de si, pela mãe.
11. (…) residindo em casa propriedade da mãe.
12. O arguido foi julgado e condenado:
12.1. Pela prática, em 2011/07/17, de factos que constituem um crime de condução perigosa de veículo rodoviário, previsto e punível pelos artigos 291.º, n.º 1, alíneas a) e b), e 69.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, e um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punível pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro, no processo n.º 197/11.... da extinta Secção Única do Tribunal Judicial ..., por decisão proferida em 2012/03/06 e transitada em julgado em 2012/03/06, na pena principal única de 160 dias de multa à taxa diária de € 5,00, perfazendo o total de € 800,00;
12.2. Pela prática, em 2013/09/15, de factos que constituem um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punível pelos artigos 292.º, n.º 1, e 69.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, e um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punível pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro, no processo n.º 212/13.... do extinto ... Juízo Criminal do Tribunal Judicial ..., por decisão proferida em 2013/09/27 e transitada em julgado em 2013/10/28, na pena única de 220 dias de multa à taxa diária de € 7,00, perfazendo o total de € 1.540,00;
12.3. Pela prática, em 2014/09/27, de factos que constituem um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punível pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro, no processo n.º 78/14.... do Juízo Local Criminal ... do Tribunal Judicial da Comarca ..., por decisão proferida em 2014/09/29 e transitada em julgado em 2014/10/29, na pena de 4 meses de prisão substituída por multa de 150 dias à taxa diária de € 7,00, perfazendo o total de € 1.050,00;
12.4. Pela prática, em 2016/07/03, de factos que constituem um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punível pelos artigos 292.º, n.º 1, e 69.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, e um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punível pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro, no processo n.º 105/16.... do Juízo Local Criminal ... do Tribunal Judicial da Comarca ..., por decisão proferida em 2016/07/12 e transitada em julgado em 2016/09/27, na pena principal única de 8 meses de prisão substituída por 240 horas de trabalho e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 6 meses;
12.5. Pela prática, em 2020/01/26, de factos que constituem um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punível pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro, no processo n.º 7/20.... do Juízo Local Criminal ... do Tribunal Judicial da Comarca ..., por decisão proferida em 2020/02/10 e transitada em julgado em 2020/04/30, na pena de 1 ano de prisão suspensa por 1 ano com regime de prova com frequência de programa de prevenção rodoviária, com comprovação no prazo de 6 meses de frequência de aulas teóricas e aprovação nos exames teórico e prático.

B – Matéria de facto não provada
Com relevância para a boa decisão da causa, não se provou, nomeadamente, que:
a) Nas circunstâncias referidas no ponto 1 da matéria de facto provada o arguido conduziu o veículo por necessidade de prestar assistência a BB, seu colega de trabalho, por este se ter sentido mal de saúde.

Definido o quadro factual, apreciemos da bondade do peticionado.

B.1. Da alteração da pena de prisão

Como atrás se disse, o recorrente não peticiona, em concreto, uma pena, ainda que solicite a revogação do que foi determinado pela instância recorrida, alegando, ainda que sem justificar tal asserção, que a pena que lhe foi aplicada é desadequada e desproporcional em relação às circunstâncias do caso.
Veja-se o que, em sede de pena, se disse na decisão sindicada (transcrição):

B – Determinação do tipo e da medida da pena
Pela prática de um crime de condução de veículo motorizado sem habilitação legal, previsto e punível pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro, incorre o arguido em punição com pena de prisão até 2 anos ou multa até 240 dias. Cumpre determinar, antes de mais, o tipo de pena a aplicar pela prática do crime supra referido.
Estabelece o art.º 70.º do Código Penal que “se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.
Com este comando legal, o legislador expressa, de forma inequívoca, a opção pela restrição máxima da aplicação da pena de prisão, a que não é alheio o reconhecimento generalizado, pela moderna criminologia, de que “aquele que cumpre uma pena de prisão é desinserido profissional e familiarmente, sofre o contágio prisional, fica estigmatizado com o labéu de ter estado na prisão e não é compensado, muitas vezes, com efetiva ressocialização” (Anabela Rodrigues, A determinação da medida concreta da pena privativa de liberdade e a escolha da pena”, anotação ao AcSTJ de 1990/03/21 (3ª secção – processo n.º 40.639), in Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano I, n.º 2, abril – junho de 1991, pág. 255).
Neste sentido, só haverá que optar por uma pena de prisão quando tal seja imposto pelos fins das penas, quais sejam a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, limitados pela medida da culpa do agente (art.º 40.º, n.º 1 e 2, do Código Penal).
A proteção de bens jurídicos implica a utilização da pena para dissuadir a prática de crimes pelos cidadãos (prevenção geral negativa), incentivar a convicção de que as normas penais são válidas e eficazes e aprofundar a consciência dos valores jurídicos por parte dos cidadãos (prevenção geral positiva). A proteção de bens jurídicos significa ainda prevenção especial como dissuasão do próprio delinquente potencial. Por outro lado, a reintegração do agente significa a prevenção especial na escolha da pena ou na execução da pena. E, finalmente, a retribuição, que não é exigida necessariamente pela proteção de bens jurídicos. A pena como censura da vontade ou da decisão contrária ao Direito pode ser desnecessária, segundo critérios preventivos especiais, ou ineficaz para a realização da prevenção geral. (Fernanda Palma, Casos e Materiais de Direito Penal, 2000, Almedina, págs. 32-33).
No caso concreto dos autos, são elevadas as necessidades de prevenção geral negativa (atenta a habitualidade e frequência da prática de crimes de natureza rodoviária a nível nacional, e de que esta circunscrição judicial não é exceção), e igualmente elevadas as necessidades de prevenção geral positiva (necessidade de promover a reafirmação contrafáctica da norma na sociedade e aprofundar a consciência dos valores inerentes ao bem jurídico por aquela protegido, sobretudo na comunidade local onde se insere o arguido).
Quanto às necessidades de prevenção especial como dissuasão do próprio delinquente potencial e de reintegração do agente na sociedade, terão as mesmas de considerar-se como muito elevadas, na medida em que o arguido foi já condenado anteriormente por cinco vezes pela prática, num período de tempo de cerca de 9 anos decorrido entre 2011 e 2020, de oito crimes de natureza rodoviária, sendo cinco deles de condução sem habilitação legal (do mesmo tipo do crime sub judice), dois de condução de veículo em estado de embriaguez e um de condução perigosa de veículo rodoviário, pelos quais foi já condenado em três penas de multa e em duas penas de prisão, a última delas suspensa na sua execução com obrigação de se sujeitar a inscrição em escola de condução e a exame teórico e prático, mostrando-se inequivocamente portador de personalidade tendencialmente criminosa, com preocupante indiferença perante os valores da comunidade onde se insere e pelos bens jurídicos nesta tutelados.
A aplicação anterior de múltiplas penas de multa e de prisão, a última delas suspensa na sua execução e referente a factos ocorridos em 2020, já com a obrigação de inscrição em escola de condução e sujeição a exames teórico e prático, não foi manifestamente eficaz para refrear o ímpeto criminal do arguido.
Neste sentido, e não obstante a sua boa integração social, familiar e a atividade profissional ativa, é de crer que a mera aplicação de uma pena não detentiva seja já insuficiente para assegurar as finalidades preventivas, tanto as de natureza especial, atenta a pertinácia criminógena do arguido, como geral, em razão da incompreensão social pela persistente recidiva do mesmo, pelo que opta o Tribunal pela aplicação de uma pena de prisão.
Cumpre determinar, então, a medida da pena a aplicar.
Nos termos do art.º 71.º, n.º 1, do Código Penal, “a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção”.
Neste sentido, a pena funciona como remédio dissuasor à prática de ilícitos, prevenindo
comportamentos ofensivos de bens jurídicos penalmente protegidos, por um lado, e como veículo ressocializador do agente, conforme estatui o art.º 40.º, n.º 1, do Código Penal.
Por seu turno, o art.º 40.º, n.º 2, do Código Penal estabelece que “em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa”, entendendo-se por culpa a censura ético-jurídica dirigida a um sujeito por não ter agido de modo diverso, sendo portanto um juízo de valor em face de uma motivação censurável do arguido (Eduardo Correia, Direito Criminal, I, Almedina, págs. 316 e 320-321).
Temos, assim, que as necessidades de prevenção jamais ultrapassarão a medida da culpa, o que se traduz, naturalmente, na consideração da culpa, simultaneamente, como pressuposto e limite para o estabelecimento da pena concreta.
Pelo que o modelo da medida da pena há de ser construído por consideração do binómio prevenção/culpa, dando-se, assim, pela via das exigências de prevenção, simultaneamente cumprimento à necessidade comunitária de punição do facto praticado pelo agente, cumprindo as finalidades da pena, nomeadamente de proteção dos bens jurídicos e de reintegração do agente na sociedade, estabelecendo o limite mínimo da pena, e pela culpa se estabelece o seu limite máximo por respeito à dignidade da pessoa humana (E que constitui princípio constitucional fundamental nos termos do art.º 1.º da Constituição da República Portuguesa).
Assim, e em sede de medida da pena, o Tribunal considerou, nos termos do art.º 71.º, n.º
2, do Código Penal:
Em desfavor do arguido:
- O grau elevado de ilicitude, consubstanciado essencialmente no tipo de veículo utilizado (automóvel);
- Os antecedentes criminais, com cinco condenações anteriores pela prática de oito crimes de natureza rodoviária, sendo cinco deles do mesmo tipo do crime sub judice;
- A intensidade do dolo com que atuou (direto);
- A manifesta impreparação para manter uma conduta rodoviária lícita, expressa nos seus antecedentes criminais.
Em favor do arguido:
- A boa inserção social, familiar e laboral;
- A confissão livre, integral e sem reservas dos factos.
Tendo tudo ponderado, o Tribunal considera adequado aplicar ao arguido, pela prática, em autoria material, de um crime de condução de veículo motorizado sem habilitação legal, a pena de 6 meses de prisão.
O Tribunal entende que a pena aplicada ao arguido é a adequada e necessária ao caso concreto, ponderadas que foram todas as circunstâncias agravantes e atenuantes, assim como as necessidades de prevenção geral e especial, já supra elencadas.
O Tribunal considerou ainda como limite inultrapassável na determinação da medida da pena o carácter elevado da culpa demonstrada pelo arguido, a quem se impunha, em razão da sua idade, grau de esclarecimento e condenações anteriores, outro tipo de comportamento.

C – Da substituição da pena de prisão
O Código Penal prevê a existência de duas penas principais (prisão e multa), às quais acrescenta uma série de penas de substituição das penas principais, e nas quais se incluem a pena de substituição detentiva de permanência na habitação (art.º 43.º do Código Penal) e as não detentivas de multa, proibição de exercício de profissão, função ou atividade, suspensão da execução da pena de prisão e de prestação de trabalho a favor da comunidade (respetivamente, artigos 45.º, 46.º.º, 50.º e 58.º, do Código Penal).
*
Mostram-se completamente desadequadas as penas de substituição de multa (art.º 45.º, n.º 1, do Código Penal) e de prestação de trabalho a favor da comunidade (art.º 58.º, n.º 1, do Código Penal), pela sua manifesta ineficácia preventiva in casu, uma vez que não se mostram suficientemente acauteladoras da possível recidiva criminosa do arguido nem são capazes de assegurar cabalmente a sua ressocialização total, pelo que o Tribunal ponderou apenas a substituição da pena de prisão pela pena de suspensão de execução da pena de prisão ou pelo regime de permanência na habitação.
*
No que à pena substitutiva de suspensão da execução da pena de prisão diz respeito, prevê o art.º 50.º, n.º 1, do Código Penal que “o tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada as finalidades de punição”.
As finalidades da punição referidas comportam quer a proteção de bens jurídicos, quer a
reintegração do agente na sociedade (art.º 40.º, n.º 1, do Código Penal).
Quando aplicar pena de prisão não superior a 5 anos, o Tribunal deve suspender a sua execução sempre que, reportando-se ao momento da decisão, o julgador possa fazer um juízo de prognose favorável ao comportamento futuro do arguido, juízo este não necessariamente assente numa certeza, bastando uma expectativa fundada de que a simples ameaça da pena seja suficiente para realizar as finalidades da punição e consequentemente a ressocialização, em liberdade, do arguido (AcTRC de 2010/09/15, proc. n.º 68/07.9TAFZZ.C1, in www.dgsi.pt/).
A pena de suspensão de execução da pena de prisão pode ocorrer em três modalidades: de forma simples (art.º 50.º, n.º 1, do Código Penal), com cumprimento de deveres ou observância de regras de conduta (artigos 50.º, n.º 2, 51.º e 52.º do Código Penal) e/ou sujeita a regime de prova (artigos 50.º, n.º 2, e 53.º do Código Penal), visando a reintegração do agente na sociedade e/ou a reparação do mal do crime.
No caso concreto, dão-se por reproduzidas todas as necessidades de prevenção já supra
referidas, existindo prementes necessidades de promover a ressocialização do arguido do ponto de vista social, atento o desfasamento da personalidade do mesmo em relação ao Direito decorrente da indiferença demonstrada face à solene censura contida nas já extensas condenações sofridas anteriormente – cinco condenações anteriores pela prática de oito crimes, sendo quatro deles do mesmo tipo do crime sub judice e os demais da mesma natureza (rodoviária).
O arguido revela não ter aprendido com os seus erros anteriores, demonstrando uma personalidade incapaz de assimilar totalmente a ilicitude da sua conduta, sendo evidente a ineficácia das condenações anteriores aos factos sub judice (nomeadamente das penas de multa e de prisão suspensa na sua execução) e das solenes censuras nelas contidas para o reencaminhar para um comportamento conforme aos bens jurídicos tutelados pelas normas em causa.
Não obstante a sua integração social, familiar e laboral, o arguido evidencia ainda uma preocupante incapacidade para interiorizar a ilicitude do seu comportamento, fazendo crer na elevada probabilidade de ineficácia da suspensão da execução da pena de prisão, sobretudo aos olhos da comunidade (vertente da prevenção geral), que interpretará necessariamente a insistência numa eventual suspensão da execução da pena de prisão como uma verdadeira absolvição, perceção negativa e desqualificadora das sanções penais a que o Tribunal necessariamente terá que obstar.
Verifica-se, assim, como comprometido o juízo de prognose favorável ao comportamento futuro do arguido no que concerne à sua ressocialização, resultando evidente que a simples ameaça da pena não é já suficiente para realizar as finalidades da punição quanto à sua reabilitação em liberdade.
Nas palavras de Jescheck, “(…) a prognose favorável do réu, que deve verificar-se em todos os casos, consiste na esperança de que o condenado sentirá a condenação como uma advertência e que não cometerá no futuro nenhum delito. Com razão não se exige já a perspetiva de uma "vida futura ordenada e conforme à lei", já que para o fim preventivo da suspensão é suficiente que não volte a delinquir no futuro. Esperança não significa certeza. O Tribunal deve estar disposto a assumir um risco prudencial; mas se existem sérias dúvidas sobre a capacidade do condenado para compreender a oportunidade de ressocialização que se lhe oferece, a prognose deve ser negativa, o que de facto supõe um "in dubio contra reo" (…) Jescheck, Tratado de Derecho Penal, Parte General, II Volume, pág. 1154, tradução nossa do original.
Pelo exposto, o Tribunal decide, nos termos do art.º 50.º do Código Penal, não proceder à suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido. *
Resta ponderar pela determinação do cumprimento da pena de prisão aplicada em regime de permanência na habitação.
Dispõe o art.º 43.º do Código Penal, sob a epígrafe “regime de permanência na habitação”, na sequência da alteração introduzida pela Lei n.º 94/2017, de 23 de agosto, que:
1 - Sempre que o tribunal concluir que por este meio se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão e o condenado nisso consentir, são executadas em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância:
a) A pena de prisão efetiva não superior a dois anos;
b) A pena de prisão efetiva não superior a dois anos resultante do desconto previsto nos artigos 80.º a 82.º;
c) A pena de prisão não superior a dois anos, em caso de revogação de pena não privativa da liberdade ou de não pagamento da multa previsto no n.º 2 do artigo 45.º
2 - O regime de permanência na habitação consiste na obrigação de o condenado permanecer na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, pelo tempo de duração da pena de prisão, sem prejuízo das ausências autorizadas.
3 - O tribunal pode autorizar as ausências necessárias para a frequência de programas de ressocialização ou para atividade profissional, formação profissional ou estudos do condenado.
4 - O tribunal pode subordinar o regime de permanência na habitação ao cumprimento de regras de conduta, suscetíveis de fiscalização pelos serviços de reinserção social e destinadas a promover a reintegração do condenado na sociedade, desde que representem obrigações cujo cumprimento seja razoavelmente de exigir, nomeadamente:
a) Frequentar certos programas ou atividades;
b) Cumprir determinadas obrigações;
c) Sujeitar-se a tratamento médico ou a cura em instituição adequada, obtido o consentimento prévio do condenado;
d) Não exercer determinadas profissões;
e) Não contactar, receber ou alojar determinadas pessoas;
f) Não ter em seu poder objetos especialmente aptos à prática de crimes.
5 - Não se aplica a liberdade condicional quando a pena de prisão seja executada em regime de permanência na habitação”.
Conforme se faz notar no AcTRL de 2019/01/29, proc. n.º 310/15.2SILSB-5, in www.dgsi.pt/, “(…)[c]om as alterações introduzidas pela Lei nº 94/2017 de 23/08, o regime agora previsto no artigo 43º do Código Penal passou a constituir não só uma pena de substituição em sentido impróprio, mas também uma forma de execução ou de cumprimento da pena de prisão (…) a nova lei traduz o entendimento generalizado de que as penas curtas de prisão devem ser evitadas por não contribuírem necessariamente para a ressocialização efetiva do condenado. Foi, inclusivamente, na senda desse pensamento, que se procedeu à abolição da prisão por dias livres e do regime de semidetenção, alterando-se (através da ampliação do respetivo campo de aplicação) o regime de permanência na habitação (…)” [sublinhado nosso].
Ora, como já vimos supra, as finalidades da punição referidas comportam quer a proteção de bens jurídicos, quer a reintegração do agente na sociedade (art.º 40.º, n.º 1, do Código Penal), sendo de entender que este regime corresponde de modo mais eficaz à reintegração efetiva do arguido do ponto de vista social, ao permitir manter de forma contínua os laços familiares e a sua atividade profissional, não sendo prejudicada neste processo pelo corte provocado pela institucionalização decorrente da prisão em estabelecimento prisional.
O arguido consentiu expressamente no cumprimento da pena de prisão em regime de permanência na habitação.
Acresce ainda que a pena aplicada ao arguido é inferior a 2 anos, pelo que igualmente é admissível, pela sua dosimetria, o cumprimento da mesma neste regime.
O cumprimento da pena de prisão nesta modalidade pode ainda ser sujeito à autorização pelo Tribunal de ausências da habitação pelo arguido para frequência de programas de ressocialização ou para atividade profissional, formação profissional ou estudos do condenado (art.º 43.º, n.º 3, do Código Penal).
No caso vertente mostra-se fulcral ao processo ressocializador do arguido que o mesmo possa manter a sua atividade laboral e, bem assim, prosseguir o intento de obter licença para condução de veículos motorizados, pelo que serão igualmente autorizadas as ausências da habitação pelo arguido estritamente necessárias para prossecução da sua atividade laboral dentro do horário respetivo, e, bem assim, da frequência de aulas teóricas e práticas de condução e sujeição aos respetivos exames, a comprovar junto da Equipa de Vigilância da DGRSP.
Não obstante a verbalização em audiência de julgamento por parte do arguido do consentimento para o cumprimento da pena de prisão neste regime, a sua efetivação ficará condicionada à reunião dos pressupostos previstos pelos artigos 4.º, n.º 4, e 7.º, n.º 2, da Lei n.º 33/2010, de 2 de setembro, efeito para o que se requererá a elaboração pelos serviços da DGRSP do competente relatório, com obtenção dos legais consentimentos por escrito.

A transcrição que antecede quase dispensaria considerações complementares, tão coerentemente se mostra justificada a determinação da pena aplicada ao arguido.
Apenas duas ou três notas, em remate do que ali se disse, reforçando a necessidade, adequação, proporcionalidade, e justeza da condenação.
Como se sabe, na determinação da pena concreta, importa ter em conta, nos termos do Artº 71 do C. Penal, as necessidades de prevenção geral e especial que nos autos se imponham, bem como, as exigências de reprovação do crime, não olvidando que a pena tem de ser orientada em função da culpa concreta do agente e que deve ser proporcional a esta, em sentido pedagógico e ressocializador.
Como ensina Figueiredo Dias in Direito Penal, Parte Geral, Tomo 2, As consequências jurídicas do crime, 1988, pág. 279 e segs:
«As exigências de prevenção geral, ... constituirão o limiar mínimo da pena, abaixo do qual já não será possível ir, sob pena de se pôr em risco a função tutelar do Direito e as expectativas comunitárias na validade da norma violada;
As exigências de culpa do agente serão o limite inultrapassável de todas e quaisquer considerações preventivas, por respeito ao princípio politico-criminal da necessidade da pena (Artº 18 nº2 da CRP) e do principio constitucional da dignidade da pessoa humana (consagrado no nº1 do mesmo comando)
Por fim, as exigências de prevenção especial de socialização, sendo elas que irão determinar, em último termo e dentro dos limites referidos, a medida concreta da pena»
Importa ainda ter em conta que:
«A função primordial de uma pena, sem embargo dos aspectos decorrentes de uma prevenção especial positiva, consiste na prevenção dos comportamentos danosos incidentes sobre bens jurídicos penalmente protegidos.
O seu limite máximo fixar-se-á, em homenagem à salvaguarda da dignidade humana do condenado, em função da medida da culpa revelada, que assim a delimitará, por maiores que sejam as exigências de carácter preventivo que social e normativamente se imponham.
O seu limite mínimo é dado pelo quantum da pena que em concreto ainda realize eficazmente essa protecção dos bens jurídicos.
Dentro destes dois limites situar-se-á o espaço possível para resposta às necessidades da reintegração social do agente
Ainda, embora com pressuposto e limite na culpa do agente, o único entendimento consentâneo com as finalidades de aplicação da pena é a tutela de bens jurídicos e, (só) na medida do possível, a reinserção do agente na comunidade» (Cfr. Anabela Miranda Rodrigues, RPCC, Ano 12º, nº 2, pág. 182 e Ac. do STJ de 4-10-07, Proc. nº 2692/07 - 5ª).
Ora, confrontando o raciocínio expendido pela instância recorrida, constata-se que ali foram tidos em conta, na determinação da pena a aplicar, todos os critérios legais a que aludem os Artsº 70 e 71 do C. Penal, não podendo o arguido queixar-se de severidade por banda do tribunal a quo.
Com efeito, o recorrente parece esquecer-se do seu passado criminal, onde consta o cometimento de oito crimes de natureza rodoviária, sendo que cinco deles reportam-se à prática de ilícito de igual natureza ao dos presentes autos
Nessas condenações, foram sendo dadas ao arguido, de forma sistemática, suficientes oportunidades para que o mesmo arrepiasse caminho no cometimento de crimes, tendo-lhe sido aplicadas penas de multa, de prisão substituída por multa e pena de prisão suspensa na execução, o que demonstra, de forma clara, que as anteriores condenações não lhe serviram de suficiente advertência contra a prática de novos crimes, não sendo despiciendo notar que os factos dos autos foram cometidos cerca de um ano depois de expirado o período de suspensão da execução de uma pena de 1 ano de prisão em que foi condenado pelo cometimento de crime similar ao presente, sendo por isso evidente que os seus anteriores registos criminais não surtiram qualquer efeito preventivo.
Importa fazer uma nota para que se esclareça – o que não consta na decisão recorrida – que os antecedentes criminais do arguido podem ser valorados na medida em que, sobre qualquer uma das suas condenações, não passaram os cinco anos a que aludem as als. a) e b) do nº1 do Artº 11 da Lei nº37/2015, de 5 de Maio.
Com efeito, apesar de não se ter feito constar da sentença recorrida a data da extinção das penas por que o arguido foi condenado nos processos ali referenciados, e sendo esse um elemento essencial para apreciar e decidir do eventual cancelamento da inscrição de tais condenações no registo criminal nos termos do disposto no citado comando legal, a verdade é que compulsado o seu CRC, verifica-se que nunca, desde a sua primeira condenação, ocorrida em 2012, até a última, que teve lugar em 2020, passaram mais de cinco anos, considerado aqui o momento em que tais condenações foram julgadas extintas.
Na verdade, como se diz no Artº 11 nº1 als. a) e b) da referida Lei nº 37/2015, de 5 de Maio, as decisões inscritas no registo criminal cessam a sua vigência decorridos cinco anos – no caso das penas aplicadas ao arguido – sobre a extinção da pena e desde que, entretanto, não tenha ocorrido nova condenação por crime de qualquer natureza, o que, in casu, nunca sucedeu, pelo que todos os registos criminais do ora recorrente podem, e devem, ser valorados na determinação da medida da pena.
É, assim, manifesto que o arguido, de forma ostensiva e gritante, tem ignorado, dir-se-á, olimpicamente, os sucessivos avisos em que tais condenações se consubstanciavam, desprezando, de forma lamentável, as possibilidades de reintegração social que lhe foram sendo sistematicamente concedidas.
Na verdade, se nem após ter sido condenado em pena de prisão suspensa na sua execução o arguido se inibiu de cometer novo crime, compreende-se que o tribunal recorrido tenha entendido que a aplicação de uma pena de prisão nesses moldes, ou substituída por qualquer outra, como a prestação de trabalho a favor da comunidade, realizasse, de forma adequada e suficiente, as razões de prevenção geral e especial que se desenham na situação sub judice.
A bondade do peticionado pelo recorrente esbarra, assim, no seu próprio comportamento, ao persistir na prática de condutas criminosas, demonstrando um profundo desprezo pelos comandos legais.
Não se ignoram os efeitos criminógenos da prisão e, por isso mesmo, a decisão d tribunal recorrido favorece a integração familiar e social do ora recorrente, permitindo-lhe que continue a exercer a sua actividade laboral, para além de se prosseguir o intento de obter licença para a condução de veículos motorizados, assim se mitigando, de modo substancial, tais efeitos.
As razões de prevenção geral, neste tipo de ilícito, são por demais conhecidas e ao nível da prevenção geral, dispensam-se outros considerandos para além do que se expôs.
Em suma, na determinação da pena concreta em análise, o tribunal recorrido deu cumprimento ao disposto nos Artsº 40 e 71 nº2, ambos do Código Penal, não se mostrando a mesma desproporcionada face às circunstâncias do caso concreto, pelo que, inexistindo qualquer razão para proceder à sua alteração, o recurso terá de improceder.

3. DECISÃO

Nestes termos, decide-se negar provimento ao recurso e em consequência, manter, na íntegra, a sentença recorrida.
Custas a cargo do recorrente, fixando-se a taxa de justiça, atendendo ao trabalho e complexidade das questões suscitadas, em 3 UC, ao abrigo do disposto nos Arts 513 nº 1 e 514 nº 1, ambos do CPP e 8 do Regulamento das Custas Processuais e tabela III anexa.
xxx
Consigna-se, nos termos e para os efeitos do disposto no Artº 94 nº2 do CPP, que o presente acórdão foi elaborado pelo relator e integralmente revisto pelos signatários.
xxx
Évora, 24 de Janeiro de 2023
Renato Barroso (Relator)
Maria Fátima Bernardes (Adjunta)
Fernando Pina (Adjunto)