PROCEDIMENTO CONTRAORDENACIONAL
PRESCRIÇÃO
NULIDADES
ILEGALIDADES
VÍCIOS DA DECISÃO
CONCURSO DE INFRACÇÕES
COIMA
SANÇÃO ACESSÓRIA
INCONSTITUCIONALIDADE
DEVER DE PRESTAR INFORMAÇÕES
Sumário

I. A suspensão do prazo de prescrição a partir da prolação da sentença ora recorrida não pode constituir um caso de retroatividade (proibida), já que a causa de suspensão, tal como se encontra prevista no artigo 418.º, n.º 2, do CdVM, opera por via da verificação de um facto jurídico – a confirmação da decisão condenatória da autoridade administrativa – que, no caso em apreço, ocorreu após a entrada em vigor da lei.
II. O critério que preside à inclusão da informação no prospeto não é um critério de materialidade da informação relativamente às contas do emitente, mas antes um critério de relevância ou necessidade da informação para formar juízos fundados sobre a oferta (i.e., decisões de investir ou não por parte dos investidores, destinatários da mesma), que se não confunde com a materialidade da informação em causa.
III. Estando em causa a prática de infrações relacionadas com a tutela da qualidade da informação constante do prospeto (artigo 393.º, n.º 2, alínea d), do CdVM) e do dever de divulgação de adendas ao prospeto (artigo 393.º, n.º 2, alínea c), do CdVM), pilares essenciais do regular funcionamento do mercado de valores mobiliários e instrumentos financeiros, designadamente no quadro das ofertas públicas, as condutas que realizam os tipos contraordenacionais em apreço constituem condutas muito graves, atentatórias dos bens e interesses em jogo nesse mercado, onde se investem e transacionam as poupanças dos aforradores, devendo as sanções mostrar-se adequadas a tal gravidade.

Texto Integral

Acordam, em Conferência, os Juízes que compõem esta Secção da Propriedade Intelectual e da Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa:

I. Relatório

AA (adiante também designado AA), BB (adiante também designado BB), CC (adiante também designado CC) e   DD (adiante também designado DD) apresentaram recurso de Impugnação Judicial da decisão proferida pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (adiante CMVM), que os havia condenado nos seguintes termos:

O Recorrente AA:

a) Quanto à violação do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto:
- numa coima de € 150.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto, previsto no artigo 135°, nº 1, do Código dos Valores Mobiliários (CdVM) (quanto ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do prospeto), o que constitui, nos termos do artigo 389.°, n.° 2, alínea d), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, punível com coima de € 25.000,00 a € 5.000.000,00, nos termos do artigo 388º, n.° 1, alínea a), do CdVM;
- numa coima de € 400.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de prestação de informação com qualidade, previsto no artigo 135°, nº 1, do CdVM (quanto à situação financeira e patrimonial do BESA detectada em finais de 2013 que esteve na origem da emissão pela República Popular de Angola, em 31.12.2013, da garantia soberana a favor do BESA), o que constitui, nos termos do artigo 393°, n.° 2, alínea d), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de € 25.000,00 a € 5.000.000,00, nos termos do artigo 388º, nº 1, alínea a), do CdVM.
b) Quanto à violação do dever de requerer adenda ao prospeto:
- numa coima de €150.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de requerer adenda ao prospeto, previsto no artigo 142º, nº 1, do CdVM (quanto ao aumento da exposição directa do BES às sociedades do Grupo ESFG, por força dos financiamentos concedidos pelo BES àquelas em 30.05.2014), o que constitui, nos termos do artigo 393º, nº 2, alínea c), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, punível coima de € 25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388º, nº 1, alínea a), do CdVM;
-  numa coima de €150.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de requerer adenda ao prospeto, previsto no artigo 142º, nº 1, do CdVM (quanto ao aumento da exposição directa do BES às sociedades do Grupo Rio Forte, por força do financiamento concedido pelo BES à Rio Forte em 12.06.2014), o que constitui, nos termos do artigo 393º, nº 2, alínea c), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, punível coima de € 25.000,00 a € 5.000.000,00, nos termos do artigo 388º, nº 1, alínea a), do CdVM;
c) Por referência às anteriores coimas singulares, numa coima única no montante de €600.000,00.
d) Na sanção acessória de inibição do exercício de funções de administração, direcção, chefia ou fiscalização e, em geral, de representação de quaisquer intermediários financeiros no âmbito de todas as actividades de intermediação em valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros (art. 404.°, n.° 1, al. c), do CdVM), pelo período de 4 anos.

 O Recorrente BB:

a) Quanto à violação do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto:
- numa coima de € 150.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto, previsto no artigo 135°, nº 1, do CdVM (quanto ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do prospeto), o que constitui, nos termos do artigo 389º, n.° 2, alínea d), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, punível com coima de € 25.000,00 a € 5.000.000,00, nos termos do artigo 388º, n.° 1, alínea a), do CdVM;

b) Quanto à violação do dever de requerer adenda ao prospeto:
- numa coima de € 150.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de requerer adenda ao prospeto, previsto no artigo 142º, nº 1, do CdVM (quanto ao aumento da exposição directa do BES às sociedades do Grupo ESFG, por força dos financiamentos concedidos pelo BES àquelas em 30.05.2014), o que constitui, nos termos do artigo 393º, nº 2, alínea c), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, punível coima de € 25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388º, nº 1, alínea a), do CdVM;
-  numa coima de € 150.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de requerer adenda ao prospeto, previsto no artigo 142º, nº 1, do CdVM (quanto ao aumento da exposição directa do BES às sociedades do Grupo Rio Forte, por força do financiamento concedido pelo BES à Rio Forte em 12.06.2014), o que constitui, nos termos do artigo 393º, nº 2, alínea c), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, punível coima de € 25.000,00 a € 5.000.000,00, nos termos do artigo 388º, nº 1, alínea a), do CdVM;
c) Por referência às anteriores coimas singulares, numa coima única no montante de €300.000,00.

d) Na sanção acessória de inibição do exercício de funções de administração, direcção, chefia ou fiscalização e, em geral, de representação de quaisquer intermediários financeiros no âmbito de todas as actividades de intermediação em valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros (art. 404.°, n.° 1, al. c), do CdVM), pelo período de 1 ano.

O Recorrente CC:

a) Quanto à violação do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto:
- numa coima de € 200.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto, previsto no artigo 135°, nº 1, do CdVM (quanto ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do prospeto), o que constitui, nos termos do artigo 389.°, n.° 2, alínea d), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, punível com coima de € 25.000,00 a € 5.000.000,00, nos termos do artigo 388º, n.° 1, alínea a), do CdVM;
- numa coima de € 500.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de prestação de informação com qualidade, previsto no artigo 135°, nº 1, do CdVM (quanto à situação financeira e patrimonial do BESA detectada em finais de 2013 que esteve na origem da emissão pela República Popular de Angola, em 31.12.2013, da garantia soberana a favor do BESA), o que constitui, nos termos do artigo 393°, n.° 2, alínea d), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de € 25.000,00 a € 5.000.000,00, nos termos do artigo 388º, nº 1, alínea a), do CdVM.

b) Quanto à violação do dever de requerer adenda ao prospeto:
- numa coima de € 200.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de requerer adenda ao prospeto, previsto no artigo 142º, nº 1, do CdVM (quanto ao aumento da exposição directa do BES às sociedades do Grupo ESFG, por força dos financiamentos concedidos pelo BES àquelas em 30.05.2014), o que constitui, nos termos do artigo 393º, nº 2, alínea c), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, punível coima de € 25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388º, nº 1, alínea a), do CdVM;
-  numa coima de € 200.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de requerer adenda ao prospeto, previsto no artigo 142º, nº 1, do CdVM (quanto à emissão, pelo BES, em 9.06.2014, de duas cartas de conforto a favor das sociedades do grupo PDVSA), o que constitui, nos termos do artigo 393º, nº 2, alínea c), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, punível coima de € 25.000,00 a € 5.000.000,00, nos termos do artigo 388º, nº 1, alínea a), do CdVM;
-  numa coima de € 200.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de requerer adenda ao prospeto, previsto no artigo 142º, nº 1, do CdVM (quanto ao aumento da exposição directa do BES às sociedades do Grupo Rio Forte, por força do financiamento concedido pelo BES à Rio Forte em 12.06.2014), o que constitui, nos termos do artigo 393º, nº 2, alínea c), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, punível coima de € 25.000,00 a € 5.000.000,00, nos termos do artigo 388º, nº 1, alínea a), do CdVM;

c) Por referência às anteriores coimas singulares, numa coima única no montante de €1.000.000,00.

d) Na sanção acessória de inibição do exercício de funções de administração, direcção, chefia ou fiscalização e, em geral, de representação de quaisquer intermediários financeiros no âmbito de todas as actividades de intermediação em valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros (art. 404.°, n.° 1, al. c), do CdVM), pelo período de 5 anos.

O Recorrente DD:

a) Quanto à violação do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto:
- numa coima de € 400.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto, previsto no artigo 135°, nº 1, do CdVM (quanto à situação financeira e patrimonial do BESA detectada em finais de 2013 que esteve na origem da emissão pela Répública Popular de Angola, em 31.12.2013, da garantia soberana a favor do BESA), o que constitui, nos termos do artigo 393º, n.° 2, alínea d), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, punível com coima de € 25.000,00 a € 5.000.000,00, nos termos do artigo 388º, n.° 1, alínea a), do CdVM;

b) Quanto à violação do dever de requerer adenda ao prospeto:
- numa coima de € 150.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de requerer adenda ao prospeto, previsto no artigo 142º, nº 1, do CdVM (quanto ao aumento da exposição directa do BES às sociedades do Grupo ESFG, por força dos financiamentos concedidos pelo BES àquelas em 30.05.2014), o que constitui, nos termos do artigo 393º, nº 2, alínea c), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, punível coima de € 25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388º, nº 1, alínea a), do CdVM;
-  numa coima de € 150.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de requerer adenda ao prospeto, previsto no artigo 142º, nº 1, do CdVM (quanto ao aumento da exposição directa do BES às sociedades do Grupo Rio Forte, por força do financiamento concedido pelo BES à Rio Forte em 12.06.2014), o que constitui, nos termos do artigo 393º, nº 2, alínea c), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, punível coima de € 25.000,00 a € 5.000.000,00, nos termos do artigo 388º, nº 1, alínea a), do CdVM;

c) Por referência às anteriores coimas singulares, numa coima única no montante de €400.000,00.

d) Na sanção acessória de inibição do exercício de funções de administração, direcção, chefia ou fiscalização e, em geral, de representação de quaisquer intermediários financeiros no âmbito de todas as actividades de intermediação em valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros (art. 404.°, n.° 1, al. c), do CdVM), pelo período de 2 anos.
*
Por sentença proferida a 10.10.2022, foi a referida Impugnação Judicial julgada, quanto aos aqui recorrentes, nos seguintes termos:

I. ABSOLVER os Recorrentes AA, BB, […], CC e DD da violação do dever de requerer adenda ao Prospeto da violação, a título doloso, previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CdVM (quanto ao aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte, por força do financiamento concedido pelo BES à Rio Forte em 12.06.2014).

II. CONDENAR o Recorrente AA
a) Quanto à violação do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto:
i) Na coima de € 150.000,00 (cento e cinquenta mil euros), pela violação, a título doloso, do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM (quanto ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do prospeto), consubstanciando, nos termos do artigo 393.º, n.º 2, alínea d), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
ii) Na coima de € 400.000,00 (quatrocentos mil euros), pela violação, a título doloso, do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM (quanto à situação financeira e patrimonial do BESA detetada em finais de 2013 que esteve origem na emissão pela República de Angola, em 31.12.2013, da garantia soberana a favor do BESA), consubstanciando, nos termos do artigo 393.º, n.º 2, alínea d), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
b) Quanto à violação do dever de requerer adenda ao prospeto:
i) Na coima de € 150.000,00 (cento e cinquenta mil euros), pela violação, a título doloso, do dever de requerer adenda ao prospeto, previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CdVM (quanto ao aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG, por força dos financiamentos concedidos pelo BES àquelas em 30.05.2014), consubstanciando, nos termos do artigo 393.º, n.º 2, alínea c), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM.

Em cúmulo jurídico, nos termos constantes no artigo 19.º, números 2 e 3 do RGCO, condenar o Recorrente AA na coima única de 500.000 (quinhentos mil euros), suspensa em 20 por cento da sua execução pelo período de 2 anos (artigo 415.º, números 1 e 3 do CdVM).

Aplicar ao Recorrente AA, cumulativamente com o que antecede, a sanção acessória de inibição do exercício de funções de administração, gestão, direção, chefia ou fiscalização e, em geral, de representação em emitentes de valores mobiliários sujeitos à supervisão da CMVM e intermediários financeiros (artigo 404.º, n.º 1, alínea c), do CdVM), pelo período de 3 (três) anos.

III. CONDENAR o Recorrente BB
a) Quanto à violação do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto
i) Na coima de € 150.000,00 (cento e cinquenta mil euros), pela violação, a título doloso, do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM (quanto ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do prospeto), consubstanciando, nos termos do artigo 393.º, n.º 2, alínea d), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
b) Quanto à violação do dever de requerer adenda ao prospeto
ii) Na coima de € 150.000,00 (cento e cinquenta mil euros), pela violação, a título doloso, do dever de requerer adenda ao prospeto, previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CdVM (quanto ao aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG, por força dos financiamentos concedidos pelo BES àquelas em 30.05.2014), consubstanciando, nos termos do artigo 393.º, n.º 2, alínea c), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM.

Em cúmulo jurídico, nos termos constantes no artigo 19.º, números 2 e 3 do RGCO, condenar o Recorrente BB na coima única de 250.000 (duzentos e cinquenta mil euros), suspensa em 20 por cento da sua execução, pelo período de 2 anos (artigo 415.º, números 1 e 3 do CdVM).

VI. CONDENAR o Recorrente CC:
a) Quanto à violação do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto:
i) Numa coima de € 200.000,00 (duzentos mil euros), pela violação, a título doloso, do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM (quanto ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do prospeto), consubstanciando, nos termos do artigo 393.º, n.º 2, alínea d), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, punível nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
ii) Numa coima de € 500.000,00 (quinhentos mil euros), pela violação, a título doloso, do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM (quanto à situação financeira e patrimonial do BESA detetada em finais de 2013 que esteve origem na emissão pela República de Angola, em 31.12.2013, da garantia soberana a favor do BESA), consubstanciando, nos termos do artigo 393.º, n.º 2, alínea d), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, punível nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
b) Quanto à violação do dever de requerer adenda ao prospeto:
i) uma coima de € 200.000,00 (duzentos mil euros), pela violação, a título doloso, do dever de requerer adenda ao prospeto, previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CdVM (quanto ao aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG, por força dos financiamentos concedidos pelo BES àquelas em 30.05.2014), consubstanciando, nos termos do artigo 393.º, n.º 2, alínea c), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, punível nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
ii) uma coima de € 400.000,00 (quatrocentos mil euros), pela violação, a título doloso, do dever de requerer adenda ao prospeto, previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CdVM (quanto à emissão, pelo BES, em 09.06.2014, de duas cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA), o que constitui, nos termos do artigo 393.º, n.º 2, alínea c), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, punível com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM.

Em cúmulo jurídico, nos termos constantes no artigo 19.º, números 2 e 3 do RGCO, condenar o Recorrente CC na coima única de € 950.000 (novecentos e cinquenta mil euros), sem suspensão, parcial ou total, da execução da sanção.

Aplicar ao Recorrente CC, cumulativamente com o que antecede, a sanção acessória de inibição do exercício de funções de administração, gestão, direção, chefia ou fiscalização e, em geral, de representação em emitentes de valores mobiliários sujeitos à supervisão da CMVM e intermediários financeiros (artigo 404.º, n.º 1, alínea c), do CdVM), pelo período de 4 (quatro) anos.

VI. CONDENAR o Recorrente DD, na coima de € 400.000,00 (quatrocentos mil euros), pela violação, a título doloso, do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM (quanto à situação financeira e patrimonial do BESA detetada em finais de 2013 que esteve origem na emissão pela República de Angola, em 31.12.2013, da garantia soberana a favor do BESA), consubstanciando, nos termos do artigo 393.º, n.º 2, alínea d), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, punível, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM.
Determinar a suspensão em 20 por cento da execução daquela coima, pelo
período de 2 anos (artigo 415.º, números 1 e 3 do CdVM)
Aplicar ao Recorrente DD, cumulativamente com o que antecede, a sanção acessória de inibição do exercício de funções de administração, gestão, direção, chefia ou fiscalização e, em geral, de representação em emitentes de valores mobiliários sujeitos à supervisão da CMVM e intermediários financeiros (artigo 404.º, n.º 1, alínea c), do CdVM), pelo período de 2 (dois) anos.
*

Inconformados com tal decisão, vieram os arguidos AA (adiante também designado ‘AA’), BB (adiante também designado ‘BB), CC (adiante também dsignado ‘CC’) e DD (adiante também designado ‘DD’) e da mesma interpôr recurso para este Tribunal da Relação, seguindo-se as respectivas conclusões:

CONCLUSÕES [AA]

RESUMO DA DECISÃO RECORRIDA

1ª. O Tribunal a quo decidiu (vd. págs. 852-3 da Sentença recorrida):

III. ABSOLVER os Recorrentes AA, BB, EE, CC e DD da violação do dever de requerer adenda ao Prospeto da violação, a título doloso, previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CdVM (quanto ao aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte, por força do financiamento concedido pelo BES à Rio Forte em 12.06.2014).

IV. CONDENAR o Recorrente AA

a) Quanto à violação do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto:

iii) Na coima de € 150.000,00 (cento e cinquenta mil euros), pela violação, a título doloso, do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM (quanto ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do prospeto), consubstanciando, nos termos do artigo 393.º, n.º 2, alínea d), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;

iv) Na coima de € 400.000,00 (quatrocentos mil euros), pela violação, a título doloso, do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM (quanto à situação financeira e patrimonial do BESA detetada em finais de 2013 que esteve origem na emissão pela República de Angola, em 31.12.2013, da garantia soberana a favor do BESA), consubstanciando, nos termos do artigo 393.º, n.º 2, alínea d), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;

b) Quanto à violação do dever de requerer adenda ao prospeto:

ii) Na coima de € 150.000,00 (cento e cinquenta mil euros), pela violação, a título doloso, do dever de requerer adenda ao prospeto, previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CdVM (quanto ao aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG, por força dos financiamentos concedidos pelo BES àquelas em 30.05.2014), consubstanciando, nos termos do artigo 393.º, n.º 2, alínea c), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM.

Em cúmulo jurídico, nos termos constantes no artigo 19.º, números 2 e 3 do RGCO, condenar o Recorrente AA na coima única de 500.000 (quinhentos mil euros), suspensa em 20 por cento da sua execução, pelo período de 2 anos (artigo 415.º, números 1 e 3 do CdVM).

Aplicar ao Recorrente AA, cumulativamente com o que antecede, a sanção acessória de inibição do exercício de funções de administração, gestão, direção, chefia ou fiscalização e, em geral, de representação em emitentes de valores mobiliários sujeitos à supervisão da CMVM e intermediários financeiros (artigo 404.º, n.º 1, alínea c), do CdVM), pelo período de 3 (três) anos.

PRESCRIÇÃO DO PROCEDIMENTO CONTRAORDENACIONAL

2ª. O Prospeto foi aprovadopela CMVM e publicado no dia 20/05/2014, tendo a Oferta decorrido entre os dias 27/05/2014 e 09/06/2014 (cfr. Factos Provados 75 a 80).

3ª. A admissão à negociação das ações novas teve lugar em 17/06/2014 (cfr. Factos Provados 75 a 80).

4ª. Portanto, a alegada prática dos factos imputados ao arguido AA (alegadas omissões informativas no Prospeto da Oferta) ocorreu, no limite, até ao dia 17/06/2014.

5ª. O art. 418º, nº 1, do CdVM, dispunha que o procedimento pelas contra-ordenações prescreve no prazo de cinco anos.

6ª. A Lei 28/2017, de 30 de maio, que entrou em vigor no dia 30/06/2017, alterou esta norma do CdVM, passando a mesma a prever que o procedimento contraordenacional prescreve:

c) No prazo de oito anos, nas contraordenações muito graves; e d)No prazo de cinco anos, nas contraordenações graves e menos graves.

7ª. O alargamento de um prazo prescricional não é aplicável a contraordenações (alegadamente) praticadas antes da data da entrada em vigor da nova lei, segundo o princípio da irretroatividade da lei restritiva de direitos fundamentais, aliás com consagração expressa no art. 3º nº 2 do RGCORD.

8ª. AA foi (paragrandesurpresa sua)notificado da acusação da CMVM no dia 22/01/2020 (vd. fls. 3987-8 dos autos), não tendo ocorrido entretanto qualquer causa de suspensão ou de interrupção da prescrição.

9ª. Pelo que, em relação ao arguido AA, o presente procedimento contraordenacional prescreveu no dia 17/06/2019.

10ª. E ainda que se considerem aplicáveis as “suspensões covidianas”:
artigo 7.º, n.os 1 e 3, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, na redação dada pelo artigo 2.º da Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril, com produção de efeitos a 09.03.2020, nos termos do artigo 6.º, n.º 2, da Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril; artigos 8.º e 10.º da Lei n.º 16/2020, de 29 de maio: entre 09.03.2020 e 02.06.2020 (ou seja, durante 86 dias)

artigos 2.º e 4.º da Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro (que aditou o artigo 6.º-C à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março), e nos artigos 6.º e 7.º da Lei n.º 13-B/2021, de 5 de abril, verificou-se a suspensão, ocasionada pela pandemia por COVID-19: entre 22.01.2021 e 05.04.2021 (ou seja, durante 74 dias)

11ª. O presente procedimento contraordenacional prescreveu no dia 17/06/2019, portanto antes destas suspensões supervenientes.

12ª. Não tendo razão a douta Sentença recorrida quando alega, na esteira da CMVM, que ocorreram causas de interrupção dos referidos prazos de prescrição nos termos da alínea b) do nº 1 do art. 28º do RGCORD, por terem sidorealizadasdiligênciasde prova interruptivas do prazo prescricional, consistindo essas diligências de prova em 8 inquirições de testemunhas.

13ª. Nas concretas circunstâncias do caso sub judice, tais diligências probatórias não tiveran efeito interruptivo da prescrição.

14ª. O que se conclui à luz dos princípios que regem o instituto da prescrição e da razão de ser do mesmo, por um lado, e da razão de ser da existência de causas de interrupção da prescrição, por outro.

15ª. Note-se que todo o prazo prescricional decorreu e esgotou-se sem que o arguido tivesse sequer tomado conhecimento de que contra ele estava pendente o presente processo contraordenacional.

16ª. Ou seja, durante o decurso de todo o prazo prescricional o Estado não teve, perante o arguido, uma única manifestação de querer exercer o seu ius puniendi.

17ª. Todo oprazoprescricional decorreu – sem que o arguido tivesse sido notificado do que quer que fosse ou tivesse sequer tomado conhecimento da pendência do processo – sem que o processo tivesse sequer saído da sua fase mais embrionária, ou seja, da fase administrativa pré-acusação e portanto sem qualquer contraditório.

18ª. O prazo de prescrição dos processos contraordenacionais é estabelecido tendo em consideração que o processo contraordenacional pode ter duas fases: uma fase administrativa, constituída, a maior parte das vezes por duas sub-fases, sendo uma primeira (pré-acusação) levada a cabo, a maioria das vezes, exclusivamente pela autoridade administrativa sem contraditório e uma segunda (pós-acusação) já com intervenção dos arguidos, onde estes exercem o contraditório; e ainda uma outra fase, judicial, já que há que ter em conta a possibilidade de apresentação de impugnação judicial da decisão administrativa para o Tribunal de 1.ª instância e que, em muitos casos, é ainda possível a interposição de recurso dessa sentença, provocando-se a intervenção do Tribunal da Relação.

19ª. Ora, no caso sub judice, a autoridade administrativa esgotou todo o prazo prescricional na 1ª fase da fase administrativa (pré-acusação), ainda sem contraditório.

20ª. Pelo que ora se peticiona ao Venerando Tribunal da Relação de Lisboa que, apreciando a presente questão prévia, declare o presente procedimento contraordenacional prescrito, prescrição essa que ocorreu já em 17/06/2019, por ter decorrido todo o prazo prescricional sem que tenha ocorrido qualquer causa interruptiva ou suspensiva da prescrição.

21ª. Sendo que uma interpretação do art. 28º nº 1 al. b) do RGCORD segundo a qual a referida norma seja aplicável mesmo naqueles casos em que tenha havido inércia por parte da autoridade administrativa que conduziu o procedimento contraordenacional, sendo a realização tardia e sem conhecimento do arguido das diligências probatórias em causa apenas imputável à própria autoridade administrativa, é inconstitucional por violar o Princípio de Estado de Direito Democrático constitucionalmente consagrado no art. 2º da CRP, nas suas vertentes do Princípio da segurança jurídica e da proteção da confiança, junto daqueles a quem a prescrição beneficia, os cidadãos-arguidos, e por violar os direitos, liberdades e garantias assegurados aos arguidos e constitucionalmente consagrados no art. 32º nºs 1 e 10 da CRP.

LIMITES DOS PODERES DE COGNIÇÃO DO TRIBUNAL AD QUEM

22ª. Nos termos do artigo 75º do Regime Geral das Contraordenações(“RGCO”), por regra, a 2ª Instância apenas conhece de matéria de Direito.

23ª. Nos termos porém do artigo 410º, nº2, do Código do Processo Penal (CPP), aplicável ex vi art. 41º do RGCO e este ex vi art. 232º do RGICSF – e ainda por analogia e identidade de razão com o art. 434º do CPP –, mesmo nos casos em que a lei restrinja a cognição do Tribunal de recurso a matéria de Direito, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum:
a) A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada;
b) A contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão;
c) Erro notório na apreciação da prova.

24ª. A douta Sentença recorrida, além de errada em termos de Direito (uns de Direito Probatório e outros de Direito Substantivo), padece dos indicados vícios de julgamento, que resultam do seu próprio texto, umas vezes por si sós e outras quando conjugados com as regras da experiência comum, impondo-se a absolvição do Recorrente de todas as condenações, ou, quando muito, a anulação da Sentença e a devolução do processo ao Tribunal a quo.

1ª CONTRAORDENAÇÃO EM QUE FOI CONDENADO O RECORRENTE AA
(pretensa falta de informação no Prospeto sobre o montante total
dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data de aprovação do prospeto)

25ª. A douta Sentença recorrida confirmou a decisão da CMVM de condenar alguns dos arguídos (entre os quais o ora recorrente) na alegada prática de uma contraordenação pelo facto de o Prospeto indicar, na 2ª tabela constante da sua página 302, um volume total da exposição do BES à ESFG e suas subsidiárias no montante de 290 milhões de euros, quando, à data do Prospeto (20/05/2014) o volume era de 533 milhões de euros.

26ª. A Sentença recorrida lavra nos seguintes erros manifestos:
- Erro (de Direito) considerar que a informação sobre a exposição a Entidades Terceiras Ligadas tinha que ser dada com o valor à data do prospeto (20/05/2014);
- Erro (de julgamento dos factos) de considerar provado que o aumento da exposição relevante é apenas relativo à ESFG e suas subsidiárias (e não em relação a todas as entidades relacionadas);
- Erro (de julgamento dos factos) de considerar provado que os destinatário da Oferta não detinham informação sobre o aumento da exposição à ESFG e subsidiárias, de 290 milhões de euros a 31/12/2013 para cerca de 400 milhões de euros a 31/03/2014;
- Erro (de julgamento dos factos) de considerar que o aumento da exposição do BES à ESFG e subsidiárias (entre 31/12/2013 e 20/05/2014) representava uma alteração significativa na posição financeira ou comercial do grupo BES;
- Erro (de julgamento dos factos) de considerar provado que a informação em causa era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma.

27ª. Sobre o primeiro erro, o Cap. 12.2 do Prospeto (sob o título Operações com entidades terceiras especialmente relacionadas) informa sobre o montante global dos ativos e passivos do Grupo BES que se referem a operações realizadas com entidades subsidiárias, associadas e relacionadas do Grupo ESFG (holding do Banco), apresentando para o efeito tabelas com informação comparativa reportada a 31/12/2011, 31/12/2012 e 31/12/2013 (vd. facto provado 89).

28ª. Esta informação foi prestada no Prospeto exatamente nos termos previstos no n.º 19 do Anexo I do Regulamento (CE) n.º 809/2004, da Comissão, de 29 de abril, com a epígrafe: OPERAÇÕES COM ENTIDADES TERCEIRAS LIGADAS, que estipulava que deviam constar do Prospeto:
Se pertinente, as informações sobre as operações com entidades terceiras ligadas [que para os presentes efeitos são definidas em conformidade com as normas adoptadas nos termos do Regulamento (CE) n. o 1606/2002], realizadas pelo emitente durante o período coberto pelo historial financeiro, até à data do prospecto, devem ser fornecidas em conformidade com a norma correspondente adoptada nos termos do Regulamento (CE) n.o 1606/2002, se aplicável.

29ª. Pois foi isto mesmo que se fez: o Prospeto informou sobre (vd. facto provado 89).:
- as operações com entidades terceiras ligadas,
- realizadas pelo emitente durante o período coberto pelo historial financeiro, até à data do prospecto - ou seja pelo período coberto pelos documentos de prestação de contas do BES mais recentes em relação à data do Prospeto – que eram as relativas ao exercício findo em 31/12/2013.

30ª. A contraordenação aqui em causa é a prevista no artigo 393.º, n.º 2, alínea d), do CdVM, segundo o qual constitui contraordenação muito grave a violação do dever de inclusão de informação no prospeto que seja completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita segundo os modelos previstos no Regulamento (CE) n.º 809/2004, da Comissão, de 29 de abril.

31ª. Pelo que só pode existir contraordenação relativa à informação de um Prospeto se não forem observados os modelos previstos no Regulamento (CE) n.º 809/2004, da Comissão, de 29 de abril.

32ª. Dito de outro modo: para efeitos contraordenacionais, não basta simplesmente, como parece ser a posição da douta Sentença recorrida, que a informação contida no Prospeto não seja completa, ou verdadeira, ou atual, ou clara, ou objetiva ou lícita.

33ª. Era necessário averiguar se foi ou não respeitado o Regulamento (CE) n.º 809/2004, que determinava o tipo de informação que devia constar de cada Prospeto de cada tipo de oferta pública e especificava os conceitos genéricos previstos no CdVM, nomeadamente sobre a atualidade da informação a ser prestada.

34ª. Ora, o n.º 19 do Anexo I do Regulamento (CE) n.º 809/2004, da Comissão, de 29 de abril, com a epígrafe: OPERAÇÕES COM ENTIDADES TERCEIRAS LIGADAS, que estipulava que o Prospeto devia conter:

Se pertinente, as informações sobre as operações com entidades terceiras ligadas [que para os presentes efeitos são definidas em conformidade com as normas adoptadas nos termos do Regulamento (CE) n. o 1606/2002], realizadas pelo emitente durante o período coberto pelo historial financeiro, até à data do prospecto, devem ser fornecidas em conformidade com a norma correspondente adoptada nos termos do Regulamento (CE) n.o 1606/2002, se aplicável.

35ª. Desta norma resulta que as informações sobre as operações com entidades terceiras ligadas que deviam constar do Prospeto eram as que constassem dos documentos de prestação de contas do emitente mais recentes em relação à data do Prospeto (o que, neste caso do aumento de capital do BES de maio de 2014, eram os seus documentos de prestação de contas relativos ao exercício findo em 31/12/2013).

36ª. Depois, o n.º 20.8 do Anexo I do Regulamento (CE) n.º 809/2004, previa que o Prospeto devia informar sobre as eventuais alterações significativas na posição financeira ou comercial do grupo registadas desde o final do último período financeiro em relação ao qual tenham sido publicadas informações financeiras auditadas ou informações financeiras intercalares, ou uma declaração negativa adequada.

37ª. Este n.º 20.8 do Anexo I do Regulamento (CE) n.º 809/2004) insere-se num capítulo que começa assim:

20. INFORMAÇÕES FINANCEIRAS ACERCA DO ACTIVO E DO PASSIVO, DA SITUAÇÃO FINANCEIRA E DOS LUCROS E PREJUÍZOS DO EMITENTE

20.1. Historial financeiro
Fornecer as informações financeiras históricas auditadas relativas aos 3 últimos exercícios (ou a um período mais curto correspondente ao período de actividade do emitente) e os relatórios de auditoria de cada exercício.
Se o emitente tiver alterado a sua data de referência contabilística durante o período em relação ao qual são requeridas as informações financeiras históricas, as informações históricas auditadas devem abranger o mais curto dos seguintes períodos: 36 meses pelo menos,ou toda a duração da actividade do emitente.
Tais informações financeiras devem ter sido elaboradas em conformidade com o Regulamento (CE) n.o 1606/2002 ou, se o mesmo não for aplicável, com as normas nacionais de contabilidade de um Estado- -Membro, no caso de um emitente da Comunidade. Relativamente aos emitentes de países terceiros, estas informações financeiras devem ter sido elaboradas em conformidade com as normas internacionais de contabilidade adoptadas nos termos do procedimento do artigo 3.o do Regulamento (CE) n.o 1606/2002 ou com as normas nacionais de contabilidade de um país terceiro equivalentes a estas normas. No caso de estas informações financeiras não serem equivalentes a estas normas, devem ser apresentadas sob forma de uma reformulação das informações financeiras.

38ª. Ou seja, no que respeita a informações financeiras acerca do activo e do passivo, da situação financeira e dos lucros e prejuízos do emitente, devia o Prospeto utilizar a informação constante dos seus documentos de prestação de contas relativas aos 3 últimos exercícios.

39ª. E devia o Prospeto atualizar essa informação apenas se, e na medida em que, tivessem alterações significativas na posição financeira ou comercial do grupo registadas desde o final do último período financeiro em relação ao qual tenham sido publicadas informações financeiras auditadas ou informações financeiras intercalares, ou uma declaração negativa adequada (n.º 20.8 do Anexo I do Regulamento (CE) n.º 809/2004).

40ª. Portanto, um aumento de exposição a Entidade Terceira Ligada, desde a data de referência dos últimos documentos de prestação de contas (in casu, 31/12/2013) até à data do Prospeto (in casu, 20/05/2014) só teria que constar do Prospeto, se e na medida em que fosse de tal maneira relevante que representasse uma alteração significativa na posição financeira ou comercial do grupo [in casu, BES] relativamente àquela que consta do útimo documento de prestação de contas do emitente [grupo [in casu, BES]].

41ª. A informação sobre Entidades Terceiras Ligadas faz parte da informação contabilística que deve constar dos relatórios e contas das sociedades, nos termos das normas internacionais de contabilidade (mais concretamente a IAS 24, como reconhece a douta Sentença recorrida na pág. 723).

42ª. Devendo os Prospetos usar a última informação contabílistica existente e não tendo que a atualizar à data do próprio Prospeto, sob pena de a entidade emitente ter que encerrar a atividade (“fechar para balanço” como antigamente se dizia) para elaborar documentos de prestação de contas reportados à data do próprio Prospeto – o que ainda assim seria uma tarefa impossível, pois a entidade parada sofreria depreciaçõese prejuízos queem permanência desatualizariam as contas em elaboração...

43ª. Aliás, existe sempre desatualização entre a data em que os documentos de prestação de contas são encerrados e a data a que os mesmos se reportam!

44ª. Depois de encerrado exercício (normalmente coincidente com o ano civil, ou seja, a 31 de dezembro) é que são elaborados os documentos de prestação de contas desse mesmo exercício.

45ª. O que, no caso de sociedades de grande complexidade (como era o caso de um banco como o BES), pode demorar 2 a 3 meses a concluir.

46ª. E, como também parece óbvio, as sociedades não ficam encerradas e congeladas desde 1 de janeiro até que consigam fechar os documentos de prestação de contas.

47ª. Por isso, nunca em lado algum se exigiu que a informação financeira constante de um Prospeto fosse reportada à data do próprio Prospeto – isso seria absurdo e impossível de realizar.

48ª. Quanto ao apontado segundo erro, a mencionada tabela do Prospeto informa sobre o montante global dos ativos e passivos do Grupo BES que se referem a operações realizadas com entidades subsidiárias, associadas e relacionadas do Grupo ESFG (holding do Banco) (vd. facto provado 89).

49ª. Esta tabela contém o valor das rubricas dos ativos e das garantias (ou seja, dos montantes em dívida ou potencialmente em dívida ao BES)às Entidades Terceiras Ligadas - como manda o n.º 19 do Anexo I do Regulamento (CE) n.º 809/2004, da Comissão, de 29 de abril).

50ª. Porém, a douta Sentença recorrida (tal como antes a CMVM), em vez de considerar a exposição do BES às Entidades Terceiras Ligadas (como manda o n.º 19 do Anexo I do Regulamento (CE) n.º 809/2004), restringe (ilegal e injustificadamente) a sua análise à ESFG e suas subsidiárias, considerando que estas são a ES Financial Group, a ESF Portugal, a Espírito Santo Financiére, S.A., o Banque Privée Espírito Santo e o ES Bank Panama.

51ª. Ou seja, a douta Sentença recorrida seguiu a decisão da CMVM no sentido de omitir 13 das 18 Entidades Terceiras Ligadas ao BES que (em obediência ao disposto no n.º 19 do Anexo I do Regulamento (CE) n.º 809/2004), constam do Prospeto.

52ª. Na verdade, e como consta da pág. 328 da decisão da CMVM:

Considerando a exposição das entidades ES Financial Group (27,2), ESF Portugal (37,6), Espírito Santo Financiére, S.A. (29,0), Banque Privée Espírito Santo (15,6) e ES Bank Panama (183,0), conclui-se que a exposição do BES à ESFG e subsidiárias em 31.12.2013 era de cerca de 290 milhões de euros (exatamente, de 292,4 milhões de euros).

53ª. E foi este mesmo valor (290 milhões de euros) o considerado na douta Sentença recorrida.

54ª. Mas foi assim subvertida a análise comparativa dos valores da exposição do BES às Entidades Terceiras Ligadas, entre 31/12/2013 (data a que se reporta a informação contida no Prospeto) e 20/05/2014 (data da publicação do Prospeto).

55ª. Pois que o que está em causa é o aumento do valor da exposição do BES às Entidades Terceiras Ligadas (entidades subsidiárias, associadas e relacionadas do grupo ESFG (holding do Banco), como menciona o texto junto à tabela) e não a qualquer uma delas em particular.

56ª. Da mencionada tabela resulta que a exposição do grupo BES a entidades subsidiárias, associadas e relacionadas do grupo ESFG (holding do Banco), era, a 31/12/2013, de € 873,3 milhões (€ 776 milhões em ativos e € 97,3 milhões em garantias) (vd. facto provado 89).

57ª. A douta Sentença recorrida considerou provado que, à data do Prospeto (20/05/2014) , a exposição à ESFG e subsidiárias, se cifrava em cerca de 533 milhões de euros, informando o Prospeto que essa exposição, a 31/12/2013, era de 292,4 milhões de euros.

58ª. Tendo considerado provado que (pág. 720):
[…]
ocorreu um aumento de mais de 83,79 % da exposição do BES à ESFG e subsidiárias (de 290 milhões de euros, com referência a 31.12.2013, para 533 milhões de euros, à data da aprovação do prospeto).

59ª. Ora, considerando o valor constante do Prospeto da exposição do BES a entidades subsidiárias, associadas e relacionadas do grupo ESFG (holding do Banco) (€873,3 milhões), o aumento da exposição de €294,4 milhões, representa 33,6%.

60ª. Sobre o apontado terceiro erro: em 30/05/2014, o BES publicou o seu Relatório e Contas Consolidado e Individual - 1º Trimestre de 2014, no SDI – Sistema de Difusão de Informação da CMVM.

61ª. Relatório este que, na pág. 172, informa quea exposição do BES às Entidades Terceiras Interligadas, e dentro destas, à ESFG e suas subsidiárias em termos semelhantes aos usados no Prospeto (que por sua vez foram retirados dos documentos de prestação de contas do BES do exercício findo a 31/12/2013).

62ª. Conforme consta da douta Sentença recorrida:

pág. 220:
o Relatório e Contas consolidado e individual do BES do 1.º Trimestre de 2014, do qual constava informação acerca do valor dos financiamentos concedidos pelo BES à ESFG e suas subsidiárias a 31.03.2014, apenas foi divulgado no SDI da CMVM no dia 30.05.2014 às 15:01 (cfr. fls. 7968-8276 dos autos), ou seja, posteriormente à aprovação do prospeto.

pág. 721:
E ulteriormente, aquando da divulgação das contas do 1.º trimestre de 2014, mas apenas em 30.5.2014, o BES apenas divulgou no SDI o montante de exposição com reporte a 31.3.2014 (de €400M), omitindo que o valor de exposição à data da aprovação do Prospeto (20.5.2014) ascendia já a € 533 M.

63ª. Ou seja, em pleno período da oferta, foram divulgadas as contas trimestrais do BES, e pelos mesmos meios que foi divulgado o Prospeto (SDI da CMVM), com informação atualizada sobre o tal nível de exposição.

64ª. Informação esta que passou então a estar disponível aos destinatários da Oferta.

65ª. A tabela constante da pág. 172 do relatório e contas trimestral, informa que a exposição do grupo BES a entidades subsidiárias, associadas e relacionadas do grupo ESFG (holding do Banco), era, a 31/03/2014, de € 866,5 milhões (€783,8 milhões em ativos e de € 82,7 em garantias).

66ª. Ou seja, um nível de exposição global muito semelhante ao apurado a 31/12/2013 e constante do Prospeto - € 873,3 milhões (€ 776 milhões em ativos e € 97,3 milhões em garantias).

67ª. E quanto às referidas 5 entidades selecionadas pela decisão da CMVM e pela douta Sentença recorrida (as por elas consideradas ESFG e subsidiárias), esta tabela constante do relatório e contas trimestral informa, com referência a 31/03/2014, o montante de € 409,204 milhões.

68ª. Portanto, mesmo utilizando o critério seletivo da decisão da CMVM e da douta Sentença recorrida (a exposição às tais 5 entidades – ESFG e subsidiárias), a verdade é que os destinatários da oferta passaram a deter a informação de que a exposição a estas entidades passou a ser de € 409,204 milhões, por referência a 31/03/2014.

69ª. Devendo este ser o valor a comparar com a exposição existente à data do Prospeto, e não o valor deste constante por referência a 31/12/2013.

70ª. De um para o outro, resulta um aumento de 23,23% (de € 409,204 milhões para € 533 milhões), e não de 83,79%, como, erradamente e a bold, alegou a CMVM e a douta Sentença recorrida transcreveu na sua pág. 720.

71ª. Nos termos do n.º 20.8 do seu Anexo I do Regulamento (CE) n.º 809/2004, nos termos do qual o Prospeto devia:

Descrever todas as alterações significativas na posição financeira ou comercial do grupo registadas desde o final do último período financeiro em relação ao qual tenham sido publicadas informações financeiras auditadas ou informações financeiras intercalares, ou uma declaração negativa adequada.

72ª. As contas trimestrais do BES, publicadas em 20/05/2014, são informações financeiras intercalares, pelo que é a partir da informação nelas contida que se tinha que averiguar se o aumento de exposição (agora de 31/03/2014 para 20/05/2014, e que, nas contas da decisão da CMVM e acolhidas pela douta Sentença, se cifra em € 123,79 milhões (€ 533 milhões menos € 409,204 milhões), constituía ou não uma alteração significativa na posição financeira ou comercial do grupo).

73ª. Sobre o quarto erro, na pag. 724 da douta Sentença recorrida  surpreende-se o seguinte trecho:

O aumento relevante da exposição do BES a partes relacionadas acarretava uma alteração da situação financeira e comercial do emitente, tal como inicialmente divulgada.

74ª. Donde parecer que a douta decisão recorrida considerou que foi violado o n.º 20.8 (citando ela, por lapso, o nº 20.9) do Anexo I do Regulamento (CE) n.º 809/2004.

75ª. Ou seja, parece que a douta Sentença recorrida julgou que o dito aumento de exposição do BES à ESFG e subsidiárias, representou uma alteração significativa na posição financeira ou comercial do grupo BES.

76ª. Sendo que, e como já visto, o quadro normativo só exigia a atualização da informação contabilística se e na medida em que se verificasse uma alteração significativa na posição financeira do grupo em que se inseria o emitente.

77ª. Com devido respeito, também aqui a douta Sentença cometeu erro notório na apreciação da prova, como resulta do texto da douta Sentença, porsisóouconjugada com as regrasda experiência comum.

78ª. Na verdade, é evidente que o tal aumento de exposição do BES à ESFG e suas subsidiárias, de € 290 para 533 milhões de euros, não constitui nenhuma alteração, quanto mais significativa, na posição financeira ou comercial do BES, quanto mais do grupo BES!

79ª. O BES detinha uma carteira de crédito superior a 51.000. 000.000 de euros (51 mil milhões de euros – vd. Relatório e Contas do BES – 1º trimestre de 2014, p. 19, a fls 7986 dos autos).7

7 É de lamentar que a douta Sentença recorrida não tenha expressamente dado este facto como provado, apesar de tão objetivo, tão documentado nos autos, tão alegado no julgamento e tão relevante para a justa decisão da causa.

80ª. Pelo que este alegado aumento de exposição de € 243 milhões (de € 290 para 533 milhões), representou menos 0,2%, ou seja uma insignificância, da carteira de crédito do BES!

81ª. OBES era uma grande Bancocomercial, cuja atividade corrente era constituída pela receção de depósitos e pela concessão de crédito.

82ª. A douta decisão recorrida afirma o oposto “porque sim”, sem fundamentar.

83ª. Ao fazê-lo, comete erro notório na apreciação da prova, como resulta do seu texto, tanto por si só como conjugado com as regras da experiência comum.

84ª. Por outro lado ainda, a douta Sentença recorrida não teve em consideração o facto 104 por ela dado como provado: os financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias foram concedidos através de linhas de mercado monetário.

85ª. Sendo que, como considerou a douta Sentença recorrida a pág. 343:

397. As linhas de mercado monetário, pela facilidade que existe no saque e no reembolso dos montantes utilizados (desde que incluídos no valor global do montante aprovado para a linha em causa), são um instrumento de concessão de crédito mais volátil, no sentido em que estão (ou podem estar) sujeitas a grandes variações ao nível do capital utilizado.

86ª. Donde, também por aqui, decorre que não tinham significado os apontados aumentos de exposição do BES à ESFG e subsidiários, desde 31/12/2013 à data da Oferta.

87ª. O quinto, e o mais relevante erro da douta Sentença recorrida, foi o de considerar provado que a alegada informação omitida era necessária para que os destinatários na oferta pudessem formular juízos fundamentados sobre a mesma.

88ª. Este erro é decorrência do anterior – de erradamente ter a douta Sentença recorrida julgado que o aumento da exposição do BES à ESFG e subsidiárias (entre 31/12/2013 e 20/05/2014) representava uma alteração significativa na posição financeira ou comercial do grupo BES.

89ª. Mas, parece que ciente da fraqueza deste argumento, a douta Sentença recorrida socorre-se de outros, que chegam a ser contraditórios entre si, num visível esforço de procurar dar por provado este facto.

90ª. Os argumentados adicionais aventados são os seguintes:

üAs operações com entidades terceiras especialmente relacionadas, na medida em que envolvem muitas vezes um conjunto alargado e complexo de relações e estruturas e podem não ser realizadas segundo termos e condições de mercado normais, são operações que, pela sua própria natureza, envolvem um risco de inadequado relato financeiro, sendo assim relevante para os investidores conhecer o montante dessas operações [pág. 498];

üExistiam à data do Prospeto indícios de fragilidades da ESFG e subsidiárias que justificariam a atualização do valor da exposição do BES a elas.

91ª. Estes argumentos adicionais constituem erros crassos ou grosseiros de apreciação da prova, evidenciados no texto da própria Sentença recorrida.

92ª. O primeiro dos apontados argumentos adicionais, é enunciado na douta Sentença recorrida do seguinte modo:

Pág. 469:
As operações com entidades terceiras especialmente relacionadas, na medida em que envolvem muitas vezes um conjunto alargado e complexo de relações e estruturas e podem não ser realizadas segundo termos e condições de mercado normais, são operações que, pela sua própria natureza, envolvem um risco de inadequado relato financeiro, sendo assim relevante para os investidores conhecer o montante dessas operações.

Págs. 538-40:
ORecorrente argumenta que o critério para aferir a relevância é a dosimetria material da variação da exposição, o que, contudo, colide com o que antecede, pois que, como se explanou, o que revela é, por si só, o risco decorrente da concessão definanciamento a partes relacionadas, o que, aliás, como o Recorrente bem sabia, tinha exigências tão distintas e mais intensas que era acompanhado por uma comissão própria.

93ª. Ou seja, para a douta Sentença recorrida, a dado passo já não interessa se o aumento de exposição é quantitativamente significativo ou não, pois o que revela é, por si só, o risco decorrente da concessão de financiamento a partes relacionadas…

94ª. Ora, é verdade que as operações com entidades terceiras relacionadas envolvem um especial risco de não serem realizadas em condições de mercado, por conflito de interesses, decorrente de serem operações realizadas com “entidades filhas” ou “entidades mães”.

95ª. E por isso mesmo é que as normas internacionais de contabilidade (mais concretamente a IAS 24, como reconhece a douta Sentença recorrida na pág. 723) preveem que tais operações devem ser objeto de relato financeiro – ou seja, de contabilização e informação nos documentos de prestação de contas.

96ª. Sucede que o Regulamento (CE) n.º 809/2004 impõe que o Prospeto documente tais operações, assim como toda a demais informação contabilísitico-financeira do emitente, com os elementos que constam dos últimos documentos de prestação de contas aprovados!

97ª. E não com a sua atualização à data do Prospeto.

98ª. A não ser se e quando, nos termos do n.º 20.8 do seu Anexo I, fosse necessário descrever:
alterações significativas na posição financeira ou comercial do grupo registadas desde o final do último período financeiro em relação ao qual tenham sido publicadas informações financeiras auditadas ou informações financeiras intercalares, ou uma declaração negativa adequada.

99ª. Portanto, é opinião da Mma. Juiza que elaborou a douta Sentença recorrida que a informação sobre a exposição a entidades terceiras reveste de uma tal especialidade que devia constar do Prospeto atualizada à data da publicação do mesmo (o que, no caso de um Banco, constituiria um desafio logístico – teria que parar qualquer operação de concessão de financiamentos, prestação de garantias, o mesmo de reembolsos durante alguns dias anteriores à publicação do Prospeto para poder assegurar que este informava o montante exato na data da sua publicação...).

100ª. Mas é uma opinião contrária ao Direito constituído, segundo o qual, como já vimos e revimos, o Prospeto, por princípio, tem que prestar essa informação reportada à data das últimas contas do emitente, e, por exceção, deve reportá-la a data mais recente, se e quando essa informação constituir uma alteração significativa na posição financeira ou comercial do grupo.

101ª. E é pelo Direito constituído, pela Lei e não pelas opiniões dos julgadores que, de acordo com o art. 203º da Constituição, os arguidos devem ser julgados.

102ª. A douta Sentença recorrida também não retirou as necessárias consequências dos seguintes factos por ela dados como provados:

21. Desde março de 2014 e até agosto de 2014, existiu no seio do Conselho de
 Administração do BES uma Comissão de Controlo de Transações com Partes relacionadas, sendo composta pelos seguintes administradores do BES: a) FF (Presidente); b) GG; c) BB.

22. A Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas tinha por função pronunciar-se sobre quaisquer operações de crédito ou relações comerciais significativas celebradas entre todas as instituições do Grupo BES e qualquer titular direto e indireto de uma participação social superior a 2% no capital social ou direitos de voto do BES, ou com qualquer entidade que pertencesse ao mesmo grupo económico do titular de tal participação.

23. As operações com partes relacionadas apenas poderiam ser submetidas à aprovação dos órgãos competentes após a obtenção de parecer de não oposição, emitido por escrito, pela Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas.

108. Os financiamentos concedidos pelo BES à ESFG eram objeto de parecer vinculativo de não oposição pela Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas do BES.

103ª. Portanto, os financiamentos em causa foram escrutinados pela Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas, que, como o próprio nome indica, tinha que controlar se os mesmos obedeciam a condições de mercado e não representavam um qualquer favor em benefício de uma entidade relacionada e em detrimento do interesse do BES.

104ª. Ou seja, as operações em causas foram escrutinadas pela Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas com vista precisamente a acautelar o risco decorrente da concessão de financiamento a partes relacionadas, para usar os termos da douta Sentença recorrida.

105ª. O segundo argumento adicional consta assim da douta Sentença recorrida:

Págs 503-5:
Ora, ainda que se possa prefigurar, meramente para efeitos de acompanhamento do argumentário do Recorrente [AA] que este, por não ter ligação funcional à holding do GES (ESFG, cujo principal ativo era o BES) – ao contrário do Recorrente CC – não tivesse visibilidade total sobre a situação financeira daquela, a verdade é que, para o que ora releva, teve pelo menos conhecimento do ofício do Banco de Portugal, datado de 26 de Fevereiro de 2014 (referindo-se expressamente ao anterior ofício de 14.2.2014) e apreciado em CE do BES de 12.3.2014 (em que participou) onde se pode ler:

Assim, tal como solicitado na carta ..., de 14 de fevereiro, torna-senecessário e urgente que o grupo ESFGapresente umplano rigoroso e detalhado que, para cada uma das medidas de capitalização, identifique claramente (i) o respetivo calendário de implementação, com datas concretas e a descrição pormenorizada de cada uma das etapas necessárias para assegurar a sua execução; (ii) pressupostos, condições de exequibilidade e requisitos legais associados a cada medida; (iii) riscos de execução que podem comprometer a concretização da medidae/ou calendário definido;(iv) cenários (base e conservador) para o respetivo impacto em termos de rácios de capital; responsável(eis) pela coordenação e monitorização do processo de implementação de cada medida; (vi) investidores contactados para a realização de cada medida e demonstração da sua intenção e capacidade; (vii) medidas de contingência a adotar em caso de se materializarem os riscos de execução existentes (…).”.

No ofício supra referido, de modo expresso, datado de 14 de Fevereiro de 2014, o Banco de Portugal proferiu uma determinação específica, dirigida à ESFG (sujeita a supervisão em base consolidada pelo BdP), na qual, para o que ora releva, i) ordenou o reforço de fundos próprios, a constituição de um buffer e ii) a apresentação detalhada das medidas de capitação gizadas para assegurar o cumprimento dos rácios mínimos de capital aplicáveis.

106ª. Ora, bem se sabe na douta Sentença recorrida que este é o ofício do Banco de Portugal dirigido à ESFG no sentido de determinar que fossem reforçados os fundos próprios do grupo ESFG, de modo a que o BES pudesse reforçar os seus rácios de solvabilidade.

107ª. O que determinou a decisão de efetuar um aumento de capital através de uma oferta pública de subscrição, para a qual foi aprovado e publicado o Prospeto sub judice.

108ª. Ofício este que foi dirigido à ESFG enquanto entidade holding do grupo em que se inseria o BES.

109ª. Portanto, não tem nada a ver com a situação financeira da ESFG em si mesma nem com a capacidade financeira desta entidade para honrar os seus compromissos.

2ª  CONTRAORDENAÇÃO EMQUEFOI CONDENADO O RECORRENTEAA
(não publicação de uma des(necessária) Adenda ao Prospeto com informação sobre o montante dos financiamentos do BES à ESFG concedidos durante o período da Oferta)

110ª. A douta Sentença recorrida dá como provado o seguinte:

136. (i) A 30 de maio de 2014, o BES concedeu financiamentos à ESFG e subsidiárias, no montante de cerca de 194 milhões de euros.

137. Os referidos financiamentos foram aprovados pelo Conselho Financeiro e de Crédito do BES após parecer vinculativo de não oposição pela Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas.

138. A 30 de maio de 2014, o montante total de financiamentos do BES concedidos à ESFG e suas subsidiárias ascendia a cerca de 727 milhões de euros. (cd de fls. 3223; 3225-3226 v.; 3232-3236)

141. A informação sobreo aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma.

111ª.  Sobre este alegado aumento de exposição do BES à ESFG e
subsidiárias, de € 194 milhões, ocorrido durante o período da Oferta (o qual, segundo a decisão da CMVM e a douta Sentença recorrida, impunha que fosse elaborada uma Adenda ao Prospeto), alega-se em abono do ora recorrente AA tudo o anteriormente exposto sobre a 1ª imputada contraordenação (o Prospeto conter o valor da exposição à ESFG e subsidiárias por referência a 31/12/2013 e não por referência à data do Prospeto (20/05/2014).

112ª. A douta Sentença recorrida apresenta porém nesta 2ª contraordenação algumas particularidades, muito erradas, não só a propósito desta 2ª contraordenação como também a propósito da 1ª, porque alguns dos erros que àquela se apontaram, a esta também se aplicam.

113ª. Assim, douta Sentença recorrida tece a seguinte fundamentação, a págs. 469-71:

Reitera-se, como supra que, relativamente ao segmento “Operações com entidades terceiras especialmente relacionadas” constava do prospeto o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias com referência a 31.12.2013, no valor de cerca de 290 milhões de euros (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210 e factos provados 109 e 177)

Assim, foi o próprio Banco quem, no quadro dos seus juízos de seleção de informação para verter no prospeto em face da sua relevância, fez constar o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias com referência a 31.12.2013.

Isto é, a sinalização daquele valor no prospeto consubstancia um comportamento concludente, no sentido de que o próprio Banco considerou a sobredita informação relevante para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma.

Ora, estando aqui em causa e referindo-se a informação que não foi objeto de adenda ao prospeto ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias na sequência da concessão de financiamentos de cerca de 194 milhões de euros (factos provados 136 e 197), afigura-se que existe uma alteração da informação já constante do prospeto (com referência a 31.12.2013), não se divisando motivo para concluir que essa informação não era, à semelhança do preconizado pelo próprio Banco no momento inicial, necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma.

114ª. Ora, é improcedente (e tergiversante) argumentar que, se foi o próprio BES que decidiu incluir no Prospeto informação sobre o volume da exposição do BES à ESFG e subsidiárias, é porque achou essa informação relevante e portanto tinha que a fornecer atualizada à data do Prospeto.

115ª. Esta informação consta do Prospeto porque, como já se viu, o Regulamento (CE) n.º 809/2004, no n.º 19 do seu Anexo I, com a epígrafe: OPERAÇÕES COM ENTIDADES TERCEIRAS LIGADAS, determina o seguinte:
Se pertinente, as informações sobre as operações com entidades terceiras ligadas [que para os presentes efeitos são definidas em conformidade com as normas adoptadas nos termos do Regulamento (CE) n. o 1606/2002], realizadas pelo emitente durante o período coberto pelo historial financeiro, até à data do prospecto, devem ser fornecidas em conformidade com a norma correspondente adoptada nos termos do Regulamento (CE) n.o 1606/2002, se aplicável.

116ª. E não por um qualquer juízo efetuado sobre a sua relevância para a decisão dos investidores.

117ª. E consta do Prospeto com referência a 31/12/2013 porque é assim que o Regulamento determina que seja (...operações...realizadas pelo emitente durante o período coberto pelo historial financeiro, até à data do prospecto).

118ª. A não ser se e quando, nos termos do n.º 20.8 do seu Anexo I, fosse necessário descrever:

alterações significativas na posição financeira ou comercial do grupo registadas desde o final do último período financeiro em relação ao qual tenham sido publicadas informações financeiras auditadas ou informações financeiras intercalares, ou uma declaração negativa adequada.

119ª. Por outro lado, a douta Sentença recorrida continua a considerar que não interessa o montante das operações com partes relacionadas, porque elas são sempre relevantes, como se pode constatar, por exemplo:

A págs. 538-40:
O Recorrente argumenta que o critério para aferir a relevância é a dosimetria material da variação da exposição, o que, contudo, colide com o que antecede, pois que, como se explanou, o que revela é, por si só, o risco decorrente da concessão de financiamento a partes relacionadas, o que, aliás, como o Recorrente bem sabia, tinha exigências tão distintas e mais intensas que era acompanhado por uma comissão própria.

A págs. 783-4:
O arguido BB argumenta que aqueles financiamentos não têm materialidade para o BES, porque estavam colateralizados (assim diminuindo o risco de incumprimento numa avaliação ex ante) e projetavam-se com risco mitigado na carteira de crédito do BES e no capital do BES
[…]
Como já se explanou e ora se reitera, o critério normativamente relevante para determinar a inclusão, ou não, de adendas no prospeto, não é um critério de materialidade da informação relativamente às contas do emitente, fundado em critérios normativos provenientes do direito da contabilidade ou do direito da auditoria; mas antes, um critério de relevância ou necessidade da informação para a decisão dos destinatários da oferta. Destrate, a observação do dever que decorre da norma não demanda a aferição, pelos Recorrentes, da dosimetria (materialidade) das operações de financiamento para o BES, mas antes um juízo de aferição da relevância e necessidade da informação para a decisão fundada e racional dos investidores

120ª. Porém, na douta Sentença recorrida também se lê o seguinte:

Págs. 470-1
[..] Ex abundantis, não pode deixar de se atentar na dosimetria concreta do aumento de exposição.
Com efeito, estava em causa um aumento do montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias (cerca de 727 milhões de euros, em 30.05.2014, na sequência de financiamentos, nessa data, de cerca de 194 milhões de euros) face à informação que constava do prospeto, com referência a 31.12.2013 (cerca de290 milhões deeuros), portanto, um aumento demais de150%faceà informação queconstava do prospeto.
Isto é, no período de duração da Oferta, o BES aumentou a exposição à ESFG e subsidiárias (entidade que detinha uma participação de 27,36% no BES) em mais de 150% face à informação que constava do prospeto.

Pág. 786:
[...] o que releva, na aferição da relevância dos financiamentos de 194 M €, concedidos em 30.05.2014, para a decisão dos destinatários da oferta, é o montante significativo desses financiamentos [sublinhado nosso] por referência à informação que constava do prospeto sobre a exposição do BES à ESFG e subsidiárias, sendo irrelevante que parte dos mesmos tenham sido parcialmente colateralizados.

Donde, além do risco associado ao aumento da exposição a uma parte relacionada, a dosimetria desse aumento ascende a 533 M € face ao montante divulgado no prospeto, representando um aumento de 150 % face ao montante divulgado no prospeto. Os financiamentos de 194 M € concedidos pelo BES à ESFG e subsidiárias, em 30.05.2014, representavam 66,89 % do montante divulgado no prospeto (290 M €), de onde também se conclui que a divulgação dos referidos financiamentos era relevante para a decisão dos destinatários da oferta e, portanto, devia ter sido objeto de adenda ao prospeto.

121ª. Ou seja, a douta Sentença recorrida, quando parece que a dosimetria não colhe, julga que esta não está em causa e, quando lhe parece que a dosimetria já pode impressionar, julga que é relevante.

122ª. Chegando tanto ao ponto de entender que:
O dever que decorre da norma não demanda a aferição da dosimetria (materialidade) das operações de financiamento para o BES

123ª. …como ao ponto de entender exatamente o seu contrário:
o que releva, na aferição da relevância dos financiamentos de 194 M €, concedidos em 30.05.2014, para a decisão dos destinatários da oferta, é o montante significativo desses financiamentos.

124ª. A douta Sentença recorrida considera agora que é uma grande dosimetria a variação da exposição à ESFG e subsidiárias, de cerca de € 290 milhões a 31/12/2013 (e que era a informação que constava do Prospeto), para os cerca de € 727 milhões, atingidos a 30/05/2014, durante o período da Oferta.

125ª. Ora, a 1ª contraordenação respeita ao alegado aumento de exposição, de cerca de € 290 milhões a 31/12/2013, para cerca de € 533 milhões à data do Prospeto (20/05/2014).

126ª. Portanto, a dosimetria em causa nesta 2ª contraordenação é o aumento de €533 milhões para €727 milhões - ou seja, de €194 milhões - 26,7%; e não, como se lê na douta Sentença, um aumento de mais de 150% (por referência certamente à diferença entre €290 milhões e €727 milhões).

127ª. A douta Sentença recorrida julgou (mal, com o devido respeito), que são distintas contraordenações, ao contrário do defendido pelos arguidos – que sustentaram, à luz da proibição do non bis in idem, que, a terem ocorrido os imputados ilícitos, sempre se trataria de uma contraordenação continuada: diversas falhas informativas de um mesmo Prospeto de uma mesma oferta pública de subscrição de ações.

128ª. Mas então “de duas uma”: se a douta Sentença recorrida considera que são duas contraordenações distintas, não pode juntá-las para determinar a existência/gravidade da segunda!

129ª. Já é errado não concluir que (a ter havido contraordenação alguma) estaria em causa uma única contraordenação continuada – como se defende infra.

130ª. Mas é, além de errado, incompreensível e inadmissível que a douta Sentença recorrida junte as duas pretensas contraordenações mas apenas para o efeito de considerar incluída na segunda a alegada factualidade ilícita objeto da primeira.

131ª. Depois, a douta Sentença recorrida socorre-se de mais este argumento (pp. 470-1):

[...] v. Essa variação ocorreu no quadro de um singular contexto, que não podia deixar de influenciar os juízos de prudência e transparência exigíveis aos Recorrentes: a situação detetada nas contas da ESI que levou a que a ESFG tivesse efetuado nas suas contas de 2013 uma provisão de 700 milhões de euros; as determinações específicas do Banco de Portugal impostas à ESFG através das cartas de 14.02.2014 e de 26.02.2014, bem como de 04.06.2014; o plano de reorganização da ESI e as medidas impostas pelo Banco de Portugal no reembolso dos clientes que subscreveram papel comercial da ESI.

132ª. Desconsiderando agora a referência à determinação específica do Banco de Portugal (já rebatida a propósito da 1ª contraordenação, para onde se remete), sobressai a referência falaciosa à ESI, na qual foram detetadas irregularidades nas contas, tal como referido no Prospeto; e não na ESFG que, à data do Prospeto, era uma sociedade cotada com contas auditadas e supervisionada pelo Banco de Portugal enquanto sociedade holding do BES.

133ª. Aliás, o Banco de Portugal considerou a ESFG suficientemente robusta para nela ser constituída (e não no BES) a dita provisão de € 700 milhões, para cobrir o eventual dano reputacional do BES decorrente da comercialização aos seus balcões do papel comercial emitido pela ESI.

134ª. Pelo que deve ter-se por infundamentada, anódina e supérflua a referência que faz a douta Sentença recorrida à ESI.

NULIDADE DOS PROCESSOS DE CONTRAORDENAÇÃO SUPRA POR MANIFESTA VIOLAÇÃO DA REGRA LÓGICO-JURÍDICA DE QUE QUEM AGE DE FORMA IGUAL DEVE SER TRATADO DE FORMA IGUAL, COMO RESULTA DO PRINCÍPIO DA IGUALDADE

135ª. Na senda da decisão da CMVM, a douta Sentença recorrida imputa ao arguido AA estas duas contraordenações por, alegadamente, conhecer factos que eram igualmente do conhecimento de outros administradores executivos do BES, que delas não foram acusados.

136ª. Assim, quanto à 1ª contraordenação, o valor da exposição do BES às entidades da ESFG, a 15/05/2014, foi do conhecimento de todos os administradores presentes na reunião do Conselho de Administração do BES ocorrida neste mesmo dia.

137ª. Quanto à 2ª contraordenação, os financiamentos concedidos à ESFG durante a Oferta (que devia ter sido objeto, segundo a CMVM, de uma Adenda ao Prospeto), foram do conhecimento de todos os membros da Comissão Executiva do BES presentes nas reuniões da Comissão Executiva dos dias 11e 12 de junho de 2014.

138ª. De facto, considera a douta Sentença recorrida provado que:

106. O DFME do BES reportava semanalmente à Comissão Executiva do BES a exposição do BES a contrapartes, entre as quais as sociedades do Grupo ESFG.

19. À data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, a Comissão Executiva do BES era composta pelos seguintes membros: (fls. 24-211, maxime fls. 144-145 v.; 958 v.; 1583-1636, maxime fls. 1590 v.-1591 e 1594-1595)
a) CC;
b) EE;
c) HH;d) II; e) JJ;
f) DD; g) BB;
h) AA; i) KK;
j) LL.

139ª. Donde resulta que os demais administradores executivos do BES também aprovaram os financiamentos à ESFG.

140ª. A CMVM não acusou esses demais administradores do BES, e muito bem, pois, como já se demonstrou, nenhuma contraordenação foi praticada.

141ª. E não está na disponibilidade da CMVM nem dos Tribunais acusar uns e não outros por factos em que uns e outros participaram em medida.

142ª. Sob pena de grosseira e arbitrária violação dos princípios da legalidade e da igualdade constitucionalmente consagrados.

143ª. Pelo que a douta sentença recorrida e, bem assim, já antes a decisão da CMVM violaram o princípio da igualdade previsto no artigo 13º da Constituição.

144ª. Arguida esta nulidade na Impugnação judicial, teceu a douta Sentença recorrida, sobre ela, nomeadamente, as seguintes considerações:

(págs. 157-60):

Em segundo lugar e compulsados os autos, não se divisa arbítrio ou violação do princípio da igualdade (artigo 13.º da CRP) na decisão recorrida.

É que, o sobredito princípio da igualdade não confere aos arguidos, salvo melhor opinião, o direito de exigir que pessoas terceiras (ex-administradores) sejam constituídas arguidas e lhes seja imputada a violação de normas contraordenacionais.

145ª. a douta Sentença recorrida lavra no erro de dizer que o arguido ora recorrente defendeu o disparate de exigir que fossem constituídos arguidos todos os ex-administradores executivos do BES em obediência ao princípio constitucional da igualdade.

146ª. Quando o que o arguido ora recorrente defendeu e ora mantém, foi o inverso, ou seja que se nenhum dos demais administradores, que sabiam o mesmo que ele, não foram punidos – e bem ! repete-se ! – então também ele não o devia ser, tendo-se censurado a propósito a CMVM, pois toda a atividade das autoridades administrativas, mormente a contraordenacional, tem que estar subordinada aos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé, como manda o art. 266º, número 2, da Constituição da República Portuguesa!

147ª. Pelo que o desrespeito por tais princípios (ainda para mais da forma tão gritante demonstrada supra), agora também cometido pela douta Sentença recorrida inquina necessariamente de invalidade o processo contraordenacional.

148ª. Uma invalidade que se impõe por imperativo constitucional direto, nos termos do art. 18º nº 1 da Constituição, que se sobrepõe a quaisquer limitações de invocação de nulidades próprias do processo penal (ou do processo contraordenacional, ou de qualquer outro), e que a douta Sentença recorrida podia e devia ter conhecido, com as necessárias consequências
absolutórias       dos arguidos destas contraordenações.


III.6 - 3ª CONTRAORDENAÇÃO EM QUE FOI CONDENADO O RECORRENTE AA (omissão de informação pretensamente devida no Prospeto sobre a situação financeira e patrimonial do BESA detetada em finais de 2013)

149ª. A douta Sentença recorrida dá como provado o seguinte:

Págs. 223-25:
115. A secção 2.1.23 (“Garantia autónoma prestada pelo Estado Angolano a favor do BESA, relativa a operações realizadas com empresas angolanas”) tem a seguinte redação: (fls. 24-211, maxime fls. 54)

“Tendo como fundamento a relevância do BES Angola no financiamento das empresas Angolanas inseridas no setor privado não petrolífero,em particular em áreas consideradas estratégicas para o desenvolvimento económico de Angola e, o seu envolvimento preponderante em operações creditícias de significativa importância para a implementação dos objetivos constantes do Plano Nacional de Desenvolvimento de Médio Prazo para os anos 2013-2017, o Estado Angolano concedeu ao BESA, em 31 de dezembro de 2013, uma garantia soberana, autónoma e exigível à primeira solicitação do beneficiário, no montante global de até USD 5.700 milhões (equivalente a €4.200 milhões em 31 de dezembro de 2013).

Reconhecendo que no contexto global de recuperação económica do setor empresarial Angolano as empresas e os investidores podem não apresentar as condições de tesouraria necessárias para fazer face ao cumprimento atempado das respetivas responsabilidades, o Estado Angolano estabeleceu esta garantia como forma de proteger o banco de eventuais atrasos e incumprimentos na liquidação dos ativos, cobrindo crédito e juros, que beneficiam da garantia (créditos e valores de venda de imóveis).

A garantia pessoal do Estado Angolano tem a validade de dezoito meses a contar da data da sua assinatura, tendo ainda ficado estabelecido entre o Estado Angolano e o BESA que poderá vir a ser acordado, durante o prazo de vigência da garantia, a sua substituição por outra garantia, bem como por um acordo negocial global, desde que se encontre cumprida a mesma finalidade da garantia pessoal prestada. À data do presente Prospeto, esta garantia não foi ainda acionada.

Apesar de a garantia ter sido considerada para o cálculo das imparidades do crédito a 31 de dezembro de 2013, a mesma não foi refletida nos rácios de capital do Grupo BES por ainda se encontrar em fase de apreciação pelo Banco de Portugal. Caso a garantia pessoal do Estado não seja renovada, e se venham a verificar incumprimentos nos créditos ou desvalorizações nos imóveis garantidos, a atividade, situação financeira e resultados do BESA poderão sofrer um efeito negativo, e por essa via causar um efeito negativo na situação financeira e nos resultados do Grupo BES.

Adicionalmente, esta garantia não cobre a totalidade da carteira de crédito do BESA, pelo que a parcela da carteira de crédito do BESA não coberta por esta garantia está naturalmente sujeita aos riscos acima descritos, os quais se traduziram no primeiro trimestre de 2014, no reconhecimento de €70 milhões de perdas por imparidade do crédito.”.

Págs. 230-5:
124. Emoutubro de 2013, a Comissão Executiva do BESA apurou a existência de um conjunto de créditos, de valor material, considerados de cobrança duvidosa. (fls. 1521-1582)

125. Nas reuniões da assembleia-geral do BESA, realizadas em 3 e 21 de outubro de 2013, na qual esteve presente, em representação do BES, o arguido CC, foram analisados aspetos da carteira de crédito do BESA, com referência a31 de agosto de 2013, tendo acarteira de crédito sido dividida em dois blocos de clientes (bloco A e bloco B), atendendo ao grau de conhecimento que a Comissão Executiva do BESA detinha sobre os mesmos, bem como à dimensão dos créditos concedidos pela anterior gestão. (fls. 1521-1582, maxime fls. 1524-1531, 1532-1549 e 1572)

126. O designado bloco A dos créditos representava 80% do total da carteira de crédito do BES, totalizando cerca de 5,5 mil milhões de dólares, e respeitava a um conjunto de clientes do BESA sobre os quais o Conselho de Administração do BESA, em 3 de outubro de 2014, desconhecia a identidade dos mutuários, a finalidade dos créditos e as garantias associadas aos mesmos. (fls. 1521-1582, maxime fls. 1526-1527)

127. O crédito concedido pelo BESA totalizava, em 31 de agosto de 2013, 6,9 mil milhões de dólares, dos quais, 1,8 mil milhões de dólares correspondiam a capital vencido. (fls. 1521-1582, maxime fls. 1526-1527)

128. Em 31 de agosto de 2013, os juros vencidos por liquidar juntamente com os juros de mora totalizavam cerca de 560 milhões de dólares. (fls. 1521-1582, maxime fls. 1527)

129. O BESA apresentava, em outubro de 2013, para além de uma difícil situação de liquidez, com necessidades de financiamento de cerca de 6.6 mil milhões de dólares, 4.6 mil milhões de dólares financiados através do BES e 2 mil milhões de dólares através de bancos angolanos, uma grave situação patrimonial, resultado da deteção de uma fraude ao nível da sua carteira de crédito e do seu portfólio de ativos imobiliários.

130. As atas das reuniões da assembleia-geral do BESA realizadas em 3 e 21 de outubro de 2013 foram elaboradas pelo Presidente da Mesa da Assembleia-Geral do BESA, que deu conhecimento das versões finais das mesmas aos arguidos AA e DD.

131. No dia 5 de novembro de 2013, foram enviadas pelo Presidente do Conselho de Administração e pelo Presidente da Comissão Executiva do BESA duas cartas, dirigidas ao Presidente da República de Angola, às quais foi anexo um memorando sobre a situação patrimonial do BESA àquela data, no qual pode ler-se: (fls. 1521-1582, maxime fls. 1575-1576, 1577-1578 e 1579-1580 v.)

A nova equipa de gestão do BESA, eleita em finais de Junho de 2013, tem vindo a realizar um trabalho de diagnóstico da situação patrimonial do Banco. O trabalho realizado permite concluir que o BESA apresenta, para além de uma difícil situação de liquidez, com necessidades de financiamento de cerca de $ 6.6 mil milhões, $4.6 mil milhões financiados através do BES e $2 mil milhões através dos bancos nacionais, uma grave situação patrimonial, resultado da deteção de uma fraude ao nível da sua carteira de crédito e do seu portfólio de activos imobiliários.
As conclusões deste trabalho foram apresentadas em Assembleia Geral ocorrida no passado dia 3 de Outubro de 2013, com conclusão no dia 21 de Outubro, em que estiveram presentes todos os acionistas. As conclusões do estudo efectuado são resumidas conforme se segue:

1. À data de 31 de Agosto de 2013, o BESA apresentava activos num total de $11.3 mil milhões, dos quais $7.4 mil milhões relativos a crédito concedido (…) e $1.6 mil milhões de activos imobiliários (…), sendo o segundo maior Banco em Angola em dimensão de activos.

2. Do total da carteira de crédito, o BESA apresenta $3.7 mil milhões de financiamentos concedidos, dos quais $1.8 mil milhões se encontram vencidos, cuja probabilidade de recuperação é extremamente reduzida, dado que da análise aos movimentos financeiros conclui-se que a maioria dos créditos nãose destinaram a financiaractividadeseconómicas ou aaquisição de activos (…).

3.O estado da carteira de crédito, descrita no ponto anterior, coloca o BESA numa situação de extrema dificuldade, tendo em consideração que o capital do Banco é de apenas $1.6 mil milhões, já considerando a incorporação do aumento de capital de $500 milhões a realizar no decurso do mês de Novembro. (…)

4. A carteira de activos imobiliários apresenta imóveis no valor de $119 milhões para os quais não se encontram registos que permitam identificar a sua existência e localização. (…)

5. Adicionalmente, o BESA apresenta um outro conjunto de créditos que estando em situação de incumprimento se consideram recuperáveis, mas que necessitam de ser reestruturados. Estes créditos totalizam $1.7 mil milhões e estima-se que o processo de reestruturação demore largos meses por estarem envolvidos várias dezenas de clientes e de operações.

6. Em resumo, o BESA apresenta créditos e activos imobiliários num total de $3.9 mil milhões cujo valor de realização é próximo de zero e um segundo conjunto de créditos no valor de $1.7 mil milhões que necessitam de reestruturação. (…)
Conclui-se que a situação encontrada tudo aponta para um caso de fraude e nãoapenasdenegligência ou demá gestão, umavez que o sistema decontrolo interno e de aprovação de crédito foi eliminado para que estas funções não pudessem identificar as práticas abusivas aqui relatadas. (…)

Com o objetivo de evitar os impactos desta situação para o sistema financeiro Angolano, nomeadamente para o seu regulador, o Banco Nacional de Angola, os acionistas principais do BESA, bem como o seu Conselho de Administração e a respectiva Comissão Executiva, propõem a adopção de esquema de protecção de activos, associado a um plano de recuperação de créditos, que permita garantir a continuidade da actividade do BESA. (…)

Adoptando esta solução para o caso do BESA, a mesma prevê a emissão de duas garantias por parte de uma entidade do Estado Angolano. Uma no montante de cerca de $3.9 mil milhões para fazer face a eventuais perdas que se venham a verificar na carteira de crédito e no portfólio imobiliário em risco, referidos nos pontos 2 e 4. Uma segunda de $1.7 mil milhões, de cariz mais técnico, que possibilite ao BESA tempo para reestruturar o portfólio referido no ponto 5, não envolvendo esta qualquer responsabilidade efectiva por parte do Estado Angolano.” (sublinhados nossos).

133. O BES não fez constar do Prospeto informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação. (fls. 24-211; fls. 1521-1582)

135. A informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma.

150ª. Com o devido respeito, a douta Sentença recorrida lavra a este propósito em vários vícios, um erro de Direito, um erro notório na apreciação da prova e uma contradição insanável da fundamentação, todos resultantes do próprio texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum.

151ª. Quanto ao erro de Direito, considera a douta Sentença recorrida que (pág. 149):

os requisitos de qualidade da informação referidos no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM demandam que seja:
a. Completa, isto é, caracterizando-se pela correspondência entre a mensagem e o referente; […]
c. Atual, isto é, pressupondo correspondência temporal entre o referente e a mensagem;

152ª. Ora, a informação completa não se caracteriza pela correspondência entre a mensagem e o referente nem a informação atual pela correspondência temporal entre o referente e a mensagem.

153ª. Informação atual é, muito simplesmente e como está bem de ver, informação que relata factos como eles são à data em que a informação é prestada – no caso, 20/05/2014, que foi a data da publicação do Prospeto (facto provado 164).

154ª. E os requisitos da informação constante de um Prospeto (completude, veracidade, atualidade, clareza, objetividade e licitude), devem ser observados em conjunto e nas suas dimensões positivas e negativas.

155ª. Assim, do requisito da completude, resulta que o Prospeto deve conter toda a informação relevante (para que os investidores possam formular juízos fundados sobre a oferta), mas também que não deve conter informação irrelevante para esse mesmo fim.

156ª. A douta Sentença recorrida deu como provado que:

134. A informação constante do Prospeto não é completa, porquanto não contém informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação.

157ª. Sucede que esta informação não era a informação atual sobre o BESA à data do Prospeto, pela razão, tão simples quão decisiva, de que esses créditos passaram a estar garantidos pela garantia soberana, emitida pela República de Angola em 31/12/2013, no montante global de até USD 5.700 milhões de dólares (equivalente a € 4.200 milhões de euros).

158ª. Se tais créditos, em 31/12/2013, passaram a estar garantidos pela garantia soberana da República de Angola, parece evidente que o Prospeto, que tem data de 20/05/2014, conteria informação que não era atual se informasse que o BESA, no final do ano de 2013, era titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação.

159ª. De facto, se, em 31/12/2013, tais créditos passaram – como na verdade inquestionavelmente passaram esmo – a estar garantidos pela garantia soberana da República de Angola, não poderia ser verdadeira a informação de que o BESA, no final do ano de 2013, era titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero.

DESNECESSIDADE DA INFORMAÇÃO

160ª. Por outro lado, só podia ter sido praticada a contraordenação sub judice se tal informação fosse necessária para que os destinatários da Oferta pudessem fazer juízos fundados sobre a mesma.

161ª. A douta Sentença recorrida dá como provado que esta informação desatualizada – não atual e falsa à data do Prospeto (de que, até 31/12/2013, data em que foi emitida a garantia soberana, o BESA era titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero), era necessária para que os investidores pudessem formar juízos fundados sobre a oferta.

162ª. Fá-lo, porém, com manifesta insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e com contradição insanável da fundamentação, conforme resulta do seu próprio texto.

163ª. Na verdade, a douta Sentença recorrida dá este facto como provado (necessidade da informação para os destinatários da oferta) com base nas seguintes fundamentações:

Pág. 437:
- Uma vez que o BESA, por um lado, era uma subsidiária do BES, consolidando nas contas deste e, por outro lado, era uma importante subsidiária do BES no seu plano de negócios de expansão internacional, afigura-se manifesto que os problemas detetados na carteira de crédito daquele (“titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação”) seriam suscetíveis de se refletir negativamente, não apenas nas contas do próprio BESA, mas também nas contas do BES, bem como no plano de negócios do BES, que assentava na expansão internacional, “crucial para compensar o abrandamento da atividade doméstica.” (fls. 24-211, maxime fls. 83).

Donde, a informação acerca da real situação financeira e patrimonial do BESA (para mais, com origem em fraude imputável ao anterior Presidente da Comissão Executiva do BESA, segundo o próprio BES) era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma.

Pág. 462:
Em síntese, dos elementos probatórios acima escalpelizados (de natureza documental e pessoal) criticamente conjugados e apreciados à luz do disposto no artigo 127.º do CPP, resulta que:
(i) em momento anterior à realização da OPS foi detetada, no BESA, uma situação de fraude, que colocou o BESA numa grave situação financeira e patrimonial,
(ii) o BESA era uma subsidiária do BES que consolidava nas contas o BES,
(iii) o BESA era uma importante subsidiária do BES no plano de negócios do BES, assente na expansão internacional, pelo que a informação acerca da real situação financeira e patrimonial do BESA (para mais, com origem em fraude imputável ao anterior Presidente da Comissão Executiva do BESA.

É, assim, mister concluir que a informação aposta no prospeto sobre o BESA era, por um lado, incompleta; e, por outro lado, a informação omitida era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma.

164ª. Ou seja: a douta sentença recorrida simplesmente considera evidente que a informação acerca da real situação financeira e patrimonial do BESA [anterior à emissão da garantia soberana…] era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma.

165ª. Sucede que, à data do Prospeto (20/05/2014) a real situação financeira e patrimonial do BESA era a que lhe foi dada pela garantia soberana da República de Angola, e não a situação que detinha antes desta garantia soberana ter sido emitida (ou seja, até 30/12/2013), contra o que, erradamente, a douta Sentença recorrida insiste em dizer vezes sem conta, mas sempre com a mesma inelutável falha de razão e de sentido lógico.

166ª. Mas mais: lavra a douta Sentença recorrida em erro notório na apreciação da prova, conforme resulta do seu próprio texto, ao desconsiderar que, dos factos por ela dados como provados a seguir indicados, resulta provado que a informação histórica e já desatualizada, de que, até 31/12/2013, não era necessária para que os investidores pudessem formar juízos fundados sobre a oferta.

167ª. Tais factos são os seguintes:

Pág. 344:
404. No dia 7 de Junho de 2014, o título da primeira página do ..., foi o seguinte:

«BES ANGOLA PERDEU O RASTO A 5,7 MIL MILHÕES»

405. Seguido dos seguintes subtítulo:
- Banco desconhece beneficiários de 80% da carteira de crédito
- Ex-CEO MM foi incapaz de esclarecer a situação
- Levantamentos em numerário superiores a 500 milhões de dólares

406. Nas páginas 6 e 7 do ..., com o título SAQUE AO BESA, podia ler-se:

«BES Angola. O banco não sabe a quem emprestou 5,7 mil milhões de dólares. Administração atual acredita que 745 milhões foram parar às mãos de MM, presidente do banco até 2012.»

407. A operação de aumento de capital foi noticiada como um êxito, com «procura a superar 178% a oferta».

168ª. Na verdade, destes factos resulta que, em 07/06/2012, ou seja durante aOferta, foi publicamente divulgada a notícia de que o“BESA perdeu o rasto a 5,7 mil milhões”.

169ª. Os mesmos 5,7 mil milhões que eram objeto da garantia soberana, como informava o Prospeto! (vd. facto provado nº 115, transcrito supra).

170ª. E que correspondem aos créditos do BESA que, antes da emissão da garantia soberana (em 31/12/2013), a douta Sentença considera provado que tinham valor de realização próximo de zero ou que careciam de reestruturação (vd. por exemplo facto provado nº134, transcrito supra).

171ª. Assim, é forçoso concluir que, (i) durante a Oferta, foi amplamente divulgada a informação que a douta Sentença recorrida considera em falta no Prospeto; e que (ii) a Oferta registou uma procura superior a 178% das ações que dela eram objeto; o que (ii) bem demonstra que essa informação não era necessária para que os destinatários da oferta formulassem juízos fundados sobre a mesma.

172ª. O que decorre das regras da experiência comum (art. 410º/2 do CPP): com a notícia do ..., os destinatários da Oferta ficaram informados de que o BESA, não fosse a Garantia Soberana, teria um grave problema nas suas contas – mas isso em nada relevou para a sua decisão de subscrever as ações do aumento de capital do BES objeto da oferta, porque esse problema estava coberto precisamente por uma garantia soberana emitida pelo Estado angolano.

173ª. De resto, a CMVM considerou, à data, que a informação em causa não era necessária para que os destinatários da oferta formulassem juízos fundados sobre a mesma!

174ª. Nos termos do art. 133º/1 do CdVM (redação vigente em junho de 2014):

4. A CMVM deve proceder à suspensão da oferta quando verifique alguma ilegalidade ou violação de regulamento sanáveis.
5. [...]
6. A suspensão da oferta faculta aos destinatários a possibilidade de revogar a sua declaração com direito à restituição do que tenha sido entregue.

175ª. Portanto, a CMVM devia ter suspendido a oferta se considerasse que a informação em causa era necessária para que os destinatários da oferta formulassem juízos fundados sobre a mesma, exigindo ao emitente BES que fizesse a adequada adenda ao Prospeto com informação sobre estes factos.

176ª. Não o fez por considerar (e bem) que essa informação histórica sobre os problemas do BESA que estiveram na origem da emissão da garantia soberana, não era necessária para que os destinatários da oferta formulassem juízos fundados sobre a mesma (como se verificou que não foi, dado o enorme êxito da oferta).

177ª. Insiste porém a douta Sentença recorrida, nestes termos:

Pág. 464:
Reitera-se que a imputação fáctico-normativa aqui em causa não respeita à emissão da garantia soberana, mas à situação patrimonial do BESA, que era titular de créditos e ativos imobiliários no valor de 3,9 mil milhões de dólares cujo valor de realização era próximo de zero. Se, no quadro das suas prerrogativas de gestão do BES e do BESA, o BESA, logrou obter uma garantia soberana isso é matéria que, sendo pertinente, não retira relevância, para efeitos de divulgação no Prospeto, dos fundamentos de facto que fundaram a necessidade de emissão da sobredita garantia soberana.
Aos Recorrentes, no âmbito da divulgação de informação para efeitos de subscrição da oferta, não compete, no quadro do seu juízo valorativo, pessoal e singular, estabelecer lógicas de equiparação ou correspondência entre esses dois factos, pois que o que lhes competia era transmitir, de um lado, a real situação do BESA apurada em final de 2013; e por outro, a génese da garantia soberana obtida, a qual pela sua singularidade, quer quanto ao emitente (um estado soberano), quer quanto ao montante (5,7 mil milhões de dólares americanos), quer quanto ao prazo de validade (18 meses), sempre teria que ser do conhecimento dos subscritores da Oferta.

178ª. Ou seja, para a douta Sentença recorrida, o Prospeto tinha que ter informado sobre os fundamentos de facto que fundaram a necessidade de emissão da sobredita garantia soberana, a génese da garantia soberana obtida.

179ª. O que, valha a verdade, não passa de um juízo conclusivo e não fundamentado - nem na lógica, nem nos factos considerados provados.

180ª. Porque é que haveria de pesar na decisão dos destinatários da oferta terem a informação sobre os factos que a douta Sentença recorrida considera provados como estando na génese da emissão da garantia soberana?

181ª. O que podia interessar aos destinatários da Oferta era saber se, à data em que tiveram que tomar a sua decisão de investimento no BES (maio de 2014), havia ou não risco de incumprimento de uma significativa carteira de créditos detida por uma entidade participada pelo BES – o BESA.

182ª. Ora, estando esse risco salvaguardado por uma garantia soberana emitida pela República de Angola, não se vê, sob nenhum ponto de vista lógico, como pudesse ser essencial para os investidores a descrição dos factos que estiveram na origem da emissão dessa garantia.

183ª. Terá escapado à douta Sentença recorrida que um Estado soberano (no caso, Angola), tem o poder de expropriar, nacionalizar, intervencionar, lançar impostos, enfim, de se apropriar dos bens de uma entidade (no caso, o BESA) residente e a operar nesse mesmo Estado.

184ª. Pelo que uma garantia soberana emitida por esse Estado independente é a maior segurança que pode ser dada a uma entidade residente e a operar nesse mesmo Estado.

185ª. Ainda assim, não é verdade que o Prospeto não contivesse   informação sobre a génese da emissão da garantia soberana.

186ª. De facto, recorde-se que a douta Sentença recorrrida (a pág. 223) dácomo provado queo Prospeto continha a seguinte informação:

115. A secção 2.1.23 (“Garantia autónoma prestada pelo Estado Angolano a favor do BESA, relativa a operações realizadas com empresas angolanas”) tem a seguinte redação: (fls. 24-211, maxime fls. 54)

“Tendo como fundamento a relevância do BES Angola no financiamento das empresas Angolanas inseridas no setor privado não petrolífero,em particular em áreas consideradas estratégicas para o desenvolvimento económico de Angola e, o seu envolvimento preponderante em operações creditícias de significativa importância para a implementação dos objetivos constantes do Plano Nacional de Desenvolvimento de Médio Prazo para os anos 2013-2017, o Estado Angolano concedeu ao BESA, em 31 de dezembro de 2013, uma garantia soberana, autónoma e exigível à primeira solicitação do beneficiário, no montante global de até USD5.700 milhões (equivalente a €4.200 milhões em 31 de dezembro de 2013).

Reconhecendo que no contexto global de recuperação económica do setor empresarial Angolano as empresas e os investidores podem não apresentar as condições de tesouraria necessárias para fazer face ao cumprimento atempado das respetivas responsabilidades, o Estado Angolano estabeleceu esta garantia como forma de proteger o banco de eventuais atrasos e incumprimentos na liquidação dos ativos, cobrindo crédito e juros, que beneficiam da garantia (créditos e valores de venda de imóveis).

187ª. Ou seja, o Prospeto informou que a garantia soberana foi emitida para proteger o banco [o BESA] de eventuais atrasos e incumprimentos por parte dos clientes do banco, que podem não apresentar as condições de tesouraria necessárias para fazer face ao cumprimento atempado das respetivas responsabilidades.

188ª. Insiste porém a douta Sentença recorrida com o seguinte argumentário:

Págs. 524-6:
A justificação/enquadramento descriminados não contém qualquer conexão com a carteira de crédito do BESA e o seu portfólio de activos, edificando-se sobre generalidades e vacuidades relativas ao «contexto global de recuperação económica do sector empresarial angolano», embora inexistissem dúvidas, por parte da gestão do BES e do BESA, que aquilo que fundara a garantia soberana fora a degradação da carteira de crédito do BESA e os riscos divisados para a sua solvabilidade.

Por outro lado, com reporte à redação do factor de risco, verifica-se que, a terminologia usada e a forma verbal escolhida «podem não apresentar condições» inculca, no destinatário da comunicação, a impressão de que a temida situação de incumprimento das responsabilidades de tesouraria é uma mera hipótese, uma conjuntura, um facto futuro e de verificação possível, mas não garantida.

Sucede que, o Recorrente AA (e os Recorrentes CC e DD) bem sabiam que, logo em 3 e 4 de Novembro de 2013, o BES e o BESA, concluíram pela existência de 3,9 mil milhões de dólares de que o BESA era titular em créditos e ativos imobiliários «cujo valor de realização era próximo de zero» e ainda um conjunto de créditos de 1.7 mil milhões que careciam de reestruturação (estavam já, por isso, pelo menos em situação de mora).

Donde, a ambiguidade e a vacuidade do léxico escolhido para retratar a situação do BESA no Prospeto, não só desvia, propositadamente, a atenção da carteira de crédito do BESA, como inculca, nos destinatários da comunicação, a falsa percepção de que a mobilização da garantia soberana era um acto de gestão, de natureza prudente e antecipatória, de prejuízos futuros, que podiam, ou não, materializar-se, quando como bem sabiam, assim não era.

189ª. Não ponderou contudo a douta Sentença recorrida, como devia e estava ao seu alcance pelas regras da comum experiência, que a existência de créditos de 3,9 mil milhões de dólares «cujo valor de realização era próximo de zero», foi a expressão utilizada pelo BESA nas cartas dirigidas ao Presidente da República de Angola em que solicitou a intervenção do Estado angolano (vd. facto provado 131).

190ª. De facto é nessas cartas dirigidas pelo BESA ao Presidente da República de Angola que consta o seguinte (vd. facto provado 131):
[...]
6. Em resumo, o BESA apresenta créditos e activos imobiliários num total de $3.9 mil milhões cujo valor de realização é próximo de zero e um segundo conjunto de créditos no valor de $1.7 mil milhões que necessitam de reestruturação. (…)

191ª. Sendo que, como resulta das regras da comum experiência, terá o BESA, nestas cartas, exagerado (“carregado nas tintas”) com a finalidade de obter um esquema protetivo por parte do Estado angolano, conforme veio a obter, em 31/12/2013, através da emissão da garantia soberana.

192ª. Ora, a partir do momento em que o Estado angolano emitiu a garantia soberana, é de supor, segundo as regras da experiência comum, que o Estado angolano desenvolvesse esforços junto dos tais clientes do BESA no sentido destes virem a pagar os créditos concedidos, de modo a minimizar as consequências para o Estado angolano da emissão da sua garantia.

193ª. Assim se percebe bem que o texto da garantia soberana (vd. douta Sentença recorrrida a pág. 223) ateste que a razão de ser da sua emissão decorre de os clientes do BES em causa (empresas angolanas), no contexto global de recuperação económica do setor empresarial Angolano, poderem não apresentar as condições de tesouraria necessárias para fazer face ao cumprimento atempado das respetivas responsabilidades.

194ª. Quem emitiu a garantia soberana foi o Estado angolano, não foi o BESA nem o BES, pelo que as verdadeiras razões da emissão da garantia são as que levaram o Estado angolano a emiti-la e estão escritas nos documentos próprios pelos representantes desse Estado angolano.

195ª. Neste contexto, é por demais especioso e esforçado, mas sobretudo erróneo, o argumento de que o Prospeto não continha a devida informação sobre o BESA porque não informou sobre a génese da sua emissão – as cartas dirigidas pelo BESA ao Presidente da República de Angola nas quais é feita a referência a créditos e activos imobiliários num total de $3.9 mil milhões cujo valor de realização é próximo de zero.

196ª. Parecendo denunciar o desconforto com a fundamentação até então apresentada, passa a douta Sentença recorrida, a dado passo, a desenvolver uma nova linha argumentativa – que nem a decisão da CMVM ousara trilhar: pôr em causa a bondade e a eficácia da garantia soberana obtida.

197ª. Durante o julgamento, o tribunal atestou não estar em causa a bondade da garantia soberana porque tal não constava sequer da decisão da CMVM (nomeadamente quando impediu que a testemunha NN – atualmente administrador do Novo Banco, a instâncias do mandatário do ora recorrente AA, respondesse quando foi questionado porque é que o Novo Banco, “herdeiro do BES”, não promoveu a execução da garantia soberana, sub-rogando-se ao BESA na ação e dado ser credor deste).

198ª. Assim, considera a douta Sentença recorrida:

Pág. 533-5:
Desde logo, em 28 de Abril de 2014, o próprio DAJ do BES, não afiança que a situação da carteira de crédito e portefólio de ativos divisada pela Administração do BESA em 3 e 21 de Outubro de 21013, esteja integralmente acautelada (fls. 1570 dos autos)
[…]
Acresce que, o próprio Banco de Portugal, recuperando o depoimento de OO, não só recusou o reconhecimento da elegibilidade da garantia para efeitos de ratios prudenciais, como embora não questionando a validade da garantia, assinalou que ao Banco de Portugal nunca foram disponibilizados os anexos, nem os créditos identificados como cobertos pela garantia, razão porque o Banco de Portugal expôs, desde sempre, junto dos Administradores do BES, que lhe merecia dúvidas
i) a qualificação da garantia como «on first demand», pois que o seu teor inculcaria no destinatário a convicção de que, em momento anterior ao seu acionamento, caberia ainda ao BESA proceder a uma due diligence;
ii) a garantia só tinha o prazo de 18 meses e desconhecendo-se, porque o BES não divulgava tal informação, o prazo dos créditos pretensamente protegidos não se podia concluir, com segurança, se estavam, ou não acautelados pela garantia soberana.

Assim, tendo o Recorrente – juntamente com os demais arguidos sobre quem impende esta acusação –impossibilitado que terceiros, exógenos, equidistantes e sem interesse material/financeiro no desfecho da situação, sindicassem plenamente o alcance da garantia soberana e em face das legítimas dúvidas suscitadas pelo Banco de Portugal, não se pode concluir que atuou convencido de que o risco da carteira de crédito estava integralmente mitigado em face da emissão da garantia – o que repete-se, não o eximiria, salvo melhor opinião, em face da natureza do dever legal, de remeter no prospeto a informação verdadeira e completa que fundara a razão de ser da emissão da garantia soberana.
[...]

199ª. Em suma, e deixando de parte as demais considerações mais ou menos supérfluas vertidas a propósito na douta Sentença recorrida, considera esta que a garantia soberana não era, digamos assim, completamente válida e eficaz:
- desde logo porque o próprio DAJ do BES, não afiança que a situação da carteira de crédito e portefólio de ativos divisada pela Administração do BESA em 3 e 21 de Outubro de 2013, esteja integralmente acautelada (fls. 1570 dos autos), e porque o Banco de Portugal não a teve em conta para efeitos prudenciais;
- e porque tinha a validade de 18 meses.

200ª. Ora, quanto ao primeiro argumento, remete a douta Sentença recorrida para o documento de fls. 1570 dos autos - um e-mail do Diretor do DAJ Dr. PP, de 28/04/2014, dirigido ao seu administrador peloureiro e ora também arguído Dr. DD, tendo por assunto: Due diligence ao BES.

201ª. O texto é o seguinte:

Exmo. Senhor Dr.,

Temos vindo a acompanhar os temas legais respeitantes à elaboração do prospecto e à realização da due diligence ao BES e ao Grupo BES. Do ponto de vista da materialidade dos litígios existentes, não existe nada de relevante a assinalar.

As questões mais importantes têm que ver relacionamento dos principais accionistas do BES com as entidades de supervisão ou o desfecho do processo de separação das áreas financeira e não financeira do BES,    situações de impacto reputacional ou neste momento de impacto desconhecido, como é o caso do BES.

No que respeita às questões que neste momento levantam mais cuidados, temos o caso da REN e da existência ou não de um processo contra o Dr. JJ, em que não obstante todos os esforços e boa vontade mostrados pelo BESI (QQ), a verdade é que não dispomos de qualquer indicação sobre o assunto, sendo que me pareceu que a posição oficial, dentro do BESI, é que o processo não existe.

Sobra também a questão da assembleia geral do BESA de 3 e 21 de Outubro passados, que estando corporizada numa acta da Assembleia Geral, deveria ser exibida juntamente com a restante documentação que o BESA venha a disponibilizar para a due diligence (temos já mais de um pedido dos advogados do aumento de capital para analisar a documentação referente ao BESA). Ao tempo da realização da Assembleia, não obstante todos os inconvenientes apontados, foi desejo maioritário dos acionistas que a acta fosse mais detalhada e descritiva que o normal, vontade que respeitei.

Este último ponto é complexo, pois cruza-se com a reserva que existe por parte de todas as entidades de Angola em disponibilizar informação para fora do País (o Dr. AA ficou a estepropósito de enviar carta onde, salvo erro, o próprio BNA, refere este ponto), e com a natureza sensível e quase pessoal da referida Assembleia, que teve um conteúdo totalmente atípico de discussão de passagem de gestão e de discussão da carteira de crédito do BESA.

Tendo em conta as reservas que referi que existem sobre as transmissões de dados para fora de Angola, tendo o Dr. AA manifestado o natural cuidado de que não poderiam ser desrespeitadas as regras que existam, foi-me pedido que fizesse a tentativa de suprimir da acta do BES Angola as referências a pessoas e montantes de operações concretas, para que, sem adulterar o sentido da Assembleia, a mesma não contivesse estas referências.

O resultado final desse ensaio é que segue em anexo, para apreciação e decisão do Senhor Dr..
Em qualquer caso, neste momento o que me parece fundamental é o seguinte:

c) Para além da acta, existe a situação que a mesma retrata ou retratou em Outubro do ano passado, e essa situação poderá ou deverá ser evidenciada por outros itens da due diligence em curso, e poderá ou não ter sido totalmente sanada pela garantia soberana prestada pelo Estado Angolano.

d) Creio que o assunto da documentação a prestar pelo BESA para a due diligence deveria ser visto como um todo, incluindo esta dita acta com todos os outros elementos de informação solicitados a Angola, no sentido de se verificar com os advogados externos que prestam apoio ao BESA efectivamente que informação pode ou não sair do País, e em que termos o pode fazer.

O BES é uma sociedade aberta, o que significa que tem deveres especiais perante os seus investidores. Um processo de aumento de capital implica uma transparência absoluta na prestação de toda a informação relevante, tenha a mesma a sua origem em Portugal, ou noutro País em que o BES actue.

Caso se verifiquem restrições relevantes à prestação de informação por parte do BESA, o BES estará perante o conflito eventual entre o dever de prestar toda a informação relevante vs o dever de respeitar as regras locais de prestação de informação.

Sendo que normalmente o dever de prestar toda a informação relevante tem de predominar, visto que se trata de procurar recolher poupanças junto os investidores, e o Grupo deveria apenas poder recolhê-las se estivesse em condições de prestar toda a informação que possa ser considerada relevante. Em qualquer caso, será necessário analisar a regra angolana que é convocada para a questão, o seu alcance e os efeitos que decorrem da violação da mesma, para se apurar tecnicamente a existência e sentido do suposto conflito.

vemos (o BES) num quadro europeu e de regras europeias, de escrutínio total da actividade dos Bancos e prestações de informações crescentes ao mercado, num cenário em que o BCE se prepara para passar a supervisionar também os Bancos portugueses.

Uma reflexão estratégica que deveria decorrer deste processo de aumento de capital seria a de determinar em que termos será possível ao BES manter, no futuro, participações de controlo em Instituições sedeadas em Países em que existam restrições relevantes ao envio de informação para a casa-mãe, caso este venha a ser o caso, pretendendo ao mesmo tempo manter-se como sociedade aberta ao investimento do público.

202ª. Ou seja, o Dr. PP começa por informar o seu administrador Dr. DD que “Temos [o DAJ] vindo a acompanhar os temas legais respeitantes à elaboração do prospeto e à realização da due diligence ao BES e ao Grupo BES”.

203ª. Sobre a assembleia geral do BESA de 03 e 21 de outubro [de 2013], informa que a respetiva ata deveria ser exibida na documentação sobre o BESA a disponibilizar para a due diligence [para efeitos de elaboração do Prospeto], ms que se trata de ponto complexo, dada a reserva por parte de todas as entidades angolanas em dispobilizar informação para fora do país, e que não poderiam ser desrespeitadas as regras que existiam.

204ª. E, mais para o fim do texto, é que refere que da “due diligence em curso, e poderá ou não ter sido totalmente sanada pela garantia soberana prestada pelo Estado Angolano”.

205ª. Ora, este e-mail é de 28/04/2014 e o Prospeto é de 20/05/2014.

206ª. E, quando foi publicado o Prospeto (20/05/2014) já tinha necessariamente terminada a due diligence realizada com vista à elaboração do Prospeto.

207ª. E, conforme atesta a douta Sentença recorrida, o Prospeto continha a seguinte informação (sublinhado nosso) (facto provado 115, a pág. 225):

Adicionalmente, esta garantia não cobre a totalidade da carteira de crédito do BESA, pelo que a parcela da carteira de crédito do BESA não coberta por esta garantia está naturalmente sujeita aos riscos acima descritos, os quais se traduziram no primeiro trimestre de 2014, no reconhecimento de €70 milhões de perdas por imparidade do crédito.”.

208ª. Portanto, e em conformidade com a preocupação manifestada pelo Dr. PP, a due diligence apurou que a garantia não cobria a totalidade da carteira de crédito, pelo que desse facto foi prestada informação no Prospeto.

209ª. Quanto à apreciação da garantia soberana pelo Banco de Portugal, o Prospeto informa o seguinte (facto provado 115, a pág. 224):

Apesar de a garantia ter sido considerada para o cálculo das imparidades do crédito a 31 de dezembro de 2013, a mesma não foi refletida nos rácios de capital do Grupo BES por ainda se encontrar em fase de apreciação pelo Banco de Portugal.

210ª. Nunca ninguém percebeu porque é que o Banco de Portugal aceitou que o BES não registasse imparidades de crédito (em relação ao crédito concedido pelo BES ao BESA) por via da existência da garantia soberana, mas continuasse a depreciar esta para efeitos de cálculo dos rácios prudenciais do BES.

211ª. Talvez a razão seja simplesmente a de que o Banco de Portugal quis forçar o BES a aumentar o seu capital social, sendo que para isso precisava de argumentar que o BES não estava a cumprir um rácio de capital, desconsiderando a existência da garantia soberana emitida pelo Estado angolano a favor do BESA.

212ª. Ora, uma coisa é o Banco de Portugal, à data do Prospeto, ainda estar em fase de apreciação da garantia para efeitos dos rácios de capital,

213ª. e outra coisa é o Banco de Portugal ter recusado o reconhecimento da elegibilidade da garantia para efeitos de ratios prudenciais, como a douta Sentença recorrida se apressou, erroneamente, a concluir.

214ª. Pois se a garantia soberanaafasta as imparidades é porque cobre o risco de pagamento dos créditos por ela abrangidos, não se percebendo porque é que, ainda assim, seria relevante para a decisão dos destinatários da Oferta conhecerem as circunstâncias que, historicamente, estiveram na origem da sua emissão (então teriam que conhecer toda a história de todos os grandes problemas que historicamente o BES teve e estavam entretanto vencidos à data do Prospeto).

215ª. Por fim, não se percebe o argumento da validade da garantia a 18 meses.

216ª. Desde logo porque, como vimos, o Prospeto claramente informou que a garantia tinha um prazo de validade de 18 meses.

217ª. Depois,porque a regra é justamente as garantias (todas ! e desde logo as bancárias) terem um prazo de validade, de modo a acautelar que o garante não fique vinculado per saecula saeculorum.

218ª. Ora, 18 meses a partir de 31/12/2013, significa que a garantia era válida até 30/06/2015 – prazo mais que suficiente para que o BES averiguasse aprofundadamente quais os credores que estavam em situação de incumprimento e que não renegociaram as respetivas dívidas, acionando a garantia soberana em relação aos mesmos, a não ser que a mesma garantia soberana fosse entretanto renovada ou substituída por outra garantia idónea – tudo como é próprio da gestão sã e prudente de uma instituição de crédito.

219ª. Portanto soçobram os argumentos aventados pela douta sentença recorrida com vista a pretender pôr em causa a validade e eficácia da garantia soberana (em aditamento, digamos assim surpreendente, à fundamentação constante da decisão da CMVM).

220ª. A verdade é que, nem à data do Prospeto nem depois, havia razões para duvidar da validade e exigibilidade da garantia soberana.

221ª. É verdade que, mais tarde, quando o desastrado (é o qualificativo mais suave que se encontra) Banco de Portugal resolve o BES e decide colocar a participação no BESA no “Banco mau”, deu de mão beijada às autoridades angolanas o pretexto político para a revogação da garantia.

222ª. Uma revogação absolutamente ilegal, a que não reagiu nem o BESA porque passou a ter como acionista dominante o próprio Estado angolano, “revogador” da garantia soberana, nem o Novo Banco, por razões que se desconhecem, mas certamente alheias ao campo jurídico.

223ª. Por fim, a douta Sentença recorre a um derradeiro argumento, que, como se julga bem de ver, é errado, e que se encontra vertido nos seguintes trechos:

Pág. 531-2:
Ao pretender estabelecer esta putativa «equivalência», considerando com tal juízo justificada a omissão de informação, o Recorrente AA retirou aos subscritores da Oferta a possibilidade de por si, e com acesso a informação completa, atual e documentada, concluírem pela existência, ou não, de tal (alegada) cobertura total.

Não se nos afigura que seja intenção do legislador, no detalhe terminológico que empregou quanto aos deveres de informação a observar no prospeto, transferir para os Emitentes juízos definitivos sobre a informação da oferta de subscrição.

O que competia ao Recorrente AA e aos demais, era, precisamente, assegurar que, tal como o Recorrente AA, considerou os riscos mitigados por força da emissão da garantia soberana, também os subscritores o pudessem, ou não, fazer.

Ao sonegar informação sobre a real situação encontrada e ao estabelecer equivalências de questionável correspondência, colocaram os Recorrentes, propositadamente, em crise o comando legal que obriga à veiculação de informação completa e verdadeira, o que o arguido bem sabia, assim o tendo representado e querido.

224ª. ou seja, segundo a douta Sentença recorrida:

- não competia aos arguídos ajuizar se a garantia soberana cobria ou não os problemas com a carteira de crédito do BESA por ela abrangidos;
- devia o Prospeto informar sobre esses problemas para que os destinatários da oferta pudessem eles próprios ajuizar se a garantia soberana era ou não idónea.

225ª. Ora, salvo o devido respeito, tem que se dizer que a douta Sentença recorrida erra profundamente nesta sua derradeira ponderação.

226ª. Desde logo porque foi o próprio Banco de Portugal que, a propósito das contas consolidadas do BES com o BESA, considerou que a garantia soberana cobria os problemas com a carteira de crédito do BESA por ela abrangidos, na medida em que aceitou que o BES não registasse imparidades de crédito.

227ª. Por outro lado porque ajuizar qual a informação relevante para incluir no Prospeto é precisamente o que seexige aos responsáveis por cada Prospeto de cada oferta pública de subscrição !

228ª. Que selecionem, de entre a infindável informação existente sobre o emitente, aquela que é relevante para incluir no Prospeto !

229ª. Se um determinado volume de crédito, por muito relevante que seja e por muitos problemas intrínsecos que tivesse, está abrangido por uma garantia soberana, naturalmente que compete aos responsáveis pela elaboração do Prospeto ajuizar se e em que medida tal carteira de crédito se encontra salvaguardada pela garantia e, em conformidade, disso informar no Prospeto, com verdade e atualidade.

230ª. Rejeita-se assim em absoluto, porque contrária ao Direito e à elementar lógica, a ideia de que não competia aos autores do Prospeto ajuizar sobre a bondade da garantia soberana.

231ª. O BES e os seus administradores tiveram a estrita obrigação de avaliar a validade e eficácia da garantia soberana e de, em conformidade com o seu melhor juízo, informar os destinatários da oferta.

232ª. E fizeram-no: para isso é que foi feita a due diligence, se pronunciou o DAJ do BES e que foram contratados advogados externos, foram ainda consultados os melhores especialistas (nomeadamente recorreu-se a parecer do professor Doutor RR da Faculdade de Direito ...), também assim se pronunciaram os auditores externos (K... Angola do BESA e K... Portugal do BES) e ainda se pronunciaram no mesmo sentido a autoridade bancária angolana (BNA) e a autoridade bancária portuguesa, tudo como amplamente resulta da matéria de facto provada, conjugada com a experiência comum e com factos públicos e notórios.

DA FALTA DE CULPA DO ARGUÍDO AA

233ª. E ainda que assim não fosse tudo o que já vai dito, devia no entanto a douta Sentença recorrida ter julgado que o ora Recorrente AA não teve culpa nas contraordenações em apreciação, como resulta da matéria de facto dado como provada.

234ª. Assim, e começando pelas duas contraordenações imputadas ao arguído AA relativas ao aumento da exposição do BES à ESFG e subsidiárias (até à data do Prospeto – 1ª contraordenação, e durante o período da Oferta – 2ª contraordenação), considera a douta Sentença recorrida provado o seguinte:

225. O arguido AA tinha conhecimento de que a informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211 maxime fls. 29, 34, 60 v., 61, 62, 143 v., 174, 174 v.,175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; fls. 1644-1785; fls. 4873-4896 e fls. 7297-7343; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.).

242. O arguido AA tinha conhecimento de que a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211, maxime fls. 27, 27 v., 29, 60 v., 61 e 62, 143 v., 145, 174, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583- 1636, maxime fls. 1595; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2479 v.; cd de fls. 3223; fls. 3225- 3226 v.; fls. 3232-3236 v.; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v. e cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06- 2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014)

235ª. Ora, e em primeiro lugar, não procede a técnica imputativa usada pela CMVM e reproduzida na douta Sentença recorrida, consistente em referenciar milhares de documentos que alegadamente suportam a conclusão de que o arguído AA sabia que a dita informação era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma.

236ª. Os milhares de documentos referenciados em nada, em absolutamente nada, suportam ou sequer indiciam que a informação em causa era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma!

237ª. Porque não pode ser com a remissão para uma profusão de documentos, sem fundamentação, que se possa considerar suficiente, para a decisão, a matéria de facto provada (art. 410º/2/a) do CPP).

238ª. A douta Sentença recorrida, como resulta do seu próprio texto, não contém a matéria probatória para poder considerar provado que o arguido AA tinha conhecimento de que a informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma.

239ª. A douta Sentença recorrida também não retirou a consequência que se impunha dos seguintes factos por ela dados como provados:

21. Desde março de 2014 e até agosto de 2014, existiu no seio do Conselho de Administração do BES uma Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas, sendo composta pelos seguintes administradores do BES: (fls. 24- 211, maxime fls. 141 v.-142 e 166; fls. 1583-1636, maximefls. 1619 v.;fls. 2272-2281 v., maximefls. 2277-2281; cd de fls. 3223; fls. 3224-3244; fls. 3574-3588 v., maxime fls. 3583) a) FF (Presidente); b) GG;
c) BB.

22. A Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas tinha por função pronunciar-se sobre quaisquer operações de crédito ou relações comerciais significativas celebradas entre todas as instituições do Grupo BES e qualquer titular direto e indireto de uma participação social superior a 2% no capital social ou direitos de voto do BES, ou com qualquer entidade que pertencesse ao mesmo grupo económico do titular de tal participação. (fls. 24-211, maxime fls. 142 e 166; cd de fls. 2245, pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140317”, ficheiro “9. B Anexo 6_Regulamento Comissão Controlo Transacções Partes Relaconadas”; fls. 2272-2281 v., maximefls. 2277-2281; fls. 2888-2892 v.; fls. 5026-5031, maxime fls. 5027 v., 5028 v. e 5029 v.; fls. 5680-5684 v., maxime fls. 5681, 5682 e 5683)

23. As operações com partes relacionadas apenas poderiam ser submetidas à aprovação dos órgãos competentes após a obtenção de parecer de não oposição, emitido por escrito, pela Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas. (fls. 24-211,maxime fls. 166; cd de fls. 2245, pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140317”, ficheiro “9. B Anexo 6_Regulamento Comissão Controlo Transacções Partes Relaconadas”; fls. 2888-2892 v.; fls. 5026-5031, maxime fls. 5028 v. e 5029 v.; fls. 5680- 5684 v., maxime fls. 5681, 5682 e 5683).

108. Os financiamentos concedidos pelo BES à ESFG eram objeto de parecer vinculativo de não oposição pela Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas do BES. (cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140317”, ficheiro “9. B Anexo 6_Regulamento Comissão Controlo Transacções Partes Relaconadas”, pasta “CA”, ficheiro “(306) 20 06_01 07 2014” e pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140620”, ficheiro “5. ii Com Controlo de Transacções com Partes Relacionadas”, maxime pp. 3, 4 e 13; cd de fls. 3223; fls. 3224-3244 v., maxime fls. 3224-3224 v., 3225-3226 v. e 3232-3244 v.; fls. 5026-5031 e fls. 5680-5684 v.)

240ª. Portanto, os financiamentos em causa foram escrutinados pela Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas, que, como o próprio nome indica, tinha que controlar se os mesmos obedeciam a condições de mercado e não representavam um qualquer favor em benefício de uma entidade relacionada e em detrimento do interesse do BES.

241ª. Sendo que dessa Comissão fazia parte o administrador BB, que era, como atesta a douta Sentença recorrida na pág. 556, o Administrador Peloureiro da área do RISCO GLOBAL DO BES.

242ª. Portanto, se algum risco significativo houvesse com esses financiamentos, com certeza que o DRG (Departamento de Risco Global), melhor que ninguém o poderia e deveria indentificar, nomeadamente para efeitos de ser refletido no Prospeto.

243ª. Ou seja, o ora recorrente AA sempre teve a convicção, que mantém, de que tais operações não revestiam materialidade ou significado para a apreciação que os investidores tinham de fazer sobre a Oferta.

244ª. Convicção essa que confirmou pelo facto de tais operações (i) nunca terem merecido oposição por parte da Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas, e (ii) pelo facto de o DRG (Departamento de Risco Global) não ter considerado que as mesmas deveriam estar refletidas na informação contida no Prospeto.

245ª. Quanto à 3ª contraordenação, relativa ao BESA, o recorrente AA entendia e entende, como já amplamemte visto, que a garantia soberana da República de Angola eliminava os problemas detetados na carteira de crédito do BESA e que o Prospeto descrevia adequadamente esta realidade.

246ª. Convicção esta que foi particular e compreensivelmente reforçada pelo facto de o DAJ – Departamento de Assuntos Jurídicos do BES, dirigido pelo arguido DD, ter como Diretor o Dr. PP, que era o presidente da assembleia geral do BESA, que esteve presente nas assembleias gerais do BESA de 03/10/2014 e de 21/10/2014; que elaborou as respetivas atas e que minutou as cartas endereçadas ao presidente da República de Angola.

247ª. Dá a douta Sentença recorrida como provado que:

Pág. 340:
380. O Recorrente DD designou PP, SS e TT, colaboradores do DAJ de que era administrador peloureiro, para acompanharem a operação do aumento de capital aqui em causa.

248ª. Mais fundamentou a douta Sentença recorrida que:

Págs. 438-9:
A testemunha [PP] que, à data dos factos, era Diretor do DAJdo BES, reportando ao arguido DD, esimultaneamente Presidente da Mesa da Assembleia Geral do BESA
– prestou declarações sobre (i) o processo de substituição da gestão do BESA e apuramento pela nova gestão do BESA de problemas na carteira de crédito do BESA, (ii) a sua participação nas Assembleias-Gerais do BESA de 03.10.2013 e 21.10.2013, na qualidade de Presidente da Mesa da Assembleia Geral do BESA, onde foram discutidos os problemas detetados na carteira de crédito do BESA, (iii) a elaboração por si das referidas atas, (iv) a sua intervenção na elaboração das cartas que, em 05.11.2013, foram enviadas ao Presidente da República de Angola, (v) tendo referido ter dado conhecimento das referidas atas e cartas aos arguidos AA e DD.

249ª. Em 28/04/2014, o Dr. PP enviou um longo e-mail ao seu administrador peloureiro (e ora também arguído Dr. DD), a fls. 1570 dos autos, a que faz referência a douta Sentença recorrida na pág. 533, e transcrito supra.

250ª. Nesse e-mail, tendo por assunto: Due diligence ao BES, o Dr. PP começou por escrever o seguinte:
Exmo. Senhor Dr.,
Temos vindo a acompanhar os temas legais respeitantes à elaboração do prospecto e à
realização da due diligence ao BES e ao Grupo BES.

251ª. E, de seguida, expõe detalhadamente as questões atinentes ao BESA e à informação que sobre ele do Prospeto devia constar.

252ª. Resulta assim à saciedade que o DAJ, e muito particularmente através do seu Diretor Dr. PP, que conhecia detalhada e diretamente a informação que a CMVM e a douta Sentença recorrida julgaram que devida constar do Prospeto, analisaram e validaram a informação contida no Prospeto relativa ao BESA, e a consideraram conforme às exigências legais e regulamentares aplicáveis.

253ª. O ora recorrente AA, que não é jurista e entendeu que o DAJ, com todo o particular conhecimento que tinha sobre a matéria, aportado pelo Dr. PP, assegurou que o Prospeto continha a informação legalmente exigível sobre o BESA, e não teve, nem tem, qualquer razão para duvidar de que assim tenha acontecido.

254ª. Note-se que, para além do DAJ, o BES contratou uma prestigiada sociedade de advogados internacional, a L..., para o assessorar na redação do Prospeto, como atesta a douta decisão recorrida:

Pág. 340:
381. No quadro do descrito no ponto 377 supra, o BES contratou a firma L..., incluindo os Srs. Drs. Advogados UU e VV.

255ª. O BES estava pois dotado dos meios técnicos e humanos (nomeadamente jurídicos) aptos para assegurar que o Prospeto cumpria todas as exigências legais e regulamentares.

256ª. Pois bem sabe a douta Sentença recorrida que o arguido AA jamais expressou que a responsabilidade da informação vertida no prospeto fora acometida aos diretores do BES e da L..., eximindo os administradores.

257ª. O que o arguido AA, ora recorrente alegou, e mantém, é que, tendo os fatores de risco constantes do Prospeto relativos ao BESA, sido verificados pelo DAJ, na pessoa do seu diretor Dr. PP, que conhecia particularmente bem toda a problemática relativa aos créditos do BESA e à garantia soberana; e ainda para mais contando o DAJ com a assessoria da prestigiada sociedade de advogados internacional L...; formou a fundada convicção de que o Prospeto continha toda a informação legal e regulamentarmente exigível sobre a matéria!

258ª. Convicção que ainda hoje mantém, aliás reforçada com o testemunho preclaro do Dr. PP em Tribunal (que a douta Sentença recorrida amplamente reproduz, exceto na parte, que omite, em que a testemunha se referiu categoricamente à regularidade da informação prestada).

COMO FOI ELABORADO O PROSPETO

259ª. A douta Sentença recorrida dá como provados os seguintes factos:

66. Os departamentos do BES mais envolvidos na elaboração do Prospeto foram o Departamento Financeiro, de Mercados e Estudos (DFME), o Gabinete de Relações com Investidores (GRI), o Departamento de Planeamento e Contabilidade (DPC) e o Departamento de Assuntos Jurídicos (DAJ).

163. O Prospeto foi elaborado pelos Departamentos do BES, principalmente o DFME, o GRI, o DPC e o DAJ.

424. Entre Abril e maio de 2014, o BES remeteu à Recorrida informação recolhida pelos departamentos operacionais do BES (DFME, DRG, DAJ e DPC) e diversas versões da minuta do prospeto de aumento de capital, comentados pela CMVM e pela L... através de conference calls.

419. Os quadros dos Departamentos do BES, DRG, DPC, GRI, o DFME, DDI, DME e o ESR efetuaram apresentações verbais perante os representantes dos bancos subscritores (Underwriters), destinadas a responder a perguntas por estes formuladas e a prestar as informações consideradas necessárias ao esclarecimento dos possíveis investidores acerca da situação patrimonial, financeira e técnica do BES.

260ª. No capítulo dedicado à “Apreciação crítica da prova”, a pág. 400, informa a douta Sentença recorrida que relevou o depoimento da testemunha (sublinhado nosso):

PP - que aos costumes esclareceu ser advogado e integrar o Departamento de assuntos jurídicos do BES (DAJ) que coordenou, cujo administrador peloureiro era o Recorrente DD e que, pese embora a ligação funcional aos Recorrentes, depôs de modo espontâneo, equidistante e coerente, também com os demais elementos probatórios juntos, com o que logrou alcançar a credibilidade do Tribunal - reiterou que o prospeto envolveu vários departamentos do BES, mencionando que se trata de um «trabalho intensivo e com muitas mãos», sendo que o DFME e o BESI assumiam a posição de «centralizadores» da informação remetida por cada departamento do BES.

261ª. Estribando-se neste depoimento, continua a Sentença recorrida, a pág. 401:

Salvo melhor entendimento, estas explicações e a documentação acima escalpelizada são compreensíveis e enquadráveis à luz das regras da experiência comum e da normalidade social (artigo 127.º do CPP aplicável  por        remissão):
Cada departamento do BES         era convocado e concorria na medida do seu conhecimento funcional para a elaboração do Prospeto, compreendendo-se que tratando-se de um aumento de capital, edificado, em larga medida, sobre aspectos financeiros, o DFME tenha assumido o papel de centralizador da informação.

262ª. E, a págs. 499-500:

Afigura-se que assiste razão ao Recorrente AA quando, evidenciando melhor compreensão da axiologia dos deveres legais que impendem sobre administradores de entidades bancárias, sinaliza que se trata de uma decisão estratégica do CA do Banco, não havendo, por isso, na linha da narração de factos constante na decisão recorrida, quetransformaro DFME – eo seu administrador peloureiro - em mais do que o centralizador de informação de uma decisão que é colegial e cometida em exclusivo ao CA do BES

263ª. Mereceu também credibilidade, segundo a douta sentença recorrida, a testemunha WW (págs. 401-2):

Neste sentido, depôs, igualmente a testemunha WW (aos costumes esclareceu exercer funções no BES desde 1993, integrando a área de contabilidade) que afirmou ter participado na tarefa de aumento de capital, reiterando que o DFME centralizava a informação e o seu departamento de contabilidade prestava informação coadjuvante.
Explicitou, ainda, que o DRG (departamento de risco Global, cujo Administrador peloureiro era o Recorrente BB) também contribuía com informação, designadamente a atinente ao risco, como sejam detalhes de crédito, da carteira de crédito, rating, depósitos, «o normal para um capítulo de risco», afiançou.

264ª. E, a págs. 403-4 da douta Sentença, consta o seguinte:

Mais mencionou, o depoente PP, queo BES recorreu, igualmente, a apoio jurídico externo, através da sociedade de advogados L..., devido à «tecnicidade do tema» e à intensidade de meios que a tarefa mobilizava.

Quanto à dinâmica relacional estabelecida entre o BES e a L..., esclareceu aquela testemunha que, competia à área jurídica do BES (que integrava) assegurar a interligação com o apoio jurídico externo, o que se concretizava através do apoio na utilização da linguagem própria do Banco no prospeto, por um lado; e, por outro lado, conferindo, ao apoio externo, o histórico dos aumentos decapital.

265ª. Ou seja, resulta da matéria dada como provada que:

- O BES dotou-se de todos os meios técnicos e humanos adequados para assegurar que o Prospeto fosse elaborado e concluído com toda a informação legal e regulamentarmente exigível;
- O DAJ e os assessores externos L... verificaram e validaram a informação contida no Prospeto;
- O DFME, atento a tratar-se de um aumento de capital (uma operação financeira) assumiu um papel centralizador da informação a verter no Prospeto, que era fornecida e verificada pelos pertinentes departamentos do BES;
- O DRG (Departamento de risco Global), prestou a informação atinente ao risco, nomeadamente das carteiras de crédito,

266ª. O ora recorrente AA teve a tarefa de apresentar a Oferta junto de investidores internacionais, como reconhecido na douta Sentença recorrida a pág. 498:

Revelou conhecimento, pormenorizado e aturado, do teor do Prospeto, dado que, além de o ter aprovado em CA do BES, participou, conforme explicitou, ativamente no road show de divulgação do Prospeto, tarefa levada a cabo junto de investidores internacionais, no âmbito do qual o Recorrente (e o Recorrente BB) expunha as linhas diretrizes do Prospeto e respondia às perguntas que lhe eram colocadas.

267ª. A douta Sentença recorrida dá como provado que:

27. À data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, o arguido AA (doravante, AA) desempenhava os seguintes cargos no BES: (fls. 24-211, maxime fls. 143 v.; 1583-1636, maxime fls. 1590 v.) a) Membro do Conselho de Administração; b) Membro da Comissão Executiva.

28. À data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, na qualidade de membro da Comissão Executiva do BES, o arguido AA era responsável pelos seguintes pelouros: (fls. 24-211, maxime fls. 145; 1583-1636, maxime fls. 1595)
a) Departamento Financeiro, de Mercados e Estudos;
b) Controlo de Gestão (função partilhada com o Presidente da Comissão
Executiva);
c) Comité de Estratégia e Coordenação Internacional;
d) Gabinete de Reorganização Estratégica;
e) Departamento de Gestão de Poupança;
f) Departamento de Desenvolvimento Internacional; g) Sucursal de ...;
h) Sucursal de ...; i) Sucursal de ...;
j) Sucursal da ... (função partilhada com EE);
k) Sucursal do ... (função partilhada com EE);
l) ES Bank;
m) BES África, SGPS, S.A.;
n) Aman Bank;
o) BES Angola, SARL;
p) Moza Banco;
q) Banco e Sucursal de Cabo Verde;
r) Escritórios de representação no estrangeiro;
s) A..., S.A.;
t) Espírito Santo Research;
u) BES Vida, Companhia de Seguros, S.A.;
v) BES Finance;
w) BES Cayman; x) BESIL;
y) BIBL;
z) BES GmbH;
aa) Conselho Financeiro e de Crédito.

29. À data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, o arguido AA desempenhava ainda os seguintes cargos: (fls. 24-211, maxime fls. 154; 1583-1636, maxime fls. 1601)
a) Presidente do Conselho de Administração da A..., S.A.;
b) Membro do Conselho de Administração do Banco Espírito Santo de Investimento, S.A.;
c) Membro da Comissão de Remunerações do Banco Espírito Santo de Investimento, S.A.;
d) Membro do Conselho de Administração do Banco Espírito Santo do Oriente, S.A.;
e) Presidente do Conselho de Administração do Bank Espírito Santo (International) Limited;
f) Membro do Conselho de Administração do BES – Vida, Companhia de Seguros, S.A;
g) Membro do Conselho de Administração do BES África, S.G.P.S., S.A.;
h) Membro do Conselho de Administração do BES Finance Ltd;
i) Presidente do Conselho de Administração do BIC International Bank Limited;
j) Membro do Conselho de Administração do ES Tech Ventures, S.G.P.S., S.A.;
k) Membro do Conselho de Administração do ESAF – Espírito Santo Activos Financeiros, S.G.P.S., S.A.;
l)  Membro do Conselho de Administração do Espírito Santo – Empresa de Prestação de Serviços 2, ACE;
m) Membro do Conselho de Administração do Espírito Santo PLC;
n) Non-Executive Director da Espírito Santo Investment Holdings Limited;
o) Vice-Presidente do Conselho de Administração do Moza Banco, S.A.;
p) Membro do Conselho de Administração da P..., S.A..

268ª. Donde decorre necessariamente que o ora recorrente AA:

- Desempenhava um vasto conjunto de funções no BES;
- Durante o aumento de capital, esteve junto de investidores
internacionais a apresentar a operação;

- Sendo impossível a ele próprio verificar a correção de toda a informação contida no Prospeto;
- Enquanto administrador do BES, dotou este de todos os meios técnicos e humanos necessários para assegurar que o Prospeto cumpria todas as exiegências legais e regulamentares;
- Pelo que entendeu, e entende, que os diveros departamentos do BES envolvidos na operação, asseguraram a completa legalidade do Prospeto.

269ª. Sendo certo que jamais determinou ou sequer influenciou a inclusão ou a omissão de qualquer informação no Prospeto, e que a douta Sentença recorrida não deu como provado o contrário.

270ª. Neste contexto, nãolhe era exigível outro comportamento, ativo ou omissivo e não lhe é censurável o comportamento que teve.

SEM CONCEDER – DA CONTRAORDENAÇÃO CONTINUADA

271ª. A terem sido praticadas as 3 contraordenaçoes em que o ora arguído foi condenado, as mesmas configuram(riam) a prática de uma única contraordenação, dado que todos os factos respeitam a alegadas deficiências informativas do (mesmo) Prospeto da (mesma) Oferta.

272ª. Por ter existido nos 3 casos a mesma situação externa de terem sido constituídas várias equipas de profissionais muito competentes, com meios praticamente ilimitados, no sentido de, na mesma Oferta, ser dada aos investidores toda e a melhor informação relevante, tendo o ora recorrenteAMPconfiado, absolutamentee comboas razões, que assim estava a suceder, o que preenche a previsão do art. 30º nº 2 do CP ex vi art. 32º do RGCORDRD.

273ª. De facto, a confiança de AA na elaboração do mesmo Prospeto, relativo à mesma Oferta Pública (do mesmo aumento de capital), relativamente às mesmas equipas altamente qualificadas que trabalharam no âmbito do mesmo objeto e com os mesmos fins e essencialmente no mesmo período temporal, facilitou a repetição das alegadas omissões (admitindo sem conceder que elas tenham existido).

274ª. In casu, a situação exógena ao agente é a operação de aumento de capital do BES, para a qual o Prospeto foi elaborado, em inegável unidade de contexto situacional;

275ª. O que diminui consideravelmente a culpa do agente, nos termos decorrentes da aplicação do artigo 30º, nº 2, do Código Penal.

276ª. A douta Sentença recorrida julgou erradamente que não houve homogeneidade de execução das condutas, dado que, os factos novos ocorridos após a divulgação do prospeto, tiveram origem em diferentes tipos de condutas ativas – de um lado, operações de financiamento (em 30.05.2014 e 12.06.2014) […] (pág. 804).

277ª. Porque o que está em causa não é a prática dos factos que deveriam, segundo a douta Sentença ter sido relatados no Prospeto, os quais podem ter ocorrido, conforme ocorreram, em datas muito diferentes (principalmente os relativos ao BESA).

278ª. Mas sim a omissão de informação, no mesmo Prospeto, sobre esses mesmos factos.

279ª. Sendo de toda a razoabilidade julgar que correspondem a uma única contraordenação todas as deficiências informativas detetadas num mesmo Prospeto, assim como há-de constituir um único crime de falsificação todas as falsificações perpetradas num mesmo documento.’

Termina, formulando os seguintes pedidos:

‘Nestes termos, e nos demais de direito que «que V. Exas. Venerandos Desembargadores suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente e em conformidade ser o absolvido o arguído ora recorrente das 3 contraordenações em que foi injustamente condenado. […]

Para os efeitos do disposto no n.º 5 do artigo 411.º do CPP, ex vi artigo 74.º, n.º 4, do RGCORD) e com vista à realização da audiência aí prevista, com alegações orais, passam-se a indicar os concretos pontos da motivação do presente recurso que se pretendem ver debatidos nessa audiência, por se considerar que tal debate é essencial para a defesa do arguido ora recorrente e para a boa decisão da causa: Capítulos III.3 a III.7 da presente Motivação de Recurso.’

CONCLUSÕES [BB]
I. No despacho saneador proferido em sede de recurso de impugnação judicial, inexistindo norma específica no RGCO sobre tal ato, deve aplicar-se o disposto no artigo 311.º do CPP.
II. O Tribunal a quo devia ter-se pronunciado, no despacho saneador, sobre as nulidades e demais questões prévias invocadas pelos recorrentes, nomeadamente, sobre a prescrição do processo de contraordenação.
III. Uma condenação em processo de contraordenação por violação do CVM pode ter impactos muito mais gravosos na esfera jurídica de um arguido do que uma condenação em processo penal, considerando os valores das coimas aplicáveis, que ascendem a centenas de milhares (ou até mesmo a milhões) de euros, sendo necessário ter em consideração as circunstâncias concretas de cada arguido para compreender o real impacto que pode ter a aplicação de uma coima em processo de contraordenação.
IV. O RGCO é um regime com 40 anos, aprovado num momento em que ainda não existiam “grandes contraordenações”, e cujas normas, pensadas para processos simples e céleres, não são aplicáveis à tramitação dos processos onde estejam a ser averiguadas “grandes contraordenações” (onde se incluem as do direito sancionatório dos mercados financeiros).
V. A complexidade das matérias em análise e a gravidade dos efeitos que uma coima aplicada num processo de “grande contraordenação” impõem o cumprimento de um dever de fundamentação da sentença mais robusto, nos termos dos artigos 374.º e 375.º do CPP, aplicáveis ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO.
VI. O incumprimento das exigências de fundamentação da sentença só pode ter como consequência a nulidade da decisão recorrida, nos termos previstos no artigo 379.º do CPP, que está intrinsecamente ligado ao artigo 374.º, n.º 2, do CPP, tendo de ser aplicados em conjunto.
VII. Os erros na apreciação da prova assinalados podem decorrer diretamente de um erro na apreciação dos elementos probatórios constantes dos autos, podendo, no limite, afirmar-se que a sentença gera uma perceção necessariamente deficiente devido à forma como é fundamentada a apreciação da prova.
VIII. Há falta de fundamentação, pelo menos, para justificar o resultado atingido quanto ao elenco de factos provados e não provados, sendo, consequentemente, nula a sentença por violação do disposto nos artigos 374.º, n.º 2, e 375.º do CPP – nulidade que ora se argui.
IX. As normas sobre prescrição são consideradas, pela doutrina e pela jurisprudência, normas processuais materiais, pelo que se encontram sujeitas à disciplina do artigo 29.º da CRP, em particular, ao seu n.º 4, que consagra o princípio da proibição da aplicação retroativa da lei penal desfavorável – «o imperativo constitucional da legalidade/irretroactividade (artigo 29º da Constituição da República), consabidamente válido tanto para o direito criminal como para o direito contraordenacional», conforme salienta o Professor Doutor Manuel da Costa Andrade na p. 3 da Opinião que ora se junta.
X. O momento relevante para o início da contagem do prazo de prescrição é o momento da prática do facto (cfr. artigo 5.º do RGCO).
XI. O princípio da segurança jurídica obriga a que, no momento da prática do facto, esteja determinado o período máximo durante o qual pode ser exercida a ação punitiva.
XII. A norma de prescrição aplicável tem de ser a norma que estava em vigor à data da prática dos factos, não sendo admissível a aplicação retroativa de normas que aumentem o prazo de prescrição (por desfavoráveis ao arguido) ou que prevejam novas causas de suspensão e de interrupção da prescrição.
XIII. Não se aceita a afirmação de que, à data da dedução da acusação, os ilícitos imputados a BB não se encontravam prescritos.
XIV. O Tribunal a quo, ao sustentar a interrupção da prescrição antes do decurso inicial do prazo exclusivamente no disposto no artigo 28.º, n.º 1, alínea b), do RGCO, aplicou uma norma segundo a qual «a prescrição do procedimento por contraordenação interrompe-se com a realização de quaisquer diligências de prova, designadamente exames e buscas, ou com o pedido de auxílio às autoridades policiais ou a qualquer autoridade administrativa, ainda que tais diligências ou pedidos ocorram antes da comunicação ao arguido de qualquer despacho, decisão ou medida contra ele tomada, ou antes de qualquer notificação que lhe seja dirigida na qualidade de arguido» – norma que é inconstitucional por violação do artigo 2.º da CRP; inconstitucionalidade que ora se invoca.
XV. Só podem ser aplicadas, em processo de contraordenação, as causas de suspensão previstas na legislação em vigor à data da prática dos factos, sob pena de aplicação retroativa de lei sancionatória desfavorável.
XVI. A aplicação das causas de suspensão previstas nos artigos 7.º, números 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, e 2.º na Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, levantam dois problemas de aplicação retroativa: um relativo à sua aplicação a factos praticados antes da sua entrada em vigor e outro relativo à sua aplicação temporal anterior à sua entrada em vigor.
XVII. A aplicação da primeira “suspensão Covid” ao período compreendido entre 9 e 19 de março de 2020 e a aplicação da segunda “suspensão Covid” ao período compreendido entre 22 de janeiro e 1 de fevereiro de 2021 configuram situações de retroatividade de primeiro grau – aplicação que é proibida pelos artigos 29.º, n.º 4, e 2.º da CRP, apenas se podendo aplicar para o futuro (ou seja, a partir de 20 de março de 2020 e de 2 de fevereiro de 2021, respetivamente).
XVIII. À luz deste critério, o processo de contraordenação prescreveria a 4 de novembro de 2022 (admitindo-se, sem conceder, que as infrações se consumaram a 17 de junho de 2014) – pelo que, se o Tribunal a quo viesse a proferir despacho de admissão do recurso, o procedimento, à data do seu envio para o Tribunal da Relação de Lisboa, já se encontraria prescrito.
XIX. Caso o Tribunal a quo profira despacho de aceitação do recurso e determine o seu envio para o Tribunal da Relação de Lisboa, estará a aplicar:
a. A norma constante do artigo 7.º, números 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, a factos praticados antes da sua entrada em vigor;
b. A norma constante do artigo 2.º da Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, a factos praticados antes da sua entrada em vigor.
XX. Normas que serão igualmente aplicadas pelo Tribunal ad quem caso considere que o procedimento, aquando da subida dos autos, não está prescrito.
XXI. Normas que são inconstitucionais por violação dos artigos 2.º e 29.º da CRP – inconstitucionalidade que ora se invoca.
XXII. Caso se considere que o procedimento esteve suspenso pelo período de 160 dias – o que, sem conceder, se concebe por cautela de patrocínio –, desde já se consigna que, também à luz deste critério, o procedimento prescreveria a 24 de novembro de 2022 (admitindo-se, também sem conceder, que as infrações imputadas ao Recorrente se consumaram a 17 de junho de 2014) – pelo que, se o Tribunal a quo viesse a proferir despacho de admissão do recurso, o procedimento, à data do seu envio para o Tribunal da Relação de Lisboa, já se encontraria prescrito.
XXIII. Caso o Tribunal a quo profira despacho de aceitação do recurso e determine o seu envio para o Tribunal da Relação de Lisboa, estará a aplicar:
a. A norma constante do artigo 7.º, números 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, a um período anterior à data da sua entrada em vigor e a factos praticados antes da sua entrada em vigor;
b. A norma constante do artigo 2.º da Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, a um período anterior à data da sua entrada em vigor e a factos praticados antes da sua entrada em vigor.
XXIV. Normas que serão igualmente aplicadas pelo Tribunal ad quem caso considere que o procedimento, aquando da subida dos autos, não está prescrito.
XXV. Normas que são inconstitucionais por violação dos artigos 2.º e 29.º da CRP; inconstitucionalidade que ora se invoca.
XXVI. Considerar aplicável retroativamente o disposto na redação posterior do artigo 418.º do CVM (que aumenta o prazo de prescrição de 5 para 8 anos, no n.º 1, e estabelece uma nova causa de suspensão do processo, no n.º 2) não tem base legal.
XXVII. A regra geral é a da aplicação da lei nova apenas para o futuro – cfr. artigo 12.º, n.º 1, do Código Civil, artigo 2.º do Código Penal (exceto se a lei nova for mais favorável), e artigo 3.º do RGCO (exceto se a lei nova for mais favorável).
XXVIII. A aplicação retroativa de lei nova depende de norma expressa nesse sentido (cfr. artigo 12.º, n.º 1, segunda parte, do Código Civil), sendo que, mesmo nesse caso, é salvaguardada a posição do arguido, caso a lei nova seja desfavorável. Não existe norma que permita a aplicação retroativa do artigo 418.º do CVM a factos praticados antes da sua entrada em vigor, pelo que tal artigo apenas pode ser aplicado para o futuro.
XXIX. São irrelevantes, no que respeita à aplicação retroativa de lei desfavorável, «os interesses públicos subjacentes às alterações introduzidas no CdVM».
XXX. O Tribunal a quo aplica, desde já, a nova redação do artigo 418.º do CVM, determinando a sua retroatividade – o que faz em violação de lei por inexistência de norma ordinária que o autorize; normas próprias que extrai por interpretação e que, alegadamente, habilitam a aplicação da lei nova.
XXXI. O Tribunal a quo aplicou uma norma segundo a qual «o procedimento contraordenacional prescreve no prazo que estiver determinado no Código dos Valores Mobiliários (artigo 418.º) na redação vigente à data do recebimento do recurso de impugnação judicial, ainda que o prazo determinado pelo Código dos Valores Mobiliários (artigo 418.º) à data da prática dos factos seja inferior» – norma que é inconstitucional por violação dos artigos 2.º e 29.º da CRP; inconstitucionalidade que ora se invoca.
XXXII. O Tribunal a quo aplicou, ainda, uma norma segundo a qual «a suspensão do prazo de prescrição prevista na nova redação do artigo 418.º do Código dos Valores Mobiliários é aplicável aos processos contraordenacionais pendentes por factos praticados antes da sua entrada em vigor» – norma que é inconstitucional por violação dos artigos 2.º e 29.º da CRP; inconstitucionalidade que ora se invoca.
XXXIII. Ou dito de outro modo, o Tribunal a quo aplicou uma norma extraída por interpretação que permite aplicar o artigo 418.º do CVM na sua atual redação aos processos contraordenacionais pendentes por factos praticados antes da sua entrada em vigor – norma que é inconstitucional por violação dos artigos 2.º e 29.º da Constituição; inconstitucionalidade que ora se invoca.
XXXIV. Deve, assim, ser declarada a extinção do procedimento com fundamento no decurso do prazo de prescrição de 5 anos, previsto no artigo 418.º do CVM na redação à data da prática das infrações em causa, com a consequente absolvição do Recorrente BB.
XXXV. A sentença recorrida padece de contradição insanável da fundamentação (cfr. artigo 410.º, n.º 2, alínea b), do CPP), porquanto a decisão de facto e de direito quanto à Rio Forte não possibilita a adoção de decisão distinta quanto à ESFG.
XXXVI. O Tribunal a quo atribui relevância à supervisão bancária relativamente aos factos respeitantes à Rio Forte («A concessão do sobredito financiamento foi, em momento anterior à sua aprovação, discutida com o Banco de Portugal, que impôs a colateralização integral do financiamento, o que veio a ser acatado pelo BES e seus Administradores (cfr. depoimento de OO, do Banco de Portugal e declarações do Recorrente BB, em juízo).», cfr. p. 492 da sentença) e à regulamentação emanada pelo Banco de Portugal a respeito do cálculo das imparidades («Donde, impõe-se concluir, à luz das regras da experiência comum e da normalidade social que se, como resulta das reservas constantes das certificações legais de contas consolidadas do BESA respeitantes aos exercícios de 2011 e 2012, nesses anos não foi possível extrair do sistema informático do BESA informação acerca “[d]a identificação efetiva (i) das operações de crédito que foram objeto de reestruturação e (ii) do grupo económico em que cada cliente se insere”, então também o auditor das contas consolidadas do BES de 2011 e 2012 (a K... Portugal) não dispôs da necessária informação quanto à carteira de crédito do BESA para que pudesse concluir acerca da adequação do valor das perdas por imparidade, à luz das regras de cálculo destas (Instrução do Banco de Portugal n.º .../2013).», a p. 434 da sentença), tendo, porém, considerado irrelevante o facto de o BES ser supervisionado pelo Banco de Portugal e inaplicável o disposto no Aviso do Banco de Portugal n.º .../2010 sobre cálculo dos limites dos grandes riscos no caso da ESFG, sendo incompreensível o critério que baseou tais decisões.
XXXVII. A ESFG, sendo a cabeça do grupo financeiro que integrava o BES, não era, por um lado, uma parte relacionada distante (contrariamente ao que sucedia quanto a outras empresas do GES, nomeadamente, a Rio Forte), e, por outro lado, não era uma parte relacionada normal: o facto de estar sujeita a supervisão pelo Banco de Portugal, e de o BES consolidar contas com a referida entidade, determinava uma confiança adicional na entidade; ao que acrescia que, em virtude dessa relação de grande proximidade e do facto de BES e ESFG serem entidades supervisionadas em base consolidada pelo Banco de Portugal, não só não existia risco de inadequado relato financeiro, como não havia «conjunto alargado e complexo de relações e estruturas» de que resultasse qualquer tipo de risco relacionado com as operações de financiamento e o seu reporte (cfr. p. 425 da sentença).
XXXVIII. Todos os financiamentos concedidos à ESFG, tanto através de LMM como de contratos de mútuo com garantia, o eram em condições de mercado.
XXXIX. A proposta da CCTPR, formulada na reunião de 9 de maio de 2014, permitia (i) a concessão de financiamentos através das LMM aprovadas à data (instrumento de concessão de crédito específico do mercado interbancário, sendo da responsabilidade da CCTPR garantir que as LMM aprovadas em benefício das instituições financeiras que fossem partes relacionadas estavam em linha com as condições de mercado), e (ii) a concessão de financiamento através de contratos de mútuo mediante apresentação de colaterais para garantia do crédito – proposta que foi levada à aprovação do Conselho de Administração do BES a 15 de maio de 2014.
XL. Na senda da argumentação do Tribunal a quo quanto à Rio Forte, considerando, quanto à infração por violação do artigo 142.º do CVM (ESFG):
a. O baixíssimo risco destas operações em concreto (os financiamentos concedidos à ESFG na pendência da Oferta [no valor de EUR 124 milhões] e até o financiamento anterior à pendência da Oferta concedido a 12 de maio de 2014 [no valor de EUR 70 milhões] estavam integralmente colateralizados, o que mitigava significativamente o risco do Banco por referência a tais financiamentos;
b. O baixíssimo risco da entidade mutuária, que, era uma instituição financeira sujeita a supervisão pelo Banco de Portugal;
c. Que o Banco de Portugal:
i. Tinha conhecimento, no contexto da supervisão que exercia sobre o BES e sobre a ESFG; e
ii. Escrutinava todos os financiamentos que eram concedidos pelo Banco à sua acionista e, à data, não tinha imposto quaisquer limites aos financiamentos a conceder pelo BES à ESFG – de onde se extrai uma declaração de vontade do regulador bancário não despicienda no contexto dos presentes autos;
d. Que a probabilidade de incumprimento da ESFG, independentemente da existência de garantias, era de 0,25% (probabilidade de incumprimento decorrente do rating de nível “bbb-”) – rating que era muito melhor ao atribuído à Rio Forte (cujo rating era de nível “b+”, refletindo uma probabilidade de incumprimento de 1,96% (oito vezes superior à probabilidade de incumprimento da ESFG);
e. O BES tinha uma relação financeira com a ESFG há mais de 10 anos (contrariamente ao que sucedia com a Rio Forte);
f. O valor da exposição do BES à ESFG e respetivas subsidiárias não era, no contexto global do Banco, material, não representando a variação da exposição entre 20 e 30 de maio uma alteração significativa da situação financeira do emitente, tendo em conta os capitais próprios do BES à data e a baixíssima “perda esperada” por referência a estes financiamentos (que, reitera-se, estavam integralmente colateralizados, o que mitigava significativamente o risco do Banco),
o Recorrente BB não representou que tais operaçõesfossem relevantes para que os destinatários formulassem um juízo sobre a Oferta – ausência de representação que se deve ter por provada, pelo menos, em termos equivalentes aos referidos na sentença recorrida quanto à operação da Rio Forte, pelo que deverá ser igualmente absolvido, sob pena de violação do artigo 410.º, n.º 2, alínea b), do CPP.
XLI. Na senda da argumentação do Tribunal a quo quanto à Rio Forte, considerando, quanto à infração por violação do artigo 135.º do CVM (ESFG):
a. O baixíssimo risco da entidade mutuária, que, era uma instituição financeira sujeita a supervisão pelo Banco de Portugal;
b. Que o Banco de Portugal:
i. Tinha conhecimento, no contexto da supervisão que exercia sobre o BES e sobre a ESFG; e
ii. Escrutinava todos os financiamentos que eram concedidos pelo Banco à sua acionista e, à data, não tinha imposto quaisquer limites aos financiamentos a conceder pelo BES à ESFG – de onde se extrai uma declaração de vontade do regulador bancário não despicienda no contexto dos presentes autos;
c. Que a probabilidade de incumprimento da ESFG, independentemente da existência de garantias, era de 0,25% (probabilidade de incumprimento decorrente do rating de nível “bbb-”) – rating que era muito melhor ao atribuído à Rio Forte (cujo rating era de nível “b+”, refletindo uma probabilidade de incumprimento de 1,96% (oito vezes superior à probabilidade de incumprimento da ESFG);
d. O BES tinha uma relação financeira com a ESFG há mais de 10 anos (contrariamente ao que sucedia com a Rio Forte);
e. O valor da exposição do BES à ESFG e respetivas subsidiárias não era, no contexto global do Banco, material, não representando a variação da exposição entre 31 de janeiro de 2013 e 20 de maio de 2014 uma alteração significativa da situação financeira do emitente, tendo em conta os capitais próprios do BES à data e a baixíssima “perda esperada” associada a esta exposição, em função do rating internacionalmente atribuído à ESFG,
o Recorrente BB não representou que tal informação (exposição à ESFG a 20 de maio de 2014) fosse relevante para que os destinatários formulassem um juízo fundado sobre a Oferta – ausência de representação que se deve ter por provada, pelo menos, em termos equivalentes aos referidos na sentença recorrida quanto à operação da Rio Forte, pelo que deverá ser igualmente absolvido, sob pena de violação do artigo 410.º, n.º 2, alínea b), do CPP.
XLII. A 9 de maio de 2014, a CCTPR não propôs o aumento do plafond das LMM autorizadas em benefício da ESFG, tendo proposto que a exposição não colateralizada do BES à sua acionista tendencialmente viesse a diminuir nos meses seguintes e que a concessão de financiamentos adicionais à ESFG dependesse de contratos de mútuo mediante a prestação de garantias adicionais, o que «revelou compreensão da situação do BES e do risco associado» à exposição à ESFG através de LMM (em todo o caso, diminuto, pelas razões acima expostas), «contribuindo, de modo empenhado e adequado, para a mitigação desse risco».
XLIII. Há erro notório na apreciação da prova (cfr. artigo 410.º, n.º 2, alínea c), do CPP), na medida em que a prova constante dos autos não permite que a decisão (de facto e de direito) quanto à ESFG seja distinta da decisão do Tribunal a quo quanto à Rio Forte, no que concerne ao aqui Recorrente:
a. Por desconsideração de prova documental (em especial, por desconsideração de prova documental que infirma, de forma clara e direta, o que consta do elenco de factos provados);
b. Por desconsideração e não aplicação de regras da experiência comum (em especial, quanto à intervenção do Recorrente no processo de elaboração do Prospeto);
c. Por desconsideração de factos públicos e notórios (em especial, por desconsideração de notícias públicas de onde resulta que o Recorrente não teve qualquer contributo causal, por ação ou omissão, para os factos aqui em causa); e
d. Pela desconsideração da aprovação do Prospeto pela CMVM (ou seja, por não valorização dos efeitos de tal decisão quanto à consciência da ilicitude – ou, melhor dizendo, falta dela – do Recorrente).
XLIV. Erros notórios na apreciação da prova que impõem uma decisão distinta quanto à matéria de facto, pelo menos, sem limitar, quanto aos factos provados números 109, 257, 258, 259, 260, 261, 262(d), 262(e), 262(f), 262(g), 262(h) e 262(i),263, 269, 277(f) e 278.
XLV. Sem conceder, na medida em que tais erros decorrem diretamente de um erro na apreciação da prova, ou, no limite, corresponde a uma perceção deficiente derivada da forma como o Tribunal a quo fundamenta a apreciação que faz da prova, a sentença padece de falta de fundamentação no que concerne à justificação do resultado atingido nos factos provados e não provados, em violação do disposto nos artigos 374.º, n.º 2, e 375.º do CPP, o que tem como consequência a nulidade da sentença recorrida – nulidade que ora se argui.
XLVI. O critério (jurídico) de relevância da informação subjacente à aplicação dos artigos 135.º e 142.º do CVM é um critério indeterminado, tendo de ser densificado através de lugares paralelos.
XLVII. O conceito convocado pelo Tribunal a quo – que convoca uma Diretiva que estabelece um critério ainda mais geral de seleção do que o estabelecido nos artigos 135.º e 142.º do CVM – carece de corporização.
XLVIII. O critério que deve nortear a seleção da informação a incluir num prospeto, nos termos e para os efeitos dos artigos 135.º e 142.º do CVM, é o conceito de price sensitivity, uma vez que todas as alterações significativas da situação financeira do emitente normativamente relevantes são suscetíveis de afetar o valor das ações objeto da oferta.
XLIX. O critério de price sensitivity não está longe da Diretiva, sendo, antes, a forma de concretização da Diretiva. Por outras palavras, a Diretiva, quando se refere a “alterações significativas”, reporta-se a alterações da situação financeira do emitente que sejam suscetíveis de alterar o preço dos valores mobiliários objeto de uma oferta – parâmetro que serve para avaliar o que é relevante para o investidor e, consequentemente, tomar a decisão sobre o que deve, ou não, constar de um prospeto.
L. Informação relevante para o investidor é a informação que possa influenciar, de maneira sensível, o preço de um determinado valor mobiliário, tendo a relevância da informação de ser aferida de acordo com um critério de price sensitivity (cfr. esclarecimentos constantes do site da CMVM sobre o conceito de price sensitive information, disponíveis em https://www.cmvm.pt/pt/Legislacao/Legislacaonacional/Recomendacoes/Anexos/Pages/Abuso-de-Informa%C3%A7%C3%A3o-Privilegiada.aspx).
LI. A verdade é que, por todas as razões supra expostas, a informação sobre a variação da exposição à ESFG entre 1 de janeiro e 20 de maio de 2014 e entre 20 de maio e 30 de maio de 2014 não era relevante para que os investidores pudessem formar um juízo fundado sobre a Oferta, uma vez que, não representando uma alteração significativa da situação financeira do emitente (que tinha capitais próprios muito elevados), em virtude da “perda esperada” praticamente nula (considerando que se estava perante um dos melhores ratings da carteira de crédito do BES, bem como a alargada colateralização), não era suscetível de afetar o preço das ações objeto da Oferta.
LII. As exigências dos artigos 135.º e 142.º do CVM, em particular no que respeita à atualidade da informação, não podem ser aplicadas tout court, tendo de ser analisadas em função do setor concreto de atividade de uma determinada entidade.
LIII. No contexto da atividade bancária, apenas se pode considerar relevante – por representar uma alteração significativa da posição financeira do emitente – uma variação da exposição a partes relacionadas que seja price sensitive, isto é, que seja suscetível de influenciar o valor das ações objeto da Oferta, devendo ser este o sentido normativo a atribuir aos artigos 135.º e 142.º do CVM.
LIV. Qualquer outra solução corresponderá a uma má aplicação do direito, traindo-se a teleologia do disposto nos artigos 135.º e 142.º do CVM, ou seja, violando estas normas.
LV. Desde já se antecipando, num excesso de cautela de patrocínio, que, se o Tribunal ad quem viesse a entender que a densificação do disposto nos artigos 135.º e 142.º do CVM constitui impugnação da matéria de facto – e não questão de direito –, estaria a aplicar uma norma segundo a qual «a delimitação normativa de um conceito indeterminado, através de um exercício de adequação ao setor concretamente regulado, não constitui questão de direito suscetível de recurso para uma segunda instância judicial em processo de contraordenação»; norma que seria inconstitucional, por violação da certeza jurídica e do Estado de Direito e por inadmissível restrição do direito ao recurso (cfr. artigos 2.º e artigo 32.º, números 1 e 10, da CRP).
LVI. No caso do BES, as exigências de atualidade de informação não podem desconsiderar as concretas condições da atividade de gestão bancária e, bem assim, as normas legais e regulatórias relevantes e que lhe eram aplicáveis, nomeadamente, as metodologias e conceitos adotados na gestão bancária, certificados pelas autoridades de supervisão relativamente à avaliação da relevância de uma determinada exposição a uma contraparte, que concorrem, de forma significativa, para a análise sobre a relevância da informação a incluir num prospeto para efeitos do disposto nos artigos 135.º e 142.º do CVM.
LVII. À luz das métricas acima enunciadas, a variação da exposição do BES à ESFG após 31 de dezembro de 2013 não tinha impacto material na situação financeira do Banco em virtude do montante dos capitais próprios do Banco antes do aumento de capital (EUR 6,1 mil milhões), e, bem assim, por causa da “perda esperada” praticamente nula (considerando que se estava perante um dos melhores ratings da carteira de crédito do BES, bem como a alargada colateralização), de onde decorre que não se verificou uma alteração significativa da situação financeira do emitente entre a data das últimas demonstrações financeiras e o período da Oferta.
LVIII. A informação sobre a variação da exposição do BES à ESFG no referido período não era relevante para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma, dado que não era suscetível de afetar o valor das ações objeto da Oferta.
LIX. O que implica, necessariamente, a absolvição do aqui Recorrente.

Termina, formulando os seguintes pedidos:

‘Termos em que se requer que V. Exas.:
(i) Declarem prescrito o procedimento contraordenacional;
(ii) Caso assim não se considere – o que, sem conceder, se concebe por mera cautela de patrocínio –, absolvam o Recorrente das infrações de que vem condenado, atendendo às questões que foram suscitadas.’

CONCLUSÕES [CC]

NULIDADE DA SENTENÇA RECORRIDA POR IMPUTAÇÃO DE FACTOS COM RECURSO A JUÍZOS CONCLUSIVOS

1. Na Decisão da CMVM e na Sentença Recorrida, o Tribunal considerou como provada – em
sede de decisão sobre matéria de facto – matéria conclusiva e valorativa e/ou,até, jurídica que, em rigor, não poderá consubstanciar matéria de facto objectiva e concreta.

2.   Em primeiro lugar, nos factos provados n.os 101, 113, 123, 135, 141, 148, 158, 323, 328, 331, alínea h), e k), 338, 343, 349, 351, alíneas f) e k) da Sentença Recorrida, a utilização da expressão “informação (…) necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma” configura um conceito jurídico, o qual não poderia integrar a matéria de facto provada.

3.  Esta expressão está, evidentemente, associada aos elementos constitutivos do tipo da contra-ordenação pela falta de qualidade da informação constante do prospecto imputada na Sentença Recorrida e à previsão legal do artigo 135.º, n.º 1, do CVM, que terá alegadamente sido violado pelo ora Recorrente.

4. Assim, esta matéria devia constar do enquadramento jurídico dos factosda decisão, na medida em que integra o próprio thema decidendum, e não da matéria de facto dada como provada.

5.  Em segundo lugar, a matéria de facto dos factos provados n.os 329 e 331, alínea l) da Sentença Recorrida, nos quais se deu como provada a “não adopção de medida adequada a sanar os vícios da informação” também consubstancia matéria de cariz conclusivo, vago e genérico, a qual não poderia ter sido dada como provada pelo Tribunal.

6. A expressão “medida adequada” não só representa um conceito subjectivo e genérico, como constitui um juízo conclusivo e normativo sobre uma determinada realidade factual.

7. Tanto que a expressão “não adopção de medida adequada a sanar os vícios da informação” tem correspondência com a previsão legal do artigo 401.º, n.º 4, do CVM.

8. Na Sentença Recorrida, o Tribunal limita-se a concluir em termos absolutamente abstractos que o ora Recorrente não adoptou medida adequada a sanar os vícios da informação que consta do Prospecto.

9. Não está em causa uma realidade da vida, nem um acontecimento concreto, mas uma interpretação ou conclusão que pode ser retirada de determinados factos objectivos, sem que os factos objectivos a partir dos quais tal conclusão ou interpretação pode ser retirada nem sequer foram dados como provados na Sentença.

10. Em face do exposto, por ter dado como provada matéria de carácter jurídico-normativo ou de cariz genérico e valorativo-conclusivo, a Decisão da CMVM e, em consequência, a Sentença Recorrida devem ser declaradas NULAS, por força da violação do artigo 58.º, n.º 1, alínea b), do RGCO, ex vi artigo 407.º do CVM e, ainda, dos artigos 374.º, n.º 2, 283.º, n.º 3 - al. b), do CPP.

11. Em consequência, toda a matéria de carácter jurídico-normativo ou de cariz genérico e valorativo-conclusivo da Sentença Recorrida indicada supra dever-se-á considerar como não escrita.

SEM CONCEDER: A PRESCRIÇÃO DO PROCEDIMENTO CONTRA-ORDENACIONAL

12. As quarto contra-ordenações imputadas ao ora Recorrente nos presentes autos irão necessariamente prescrever, com toda a probabilidade ainda antes da subida do presente recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa e da prolação de acórdão definitivo sobre o mesmo.

13.  Por força da conjugação do artigo 418.º, n.º 1, do CVM, na redacção atribuída pelo Decreto-Lei n.º 486/99 – aplicável ao caso concreto –, com o artigo 28.º do RGCO, o prazo máximo de prescrição nunca poderá ultrapassar os 7 anos e 6 meses.

14. A este prazo,acrescerão as três causasde suspensão que resultam do da legislação covidiana e do artigo 27.º, n.º 1 al. c) e n.º 2 do RGCO.

15. Com efeito, ocorreram no presente processo, três causas susceptíveis de determinar a suspensão do prazo de prescrição, nos termos do artigo 27.º-A, n.º 1, do RGCO:
a) A primeira suspensão de 86 dias teve lugar entre 9 de Março de 2020 e 2 de Junho de 2020, por força do disposto no artigo 7.º, n.os 1, 6, alínea d), 3, 9 alínea b), da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março, na redacção dada pelo artigo 2.º da Lei n.º 4-A/2020, de 6 de Abril;
b) A segunda de 74 dias ocorreu entre 22 de Janeiro de 2021 e 5 de Abril de 2021, por força do disposto nos artigos 2.º e 4.º da Lei n.º 4-B/2021, de 1 de Fevereiro (que aditou o artigo 6.º-C à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março) e nos artigos 6.º e 7.º da Lei n.º 13-B/2021, de 5 de Abril (artigo 6.º-C, n.os 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março);
c) A terceira causa de suspensão pelo período máximo de 6 meses operou, com a notificação do despacho que recebeu os recursos de impugnação judicial, como resulta do artigo 27.º-A, n.º 2 do RGCO.

16. De resto, contrariamente ao entendimento sufragado pelo Tribunal de 1.ª instância, não há lugar, no presente processo, à aplicação do artigo 418.º, n.º 2 do CVM,na redacção introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de Maio de 2017.

17. Nestes termos, ao prazo máximo de prescrição do procedimento de 7 anos e 6 meses acrescerá o prazo de seis meses e 160 dias de suspensão do prazo de prescrição.

18.   Pelo exposto, por força da conjugação do artigo 418.º, n.º 1, do CVM, na redacção em vigor à data da prática dos factos nos presentes autos, com o artigo 27.º-A, n.º 1, al. c), artigo 27.º-A, n.º 2 e 28.º, n.º 3 do RGCO, o prazo de prescrição das contra-ordenações aqui em causa é de 8 anos e 160 dias.

19.   Ora, segundo o entendimento sufragado nas páginas 37 a 39 da Sentença Recorrida, o dies a quo, i.e. a data a considerar como o dia em que o facto ilícito das quatro contra-ordenações imputadas ao ora se consumou, é o dia 17 de Junho de 2014.

20. Nesta medida, a prescrição das duas supostas contra-ordenações pela alegada violação do dever de prestar informação com qualidade no prospecto de aumento de capital do BES de 2014, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CVM ocorrerá no dia 26 de Novembro de 2022.

21. Na mesma linha, a prescrição das duas contra-ordenações pela alegada violação do dever de requerer adenda ao prospecto de aumento de capital do BES de 2014, previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CVM terá lugar em 26 de Novembro de 2022.

22. Ora, uma vez que o prazo para o Recorrente interpor o presente recurso termina no dia 31 de Outubro de 2022 e o prazo para o Ministério Público apresentar as contra-alegações terminará, em princípio, no dia 23 de Novembro de 2022, é pouco provável (ou mesmo até impossível) que os recursos sejam admitidos e que seja ordenada a sua subida para o Tribunal da Relação de Lisboa antes da prescrição do procedimento.

23. Em face do exposto, a prescrição das quatro contra-ordenações imputadas ao ora Recorrente deve ser declarada, a partir do dia 26 de Novembro de 2022 e, em consequência, o ora Recorrente deve ser absolvido.

A INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 418.º, N.º 2, DO CVM, NA REDACÇÃO INTRODUZIDA PELA LEI N.º 28/2017,DE 30 DE MAIO,E O ARTIGO 2.º DESTA MESMA LEI N.º 28/2017,DE 30 DE MAIO

24. Como resulta da nova redacção do n.º 2 do artigo 418.º, alterada pela Lei n.º 28/2017, de 30 de Maio (Lei n.º 28/2017), foi definida uma nova causa de suspensão do prazo de prescrição e de alargamento do prazo máximo de prescrição do procedimento contra-ordenacional para as contra-ordenações previstas no Código de Valores Mobiliários.

25. Esta nova causa de suspensão do prazo de prescrição opera caso a decisão condenatória
proferida pela entidade administrativa seja confirmada total ou parcialmente pelo tribunal que julgar o recurso de impugnação judicial de tal decisão.

26. No entanto, a causa de suspensão da prescrição prevista no n.º 2 do artigo 418.º do CVM, na versão alterada pela Lei n.º 28/2017, de 30 de Maio, não poderia em caso algum ter sido aplicada aos presentes autos, como o foi na Sentença Recorrida, uma vez que tal configura uma aplicação retroactiva de lei posterior desfavorável ao arguido, proibida nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 3.º do RGCO, ex vi artigo 407.º do CVM.

27. Em primeiro lugar, os factos imputados ao ora Recorrente nestes autos terão sido praticados entre 15 de Maio de 2014 e 17 de Junho de 2014, ou seja, três anos antes da entrada em vigor desta Lei, em 30 de Junho de 2017.

28. Nestes termos, é evidente que a data da entrada em vigor da nova causa de suspensão do prazo de prescrição do procedimento contra-ordenacional, previsto no n.º 2 do artigo 418.º do CVM, alterado pela Lei n.º 28/2017, de 30 de Maio, corresponde a um momento posterior ao momento da prática dos alegados factos imputados nos presentes autos ao ora Recorrente.

29. Em segundo lugar, as normas sobre as causas de suspensão da prescrição e os prazos máximos de prescrição têm natureza processual material, (ou, no limite, natureza mista, incluindo uma vertente substantiva), porquanto afectam a situação substancial do arguido.

30. Nessa medida, qualquer alteração legislativa que agrave o referido prazo prescricionalseja através do alargamento do seu período máximo, seja através da previsão de novas causas de suspensão – não pode ser aplicada a factos ocorridos antes dessa alteração legislativa, sob pena de aplicação retroactiva da lei criminal / contra-ordenacional de forma desfavorável ao arguido.

31. É evidente que a aplicação aos presentes autos do disposto no n.º 2 do artigo 418.º do CVM, alterado pela Lei n.º 28/2017, efectivamente agrava a situação do ora Recorrente: esta norma não só prevê uma nova causa de suspensão do prazo de prescrição, como a sua aplicação conduz, necessariamente, a um efectivo alargamento do prazo máximo de prescrição.

32. Sendo certo que, na verdade, da aplicação do artigo 418.º, n.º 2 do CVM resulta um prazo de prescrição eterno, visto que esta norma não estabelece um limite ou prazo máximo para a suspensão do prazo de prescrição, o que é absolutamente inadmissível.

33. Em terceiro lugar, a aplicação retroactiva desta nova causa de suspensão da prescrição prevista no n.º 2 do artigo 418.º do CVM contraria frontalmente a jurisprudência uniforme dos tribunais superiores, nomeadamente, a jurisprudência do Tribunal Constitucional, do Supremo Tribunal de Justiça, do Supremo Tribunal Administrativo e até dos Tribunais da Relação de Lisboa e do Porto.

34. Do exposto resulta que a aplicação retroactiva da causa de suspensão dos prazos de prescrição prevista no n.º 2 do artigo 418.º do CVM, alterado pela Lei n.º 28/2017, de 30 de Maio, ao presente processo contra-ordenacional, imposta na Sentença Recorrida, viola o princípio da proibição da aplicação retroactiva de lei desfavorável ao arguido, previsto no artigo 29.º, n.ºs 1 e 4, da CRP.

35. Em qualquer caso, o artigo 418.º, n.º 2, do CVM, na redacção introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de Maio, interpretado no sentido de que a causa de suspensão da prescrição aí prevista é aplicável aos processos contra-ordenacionais pendentes aquando da entrada em vigor desta Lei, em que estejam em causa ou discussão alegados factos ilícitos imputados ao arguido praticados antes de 30 de Junho de 2017, é inconstitucional, por violação das garantias do direito de defesa do arguido, consagradas no artigo 32.º, n.os 1 e 10, da CRP, dos princípios da confiança e segurança jurídicas ínsitos ao Estado-de-Direito consagrado no artigo 2.º da CRP, do princípio da proibição da aplicação retroactiva de lei desfavorável ao arguido, previsto no artigo 29.º, n.ºs 1 e 4, da CRP e, ainda, do princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 18.º, n.º 3, da CRP.

36. De igual modo, o artigo 2.º da Lei n.º 28/2017, de 30 de Maio, que veio alterar a redacção do n.º 2 do artigo 418.º do CVM, interpretado no sentido de que a nova causa de suspensão da prescrição prevista no n.º 2 do artigo 418.º do CVM é aplicável aos processos contra-ordenacionais pendentes aquando da entrada em vigor desta Lei, em que estejam em causa ou discussão alegados factos ilícitos imputados ao arguido praticados antes de 30 de Junho de 2017, é inconstitucional, por violação das garantias do direito de defesa do arguido, consagradas no artigo 32.º, n.os 1 e 10, da CRP, dos princípios da confiança e segurança jurídicas ínsitos ao Estado-de-Direito consagrado no artigo 2.º da CRP, do princípio da proibição da aplicação retroactiva de lei desfavorável ao arguido, previsto no artigo 29.º, n.ºs 1 e 4, da CRP e, ainda, do princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 18.º, n.º 3, da CRP.

37. Mais: o artigo 418.º, n.º 2, do CVM, na redacção introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de Maio, conjugado com o artigo 2.º desta mesma Lei n.º 28/2017, de 30 de Maio, interpretados no sentido de que a causa de suspensão da prescrição aí prevista é aplicável aos processos contra-ordenacionais pendentes aquando da entrada em vigor desta Lei, em que estejam em causa ou discussão alegados factos ilícitos imputados ao arguido praticados antes de 30 de Junho de 2017, é inconstitucional, por violação das garantias do direito de defesa do arguido, consagradas no artigo 32.º, n.os 1 e 10, da CRP, dos princípios da confiança e segurança jurídicas ínsitos ao Estado-de-Direito consagrado no artigo 2.º da CRP, do princípio da proibição da aplicação retroactiva de lei desfavorável ao arguido, previsto no artigo 29.º, n.ºs 1 e 4, da CRP e, ainda, do princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 18.º, n.º 3, da CRP.

A ALEGADA FALTA DE QUALIDADE E A ALEGADA NÃO DIVULGAÇÃO DA INFORMAÇÃO QUANTO À EXPOSIÇÃO DO BES À ESFG E SUBSIDIÁRIAS

38. Na Sentença Recorrida, o Tribunal de 1.ª instância imputa ao ora Recorrente a prática de uma contra-ordenação pela alegada violação do dever de prestar informação com qualidade no prospecto,previsto no artigo 135.º,n.º1,do CVM, quanto ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do prospecto.

39. Mais se condenou o ora Recorrente pela infracção consubstanciada na alegada violação do dever de requerer adenda ao prospecto de aumento de capital do BES de 2014, previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CVM, quanto ao aumento da exposição directa do BES às sociedades do Grupo ESFG, por força dos financiamentos concedidos pelo BES àquelas em 30.05.2014.

40. No entanto, estas duas imputações deverão cair pela base.

DA IRRELEVÂNCIA DA INFORMAÇÃO FINANCEIRA PARA A CONFORMAÇÃO DA DECISÃO DE INVESTIMENTO PELOS DESTINATÁRIOS DA OFERTA:A INSUFICIÊNCIA DA MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA

41. Na tese da Sentença Recorrida, é imputada uma suposta falta de completude e actualidade do prospecto por umsuposto diferencial de EUR 243 milhões, no que diz respeito à exposição do BES à ESFG, atenta a referência de EUR 290 milhões que constava do Prospecto.

42. É, igualmente, imputada uma contra-ordenação ao ora Recorrente, relativa à não divulgação de uma adenda ao prospecto, em função do aumento da exposição do BES à ESFG e subsidiárias, por, em 30 de Maio de 2014, o BES ter concedido financiamentos à ESFG e subsidiárias de cerca de EUR 194 milhões.

43. No entanto, da mera leitura da Sentença Recorrida, resulta que o elenco de factos provados da Sentença é omisso quanto a quaisquer factos concretos que permitam a conclusão de que aqueles diferenciais eram relevantes para a decisão de investimento dos destinatários da oferta.

44. Não resulta dos factos provados na Sentença Recorrida, que os alegados diferenciais de (i) EUR 243 milhões, no que diz respeito à exposição do BES ao grupo ESFG, entre 31.12.2013 e a data da aprovação do prospecto, e de (ii)EUR 194 milhões, no que diz respeito à exposição do BES ao Grupo ESFG em 30.05.2014, fossem significativos ou tivessem uma materialidade ou relevância tal que pudessem interferir na decisão dos investidores de participar na oferta pública de subscrição.

45. Para efeitos da imputação objectiva das contra-ordenações aqui em causa, não é suficiente o Tribunal de 1.ª instância afirmar, em termos absolutamente conclusivos e genéricos, que a informação alegadamente omitida no Prospecto a este respeito era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma e tinha relevo para a tomada de decisão de investimento.

46. Como é lógico,estando emcausa um elemento constitutivo do tipo das contra-ordenações aqui imputadas, o mesmo tem de ser aferido com recurso a factos concretos e objectivos (os quais, de resto, seriam apenas susceptíveis de ser demonstrados por perícia financeira ou, no limite, por prova testemunhal).

47. Se as operações com partes relacionadas, e in casu, os financiamentos concedidos ao Grupo ESFG configuram operações que, pela sua própria natureza,envolvem um risco de inadequado relato financeiro, e, por esse motivo, é relevante para os investidores conhecer o montante dessas operações, o Tribunal deveria ter dado tal premissa como provada.

48. Deveria, pelo menos, resultar dos factos provados que as operações com partes relacionadas configuram operações que,pela sua própria natureza, envolvem um risco de inadequado relato financeiro, o que, como é evidente, não foi o caso.

49. Por outro lado, sempre faltaria demonstrar, através de factos concretos e objectivos, que a informação sobre o relato financeiro tinha efectivamente relevo para a decisão de investimento.

50. No entanto, não foi produzida qualquer prova nesse sentido.

51. Em rigor, está em causa uma insuficiência da matéria de facto, que resulta da mera leitura da própria Sentença Recorrida, e que releva, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 410.º, n.º 2 - al. a), do CPP, ex vi artigos 41.º, n.º 1, e 74.º, n.º 4, do RGCO.

52. Pelo exposto, a insuficiência da matéria de facto provada resultante da falta de factos provados na Sentença Recorrida que permitam sustentar que a informação sobre o montante total dos financiamentos concedidos à ESFG e o aumento da exposição do BES ao Grupo ESFG era relevante para a conformação da decisão de investimento pelos destinatários na oferta de aumento de capital configura um vício da sentença recorrida, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 410.º, n.º 2, alínea a) do CPP aplicável ex vi artigo 41.º, n.º 1 e 74.º, n.º 4, do RGCO, devendo a mesma ser revogada, ordenando-se a baixa do processo para correcção do vício, o que se REQUER.

53. A necessidade e/ou relevância da informação no prospecto para a tomada de decisão de investimento pelos destinatários da oferta é um elemento constitutivo dos tipos contra-ordenacionais imputados ao ora Recorrente nos presentes autos, traduzidos na violação dos deveres previstos nos artigos 135.º, n.º 1 e 142.º, n.º 1, do CVM.

54. Conforme resulta do exposto, na Sentença Recorrida não resultou provado qualquer facto concreto e objectivo a propósito da relevância da informação económica e financeira alegadamente omitida para a conformação da decisão de investimento pelos destinatários na oferta de aumento de capital.

55. Por conseguinte, é forçoso concluir que, à luz da matéria de facto provada na Sentença Recorrida, não está preenchido o tipo objectivo das contra-ordenações aqui imputadas, pela violação do disposto no artigo 135.º, n.º 1, e no artigo 142.º, n.º 1, do CVM.

56. Nestes termos, as imputações feitas na Sentença Recorrida ao ora Recorrente a respeito da falta de qualidade da informação do prospecto e da não divulgação de adenda ao prospecto quanto ao aumento da exposição do BES à ESFG devem cair pela base, e, em consequência, o Recorrente deve ser absolvido.

DA FALTA DE MATERIALIDADE DAS OPERAÇÕES DE FINANCIAMENTO À ESFG

57. Contrariamente ao sustentado na Sentença Recorrida,nenhum dos aumentos da exposição do BES à ESFG a que se reporta a Sentença se afiguraram “relevantes para a decisão dos destinatários” do prospecto, para efeitos de formarem o juízo de subscrição ou investimento nas novas acções emitidas pelo BES, no âmbito do aumento de capital de 2014.

58. EM PRIMEIRO LUGAR, nem o aludido diferencial de EUR 243 milhões, nem o de EUR 194 milhões se afigurariam materiais ou susceptíveis de interferir ou impedir a formação de juízos fundados dos investidores quanto à subscrição das novas acções do BES, para efeitos de análise da situação patrimonial, económica e financeira do BES.

59. Assim, o aludido diferencial de EUR 243 milhões corresponderia apenas a 0,25% dos activos totais, 0,29% do activo e, aproximadamente, 0,48% do crédito a Clientes, por referênccia a 31 de Março de 2014.

60. Na mesma linha, o montante de um financiamento de EUR 194 milhões não se afigurou, minimamente, material face à actividade do BES, à luz dos factos conhecidos até 9 de Junho de 2014 ou, mesmo até 17 de Junho de 2014: correspondia apenas a 0,20% dos activos totais, 0,23% do activo e, aproximadamente, 0,38% do crédito a Clientes, por referêcncia a 31 de Março de 2014.

61. EM SEGUNDO LUGAR, a relevância do factor de materialidade da exposição a partes relacionadas e, neste caso, dos diferenciais de EUR 243 milhões ou de EUR 194 milhões nos termos que acabamos de explicar também resulta das recentes alterações legislativas introduzidas ao Código dosValores Mobiliários, nomeadamente o artigo 249.º-B, n.º1, doCVM, aditado ao CVM pelo artigo 3.º da Lei n.º 50/2020, de 25 de Agosto, e o artigo 29.º-T aditado ao CVM pelo artigo 16.º da Lei n.º 99-A/2021, de 31 de Dezembro.

62. De acordo com estas normas, as sociedades emitentes de acções admitidas à negociação em mercado regulamentado apenas ficariam obrigadas a divulgar publicamente as transacções com parte relacionadas se o valor das operações em causa fosse igual ou superior a 2,5% do activo consolidado da emitente.

63. Em consequência, resulta evidente que as operações com partes relacionadas do Grupo BES e, in casu, o aumento da exposição do BES à ESFG e às suas subsidiárias, apenas teriam relevo, ou seriam significativas para a decisão de investimento se o montante dos financiamentos fosse igual ou superior a 2,5% do activo consolidado do BES.

64. Caso contrário, nem sequer existiria uma obrigatoriedade de divulgação púbica de tais operações.

65. Se o legislador entendeu que apenas a partir de determinado montante é que seria obrigatório divulgar uma operação entre partes relacionadas de um emitente, é porque, quando as transacções sejam realizadas abaixo desse montante, as mesmas não assumem uma relevância ou importância tal que seja necessário o emitente o informar ao mercado.

66. Ora, como vimos supra, tanto no caso dos financiamentos concedidos que conduziram ao aumento de exposição do BES à ESFG e subsidiárias de EUR 290 milhões para EUR 533 milhões, à data de aprovação do prospecto, como no caso dos financiamentos que levaram ao aumento de exposição do BES à ESFG e subsidiárias de EUR 533 milhões para EUR 727 milhões, o valor do diferencial em ambos os casos é inferior a 2,5 % do activo consolidado do BES.

67. Aliás, em ambos os casos, não atinge sequer o meio ponto percentual.

68. Acresce que, o CVM também sofreu alterações a propósito da informação semestral a ser divulgada pelos emitentes de acções e de valores mobiliários representativos de dívida, conforme resulta das alterações introduzidas ao artigo 246.º do CVM pelo Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de Outubro, e artigo 29.º-J foi aditado ao CVM, pela Lei n.º 99-A/2021, de 31 de Dezembro

69. Nestes termos, o CVM passou a prever que as divulgações semestrais devem incluir informação sobre transacções relevantes entre partes relacionadas desde que tais operações tenham afectado significativamente a situação financeira do emitente, ou quando tenham um efeito significativo na sua posição financeira ou desempenho (cfr. alterações introduzidas ao artigo 246.º do CVM pelo Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de Outubro, e artigo 29.º-J foi aditado ao CVM, pela Lei n.º 99-A/2021, de 31 de Dezembro).

70. Assim, e igualmente, não será todo e qualquer aumento de exposição a uma parte relacionada do BES que relevará para a decisão de investimento.

71. Pelo que é forçoso concluir que o BES não era obrigado a divulgar publicamente as operações de financiamento à ESFG e subsidiárias, enquanto operações entre partes relacionadas, por não serem operações significativas, e atenta a sua falta de materialidade.

72. Se não estava obrigado a divulgar tais operações publicamente e ao mercado, parece evidente que os financiamentos à ESFG e às suas subsidiárias aqui em causa, e o aumento de exposição do BES à ESFG que os mesmos implicaram, não assumiriam relevância para a decisão de investimento.

73. Em face de todo o exposto, uma vez que a necessidade e/ou relevância da informação no prospecto para a tomada de decisão de investimento pelos destinatários da oferta é um elemento constitutivo dos tipos contra-ordenacionais imputados ao ora Recorrente nos presentes autos, é forçoso concluir que não está preenchido o tipo objectivo das contra-ordenações aqui imputadas, pela violação do disposto no artigo 135.º, n.º 1, e no artigo 142.º, n.º 1, do CVM.

74. Nestes termos, deve o presente recurso ser julgado procedente e a Sentença Recorrida revogada na parte em que condenou o ora Recorrente por estas duas infracções relacionadas com a informação divulgada sobre a exposição do BES à ESFG e às suas subsidiárias e, em consequência, o ora Recorrente deve ser absolvido.

A ALEGADA FALTA DE QUALIDADE DA INFORMAÇÃO SOBRE O BESA NO PROSPECTO AACTUALIDADE DA INFORMAÇÃO SOBRE O BESADECORRE DA PRÓPRIA SENTENÇA RECORRIDA

75. Na Sentença Recorrida, o Tribunal tanto entende que, no que se refere à exposição do BES ao Grupo ESFG, deveria estar indicado no Prospecto o montante total de financiamentos à data da aprovação do prospecto (ou seja, com referência a Maio de 2014), mas os ora Recorrentes apenas atenderam à informação de 31.12.2013 (cfr. facto provado n.º 112 da Sentença)...

76. ...como depois afirma que, no caso da situação financeira do BESA, haveria que informar da situação do BESA no final de 2013, mas o BES e o ora Recorrente apenas atenderam à informação à data de aprovação do prospecto, incluindo a referência à garantia soberana de Angola (cfr. factos provados n.º 133 e 134).

77. Por um lado, o Tribunal defende que divulgar a informação por referência à data do prospecto equivale a prestar informação incompleta, e que se deveria incluir informação do ano anterior, mas, por outro lado, limitar-se a divulgar informação por referência ao ano anterior reconduz-se a prestar informação incompleta e desactualizada, pelo que os arguidos deveriam prestar informação por referência à data do prospecto.

78. Assim, verifica-se uma contradição insanável na fundamentação de facto da Sentença Recorrida a qual deve deve ser revogada, nos termos e para os efeitos do disposto na al. b) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, aplicável ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO, e, em consequência, ser ordenada a baixa do processo com vista à sanação deste vício.

79. Acresce que,atenta a referência temporal referida pela CMVM – i.e., “no final do ano de 2013” – é forçoso concluir que as imputações feitas ao ora Recorrente não lhe podem ser imputadas.

80. Ora, tendo em conta que, em 15 e 20 de Maio de 2020, o BES já dispunha de informação sobre o BESA mais actual do que a informação que era conhecida no “final do ano de 2013”, a imputação feita pela Decisão Recorrida, por referência a Outubro e Novembro de 2013 não tem qualquer fundamento (cfr. factos provadosn.os 114 a 118 e 124. a 132. da SentençaRecorrida).

81. De facto, mediante a emissão da Garantia Soberana de Angola em 31 de Dezembro de 2013, a favor do BESA e com impacto positivo no BES – à luz dos factos conhecidos em 15 e 20 de Maio de 2020 –, a informação que era conhecida em Outubro e Novembro de 2013 deixou de ser actual e era em absoluto irrelevante, pelo que a sua inclusão faria com que o prospecto contivesse informação desactualizada e não fosse claro.

82. A referência feita à Garantia Soberana de Angola no ponto 2.1.23 na página 60 do prospecto do aumento de capital do BES, em sede de “Factores de Risco”, dada como provada no facto provado n.º 115, foi – em face dos factos então conhecidos – completa, actual e verdadeira.

83. A verdade é que, em face dos factos conhecidos em 15 e 20 de Maio de 2014, a garantia soberana emitida pela República de Angola assegurava, de forma consistente, os riscos da carteira de crédito do BESA (e, nessa medida, a exposição do BES ao BESA estava, igualmente, assegurada).

84. Pelo que é forçoso concluir que em face dos factos conhecidos em 15 e 20 de Maio de 2014, a informação inserida no prospecto de aumento de capital do BES relativa à situação do BESA correspondia aà informação conhecida àquela data pelo ora Recorrente.

85. Nestes termos, deve o presente recurso ser julgado procedente e a Sentença Recorrida revogada na parte em que condenou o ora Recorrente pela infracção relativa à incompletude da informação que constava do prospecto de aumento de capital em Maio de 2014, relativa à situação do BESA em finais de 2013, e, em consequência, o ora Recorrente deve ser absolvido.


DO ERRO NA PONDERAÇÃO DO FACTOR DE RISCO SOBRE O BESACONTIDO NO PROSPECTO

86. Em qualquer caso e sem conceder, a verdade é que a Sentença Recorrida dá como provada a advertência feita no prospecto a propósito do factor de risco BESA e da garantia bancária soberana da República de Angola, mas depois, na fundamentação, desconsidera por completo o que consta deste factor de risco.

87. A verdade é que, mesmo com a Garantia Soberana de Angola em vigor em Maio de 2014, com natureza autónoma e irrevogável, o prospecto do aumento de capital do BES salientou, expressamente, que o incumprimento dos créditos ou a desvalorização dos imóveis garantidos poderia ter um efeito negativo no BESA, e por esta via, causar um efeito negativo na situação financeira e nos resultados do Grupo BES, em caso de não renovação da garantia.

88. No entanto,o Tribunal de 1.ª instância simplesmente desconsiderou esta advertência constante dos factores de risco do prospecto, isto é, a Sentença Recorrida ignorou e desconsiderou, agora, a 2.ª parte do 4.º parágrafo do ponto 2.1.23 dos factores de risco do prospecto de aumento de capital (página 60 do prospecto) e que consta do facto provado n.º 115 da Sentença.

89. A verdade é que a matéria da garantia soberana emitida pela República Angolana não pode ser dissociada da informação divulgada no prospecto sobre a situação patrimonial do BESA, uma vez que, como indicado no prospecto, estamos a falar de factos sequenciais e conexionados entre si.

90. Se, tanto quanto era do conhecimento do ora Recorrente, a garantia soberana salvaguardava o BESA face aos riscos que podiam advir da sua carteira de créditos concedidos aos respectivos clientes (e imóveis) e, nessa medida, a exposição do BES ao BESA também ficaria assegurada, não haveria qualquer razão para fazer mais advertências ao nível deste factor de risco no prospecto.

91. Sob pena de, caso o prospecto não contivesse a informação que tinha a este propósito, ou se limitasse a indicar a situação anterior do BES com referência a 31 de Dezembro de 2013, então o prospecto tornar-se-ia pouco claro, desactual e desconforme.

92. Donde resulta que não houve qualquer omissão de informação pelo ora Recorrente, pelo que não se verificam nenhuns dos elementos constitutivos do tipo de ilícito.

93. Nestes termos, as imputações feitas na Sentença Recorrida ao ora Recorrente a respeito da falta de qualidade da informação do prospecto de aumento de capital do BES por o mesmo não ser completo, por falta de informação relativa ao BESA deverão improceder, e, em consequência, o Recorrente deve ser absolvido.

A ALEGADA NÃO DIVULGAÇÃO DE INFORMAÇÃO SOBRE A EMISSÃO DAS CARTAS DE CONFORTO  - AINSUFICIÊNCIA DA MATÉRIA DE FACTO PROVADA

94. Na Sentença Recorrida, o Tribunal de 1.ª instância limita-se a dar como provado, nos factos provados n.º 343 e 351, k), em termos genéricos e abstractos, que o ora Recorrente tinha conhecimento de que a informação sobre a emissão,pelo BES, das cartasde conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma.

95. O Tribunal limita-se a referir que o ora Recorrente sabia que esta informação era necessária para a decisão de investimento pelos destinatários da Oferta apenas com base no facto de o Recorrente as ter assinado e conhecer o seu conteúdo.

96. No entanto, tal é, evidentemente, insuficiente para concluir pela relevância dessa matéria para a conformação da decisão de investimento pelos destinatários na oferta de aumento de capital.

97. A relevância desta informação deve ser efectivamente demonstrada e provada na decisão, através da realização de produção de prova, designadamente de uma perícia financeira ou, no limite, através da produção de prova testemunhal, mas tal não foi o caso da Sentença Recorrida.

98. Nesta medida, resulta evidente que, da mera leitura da Sentença Recorrida, não constam quaisquer factos provados concretos que permitam concluir que a informação sobre a emissão, pelo BES, das cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma.

99. Pelo exposto, a insuficiência da matéria de facto provada resultante da falta de factos provados na Sentença Recorrida que permitam sustentar que a necessidade da informação sobre a emissão pelo BES das “cartas de conforto” em favor das sociedades do grupo PDVSA para a decisão de investimento dos destinatários da Oferta configura um vício da sentença recorrida, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 410.º, n.º 2, alínea a) do CPP aplicável ex vi artigo 41.º, n.º 1 e 74.º, n.º 4, do RGCO, devendo a mesma ser revogada, ordenando-se a baixa do processo para correção do vício, o que se REQUER.

100. De resto, e como já referimos supra, a necessidade e/ou relevância da informação no prospecto para a tomada de decisão de investimento pelos destinatários da oferta é um elemento constitutivo do tipo contra-ordenacional imputado ao ora Recorrente nos presentes autos.

101. Por conseguinte, na falta de prova de factos concretos e objectivos que permitam sustentar que a necessidade da informação sobre a emissão pelo BES das “cartas de conforto” em favor das sociedades do grupo PDVSA para a decisão de investimento dos destinatários da Oferta, será forçoso concluir que não está preenchido o tipo objectivo das contra-ordenações aqui imputadas, pela violação do disposto no artigo 142.º, n.º 1, do CVM.

AS CARTAS DE CONFORTO NÃO IMPLICAM UM COMPROMISSO DE REEMBOLSO PELO BES DOS INSTRUMENTOS DE DÍVIDA EMITIDOS PELA ESI

102. Em qualquer caso, a imputação ao ora Recorrente de uma alegada contra-ordenação, pela suposta violação do dever de realizar uma adenda ao prospecto, em função da subscrição de duas cartas de conforto, da qual alegadamente resultaria uma exposição adicional do BES no valor de EUR 372 milhões, é manifestamente improcedente.

103. Em primeiro lugar, a Sentença Recorrida incorre numa incongruência ao qualificar ad nauseum os documentos de fls. 2.246 e 2.247 da pasta 5 como meras “cartas de conforto” (sic), mas, por outro lado, concluir que estas cartas implicaram um “compromisso de reembolso”, a Decisão Recorrida incorre numa incongruência – cfr., literalmente, os facto provados n.os 142., 143., 145. a 148. e 339. a 343 da Sentença.

104. Não obstante ter qualificado os aludidos documentos como “cartas de conforto” por onze vezes, a Sentença conclui que os mesmos teriam tido o efeito de que o BES tivesse assumido o “compromisso de reembolsar os títulos de dívida emitidos pela ESI” (cfr. factos provados n.os 143. e 339. da Sentença Recorrida).

105. Porém, caso o BES pretendesse assumir uma obrigação de “financiar” e os clientes Fonden e Banco de Desarollo Economico y Social tivessem o propósito certo e inequívoco de beneficiar desse “financiamento”, certamente que não se iriam submeter às fragilidades e debilidades de uma “carta de conforto”.

106. Com efeito, uma normal empresa de natureza internacional, experimentada em negócios, não espera assegurar um financiamento atravésde uma simples e fraca “carta de conforto” e, ainda para mais, com uma redacção fraca ou débil... e com gralhas.

107. Em segundo lugar, ao contrário do raciocínio conclusivo dos factos provados n.os 143. e 339. da Sentença Recorrida, a primeira frase das “cartas de conforto” marca e delimita o seu propósito e os respectivos limites: prestar uma mera informação aos clientes destinatários (fls. 2.246 e 2.247 da pasta 5).

108. De resto, trata-se de uma informação pouco rigorosa e incerta (até aqui se reflectiu o carácter informal destas cartas), reportando-se a uma mera “intenção” de um terceiro (uma “intenção” da Rio Forte de proceder à emissão de dívida), o que afasta qualquer carácter vinculativo destas cartas de conforto.

109. Em terceiro lugar, esta cartas visaram apenas “confortar” e comunicar aos destinatários que, se e quando a Rio Forte viesse a emitir dívida, então aí o BES iria usar da normal diligência de um intermediário financeiro com vista a que substituir a dívida da ESI colocada nos destinatários das cartas de conforto, através de uma de duas formas aí referidas.

110. Donde, por um lado: tudo estava dependente da verificação de um pressuposto baseado numa mera intenção, que nunca se veio a concretizar e, por outro lado, mesmo se este pressuposto tivesse ocorrido (mas não veio), de entre as duas alternativas ponderadas nessas cartas, não se refere em momento algum que haverá um financiamento do BES.

111. Em quarto lugar, caso houvesse uma qualquer intenção de obrigar o BES a conceder um financiamento, o texto da aludida carta preveria a data limite para a concessão do financiamento ou linha de crédito, o seu montante e forma para disponibilização dos fundos (e não meras informações sobre intenções incertas, que nem sequer se concretizaram).

112. Em quinto lugar, a criação de uma exposição para o BES, através da concessão de uma garantia ou um financiamento a um cliente institucional, implicaria uma declaração clara neste sentido, o que não foi o caso na prestação de informação vertida nas “cartas de conforto” em causa.

113. Em face do exposto, a Sentença Recorrida deve ser revogada e o ora Recorrente deve ser absolvido da prática da contra-ordenação pela não divulgação de uma adenda ao prospecto com a divulgação da informação sobre a emissão das cartas conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA, que lhe foi imputada nos presentes autos.

DA NULIDADE DA SENTENÇA RECORRIDA POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA SOBRE O TEOR DAS DECISÕES DA COMISSÃO LIQUIDATÁRIA NO PROCESSO DE LIQUIDAÇÃO/INSOLVÊNCIA DO BES

114. Na Sentença Recorrida, o Tribunal de 1.ª instância apenas deu como provada uma parte do texto das decisões da Comissão Liquidatária do BES no sentido do não reconhecimento dos créditos reclamados pelas sociedades do grupo PDVSA, no facto provado n.º 436 da Sentença Recorrida.

115. No entanto, na Sentença Recorrida, omitiram-se excertos relevantes da decisão da Comissão Liquidatária do BES; invocados expressamente nos artigos 964 a 988 das alegações do recurso de impugnação judicial do Recorrente.

116. Primeiro, a Comissão Liquidatária do BES entendeu que as “cartas de conforto” não consubstanciam qualquer garantia ao reembolso da dívida titulada da ESI que foi subscrita pelo BANDES e o FONDEN, tal como resulta dos 2.º, 5.º e 7.º parágrafos das decisões da Comissão Liquidatária do BES (cfr. fls. 8.360 e ss.).

117. Segundo, decorre do 6.º parágrafo das decisões da Comissão Liquidatária do BES (cfr. fls. 8.360 e ss.) que a Comissão Liquidatária do BES rejeitou a existência de qualquer “compromisso de reembolso” do BES, na medida em que as “cartas de conforto” estavam dependentes de uma condição (a emissão de títulos de dívida da Rioforte, que substituíssem os títulos de dívida da ESI subscritos pelo BANDES e FONDEN), que nunca se verificou.

118. Terceiro, resulta dos parágrafos 5.º e 6.º das decisões da Comissão Liquidatária do BES (cfr. fls. 8.360 e ss.), que a Comissão Liquidatária do BES considerou que as condutas descritas nas “cartas de conforto” não implicam uma obrigação de reembolso de títulos de dívida da ESI, à custa do património do BES, não havendo, por isso, qualquer obrigação do BES em liquidar ou financiar o reembolso destes títulos de dívida.

119. O Tribunal de 1.ª instância não podia ter optado por excluir ou desconsiderar as partes das decisões da Comissão Liquidatária do BES, como o fez na Sentença e se acaba de demonstrar.

120. Em face do exposto, dever-se-á julgar verificada e declarar a nulidade da SENTENÇA por omissão de pronúncia quanto ao teor das decisões da Comissão Liquidatária do BES, nos termos referidos supra, por força do disposto nos artigos 379.º, n.os 1, al. c), e 2 do CPP ex vi artigos 41.º, n.º 1, do RGCO e 232.º do RGICSF, devendo, em consequência, ser devolvido o processo ao Tribunal de 1.ª instância para que este possa suprir a referida nulidade.

DA DECISÃO DE NÃO RECONHECIMENTO DAS CARTAS COMO CRÉDITOS CONTRA O BES NO PROCESSO DE LIQUIDAÇÃO/INSOLVÊNCIA DO BES

121. Na Sentença Recorrida, o Tribunal de 1.ª instância limitou-se a afirmar que o entendimento perfilhado pela Comissão Liquidatária do BES não é de que a Comissão Liquidatária considerou que aqueles créditos não são devidos, o que não pode proceder.

122. De forma decisiva, no processo de liquidação do BES, a própria Comissão Liquidatária do BES determinou que as “cartas de conforto” (sic) não atribuíram – nem atribuem – qualquer crédito ao BANDES e FONDEN sobre o BES, nem tão-pouco tais “cartas de conforto” constituem qualquer garantia firme do BES quanto ao reembolso de títulos de dívida da ESI.

123. Por aqui fica demostrado – sem necessidade de argumentos adicionais – que o BES não assumiu qualquer responsabilidade, com base nas cartas de conforto, ao contrário do que é imputado na Sentença Recorrida.

124. É entendimento unânime na Jurisprudência que apenas é possível afirmar a existência de créditos contra o BES, caso tais créditos sejam reconhecidos no processo de liquidação do BES, por força do disposto no n.º 5 do artigo 128.º do CIRE (ex vi artigo 8.º, n.os 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 199/2006) (23).
(23) Nos termos do disposto no n.º 5 do artigo 128.º do CIRE, “A verificação tem por objecto todos os créditos sobre a insolvência, qualquer que seja a sua natureza e fundamento, e mesmo o credor que tenha o seu crédito reconhecido por decisão definitiva não está dispensado de o reclamar no processo de insolvência, se nele quiser obter pagamento”.

125. Pelo que, se no próprio processo de liquidação / insolvência do BES, a Comissão Liquidatária decidiu que as aludidas cartas de conforto não implicaram a assunção de uma dívida, por parte do BES, então o Tribunal de 1.ª instância não pode entender o contrário, nos presentes autos.

126. Em consequência, a imputação da contra-ordenação por suposta violação do dever de promover uma adenda ao prospecto, fundada na assinatura das aludidas “cartas de conforto”, cai pela base, porquanto está mais do que demonstrado que estas cartas não deram lugar a qualquer “compromisso de reembolso” por parte do BES.

A VIOLAÇÃO DO DEVER DE PRESTAR INFORMAÇÃO COM QUALIDADE NO PROSPECTO DE AUMENTO DE CAPITAL DO BES DE 2014 CONSUBSTANCIA A PRÁTICA DE UMA ÚNICA CONTRA-ORDENAÇÃO

127. A Sentença Recorrida imputa ao ora Recorrente a alegada prática de duas contra-ordenações consubstanciadas na alegada violação do dever de prestar informação com qualidade no prospecto de aumento de capital do BES de 2014, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CVM, previstas e punidas no artigo 393.º, n.º 2, alínea d), do CVM (cfr. página 834 da Sentença Recorrida).

128. Sucede que as infracções alegadamente praticadas pelo ora Recorrente não têm autonomia entre si, não podendo configurar mais do que uma contra-ordenação (sem conceder).

129. Por um lado, a pretensa actuação do ora Recorrente consubstanciadora das aludidas contra-ordenações é a mesma: (i) a aprovação do prospecto conhecendo a informação nele omitida e (ii) a não adopção, durante o período de duração da oferta, de qualquer conduta no sentido de sanar os vícios de qualidade de informação do prospecto (cfr. páginas 583, 584 e 593 da Sentença Recorrida).

130. Por outro lado, estando em causa a pretensa dupla violação do mesmo dever, é claro que o bem jurídico é o mesmo, consistindo na protecção dos investidores e a tutela da confiança destes no regular funcionamento do mercado.

131. Assim, quando muito, o facto de estar em causa a não inclusão de duas categorias de informação diferentes (i.e., o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do prospecto e situação financeira e patrimonial do BESA detectada em finais de 2013, que esteve na origem da emissão pela República de Angola, em 31.12.2013, da garantia soberana a favor do BESA, apenas poderá relevar, em sede de determinação da medida da sanção, ao abrigo do disposto no artigo 405.º do CVM («Determinação da sanção aplicável») (sem conceder).

132. Ou seja, está em causa uma única acção e omissão levada a cabo (sem conceder) por um mesmo agente, pelo que nem sequer se pode afirmar estar em causa o preenchimento do mesmo tipo legal mais do que uma vez.

133. Caso assim não se entenda, sem conceder, sempre será forçoso concluir estarem em causa contra-ordenações continuadas.

134. Nas contra-ordenações imputadas está em causa uma única resolução típica: a aprovação do prospecto conhecendo a informação nele omitida e a não adopção, durante o período de duração da oferta, de qualquer conduta no sentido de sanar os pretensos vícios de qualidade de informação do prospecto.

135. Por conseguinte, está em causa uma única contra-ordenação, ainda que possa ser configurada como uma contra-ordenação continuada, o que releva para fixar a medida da sanção, mas nunca para efeitos de imputar duas contra-ordenações.

136. Em face do exposto, é forçoso concluir que as supostas violações do dever de prestar informação com qualidade no prospecto, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CVM, quanto ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do prospecto e quanto à situação financeira e patrimonial do BESA detectada em finais de 2013, que esteve origem na emissão da República de Angola, em 31.12.2013, da garantia soberana a favor do BESA, imputadas ao ora Recorrente, nestes autos, nunca poderiam configurar a prática de contra-ordenações autónomas respeitantes a cada uma daquelas categorias de informação.

137. Por conseguinte, caso se considere que o Recorrente praticou as aludidas infracções (sem conceder) apenas poderá, no limite, ser imputada a prática de uma única contra-ordenação ao Recorrente, por cada pretensa violação do artigo 135.º, n.º 1, do CVM.

138. E, como tal, a Sentença Recorrida deve ser revogada e alterada em consequência com o ora exposto (sem conceder).

A VIOLAÇÃO DO DEVER DE REQUERER UM ADENDA AO PROSPECTO DE AUMENTO DE CAPITAL DO BES DE 2014 CONSUBSTANCIA A PRÁTICA DE UMA ÚNICA CONTRA-ORDENAÇÃO

139. O que vai exposto do capítulo precedente vale, mutatis mutandis, para a alegada prática de três contra-ordenações consubstanciadas na violação do dever previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CVM (i.e., dever de actualizar o prospecto do aumento de capital do BES de 2014), que apenas configuraria um único ilícito típico contra-ordenacional previsto e punível, nos termos do disposto no artigo 393.º, n.º 2 – al. c), do CVM.

140. Por um lado, também aqui a pretensa actuação do ora Recorrente consubstanciadora das aludidas contra-ordenações é a mesma: (i) o conhecimento dos factos supervenientes que alegadamente seriam relevantes para a decisão dos investidores e (ii) a não promoção de qualquer diligência no sentido de o BES requerer adenda ao prospecto quanto a esses factos (cfr. páginas 594 a 597 da Sentença Recorrida).

141. Por outro lado, estando em causa a pretensa dupla violação do mesmo dever, é claro que o bem jurídico é o mesmo, consistindo na protecção dos investidores e a tutela da confiança destes no regular funcionamento do mercado.

142. No limite, apenas poderia ser imputada ao ora Recorrente uma única contra-ordenação consubstanciada na alegada violação do dever de requerer adenda ao prospecto de aumento de capital do BES de 2014, previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CVM, quanto o aumento da exposição directa do BES às sociedades do Grupo ESFG e as cartas de conforto emitidas em 09.06.2014 (sem conceder).

143. Caso assim não se entenda, sem conceder, sempre será forçoso concluir estarem em causa contra-ordenações continuadas, porquanto está em causa uma única resolução típica: o não requerimento de adenda ao prospecto até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas acções ordinárias do BES.

144. Em face do exposto, é forçoso concluir que as supostas violações do dever de requerer adenda ao prospecto de aumento de capital do BES de 2014, previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CVM, quanto ao aumento da exposição directa do BES às sociedades do Grupo ESFG, e as cartas de conforto emitidas em 09.06.2014, imputadas ao ora Recorrente, nestes autos, nunca poderiam configurar a prática de contra-ordenações autónomas respeitantes a cada uma daquelas categorias de informação.

145. Por conseguinte, caso se considere que o Recorrente praticou as aludidas infracções (sem conceder) apenas poderá, no limite, ser imputada a prática de uma única contra-ordenação ao Recorrente, por cada pretensa violação do artigo 142.º, n.º 1, do CVM, o que determinará a revogação e alteração da Sentença Recorrida neste sentido.

SUBSIDIARIAMENTE: O CONCURSO APARENTE ENTRE AS CONTRA-ORDENAÇÕES IMPUTADAS POR FALTA DE QUALIDADE DA INFORMAÇÃO CONSTANTE DO PROSPECTO

146. A Sentença Recorrida andou mal ao entender que existiria um concurso efectivo entre duas contra-ordenações pela violação do dever de prestar informação com qualidade no prospecto de aumento de capital do BES de 2014, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CVM e entre duas contra-ordenações pela violação do dever de requerer adenda ao prospecto, previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CVM (cfr. páginas 834 e 835 da Sentença Recorrida), porquanto não têm autonomia entre si, reconduzindo-se a situações de claros concursos aparentes (sem conceder).

147. POR UM LADO, sem prejuízo de as infracções imputadas ao ora Recorrente em matéria de violação do dever de prestar informação com qualidade no prospecto, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CVM relativamente ao (i) o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do prospecto e situação financeira e (ii) à situação financeira e patrimonial do BESA detectada em finais de 2013, que esteve origem na emissão da República de Angola, em 31.12.2013, da garantia soberana a favor do BESA, não têm autonomia entre si, estando, em causa, quando muito, uma única contra-ordenação ou, no limite, uma contra-ordenação continuada, sempre será forçoso concluir pela existência de um concurso aparente, por consumpção.

148. Em primeiro lugar, é imputada ao ora Recorrente uma única pretensa conduta: a aprovação do prospecto conhecendo a informação nele omitida e a não adopção, durante o período de duração da oferta, de qualquer conduta no sentido de sanar os vícios de qualidade de informação do prospecto, que é a expressão de uma única resolução típica (sem conceder).

149. É combase na mesma e única conduta do ora Recorrente, que a Sentença lhe imputa a dupla violação do artigo 135.º, n.º 1, do CVM.

150. Em segundo lugar, está em causa a salvaguarda do mesmo bem jurídico: a protecção dos investidores e a tutela da confiança destes no regular funcionamento do mercado, pelo que é evidente que o desvalor jurídico por cada pretensa violação do n.º 1 do artigo 135.º do CVM é exactamente o mesmo.

151. Assim, as duas contra-ordenações pela violação do n.º 1 do artigo 135.º do CVM não podem ser simultaneamente imputadas ao ora Recorrente por se encontrarem numa relação de concurso aparente, por consumpção.

152. Por conseguinte, caso se considere que o Recorrente praticou as aludidas infracções (sem conceder) apenas poderá, no limite, ser imputada a prática de uma única contra-ordenação ao Recorrente, por cada pretensa violação do n.º 1 do artigo 135.º do CVM, sob pena de violação do princípio ne bis in idem previsto no artigo 29.º, n.º 5, da CRP.

153. POR OUTRO LADO, o que vai exposto vale, mutatis mutandis, para as duas contra- ordenações imputadas ao ora Recorrente consubstanciadas na alegada violação do dever previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CVM (i.e., dever de actualizar o prospecto do aumento de capital do BES de 2014).

154. Em primeiro lugar, apenas é imputada ao ora Recorrente uma única pretensa conduta: a não promoção de qualquer diligência no sentido de o BES requerer adenda ao prospecto quanto aos factos supervenientes, que é expressão de uma única resolução típica (sem conceder).

155. Em segundo lugar, o desvalor jurídico por cada pretensa violação do n.º 1 do artigo 142.º do CVM é precisamente o mesmo, porquanto está em causa a mesma pretensa actuação e a salvaguarda do mesmo bem jurídico: a protecção dos investidores e a tutela da confiança destes no regular funcionamento do mercado.

156. Assim, as duas contra-ordenações pela violação do n.º 1 do artigo 142.º do CVM não podem ser simultaneamente imputadas ao ora Recorrente por se encontrarem numa relação de concurso aparente, sob pena de violação do princípio ne bis in idem previsto no artigo 29.º, n.º 5, da CRP.

A INDETERMINABILIDADE DO TIPO OBJECTIVO E A INEXISTÊNCIA DE DOLO, OU SUBSIDIARIAMENTE, DE ERRO

157. A Sentença Recorrida imputa ao Recorrente a prática das seguintes contra-ordenações:

a) A prática de duas contra-ordenações por alegada violação do dever de qualidade da informação, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CVM, referente ao prospecto do aumento de capital social do BES de 2014, prevista e punida no artigo 393.º, n.º 2 – al. d), do CVM (cfr. V. al. a) i) e ii) página 856 da Sentença Recorrida);

b) A prática de duas contra-ordenações por alegada violação do dever previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CVM (i.e., dever de actualizar o prospecto do aumento de capital do BES de 2014), prevista e punida no artigo 393.º, n.º 2 – al. c), do CVM (cfr. V. al. b) i) e ii) páginas 856 e 857 da Sentença Recorrida).

158. Sucede que, as aludidas normas contêm conceitos normativos indeterminados e subjectivos, em violação do princípio da legalidade.

DA INCONSTITUCIONALIDADE POR INDETERMINAÇÃO DOS TIPOS CONTRA-ORDENACIONAIS PREVISTOS NAS ALÍNEAS C)E D)DO N.º 2 DO ARTIGO 393.º DO CVM

159. Por imposição do princípio da legalidade, as leis sancionatórias têm que ser redigidas com clareza, rigor e determinabilidade, para que seja apreensível tanto o seu conteúdo, como os seus limites, sob pena de violação do princípio da legalidade, consagrado nos artigos 2.º do RGCO e 1.º, n.º 1,do Código Penal (aplicávelex viartigo 407.º do CVM e artigo 32.º do RGCO).

160. Todo o direito sancionatório está submetido às garantias essenciais do direito penal, isto é, às garantias referentes à segurança, certeza, confiança e previsibilidade, por força do princípio do Estado de Direito consagrado no artigo 2.º da CRP.

161. Uma das vertentes do princípio da legalidade é a tipicidade (que impõe que a lei seja também estrita e certa), reportando-se à adequação da conduta ao tipo.

162. A legalidade dos ilícitos é obtida através da técnica da tipicidade, que consiste na descrição, de forma clara, precisa, rigorosa e determinável, da conduta ou dos factos considerados criminalmente reprováveis, para que seja apreensível tanto o seu conteúdo, como os seus limites.

163. Importa que a descrição da matéria proibida e de todos os demais requisitos de que dependa em concreto uma punição seja levada, pelo menos, a um ponto em que se tornem objectivamente determináveis os comportamentos proibidos e sancionados.

164. Reportando-nos às concretas contra-ordenações em causa – previstas no artigo 393.º, n.º 2, al. d), e al. c), do CVM – constata-se que as mesmas contêm normas que impõem deveres de actuação positiva, o que, já por si, obrigaria à concreta determinação do que são aqueles deveres (previstos nos artigos 135.º, n.º 1, e 142.º, n.º 1, do CVM).

165. Com efeito, os tipos de ilícito (seja penal, seja contra-ordenacional) que impõem uma conduta positiva – como os que estão aqui em causa – têm, obrigatoriamente, de determinar os concretos pressupostos em que esta conduta deve ter lugar e, ainda, os termos em que pode ser prestada.

166. Porém, no caso concreto, o legislador usou conceitos normativos, genéricos, indeterminados e subjectivos, que obstam à determinabilidade objectiva das condutas proibidas – e, em particular, dos concretos pressupostos da conduta positiva que deve ter lugar – e demais elementos de punibilidade requeridos.

167. EM PRIMEIRO LUGAR, no que diz respeito à alegada contra-ordenação por violação do dever de qualidade da informação, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CVM, pretende-se sancionar a violação do dever de incluir, no prospecto, de informação completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita, que permita aos destinatários formar juízos fundados sobre a oferta, segundo os modelos previstos no Regulamento (CE) n.º 809/2004, da Comissão,de 29 de Abril (cfr. artigos 393.º, n.º 2 – al. d) e 135.º, n.º 1 do CVM).

168. Aquela norma tem um duplo grau de indeterminação.

169. Isto porque, por um lado, exige-se a inclusão de informação «completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita».

170. E, por outro lado, exige-se a inclusão de tal informação completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita que «permita aos destinatários formar juízos fundados sobre a oferta»

171. Como é que se define o que é informação completa?

172. No contexto de um prospecto com vista à realização de um aumento de capital social de uma sociedade, o que é que constituiu informação completa?

173. E mais: como é que se define qual é a informação que permite aos destinatários formar juízos fundados sobre a oferta e que dá origem ao dever de inclusão no prospecto?

174. Como é evidente, todos estes conceitos se revelam indeterminados e subjectivos, os quais violam o princípio da legalidade.

175. EM SEGUNDO LUGAR, no que diz respeito à contra-ordenação por alegada violação do dever de actualizar o prospecto do aumento de capital do BES de 2014, pretende-se sancionar a violação do dever de requerer a aprovação de adenda de um prospecto quando ocorrer qualquer facto novo ou se tomar conhecimento de qualquer facto anterior não considerado no prospecto, que seja relevante para a decisão dos destinatários (cfr. artigos 393.º, n.º 2 – al. c) e 142.º, n.º 1 do CVM).

176. Importa, assim, aferir, o que são factos novos que sejam relevantes para a decisão dos destinatários e que dão origem ao dever de divulgação de uma adenda ao prospecto.

177. Como é evidente, o conceito de factos novos que sejam relevantes para a decisão dos destinatários, e que dá origem ao dever de divulgação de uma adenda ao prospecto, é igualmente um conceito indeterminado e subjectivo.

178. Estamos, uma vez mais, perante um conceito de tal modo aberto, indeterminado e, manifestamente, subjectivo que não respeita o princípio da legalidade contra-ordenacional.

179. O conceito «relevantes para a decisão dos destinatários» é de tal forma indeterminado, que não é possível apreender os concretos pressupostos em que a conduta deve ter lugar.

180. Em suma, os conceitos normativos utilizados nos artigos 393.º, n.º 2 - al. d) e 135.º, n.º 1 e nos artigos 393.º, n.º 2 - al. c) e 142.º, n.º 1, todos do CVM são de tal modo abertos, indeterminados e subjectivos que, evidentemente, não respeitam o princípio da legalidade contra-ordenacional.

181. A garantia de que as normas sejam objectivamente determináveis é, como já se disse supra, uma exigência legal(prevista nos artigos 2.º do RGCOe 1.º, n.º 1, do Código Penal– aplicável ex vi artigo 407.º do CVM e artigo 32.º do RGCO) e constitucional (artigo 29.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa), a qual não é respeitada nos artigos 393.º, n.º 2 – al. d) e 135.º, n.º 1 e nos artigos 393.º, n.º 2 – al. c) e 142.º, n.º 1, do CVM.

182. Desta forma, não restam dúvidas que tais preceitos estão feridos de inconstitucionalidade, por violação do princípio da legalidade consagrado no artigo 29.º, n.º 1, da CRP, e violação das garantias de segurança, certeza, confiança e previsibilidade, por força do princípio do Estado de Direito consagrado no artigo 2.º da CRP.

183. Em face do exposto, requer-se que seja declarada a inconstitucionalidade das alíneas c) e d) do número 2, do artigo 393.º do CVM, interpretadas e aplicadas nos sentidos normativos acima referidos, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 72.º da LOTC, o que determina a revogação da Sentença Recorrida.

AINDETERMINAÇÃO DOS TIPOS CONTRA-ORDENACIONAIS E A INEXISTÊNCIA DE DOLO

184. Sem prejuízo da inconstitucionalidade das aludidas normas, a indeterminação dos conceitos utilizados nos tipos contra-ordenacionais aqui em causa tem ainda implicações relevantes na representação do cometimento do ilícito contra-ordenacional, e, portanto, ao nível do dolo.

185. No presente caso, a Sentença Recorrida imputa a prática das referidas contra-ordenações ao ora Recorrente, a título doloso.

186. Ora, para que o dolo possa abranger todos «os elementos do ilícito-típico indispensáveis para que o agente atinja o problema da ilicitude do facto», é necessário que os comportamentos proibidos e sancionados sejam objectivamente determináveis.

187. Com efeito, como é lógico, o agente apenas pode representar a realização de um facto que preencha um tipo de ilícito, e actuar com a intenção de o realizar, aceitando ser consequência necessária ou possível da sua conduta, caso os tipos contra-ordenacionais sejam suficientemente determinados para que o mesmo apreenda o seu conteúdo.

188. Sucede que, como vimos, não é este caso dos tipos contra-ordenacionais aqui em causa.

189. EM PRIMEIRO LUGAR, o 135.º, n.º 1, do CVM e osn.os 12.2 e 20.9 do Anexo Ido Regulamento (CE) n.º 809/2004, da Comissão, de 29 de Abril, não são suficientemente precisos de forma a que, no caso concreto, o ora Recorrente pudesse ter representado que o facto de o BES não ter feitoincluir no prospecto o montante total dos financiamentosdo BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação,no valor de€ 533 milhões, mas sim o valorde €290 milhões porreferência a 31 de Dezembro de 2013, preencheria os elementos do ilícito-típico da contra-ordenação por violação de dever de qualidade de informação prevista e punida no artigo 393.º, n.º 2 – al. d) do CVM.

190. Com efeito, os elementos do tipo–a inclusão de informação completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita, que permita aos destinatários formar juízos fundados sobre a oferta – são de tal forma indeterminados e subjectivos, que o ora Recorrente não pôde representar que o facto de o BES não ter feito incluir no prospecto o montante de € 243 milhões dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias – que apenas representava cerca de 0,25% do activo consolidado do BES –, preencheria os elementos do ilícito-típico da contra-ordenação por violação de dever de qualidade de informação prevista e punida no artigo 393.º, n.º 2 – al. d) do CVM.

191. De igual modo, o 135.º, n.º 1, do CVM e os n.os 12.2 e 20.9 do Anexo I do Regulamento (CE) n.º 809/2004, da Comissão, de 29 de Abril, não são suficientemente precisos de forma a que, no caso concreto, o ora Recorrente pudesse ter representado que o facto de o BES não ter feito incluir no prospecto informação sobre o facto de o «BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação» preencheria os elementos do ilícito-típico da contra-ordenação por violação de dever de qualidade de informação prevista e punida no artigo 393.º, n.º 2 – al. d) do CVM.

192. Perante estes factos e a indeterminabilidade e subjectividade dos conceitos utilizados no tipo de ilícito da contra-ordenação prevista no artigo 393.º, n.º 2 – al. d) do CVM, é evidente que o ora Recorrente não pôde representar que a não inclusão da informação relativa à carteira de crédito do BESA determinaria que a informação incluída no prospecto não fosse completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita, nem que a mesma fosse necessária para que os destinatários formassem juízos fundados sobre a oferta (tanto mais tendo em causa a falta de materialidade de tal informação).

193. De resto, saliente-se que tais tipos contra-ordenacionais não só não são suficientemente precisos e concretos para que o ora Recorrente pudesse ter representado o preenchimentos os elementos do ilícito-típico da contra-ordenação por violação de dever de qualidade de informação prevista e punida no artigo 393.º, n.º 2 – al. d) do CVM, como tal representação não lhe era exigível.

194. E, assim, não podendo o ora Recorrente representar, nem tal lhe sendo exigível, que a não inclusão daquelas informações preencheria o tipo de ilícito previsto no artigo 393.º, n.º 2 - al. d) do CVM, é por demais evidente que inexiste qualquer dolo, em qualquer das suas modalidades.

195. EM SEGUNDO LUGAR, o 142.º, n.º 1, do CVM não é suficientemente preciso de forma a que, no caso concreto, o ora Recorrente pudesse ter representado que a aprovação, em 30 de Maio de 2014, de financiamentos à ESFG e subsidiárias no valor de € 194 milhões consubstanciaria um facto «relevante para a decisão dos destinatários» e, que,por isso, a omissão de aprovação de adenda com a inclusão de tal facto, preencheria os elementos do ilícito-típico da contra-ordenação por violação do dever de actualizar o prospecto do aumento de capital do BES de 2014, prevista e punida no artigo 393.º, n.º 2 – al. c) do CVM.

196. A indeterminabilidade do conceito utilizado no 142.º, n.º 1, do CVM também impossibilitou que o ora Recorrentepudesse ter representado que a emissão de duas cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA, no valor de 372 milhões de dólares consubstanciaria um facto «relevante para a decisão dos destinatários» e, que, por isso, a omissão de aprovação de adenda com a inclusão de tal facto, preencheria os elementos do ilícito-típico da contra-ordenação por violação do dever de actualizar o prospecto do aumento de capital do BES de 2014, prevista e punida no artigo 393.º, n.º 2 – al. c) do CVM.

197. Perante estes factos e a indeterminabilidade e subjectividade dos conceitos utilizados no tipo de ilícito da contra-ordenação prevista no artigo 393.º, n.º 2 – al. c) do CVM, como poderia o ora Recorrente representar que a inclusão de informação relativa a tal financiamento consubstanciaria um facto «relevante para a decisão dos destinatários» e que, portanto, dava lugar ao dever de aprovação de adenda ao prospecto?

198. É evidente que não podia e, no caso concreto, não pôde.

199. Ora, não só tal tipo contra-ordenacional não é suficientemente preciso e concreto para que o ora Recorrente pudesse ter representado o preenchimento dos elementos do ilícito-típico da contra-ordenação por violação do dever de actualizar o prospecto do aumento de capital do BES de 2014, prevista e punida no artigo 393.º, n.º 2 – al. c) do CVM, como tal representação não lhe era, in casu, exigível.

200. Deste modo, não podendo o ora Recorrente representar, nem tal lhe sendo exigível, que a omissão de aprovação de adenda com a inclusão daqueles factos preencheria o tipo de ilícito previsto no artigo 393.º, n.º 2 – al. c), do CVM, é por demais evidente que inexiste qualquer dolo, em qualquer das suas modalidades.

201. Em face do exposto, é forçoso concluir que o ora Recorrente jamais pretendeu a realização – a título doloso – dos tipos contra-ordenacionais previstos no artigo 393.º, n.º 2 – al. c) e d) do CVM.

SUBSIDIARIAMENTE,DO ERRO SOBRE A FACTUALIDADE TÍPICA

202. Sem prejuízo do supra exposto, a verdade é que, atenta a indeterminabilidade dos tipos contra-ordenacionais aqui em causa, o ora Recorrente sempre teria actuado com erro, quer sobre a factualidade típica, o que sempre excluiria o dolo.

203. Como vimos, no caso concreto, atenta a indeterminabilidade dos tipos contra-ordenacionais previstos e punidos do artigo 393.º, n.º 2 - als. c) e d) do CVM, o ora Recorrente ignorava que os factos imputados preenchessem os elementos dos ilícitos-típicos das contra-ordenações.

204. Primeiro, o ora Recorrente ignorava que a informação incluída no prospecto, a respeito do montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, não seria completa, por existir uma discrepância no valor de € 243 milhões, nem que teria materialidade suficiente para fazer concluir que a informação ali incluída não seria completa ou que a mesma permitia «aos destinatários formar juízos fundados sobre a oferta».

205. Segundo, o ora Recorrente ignorava que a informação incluída no prospecto, a respeito do BESA, não seria completa, nem que a inclusão de tal informação fosse necessária para que os destinatários formassem juízos fundados sobre a oferta.

206. Tanto que, como já referido, o risco de crédito do BESA estava plenamente assegurado pela garantia soberana prestada pelo Estado Angolano, motivo pelo qual a K... nunca exigiu provisionamento do crédito (ou registo de imparidades) concedido pelo BES ao BESA, em cerca de € 3.6 mil milhões, nem do crédito concedido pelo BESA a clientes, precisamente por causa da validade e eficácia da garantia.

207. Terceiro, o ora Recorrente ignorava que a concessão do financiamento de € 194 milhões à ESFGtivesse materialidade suficiente, para constituir uma informação relevante para a decisão dos destinatários.

208. Quarto, se o BES nunca se constituiu na posição de garante da obrigação de reembolso da ESI a favor das sociedades do grupo PDVSA, é evidente que a emissão de tais cartas de conformo não podem constituir um facto relevante para a decisão dos destinatários que justificasse a aprovação de uma adenda e, desse modo, que a respectiva omissão pudesse consubstanciar uma violação do dever de actualizar o prospecto do aumento de capital do BES de 2014, prevista e punida no artigo 393.º, n.º 2 – al. c) do CVM.

209. Em suma, e subsidiariamente, é forçoso concluir que o ora Recorrente sempre teria actuado com erro sobre a factualidade típica, o que sempre afastaria o dolo, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 8.º, n.º 2, do RGCO, ex vi artigo 407.º do CVM.

CÚMULO JURÍDICO: A ERRADA DETERMINAÇÃO DA MEDIDA CONCRETA DA COIMA

DO ERRO NA PONDERAÇÃO DA SITUAÇÃO PESSOAL DO ORA RECORRENTE NA DETERMINAÇÃO DA COIMA APLICÁVEL

210. Na Sentença Recorrida, o Tribunal de 1.ª instância deu como provado que actualmente o ora Recorrente tem um diagnóstico clínico compatível com a doença de Alzheimer(factos provados 437 a 439), não tendo, todavia, tendo reconhecido que tal facto mitigaria as exigências de prevenção especial (página 833 da Sentença Recorrida).

211. Apesar de dar este facto como provado, e de o diagnóstico clínico de Alzheimer do ora Recorrente dever mitigar as exigências de prevenção especial, o Tribunal de 1.ª instância manteve a coima única aplicada pela CMVM.

212. Ora, como é bom de ver, o diagnóstico acima referido afigurava-se relevantepara a boa decisão da causa, porquanto permitia valorar as condições pessoais do ora Recorrente, impondo que, a manter-se a condenação do ora Recorrente (sem de forma alguma conceder) a coima aplicada tivesse sido objecto de redução na Sentença Recorrida.

213. As necessidades de prevenção – gerais e especiais – são tanto menores quando se verifica que o arguido não tem a capacidade de compreender a totalidade da sanção.

214. É, precisamente, o que se verifica nos presentes autos, como resulta do diagnóstico clínico da doença de Alzheimer feito ao ora Recorrente, pelo que sempre será forçoso concluir que, a manter-se a condenação do ora Recorrente (sem de forma alguma conceder),a coima aplicada terá de ser objecto de uma manifesta redução à luz das circunstâncias pessoais do ora Recorrente.

215. Com efeito, na determinação da medida concreta da coima a aplicar ao ora Recorrente, a Sentença Recorrida deveria ter ponderado correctamente que, tanto a doença mental cognitiva que lhe foi diagnosticada como a idade avançada do Recorrente – 78 anos – concorrem para mitigar as exigências de prevenção geral e especial e, em consequência, as necessidades da sanção.

216. Desde logo, porque a capacidade cognitiva do ora Recorrente para compreender o alcance da coima que lhe é aplicada está arredada e afectada ou, pelo menos, diminuída.

217. Pelo exposto, a Sentença Recorrida deve ser revogada e reformulada, devendo ser devidamente ponderada a determinação do valor global da coima aplicada ao Recorrente tendo em consideração a situação pessoal do ora Recorrente, dada como provada na Sentença Recorrida e, em consequência, deverá ser reduzida a coima aplicada ao ora Recorrente.

DO ERRO NA PONDERAÇÃO DO TEMPO DECORRIDO DESDE A PRÁTICA DA INFRACÇÃO QUE DETERMINA A ATENUAÇÃO ESPECIAL DA COIMA (ARTIGO 72.º, N.º 1,AL.D)DO CÓDIGO PENAL)

218. A Sentença não fez a correcta ponderação do facto de ter decorrido um período de 8 anos e 4 meses desde o momento da prática das infracções aqui em causa, o que deveria ter sido considerado como circunstância atenuante pelo Tribunal de 1.ª instância.

219. As circunstâncias modificativas atenuantes previstas na norma do artigo 72.º do CP têm plena aplicabilidade no direito contra-ordenacional e, assim, no processo dos presentes autos, por via da remissão do artigo 32.º do RGCO.

220. Nesta medida, a circunstância da alínea d) do n.º 2 do artigo 72.º do CP reportada ao “decurso de muito tempo sobre a prática da infracção, mantendo o agente boa conduta” deveria ter sido ponderada pelo Tribunal de 1.ª instância na determinação do valor global da coima aplicada ao Recorrente.

221. Como é evidente, a circunstância de terem já passado mais de 8 anos desde a prática dos factos aqui em causa diminui de forma acentuada a necessidade da sanção.

222. Pelo exposto, a Sentença Recorrida deve ser revogada e reformulada, devendo ser devidamente ponderada a determinação do valor global da coima aplicada ao ora Recorrente tendo em consideração a circunstância modificativa atenuante prevista no artigo 72.º, n.º 2, alínea d) do Código Penal, ex vi artigo 32.º do RGCO e 407.º do CVM, relativa ao decurso do tempo desde a prática dos factos, e em consequência, deverá ser reduzida a coima aplicada ao ora Recorrente.

DAS VIOLAÇÕES DO PRINCÍPIO DA IGUALDADE E DA PROPORCIONALIDADE NA DETERMINAÇÃO DA MEDIDA DA COIMA ÚNICA

223. Na determinação concreta da medida da coima única a aplicar ao ora Recorrente, a decisão proferida na Sentença Recorrida violou, por duas vezes, o princípio da igualdade, previsto no artigo 13.º da CRP, e o princípio da proporcionalidade, previsto no artigo 18.º da CRP.

224. Por um lado, perante circunstâncias modificativas atenuantes comuns, o Tribunal de 1.ª instância decidiu, de forma absolutamente arbitrária e desproporcional, no caso do Recorrente EE, relevar tais critérios de forma positiva, e considerá-los como atenuantes, mas, no caso do ora Recorrente, desvalorizar e afastar a sua ponderação na determinação da medida da coima.

225. Ao fazer a ponderação e avaliação da situação de saúde do ora Recorrente e ao concluir pela irrelevância, para o caso, do decurso do tempo desde aprática dos factos, enquanto atenuante, a Sentença Recorrida violou os princípios constitucionais da igualdade e da proporcionalidade.

226. As circunstâncias e critérios ponderados pelo Tribunal de 1.ª instância como atenuantes e que fundamentam a decisão de aplicar ao Recorrente EE uma sanção de admoestação também concorrem a favor do ora Recorrente.

227. Tanto se considera, na Sentença Recorrida, que a situação pessoal de saúde do Recorrente EE, atenua a culpa do Recorrente e a gravidade das infracções a si imputadas o que mitiga acentuadamente as necessidades de prevenção especial...

228. ...como, em seguida, se afirma que a situação de saúde do ora Recorrente, a quem foi diagnosticado Alzheimer, não releva, uma vez que tal não coloca em causa a sua integridade e capacidade à data da prática dos factos, em 2014, nem prejudica a compreensão do sentido e alcance da decisão condenatória, uma vez que a responsabilidade do ora Recorrente se traduz, apenas no seu sancionamento numa coima.

229. Nos dois casos, a “imputabilidade diminuída”dos Recorrentes, fruto da situação de doença que cada um padece, deverá, em cada caso, ser ponderada para mitigar o grau de culpa em sede de determinação da sanção concreta.

230. Tanto num caso, como no outro, as necessidades de prevenção especial são tanto menores quando se verifica que os arguidos não têm a capacidade de compreender plenamente a decisão, nem a sanção que lhes é aplicada.

231. No entanto, para o Tribunal, tal apenas se aplica para o caso do Recorrente EE, mas já não para o ora Recorrente.

232. Este tratamento desigual está destituído de qualquer sentido ou fundamento, e revela-se absolutamente desadequado e desproporcional no caso do Recorrente.

233. Do mesmo modo, a Sentença Recorrida faz uma ponderação do tempo decorrido desde a prática dos factos até à decisão, que corresponde a 8 anos (que equivale, aliás, ao tempo máximo de prescrição) somente para o Recorrente EE, mas já não para o ora Recorrente.

234. Ou seja, do ponto de vista da imputação ao Recorrente EE, este facto é valorado e ponderado pelo Tribunal de forma positiva, como atenuante, mas, no caso do ora Recorrente, este facto é absolutamente desvalorizado.

235. Apesar do próprio Tribunal sublinhar, na Sentença Recorrida, que nem o Recorrente EE, nem os demais Recorrentes tiveram qualquer comportamento adjectivo ou substantivo, que tenha concorrido para a eminência de prescrição em que estes autos se encontram, na Sentença Recorrida não se retiram as devidas consequências legais desta afirmação para os demais Recorrentes.

236. O decurso de 8 anos desde a prática dos factos nos presentes autos mitiga, forçosamente, as necessidades de prevenção especial em relação a qualquer um dos Recorrentes e, em concreto, ao ora Recorrente, no entanto, este factor não foi ponderado na determinação da medida concreta da coima aplicada ao ora Recorrente, o que se revela desproporcional e desadequado.

237. Como é evidente, o Tribunal deve tratar os casos análogos de forma análoga.

238. Nessa senda, deverá ser devidamente ponderada a determinação do valor global da coima aplicada ao Recorrente, atendendo à particular situação pessoal do ora Recorrente dada como provada na Sentença Recorrida e ao decurso do tempo desde a prática dos factos, o que determinará, necessariamente, uma atenuação especial da coima aplicada e uma manifesta redução, nos termos e para os efeitos do n.º 3 do artigo 18.º do RGCO.

239. O artigo 405.º do CVM, o artigo 18.º, n.ºs 1 e 3, do RGCO, e o artigo 72.º, n.ºs 1 e 2, do CP, ex vi artigo 32.º do RGCO e 407.º do CVM, interpretados no sentido em que o Tribunal pode fazer um juízo de prognose positivo na determinação da sanção a aplicar a um arguido, com base em determinadas circunstâncias modificativas atenuantes da sanção, mas desconsiderar e desvalorizar as mesmas circunstâncias atenuantes na ponderação da determinação da sanção a aplicar a outro arguido, quando as mesmas circunstâncias atenuantes lhe são aplicáveis, no caso concreto, é inconstitucional, por violação do princípio da igualdade e do princípio da proporcionalidade, previstos nos artigos 13.º, 18.º, n.º 2, e 32.º, n.º 10, da CRP, respectivamente, que, desde já, se invoca nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 72.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional.

240. Por outro lado, o Tribunal decretou a suspensão parcial da execução da coima única fixada para os Recorrentes AA, BB e DD, com base em critérios puramente objectivos, que também seriam aplicáveis ao ora Recorrente, mas, deliberadamente, excluiu o ora Recorrente da aplicação de tal medida.

241. Os elementos a que a Sentença Recorrida recorreu para realizar o mesmo juízo de prognose favorável para os Recorrentes AA, BB e DD são puramente objectivos e comuns a todos os Recorrentes nestes autos.

242. Por um lado, o decurso do tempo sobre a prática dos factos é igual para todos.

243. Por outro lado, o ora Recorrente também se encontra, como os demais Recorrentes, desde Agosto de 2014, totalmente arredado da actividade bancária, não exercendo qualquer actividade profissional, seja na Banca, seja em instituição conexa.

244. Sendo certo que os Recorrentes agiram, todos, em co-autoria.

245. Daqui resulta que não só o Tribunal dispõe de elementos, como os pressupostos considerados pelo Tribunal para justificar a suspensão em 20% da execução da coima para os Recorrentes AA, BB e DD se verificam quanto ao Recorrente.

246. Nesta medida, esta decisão revela-se absolutamente arbitrária e desproporcional, uma vez que todos os factores indicados pelo Tribunal de 1.ª instância para fundamentar a aplicação da suspensão da execução da coima para os demais Recorrentes também aproveitam ao ora Recorrente.

247. Em suma, as circunstâncias supra indicadas determinam que, a manter-se a condenação do ora Recorrente (sem de forma alguma conceder), a coima aplicada terá de ser objecto de uma manifesta redução, e de uma suspensão na sua execução, em 20% por um período de 24 meses.

248. O artigo 415.º do CVM, interpretado no sentido em que o Tribunal pode determinar a suspensão da execução da coima para um arguido, atendendo a determinadas circunstâncias modificativas atenuantes da sanção, mas não para outro arguido, quando as mesmas circunstâncias atenuantes lhe são aplicáveis, no caso concreto, é inconstitucional, por violação do princípio da igualdade e do princípio da proporcionalidade, previstos nos artigos 13.º, 18.º, n.º 2, e 32.º, n.º 10, da CRP, respectivamente.

249. Por todo o exposto, a Sentença Recorrida deve ser revogada e reformulada, devendo ser devidamente ponderada a determinação do valor global da coima aplicada ao ora Recorrente tendo em consideração as circunstâncias modificativas atenuantes consideradas para os demais Recorrentes – nomeadamente, o decurso do tempo, a situação pessoal do ora Recorrente, e o facto deste de se encontrar arredado da actividade bancária desde 2014 –, e em consequência, deverá ser reduzida a coima aplicada ao ora Recorrente e suspensa na execução, nos mesmos termos que o foi para os demais Recorrentes.

DO ERRO DA SENTENÇA NA APRECIAÇÃO DA ABSOLVIÇÃO DO ORA RECORRENTE QUANTOÀ INFRACÇÃO PELA FALTA DE ADENDA SOBRE A EXPOSIÇÃO DO BES À RIO FORTE

250. Na Sentença Recorrida, o Tribunal de 1.ª instância decidiu absolver o ora Recorrente da contra-ordenação porque vinha condenado na Decisão da CMVM, pela violação do dever de requerer uma adenda ao prospecto de aumento de capital do BES, quanto ao aumento de exposição directa do BES às sociedades do Grupo Rio Forte em 12.06.2014.

251. No entanto, tal absolvição pouco ou nada se reflectiu na determinação, pelo Tribunal de 1.ª instância, da medida da coima única que veio a ser fixada na Sentença Recorrida: a coima foi reduzida de EUR 1 milhão para EUR 950 mil.

252. Como é evidente, se o ora Recorrente foi absolvido da prática de uma contra-ordenação pela qual tinha sido condenado na coima parcelar de EUR 200 mil, tal absolvição não se pode reflectir numa redução de apenas EUR 50 mil da coima única anteriormente aplicada.

253. Assim, a medida da coima aplicada ao ora Recorrente afigura-se, manifestamente, excessiva e desproporcional.

254. Nestes termos, a Sentença Recorrida deverá ser revogada e deverá ser reformulado o cúmulo jurídico das coimas parcelares concretamente aplicadas ao ora Recorrente, após ser realizada a devida ponderação da absolvição do ora Recorrente pela prática da infracção pela não divulgação de uma adenda quanto à exposição do BES à Rio Forte em 12.06.2014, e, em consequência, a medida concreta da coima única deverá ser reduzida.

DO ERRO DA SENTENÇA QUANTO À EXISTÊNCIA DE ANTECEDENTES CONTRA-ORDENACIONAIS

255. Nos termos das páginas 830 e 831 da Sentença Recorrida, é destacado que o ora Recorrente tem antecedentes contra-ordenacionais, uma vez que foi condenado, no âmbito dos processos n.º 182/16...., 164/19...., 249/17...., 74/19.... e 280/20.....

256. Salvo o devido respeito, não assiste qualquer razão à Sentença Recorrida.

257. A condenação do ora Recorrente no âmbito dos referidos processos de contra-ordenação, por sentença transitada em julgado, não pode relevar enquanto antecedente contra-ordenacional, por que os factos relevantes naqueles processos não são anteriores aos factos destes autos.

258. Em qualquer caso, as infracções ali imputadas ao ora Recorrente terão sido alegadamente praticadas ao tempo da alegada prática das infracções aqui arguidas.

259. A lógica de graduar a coima do agente tendo em conta os seus antecedentes contra-ordenacionais tem subjacente as necessidades de prevenção especial, relacionadas com a dissuasão do agente condenado em relação à reincidência.

260. No entanto, não está aqui em causa uma actuação posterior ilícita do ora Recorrente, uma vez que os factos em causa nas decisões finais proferidas naqueles processos contra-ordenacionais não são anteriores aos da Sentença Recorrida.

261. Nestes termos, a Sentença deve ser revogada e alterada, devendo-se concluir pela ausência de antecedentes contra-ordenacionais do ora Recorrente e, em consequência, ser reduzida a coima aplicada ao ora Recorrente.


DO CÚMULO JURÍDICO POR CONHECIMENTO SUPERVENIENTE DO CONCURSO

262. O cúmulo jurídico, por conhecimento superveniente do concurso, é aplicável em sede de processos contra-ordenacionais, quando estão em causa decisões proferidas por uma mesma entidade administrativa.

263. Sendo que, no caso vertente, o ora Recorrente foi condenado pela mesma autoridade administrativa – a CMVM –, que também condenou o Recorrente noutro processo, no âmbito dos autos de recurso de contra-ordenação n.º 293/21...., cuja decisão veio a ser confirmada pelo J... do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, e pelo Tribunal da Relação de Lisboa.

264. O Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa naqueles autos não transitou em julgado.

265. Caso o referido Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido no âmbito do processo n.º 293/21.... venha a ser confirmado e transitar em julgado, o Tribunal da Relação de Lisboa deverá revogar e substituir a Sentença Recorrida, para conhecer do cúmulo jurídico por conhecimento superveniente do concurso e fixar uma coima única por referência às coimas aplicadas nos presentes autos e, ainda, no processo n.º 293/21...., nos termos dos artigos 19.º, n.os 1 e 2, do RGCO e artigo 78.º, n.os 1 e 2, do Código Penal ex vi artigos 32.º e 41.º, n.º 1, do RGCO.

266. Caso assim não seja, os artigos 19.º, n.os 1 e 2, do RGCO e artigo 78.º, n.os 1 e 2, do Código Penal ex vi artigos 32.º e 41.º, n.º 1, do RGCO, interpretados no sentido de que o arguido de processos contra-ordenacionais sucessivos e autónomos – por factos ilícitos todos praticados antes da primeira condenação – pode ser condenado por concurso de contra-ordenações em coima de valor superior ao dobro da coima parcelar mais elevada será inconstitucional, por violação dos artigos 2.º,18.º, n.º 2,e 32.º, n.os 1 e 10, da Constituição da República Portuguesa, que consagram respectivamente os princípios de Estado de Direito (que tem ínsito o princípio da segurança jurídica), proporcionalidade e garantias de defesa em processo contra-ordenacional.

Termina, formulando os seguintes pedidos:

Em face do exposto, o presente recurso deve ser julgado inteiramente procedente e ser declarada a extinção do presente processo, por prescrição, a partir do dia 26 de Novembro de 2022.

Em qualquer caso (sem conceder), requer-se que o presente recurso seja julgado integralmente procedente com base nos fundamentos e quanto às questões acima suscitadas no corpo das alegações e respectivas conclusões (que aqui se dão por reproduzidas, por economia processual), a Sentença Recorrida seja revogada e, em consequência, o ora Recorrente seja absolvido das contra-ordenações que lhe foram imputadas na Sentença Recorrida ou, caso assim, nãose entenda determinada a baixa doprocesso para sanação dos vícios aqui suscitados quanto à Sentença Recorrida ou, caso assim não se entenda, que sejam reduzidas as coimas aplicadas ao ora Recorrente.


CONCLUSÕES [DD]

8.1.           PRESCRIÇÃO DA PRETENSA CONTRAORDENAÇÃO IMPUTADA AO RECORRENTE

8.1.1     Erro de Direito da Sentença Recorrida no apuramento da data de início da contagem do prazo de prescrição da pretensa contraordenação imputada ao Recorrente

1. Nos termos e paraos efeitos do disposto no artigo 5.º do RGCO, a sentença recorrida sustenta que o dies a quo da contagem do prazo de prescrição – a data da prática da pretensa contraordenação imputada ao Recorrente DD – seria o dia 17 de junho de 2014, o que, salvo o devido respeito, constitui uma errada interpretação e aplicação da lei por parte do Tribunal a quo, em particular uma violação do disposto no artigo 5.º do RGCO e na alínea d) do n.º 2 do artigo 393.º do CVM.

2. Ao contrário do sustentado na sentença recorrida, a pretensa contraordenação imputada ao Recorrente DD respeitante a matéria do BESA e que se consubstanciaria na violação da qualidade de informação constante do Prospeto, o que, naturalmente, a existir (oque jamais se concede), corporizou-se no momento em que o Recorrente DD e restantes administradores do BES à data aprovaram a minuta do Prospeto, isto é, 15 de maio de 2014, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 5.º do RGCO, aplicável ex vi do artigo 407.º do CVM, e na alínea d) do n.º 2 do artigo 393.º do CVM – trata-se de uma contraordenação instantânea, que apenas se consuma e cristaliza num, e apenas num, determinado momento – o momento da aprovação do prospeto pelo agente.

3. De resto, a interpretação e aplicação conjugada do disposto no artigo 135.º e na alínea d) do n.º 2 do artigo 393.º, ambos do CVM e no artigo 5.º do RGCO, aplicável ex vi do artigo 407.º do CVM, no sentido de que uma pretensa omissão de informação num Prospeto de uma oferta pública de subscrição se considera praticada até ao final da operação de aumento de capital (no caso concreto, 17 de junho de 2014), e não no dia de aprovação do Prospeto (no caso concreto, 15 de maio de 2014), é inconstitucional por violação dos princípios da segurança jurídica, legalidade e tipicidade vertidos nos artigos 1.º, 2.º e nos n.os 1, 3 e 4 do artigo 29.º da Constituição da República Portuguesa, o que, desde já, se invoca, para os devidos efeitos legais.


8.1.2 Erro de Direito da Sentença Recorrida por inaplicabilidade ao caso concreto – por ilegalidade e inconstitucionalidade – do disposto na alínea a) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 418.º do CVM na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio

4. A sentença recorrida comete novo Erro de Direito – por errada interpretação e aplicação do artigo 3.º do RGCO, aplicável ex vi artigo 407.º do CVM, e dos artigos 1.º, 2.º, 18.º e 29.º da Constituição da República Portuguesa – quando sustenta que haveria que aplicar ao caso concreto o disposto nos n.os 1 (em particular, a alínea a) e 2 do artigo 418.º do CVM, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio, “por ser a que estava em vigor à data do recebimento do recurso de impugnação judicial (2022)”(sic), em particular (i) o alargamento de 5 para 8 anos do prazo de prescrição previsto na alínea a) do novo n.º 1 do referidoartigo418.º do CVM; e (ii) a nova causa de suspensão prevista no n.º 2 do aludido artigo 418.º do CVM (cfr. páginas 42 e 43 da sentença recorrida).

5. Salvo o devido respeito, o critério normativo adotado na sentença recorrida – que constitui ratio decidendi da mesma (cfr. pp. 42 e 43 da sentença recorrida) –, no sentido de aplicar ao caso concreto o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 418.º do CVM, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio, e propugnando a aplicação da causa de suspensão prevista no n.º 2 do artigo 418.º do CVM, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio, é flagrantemente violador da lei, em particular do artigo 3.º do RGCO, aplicável ex vi artigo 407.º do CVM, e inconstitucional, por violação do disposto nos artigos 1.º, 18.º e 29.º da Constituição – o que, desde já, se invoca –, e contraria toda a construção legal, doutrinária e jurisprudencial em matéria de proibição da retroatividade in malam partem (cfr. Opinião do Professor Doutor MANUEL DA COSTA ANDRADE em anexo).

6. O Tribunal a quo deveria ter interpretado e aplicado a lei no sentido de que a Lei n.º 28/2017, de 30 de maio, em particular a alteração que introduziu a alínea a)ao dispostono n.º 1 do artigo 418.º do CVM em matéria de alargamento do prazo de prescrição para 8 (oito) anos, não se aplica retroativamente à pretensa contraordenação imputada ao Recorrente DD na sentença recorrida, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 3.º do RGCO e no n.º 1 do artigo 2.º do Código Penal, aplicáveis ex vi artigo 407.º do CVM e artigo 32.º do RGCO.

7. Identicamente, e ao contrário do que se sustenta na sentença recorrida (cfr. página 43 da sentença recorrida), o Tribunal a quo também deveria ter interpretado e aplicado a lei no sentido de que a “nova” causa de suspensão da prescrição prevista no n.º 2 do artigo 418.º do CVM, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio, não é retroativamente aplicável aos factos em causa nos autos, ao abrigo do disposto no n.º1 doartigo 3.º do RGCO e non.º 1 do artigo 2.º do Código Penal, aplicáveis ex vi artigo 407.º do CVM e artigo 32.º do RGCO.

8. De resto, o Tribunal a quo, ao concluir que “sempre haveria que aplicar a estes autos o artigo 418.º do CdVM na redação introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de Maio, por ser a que estava em vigor à data do recebimento do recurso de impugnação judicial” (p. 43 da sentença recorrida), adotou um critério normativo que exclui a alteração aos n.os 1 (em particular, a alínea a)) e 2 do artigo 418.º do CVM aprovada pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio – que aumentou o prazo de prescrição de cinco para oito anos no caso de contraordenações muito graves e criou uma “nova” causa de suspensão do prazo de prescrição –, do âmbito de aplicação do disposto no n.º 1 do artigo 3.º do RGCO e no n.º 1 do artigo 2.º do Código Penal – aplicável ex vi artigo 407.º do CVM e 32.º do RGCO – e que, consequentemente, sustenta a aplicação retroativa do disposto na alínea a) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 418.º do CVM, na redação que lhefoi dada pela Lei n.º 28/2017,de 30 de maio, a processos contraordenacionais relacionados com factos ocorridos antes da entrada em vigor da aludida redação do disposto na alínea a) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 418.º do CVM (conferida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio), pelo que tal critério normativo é inconstitucional por violação das garantias do direito de defesa do arguido, consagradas no artigo 32.º, n.os 1 e 10, da Constituição, dos princípios da confiança e segurança jurídicas ínsitos ao Estado-de-Direito consagrado no artigo 2.º, do princípio da proibição da aplicação retroativa de lei desfavorável ao arguido, previsto no artigo 29.º, n.os 1 e 4 e, ainda, do princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 18.º, n.º 3, todos da Constituição da República Portuguesa.

9. Por cautela de patrocínio, invoca-se ainda as seguintes inconstitucionalidades relacionadas com a ilegal e inconstitucional aplicabilidade do disposto na alínea a) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 418.º do CVM, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio, ao caso concreto:

- O artigo 2.º da Lei n.º 28/2017, de 30 de Maio, que veio alterar a redação do disposto nos n.os 1 e 21 do artigo 418.º do CVM, interpretado no sentido de que o alargamento do prazo de prescrição para oito anos e a nova causa de suspensão da prescrição previstos na alínea a) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 418.º do CVM é aplicável aos processos contra-ordenacionais pendentes aquando da entrada em vigor desta Lei, em que estejam em causa ou discussão alegados factos ilícitos contraordenacionais praticados antes de 30 de Junho de 2017 (data de entrada em vigor da Lei n.º 28/2017, de 30 de Maio), é inconstitucional, por violação das garantias do direito de defesa do arguido, consagradas no artigo 32.º, n.os 1 e 10, da Constituição da República Portuguesa, dos princípios da confiança e segurança jurídicas ínsitos ao Estado-de-Direito consagrado no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa, do princípio da proibição da aplicação retroativa de lei desfavorável ao arguido, previsto no artigo 29.º, n.os 1 e 4, da Constituição da República Portuguesa e, ainda, do princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 18.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa;
- O disposto nos n.os 1 e 2 do artigo 418.º do CVM, na redação introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de Maio, conjugado com o artigo 2.º desta mesma Lei n.º 28/2017, de 30 de Maio, interpretados no sentido de que o alargamento do prazo de prescrição para oito anos e a causa de suspensão da prescrição previstos na alínea a) do n.º 1 no n.º 2 do artigo 418.º do CVM é aplicável aos processos contra-ordenacionais pendentes aquando da entrada em vigor desta Lei, em que estejam em causa ou discussão alegados factos ilícitos contraordenacionais praticados antes de 30 de Junho de 2017, é inconstitucional, por violação das garantias do direito de defesa do arguido, consagradas no artigo 32.º, n.os 1 e 10, da Constituição da República Portuguesa, dos princípios da confiança e segurança jurídicas ínsitos ao Estado-de-Direito consagrado no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa, do princípio da proibição da aplicação retroativa de lei desfavorável ao arguido, previsto no artigo 29.º, n.os 1 e 4, da Constituição da República Portuguesa e, ainda, do princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 18.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa.

10. De resto, e para a hipótese de se entender que o aumento do prazo de prescrição e a nova causa de suspensão introduzidos pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio, na alínea a) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 418.º do CVM, não se subsumiriam ao disposto no n.º 1 do artigo 3.º do RGCO (nem ao n.º 1 do artigo 2.º do Código Penal) - o que não se concede e apenas por mero dever de patrocínio se equaciona -, a verdade é que a alteração aos prazos de prescrição e sua contagem (incluindo nova causa de suspensão) previstos no artigo 418.º do CVM não é, em qualquer caso, aplicável ao caso concreto por força do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 5.º do CPP, aplicável ex vi do artigo 407.º do CVM e do artigo 41.º do RGCO.

11. Aliás, toda e qualquer interpretação do ordenamento jurídico dele retirando um critério normativo segundo o qual a alteração ao artigo 418.º do CVM introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio, em particular o alargamento do prazo de prescrição para 8 (oito) anos no caso das contraordenações muito graves (cfr. alínea a) do n.º 1 do artigo 418.º do CVM, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio), e a criação de uma causa de suspensão da prescrição (cfr. n.º 2 do artigo 418.º do CVM, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio), não se subsumiria ao artigo5.ºdoCPP,aplicável ex viartigo407.º do CVM e artigo 41.º do RGCO, e, como tal, seria aplicável a factos anteriores à respetiva entrada em vigor, é inconstitucional por violação das garantias do direito de defesa do arguido, consagradas no artigo 32.º, n.os 1 e 10, da CRP, dos princípios da confiança e segurança jurídicas ínsitos ao Estado-de-Direito consagrado no artigo 2.º, do princípio da proibição da aplicação retroativa de lei desfavorável ao arguido, previsto no artigo 29.º, n.os 1 e 4 e, ainda, doprincípio da proporcionalidade consagrado no artigo18.º,n.º3, todos da Constituição, o que desde já, SE INVOCA para todos os efeitos legais.


8.1.3 A prescrição da pretensa contraordenação imputada ao Recorrente na sentença recorrida uma vez que decorreu o prazo de prescrição sem que se verificassem causas de interrupção ou suspensão

8.1.3.1. O decurso do prazo de cinco anos previsto no n.º 1 do artigo 418.º do CVM

12. A pretensa contraordenação imputada ao ora Recorrente teria sido (alegadamente) praticada em 15 de maio de 2014, pelo que prescreveu em 15 de maio de 2019, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 418.º do CVM, na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 486/99, de 13 de novembro, porquanto, até 15 de maio de 2019, não se verificou qualquercausadesuspensão e/ou de interrupção prevista nosartigos27.º-Ae28.ºdoRGCO, aplicável ex vi artigo 407.º do CVM, pelo que resta concluir pela prescrição do presente procedimento contraordenacional, com a consequente absolvição do Recorrente.

8.1.3.2. A inaplicabilidade do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 28.º do RGCO

13. Até à notificação da acusação em 21 de janeiro de 2020, o Recorrente DD não foi notificado de rigorosamente nada no que diz respeitoa este processo contraordenacional, nem sequer de pretensas diligências de prova, pelo que não tinha sequer conhecimento da sua existência.

14. Ao contrário da errada interpretação e aplicação da lei vertida na sentença recorrida, o efeito interruptivo da prescrição previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 28.º do RGCO, aplicável ex vi artigo 407.º do CVM, apenas se pode aplicar quando as diligências de prova em causa atinjam diretamente a esfera do visado / arguido, sob pena de inconstitucionalidade por violação do princípio da segurança e confiança jurídica.

8.1.3.3. A inconstitucionalidade da interpretação do Tribunal a quo relativamente à alínea b) do n.º 1 do artigo 28.º do RGCO

15. Ao concluir que “em face da normação inscrita na alínea b) do artigo 28.º, n.º 1, do RGCO, afigura-se que quaisquer diligências de prova, sem distinção e, incluindo a inquirição de testemunhas, é apta a interromper a prescrição, independentemente do momento processual em que essa realização tenha lugar” (cfr. p. 26 da sentença recorrida), o Tribunal a quo fez uma (errada) interpretação e aplicação da citada norma no sentido de que, para efeitos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 28.º do RGCO, aplicável ex vi do artigo 407.º do CVM, a mera realização de diligências de prova sem que o arguido tenha qualquer conhecimento da realização das mesmas (ou tenha sequer conhecimento da existência do processo contraordenacional) teria o efeito de interromper a prescrição relativamente a esse mesmo arguido, a qual é errada e inconstitucional por violação das garantias do direito de defesa do arguido, consagradas no artigo 32.º, n.os 1 e 10, da CRP, e, bem assim, dos princípios da confiança e segurança jurídicas ínsitos ao Estado-de-Direito consagrados no artigo 2.º da Constituição, o que desde já, SE INVOCA para todos os efeitos legais.

8.1.4. (Em qualquer caso) A prescrição da pretensa contraordenação imputada ao recorrente na sentença recorrida visto que decorreu o prazo de prescrição acrescido de metade e da suspensão de 6 meses

16. Sem prejuízo da prescrição acima explicitada, a verdade é que, ao contrário da errada interpretação e aplicação do Tribunal a quo relativamente ao disposto no n.º 3 doartigo 28.º do RGCO, o presente processo contraordenacional contra o Recorrente DD também já se encontra, em qualquer caso, prescrito, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 28.º do RGCO, aplicável ex vi artigo 407.º do CVM, porquanto, no caso concreto, quando os presentes autos foram preliminarmente examinados ao abrigo do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 27.º-A do RGCO, isto é, em 4 de abril de 2022 (para efeitos da aplicação desta suspensão o que conta é o momento da notificação ao arguido desse despacho), já havia decorrido o prazo da prescrição (5 anos), acrescido de metade (2 anos e 6 meses), isto é, 7 anos e seis meses, relativamente à pretensa contraordenação imputada ao Recorrente DD, não se tendo verificado qualquer causa de suspensão, ao abrigo do disposto no artigo 27.º-A do RGCO (que não pode ultrapassar 6 meses), aplicável ex vi do artigo 407.º do CVM.

17. Acresce que, e em todo o caso, desde a alegada prática da pretensa contraordenação imputada ao Recorrente DD (em 15 de maio de 2014), já decorreram mais de 8 anos em 15 de maio de 2022, isto é, já decorreu o prazo máximo de prescrição, acrescido do prazo máximo das suspensões previstas no artigo 27.º-A do RGCO (isto é, 8 anos), pelo que resta concluir pela prescrição do presente procedimento contraordenacional, com a consequente absolvição do Recorrente.

8.1.5. (Em qualquer caso) A inconstitucionalidade da interpretação segundo a qual o disposto nos n.os 1 e 3 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2000, de 19 de março, no n.º 2 do artigo 6.º da Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril, nos artigos 8.º e 10.º da Lei n.º 16/2020, de 29 de maio e nos artigos 2.º e 4.º da Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, e nos artigos 6.º e 7.º da Lei n.º 13-B/2021, de 5 de abril, seria aplicável a factos anteriores à respetiva entrada em vigor

18. . A páginas 30 a 33 da sentença recorrida, o Tribunal a quo concluiu pela verificação de duas causas de suspensão do prazo de prescrição dos presentes autos contraordenacionais, a um tempo, por força do disposto no artigo 7.º, n.os 1, 3, 6, alínea d) e 9, alínea b), da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, no artigo 6.º, n.º 2, da Lei n.º 4-A/20202, de 6 de abril, e nos artigos 8.º e 10.º da Lei n.º 16/2020, de 29 de janeiro, e, a outro tempo, por força do disposto nos artigos 2.º e 4.º da Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, e nos artigos 6.º e 7º. da Lei n.º 13-B/2021, de 5 de abril – a denominada suspensão covidiana, o que, uma vez mais, constitui uma errada aplicação e interpretação do Direito por parte do Tribunal a quo.

19. Por força dos princípios constitucionais da proibição da aplicação retroativa da lei penal ou contraordenacional e da tutela da confiança, as suspensões dos prazos de prescrição criadas pela Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril, Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, e Lei n.º 13-B/2021, de 5 de abril, não podem ser aplicadas a factos anteriores à respetiva entrada em vigor sob pena de agravamento da posição de um arguido.

20. A adoção de um tal critério normativo por parte do Tribunal a quo, assente na interpretação do disposto nos n.os 1 e 3 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, na redação dada pelo artigo 2.º da Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril, nos artigos 8.º e 10.º da Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, nos artigos 2.º e 4.º da Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, e nos artigos 6.º e 7.º da Lei nº 13-B/2021, de 1 de Fevereiro, e nos artigos 6º e 7º da Lei nº 13-B/2021, de 5 de abril, quando em concatenação normativa com o disposto no artigo 29º do Código Penal e alínea a) do artigo 5º do Código de Processo Penal, estes por remissão do estatuído nos artigos 32º e 41º do RGCO e artigo 407º do CVM, quando determinem a suspensão do prazo de prescrição do procedimento contraordenacional relativo a factos anteriores à sua vigência e com isso determinarem a aplicação em modo retroactivo de lei mais gravosa para o agente do ilícito a quem são imputados factos antecedentes à sua entrada em vigor, conduz à inconstitucionalidade material das citadas normas por violação do disposto no nº 6 do artigo 19º e nos nºs 1, 3 e 4 do artigo 29º, ambos da Constituição da República Portuguesa, o que desde já se invoca, para os devidos efeitos legais.

21. Ao mesmo tempo, os referidos preceitos, interpretados e aplicados – como o faz o Tribunal a quo – no sentido de determinarem a suspensão do procedimento  contraordenacional relativo a um processo que continua a correr seus termos e relativamente a cujos prazos os arguidos continuam adstritos, gera uma situação de desigualdade, em favor da pretensão punitiva do Estado e contra o direito dos arguidos, padecem de inconstitucionalidade material por violação do princípio da igualdade, consagrado no n.º 1 do artigo 13.º da Constituição, o que igualmente se invoca.

22. Por cautela de patrocínio, invocam-se ainda as seguintes inconstitucionalidades:
- O artigo 7.º, n.os 3 e 6, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março de 2020 (na sua redação original), interpretado no sentido de que a suspensão da prescrição é aplicável aos processos contra-ordenacionais pendentes aquando da entrada em vigor desta Lei, em que estejam em causa ou discussão alegados factos ilícitos imputados ao arguido praticados antes de 9, 13 ou 19 de Março de 2020, viola as garantias do direito de defesa do arguido, consagradas no artigo 32.º, n.os 1 e 10, da Constituição da República Portuguesa, os princípios da confiança e segurança jurídicas ínsitos ao Estado-de-Direito consagrado no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa e, ainda, o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 18.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa.

- O artigo 7.º, n.os 4 e 6, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março de 2020 (na sua redação original), interpretado no sentido de que o alargamento do prazo máximo de prescrição pelo período de tempo em que vigorar a situação excecional, é aplicável aos processos contra-ordenacionais pendentes aquando da entrada em vigor desta Lei, em que estejam em causa ou discussão alegados factos ilícitos imputados ao arguido praticados antes de 9, 13 ou 19 de Março de 2020, viola as garantias do direito de defesa do arguido, consagradas no artigo 32.º, n. os 1 e 10, da Constituição da República Portuguesa, os princípios da confiança e segurança jurídicas ínsitos aoEstado-de-Direitoconsagradonoartigo2.º daConstituiçãoda RepúblicaPortuguesae,ainda, o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 18.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa;

- O artigo 6.º-B, n.os 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março de 2020, na redação dada pela Lei n.º 4-B/2021, de 1 de Fevereiro, interpretado no sentido de que a suspensão da prescrição é aplicável aos processos contra-ordenacionais pendentes aquando da entrada em vigor desta Lei, em que estejam em causa ou discussão alegados factos ilícitos imputados ao arguido praticados antes 22 de Janeiro de 2021, viola as garantias do direito de defesa do arguido, consagradas no artigo 32.º, n.os 1 e 10, da Constituição da República Portuguesa, os princípios da confiança e segurança jurídicas ínsitos ao Estado-de-Direito consagrado no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa e, ainda, o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 18.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa;

- O artigo 6.º-C, n.os 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março de 2020, na redação dada pela Lei n.º 4-B/2021, de 1 de Fevereiro, interpretado no sentido de que a suspensão da prescrição é aplicável aos processos contra-ordenacionais pendentes aquando da entrada em vigor desta Lei, em que estejam em causa ou discussão alegados factos ilícitos imputados ao arguido praticados antes 22 de Janeiro de 2021, viola as garantias do direito de defesa do arguido, consagradas no artigo 32.º, n.os 1 e 10, da Constituição da República Portuguesa, os princípios da confiança e segurança jurídicas ínsitos ao Estado-de-Direito consagrado no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa e, ainda, o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 18.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa;

- O artigo 6.º-C, n.os 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março de 2020, na redação dada pela Lei n.º 4-B/2021, de 1 de Fevereiro, interpretado no sentido de que o alargamento do prazo máximo de prescrição pelo período de tempo em que vigorar a situação excecional, é aplicável aos processos contra-ordenacionais pendentes aquando da entrada em vigor desta Lei, em que estejam em causa ou discussão alegados factos ilícitos imputados ao arguido praticados antes 22 de Janeiro de 2021, viola as garantias do direito de defesa do arguido, consagradas noartigo 32.º, n. os 1 e 10, da Constituição da República Portuguesa, os princípios da confiança e segurança jurídicas ínsitos ao Estado-de-Direito consagrado no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa e, ainda, o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 18.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa.

8.1.6. (Em qualquer caso) A prescrição da pretensa contraordenação imputada ao recorrente na Sentença Recorrida (mesmo com a aplicação da suspensão «covidiana» - sempre sem conceder) visto que já decorreu o prazo de prescrição

23. Mas mesmo que se conclua pela aplicação da causa de suspensão covidiana ao caso concreto – o que se admite, sem conceder –, a verdade é que, mesmo nesse caso, a pretensa contraordenação imputada ao Recorrente DD já prescreveu, uma vez que a mesma teria sido praticada no dia 15 de maio de 2014, pelo que, na presente data, o prazo legal máximo de prescrição de 8 anos – nos termos conjugados dos artigos 28.º, n.º 3, e 27.º-A, n.º 2,–, acrescido dos períodos de suspensão covidiana – 86 dias (Leisn.º 1-A/2020, de 19 de março, 4-A/2020, de 6 de abril, e 16/2020, de 29 de maio) + 74 dias (Leis n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, e 13-B/2021, de 5 de abril) –, transcorreu no passado dia 22 de outubro de 2022, pelo que deve a decisão judicial recorrida ser revogada e substituída por outra que reconheça o decurso do prazo legal máximo de 8 anos, acrescido do período de suspensão covidiana, e, em consequência, aprescrição da pretensa contraordenação, nos termos expostos supra,com a consequente absolvição do ora Recorrente.

24. Noutro prisma, e mesmo que se considere – o que não se concede – que a pretensa contraordenação imputada ao Recorrente se prolongaria no tempo até 17 de junho de 2014, a verdade é que, mesmo aplicando a suspensão covidiana, a pretensa contraordenação iria prescrever em 4 de novembro de 2022 (17 de junho de 2022 + 140 dias), na medida em que a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, que estabeleceu a primeira suspensão COVID, entrou em vigor no dia 20 de março de 2020, mas com efeitos retroativos a 9 de março de 2020, pelo que, quando muito, essa primeira suspensão COVID apenas se pode aplicar para o futuro, ou seja, a partir de 20 de março de 2020 até 2 de junho de 2020, sob pena de violação do disposto nos artigos 2.º e 29.º da Constituição da República Portuguesa e, por outro lado, a segunda suspensão COVID introduzida pela Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, entrou em vigor no dia 2 de fevereiro de 2021, mas com efeitos retroativos a 22 de janeiro de 2021, pelo que, quando muito, esta segunda suspensão COVID apenas se pode aplicar para o futuro, ou seja, a partir de 2 de fevereiro de 2021 até 5 de abril de 2021, sob pena de inconstitucionalidade por violação do disposto nos artigos 2.º e 29.º da Constituição da República Portuguesa.

8.2. A INCLUSÃO DE CONCLUSÕES JURÍDICAS NA MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA POR PARTE DO TRIBUNAL A QUO QUE TÊM DE SER DADAS POR NÃO ESCRITAS

25. A sentença recorrida incorre em novo Erro de Direito, na medida em que, no que diz respeito à (única) contraordenação imputada ao Recorrente, inclui conclusões jurídicas na matéria de facto dada como provada, sendo que este erro manifesto é “herdado” da forma como a CMVM construiu a imputação fáctico-jurídica ao Recorrente, o que constitui uma clara e manifesta violação do disposto no n.º 4 do artigo 607.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 41.º do RGCO, 407.º do CVM e artigo 4.º do CPP.

26. Em primeiro lugar, os factos provados n.os 134 e 361 contêm a conclusão jurídica de que a “informação constante do Prospeto não [seria] completa porquanto não conteria informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser[ia]titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação”, na medida em que, como é óbvio, o conceito de completude da informação vertida num prospeto de uma oferta pública de subscrição constitui um conceito jurídico – integrado diretamente no disposto no artigo 135.º do CVM e no tipo contraordenacional estipulado na alínea d) do n.º 2 do artigo 393.º do CVM – e não um facto, pelo que devem os “factos” (de “factos” só têm mesmo o nome) provados n.os 134 e 361 da sentença recorrida ser dados por não escritos, ao abrigo do disposto no n.º 4 do artigo 607.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 41.º do RGCO, 407.º do CVM e artigo 4.º do CPP.

27. Em segundo lugar, os factos provados n.os 135 e 362 contêm a conclusão jurídica de que a pretensa informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação [seria] necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma, o que, uma vez mais, constitui um juízo conclusivo técnico-jurídico integrado nos pressupostos previstos no artigo 135.º do CVM e no tipo contraordenacional estipulado na alínea d) do n.º 2 do artigo 393.º do CVM que não pode constar da matéria de facto dada como provada, razão pela qual os “factos” (de “factos” só têm mesmo o nome) provados n.os 135 e 362 da sentença recorrida ser dados por não escritos, ao abrigo do disposto no n.º 4 do artigo 607.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 41.º do RGCO, 407.º do CVM e artigo 4.º do CPP.


8.3. VÍCIO DA SENTENÇA RECORRIDA POR CONTRADIÇÃO INSANÁVEL DA FUNDAMENTAÇÃO

28. Em primeiro lugar, e salvo melhor opinião, a sentença recorrida incorre em vício por contradição entre a própria matéria de facto provada, especificamente entre os factos n.os 134, 135, 360, 361 e 362 e os factos n.os 384, 385, 386, 432, 433 e 434, ao dar por demonstrado o pretenso facto base que enforma todos os supostos factos n.os 133, 134, 135, 360, 361 e 362 da sentença recorrida, isto é, que o “BESA, no final do ano de 2013, ser[ia] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação”, razão pela qual os pretensos factos n.os 133, 134, 135, 360, 361 e 362 da sentença recorrida devem ser dados como não provados, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP.

29. Em segundo lugar, e salvo melhor opinião, a sentença recorrida incorre em vício por contradição entre os já referidos factos provados n.os 384, 385, 386, 432, 433 e 434 e as alíneas O), VVV) e LLLL) dos factos não provados.

30. Desde logo, salvo melhor opinião, e por força dos acima referidos factos provados n.os 384, 385, 386, 432, 433 e 434 revela-se contraditório dar por não provado – como se faz na alínea O) da sentença recorrida – que seria falsa a informação de que o BESA, no final do ano de 2013, seria titular de créditos e ativos imobiliários no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero.

31.Acresce que, e por força dos acima referidos factos provados n.os 384, 385, 386, 432, 433 e 434 revela-se igualmente contraditório dar por não provado – como se faz na alínea VVV) da sentença recorrida – que o Recorrente DD verificou que a garantia soberana emitida pela República de Angola a favor do BESA imunizava o BES de quaisquer potenciais consequências que pudessem advir da carteira de créditos e imobiliário do BESA.

32. Efetivamente, e conforme decorre do facto provado n.º434 da sentença recorrida, em junho de 2014, o Banco de Portugal considerou que a garantia do Estado Angolano, de acordo com pareceres jurídicos enviados ao Banco de Portugal, deve ser considerada para efeitos de avaliação de imparidade dos devedores selecionados, tendo o Recorrente tido acesso ao parecer jurídico do Professor Doutor RR enviado ao Banco de Portugal e elaborado, em fevereiro de 2014, um memorando a sustentar que a Garantia Soberana do Estado Angolano deveria, inclusivamente, ser considerada para efeitos prudenciais no BES (cfr. fls. 2209 dos autos), pois, para efeitos de cobertura de risco de crédito – que é o que interessa para os presentes autos – jamais houve qualquer dúvida de que a Garantia Soberana do Estado Angolano cobria o risco de crédito, conforme decorre do facto provado n.º 434.

33. Por outro lado, e por força dos acima referidos factos provados n.os 384, 385, 386, 432, 433 e 434 revela-se igualmente contraditório dar por não provado – como se faz na alínea LLLL) da sentença recorrida – que, com a emissão da garantia soberana, a pretensa informação segundo a qual o “BESA, no final do ano de 2013, ser[ia] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valortotalde1.7milmilhõesdedólaresquecareciamdereestruturação”(queéqueenformaaacusação) deixou de ser atual e irrelevante.

34. Em suma, salvo melhor opinião, é manifesto que a sentença recorrida incorre num vício por contradição na fundamentação ao dar por não demonstradas as alíneas O), VVV) e LLLL), razão pela qual os pretensos factos não provados das alíneas O), VVV) e LLLL) da sentença recorrida devem ser dados como provados, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, sendo que, relativamente à alínea LLLL) com a seguinte formulação:

“LLLL). Com a emissão da garantia soberana de Angola, em 31 de dezembro de 2013, a informação de que o BESA, no final do ano de 2013, ser[ia] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação” deixou de ser atual e era irrelevante, pelo que a sua inclusão no prospeto tornaria o mesmo desatualizado e não claro” (cfr. facto não provado LLLL), página 368 da sentença recorrida).

35. Em terceiro lugar, e salvo melhor opinião, a sentença recorrida incorre igualmente em vício por contradição entre os já referidos factosprovadosn.os 384, 385e386 e a alínea XXX)dos factos não provados, na medida em que, tendo o Tribunal a quo concluído que a K... Angola se encontrava a efetuar uma revisão da carteira de créditos do BESA no facto provado n.º 384, não se compreende, salvo melhor opinião, como é que, simultaneamente, dá por não provado a alínea XXX.

36. Em suma, salvo melhor opinião, é manifesto que a sentença recorrida incorre num vício por contradição na fundamentação ao dar por demonstrados os factos n.os 384, 385 e 386 da sentença recorrida e, simultaneamente,dar por não provado o facto da alínea XXX., razãopela qual deve o facto não provado da alínea XXX. ser dado como provado, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP.


8.4. VÍCIOS DA SENTENÇA RECORRIDA POR ERRO NOTÓRIO NA APRECIAÇÃO DA PROVA

37. Em primeiro lugar, e salvo melhor opinião, a sentença recorrida incorre no vício de erro notório de apreciação da prova, ao abrigo do disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, aplicável ex vi artigo 41.º do RGCO, ao dar como provados os factos n.os 133, 134, 135, 360, 361 e 362.

38. O pretenso facto base que enforma todos os supostos factos n.os 133, 134, 135, 360, 361 e 362 da sentença recorrida, isto é, que o “BESA, no final do ano de 2013, ser[ia] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação”, não é, desde logo, verdadeiro, na medida em que, precisamente no final de 2013, isto é, em 31 de dezembro de 2013, foi emitida a Garantia Soberana do Estado Angolano a favor do BESA (cfr. fls. 8278 dos autos), pelo que eventuais créditos e ativos imobiliários cujo valor de realização fosse “próximo de zero” ou conjunto de créditos que carecessem de reestruturação estavam a coberto da aludida Garantia Soberana emitida, justamente, no final de 2013.

39.     Assim, e salvo melhor opinião, a sentença recorrida incorre em erro notório na apreciação da prova produzida nos presentes autos ao concluir que o BESA, “no final do ano de 2013, [fosse] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação’, razão pela qual os factos nºs 133, 134, 135, 360, 361 e 362 da sentença recorrida devem ser dados como não provados, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea c) do nº 2 do artigo 410º do CPP.
 
40.Em segundo lugar, a sentença recorrida incorre igualmente em erro notório na apreciação da prova quando dá por não provados os factos WWW. e XXX., constantes da página 366:
“WWW. Com interesse para estes autos e para a omissão em causa, entre Maio e Junho de 2014, o Recorrente DD não dispunha de informação concreta e detalhada sobre a situação real da carteira de crédito do BESA, apurada em Outubro de 2013” (cfr. facto não provado WWW. – página 366 da sentença recorrida).
“XXX. Com interesse para estes autos e para a omissão em causa, em 2014, realizavam-se diversas auditorias à carteira de crédito do BESA para apurar a real situação” (cfr. facto não provado XXX. – página 366 da sentença recorrida).

41.Efetivamente, decorre de prova documental junta aos autos, em particular das atas do Conselho de Administração do BES de 20 de junho de 2014 e 1 de julho de 2014, que o peloureiro do BESA, Dr. AA, informou os administradores, incluindo o ora Recorrente, de que decorriam auditorias ao BESA para, “definitivamente, conhecer, circunscrever, quantificar e avaliar, de forma, objetiva e esclarecida, os problemas da carteira de créditos do BESA”, pelo que, à data em que o prospeto foi elaborado e aprovado (maio de 2014), a pretensa informação que o “BESA, no final do ano de 2013, ser[ia] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximode zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação”, não se encontrava confirmada, tanto quanto o Recorrente foi informado (tendo sido informado do decurso dessas auditorias à carteira de créditos do BESA ainda antes da aprovação do prospeto).

42. Assim, é manifesto que a sentença recorrida incorre num erro notório de apreciação da prova ao dar por não demonstrados os factos XXX. e WWW. da sentença recorrida, razão pela qual devem os mesmos ser dados como provados, pois resultam de um erro notório na apreciação da prova, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea c)do n.º 2do artigo 410.º do CPP.

43. Em terceiro lugar, a sentença recorrida incorre em erro notório na apreciação da prova quando no artigo 132.º da matéria de facto dada como provada sustenta que o Dr. PP teria elaborado os documentos aí elencados, quando decorreu da prova produzida, em particular das declarações prestadas pelo Dr. PP, que quer a minuta da carta paraa Presidência da República Angolana, quer o memorando sobre a situação patrimonial do BESA, não foram redigidos pelo Dr. PP, mas apenas revistos.

44. Assim, é manifesto que a sentença recorrida incorre num erro notório de apreciação da prova ao dar por demonstrado no artigo 132.º da matéria de facto provada da sentença recorrida (cfr. página 234) que teria sido oDr. PP a redigiras “minutas das cartas enviadas a 5 de novembro de 2013 pelo Presidente do Conselho de Administração e pelo Presidente da Comissão Executiva do BESA ao Presidente da República de Angola, bem como do memorando sobre a situação patrimonial do BESA àquela data”, razão pela qual deve o artigo 132.º da matéria de facto provada da sentença recorrida ser alterado no sentido de que o Dr. PP apenas reviu os documentos elencados no artigo 132.º (e não redigiu), nos termos e para os efeitos do disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP.


8.5. VÍCIOS DA SENTENÇA RECORRIDA POR INSUFICIÊNCIA PARA A DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO PROVADA     

45. Em primeiro lugar, e salvo melhor opinião, a sentença recorrida incorre em vício por insuficiência da matéria de facto dada como provada ao nem sequer se pronunciar sobre o facto invocado na defesa do Recorrente – artigo 1214.º do recurso de impugnação judicial – segundo o qual o próprio Governador do Banco de Portugal declarou, em 18 de julho de 2014, que – e cita-se – “o BdP não antecipa um impacto negativo relevante na posição de capital do BES resultante da situação financeirada filial BES Angola (BESA), tendo em consideração que a Garantia do Estado Angolano cobre uma parte substancial da carteira de crédito e que existe uma forte interação entre as entidades de ambos os países” (cfr. fls. 5548 dos autos).

46. Este facto – provado com base em prova documental e reiterado nas declarações da testemunha OO – é relevante para a defesa do Recorrente e deveria ter sido incluído na matéria de facto dada como provada, pois, como é evidente, encontra-se em total concordância coma defesa do Recorrente segundo a qual o prospeto se encontrava completo, na medida em que, da perspetiva do emitente (BES), a Garantia Soberana imunizava quaisquer consequências indiretas que pudesse advir de um potencial incumprimento da carteira de créditos do BESA.

47. Assim, é manifesto que a sentença recorrida incorre num vício de insuficiência da matéria de facto dada como provada, na medida em que nem sequer se pronunciou sobreo supra alegado facto, relevante para a defesa do Recorrente, razão pela qual deve ser dado como provado que, em 18 de julho de 2014, o Governador do Banco de Portugal declarou que “o BdP não antecipa um impacto negativo relevante na posição de capital do BES resultante da situação financeira da filial BES Angola (BESA), tendo em consideração que a Garantia do Estado Angolano cobre uma parte substancial da carteira de crédito e que existe uma forte interação entre as entidades de ambos os países” (cfr. fls. 5548 dos autos), nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP.

48. Em segundo lugar, a sentença recorrida incorreu igualmente em vício por insuficiência da matéria de facto dada como provada ao nem sequer se pronunciar sobre o facto invocado na defesa do Recorrente – artigo 1211.º do recurso de impugnação judicial – segundo o qual resulta das contas do BESA de 2013 que, “[e]m 31 de dezembro de 2013, toda a carteira de crédito concedido e respetivo juro corrido, sob a garantia soberana, foi considerado como crédito reestruturado, estando classificado como crédito vincendo” (cfr. fls. 560 dos autos).

49. Salvo melhor opinião, é absolutamente evidente que este facto é igualmente relevante para a defesa do Recorrente, pois demonstra que – com a Garantia Soberana – jamais seria correto dar-se por demonstrado o baluarte factual da contraordenação imputada ao Recorrente, isto é, que o BESA, “no final do ano de 2013, [seria] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação”.

50. Assim, é manifesto que a sentença recorrida incorre num vício de insuficiência da matéria de facto dada como prova da, na medida em que nem sequer se pronunciou sobre o supra alegado facto, relevante para a defesa do Recorrente, razão pela qual deve ser dado como provado que resulta das contas do BESA de 2013 que “[e]m 31 de dezembro de 2013, toda a carteira de crédito concedido e respetivo juro corrido, sob a garantia soberana, foi considerado como crédito reestruturado, estando classificado como crédito vincendo” (cfr. fls. 560 dos autos), nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP.

51. Em terceiro lugar, a sentença recorrida incorreu em vício por insuficiência da matéria de facto dada como provada ao nem sequer se pronunciar sobre o facto invocado na defesa do Recorrente – artigo 848.º do recurso de impugnação judicial – segundo o qual o Recorrente jamais transmitiu à equipa do DAJ que acompanhou a operação de aumento do capital do BES de 2014 – isto é, PP, TT e SS – qualquer instrução no sentido de não ser levada informação relevante ao prospeto, o que, naturalmente é relevante para a descoberta da verdade e para a defesa até porque foi imputado dolo ao Recorrente.

52. Assim, é manifesto que a sentença recorrida incorre num vício de insuficiência da matéria de facto dada comoprovada, na medida em que nem sequer se pronunciou sobre o supra alegado facto, relevante para a defesa do Recorrente,razão pela qual deve ser dado como provado que o Recorrente jamais transmitiu à equipa do DAJ que acompanhou a operação de aumento do capital do BES de 2014 – isto é, Dr. PP, TT e SS – qualquer instrução no sentido de não ser levada informação relevante ao prospeto, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 410.º doCPP.

53. Em quarto lugar, a sentença recorrida incorreu em insuficiência da matéria de facto dada como provada ao nem sequer se pronunciar sobre o facto de o Recorrente ter sido informado pelo peloureiro do BESA, Dr. AA, que corriam auditorias ao BESA para “definitivamente, conhecer, circunscrever, quantificar e avaliar, de forma, objetiva e esclarecida, os problemas da carteira de créditos do BESA” (cfr. Pasta 5, fls. 2245, CA – CA2006_01072014).

54. Naturalmente que este facto é relevante para a defesa do Recorrente, visto que, tanto quanto era do conhecimento do Recorrente, estavam em curso auditorias à carteira de créditos do BESA, nas palavras do próprio peloureiro do BESA, para “definitivamente, conhecer, circunscrever, quantificar e avaliar, de forma, objetiva e esclarecida, os problemas da carteira de créditos do BESA”, pelo que a pretensa informação segundo a qual o “BESA, no final do ano de 2013, ser[ia] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor totalde1.7mil milhões de dólares que careciam de reestruturação”
não estava– tal como o Recorrente havia sido informado– sequer confirmada à data em que foi elaborado e aprovado o prospeto (maio de 2014).

55. Saliente-se que este argumento factual de defesa do Recorrente é sempre sem prejuízo de se entender que o prospeto é completo em matéria de BESA dada a emissão da Garantia Soberana pelo Estado Angolano em 31 de dezembro de 2013 que imunizou o BESA e, consequentemente, o BES, em relação a qualquer potencial incumprimento da carteira de crédito debaixo da Garantia Soberana.

56. Assim, é manifesto que a sentença recorrida incorre num vício de insuficiência da matéria de facto dada como provada, na medida em que nem sequer se pronunciou sobre o supra referido facto, relevante para a defesa do Recorrente,razão pela qual deve ser dado como provado que o Recorrente foi informado pelo peloureiro do BESA, Dr. AA, que corriam auditorias ao BESA para “definitivamente, conhecer, circunscrever, quantificar e avaliar, de forma, objetiva e esclarecida, os problemas da carteira de créditos do BESA”, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP.

57. Em quinto lugar, a sentença recorrida incorreu ainda em vício por insuficiência da matéria de facto dada como provada ao nem sequer se pronunciar sobre o facto invocado na defesa do Recorrente e que foi demonstrado durante a fase de produção de prova – artigos 1165.º a 1175.º do recurso de impugnação judicial – segundo o qual, entre janeiro e abril de 2014, a K... Angola auditou o equivalente a 80% do volume da carteira de crédito do BESA e não concluiu que o BESAfosse titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares,
cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões que careciam de reestruturação.

58. Naturalmente que este facto – que resultou, entre outros, do depoimento da testemunha XX da K... Angola – é relevante para a descoberta da verdade, visto que contraria frontalmente os pretensos factos provados n.os 133, 134, 135, 360, 361 e 362 da sentença recorrida.

59. Assim, é manifesto que a sentença recorrida incorre num vício de insuficiência da matéria de factodada comoprovada, na medida em que nem sequer se pronunciou sobre o supra referido facto, relevante para a defesa do Recorrente, razão pela qual deve ser dado como provado que, entre janeiro e abril de 2014, a K... Angola auditou o equivalente a 80% do volume da carteira de crédito do BESA e não concluiu que o BESA fosse titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões que careciam de reestruturação, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP.

8.6. ERRO DE DIREITO DA SENTENÇA RECORRIDA POR DESCONSIDERAR A INCONSTITUCIONALIDADE POR INDETERMINAÇÃO DO TIPO CONTRAORDENACIONAL PREVISTO NA ALÍNEA D) DO N.º 2 DO ARTIGO 393.º DO CVM

60. A sentença recorrida incorre em Erro de Direito por força da errada interpretação e aplicação dos artigos 1.º, 2.º e 29.º da Constituição da República Portuguesa ao considerar que o tipo previsto na alínea d) do n.º 2 do artigo 393.º do CVM respeitaria o princípio da tipicidade e da legalidade, visto que, salvo melhor opinião, é evidente que o aludido tipo contraordenacional é inconstitucional por violação das garantias referentes à segurança, certeza, confiança e previsibilidade, por força do princípio do Estado de Direito consagrado no artigo 2.º e das garantias previstas no artigo 29.º da Constituição, em particular o n.º 1, por indeterminação do tipo contraordenacional previsto na alínea d) do n.º 2 do artigo 393.º do CVM.


8.7. ERRO DE DIREITO DA SENTENÇA RECORRIDA POR VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA ACUSAÇÃO E DA VINCULAÇÃO TEMÁTICA

61. A sentença recorrida faz, salvo o devido respeito, tábua rasa dos mais elementares princípios que enformam o direito contraordenacional, em particular o princípio da acusação e da vinculação temática, aplicável ao processo contraordenacional com a conversão da decisão condenatória da autoridade administrativa em acusação, incorrendo em Erro de Direito por errada interpretação e aplicação do disposto no n.º 1 do artigo 62.º do RGCO.

62. No caso concreto, a acusação, que delimita e fixa, perante o tribunal, o objeto do processo, imputa ao Recorrente a omissão da seguinte pretensa informação do prospeto em causa nos autos: “[o] BESA, no final do ano de 2013, ser[ia] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil
milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação”.

63. Todavia, a sentença recorrida distanciou-se, ilegalmente, do caráter específico e concreto da acusação – a que o Tribunal de 1.ª Instância se encontra, evidentemente, vinculado – alargando, de forma totalmente ilegal, a imputação ao Recorrente vertida na acusação para aquilo que apelida a “razão de ser” da emissão, pelo Estado Angolano, da garantia soberana, a favor do BESA (ver, por exemplo, páginas 377, 605, 616, 617, 618 e 799 da sentença recorrida).

64. Assim, a sentença recorrida incorre em erro de Direito pois a concreta imputação que é efetuada ao Recorrente na acusação – única que releva – jamais poderia proceder, na medida em que a informação segundo a qual o “BESA, no final do ano de 2013, ser[ia] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação” (e que segundo a CMVM deveria constar do prospeto) não era, à data de maio de 2014, atual, verdadeira, objetiva e lícita, pelo que não podia ter sido incluída no prospeto.

65. Em primeiro lugar, porqueobjetivamente, no final de 2013, isto é, em 31 de dezembro de 2013, foi emitida a Garantia Soberana pelo Estado Angolano a favor do BESA, pelo que, à data de maio de 2014, não seria atual, verdadeiro, objetivo e lícito incluir informação no prospeto segundo a qual [o] BESA, no final do ano de 2013, ser[ia] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação”.

66. Em segundo lugar, porque o Recorrente foi informado – pelo administrador com o pelouro do BESA no BES – que corriam auditorias ao BESA para conhecer, circunscrever, quantificar e avaliar, de forma objetiva e esclarecida, os problemas da carteira de crédito do BESA, mas que com a Garantia Soberana emitida pelo Estado Angolano o BESA estava imunizado dos impactos financeiros que pudessem decorrer de eventuais incumprimentos (cfr. Pasta 5 – Fls. 2245 – CA – CA 2006_0107 2014 – ata do Conselho de Administração do BES de 20 de junho de 2014).

8.8. ERRODEDIREITODASENTENÇARECORRIDAPORFALTADEVERIFICAÇÃODOS PRESSUPOSTOSDOTIPO
CONTRAORDENACIONAL PREVISTO NA ALÍNEA D)DO N.º 2DO ARTIGO 393.º DO CVM

67. A sentença recorrida incorre ainda em Erro de Direito por errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 135.º do CVM e do tipo contraordenacional previsto na alínea d) do n.º 2 do artigo 393.º do CVM, na medida em que, atendendo à matéria de facto provada, não se encontram verificados os pressupostos do tipo legal contraordenacional previsto na referida alínea d) do n.º 2 do artigo 393.º do CVM.

68. Em primeiro lugar, e ao contrário do que sustenta a sentença recorrida, é evidente que a informação relativa ao BESA que consta do Prospeto não é incompleta, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea d) do n.º 2 do artigo 393.º do CVM, porquanto ficou demonstrado que o Prospeto deixou claro que a Garantia Soberana do Estado Angolano - no montante global de até USD 5.700 milhões (equivalentea€4.200milhões em 31 de dezembro de 2013) - visava proteger o BESA de “eventuais atrasos e incumprimentos na liquidação dos ativos, cobrindo crédito e juros, que beneficiam (créditos e valores de venda de imóveis)”, mas que, inclusivamente, se a Garantia Soberana não fosse renovada e se verificassem incumprimentos, tal poderia ter um efeito negativo na situação financeira e resultados do BESA e, assim, afetar a situação financeira e resultados do Grupo BES e que a garantia do Estado Angolano não cobria a integralidade da carteira de crédito do BESA, sendo que a parte não coberta pela garantia levou ao reconhecimento de € 70 milhões de perdas por imparidade de crédito (cfr. facto provado n.º 115 da sentença recorrida).

69. Em segundo lugar, a informação constante no Prospeto relativamente ao BESA permitiu aos investidores formar juízos fundados “sobre a oferta de valores mobiliários que dela são objeto e os direitos que lhe são inerentes, sobre as características específicas, a situação patrimonial, económica e financeira e as previsões relativas à evolução da atividade e dos resultados de emitente”, porquanto, com toda a informação constante no Prospeto relativamente ao BESA e à Garantia Soberana, os investidores tinham todos os elementos ao seu dispor para formar um juízo fundado sobre o aumento de capital do BES (cfr. facto provado n.º 115 da sentença recorrida).

70. Em terceiro lugar,a informação que a sentença recorrida sustentanão se encontrar incluídano Prospeto, isto é, a pretensa informação segundo a qual o “BESA, no final do ano de 2013, ser[ia] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo do zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação” (pp. 234 e 235 da sentença recorrida), era FALSA à data em que foi aprovado o Prospeto pelo Recorrente DD, isto é, 15 de maio de 2014.

71. Desde logo, porque a pretensa informação - segundo a qual o “BESA, no final do ano de 2013, ser[ia] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo do zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação” - não se encontrava sequer confirmada no final de 2013, conforme resulta da prova produzida, em particular do facto de ter ficado demonstrado que em 2014 foram realizadas diversas auditorias à carteira de créditos do BESA para aferir a concreta situação desta última, designadamente pela K... Angola (cfr. factos provados n.os 384., 385., 386., 432, 433 e 434., pp. 340, 341 e 349 da sentença recorrida).

72. Acresce que, precisamente no final de 2013, foi emitida a Garantia Soberana pela República de Angola a favordo BESA,pelo que a aludida informação (nunca confirmada) segundo a qual o “BESA, no final do ano de 2013, ser[ia] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor de 3.9 milmilhõesde dólares, cujo valor de realização era próximo do zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação”, era FALSA à dataem que foi aprovado o Prospeto pelo Recorrente DD, isto é, 15 de maio de 2014 (cfr. factos provados n.os 384., 385., 386., 432, 433 e 434., pp. 340, 341 e 349 da sentença recorrida).

73. Em quarto lugar, a alegada informação segundo a qual o BESA seria “no final do ano de 2013, titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação” em nada relevava para efeitos da formação de um juízo fundado por parte de um investidor relativamente à oferta pública em causanosautosàluzdasinformaçõesjácontidasnofatorderisco2.1.23doprospeto(cfr. facto provado n.º 115 da sentença recorrida).

74. Em quinto lugar, a conduta da CMVM, que, ao contrário da sentença recorrida, apreendeu a relevância e os efeitos da garantia do Estado Angolano, na medida em que, na sequência da publicação da notícia do ... de 7 de junho de 2014 sobre o BESA (cfr. factos provados n.os 404 e 405 – página 344), a CMVM não solicitou quais esclarecimentos à administração do BES e muito menos ordenou a publicação de qualquer adenda. E porquê? Porque a CMVM, tal como o Recorrente DD, estava a par da garantia do Estado Angolano que imunizava o BESA e, consequentemente, o BES!

75. Em suma, a sentença em crise interpreta e aplica erradamente a alínea d) do n.º 2 do artigo 393.º do CVM à matéria de facto dada como provada, visto que, em qualquer caso, não se encontram verificados, no caso concreto, os elementos (indetermináveis e subjetivos) do tipo legal contraordenacional previsto na alínea d) do n.º 2 do artigo 393.º do CVM, pelo que a sentença recorrida dever ser revogada e, consequentemente, absolvido o Recorrente.

8.9. ERRO DE DIREITO DA SENTENÇA RECORRIDA POR INEXISTÊNCIA DE QUALQUER CONDUTA VIOLADORA DO DEVER DE INFORMAÇÃO POR PARTE DO RECORRENTE

76. A sentença recorrida incorre ainda em Erro de Direito – igualmente violador da alínea d) do n.º 2 do artigo 393.º do CVM – na medida em que o Recorrente jamais praticou qualquer ato (ou omitiu) violador do dever de agir.

77. Para que pudesse existir a omissão de um dever de agir por parte do Recorrente DD em incluir a informação de que “o BESA, no final de 2013, seria “titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3,9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1,7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação”, seria necessário que a mesma fosse, pelo menos, verdadeira e não o era, à data da elaboração do Prospeto e da respetiva aprovação pelo Conselho de Administração do BES.

78. Não era, desde logo, verdadeira, na medida em que em 31 de dezembro de 2013 foi emitida a Garantia Soberana do Estado Angolano a favor do BESA (cfr. fls. 8278 dos autos), pelo que os eventuais créditos e ativos imobiliários cujo valor de realização fosse “próximo de zero” ou conjunto de créditos que carecessem de reestruturação estavam a coberto da aludida Garantia Soberana emitida, justamente, no final de 2013 (cfr. factos provados n.os 384, 385, 386, 432, 433 e 434 da sentença recorrida).

79. Neste sentido, a informação efetivamente prestada no Prospeto, no fator de risco 2.1.23, era não só verdadeira mas completa, na medida em que o referido fator de risco descrevia os termos de emissão da Garantia Soberana e advertia expressamente os investidores para os riscos de natureza financeira associados a esta garantia necessários à formulação da decisão de investir (cfr. facto provado n.º 115 da sentença recorrida).

80. O efeito imunizatório da Garantia Soberana emitida pelo Estado Angolano foi atestado pela K..., que informou o Banco de Portugal em 30 de Maio de 2014 que, do seu conhecimento, “não existem questões relevantes sobre o BESA” e que, no âmbito da revisão da carteira de crédito realizada pela K... Angola “não tinham sido encontradas deficiências relevantes, sobretudo tendo em consideração a existência da garantia soberana do Estado Angolano”, tendo o Banco de Portugal igualmente manifestou o entendimento de que a“garantiadoEstado Angolano, de acordo com pareceres jurídicos enviados ao Banco de Portugal, deve ser considerada para efeitos de avaliação de imparidade dos devedores selecionados” (cfr. factos provados n.os 433 e 434 da sentença recorrida – páginas 349 e 350).

81. Assim, o conhecimento do Recorrente – à data dos factos – era o de que a Garantia Soberana emitida pelo Estado Angolano em 31 de dezembro de 2013 imunizava o BESA e, consequentemente, o emitente (BES) relativamente a um potencial incumprimento da carteira de crédito do BESA, pelo que seria incorreto afirmar-se que o BESA, “no final de 2013, [seria] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização [seria] próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhõesdedólares que careciam de reestruturação” (alicerce da acusação e da decisão em matéria do BESA) (cfr. factos provados n.os 384, 385, 386, 432, 433 e 434 da sentença recorrida).

82. Admitindo por mera hipótese de raciocínio e nunca concedendo que a informação constante do Prospeto não constituísse objetivamente a “informação completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita que permita aos destinatários formar juízos fundados sobre a oferta, os valores mobiliários que dela são objeto e os direitos que lhe são inerentes, sobre as características específicas, a situação patrimonial, económica e financeira e as previsões relativas à evolução da atividade e dos resultados do emitente e de um eventual garante”, importa indagar se ela não corresponderia a informação completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita que um homem médio, ainda que com a especial qualificação exigida a um administrador de um banco, colocado na posição do Recorrente DD conheceria e deveria conhecer à data em que o Prospeto foi aprovado.

83. Neste ponto, o Recorrente DD, na qualidade de administrador com o pelouro dos Assuntos Jurídicos (DAJ) tomou o cuidado de (i) designar para acompanharem – pelo lado do DAJ – a operação do aumento de capital do BES, os Drs. PP, SS e TT, todos juristas com reconhecida experiência e qualidade que integravam o departamento do qual era peloureiro; e (ii) promover a contratação pelo BES da sociedade de advogados L... PORTUGAL com reconhecida experiência nesta área do Direito (cfr. factos provados n.os 380, 381, 422 e 423 da sentença recorrida).

84. O Recorrente DD tinha razões objetivas para confiar na qualidade, isenção e probidade dos membros da equipa do DAJ que designou para acompanharem a operação de aumento de capital, e nos assessores externos contratados, não se encontrando provado que o Recorrente DD tenha alguma vez dado instruções para que fosse omitida qualquer documentação e/ou informação necessária ou útil para a elaboração do Prospeto.

85. Ao contrário do que sustenta a sentença recorrida, não se verificava qualquer assimetria informativa entre o Recorrente DD e a equipa de colaboradores do DAJ envolvidos no dia-a-dia da preparação e redação do Prospeto do aumento de capital, que contava com o Dr. PP, o qual tivera conhecimento direto acerca do conteúdo das atas de 3 e 21 de outubro de 2013 das reuniões da assembleia geral do BESA e colaborara ainda diretamente com o BESA na revisão da minuta da carta enviada ao Presidente da República de Angola em novembro de 2013 e do memorando a ela anexo, do qual consta a tal afirmação de que, no final de 2013, o BESA seria “titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3,9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1,7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação” (cfr. factos provados n.os 130 e 132 da sentença recorrida).

86. Não resultou provado que o Recorrente DD tivesse dirigido o Dr. PP para que este excluísse ou deixasse de incluir no Prospeto a informação de que o BESA no final de 2013, era “titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3,9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1,7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação”.

87. Assim, a sentença comete um Erro de Direito – por errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 135.º do CVMe na alínea d) do n.º2 do artigo393.ºdo CVM –ao concluir que caberia ao Recorrente DD o dever de incluir a aludida informação, isto é, que, no final de 2013, o BESA seria “titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3,9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1,7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação”, no Prospeto.


8.10. (EM QUALQUER CASO) ERRO DE DIREITO DA SENTENÇA RECORRIDA POR AUSÊNCIA DE DOLO POR PARTE DO ORA RECORRENTE

88. Sem prejuízo do supra exposto, a verdade é que a sentença recorrida comete igualmente um Erro de Direito – violador do artigo 402.º do CVM – ao concluir que, face à matéria de facto, o Recorrente teria atuado com dolo no cometimento da pretensa contraordenação que lhe é imputada e relacionada com a pretensa omissão do prospeto da informação segundo a qual o BESA, “no final do ano de 2013, [seria] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação”.

89. Em primeiro lugar, o mero facto de ter ficado provado que o Recorrente designou para acompanhar a operação de aumento de capital - pelo lado do DAJ - juristas com reconhecida experiência e qualidade que integravam o departamento do qual era peloureiro, como resulta do facto provado n.º 380 da sentença recorrida, e de não ter ficado provado qualquer elemento que aponte para o exercício, por parte do Recorrente DD, de qualquer influência indevida no sentido de alterar o desempenho regular daquelas tarefas, é, desde logo, incompatível com a conclusão da sentença recorrida que teria ocorrido uma pretensa atuação dolosa da parte do RecorrenteDD no sentido de se omitir do Prospeto informação que fosse relevante.

90. Em segundo lugar, ficou demonstrado nos autos que um dos membros da direção do DAJ que acompanhava a operação de aumento de capital em causa nos autos, o Dr. PP (cfr. facto provado n.º 380 da sentença recorrida), o qual, à data dos factos, era o Presidente da Mesa da Assembleia Geral do BESA, tendo assistido às acima referidas reuniões de 3 e 21 de outubro de 2013 (cfr. factos provados n.os 130, 132 e 359 da sentença recorrida) e revisto o memorando sobre a situação patrimonial do BESA, dava garantias (e tranquilidade) ao Recorrente DD de que eventuais temas do BESA no Prospeto seriam devidamente acompanhados.

91. Naturalmente que o facto de o Dr. PP pertencer à direção do DAJ que acompanhava – pelo lado do DAJ – a operação de aumento de capital é incompatível, de acordo com as regras de experiência comum, com a conclusão de que o Recorrente DD teria atuado dolosamente com vista a omitir informação relativa ao BESA que deveria constar do Prospeto, na medida em que se houvesse qualquer intenção de omitir (alegada) informação sobre o BESA, naturalmente que, de acordo com as regras de experiência, o Recorrente DD não teria designado o Dr. PP para acompanhar – pelo DAJ – a operação de aumento de capital de 2014!

92. Em terceiro lugar,no momento da pretensa violação dodever de informação, constava do fator de risco 2.1.23 do Prospeto que o BES reconhecia explicitamente que poderia existir um cenário de não renovação da garantia do Estado Angolano, caso em que, existindo incumprimentos nos créditos ou desvalorizações nos imóveis garantidos, a situação financeira e resultados do BESA poderão sofrer um efeito negativo e, assim, afetar a situação financeira e resultados do Grupo BES (cfr. facto provado n.º 115 da sentença recorrida).

93. Em quarto lugar, é inteiramente legítimo que o Recorrente DD tenha concluído que a Garantia Soberana vinha acautelar qualquer eventual risco de incumprimento da carteira de crédito do BESA, conclusão a que também chegaram a K... Angola e a K... Portugal, a Comissão Executiva do BESA e o próprio Governador do BdP, conforme resulta dos factos provados n.os 384, 385, 386, 432, 433 e 434 da sentença recorrida.

94. Em suma, a sentença recorrida cometeu um Erro de Direito ao imputar ao Recorrente DD a prática da pretensa contraordenação prevista na alínea d) do n.º 2 do artigo 393.º do CVM a título doloso.


8.11. (EM QUALQUER CASO) ERRO DE DIREITO DA SENTENÇA RECORRIDA POR IGNORAR ERRO SOBRE A FACTUALIDADE TÍPICA QUE SEMPRE AFASTARIA O DOLO POR PARTE DO ORA RECORRENTE

95. Sem prejuízo do supra exposto, a verdade é que, em qualquer caso, a sentença recorrida incorre em Erro de Direito – em particular, a errada interpretação e aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 8.º do RGCO, aplicável ex vi artigo 407.º do CVM – quando afasta a aplicação (invocada a título subsidiário) do instituto do erro sobre a factualidade típica que sempre afastaria a pretensa atuação dolosa do Recorrente DD.

96. Atendendo à matéria de facto provada, o Recorrente DD sempre teria atuado em erro sobre a factualidade típica, o que sempre afastaria o dolo, ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 8.º do RGCO, aplicável ex vi artigo 407.º do CVM, na medida em que, por dois motivos essenciais, o Recorrente ignoravaque apretensa informação segundoaqual oBESA, “no final de 2013, [seria] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares,cujovalorderealização[seria]próximo de zero, bem comodeum conjuntode créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação” (alicerce da acusação e da decisão em matéria do BESA) pudesse e devesse ser incluída no Prospeto.

97. Em primeiro lugar, porquanto o efeito imunizatório da Garantia Soberana emitida pelo Estado Angolanoem31de dezembro de2013 relativamenteaum potencialriscode crédito da carteira de crédito do BESA torna, salvo melhor opinião, e de per si, incorreto, desatualizado, ilícito, falso e enganador afirmar-se, à data da elaboração e aprovação do prospeto (isto é, maio de 2014) que o BESA, “no final de 2013, [seria] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização [seria] próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação” (alicerce da acusação e da decisão em matéria do BESA), conforme resulta dos factos provados n.os 384, 385, 386, 432, 433 e 434 da sentença recorrida.

98. Em segundo lugar, e sem prejuízo de se entender que a informação prestada no Prospeto em matéria de BESA era completa, atual, verdadeira, objetiva e lícita, o Recorrente – que jamais foi peloureiro do BESA – foi informado de que a carteira de créditos do BESA se encontrava a ser auditada, tendo o peloureiro do BESA, Dr. AA, transmitido em sede do conselho deadministraçãodo BESde 20de junhode 2014 e1 de julhode 2014 (eque já havia transmitido ao Recorrente em data anterior), sendo certo que ficou demonstrado que corriam auditorias à carteira de créditos do BESA (cfr. factos provados n.os 383, 384, 385 e 433 da sentença recorrida).

99. Em face do supra exposto, e ao contrário do que sustentou a sentença recorrida, o Recorrente DD sempre teria atuado em erro sobre a factualidade típica, o que sempre afastaria o dolo, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 8.º do RGCO, aplicável ex vi artigo 407.º do CVM.

8.12. (EM QUALQUER CASO) ERRO DE DIREITO DA SENTENÇA RECORRIDA POR INEXISTÊNCIA DE NEGLIGÊNCIA POR PARTE DO RECORRENTE

100. Sem prejuízo do supra exposto, a verdade é que, salvo melhor opinião, a conduta do Recorrente DD também não padece de qualquer censura a título de negligência.

101. Em primeiro lugar, aequipa do DAJ, Pelouro entãodirigido pelo Recorrente DD, e que acompanhou, pelo lado do DAJ, a operação de aumento de capital realizada pelo BES em 2014, era constituída pelos três membros da sua Direção, os quais eram experientes e com provasdadas,a saber: Dr.PP,Dr. SS e Dra. TT (cfr. facto provado n.º 380 da sentença recorrida).

102. Assim, é evidente que o facto de o Recorrente DD ter confiado o acompanhamento da operação de aumento de capital, pelo lado do DAJ, a uma equipa composta por três elementos experientes e de competência reconhecida da Direção, isto é, o Dr. PP, o Dr. SS e a Dra. TT, tendo feito, no contexto da estrutura hierárquica, o acompanhamento que lhe competia, demonstra que o Recorrente DD jamais atuou de forma negligente ou descuidada no que diz respeito à operação de aumento de capital do BES.

103. Em segundo lugar, o BES contratou a firma de advogados L... para acompanhar o processo de elaboração do Prospeto do aumento de capital em causa nos autos (cfr. facto provado n.º 381 da sentença recorrida), sendo que a equipa da L... que acompanhou o processo de elaboração do Prospeto era liderada pelo advogado UU, o qual possui comprovada experiência na elaboração de prospetos e aumentos de capital e que, no decurso da sua já longa e brilhante carreia profissional, fez, inclusivamente, parte do Conselho Diretivo da CMVM.

104. Resulta ainda dos factos provados n.os 421 e 424 da sentença recorrida que a L... (i) organizou com o BES a auditoria de natureza legal (legal due diligence); (ii) comentou com a CMVM as diversas versões do Prospeto através de conference calls.

105. Assim, é evidente que o facto de o BES ter contratado a firma de advogados L..., com larga experiência na execução de operações públicas de subscrição, para auxiliar o BES, no processo de elaboração do Prospeto do aumento de capital e acompanhamento a operação de aumento de capital, demonstra que o Recorrente DD jamais atuou de forma negligente ou descuidada no que diz respeito à operação de aumento de capital do BES.

106. Em terceiro lugar, o Prospeto tinha 374 páginas, sendo que da página 38 até à página 76 do Prospeto constam os fatores de risco – “estava lá tudo sobre o emitente”, conforme declaração do Presidente da CMVM, tendo deixado cristalino que poderia existir um cenário de não renovação da garantia do Estado Angolano, caso em que, existindo incumprimentos nos créditos ou desvalorizações nos imóveis garantidos, a situação financeira e resultados do BESA poderão sofrer um efeito negativo e, assim, afetar a situação financeira e resultados do Grupo BES (cfr. facto provado n.º 115 da sentença recorrida).

107. Em quarto lugar, o Dr. PP fazia parte da equipa do DAJ que acompanhou a operação de aumento do capital do BES, incluindo a preparação do Prospeto, e que, enquanto Presidente da Mesa da Assembleia Geral do BESA, assistiu às reuniões da Assembleia Geral do BESAde 3 e 21 de outubro de 2013 e interveio na revisão das cartas e do memorando para o Presidente da República de Angola (cfr. facto provado n.º 132 da sentença recorrida).

108. Como é evidente, o facto de o Dr. PP integrar a equipa do DAJ que acompanhou a preparação e redação do Prospeto jamais poderia levar o Recorrente DD a pensar que existisse uma situação de omissão de informação sobre o BESA no Prospeto e que, pela sua natureza e relevância, aí devesse constar.

109. Em quinto lugar, a preparação e a redação do Prospeto foram acompanhadas pela CMVM, sendo que esta última aprovou, em 20 de maio de 2014, a versão final do Prospeto, não tendo a CMVM, na sequência da publicação da notícia sobre o BESA veiculada pelo Semanário ..., em 7 de Junho de 2014 (cfr. fls. 10506), solicitado quaisquer esclarecimentos à administração do BES e muito menos ordenado a publicação de qualquer adenda ao prospeto, o que configura o reconhecimento de que a CMVM, uma vez que estava a par da Garantia Soberana do Estado Angolano, entendera que nada havia a alterar, acrescentar ou aditar à informação em tempo vertida no Prospeto, na medida em que o Prospeto estava completo.

110. Em face do supra exposto, não se vislumbra em que medida é que se poderia sequer considerar que o Recorrente DD teria agido negligentemente.

8.13. (EM QUALQUER CASO) ERRO DE DIREITO DA SENTENÇA RECORRIDA POR AUSÊNCIA DE CULPA POR PARTE DO RECORRENTE

111. A sentença recorrida conclui que o Recorrente teria alegadamente praticado a contraordenação prevista na alínea d) do n.º2 do artigo 393.ºdo CVM com elevado grau de culpa, o que constitui uma errada interpretação e aplicação da lei, na medida em que é manifesto que não pode ser formulado qualquer juízo de reprovação jurídica em relação à conduta do Recorrente DD, pois, e pelas razões que já se analisaram a propósito da inexistência de dolo e negligência do Recorrente DD, é manifesto que não era exigível que o Recorrente DD atuasse de forma distinta, pelo que inexiste qualquer juízo de culpabilidade que possa ser imputado ao Recorrente DD relativamente à pretensa contraordenação.

8.14. (EM QUALQUER CASO) ERRO DEDIREITODA SENTENÇA RECORRIDAPOR DESCONSIDERAR OPRINCÍPIO DA CONFIANÇA COMO CAUSA EXCLUDENTE DA PRETENSA CULPA POR PARTE DO RECORRENTE

112. A sentença recorrida cometeu ainda um Erro de Direito ao desconsiderar o princípio da confiança como causa excludente da pretensa culpa por parte do Recorrente DD.

113. O Recorrente DD sempre confiou – e tinha razões objetivas para o fazer – na competência e profissionalismo de todos os intervenientes na operação de aumento de capital em causa nos presentes autos contraordenacionais, sendo que, numa instituição de crédito com a dimensão e como volume de atividade que evidenciava o BES, não havia outra hipótese lícita e justificada senão confiar nos quadros técnicos competentes que o BES, efetivamente, possuía e que se encontram responsáveis pela condução do aumento de capital, assim como nos reputados e reconhecidos assessores externos especializados que prestaram assessoria nesta matéria.

114. Em facedo supra exposto, é evidente que, em qualquer caso, o Recorrente DD jamais atuou culposamente, na medida em que tinha razões fundadas e legítimas para confiar nos departamentos e quadros técnicos do BES e demais assessores externos (L... PORTUGAL)que lidaram, diretamente, com a preparação e elaboração do Prospeto, em termos tais que, segundo o princípio da confiança, excluiriam a pretensa culpa do Recorrente DD na alegada prática da contraordenação prevista na alínea d) do n.º 2 do artigo 393.º do CVM.

8.15. ERRO DE DIREITO DA SENTENÇA RECORRIDA POR DESCONSIDERAR A INCONSTITUCIONALIDADE DA AMPLITUDE SANCIONATÓRIA DA COIMA PREVISTA NA ALÍNEA A)DO N.º 1DO ARTIGO 388.º DO CVM

115. A sentença recorrida incorreu ainda em Erro de Direito – por violação do princípio do Estado de Direito previsto nos artigos 1.º e 2.º e do princípio da proporcionalidade estipulado no artigo 18.º, todos da Constituição da República Portuguesa – ao não julgar procedente a invocação da inconstitucionalidade da amplitude sancionatória da coima prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 388.º do CVM aplicável aos autos, visto que a aludida coima - aplicável a pessoas singulares - vai de € 25.000,00 a € 5.000.000,00, o que revela uma amplitude sancionatória profundamente desproporcionada e, portanto, lesiva do princípio da legalidade contraordenacional, donde resulta evidente a inconstitucionalidade – por violação do princípio da legalidade – da desproporcionada amplitude da moldura sancionatória prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 388.º do CVM, pelo que a sentença recorrida incorre em erro de direito.

8.16. ERRO DE DIREITO DA SENTENÇA RECORRIDA POR DESPROPORCIONALIDADE, EXCESSO E DESIGUALDADE DA COIMA E DA SANÇÃO ACESSÓRIA APLICADAS AO RECORRENTE

116. A sentença recorrida aplicou, e considerou proporcional aplicar, ao Recorrente DD a pesada coima de € 400.000,00 pela alegada prática da pretensa contraordenação concretamente imputada, ainda que com a suspensão em 20% da execução da mesma, o que se revela, em qualquer caso e sempre sem prescindir, totalmente desproporcional e desconforme aos critérios legais previstos na lei para fixação da medida da coima.

117. Em primeiro lugar, a sentença recorrida desconsidera o facto de que a coima inicialmente aplicada pela CMVM, no valor único de €400.000,00, dizia respeito à alegada prática de duas contraordenações, sendo certo que a sentença recorrida revogou a condenação pela prática da segunda pretensa contraordenação, circunstância que, por si só, obriga a sentença recorrida a rever o valor da coima a aplicar.

118. Em segundo lugar, e no que diz respeito ao pressuposto da ilicitude concreta (sempre sem conceder), a verdade é que, ao contrário do que sustenta a sentença recorrida, não se pode – mesmo admitindo, por mero exercício de patrocínio, que se verificaria ilicitude – reputar “elevado o desvalor das condutas imputadas ao arguido DD” (cfr. p. 837 da sentença recorrida), na medida em queexistem diversosfactos que excluem a ilicitudee/ou,pelo menos, reduzem substancialmente o grau da ilicitude concreta.

119. Em quarto lugar, e no que diz respeito ao pressuposto relacionado com as exigências de prevenção (sempre sem conceder), a verdade é que, ao contrário do que sustenta CMVM e a sentença recorrida, jamais se poderia afirmar que as mesmas são “elevadas”.

120. Desde logo, por referência a nota de ilicitude, o presente processo contraordenacional dizia respeito a factos que ocorreram há quase oito anos, pelo que é extraordinário que a CMVM – que quando notificou o Recorrente DD da nota de ilicitude já o processo se encontrava prescrito – sufrague e que a sentença recorrida subscreva – decorridos mais de oito anos desde a prática dos alegados factos – que as exigências de “prevenção geral” seriam elevadas!

121. Em quinto lugar, e no que respeita à situação económica do Recorrente DD, a verdade é que a coima de € 400.000,00, assim como a sanção acessória de inibição, pelo período de 2 (dois)anos, se revelam excessivas e desproporcionadas, pelo que a sentença recorrida incorre em erro de direito ao aplicar ao Recorrente DD a coima e sanção acessória concretamente aplicadas.

8.17. ERRO DE DIREITO DA SENTENÇA RECORRIDA POR DESCONSIDERAR A INCONSTITUCIONALIDADE DAS NORMAS DE ILÍCITOS CONTRAORDENACIONAIS QUE PERMITEM A APLICAÇÃO DE COIMAS A PESSOAS SINGULARES SUPERIORES ÀS MULTAS PENAIS

122. Sem prejuízo do supra exposto, a decisão em crise suscita ainda uma questão de inconstitucionalidade de elevada gravidade: a manifesta desproporcionalidade da coima aplicada, em clara violação do n.º 2 do artigo 18.º da Constituição da República Portuguesa, na medida em que:
- a alínea a) do n.º 1 do artigo 388.º do CVM, em conjugação com a alínea d) do n.º 2 do artigo 393.º do CVM, interpretadas e aplicadas no sentido de que uma pessoa singular possa ser ou seja, efetivamente, punida com uma coima superior ao limite máximo abstrato da pena de multa previsto na lei penal para um único crime (€ 500 x 360 dias), viola o disposto no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição da República Portuguesa, que consagra o princípio da proporcionalidade; e

- a alínea a) do n.º 1 do artigo 388.º do CVM, em conjugação com a alínea d) do n.º 2 do artigo 393.º do CVM, e o artigo 19.º do RGCO, aplicável por remissão do artigo 407.º do CVM, interpretadas no sentido de que uma pessoa singular seja, efetivamente, punida comuma coima de € 400.000,00, viola o disposto no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição da República Portuguesa, que consagra o princípio da proporcionalidade.

123. Por conseguinte, e sem prejuízo da total falta de fundamento factual e jurídico da pretensa contraordenação imputada ao Recorrente DD, a verdade é que, em qualquer caso, a decisão em crise deve ser alterada e a coima aplicada ao ora Recorrente DD substancialmente reduzida (sem conceder).

NORMAS JURÍDICAS VIOLADAS: artigos 1.º, 2.º, 18.º, 29.º e 32.º da Constituição da República Portuguesa; artigos 135.º, alínea a) do n.º 1 do artigo 388.º, alínea d) do n.º 2 do artigo 393.º, 402.º, 405.º, 407.º, 418.º do CVM; artigos 1.º, 5.º, 8.º, 19.º, 27.º-A, 28.º, 32.º, 41.º, 62.º do RGCO; artigos 2.º e 14.º do Código Penal; n.º 4 do artigo 607.º do Código de Processo Civil; artigos 3.º, 4.º e 5.º do CPP.

Termina, formulando os seguintes pedidos:

NESTES TERMOS, E NOS DEMAIS DE DIREITO QUE V.AS EX.AS DOUTAMENTE SUPRIRÃO, DEVE O PRESENTE RECURSO SER ADMITIDO E, CONSEQUENTEMENTE:

- DECLARADA A PRESCRIÇÃO DA ÚNICA INFRAÇÃO CONTRAORDENACIONAL IMPUTADA AO RECORRENTE NA SENTENÇA RECORRIDA, COM A SUA CONSEQUENTE ABSOLVIÇÃO DO RECORRENTE;

- REVOGADA A SENTENÇA RECORRIDA E, ASSIM, ABSOLVER-SE O RECORRENTE DA ÚNICA INFRAÇÃO CONTRAORDENACIONAL EM QUE VEM CONDENADO;

- (SUBSIDIARIAMENTE) REDUZIR-SE A COIMA E A SANÇÃO ACESSÓRIA APLICADAS AO ORA RECORRENTE.

A CMVM respondeu, formulando as seguintes
           
CONCLUSÕES

Enquadramento
I.
Vem o recurso a que ora se responde interposto da douta sentença proferida a fls._ dos presentes autos, pela qual o Tribunal a quo confirmou parcialmente a Decisão proferida pela CMVM, tendo condenado os arguidos (i) AA numa coima única de € 500.000,00 (quinhentos mil euros), suspensa em 20 por cento da sua execução, pelo período de 2 anos , bem como na sanção acessória de inibição do exercício de funções de administração, gestão, direção, chefia ou fiscalização e, em geral, de representação em emitentes de valores mobiliários sujeitos à supervisão da CMVM e intermediários financeiros (artigo 404.º, n.º 1, alínea c), do CdVM), pelo período de 3 (três) anos, (ii) BB numa coima única de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros), suspensa em 20 por cento da sua execução, pelo período de 2 anos, (iii) CC numa coima única de € 950.000,00 (novecentos e cinquenta mil euros), sem suspensão, parcial ou total, da execução da sanção, bem como na sanção acessória de inibição do exercício de funções de administração, gestão, direção, chefia ou fiscalização e, em geral, de representação em emitentes de valores mobiliários sujeitos à supervisão da CMVM e intermediários financeiros (artigo 404.º, n.º 1, alínea c), do CdVM), pelo período de 4 (quatro) anos e (iv) DD, na coima de € 400.000,00 (quatrocentos mil euros), suspensa em 20 por cento da sua execução, pelo período de 2 anos, bem como na sanção acessória de inibição do exercício de funções de administração, gestão, direção, chefia ou fiscalização e, em geral, de representação em emitentes de valores mobiliários sujeitos à supervisão da CMVM e intermediários financeiros (artigo 404.º, n.º 1, alínea c), do CdVM), pelo período de 2 (dois) anos.

Da alegada prescrição do procedimento contraordenacional
Do dies a quo da contagem do prazo de prescrição
II.
As infrações em causa nos presentes autos, relativas à violação do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto (assim como do dever de publicação de adendas ao mesmo) são de natureza permanente, porquanto o momento da consumação ou lesão primária do bem ou interesse jurídico, que ocorreu com a divulgação, em 20.05.2014, do prospeto de aumento de capital do BES, após aprovação pela CMVM, (ou na(s) data(s) da ocorrência dos factos geradores da obrigação da divulgação de adenda ao Prospeto, nos casos da violação esse dever), seguiu-se um período de consumação material, em que o bem ou interesse jurídico continua a ser lesado por vontade do autor (persistência da lesão do bem jurídico por vontade do autor), o qual perdurou, pelo menos, até à admissão à negociação das ações emitidas pelo BES em resultado da Oferta.
III.
Donde, o dies a quo a considerar, é, conforme bem decidiu o Tribunal a quo, o dia 17 de junho de 2014, data da admissão à negociação das ações emitidas pelo BES em resultado da Oferta.
IV.
A contagem do prazo de prescrição inicia-se com a consumação material do facto ilícito e não com a prática do(s) contributo(s) causal(ais) de cada um dos agentes para a realização do mesmo, importando ter presente que no Direito de Mera Ordenação Social vigora o conceito extensivo de autor, o qual se encontra previsto n.º 1 do artigo 16.º do RGCO, que dispõe que, “[s]e vários agentes comparticipam no facto, qualquer deles incorre em responsabilidade por contraordenação mesmo que a ilicitude ou o grau de ilicitude do facto dependam de certas qualidades ou relações especiais do agente e estas só existam num dos comparticipantes”.

Da alegada inconstitucionalidade dos artigos 135.º e 393.º, n.º 2, alínea d), CdVM
V.
Improcede a inconstitucionalidade dos artigos 135.º e 393.º, n.º 2, alínea d), CdVM invocada pelo arguido DD interpretados e aplicados no sentido de que “a pretensa omissão de informação no Prospeto se consideraria praticada até ao final da operação de aumento de capital por violação do princípio da tipicidade vertido nos n.ºs 1, 3 e 4 do artigo 29.º da Constituição da República Portuguesa”.
VI.
No que respeita à infração imputada ao arguido por violação do dever de qualidade da informação constante do prospeto, o qual está consagrado no artigo 135.º do CdVM, a infração tem-se por praticada entre 20.05.2014 (data da aprovação do prospeto pela CMVM e divulgação no SDI da CMVM) e, pelo menos, 17.06.2014 (data até à qual poderia ter sido requerida a aprovação de adenda ao prospeto), revestindo a mesma um cariz duradouro.
VII.
Isto porque o dever de qualidade da informação constante do prospeto, previsto no artigo 135.º do CdVM, é dirigido à prestação de informação durante o período da Oferta, sendo assim por esta limitado: isto é, enquanto durar a oferta pública, a informação prestada pelo Emitente tem de revestir a qualidade prevista na lei.
VIII.
Tal interpretação não implica qualquer violação do princípio da tipicidade, pois a norma de dever cuja violação é imputada ao arguido DD – artigo 135.º do CdVM – cumpre (enquanto pré-tipo) o princípio da legalidade, na sua dimensão de tipicidade, na medida em que o conteúdo da conduta que é imposta (a prestação de informação com qualidade) e, consequentemente, a conduta proibida (a prestação de informação sem qualidade) estão perfeitamente recortadas no tipo de ilícito.
IX.
O destinatário da norma sabe que tem a obrigação de divulgar um prospeto, no quadro de uma oferta pública, e sabe que esse prospeto tem de conter informação com determinados requisitos de qualidade. Sabe, igualmente, que esse prospeto se destina a ser divulgado junto dos destinatários da oferta, de forma a assegurar a prestação da informação necessária à tomada da decisão de investimento, a qual apenas se torna definitiva no termo do período da oferta. Assim, o destinatário da norma sabe necessariamente que a qualidade da informação constante do prospeto tem se manter até ao termo da oferta (sob pena de subversão da função – informativa – desempenhada pelo prospeto).

Da alegada não verificação de causa de interrupção do prazo de prescrição nos termos do disposto no artigo 28.º, n.º 1, alínea b), RGCO
X.
Improcedem as alegações dos Recorrentes AA, BB e DD de que o procedimento contraordenacional prescreveu ainda antes da notificação da acusação aos arguidos, porquanto se verificou o decurso do prazo de prescrição (5 anos) sem que tivesse ocorrido qualquer causa de interrupção da prescrição, uma vez que as diligências probatórias realizadas pela CMVM antes da notificação da acusação não tiveram efeito interruptivo da prescrição, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 28.º do RGCO.
XI.
As inquirições de testemunhas realizadas em 22.02.2018, 06.03.2018, 09.03.2018, 15.05.2019, 27.05.2019 e 29.05.2019, ou seja, em momento prévio à dedução da acusação, consubstanciam, de forma inequívoca, diligências probatórias levadas a cabo pela CMVM no âmbito do presente processo de contraordenação, tendo a sua realização seguido os trâmites e as limitações próprias dos depoimentos em processo de contraordenação, pelo que se subsumem à causa de interrupção da prescrição prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 28.º do RGCO.
XII.
De acordo com o referido na alínea b) do artigo 28.º, n.º 1, do RGCO, é manifesto que a realização de quaisquer diligências de prova, sem distinção (e, portanto, também a inquirição de testemunhas), é apta a interromper a prescrição, independentemente do momento processual em que essa realização tenha lugar e sem que tais diligências tenham de ser levadas ao conhecimento do arguido (ao contrário do que decorre das alíneas a) e c) do mesmo artigo).

Da alegada inconstitucionalidade do artigo 28.º, n.º 1, alínea b), do RGCO
XIII.
Improcede a alegação dos Recorrentes AA, BB e DD de que a intepretação e aplicação da alínea b) do artigo 28.º, n.º 1, do RGCO efetuada pela douta sentença recorrida é inconstitucional por violação dos princípios da confiança e segurança ínsitos no princípio do Estado de Direito (artigo 2.º da CRP) e das garantias de defesa do arguido (artigo 32.º, n.ºs 1 e 10, da CRP).
XIV.
Improcede, desde logo, a alegada violação do n.º 10 do artigo 32.º da CRP uma vez que, no presente processo, foram inteiramente assegurados os direitos de audição e defesa dos arguidos, na medida em que todos os arguidos foram notificados da acusação, bem como a alegada violação do artigo 2.º da CRP, uma vez que a interpretação e aplicação da norma constante do artigo 28.º, n.º 1, alínea b), do RGCO efetuada pela Sentença recorrida não viola qualquer confiança que os arguidos pudessem ter quanto aos casos em que é aplicável a causa de interrupção de prescrição nele prevista: com a “realização de quaisquer diligências de prova”.

Da alegada não verificação das causas de suspensão da prescrição previstas na Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março e na Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro
XV.
Improcede a alegação dos Recorrentes BB e DD de que as normas relativas às “suspensões covidianas” da prescrição, previstas na Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, e na Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, não são aplicáveis aos presentes autos por suposta violação dos princípios da aplicação da lei mais favorável, bem como da não aplicação retroativa da lei penal.
XVI.
Tendo ocorrido, nos presentes autos, vários factos interruptivos e suspensivos da prescrição antes de sobre a data da prática dos factos terem decorrido cinco anos, deve considerar-se que esta apenas se verificará uma vez decorridos sete anos e meio (artigos 418,º, n.º 1, do CdVM, e 27.º-A, n.º 1, alínea a), 28.º, nºs 1 e 3, do RGCO) sobre a data da prática dos factos, acrescidos de 160 dias [86 dias, entre 09.03.2020 e 02.06.2020 (artigo 27.º-A do RGCO, conjugado com artigo 7.º, n.º 1, da Lei n.º 1-A/2020, e com os artigos 8.º e 10.º da Lei n.º 16/2020, de 29 de maio) + 74 dias, entre 22.01.2021 e 05.04.2021 (no artigo 27.º-A do RGCO, conjugado com o artigo 6.º-C da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, na redação da Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, e com os artigos 6.º e 7.º da Lei n.º 13-B/2021, de 5 de abril)].

Da alegada inconstitucionalidade das normas relativas à aplicação das causas de suspensão da prescrição previstas na Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março e na Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro
XVII.
Improcede a inconstitucionalidade dos n.os 1 e 3 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março (na sua redação original), e bem assim, do artigo 6.º-C, n.ºs 1 e 3, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março de 2020, na redação dada pela Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, alegada pelos Recorrentes BB e DD, por violação dos princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança que enformam o princípio do Estado de Direito (artigo 2.º da CRP) e dos princípios da proibição da retroatividade de lei desfavorável e da retroatividade de lei favorável (artigo 29.º da CRP), bem como dos princípio da igualdade (artigo 13.º, n.º 1, da CRP), da norma relativa à declaração do estado de emergência (artigo 19.º, n.º 6, da CRP), do princípio da proporcionalidade (artigo 18.º, n.º 3, da CRP) e das garantias do direito de defesa do arguido (artigo 32.º, n.ºs 1 e 10, da CRP).
XVIII.
A suspensão do prazo para a prática dos atos ditada pelo artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, que impede o prosseguimento do procedimento contraordenacional, não traduz qualquer inércia do Estado no exercício dos ius puniendi, sendo, antes, um fator exógeno e não removível pela autoridade competente. O que aliás, resulta bem patente nos presentes autos, tendo a CMVM, à luz da situação pandémica vivida, respeitado a suspensão, entre 09.03.2020 e 02.06.2020, do prazo para os arguidos apresentarem as respetivas defesas e, entre 22.01.2021 e 05.04.2021, a suspensão da realização de diligências de prova, que apenas puderam realizar-se depois da entrada em vigor da Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, que veio revogar o artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020.
XIX.
A conformidade da aplicação da suspensão do prazo de prescrição prevista no artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, aos processos de contraordenação da competência da CMVM pendentes à data da entrada em vigor das referidas disposições foi já afirmada, pelo Tribunal Constitucional, nos Acórdãos n.º 500/2021, n.º 660/2021 e n.º 798/2021. E tal jurisprudência, versando sobre o artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, é integralmente aplicável ao disposto ao artigo 6.º-C da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março de 2020, na redação dada pela Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, dada a identidade tanto do teor da norma, como da situação fáctica que a determinou – a designada “segunda vaga” da pandemia.
XX.
Em sentido concordante com a jurisprudência constitucional vinda de referir encontra-se a jurisprudência proferida pela Secção da Propriedade Intelectual e da Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa – vejam-se os Acórdãos proferidos pelo Tribunal da Relação de Lisboa nos processos 164/19...., 124/18.8YUSTR.L2, 309/20.7YUSTR.L1, 178/20.7YUSTR.L1 e 290/20.2YUSTR.L1.

Da alegada duração máxima de 6 meses das causas de suspensão do prazo de prescrição
XXI.
Improcede a conclusão do Recorrente DD de que a prescrição dos presentes autos ocorreu em 15.05.2022, atento o decurso do prazo de prescrição (5 anos) acrescido de metade (2 anos e 6 meses), sem que se tenha verificado qualquer causa de suspensão (que, segundo o Arguido, não pode ultrapassar 6 meses) porquanto, das causas da suspensão da prescrição previstas no artigo 27.º-A do RGCO, aplicável ex vi do artigo 407.º do CdVM, apenas as previstas das alíneas b) e c) do n.º 1 se encontram sujeitas ao prazo máximo de 6 meses previsto no n.º 2 do artigo 27.º-A do RGCO, mas já não a prevista na alínea a) do n.º 1, a que se reconduz o caso das “suspensões covidianas” da prescrição (entre 09.03.2020 e 02.06.2020, i.e., durante 86 dias e entre 22.01.2021 e 05.04.2021, i.e., durante 74 dias), prazo de suspensão esse que deve ser contado, pela totalidade, em 160 dias.

Da alegada aplicação (ilegal e inconstitucional) pela sentença recorrida do prazo de prescrição previsto no artigo 418.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na redação introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio
XXII.
A douta sentença recorrida (cfr. p. 43) não aplicou o prazo de prescrição previsto no artigo 418.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na redação introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio, tendo-se limitado a declarar a admissibilidade da aplicabilidade do artigo 418.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na redação introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio, à luz da jurisprudência citada sem, contudo, retirar qualquer consequência jurídica dessa declaração, razão pela qual fica prejudicada a apreciação das questões da ilegalidade e inconstitucionalidade da referida norma invocadas pelos Recorrentes BB e DD.

Da alegada aplicação (ilegal e inconstitucional) pela sentença recorrida da suspensão do prazo de prescrição previsto no artigo 418.º, n.º 2, do CdVM, na redação introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio
XXIII.
A douta sentença recorrida (cfr. p. 43) também não aplicou a suspensão do prazo de prescrição prevista no artigo prevista no artigo 418.º, n.º 2, do CdVM, na redação introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio, tendo-se limitado a referir que “a final, é susceptível de operar a causa de suspensão da prescrição a que alude o número 2 do artigo 418.º do Código de Valores Mobiliários, na versão introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de Maio”, razão pela qual fica prejudicada a apreciação das questões da ilegalidade e inconstitucionalidade da referida norma invocadas pelos Recorrentes BB e DD.
XXIV.
Sem prejuízo, sempre se diga que a suspensão da contagem do prazo de prescrição num processo contraordenacional por força do disposto no artigo 418.º, n.º 2 do CdVM não corresponde a um caso de retroatividade legal ou constitucionalmente proibida, na medida em que tal disposição não vem alterar a qualificação do facto (ilícito) nem sequer o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional previsto na lei antiga, mas apenas estabelecer uma causa de suspensão da contagem do prazo de prescrição do procedimento. Essa possibilidade de uma lei especial suspender a prescrição está antecipadamente prevista nos artigos 120.º, n.º 1, do Código Penal, e no artigo 27.º-A, n.º 1, do RGCO, desde, respetivamente, 1982 e 1995.
XXV.
A suspensão do prazo de prescrição prevista no artigo 418.º, n.º 2, do CdVM, dispondo sobre o procedimento contraordenacional e não sobre o facto (ilícito), é uma lei especial de natureza processual: não está sujeita ao regime do artigo 29.º da CRP (está fora da sua letra, objeto e ratio), mas sim ao artigo 32.º da CRP e aos princípios fundamentais do Estado de Direito (artigo 2.º da CRP).
XXVI.
A suspensão do prazo de prescrição a partir da prolação da sentença ora recorrida jamais pode constituir um caso de retroatividade (proibida), já que a causa de suspensão, tal como se encontra prevista no artigo 418.º, n.º 2, do CdVM, opera por via da verificação de um facto jurídico – a confirmação da decisão condenatória da autoridade administrativa – que, no caso em apreço, ocorreu após a entrada em vigor da lei. Este regime legal é, assim, perfeitamente compatível com os valores do Estado de Direito: legalidade, igualdade, proporcionalidade, previsibilidade e segurança jurídica e garantias de defesa no processo, como, aliás, foi já decidido por este Venerando Tribunal ad quem, perante norma semelhante do RGICSF – o seu artigo 209.º – pelo Acórdão de 2 de dezembro de 2021 no âmbito do Processo n.º 127/19.5YUSTR.L1, e, ainda, no processo 249/17...., por Despacho ali proferido (neste caso, tendo por base norma do artigo 166.º da Lei n.º 83/2017, de 18 de agosto).

Síntese: Da improcedência da alegada prescrição do procedimento contraordenacional
Das alegadas nulidades da Decisão da CMVM e, consequentemente, da decisão recorrida
XXVII.
Alegam, em síntese, os Recorrentes que o presente procedimento contraordenacional (i) ou já prescreveu antes da notificação da acusação aos arguidos (em 15.05.2019, segundo o Recorrente DD; em 17.06.2019, segundo os Recorrentes AA e BB), (ii) ou prescreveu entretanto (em 22.10.2022, segundo o Recorrente DD), (iii) ou irá prescrever em breve (em 04.11.2022 ou, no limite, em 24.11.2022 segundo o Recorrente BB; em 26.11.2022 segundo o Recorrente CC).
XXVIII.
Adere-se à posição vertida na sentença recorrida quanto à não verificação da prescrição, nomeadamente, da que ocorreria em 26.11.2022, se não fosse pela aplicação da causa de suspensão prevista no artigo 418.º, n.º 2, do CdVM, na versão introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio.
XXIX.
Considerando que a douta sentença recorrida, proferida em 10.10.2022, confirmou parcialmente a decisão da CMVM que condenou os Arguidos AA, BB, CC e DD pela prática de contraordenações relativas à violação do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM e do dever de requerer adenda ao prospeto, previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CdVM, verificou-se, nessa data, facto que se subsume à causa de suspensão da prescrição prevista no artigo 418.º, n.º 2, do CdVM, na versão introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio, pelo que a prescrição do presente procedimento contraordenacional se encontra suspensa desde 10.10.2022.
XXX.
A aplicação da causa de suspensão da prescrição prevista no artigo 418.º, n.º 2, do CdVM, na versão introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio, não foi feita pelo Tribunal a quo, mas terá de ser apreciada pelo Tribunal ad quem, quando conhecer dos recursos a que ora se responde.

Das alegadas nulidades da Decisão da CMVM
Da alegada nulidade da Decisão por violação do princípio da igualdade
XXXI.
Improcede a arguida nulidade do processo de contraordenação, da decisão da CMVM e da sentença recorrida, por violação do princípio da igualdade (artigos 13.º e 18.º da CRP), invocada pelo Recorrente AA por ter sido condenado por factos que eram do conhecimento de outros arguidos (quanto ao valor da exposição BES às entidades da ESFG à data da aprovação do prospeto e quanto financiamentos concedidos à ESFG durante a Oferta) e que não foram sequer acusados.
XXXII.
Como resulta da douta sentença recorrida, (i) a responsabilização dos arguidos não se funda apenas e só na sua qualidade de administradores do BES, mas sim no apuramento da sua intervenção, pessoal e direta, nos factos, razão pela qual outros administradores do BES, que também aprovaram a operação do aumento de capital, não são visados nestes autos, (ii) a CMVM apenas deduziu acusação contra os agentes relativamente aos quais nos autos existiam elementos probatórios suficientes para sustentar a prática de um contributo causal para a prática das contraordenações em causa e (iii) para a avaliação do preenchimento dos elementos objetivos e subjetivos do tipo de ilícito em causa relativamente a cada um dos arguidos visados nos presentes autos releva apenas a conduta dos próprios, sendo irrelevante a análise da alegada atuação de outros administradores não visados nos presentes autos.

Da alegada nulidade da Decisão da CMVM por imputação genérica de factos
XXXIII.
Tal como decidiu o Tribunal a quo, o disposto no artigo 283.º, n.º 3, alínea b) do CPP, que disciplina o conteúdo da acusação pelo Ministério Público em processo penal, não é aplicável aos processos de contraordenação. Com efeito, o conteúdo da decisão condenatória proferida pela autoridade administrativa no âmbito de processo de contraordenação encontra-se regulado no artigo 58.º do RGCO, cuja aplicação afasta, nos termos do disposto no artigo 41.º, n.º 1, do RGCO, a necessidade (e admissibilidade) de recurso aos preceitos do processo penal.
XXXIV.
Não corresponde à verdade a alegação do Recorrente CC de que a Decisão da CMVM (e, consequentemente, a Sentença Recorrida) é nula por imputação de factos por recurso a meros juízos conclusivos, ou seja, por não concretizar os factos que fundamentaram a respetiva condenação. Com efeito, a CMVM procedeu a uma descrição exaustiva e devidamente circunstanciada de todos os factos constantes da Decisão, e, em concreto, dos que são referidos pelo Arguido relativos (i) ao conhecimento pelo arguido de que a informação omitida ou não divulgada era necessária para a decisão dos destinatários da oferta e (ii) ao facto de o arguido não ter, durante o período de duração da oferta, adotado qualquer medida adequada a sanar os vícios da informação que conhecia.
XXXV.
O que a “narração dos factos da decisão que aplique uma coima ao arguido” tem de assegurar é que as circunstâncias de modo, tempo e lugar em que os factos ocorreram sejam suficientemente percetíveis de modo a que o arguido possa exercer o seu direito de defesa, e isso encontra-se plenamente garantido ao arguido na Decisão da CMVM, como bem decidiu o douto Tribunal a quo.

Das alegadas ilegalidades e nulidades da sentença recorrida
Da alegada ilegalidade por inclusão na sentença recorrida de conclusões jurídicas na matéria de facto provada
XXXVI.
Improcede a alegada ilegalidade da douta sentença recorrida por inclusão de conceitos jurídicos na matéria de facto provada invocada pelo Recorrente DD, em violação do disposto no artigo 607.º, n.º 4, do CPC, aplicável ex vi dos artigos 4.º CPP, 41.º RGCO e 407º CdVM, (i) desde logo, porque inexiste qualquer lacuna em matéria do conteúdo da sentença em sede de processo contraordenacional que consinta na invocada aplicação subsidiária do artigo 607.º, n.º 4, do CPC, relativo à elaboração da sentença em processo civil e (ii) depois, porque, as expressões “completa” e “necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma” utilizadas nos factos provados 134, 135, 361 e 362 constituem realidades perfeitamente apreensíveis e compreensíveis pelo intelecto humano, nomeadamente, do homem médio, pelo que não se reconduzem a conceitos jurídicos cuja inserção na matéria de facto se encontre vedada.
XXXVII.
A jurisprudência vem defendendo que não é pela circunstância de um determinado conceito constar da lei, que não pode ser considerado matéria de facto. Importa sim, é que ele seja utilizado com o sentido de acontecimento ou manifestação do mundo exterior, mesmo que se reporte a atuações dos seres humanos do foro interno. À luz da citada jurisprudência, apenas é vedada a inclusão de “um ponto da matéria de facto [que] integre uma afirmação ou valoração de factos que se insira na análise das questões jurídicas a decidir, comportando uma resposta, ou componente de resposta àquelas questões” (Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 01.05.2017 (Proc. n.º 476/13.6TTPRT.P1), disponível em www.dgsi.pt), o que não é, manifestamente, o caso das expressões “completa” e “necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma” utilizadas nos factos provados 134, 135, 361 e 362.

Da alegada nulidade por falta de fundamentação
XXXVIII.
Para se verificar a nulidade da sentença cominada pelo disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 379.º do CPP será necessário que falte, em absoluto, a fundamentação quanto aos aspetos indicados no n.º 2 do artigo 374.º do CPP.
XXXIX.
Ora, pela mera leitura da sentença (maxime pp. 208, 209, 219 a 221, 235 a 236 e 284 a 295, quanto aos factos provados que fundamentaram a condenação do Recorrente BB, pp. 362 a 365 quanto aos factos não provados alegados pelo Recorrente BB e pp. 409 a 429, 465 a 471 e 541 a 563 quanto à motivação da sentença relativamente aos factos dados como provados e não provados) pode concluir-se que a mesma dá inteiro cumprimento ao dever de fundamentação ínsito no n.º 2 do artigo 374.º do CPP, improcedendo a nulidade que lhe pretende assacar o Recorrente BB “no que concerne à justificação do resultado atingido nos factos provados e não provados”.

Da alegada nulidade por omissão de pronúncia
XL.
Para se verificar a nulidade da sentença cominada pelo disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 379.º do CPP é necessário que “o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”. Ou seja, o Tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos invocados pelas partes a propósito de cada matéria, mas apenas a decidir os problemas concretos que as partes pretendem ver apreciados.
XLI.
Uma das questões a apreciar pelo Tribunal a quo é justamente a fundamentação dos factos dados como provados, in casu, as razões pelas quais deu como provado que as duas cartas assinadas pelo Recorrente CC, em 09.06.2014, tinham a natureza de cartas de conforto (cfr. factos provados 142, 143, 145, 146, 147, 148, 202, 203, 204, 205, 206, 213, alíneas f), g), h), i) e j), 339, 340, 341, 342, 343, 351, alíneas g), h), i), j) e k)), o que a douta sentença recorrida fez (cfr. pp. 471-482).
XLII.
Sem prejuízo, sempre se diga que a douta sentença recorrida apreciou também o argumento do Recorrente CC relativo à apreciação feita pela Comissão Liquidatária do BES relativa aos créditos reclamados pelo BANDES e FONDEN com fundamento nas referidas cartas (cfr. pp. 391-392), ainda que com conclusão distinta da pretendida por aquele, pelo que improcede a nulidade por omissão de pronúncia invocada pelo Recorrente CC.

Dos alegados vícios da decisão recorrida previstos no n.º 2 do artigo 410.º do CPP
Das alegadas insuficiências para a decisão da matéria de facto provada
XLIII.
A previsão do artigo 410.º, n.º 2, alínea a), do CPP, limita-se às situações em que a sentença recorrida sustenta a decisão de direito em factos que não foram dados como provados, isto é, quando a conclusão extravasa as premissas (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11/10/2005, processo n.º 898/05 – 5.ª).
XLIV.
Na Sentença recorrida, não há qualquer lacuna factual: o Tribunal a quo não se quedou do seu dever de indagar os factos em vista da descoberta da verdade material e a matéria de facto provada permite, em exata medida, suportar o raciocínio «lógico-subsuntivo» que é, corretamente, feito pelo Tribunal recorrido: as conclusões (de direito) do Tribunal recorrido não extravasam as premissas (de facto).
XLV.
Improcedem as concretas insuficiências para a decisão da matéria de facto provada invocadas pelos Recorrentes AA, CC e DD que, na verdade, se traduzem antes numa impugnação da matéria de facto dada como provada na sentença recorrida, o que lhe está vedado nos termos do disposto no artigo 75.º, n.º 1, do RGCO e no artigo 410.º, n.º 2, do CPP.

Das alegadas contradições insanáveis da fundamentação
XLVI.
Para que se verifique o vício de contradição insanável da fundamentação, tem que existir uma contradição (patente na decisão de que se recorre) na própria fundamentação (na medida em que conduz a conclusões contraditórias entre si) ou entre a fundamentação e a decisão (porquanto a fundamentação deveria conduzir a decisão contrária daquela que ficou firmada na decisão).
XLVII.
Devendo ainda salientar-se que a contradição, para ser juridicamente relevante, à luz do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, tem de consistir numa contradição que não pode ser ultrapassada pelo próprio texto da decisão recorrida.
XLVIII.
No caso em apreço, não existe qualquer contradição insanável na fundamentação da sentença, nem, ainda, contradição insanável entre a fundamentação e a decisão, pois o Tribunal a quo enumera claramente os factos (provados e não provados) e procede a um exame crítico da prova, sendo que tal exame crítico mostra-se coordenado com os factos provados (e não provados) e o iter percorrido pelo julgador é perfeitamente apreensível e coerente – ou seja, não existe no seio da fundamentação da sentença qualquer contradição entre os diferentes elementos que a compõem, e a decisão proferida mostra-se coerente com a fundamentação apresentada, não apresentando qualquer elemento contraditório.
XLIX.
O Tribunal a quo não chegou foi às conclusões que os Recorrentes AA, BB, CC e DD pretendem, mas não há nisso qualquer vício.

Dos alegados erros notórios na apreciação da prova
L.
Para que exista erro notório na apreciação da prova é requisito que o vício resulte do texto da decisão recorrida, sem recurso a confronto com quaisquer elementos de prova constantes dos autos.
LI.
No caso em apreço, o que os Recorrentes pretendem não é que seja sindicada um putativo erro notório de apreciação da prova, mas, sim, que seja reapreciada ex novo a prova em violação do disposto nos artigos 75.º do RGCO e 410.º, n.º 2, do CPP.
LII.
Os Recorrentes pretendem com a sua alegação que o Tribunal da Relação confronte determinados factos dados como provados com certos elementos probatórios constantes dos autos, por forma a concluir que determinados documentos ou depoimentos imporiam conclusão diferente quanto à matéria de facto, o que não é admissível porquanto ultrapassa claramente os fundamentos do recurso previstos no artigo 410.º, n.º 2, do CPP, na medida em que, como resulta claro desta norma, o erro notório na apreciação da prova tem que resultar “do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum”.
LIII.
Não deve, por isso, o Tribunal conhecer da questão suscitada pelos Recorrentes AA, BB e DD por a mesma extravasar os seus poderes de cognição tal como estão definidos no artigo 410.º, n.º 2, do CPP.

Dos alegados erros de direito da sentença recorrida
Da alegada atuação dos arguidos segundo o princípio da confiança
LIV.
Como bem decidiu o Tribunal a quo, o princípio da confiança, nos termos descritos na doutrina penalista portuguesa, tem aplicação no âmbito do tipo de ilícito negligente: com efeito, nomeadamente em situações de divisão de tarefas no seio de uma equipa, o princípio da confiança permite afirmar a não responsabilidade do agente que atua de forma negligente, quando este pudesse legitimamente confiar que outros cumpririam os respetivos deveres de cuidado.
LV.
O princípio da confiança não legitima que os superiores hierárquicos deixem de exercer as suas próprias funções ou que as exerçam sem o respeito pelos deveres de cuidado.
LVI.
A confiança de que outros cumpram os seus deveres não impede nem o cuidado devido nas circunstâncias concretas em que se atua se existirem razões para tal (e existiam, como se demonstra na presente Decisão) nem o cumprimento dos deveres de cuidado a que pessoalmente se está obrigado pela natureza dos cargos, pelas matérias em que se intervém e pela necessidade de cumprir a lei vigente.

Da alegada violação do princípio da acusação e vinculação temática
LVII.
Resulta evidente do mero confronto do segmento decisório da Decisão da CMVM e da douta Sentença recorrida que a imputação feita ao Recorrente é exatamente a mesma, não se tendo, por conseguinte, o Tribunal a quo “afastado” da acusação ou “desrespeitado a vinculação temática” dos presentes autos.
LVIII.
O Recorrente DD pretende reduzir a imputação da infração ao ponto 133 dos factos provados (da Sentença e da Decisão da CMVM), quando este é, apenas, um dos factos que sustenta a imputação. No entanto, como resulta claro, quer da Decisão, quer da Sentença, a contraordenação imputada ao Arguido resulta da violação dolosa do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM, por não constar do prospeto informação completa quanto à situação financeira e patrimonial do BESA detetada em finais de 2013 que esteve origem na emissão pela República de Angola, em 31.12.2013, da garantia soberana a favor do BESA.

Do alegado erro na interpretação dos artigos 135.º e 142.º do CdVM
LIX.
A aferição da necessidade ou relevância da informação sobre os aumentos de exposição do BES à ESFG constitui matéria de facto e, como tal, o que o Recorrente pretende, com a invocação de um suposto erro de direito é, afinal, impugnar a matéria de facto dada como provada, o que, como bem sabe, lhe é vedado por força do disposto no artigo 75.º do RGCO.
LX.
Não obstante, sempre se diga que o conceito de “informação (...) que permita aos destinatários formar juízos fundados sobre a oferta” constitui, em bom rigor, um elemento normativo dos tipos infracionais previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM conjugado com o artigo 393.º, n.º 2, alínea d), do CdVM, e no artigo 142.º, n.º 1, do CdVM conjugado com o artigo 393.º, n.º 2, alínea c), do CdVM, o qual tem de ser apreciado face às circunstâncias do caso concreto, nomeadamente à luz da função desempenhada pelo prospeto no contexto de uma oferta pública.
LXI.
Do conjunto de informação que, nos termos do Regulamento do Prospeto, tem necessariamente de constar do prospeto decorre que nem toda a informação que tem de ser divulgada no prospeto é, em si mesma, “price sensitive information”.
LXII.
Se já constava do prospeto informação sobre a exposição do BES à ESFG e subsidiárias (enquanto parte relacionada) com referência a 31.12.2013 (factos provados 109 e 177), ao abrigo do referido normativo significa que o emitente tinha o dever de divulgar no prospeto (ou através de adenda ao prospeto, relativamente a factos posteriores à divulgação do prospeto) alterações significativas, quanto a essa matéria, face à informação que resultava das últimas contas auditadas, como muito bem sublinhou o Tribunal a quo.

Da alegada inconstitucionalidade da hipotética interpretação dos artigos 135.º e 142.º do CdVM a realizar pelo Tribunal ad quem
LXIII.
A arguição de inconstitucionalidade é manifestamente extemporânea, dado que, não só o Tribunal a quo não aplicou, na Sentença recorrida a “norma” identificada pelo Recorrente, como a sua aplicação pelo Venerando Tribunal ad quem é meramente hipotética ou eventual, porque necessariamente futura. Donde, a inconstitucionalidade arguida pelo Recorrente não pode, sequer, ser conhecida.
LXIV.
Sem prejuízo do exposto, sempre se diga que, de facto, o conceito de “informação (...) que permita aos destinatários formar juízos fundados sobre a oferta” constitui, como se disse supra, um elemento normativo dos tipos infracionais previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM conjugado com o artigo 393.º, n.º 2, alínea d), do CdVM, e no artigo 142.º, n.º 1, do CdVM conjugado com o artigo 393.º, n.º 2, alínea c), do CdVM. E, como tal, constitui necessariamente matéria de facto e, como tal, nos termos do disposto no artigo 75.º do RGCO, subtraída do conhecimento do Tribunal de segunda instância em processo de contraordenação.

Da alegada inconstitucionalidade dos artigos 393.º, n.º 2, alíneas c) e d), do CdVM
LXV.
Improcede a alegada inconstitucionalidade dos artigos 393.º, n.º 2, alíneas c) e d), do CdVM, como resulta claro da Sentença recorrida (cfr. pp. 146 -150), que de forma clara apreciou a argumentação dos Recorrentes CC e DD.
LXVI.
Acrescenta-se apenas que, referindo-se aos requisitos de qualidade de informação previstos no artigo 7.º do CdVM – que correspondem exatamente aos previstos no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM: informação “completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita” – o Tribunal Constitucional já se pronunciou, no Acórdãos n.º 85/2012 e no Acórdão n.º 500/2021, no sentido da não inconstitucionalidade dos artigos 7.º e 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM por violação do princípio da legalidade, na vertente da tipicidade.

Do alegado erro quanto à exigência de atualidade no prospeto da informação relativa à exposição do BES à ESFG e subsidiárias
LXVII.
O requisito de atualidade da informação divulgada no prospeto, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM, impõe a divulgação de informação com referência ao período temporal mais recente disponível relativamente ao qual a informação deva ser divulgada, sendo que decorre da função do prospeto que os responsáveis pela informação constante do prospeto devem garantir a qualidade da informação nele divulgada, incluindo a sua atualidade.
LXVIII.
No caso concreto, a evolução da exposição do BES à ESFG e subsidiárias ao longo de 2014 é de tal montante (um aumento de mais de 83,79 % face ao montante com referência a 31.12.2013) que leva à desatualização da informação constante do prospeto, por referência a 31.12.2013.
LXIX.
Assim, à luz do disposto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM, conjugado com o n.º 20.9 do Anexo I do Regulamento (CE) n.º 809/2004, da Comissão, de 29 de abril, é manifesto – como bem decidiu o Tribunal a quo – que o BES devia ter feito constar do prospeto que foi aprovado pela CMVM em 20.05.2014 informação acerca do montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data de aprovação do prospeto, que ascendia a cerca de 533 M €.

Da alegada atualidade e completude da informação constante do Prospeto
LXX.
O Tribunal a quo fez constar do elenco dos factos provados – à semelhança do fizera a CMVM na sua Decisão –, os factos 111, 112, 113, 134, 135, 141, 142, 143 e 148, pelo que resultou provado que do prospeto não constava informação completa e atual. Donde, o que os Recorrentes pretendem, com a invocação dos supostos erros de direito é, afinal, impugnar a matéria de facto dada como provada, o que, como bem sabem, lhes é vedado por força do disposto no artigo 75.º do RGCO.

Da alegada inexistência de dever de atuação dos Recorrentes
LXXI.
Resultou provado que o Recorrente DD era administrador executivo do BES e, nessa qualidade, não só aprovou o prospeto, como esteve diretamente envolvido na sua elaboração. Ora, atentas, por um lado, as funções que exercia no BES e a concreta participação que teve no processo de elaboração e aprovação do prospeto, e, por outro lado, o facto de conhecer a informação omitida que era necessária para a decisão dos destinatários da oferta, o arguido DD tinha o dever de agir no sentido de garantir o cumprimento, pelo emitente, dos deveres previstos nos artigos 135.º, n.º 1, e 142.º, n.º 1, do CdVM.
LXXII.
O Recorrente DD tinha, de acordo com as normas (artigos 135.º, n.º 1, e 142.º, n.º 1, do CdVM) um dever de conformar a sua conduta com o dever de assegurar a qualidade de informação constante do prospeto – como lhe era manifestamente possível: o arguido conhecia a informação omitida que era relevante para a decisão dos destinatários da oferta e era administrador do BES.

Da alegada inexistência de dolo ou de negligência
LXXIII.
Conforme resulta dos factos provados da Sentença recorrida, ambos os elementos (intelectual e volitivo) do dolo estão preenchidos, tendo resultado demonstrado na Sentença recorrida o conhecimento e vontade dos Recorrente AA, CC e DD na prática dos factos descritos.
LXXIV.
Com efeito, os Recorrentes conheciam os factos descritos no elenco de factos provados, porquanto se trata de factos próprios, em que intervieram e controlaram. Todavia, quiseram praticar aqueles factos, decidindo (i) não incluir no prospeto informação que era do seu conhecimento e necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma e (ii) não requerer adenda ao prospeto relativamente a factos ocorridos após a divulgação do prospeto e até à admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, que eram do seu conhecimento e eram relevantes para a decisão dos destinatários.
LXXV.
A decisão tomada pelos Recorrentes de não levar ao conhecimento dos investidores, no prospeto de aumento de capital do BES de 2014 e através de adendas ao mesmo, de informação que era do seu conhecimento e necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma, nos termos referidos foi um ato representado e pretendido pelos Recorrentes AA, CC e DD.

Da alegada inexigibilidade de conduta diversa aos arguidos
LXXVI.
O que está em causa quando se afirma que não era exigível ao agente a adoção do comportamento que lhe era imposto pela norma é a afirmação da ilicitude do facto, mas a exclusão da culpa do agente: o homem médio, uma vez colocado na posição em que se encontrou o agente, não teria adotado um comportamento distinto do adotado pelo agente. A inexigibilidade não configura, assim, uma causa geral de exclusão da culpa, operando apenas “nas hipóteses em que a lei tenha entendido exprimi-la” – tais situações são o estado de necessidade desculpante (artigo 35.º do CP) e o excesso de legítima defesa desculpante (artigo 33.º do CP).
LXXVII.
Independentemente da discussão sobre a aplicabilidade da figura exigibilidade enquanto cláusula geral de exclusão da culpa (quando ela não encontra previsão legal, nem no direito penal, nem no direito de mera ordenação social), os argumentos que Recorrente AA apresenta para afirmar a inexigibilidade de uma conduta distinta da que adotou não podem proceder, como bem decidiu o Tribunal a quo, pois que resulta dos factos provados que o Recorrente AA era administrador executivo do BES e aprovou e participou no processo de elaboração do prospeto, sendo, por isso, responsável pelo seu conteúdo e, atentas por um lado, as funções que exercia no BES e a concreta participação que teve no processo de elaboração e aprovação do prospeto, e, por outro lado, o facto de conhecer a informação omitida que era necessária para a decisão dos destinatários da oferta, o Recorrente AA tinha o dever de agir no sentido de garantir o cumprimento, pelo emitente, dos deveres previstos nos artigos 135.º, n.º 1, e 142.º, n.º 1, do CdVM.
LXXVIII.
Em suma, não só era exigível ao arguido que atuasse de acordo com as normas (artigos 135.º, n.º 1, e 142.º, n.º 1, do CdVM) – isto é, que conformasse a sua conduta com o dever de assegurar a qualidade de informação constante do prospeto – como tal lhe era possível: o arguido conhecia a informação omitida que era relevante para a decisão dos destinatários da oferta e era administrador do BES.

Do alegado erro sobre a factualidade típica
LXXIX.
A alegação dos Recorrentes CC e DD é claramente improcedente, como resulta da mera leitura da Sentença recorrida, que apreciou tais alegações dos Recorrentes, em termos convincentes e concludentes: os Recorrentes CC e DD alegam ter agido sem representação dos elementos do tipo-de-ilícito prestação de informação sem qualidade (previsto nos artigos 135.º, n.º 1, do CdVM, conjugado o artigo 393.º, n.º 2, alínea d), do CdVM e no artigo 142.º, n.º 1, do CdVM, conjugado com o artigo 393.º, n.º 2, alínea c), do CdVM), em virtude de (alegadamente) ignorarem  que a informação omitida no prospeto e em adendas ao mesmo era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. Sucede que alegação dos Recorrentes é frontalmente contrária à factualidade apurada nos autos, como muito bem decidiu o Tribunal a quo.

Das infrações em concurso
LXXX.
Bem andou a douta sentença recorrida quando concluiu (cfr. pp. 796-799), à luz do artigo 30.º, n.º 1, do CP, aplicável ex vi do artigo 32.º do RGCO, pela verificação de uma situação de concurso efetivo, e, consequentemente, pela condenação do (i) arguido AA pela prática de duas contraordenações pela violação do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM e uma contraordenação pela violação do dever de requerer adenda ao prospeto, previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CdVM e do (ii) arguido CC pela prática de duas contraordenações pela violação do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM e duas contraordenações pela violação do dever de requerer adenda ao prospeto, previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CdVM, atenta a pluralidade de vezes que os arguidos violaram as referidas normas de dever.
LXXXI.
Também bem andou a douta sentença recorrida quando concluiu (cfr. pp. 800-804), não só pela inaplicabilidade em sede de processo de contraordenação da figura do crime continuado, como – a admitir a referida aplicação – pela não verificação dos respetivos pressupostos legais (cumulativos): (a) proteção do mesmo bem jurídico; (b) execução de forma tendencialmente homogénea e (c) no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente.
LXXXII.
Tendo preenchido o mesmo tipo de ilícito várias vezes, os arguidos AA e CC incorreram na prática de igual número de contraordenações, devendo as várias violações imputadas àqueles arguidos ser subsumidas a um concurso real e efetivo de contraordenações, pelo que improcede a alegação do Recorrente CC quanto à verificação nos presentes autos de uma situação de concurso aparente.

Das sanções aplicadas
Da errada determinação da medida concreta da coima aplicada ao Arguido CC
LXXXIII.
A coima e sanção acessória aplicadas ao arguido CC não merecem qualquer censura pois assentaram numa ponderação específica da gravidade da conduta do arguido, do seu grau de culpa, bem como das exigências de prevenção, em estreita observância do disposto nos artigos 404.º e 405.º do CdVM e do artigo 21.º do RGCO.
Designadamente, o Tribunal a quo considerou e valorou corretamente, quer a “situação de saúde” do Recorrente, quer o decurso do tempo sobre a prática na infração na aferição das exigências de prevenção especial.

Da alegada desproporcionalidade, excesso e desigualdade da coima e sanção acessória aplicadas ao Recorrente DD
LXXXIV.
A coima e sanção acessória aplicadas ao arguido DD não merecem qualquer censura pois assentaram numa ponderação específica da gravidade da conduta do arguido, do seu grau de culpa, bem como das exigências de prevenção, em estreita observância do disposto nos artigos 404.º e 405.º do CdVM e do artigo 21.º do RGCO.

Da alegada inconstitucionalidade do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), CdVM
LXXXV.
Improcedem as inconstitucionalidades do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, alegadas pelo Recorrente DD, conforme doutamente decidido nas pp. 841-850 da douta sentença recorrida, conclusão a que se adere inteiramente.
Termina, pedindo a improcedências dos recursos.
Também o Ministério Público respondeu, formulando as seguintes


CONCLUSÕES

1- O objeto do presente recurso é delimitado pelas conclusões da sua motivação e restrito à matéria de direito, sem prejuízo da cognição pelo Tribunal ad quem dos vícios constantes do texto da decisão recorrida;

2-- A douta sentença ora em recurso foi devidamente fundamentada, seja de facto, seja de direito,
     não existindo vícios no seu texto;

2- A sentença interpretou corretamente a prova validamente produzida em audiência e
 fundamentou, de forma adequada, os concretos motivos de apreciação da mesma;

3- Da mera leitura da decisão e da análise do restante processado, resulta, com meridiana
certeza, que a mesma procedeu à correta determinação das normas legais e à sua acertada aplicação;

5- A douta sentença não violou qualquer preceito e não merece reparo.

Neste Tribunal da Relação, o Exmo. Senhor Procurador Geral Adjunto teve vista dos autos, nada acrescentando à posição assumida pelo Ministério Público em 1ª instância.

Foram colhidos os Vistos.
***
II. Fundamentação de Facto.
Com interesse para a boa decisão da causa, foram considerados provados pelo
tribunal de 1ª instância, os seguintes factos:

Secção I – Factos gerais

1. O Banco Espírito Santo, S.A. (doravante, BES) era, à data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, uma sociedade aberta, emitente de valores mobiliários admitidos à negociação no mercado regulamentado da Euronext Lisbon, denominado Eurolist by Euronext Lisbon. (fls. 3245-3573)
2. À data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, o BES fazia parte do Grupo Espírito Santo (doravante, GES). (fls. 24-211 e 944-1192)
3. O GES foi criado em 1975 pela família E... e era constituído por um conjunto de sociedades que se dedicavam a atividades do ramo financeiro e do ramo não financeiro. (fls. 24-211, maxime fls. 76 v.; 944-1192, maxime fls. 950)
4. O GES tinha como holding de topo a Espírito Santo Control, S.A.. (fls. 320 v.; 3719; 4858 v.).
5. A Espírito Santo Control S.A. detinha, à data da prática dos factos objeto do presente processo, 56% do capital social da Espírito Santo International, S.A. (doravante, ESI). (fls. 320 v.; 3719; 4858 v.)
6. A ESI é uma sociedade anónima, de direito luxemburguês, que tem por objeto social o exercício, quer no Luxemburgo, quer no estrangeiro, de todas e quaisquer atividades, sejam elas industriais, comerciais, financeiras, mobiliárias ou imobiliárias, relativas, direta ou indiretamente, à criação, à gestão e ao financiamento, seja sob que forma for, de quaisquer empresas e sociedades tendo por objeto qualquer atividade, seja ela qual for, bem como a gestão e a exploração, a título permanente ou temporário, do investimento criado para tal efeito, na medida em que a Sociedade seja considerada, segundo as disposições aplicáveis, como uma “Sociedade de Participações Financeiras”. (fls. 3719).
7. À data dos factos objeto do presente processo de contraordenação, a ESI tinha como principais ativos:
a) Uma participação correspondente a 100% das ações representativas do capital social da Rio Forte Investments S.A. (doravante Rio Forte) – fls. 246 v.; 320 v.; 338; 3719 v.; 3772 v.; 4858 v.;
b) Uma participação correspondente a 100% das ações representativas do capital social da sociedade Espírito Santo Resources Limited (doravante ES Resources) – fls. 246 v.; 320 v.; 338.
8. À data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, a ES Resources detinha uma participação acionista no Grupo Escom e na ES Tourism. (fls. 212-256, maxime fls. 225-226, 227-228, 233 v. e 235)
9. À data dos factos objeto do presente processo de contraordenação, a Rio Forte era titular, entre outras, das seguintes participações sociais: (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140402”, ficheiro “CE-20140402-07.02.01 Anexo_Contas consolidadas de 2013 da Rioforte e relatório dos auditores”, maxime pp. 7, 12, 14, 28, 36, 41 a 45; cd de fls. 2245, maxime pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140612”, ficheiro “CE-20140612-03.03.00 Proposta de financiamento à RioForte”; fls. 3726-3813, maxime fls. 3804 a 3808)
a)   Uma participação (direta e indireta) correspondente a 49,26 % das ações representativas do capital social da Espírito Santo Finantial Group, S.A. (doravante, ESFG), sociedade detentora de participações sociais em sociedades que integravam o ramo financeiro do GES; (fls. 3726-3813, maxime fls. 3733-3733 v., 3761 v., 3762, 3776, 3786 v., 3806 v. e 3807)
b) Uma participação correspondente a 100% das ações representativas do capital social da Espírito Santo Irmãos, S.A.; (fls. 3761 v.; 3806 v.; cd de fls. 2245, maxime pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140612”, ficheiro “CE-20140612-03.03.00 Proposta de financiamento à RioForte”)
c) Uma participação correspondente a 100% das ações representativas do capital social da Espírito Santo Property, S.A. (Espart); (fls. 3720 v.; cd de  fls. 2245, maxime pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140612”, ficheiro “CE-20140612-03.03.00 Proposta de financiamento à RioForte”)
d) Uma participação correspondente a 45% das ações representativas do capital social da Espírito Santo Saúde, S.A.. (fls. 3721)
10. A ESFG era, à data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, uma sociedade de direito luxemburguês, detentora de participações sociais nas sociedades que integravam o ramo financeiro do GES e tinha por atividade a prestação de serviços bancários, centrados no BES, e de seguros vida e não-vida, desenvolvidos pela Tranquilidade e através da bancassurance do BES. (fls. 1644-1785; 4873-4896, maxime fls. 4888; 7297-7343, maxime fls. 7327)
11. A ESFG era, à data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, uma sociedade aberta com ações admitidas à negociação nos mercados regulamentados seguintes: Luxembourg Stock Exchange (no Luxemburgo), Eurolist by Euronext Lisbon (em Lisboa) e, até 6 de junho de 2014, London Stock Exchange (em Londres). (fls. 1644-1800, maxime fls. 1645 v. e 1788)
12. A 31 de dezembro de 2013, o BES tinha um capital social de 5.040.124.063,26 euros representado por 4.017.928.471 ações. (fls. 1583-1686, maxime fls. 1584 v. e 3574-3588 v., maxime fls. 3583)
13. A 31 de dezembro de 2013, a ESFG detinha uma participação qualificada no BES de 36,85% das ações representativas do capital social do BES, correspondente a uma participação direta de 1,38% e a duas participações indiretas: uma de 35,29%, através da BESPAR, SGPS, S.A. [sociedade dominada pela Espírito Santo Financial (Portugal), SGPS, S.A., que por sua vez era participada em 100% pela Espírito Santo Financial Group, S.A.]; e outra de 0,18%, através dos membros dos seus órgãos de Administração e Fiscalização. (fls. 1583-1686, maxime fls. 1585 v.)
14. A 20 de maio de 2014, na sequência da dissolução da BESPAR SGPS, S.A., a ESFG era titular de uma participação qualificada no BES de 27,36% dos direitos de voto. (fls. 24-211, maxime fls. 34 e 174 v.)
15. A 20 de maio de 2014, a ESI era titular de 49,2% das ações representativas do capital social da ESFG. (fls. 3713-3714)
16. À data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, o BES tinha os seguintes órgãos sociais: (fls. 24-211, maxime fls. 141 v. a 142 v.; 1583-1636 maxime fls.1588 v.; 3574-3588 v.)
a)   Assembleia Geral;
b)   Conselho de Administração, que delegou poderes de gestão corrente na Comissão Executiva;
c)   Comissão de Auditoria;
d)  Revisor Oficial de Contas.
17. À data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, o Conselho de Administração do BES tinha a seguinte composição: (fls. 24-211, maxime fls. 60 v.-61 e 143-144; 958-958 v.; 1583-1636, maxime fls. 1589 v.-1590; 3574-3588 v.)
a.   YY (Presidente);
b.   CC (Vice-Presidente);
c.   ZZ (Vice-Presidente);
d.   EE;
e.   HH;
f.    II;
g.   AAA;
h.   BBB;
i.    JJ;
j.    DD;
k.   BB;
l.    CCC;
m. AA;
n.   DDD;
o.   KK;
p.   EEE;
q.   FFF;
r.    GGG;
s.   HHH;
t.    III;
u.   GG;
v.   LL;
w.  FF;
x.   JJJ;
y.   KKK.
18. Os referidos membros do Conselho de Administração do BES exerceram as funções de administradores do BES entre as seguintes datas: (fls. 24-211, maxime fls. 143 v., 145 v.-147; 1583-1636, maxime fls. 1589 v.-1590, 1806-1807, 3574-3588 v., maxime fls. 3576 v., 3577, 3580, 3581, 3581 v., 3582, 3582 v., 3583, 3583 v.)
a. YY (Presidente): entre fevereiro de 2006 e 3 de agosto de 2014;
b.   CC: entre setembro de 1991 e 13 de julho de 2014;
c.   ZZ: entre abril de 2010 e 3 de agosto de 2014;
d.   EE: entre abril de 1992 e 13 de julho de 2014;
e.   HH: entre novembro de 1990 e 30 de julho de 2014;
f.    II: entre julho de 1993 e 3 de agosto de 2014;
g.   AAA: entre abril de 1992 e 3 de agosto de 2014;
h.   BBB: entre março de 1994 e 31 de maio de 2014;
i.    JJ: entre março de 1999 e 13 de julho de 2014;
j.    DD: entre março de 2000 e 30 de julho de 2014;
k.   BB: entre março de 2000 e 30 de julho de 2014;
l.    CCC: entre março de 2002 e 31 de julho de 2014;
m. AA: entre março de 2004 e 3 de agosto de 2014;
n.   DDD: entre fevereiro de 2006 e 3 de agosto de 2014;
o.   KK: entre setembro de 2006 e 3 de agosto de 2014;
p.   EEE: entre março de 2008 e 31 de julho de 2014;
q.   FFF: entre março de 2008 e 3 de agosto de 2014;
r.    GGG: entre março de 2008 e 30 de julho de 2014;
s.   HHH: entre julho de 2010 e 3 de agosto de 2014;
t.    III: entre maio 2011 e 3 de agosto de 2014;
u.   GG: entre março de 2012 e 3 de agosto de 2014;
v.   LL: entre março de 2012 e 3 de agosto de 2014;
w.  FF: entre março de 2012 e 30 de julho de 2014;
x.   JJJ: entre março de 2012 e 3 de agosto de 2014;
y.   KKK: entre novembro de 2012 e 3 de agosto de 2014.
19. À data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, a Comissão Executiva do BES era composta pelos seguintes membros: (fls. 24-211, maxime fls. 144-145 v.; 958 v.; 1583-1636, maxime fls. 1590 v.-1591 e 1594-1595)
a)   CC;
b)   EE;
c)   HH;
d)  II;
e)   JJ;
f)    DD;
g)   BB;
h)  AA;
i)    KK;
j)    LL.
20. À data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, a Comissão de Auditoria do BES era composta pelos seguintes administradores do BES: (fls. 24-211, maxime fls. 61, 144, 146 v. e 147; 958 v.;1583-1636, maxime fls. 1590, 1591, 1592 v. e 1593)
a)   FF (Presidente);
b)   JJJ;
c)   GGG.
21. Desde março de 2014 e até agosto de 2014, existiu no seio do Conselho de Administração do BES uma Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas, sendo composta pelos seguintes administradores do BES: (fls. 24-211, maxime fls. 141 v.-142 e 166; fls. 1583-1636, maxime fls. 1619 v.; fls. 2272-2281 v., maxime fls. 2277-2281; cd de fls. 3223; fls. 3224-3244; fls. 3574-3588 v., maxime fls. 3583)
a)   FF (Presidente);
b)   GG;
c)   BB.
22. A Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas tinha por função pronunciar-se sobre quaisquer operações de crédito ou relações comerciais significativas celebradas entre todas as instituições do Grupo BES e qualquer titular direto e indireto de uma participação social superior a 2% no capital social ou direitos de voto do BES, ou com qualquer entidade que pertencesse ao mesmo grupo económico do titular de tal participação. (fls. 24-211, maxime fls. 142 e 166; cd de fls. 2245, pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140317”, ficheiro “9. B Anexo 6_Regulamento Comissão Controlo Transacções Partes Relaconadas”; fls. 2272-2281 v., maxime fls. 2277-2281; fls. 2888-2892 v.; fls. 5026-5031, maxime fls. 5027 v., 5028 v. e 5029 v.; fls. 5680-5684 v., maxime fls. 5681, 5682 e 5683)
23. As operações com partes relacionadas apenas poderiam ser submetidas à aprovação dos órgãos competentes após a obtenção de parecer de não oposição, emitido por escrito, pela Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas. (fls. 24-211, maxime fls. 166; cd de fls. 2245, pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140317”, ficheiro “9. B Anexo 6_Regulamento Comissão Controlo Transacções Partes Relaconadas”; fls. 2888-2892 v.; fls. 5026-5031, maxime fls. 5028 v. e 5029 v.; fls. 5680-5684 v., maxime fls. 5681, 5682 e 5683)
24.    À data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, o arguido CC (doravante, apenas CC) desempenhava os seguintes cargos no BES: (fls. 24-211, maxime fls. 143 v.; 1583-1636, maxime fls. 1590 v.)
a)   Vice-presidente do Conselho de Administração;
b)   Presidente da Comissão Executiva.
25. À data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, na qualidade de Presidente da Comissão Executiva do BES, o arguido CC era responsável pelos seguintes pelouros: (fls. 24-211, maxime fls. 144-144 v.; 1583-1636, maxime fls. 1594)
a)   Presidência da Comissão Executiva, do Conselho Financeiro e de Crédito e do ALCO;
b)   Departamento de Planeamento e Contabilidade;
c)   Departamento de Comunicação;
d)  Departamento de Estruturação de Empresas;
e)   Gabinete de Relações com Investidores;
f)    Secretariado-Geral da Comissão Executiva;
g)   Espírito Santo Ativos Financeiros, SGPS, S.A.;
h)  BEST – Banco Electrónico de Serviço Total, S.A.;
i)    ES Tech Ventures, SGPS, S.A.;
j)    E..., S.A.;
k)   Comité de Estratégia e Coordenação Internacional.
26. À data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, o arguido CC exercia ainda os seguintes cargos: (fls. 24-211, maxime fls. 147 v.-148; 1583-1636, maxime fls. 1598-1598 v.)
a) Presidente do Conselho de Administração do Banco Espírito Santo de Investimento, S.A.;
b) Membro da Comissão de Remunerações do Banco Espírito Santo de Investimento, S.A.;
c) Membro do Conselho de Administração do Banque Espírito Santo et de la Vénétie, S.A.;
d) Presidente do Conselho de Administração do BES África, S.G.P.S. S.A.;
e) Membro do Conselho de Administração do BES Finance, Ltd;
f) Presidente do Conselho de Administração do BEST – Banco Electrónico de Serviço Total, S.A.;
g) Presidente do Conselho de Administração da ES Tech Ventures, S.G.P.S., S.A.;
h) Presidente do Conselho de Administração da ESAF – Espírito Santo Activos Financeiros, SGPS, S.A.;
i) Presidente do Conselho de Administração da Espírito Santo – Empresa de Prestação de Serviços 2, ACE;
j) Presidente do Conselho de Administração da Espírito Santo Ventures, Sociedade de Capital de Risco, S.A.;
k) Membro do Conselho de Administração do Banque Privée Espírito Santo, S.A.;
l) Presidente do Conselho de Administração da Bespar – Sociedade Gestora de Participações Sociais, S.A.;
m) Presidente do Conselho de Administração da Casa dos Pórticos – Sociedade de Administração de Bens, S.A.;
n)   Vice-Presidente do Conselho de Administração da E.S. Holding Administração e Participações S.A.;
o) Presidente do Conselho de Administração da ES Bankers (Dubai) Limited;
p) Membro do Conselho de Administração da Espírito Santo Control, S.A.;
q)   Presidente do Conselho de Administração da Espírito Santo Financial (Portugal) – Sociedade Gestora de Participações Sociais, S.A.;
r) Presidente do Conselho de Administração da Espírito Santo Financial Group, S.A.;
s) Membro do Conselho de Administração da Espírito Santo International, S.A.;
t) Membro do Conselho de Administração da Espírito Santo Resources Limited;
u) Membro do Conselho de Administração do Espírito Santo Services, S.A.;
v)   Presidente do Conselho de Administração da Pa..., S.A.;
w) Presidente do Conselho de Administração da Sociedade de Administração de Bens Pe..., S.A..
27. À data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, o arguido AA (doravante, AA) desempenhava os seguintes cargos no BES: (fls. 24-211, maxime fls. 143 v.; 1583-1636, maxime fls. 1590 v.)
a)   Membro do Conselho de Administração;
b)   Membro da Comissão Executiva.
28. À data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, na qualidade de membro da Comissão Executiva do BES, o arguido AA era responsável pelos seguintes pelouros: (fls. 24-211, maxime fls. 145; 1583-1636, maxime fls. 1595)
a)   Departamento Financeiro, de Mercados e Estudos;
b)   Controlo de Gestão (função partilhada com o Presidente da Comissão Executiva);
c)   Comité de Estratégia e Coordenação Internacional;
d)  Gabinete de Reorganização Estratégica;
e)   Departamento de Gestão de Poupança;
f)    Departamento de Desenvolvimento Internacional;
g)   Sucursal de ...;
h)  Sucursal de ...;
i)    Sucursal de ...;
j)    Sucursal da ... (função partilhada com EE              );
k)   Sucursal do ... (função partilhada com EE);
l)    ES Bank;
m) BES África, SGPS, S.A.;
n)  Aman Bank;
o)   BES Angola, SARL;
p)  Moza Banco;
q)   Banco e Sucursal de ...;
r)   Escritórios de representação no estrangeiro;
s)   A..., S.A.;
t)    Espírito Santo Research;
u)  BES Vida, Companhia de Seguros, S.A.;
v)   BES Finance;
w) BES Cayman;
x)   BESIL;
y)   BIBL;
z)   BES GmbH;
aa) Conselho Financeiro e de Crédito.
29. À data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, o arguido AA desempenhava ainda os seguintes cargos: (fls. 24-211, maxime fls. 154; 1583-1636, maxime fls. 1601)
a)   Presidente do Conselho de Administração da A..., S.A.;
b) Membro do Conselho de Administração do Banco Espírito Santo de Investimento, S.A.;
c) Membro da Comissão de Remunerações do Banco Espírito Santo de Investimento, S.A.;
d) Membro do Conselho de Administração do Banco Espírito Santo do Oriente, S.A.;
e) Presidente do Conselho de Administração do Bank Espírito Santo (International) Limited;
f) Membro do Conselho de Administração do BES – Vida, Companhia de Seguros, S.A;
g) Membro do Conselho de Administração do BES África, S.G.P.S., S.A.;
h)  Membro do Conselho de Administração do BES Finance Ltd;
i) Presidente do Conselho de Administração do BIC International Bank Limited;
j) Membro do Conselho de Administração do ES Tech Ventures, S.G.P.S., S.A.;
k) Membro do Conselho de Administração do ESAF – Espírito Santo Activos Financeiros,   S.G.P.S., S.A.;
l) Membro do Conselho de Administração do Espírito Santo – Empresa de Prestação de Serviços 2, ACE;
m) Membro do Conselho de Administração do Espírito Santo PLC;
n)  Non-Executive Director da Espírito Santo Investment Holdings Limited;
o) Vice-Presidente do Conselho de Administração do Moza Banco, S.A.;
p)  Membro do Conselho de Administração da P..., S.A..
30. À data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, o arguido BB (doravante, apenas BB) desempenhava os seguintes cargos no BES: (fls. 24-211, maxime fls. 143 v. e 166; 1583-1636, maxime fls. 1590 v.)
a)   Membro do Conselho de Administração;
b)   Membro da Comissão Executiva;
c)   Membro da Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas.
31. À data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, na qualidade de membro da Comissão Executiva do BES, o arguido BB era responsável pelos seguintes pelouros: (fls. 24-211, maxime fls. 145; 1583-1636, maxime fls. 1594 v.)
a)   Departamento de Marketing Estratégico;
b)   Departamento de Marketing, Inovação e Canais;
c) Departamento de Marketing de Comunicação e Estudo do Consumidor;
d)   Departamento de Risco Global – DRG (função partilhada com JJ);
e)   Departamento de Informação de Gestão;
f)    Gabinete das Universidades;
g)   Universidade BES;
h)  Departamento de Recuperação de Crédito;
i)    Espírito Santo Recuperação de Crédito (ACE);
j)    Departamento de Acompanhamento de Clientes de Imobiliário;
k)   Departamento Técnico Imobiliário;
l)    Espírito Santo Informática (ACE);
m) O..., S.A.;
n)  BES Seguros, S.A.;
o)   C..., S.A.;
p)  Gabinete Assurfinance;
q)   Conselho Financeiro e de Crédito.
32. À data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, o arguido BB exercia ainda os seguintes cargos: (fls. 24-211, maxime fls. 152 v.; 1583-1636, maxime fls. 1600-1600 v.)
a)   Membro do Conselho de Administração da A..., S.A.;
b) Membro do Conselho de Administração do BES – Vida, Companhia de Seguros, S.A.;
c) Presidente do Conselho de Administração da E.S. – Recuperação de Crédito, ACE;
d)  Presidente do Conselho de Administração da Espírito Santo Informática, ACE;
e) Membro do Conselho de Administração da Espírito Santo Ventures, Sociedade de Capital de Risco, S.A.;
f)    Presidente do Conselho de Administração da O..., S.A.;
g) Presidente do Conselho de Administração da BES – Companhia de Seguros, S.A.;
h)  Presidente do Conselho de Administração da Ed..., S.A.;
i)    Membro do Conselho de Administração da G..., S.A.;
j)    Membro do Conselho de Administração da P..., S.A..
33. À data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, o arguido DD (doravante, DD) desempenhava os seguintes cargos no BES: (fls. 24-211, maxime fls. 143 v.; 1583-1636, maxime fls. 1590 v.)
a)   Membro do Conselho de Administração;
b)   Membro da Comissão Executiva.
34. À data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, na qualidade de membro da Comissão Executiva do BES, o arguido DD era responsável pelos seguintes pelouros: (fls. 24-211, maxime fls. 145; 1583-1636, maxime fls. 1594 v.)
a)   Departamento de Assuntos Jurídicos;
b)   Departamento de Auditoria e Inspeção;
c)   Departamento de Gestão e Coordenação da Segurança;
d)  Gabinete Corporativo.
35. À data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, o arguido DD desempenhava ainda os seguintes cargos: (fls. 24-211, maxime fls. 152; 1583-1636, maxime fls. 1600)
a)   Presidente da Mesa da Assembleia Geral da A..., S.A.;
b)   Presidente da Mesa da Assembleia Geral do Banco Espírito Santo Cabo Verde, S.A.;
c)   Presidente da Mesa da Assembleia Geral do Banco Espírito Santo dos Açores, S.A.;
d)  Presidente da Mesa da Assembleia Geral do BEST – Banco Eletrónico de Serviço Total, S.A.;
e)   Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Ca..., S.A.;
f) Presidente da Mesa da Assembleia Geral da ES Tech Ventures, S.G.P.S., S.A.;
g)   Presidente da Mesa da Assembleia Geral da ESAF – Espírito Santo Ativos Financeiros, S.G.P.S., S.A.;
h)  Presidente da Mesa da Assembleia Geral da ESAF – Espírito Santo Fundos de Investimento Imobiliário, S.A.;
i)    Presidente da Mesa da Assembleia Geral da ESAF – Espírito Santo Fundos de Investimento Mobiliário, S.A.;
j)    Presidente da Mesa da Assembleia Geral da ESAF – Espírito Santo Fundos de Pensões, S.A.;
k)   Presidente da Mesa da Assembleia Geral da ESAF – Espírito Santo Gestão de Patrimónios, S.A.;
l)    Presidente da Mesa da Assembleia Geral da ESAF – Espírito Santo Participações Internacionais, S.G.P.S., S.A.;
m) Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Espírito Santo Ventures, Sociedade de Capital de Risco, S.A.;
n)  Presidente da Mesa da Assembleia Geral da O..., S.A.;
o)   Sócio Gerente da Sociedade de Administração de Bens Casa de Bons Ares, Lda.;
p)  Sócio Gerente da Sociedade de Silvicultura M..., Lda.;
q) Vogal do Conselho Fiscal da Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A.;
r)   Presidente da Mesa da Assembleia Geral da BES – Companhia de Seguros, S.A.;
s) Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Bespar – Sociedade Gestora de Participações Sociais, S.A.;
t)    Secretário da Mesa da Assembleia Geral da Casa dos Pórticos –Sociedade de Administração de Bens, S.A.;
u)  Vice-Presidente da Mesa da Assembleia Geral da E..., S.A.;
v)   Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Es..., S.A.;
w) Vice-Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Eu..., S.A.          ;
x)   Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Pa..., S.A.;
y)   Presidente da Mesa da Assembleia Geral da T..., S.A..
36. À data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, o arguido EE (doravante, EE) desempenhava os seguintes cargos no BES: (fls. 24-211, maxime fls. 143 v.; 1583-1636, maxime fls. 1590 v.)
a)   Membro do Conselho de Administração;
b)   Membro da Comissão Executiva.
37. À data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, na                qualidade de membro da Comissão Executiva do BES, o arguido EE era responsável pelos seguintes pelouros: (fls. 24-211, maxime fls. 144 v.; 1583-1636, maxime fls. 1594)
i.    Departamento de Private Banking;
ii.   Departamento International Business & Private Banking;
iii. Sucursal Financeira Exterior da ...;
iv.  Sucursal da ... (função partilhada com AA);
v.   Sucursal do ... (função partilhada com AA);
vi.  Departamento de Residentes no Estrangeiro (exceto segmento de residentes em ..., da responsabilidade de LL);
vii. Centro de Estudos da História do BES;
viii. Comité de Estratégia e Coordenação Internacional.
38. À data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, o arguido EE desempenhava ainda os seguintes cargos: (fls. 24-211, maxime fls. 149-149 v.; 1583-1636, maxime fls. 1598 v.-1599)
a) Membro do Conselho de Administração da A..., S.A.;
b) Membro do Conselho de Administração do Banco Espírito Santo de Investimento, S.A.;
c) Membro da Comissão de Remunerações do Banco Espírito Santo de Investimento, S.A.;
d) Membro do Conselho de Administração do BES África, S.G.P.S., S.A.;
e) Membro do Conselho de Administração da ESAF – Espírito Santo Activos Financeiros,   SGPS, S.A.;
f) Membro do Conselho de Administração do Banque Espírito Santo et de la Vénétie, S.A.;
g) Presidente do Conselho de Administração do Banque Privée Espírito Santo, S.A.;
h)  Membro do Conselho de Administração da Bespar – Sociedade Gestora de Participações Sociais, S.A.;
i)    Presidente do Conselho de Administração da Casa da Saudade – Administração de Bens Móveis e Imóveis, S.A.;
j) Membro do Conselho de Administração da ES Bankers (Dubai) Limited;
k) Membro do Conselho de Administração da Espírito Santo Control, S.A.;
l) Vice-Presidente da Espírito Santo Financial (Portugal) - Sociedade Gestora de Participações Sociais, S.A.;
m) Vice-Presidente da Espírito Santo Financial Group, S.A.;
n) Membro do Conselho de Administração da Espírito Santo International, S.A.;
o) Membro do Conselho de Administração da Espírito Santo Resources Limited;
p)  Membro do Conselho de Administração da Espírito Santo Services, S.A.;
q)   Membro do Conselho de Administração da Eu..., S.A.;
r)   Gerente da Po..., Lda.;
s)   Presidente do Conselho de Administração da R..., Ltd;
t)    Presidente do Conselho de Administração da Ri..., S.A..
Secção II – Da Oferta Pública de Subscrição e de Admissão à Negociação de até 1.607.033.212 ações ordinárias, nominativas e escriturais, sem valor nominal, representativas de até 28,57% do (novo) capital social do BES (a Oferta)
39. Por ofício datado de 14 de fevereiro de 2014, enviado ao Presidente do Conselho de Administração do BES, o Banco de Portugal comunicou ao BES que havia determinado à ESFG, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 116º-C e 141.º, n.º 1, alínea a), do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF), a adoção das seguintes medidas corretivas: (fls. 3711-3712)
“a) Não considerar elegível para efeitos prudenciais a garantia emitida pelo Estado Angolano até ao cabal esclarecimento das dúvidas que existem sobre a sua validade, efeitos e âmbito, não devendo os efeitos desta garantia ser considerados, designadamente, ao nível do cálculo dos rácios prudenciais e do apuramento das imparidades até determinação em contrário pelo Banco de Portugal;
b) Reforço de fundos próprios para um nível superior ao que seria necessário para cumprir o rácio Core Tier 1 mínimo do Banco de Portugal com referência a 31 de dezembro de 2013, bem como constituição de um “buffer” de capital adequado para a cobertura dos riscos decorrentes do “comprehensive asssessment” a realizar no contexto do SSM;
c) Requerer a apresentação detalhada das medidas de capitalização a adotar para assegurar o cumprimento dos rácios mínimos de capital aplicáveis, com a indicação, para cada uma das medidas previstas, designadamente da probabilidade da sua execução, do calendário previsto, do respetivo impacto em termos dos rácios prudenciais;
d) Reforço das disposições, processos, mecanismos e estratégias criados no âmbito do governo da sociedade, controlo interno e autoavaliação de riscos que garantam uma adequada independência face ao ramo não financeiro do GES;
e) Simplificação do grupo ESFG em cumprimento estrito dos princípios orientadores já definidos pelo Banco de Portugal para este efeito;
f) Desenvolver e implementar as medidas necessárias para garantir uma separação total e definitiva das marcas utilizadas por cada ramo do GES;
g) Não comercialização, quer de forma direta quer indireta (v.g., através de fundos de investimento, outras instituições financeiras) de dívida de entidades do ramo não financeiro do GES junto de clientes de retalho.”.
40. O referido ofício foi recebido pelo Presidente do Conselho de Administração do BES, YY, a 17 de fevereiro de 2014. (fls. 3711-3712)
41. O Presidente do Conselho de Administração do BES deu conhecimento, em 17 de fevereiro de 2014, do referido ofício do Banco de Portugal, de 14 de fevereiro de 2014, ao arguido CC. (fls. 3711-3712)
42. A ESFG respondeu ao ofício do Banco de Portugal, de 14 de fevereiro de 2014, através de carta de 20 de fevereiro de 2014, assinada pelo arguido CC, na qualidade de presidente do Conselho de Administração da ESFG. (fls. 2191-2215)
43. Por ofício datado de 26 de fevereiro de 2014, enviado ao Presidente do Conselho de Administração do BES, o Banco de Portugal clarificou o alcance das medidas corretivas determinadas à ESFG comunicadas no ofício de 14 de fevereiro de 2014, tendo comunicado ao BES que: (fls. 2869-2873, maxime fls. 2871; fls. 5010-5014, maxime fls. 5012 v.; 5675-5679, maxime fls. 5677)
“(…) b) No que se refere às medidas de capitalização apresentadas para assegurar o reforço dos fundos próprios para um nível superior ao que seria necessário para cumprir o rácio Core Tier 1 mínimo do Banco de Portugal, com referência a 31 de dezembro de 2013, e constituir um “buffer” de capital adequado para a cobertura dos riscos decorrentes do “comprehensive asssessment” a realizar no contexto do SSM, estas revelam-se insuficientes em volume e incertas na concretização. Assim, tal como solicitado na carta ..., de 14 de fevereiro, torna-se necessário e urgente que o grupo ESFG apresente um plano rigoroso e detalhado que, para cada uma das medidas de capitalização, identifique claramente (i) o respetivo calendário de implementação, com datas concretas e a descrição pormenorizada de cada uma das etapas necessárias para assegurar a sua execução; (ii) pressupostos, condições de exequibilidade e requisitos legais associados a cada medida; (iii) riscos de execução que podem comprometer a concretização da medida e/ou calendário definido; (iv) cenários (base e conservador) para o respetivo impacto em termos de rácios de capital; (v) responsável(eis) pela coordenação e monitorização do processo de implementação de cada medida; (vi) investidores contactados para a realização de cada medida e demonstração da sua intenção e capacidade; (vii) medidas de contingência a adotar em caso de se materializarem os riscos de execução existentes. Os órgãos de administração da ESFG e do BES deverão apresentar uma declaração, previamente aprovada em reunião dos respetivos Conselhos de Administração, comprometendo-se a implementar as medidas de reforço de capital na sua total plenitude e envidar todos os esforços para cumprir o calendário definido para a sua implementação.”.
44. O Banco de Portugal comunicou, ainda, ao BES, no referido ofício de 26 de fevereiro de 2014 que: (fls. 2869-2873, maxime fls. 2872 v.; fls. 5010-5014, maxime fls. 5014 v.; 5675-5679, maxime fls. 5678 v.)
“6. Atendendo à responsabilidade que o artigo 5º do Decreto-Lei n.º 104/2007, de 3 de abril, atribui ao BES por assegurar o cumprimento dos rácios e limites prudenciais com base na situação financeira consolidada da sua companhia financeira-mãe, o Banco de Portugal considera indispensável a participação ativa do órgão de administração do BES na definição do plano de ação que o grupo ESFG terá que desenvolver e implementar para dar resposta às determinações do Banco de Portugal.”.
45. O ofício do Banco de Portugal de 26 de fevereiro de 2014 foi objeto de análise na reunião da Comissão Executiva do BES havida em 12 de março de 2014. (fls. 2860-2907, maxime fls. 2862 v.-2864 v.)
46. Estiveram presentes nessa reunião da Comissão Executiva do BES todos os seus membros (com exceção de JJ), bem como o Presidente do Conselho de Administração e os membros da Comissão de Auditoria do BES. (fls. 2860-2907, maxime fls. 2860)
47. Na reunião da Comissão Executiva do BES de 12 de março de 2014, o arguido BB apresentou uma proposta de resposta do BES ao ofício do Banco de Portugal de 26 de fevereiro de 2014. (fls. 2860-2907, maxime fls. 2862 v.-2864 v.)
48. Na reunião da Comissão Executiva do BES de 12 de março de 2014, o arguido BB referiu o seguinte: (fls. 2860-2907, maxime fls. 2863)
“Não obstante esta capacidade de resistência do Banco face aos referidos cenários de stress, as recomendações entretanto recebidas no quadro dos últimos contactos havidos com o BdP e com a “Troika”, apontam para a perspetiva de realização de um aumento de capital com vista ao reforço adicional da base de capital do BES, que se prevê vir a ascender a 750 milhões €, com realização no 2.º trimestre de 2014.
Foi salientado que este aumento de capital resultaria, por si só, num aumento do rácio Common Equity Tier I de 120 p.b., para 7,0% (sem a garantia soberana) ou para 7,3% (com a garantia soberana) no cenário de stress. Tal representa um “buffer” de 1.036 milhões € e de 1.158 milhões € de capital, respectivamente sem e com a garantia soberana, face ao referencial de 5,5% do BCE (cenário de stress).”.
49. A Comissão Executiva do BES, na reunião de 12 de março de 2014, aprovou, por unanimidade dos administradores presentes, a proposta de resposta apresentada pelo arguido BB, a ser submetida ao Conselho de Administração do BES, na reunião deste órgão agendada para 17 de março de 2014. (fls. 2860-2907, maxime fls. 2864 v.)
50. No dia 12 de março de 2014, o BES enviou ao Banco de Portugal, a resposta ao ofício do Banco de Portugal de 26 de fevereiro de 2014, assinada pelos arguidos BB e DD, na qual comunicou: (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875-2876)
“(…) face às recomendações entretanto recebidas no quadro dos últimos contactos havidos com o Banco de Portugal e com a “Troika”, perspectiva-se a realização de um aumento de capital com vista ao reforço adicional da base de capital do BES, nos seguintes termos:
• Montante: 750 milhões €;
• Calendário de Implementação: 2.º trimestre de 2014, após aprovação pelo Conselho de Administração. Estão já a decorrer estudos preparatórios com vista à realização da operação. Após a publicação da convocatória da próxima Assembleia Geral de Accionistas, a Comissão Executiva irá propor que se realize uma reunião do Conselho de Administração para o efeito (recorda-se que, nos termos do artigo n.º 4 dos Estatutos do Banco, o Conselho de Administração tem poderes para deliberar aumentos de capital até 7,5 mil milhões €). Uma vez aprovado, os passos e datas indicativas principais do processo seriam:
- Selecção dos Bancos de investimento para estudo da operação e selecção de advogados e conclusão da working party list: 2ª semana de Abril;
- Due Dilligence: Última semana de Abril;
- Preparação do prospeto (com contas do 1º Trimestre): 4 semanas (1.ª semana de Maio);
- Entrega do prospeto à CMVM: 12 Maio;
- Aprovação CMVM: final de Maio;
- Preparação de materiais para roadshow / apresentações investidores: até ao final de Maio;
- Reunião do Conselho de Administração para aprovação dos termos da operação;
- Pricing e anúncio: início de Junho;
- Roadshow: 1.ª quinzena de Junho;
- Período de transacção de direitos e Subscrição: 2.ª quinzena de Junho;
- Liquidação: final de Junho.
• Pressupostos: aprovação do Conselho de Administração;
• Condições de Exequibilidade: manutenção do interesse que actualmente se verifica no mercado pela operação, manifestado pela intenção de tomada firme por parte de bancos de investimento internacionais;
• Requisitos Legais: após aprovação do Conselho de Administração, os requisitos legais são os normais para uma operação de aumento de capital de uma empresa cotada e que envolve o cumprimento dos trâmites previstos no Código de Valores Mobiliários;
• Riscos de Execução: alteração das condições de mercado que conduzam a uma modificação substancial ao sentimento actual do mercado e que mudem a atitude dos investidores perante o risco português ou mundial;
• Cenários de Base e Conservador: a operação no valor indicado encontra-se próximo do limite inferior do intervalo que os bancos de investimento internacionais consideram ser executável em mercado, para um banco com as características do BES e sem o compromisso prévio de qualquer accionista atual, pelo que já traduz uma visão prudente da operação;
• Responsáveis pela Coordenação da Operação: a nível do BES será acompanhada pela Comissão Executiva apoiada pelo BES Investimento e pelos departamentos normalmente envolvidos neste tipo de operações. Adicionalmente, será assessorada, como é habitual, por firmas de advogados de lei portuguesa e lei inglesa de reconhecida representação, ao mesmo tempo que será constituído um sindicato bancário internacional formado por cinco ou seis bancos principais (joint book-runners) que efectuarão a tomada firme da operação e um grupo de bancos auxiliares (co-leads);
• Bancos contactados: no âmbito do processo de preparação da operação já foram iniciados contactos com diversos bancos de investimento internacionais (UBS, Morgan Stanley, Nomura, Citi, JPMorgan, Bank of America Merril Lynch, Deutsche Bank, Société Generale e Crédit Suisse) no sentido de recolher, entre outros aspectos, a sua visão das condições de mercado, receptividade dos investidores, condições e calendário de execução. Estes bancos, que desde há alguns meses têm vindo a manifestar o seu interesse de forma verbal e por carta em participar numa possível operação de capital a realizar pelo BES, estão agora a renovar formalmente o seu compromisso e interesse em tomar firme uma operação de aumento de capital que o BES venha a realizar num futuro próximo (a título exemplificativo, juntamos em anexo as cartas da UBS e da Morgan Stanley – Anexos 1 e 2);
O aumento de capital do BES por 750 M€ resultaria, só por si, num aumento no rácio CET1 de 120 pontos de base, fazendo elevar o rácio para 7,0% (s/garantia soberana) ou para 7,3% (c/garantia soberana) no cenário de stress. Este valor representa um buffer de ca. 1,1 mil M€ de capital face ao referencial de 5,5% do BCE.”.
51. Em reunião havida em 17 de março de 2014, o Conselho de Administração do BES aprovou o envio ao Banco de Portugal da resposta aprovada na reunião da Comissão Executiva de 12 de março de 2014. (fls. 2272-2281, maxime fls. 2277-2281)
52. Na reunião do Conselho de Administração do BES de 17 de março de 2014 estiveram presentes os seguintes administradores do BES: (fls. 2272-2281, maxime fls. 2272)
a)   YY;
b)   CC;
c)   EE;
d)  HH;
e)   II;
f)    BBB;
g)   DD;
h)  BB;
i)    AA;
j)    DDD;
k)   KK;
l)    EEE;
m) FFF;
n)  GGG;
o)   HHH;
p)  III;
q)   GG;
r)   LL;
s)   FF;
t)    JJJ.
53. Os administradores do BES que participaram na reunião do Conselho de Administração do BES de 17 de março de 2014 votaram favoravelmente o envio ao Banco de Portugal da resposta aprovada na reunião da Comissão Executiva de 12 de março de 2014. (fls. 2272-2281, maxime fls. 2280 v.)
54. Na reunião do Conselho de Administração do BES de 17 de março de 2014, o arguido BB referiu o seguinte: (fls. 2272-2281, maxime fls. 2278-2278 v.)
“Não obstante esta capacidade de resistência do Banco face aos referidos cenários de stress, as recomendações entretanto recebidas no quadro dos últimos contactos havidos com o BdP e com a “Troika”, apontam para a perspetiva de realização de um aumento de capital com vista ao reforço adicional da base de capital do BES, que se prevê vir a ascender a 750 milhões €, com realização no 2.º trimestre de 2014.
Foi salientado que este aumento de capital, cujas categorias e calendário indicativos constam da proposta de resposta, presentemente em análise, à carta do BdP antes referida, resultaria, por si só, num aumento do rácio Common Equity Tier I de 120 p.b., para 7,0% (sem a garantia soberana) ou para 7,3% (com a garantia soberana) no cenário de stress. Tal representa um “buffer” de 1.036 milhões € e de 1.158 milhões € de capital, respectivamente sem e com a garantia soberana, face ao referencial de 5,5% do BCE (cenário de stress).”.
55. O Conselho de Administração do BES deliberou, por unanimidade dos administradores presentes, aprovar a “implementação da medida nos termos expostos pelo Senhor Dr. BB, que possibilita o reforço do capital social do Banco”. (fls. 2272-2281, maxime fls. 2278 v.)
56. O Conselho de Administração do BES deliberou, ainda, também por unanimidade dos administradores presentes, mandatar “a Comissão Executiva para iniciar de imediato os estudos económicos tendentes à formulação de uma proposta definitiva de aumento de capital, a ser deliberada na próxima reunião do Conselho de Administração”. (fls. 2272-2281, maxime fls. 2278 v.)
57. A 25 de março de 2014, o Banco de Portugal enviou ao Conselho de Administração do BES um ofício, pelo qual comunicou o seguinte: (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140331 extra”, ficheiro “CE-20140331-07.01.00 Carta do BdP ref.ª ADM 2014_0033, de 25.03.2014”, fls. 2922-2923 v., maxime fls. 2922; 2939-2940 v., maxime fls. 2939)
“1. Tendo presente a informação não prestada por V. Exas. através da carta datada de 17 de março de 2014, quando às ações desenvolvidas e a desenvolver para dar cumprimento às determinações constantes da carta ADM/2014/0016, de 14 de fevereiro, objeto de clarificação no âmbito da carta ..., de 26 de fevereiro, o Banco de Portugal reitera a necessidade de serem equacionadas medidas adicionais de capitalização para assegurar um “buffer” de capital adequado para a cobertura dos riscos decorrentes do exercício de “comprehensive assessment” a realizar no contexto do Mecanismo Único de Supervisão (“SSM”), designadamente (i) a concretização de um aumento de capital do Banco Espírito Santo (BES) em montante superior a 750 milhões de euros e (ii) a venda não condicionada de 49% da BES Vida ou outra medida equivalente como forma de capitalização a realizar nos prazos e nos termos propostos.”.
58.    O ofício do Banco de Portugal de 25 de março de 2014 foi objeto de análise nas reuniões da Comissão Executiva do BES havidas em 31 de março e 2 de abril de 2014. (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1511) 31 03 2014”, cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140331 extra”, ficheiro “CE-20140331-07.01.00 Carta do BdP ref.ª ADM 2014_0033, de 25.03.2014”, cd de fls. 2245 pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1513) 02 04 2014”, cd de fls. 2245 pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140402”, ficheiro “CE-20140402-07.01.00 Carta do BdP ref.ª ADM 2014_0033, de 25.03.2014”, fls. 2917-2927, maxime fls. 2917 v.-2918, 2921, 2924-2927; 2929-2961 v., maxime fls. 2929, 2932-2932 v., 2937 e 2941-2961 v.)
59.    Na reunião da Comissão Executiva do BES de 31 de março de 2014 estiveram presentes todos os seus membros (com exceção de LL), bem como o Presidente do Conselho de Administração e os membros da Comissão de Auditoria do BES. (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “ 2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1511) 31 03 2014” e fls. 2917-2927, maxime fls. 2917)
60.    Na reunião da Comissão Executiva do BES de 2 de abril de 2014 estiveram presentes todos os seus membros (com exceção de LL e JJ), bem como os membros da Comissão de Auditoria do BES. (cd de fls. 2245 pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1513) 02 04 2014” e fls. 2929-2961, maxime fls. 2929)
61.    Na reunião da Comissão Executiva do BES de 2 de abril de 2014, o arguido BB apresentou uma proposta de resposta do BES ao ofício do Banco de Portugal de 25 de março de 2014. (cd de fls. 2245 pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1513) 02 04 2014” e fls. 2929-2961, maxime fls. 2932-2932 v., 2937 e 2941-2961)
62.    A Comissão Executiva do BES, na referida reunião de 2 de abril de 2014, aprovou, por unanimidade dos administradores presentes, a proposta de resposta apresentada pelo arguido BB, a enviar ao Banco de Portugal. (cd de fls. 2245 pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1513) 02 04 2014” e fls. 2929-2961, maxime fls. 2932 v.)
63.    No mesmo dia 2 de abril de 2014, o BES enviou ao Banco de Portugal, a resposta ao ofício do Banco de Portugal de 25 de março de 2014, assinada pelos arguidos AA e BB, na qual comunicou: “(…) tendo em conta quer as indicações transmitidas por V. Exa. na referida carta do passado dia 25, quer a forte receptividade actual do mercado para o aumento de capital do Banco, iremos tentar concretizar esta operação num montante em torno de 1.000 M€, para o que será apresentada ao Conselho de Administração do BES, na sua próxima reunião, uma proposta nesse sentido”. (fls. 2521-2524v., maxime fls. 2521v. e 2522, e 2941-2944)
64. No dia 24 de abril de 2014, o Banco Espírito Santo de Investimento, S.A. (BESI), atualmente designado Haitong Bank, S.A., na qualidade de intermediário financeiro responsável pela prestação de serviços de assistência à oferta, deu entrada, na CMVM, do requerimento inicial de aprovação do Prospeto de oferta pública de subscrição e de admissão à negociação de até 1.607.033.212 ações ordinárias, nominativas e escriturais, sem valor nominal, representativas de até 28,57% do novo capital social do BES, assumindo a subscrição integral do aumento de capital, reservada a acionistas no exercício do seu direito de preferência e demais investidores que adquirissem direitos de preferência na subscrição (doravante, simplesmente, Prospeto). (fls. 663-668 v.; fls. 2-184 v., maxime fls. 2, 17 e 18 do processo administrativo de aprovação do prospeto, constante de pen a fls. 8719 dos presentes autos)
65.    O Prospeto foi elaborado pelo BES. (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1513) 02 04 2014”, cd de fls. 2245, maxime pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140402”, ficheiro “CE-20140402-08.01.00 Study on Capital Enhancement Alternatives”, p. 25, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1522) 14 05 2014”, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140514”, ficheiro “CE-20140514-01.02.00 Aumento de Capital do BES”, p. 10, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1525) 04 06 2014”, pasta “CE”, subpasta “3 19-06-2014 a 01-08-2014”, ficheiro “(1528) 19 06 2014” e pasta “CA”, ficheiro “(306) 20 06_01 07 2014”; fls. 2730-2751, maxime fls. 2730 v.-2731)
66. Os departamentos do BES mais envolvidos na elaboração do Prospeto foram o Departamento Financeiro, de Mercados e Estudos (DFME), o Gabinete de Relações com Investidores (GRI), o Departamento de Planeamento e Contabilidade (DPC) e o Departamento de Assuntos Jurídicos (DAJ). (cd de fls. 2245 pasta “CE”, subpasta “ 2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1513) 02 04 2014”, cd de fls. 2245 pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140402”, ficheiro “CE-20140402-08.01.00 Study on Capital Enhancement Alternatives”, p. 25; cd de fls. 2245 pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1522) 14 05 2014”, cd de fls. 2245 pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140514”, ficheiro “CE-20140514-01.02.00 Aumento de Capital do BES”, p. 10, cd de fls. 2245 pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1525) 04 06 2014”, cd de fls. 2245 pasta “CE”, subpasta “3 19-06-2014 a 01-08-2014”, ficheiro “(1528) 19 06 2014”, cd de fls. 2245, pasta “CA”, ficheiro “(306) 20 06_01 07 2014”, fls. 2730-2751, maxime fls. 2730 v.-2731)
67. A Comissão Executiva do BES aprovou, por unanimidade dos administradores presentes na reunião havida em 14 de maio de 2014, uma proposta de aumento de capital do BES, a submeter à aprovação do Conselho de Administração do BES, na reunião que se realizaria no dia seguinte, 15 de maio de 2014. (fls. 2984-3004, maxime fls. 2984 v.-2985 v.)
68. Estiveram presentes nessa reunião da Comissão Executiva do BES todos os seus membros, com exceção de JJ, AA e KK. (fls. 2984-3004, maxime fls. 2984)
69. Em reunião havida a 15 de maio de 2014, o Conselho de Administração do BES, deliberou, por unanimidade dos administradores presentes, aprovar a realização de um aumento de capital do BES até ao montante de até € 1.044.571.587,80 (mil e quarenta e quatro milhões quinhentos e setenta e um mil quinhentos e oitenta e sete euros e oitenta cêntimos) mediante a emissão de até 1.607.033.212 novas ações ordinárias, escriturais e nominativas, sem valor nominal, na modalidade de novas entradas em numerário. (fls. 2282-2729, maxime fls. 2283-2284)
70. Na reunião do Conselho de Administração do BES de 15 de maio de 2014 estiveram presentes os seguintes administradores do BES: (fls. 2282-2729, maxime fls. 2282)
a)   YY;
b)   CC;
c)   EE, também em representação de AAA;
d)  II;
e)   JJ;
f)    DD;
g)   BB;
h)  CCC;
i)    AA, também em representação de HH;
j)    DDD;
k)   EEE;
l)    FFF;
m) GGG;
n)  HHH, também em representação de ZZ ;
o)   III;
p)  GG;
q)   LL;
r)   FF;
s)   JJJ;
t)    KKK.
71. O Conselho de Administração do BES, deliberou que o aumento de capital seria realizado em dinheiro, através de oferta pública de subscrição com direito de preferência na subscrição por parte dos acionistas. (fls. 2282-2729, maxime fls. 2283-2284 v.)
72. Na reunião de 15 de maio de 2014, o Conselho de Administração do BES aprovou a minuta do Prospeto. (fls. 660-662 v.; fls. 2282-2729, maxime fls. 2283-2284 v. e fls. 2314-2518 v.)
73. A Comissão de Auditoria do BES emitiu parecer favorável à realização do referido aumento de capital do BES. (fls. 648-648 v.)
74. No dia 15 de maio de 2014, o BES divulgou, através do Sistema de Difusão da Informação (SDI) da CMVM, um comunicado de informação privilegiada com o seguinte teor: (fls.1367-1637v.)
“Banco Espírito Santo anuncia aumento de capital de até €1.045 milhões.
O Conselho de Administração do Banco Espírito Santo, S.A. (“BES”), após parecer favorável da Comissão de Auditoria, deliberou hoje um aumento de capital social por novas entradas em dinheiro a realizar através de subscrição pública com respeito pelo direito de preferência dos acionistas, de até 1.607 milhões de ações, ao preço de subscrição de €0,65 por ação, o que permitirá um encaixe de até €1.045 milhões.
O preço de subscrição representa um desconto de aproximadamente 34.06% em relação ao preço teórico ajustado ex-rights calculado com base no preço de fecho das ações do BES na Euronext Lisbon em 14 de maio de 2014 (dia anterior ao da deliberação do Conselho de Administração).
O aumento de capital permitirá ao BES reforçar a sua base de capital, por forma a potenciar a sua vantagem competitiva na recuperação da economia portuguesa e o crescimento nos mercados internacionais onde está presente e, ao mesmo tempo, criar reservas adicionais de capital para fazer face: (a) ao novo enquadramento regulamentar conhecido como CRD IV, aplicável às instituições financeiras europeias desde 1 de janeiro de 2014; e (b) aos stress tests e à revisão de qualidade dos ativos que serão realizados em antecipação à transferência da supervisão dos bancos da União Europeia para o BCE.
O aumento de capital terá um impacto no rácio Common Equity Tier I do BES fully-loaded BIS III de +162 p.b., aumentando de 8,0% a 31 de Março de 2014 para 9,6% em termos pro-forma à mesma data, permitindo alinhar este rácio de capital com o novo benchmark europeu, o que compara com o requisito mínimo regulamentar de 7%.
O BES assinou um contrato de underwriting, sujeito à lei inglesa, com um sindicato bancário, para efetuar a subscrição, por conta dos próprios membros do sindicato ou por conta de investidores institucionais por estes selecionados, das novas ações que eventualmente não sejam subscritas no âmbito do aumento de capital por titulares de direitos de subscrição.
O Espírito Santo Investment Bank, a Morgan Stanley e a UBS Investment Bank atuam como Joint Global Coordinators e Joint Bookrunners. O BofA Merrill Lynch, Citigroup Global Markets Limited, J.P. Morgan Securities Plc, e Nomura atuam como Joint Bookrunners.
A Banca IMI, Banco Santander, BBVA, COMMERZBANK, Crédit Agricole CIB, ING, KBC Securities, Keefe, Bruyette & Woods, MEDIOBANCA e Société Générale Corporate & Investment Banking atuam como Co- Lead Managers.
Os acionistas de referência do BES, Espírito Santo Financial Group, S.A. e Crédit Agricole, S.A. assumiram compromissos no sentido de, até 180 dias após a conclusão do aumento de capital, não disporem das ações por si detidas nessa data (“lock-up”).
A Espírito Santo Financial Group, S.A. informou o BES que tem intenção de subscrever novas ações no aumento de capital. Para tanto, tenciona alienar, durante o período do aumento de capital, ações ou direitos de subscrição de novas ações e, com a totalidade do encaixe líquido dessa alienação, subscrever novas ações no aumento de capital. Por seu turno, o Crédit Agricole informou o BES que tem igualmente intenção de subscrever novas ações no aumento de capital. Nesse sentido, tenciona alienar, durante o mesmo período, ações ou direitos de subscrição de novas ações e reinvestir uma parcela de aproximadamente €10 milhões do encaixe da alienação de tais ações ou direitos na subscrição de novas ações.
As alienações de ações ou direitos anteriormente referidas deverão ser realizadas pelos respetivos acionistas de uma forma ordenada, pelos meios que considerem adequado, tendo ainda os acionistas assumido o compromisso de não ficarem a deter imediatamente após a liquidação física do aumento de capital, uma quantidade de ações inferior à por eles detida atualmente.”.
75.    O Prospeto foi aprovado pelo Conselho Diretivo da CMVM em deliberação tomada a 20 de maio de 2014 e notificada ao BES na mesma data. (fls. 3814-3832; fls. 4944-4980 do processo administrativo de aprovação do prospeto, contante de pen a fls. 8719 dos presentes autos)
76.    O Prospeto, tal como aprovado pela CMVM, foi divulgado pelo BES no SDI da CMVM no dia 20 de maio de 2014, após o fecho da sessão de negociação. (fls. 24-211, maxime fls. 24 v.)
77.    Em 27 de maio de 2014 iniciou-se o período de subscrição das ações novas objeto da Oferta do aumento de capital do BES, bem como o período de negociação dos direitos de preferência. (fls. 24-211, maxime fls. 39 e 62 v.)
78. A 3 de junho de 2014 terminou o período de negociação dos direitos de preferência na subscrição das ações novas objeto da Oferta. (fls. 24-211, maxime fls. 39 e 62 v.)
79. A 4 de junho de 2014 terminou o período de revogabilidade das ordens de subscrição das ações novas objeto da Oferta. (fls. 24-211, maxime fls. 39 v. e 62 v.)
80. Em 9 de junho de 2014 terminou o período da OPS das ações representativas do aumento de capital do BES. (fls. 24-211, maxime fls. 39 v. e 62 v.)
81. Em 11 de junho de 2014 realizou-se o apuramento e foram divulgados os resultados da Oferta. (fls. 24-211, maxime fls. 39 v., 40 v. e 64 v.)
82.    Em 16 de junho de 2014, ocorreu a liquidação financeira da Oferta. (fls. 24-211, maxime fls. 39 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.)
83. A 16 de junho de 2014, o BES emitiu um comunicado de informação privilegiada no SDI com o seguinte teor: (fls. 1641)
“BES informa sobre o registo do aumento de capital de € 5.040.124.063,26 para € 6.084.695.651,06
O Banco Espírito Santo, S.A. (“BES”) vem pelo presente informar que foi obtido, nesta data, o registo junto da competente Conservatória do Registo Comercial, do aumento do capital social por novas entradas em dinheiro, no montante de €1.044.571.587,80, de €5.040.124.063,26 para €6.084.695.651,06, em resultado da emissão de 1.607.033.212 novas ações ordinárias, escriturais, nominativas, sem valor nominal, subscritas no âmbito de oferta pública de subscrição com respeito pelo direito de preferência dos Acionistas.
Deste modo, o capital social do BES é atualmente de €6.084.695.651,06, representado por 5.624.961.683 ações ordinárias, escriturais, nominativas, sem valor nominal.
As novas ações são fungíveis com as demais ações do Emitente e conferirão aos seus titulares, os mesmos direitos que as demais ações existentes antes do aumento de capital.
Foi solicitada a admissão à negociação das 1.607.033.212 novas ações ao Mercado Regulamentado Euronext Lisbon, estando previsto que a referida admissão à negociação tenha lugar no próximo dia 17 de junho de 2014 sob o código ISIN ....”.
84.    No dia 17 de junho de 2014, foram admitidas à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon as 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital. (fls. 24-211, maxime fls. 39 v.; 3485; 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.).
Secção III – Da qualidade da informação constante do Prospeto
SUBSECÇÃO I – DA INFORMAÇÃO RESPEITANTE À EXPOSIÇÃO DO BES AO GES
85.    No ponto B.5 (“Descrição do grupo e da posição do Emitente no seio do mesmo”) do Sumário do Prospeto da oferta constava a seguinte informação: (fls. 24-211, maxime fls. 33 v.)
“O Emitente [BES] é a sociedade mãe do grupo que corresponde ao conjunto formado pelo BES e as sociedades que com ele se encontram em relação de domínio ou de grupo, nos termos do artigo 21.º do Cód.VM.
Para além do BES, o Grupo é composto por diversas sociedades financeiras que operam em Portugal e no estrangeiro, com especial destaque para as atividades desenvolvidas em ..., Angola (BESA) e .... Em complemento à atividade de banca de retalho desenvolvida pelo BES, destacam-se as subsidiárias do Grupo que desenvolvem a sua atividade no setor da banca de investimento (BES Investimento), no setor da gestão de ativos (ESAF) e no setor segurador (BES Vida e BES Seguros).
De seguida apresenta-se o organigrama simplificado do Grupo BES à data de 31 de março de 2014:
 86.   A secção 2.1.18 (Riscos reputacionais associados à potencial deterioração ou perceção de deterioração da posição financeira da Espírito Santo International ou das suas subsidiárias) do Prospeto tinha a seguinte redação: (fls. 24-211, maxime fls. 52 v.-53)
“A Espírito Santo International colocou em marcha um programa de reorganização do seu grupo e de desalavancagem, o qual se destina a reequilibrar a sua situação financeira, tendo as respetivas contas vindo a ser objeto de auditorias.
Foram subscritos por clientes do BES - investidores institucionais e não institucionais - determinados instrumentos de dívida, nomeadamente papel comercial, emitidos pela Espírito Santo International e por algumas das suas subsidiárias.
Em 31 de dezembro de 2013, o montante total destes instrumentos de dívida que se encontrava por reembolsar era de €3.035 milhões, dos quais €1.565 milhões se referiam a instrumentos de dívida detidos por investidores não institucionais e €1.470 milhões eram relativos a instrumentos de dívida detidos por investidores institucionais. Em 30 de abril de 2014, o valor dos instrumentos de dívida detidos por investidores não institucionais ascendia a €516 milhões, enquanto o valor detido por investidores institucionais ascendia a €732 milhões. Em 19 de maio de 2014, o valor dos instrumentos de dívida detidos por investidores não institucionais ascendia a €395 milhões, enquanto o valor detido por investidores institucionais ascendia a € 564 milhões.
No seu relatório de auditoria às contas consolidadas do Grupo BES no exercício findo em 31 de dezembro de 2013, a K... incluiu uma ênfase respeitante à nota 46, que faz referência à colocação, pelo Grupo BES, de determinados instrumentos de dívida emitidos pela Espírito Santo International e algumas das suas subsidiárias.
Em face da situação financeira global da Espírito Santo International e dos desafios associados à capacidade desta para implementar totalmente os seu programas de reorganização e de desalavancagem, a ESFG emitiu, ela própria, uma garantia incondicional e irrevogável destinada a assegurar o cumprimento das obrigações da ESI associados aos instrumentos de dívida por ela emitidos e colocados através do BES junto dos seus clientes não institucionais.
Embora o BES não seja responsável pelo reembolso dos referidos instrumentos de dívida, no caso de uma alteração da confiança dos investidores na capacidade financeira das respetivas entidades emitentes para cumprir pontualmente as suas obrigações associadas aos instrumentos de dívida ou na eventualidade de um incumprimento, isso poderá afetar, de forma negativa, a reputação do BES ou dar origem a um conjunto de litígios contra o BES, o que poderá ter um efeito substancial negativo na sua situação financeira e nos seus resultados.”.
87. O ponto 2.1.19 (A situação financeira da ESI pode afetar a reputação do BES e a cotação das suas ações) tinha a seguinte redação: (fls. 24-211, maxime fls. 53)
“A Espírito Santo International, S.A. (ESI) foi objeto de uma revisão limitada de finalidade especial relativamente às demonstrações financeiras consolidadas pró-forma referentes a 30 de setembro de 2013 e 31 de dezembro de 2013, efetuada por um auditor externo, que apurou irregularidades nas suas contas e concluiu que a sociedade apresenta uma situação financeira grave.
A Comissão de Auditoria do ESFG identificou igualmente irregularidades materialmente relevantes nas contas da ESI.
Embora o BES não seja responsável pela situação financeira da ESI, e a ESFG tenha implementado medidas para salvaguardar eventuais situações de incumprimento por parte da ESI que possam ter impacto no BES, um agravamento da respetiva situação financeira bem como as irregularidades detetadas nas suas contas e as eventuais consequências daí resultantes, podem afetar a reputação do Banco Espírito Santo BES e a cotação das suas ações, tendo nomeadamente em conta que alguns dos anteriores membros do conselho de administração da ESI são administradores da ESFG e do BES, e que a ESI detém participação qualificada, ainda que de forma indireta, no capital do BES".
88. No ponto 12.1 (“Principais acionistas”) constava a seguinte informação sobre os acionistas com participações qualificadas no capital social do BES: (fls. 24-211, maxime fls. 174)
89. No capítulo 12.2 (“Operações com entidades terceiras especialmente relacionadas”) constava a seguinte informação: (fls. 24-211, maxime fls. 174 v.-175 e 176)
“O Grupo BES mantém relações comerciais com diversas entidades nas quais detém participações significativas ou com as quais está, por qualquer outra forma, relacionado. O Grupo BES mantém igualmente relações comerciais com diversas entidades nas quais os membros do seu Conselho de Administração detêm cargos de administração. As relações comerciais do Grupo BES com essas entidades abrangem muitos dos serviços financeiros que o Grupo BES presta em geral aos seus clientes. Todas as transações efetuadas com partes relacionadas são realizadas a preços normais de mercado, obedecendo ao princípio do justo valor.
Em março de 2014, o Conselho de Administração aprovou a criação de uma Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas cujo principal objetivo é o de apreciar preventivamente a celebração de quaisquer transações com partes relacionadas, incluindo a celebração de operações de crédito ou outras transações entre qualquer empresa do Grupo BES e as empresas incluídas no grupo empresarial onde se inclua qualquer titular de uma participação superior a 2% no capital social e nos direitos de voto do BES.
O valor das transações do Grupo BES com partes relacionadas nos exercícios findos em 31 de dezembro de 2013, 2012 e 2011, assim como os respetivos custos e proveitos reconhecidos, resume-se como segue:
Para os mesmos períodos, o montante global dos ativos e passivos do Grupo BES que se referem a operações realizadas com entidades subsidiárias, associadas e relacionadas do grupo ESFG (holding do Banco), para além das acima referidas, resume-se como segue:
(…)
O Grupo BES, no âmbito da aplicação de recursos de clientes e tendo em conta o perfil de apetite de risco dos clientes, oferece um conjunto alargado de opções de aplicação de poupanças, incluindo a subscrição direta de instrumentos de dívida emitida pelos diversos tipos de emitentes, designadamente por entidades financeiras do perímetro de consolidação do Grupo BES e de entidades relacionadas do setor não financeiro do Grupo Espírito Santo (GES).
Neste processo, o Grupo BES disponibiliza informação sobre os possíveis riscos subjacentes à subscrição dos respetivos instrumentos, tal como é exigido pelo quadro regulamentar em vigor, procedendo ao registo extrapatrimonial dos valores que mantém sob a sua guarda e prestando os serviços normais de banco custodiante associado ao respetivo dossier de títulos.
No âmbito desta atividade foram subscritos pelos clientes do BES, instrumentos de dívida emitidos pela Espírito Santo International e pelas suas filiais Espírito Santo Property, S.A. e Espírito Santo Industrial, S.A., no montante de €3.035 milhões, dos quais €1.565 milhões eram detidos, em 31 de dezembro de 2013, por investidores não institucionais e €1.470 milhões eram detidos à mesma data por investidores institucionais. Em 30 de abril de 2014, o valor dos instrumentos de dívida detidos por investidores não institucionais ascendia a €516 milhões, enquanto o valor detido por investidores institucionais ascendia a €732 milhões. Em 19 de maio de 2014, o valor dos instrumentos de dívida detidos por investidores não institucionais ascendia a € 314 milhões, enquanto o valor detido por investidores institucionais ascendia a € 565 milhões.
O Grupo ESI tem em curso um plano de reorganização interna e de desalavancagem dos seus ativos com o objetivo de reequilibrar a sua situação financeira e proceder ao reembolso do passivo. Os efeitos das medidas previstas neste plano encontram-se vertidos no plano de negócios e na demonstração de fluxos de caixa projetados para a ESI para os anos 2013 a 2023, os quais foram objeto de revisão no âmbito do Exercício transversal de Revisão da Imparidade da Carteira de Crédito (“ETRICC”) conduzido pelo Banco de Portugal.
Tendo presentes os desafios associados à implementação integral do plano de reorganização interna e de desalavancagem dos ativos, a Espírito Santo Financial Group, SA (“ESFG”), de acordo com a deliberação do seu Conselho de Administração, discutida e apreciada no Conselho de Administração do BES, decidiu assumir, através de garantias prestadas, os riscos associados aos clientes de retalho que eventualmente se venham a materializar na esfera do BES.
É expectativa do Conselho de Administração do BES, tendo presente a informação constante do plano de negócios e da demonstração de fluxos de caixa projetados para a ESI para os anos de 2013 a 2023 e disponibilizados à Autoridade de Supervisão para análise no âmbito do ETRICC, que o reembolso dos referidos instrumentos de dívida venha a ser efetuado através da implementação do plano de desalavancagem dos ativos, do apoio dos seus acionistas, da respetiva capacidade para a obtenção ou renovação de linhas de crédito nos mercados financeiros e ainda do eventual apoio que possa vir a ser necessário por parte do Grupo ESFG e do BES.
Adicionalmente, e ainda no âmbito da atividade de captação de recursos, foram subscritos pelos clientes do Grupo BES, instrumentos de dívida emitidos pela Rio Forte Investments, S.A., Espírito Santo Saúde, S.G.P.S., S.A., Espart, Quinta da Foz, Euroamerican Finance, S.A. e Espírito Santo Irmãos, S.A., no montante de €479 milhões, €38 milhões, €24 milhões, €13 milhões, €9 milhões e €2 milhões, respetivamente, com referência a 31 de dezembro de 2013, por clientes de retalho.”.
90. O relatório de auditoria e certificação legal das contas consolidadas do BES relativos ao exercício findo em 31 de dezembro de 2013 contêm uma ênfase relacionada com instrumentos de dívida emitidos pela ESI comercializados junto de clientes do BES, com o seguinte teor: (fls. 1131-1132, maxime fls. 1132)
“Sem afectar a nossa opinião expressa no parágrafo anterior, chamamos a atenção para a Nota 46, a qual descreve a situação relativa à subscrição, pelos clientes do Grupo BES, de instrumentos de dívida emitidos pela Espírito Santo Internacional, S.A. (´ESI´) e refere a expectativa do Conselho de Administração do Banco quanto aos possíveis meios de reembolso dos mesmos através da implementação do plano de desalavancagem dos activos da ESI, do apoio dos seus accionistas e da capacidade da ESI para a obtenção ou renovação de linhas de crédito nos mercados financeiros e ainda do eventual apoio que possa vir a ser necessário por parte do Grupo ESFG e do BES.”.
91. O teor da referida Nota 46 às demonstrações financeiras consolidadas em 31 de dezembro de 2013 era o seguinte: (fls. 944-1192, maxime fls. 1104-1104 v.)
“O Grupo BES, no âmbito da aplicação de recursos de clientes e tendo em conta o perfil de apetite de risco dos clientes, oferece um conjunto alargado de opções de aplicação de poupanças, incluindo a subscrição direta de instrumentos de dívida emitida pelos diversos tipos de emitentes, designadamente por entidades financeiras do perímetro de consolidação do Grupo BES e de entidades relacionadas do setor não financeiro do Grupo Espírito Santo (GES). Neste processo, o Grupo BES disponibiliza informação sobre os possíveis riscos subjacentes à subscrição dos respetivos instrumentos tal como é exigido pelo quadro regulamentar em vigor, procedendo ao registo extrapatrimonial dos valores que mantém sob a sua guarda e prestando os serviços normais de banco custodiante associado ao respetivo dossier de títulos.
No âmbito desta atividade foram subscritos pelos clientes do BES, instrumentos de dívida emitidos pela Espírito Santo International, S.A. (‘ESI’) e pelas suas filiais Espírito Santo Property, S.A. e Espírito Santo Industrial, S.A. no montante de 3035 milhões de euros, dos quais 1565 milhões de euros eram detidos, em 31 de dezembro de 2013, por clientes de retalho e 1470 milhões de euros eram detidos à mesma data por clientes institucionais. Em 14 de Março de 2014, o valor dos instrumentos de dívida detidos por clientes de retalho ascendia a 867 milhões de euros.
O Grupo ESI tem em curso um plano de reorganização interna e de desalavancagem dos seus ativos com o objetivo de reequilibrar a sua situação financeira e proceder ao reembolso do passivo. Os efeitos das medidas previstas neste plano encontram-se vertidos no plano de negócios e na demonstração de fluxos de caixa projetados para a ESI para os anos de 2013 a 2023, os quais foram objeto de revisão no âmbito do Exercício Transversal de Revisão da Imparidade da Carteira de Crédito (“ETRICC”) conduzido pelo Banco de Portugal.
Tendo presente os desafios associados à implementação integral do plano de reorganização interna e de desalavancagem dos ativos, a Espírito Santo Financial Group, SA (‘ESFG’), de acordo com a deliberação do seu Conselho de Administração, discutida e apreciada no Conselho de Administração do BES, decidiu assumir, através de garantias prestadas, os riscos associados aos clientes de retalho que eventualmente se venham a materializar na esfera do BES.
É expectativa do Conselho de Administração do BES, tendo presente a informação constante do plano de negócios e da demonstração de fluxos de caixa projetados para a ESI para os anos de 2013 a 2023 e disponibilizados à Autoridade de Supervisão para análise no âmbito do ETRICC, que o reembolso dos referidos instrumentos de dívida venha a ser efetuado através da implementação do plano de desalavancagem dos ativos, do apoio dos seus acionistas, da respetiva capacidade para a obtenção ou renovação de linhas de crédito nos mercados financeiros e ainda do eventual apoio que possa vir a ser necessário por parte do Grupo ESFG e do BES.
Adicionalmente, e ainda no âmbito da atividade de captação de recursos, foram subscritos pelos clientes do Grupo BES, instrumentos de dívida emitidos pela Rio Forte Investments, S.A., Espírito Santo Saúde, S.G.P.S., S.A., ESPART, Quinta da Foz, Euroamerican Finance, S.A. e Espírito Santo Irmãos, S.A., no montante de 479 milhões de euros, 38 milhões de euros, 24 milhões de euros, 13 milhões de euros, 9 milhões de euros e 2 milhões de euros, respetivamente, com referência a 31 de dezembro de 2013, por clientes de retalho.”.
92. O texto desta Nota 46 às demonstrações financeiras consolidadas em 31 de dezembro de 2013 foi integralmente reproduzido na Secção 12.2 do Prospeto (“Operações com entidades terceiras especialmente relacionadas”). (fls. 24-211, maxime fls. 174 v.-176)
93. (i) O BES não fez constar do Prospeto informação sobre o montante total dos títulos representativos de dívida emitidos pelas sociedades que, à data da aprovação do Prospeto, integravam o GES e que eram, também nessa data, detidos por clientes do Grupo BES. (fls. 24-211, maxime fls. 176; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140619”, ficheiro “CE-20140619-07.02.00-Exposição e garantias do BES face ao ramo não financeiro do GES e ao Grupo ESFG”, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140702”, ficheiro “CE-20140702-07.01.00-Plano de Contingência ESI” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140710”, ficheiro “CE-20140710-CE-20140710-07.01.00-Proposta de comunicado”; fls. 3039-3049 v.; fls. 3060-3065; fls. 3081-3082; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3688)
Com efeito,
94.    À data da aprovação do Prospeto, o montante total dos títulos representativos de dívida emitidos por sociedades do GES e detidos por clientes do Grupo BES totalizava cerca de € 3.100.000.000,00 (três mil e cem milhões de euros), dos quais cerca de € 1.100.000.000,00 (mil e cem milhões de euros) foram subscritos por clientes de retalho do BES e cerca de € 2.000.000.000,00 (dois mil milhões de euros) por clientes institucionais. (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140619”, ficheiro “CE-20140619-07.02.00-Exposição e garantias do BES face ao ramo não financeiro do GES e ao Grupo ESFG”, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140702”, ficheiro “CE-20140702-07.01.00-Plano de Contingência ESI” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140710”, ficheiro “CE-20140710-CE-20140710-07.01.00-Proposta de comunicado”; fls. 3039-3049 v.; fls. 3060-3065; fls. 3081-3082; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3688)
95. Do Prospeto consta informação sobre os montantes dos títulos representativos de dívida emitidos pela ESI e detidos por clientes do Grupo BES, com referência a 19 de maio de 2014 (que totalizavam 879 milhões de euros), bem como sobre os montantes dos títulos representativos de dívida emitidos pelas sociedades Rio Forte Investments, S.A. (479 milhões de euros), Espírito Santo Saúde, S.G.P.S., S.A. (38 milhões de euros), ESPART (24 milhões de euros), Quinta da Foz (13 milhões de euros), Euroamerican Finance, S.A. (9 milhões de euros) e Espírito Santo Irmãos, S.A. (2 milhões de euros) e detidos por clientes de retalho do Grupo BES, com referência a 31 de dezembro de 2013. (fls. 24-211, maxime fls. 176)
96. Do Prospeto consta, assim, informação sobre títulos representativos de dívida emitidos por sociedades do GES e detidos por clientes do Grupo BES num total de 1.444 milhões de euros. (fls. 24-211, maxime fls. 176)
97. Porém, do Prospeto não consta informação sobre os montantes dos títulos representativos de dívida emitidos pelas sociedades do grupo ESFG, do Grupo Rio Forte e pela Escom e pela ES Tourism e que, à data da aprovação do Prospeto, eram detidos por clientes do Grupo BES, num montante total de 1.656 milhões de euros. (fls. 24-211, maxime fls. 176; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140619”, ficheiro “CE-20140619-07.02.00-Exposição e garantias do BES face ao ramo não financeiro do GES e ao Grupo ESFG”, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140702”, ficheiro “CE-20140702-07.01.00-Plano de Contingência ESI” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140710”, ficheiro “CE-20140710-CE-20140710-07.01.00-Proposta de comunicado”; fls. 3039-3049 v.; fls. 3060-3065; fls. 3081-3082; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3688)
98.    Os títulos representativos de dívida emitidos por sociedades do GES e detidos por clientes do BES encontravam-se registados junto do BES. (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140710”, ficheiro “CE-20140710-07.01.00 Proposta de comunicado”, pp. 3 e 4; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3688)
99.    Os títulos representativos de dívida emitidos por sociedades do GES e detidos por clientes de outros intermediários financeiros do Grupo BES (ESAF, Best e BES Açores) encontravam-se registados ou depositados junto do BES. (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140710”, ficheiro “CE-20140710-07.01.00 Proposta de comunicado”, pp. 3 e 4; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3688)
100. Assim, a informação constante do Prospeto não é completa, porquanto não contém informação sobre os montantes dos títulos representativos de dívida emitidos pelas sociedades do grupo ESFG, do Grupo Rio Forte e pela Escom e pela ES Tourism e que, à data da aprovação do Prospeto, eram detidos por clientes do Grupo BES, num montante total de 1.656 milhões de euros. (fls. 24-211, maxime fls. 176; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140619”, ficheiro “CE-20140619-07.02.00-Exposição e garantias do BES face ao ramo não financeiro do GES e ao Grupo ESFG”, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140702”, ficheiro “CE-20140702-07.01.00-Plano de Contingência ESI” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140710”, ficheiro “CE-20140710-CE-20140710-07.01.00-Proposta de comunicado”; fls. 3039-3049 v.; fls. 3060-3065; fls. 3081-3082; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3688).
101. A informação sobre os montantes dos títulos representativos de dívida emitidos pelas sociedades do grupo ESFG, do Grupo Rio Forte e pela Escom e pela ES Tourism e que, à data da aprovação do Prospeto, eram detidos por clientes do Grupo BES, num montante total de 1.656 milhões de euros, era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211, maxime fls. 76 v., 174 v.-175 e 176; fls. 212-256, maxime fls. 225-226, 227-228, 233 v., 246 v. e 235; fls. 320 v.; fls. 338; fls. 944-1192, maxime fls. 950; cd de fls. 2245, maxime pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140612”, ficheiro “CE-20140612-03.03.00 Proposta de financiamento à RioForte”, cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140402”, ficheiro “CE-20140402-07.02.01 Anexo_Contas consolidadas de 2013 da Rioforte e relatório dos auditores”, maxime pp. 7, 12, 14, 28, 36, 41 a 45; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140619”, ficheiro “CE-20140619-07.02.00-Exposição e garantias do BES face ao ramo não financeiro do GES e ao Grupo ESFG”; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140702”, ficheiro “CE-20140702-07.01.00-Plano de Contingência ESI”; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140710”, ficheiro “CE-20140710-CE-20140710-07.01.00-Proposta de comunicado”; fls. 3039-3049 v.; fls. 3060-3065; fls. 3081-3082; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3688; fls. 3719-3719 v.; fls. 3720 v.; fls. 3721; fls. 3726-3813, maxime fls. 3733-3733 v., 3761 v., 3762, 3776, 3804 a 3808, 3786 v.; fls. 3772 v.; fls. 4858 v.)
102. (ii) O BES não fez constar do Prospeto informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto. (fls. 24-211) Com efeito,
103. À data da aprovação do Prospeto o montante total de financiamentos do BES concedidos à ESFG e suas subsidiárias ascendia a cerca de 533 milhões de euros. (cd de fls. 3223; fls. 3224-3244 v., maxime fls. 3226 e 3232; fls. 5167-5174, maxime fls. 5167 v., 5168, 5171 e 5174)
104. Os financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias eram concedidos através de linhas de mercado monetário. (cd de fls. 2245, pasta “CA”, ficheiro “(306) 20 06_01 07 2014” e pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140620”, ficheiro “5. ii Com Controlo de Transacções com Partes Relacionadas”, maxime pp. 3, 4 e 13; fls. 3139; 3141-3141 v.; 3234-3236, maxime fls. 3234, 3235 v. e 3236)
105. Os financiamentos concedidos pelo BES à ESFG eram geridos pelo DFME do BES.
106. O DFME do BES reportava semanalmente à Comissão Executiva do BES a exposição do BES a contrapartes, entre as quais as sociedades do Grupo ESFG.
107. Os financiamentos concedidos pelo BES à ESFG e subsidiárias eram aprovados pelo Conselho Financeiro e de Crédito do BES. (fls. 1583-1636, maxime fls. 1596 e fls. 3234-3236)
108. Os financiamentos concedidos pelo BES à ESFG eram objeto de parecer vinculativo de não oposição pela Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas do BES. (cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140317”, ficheiro “9. B Anexo 6_Regulamento Comissão Controlo Transacções Partes Relaconadas”, pasta “CA”, ficheiro “(306) 20 06_01 07 2014” e pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140620”, ficheiro “5. ii Com Controlo de Transacções com Partes Relacionadas”, maxime pp. 3, 4 e 13; cd de fls. 3223; fls. 3224-3244 v., maxime fls. 3224-3224 v., 3225-3226 v. e 3232-3244 v.; fls. 5026-5031 e fls. 5680-5684 v.)
109. Do Prospeto consta informação sobre o montante dos financiamentos concedidos à ESFG e suas subsidiárias com referência a 31.12.2013, correspondente a cerca de 290 milhões de euros. (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106)
110. Do Prospeto não consta  o valor dos financiamentos concedidos à ESFG e suas subsidiárias a 31.03.2014, que era de cerca de 400 milhões de euros. (fls. 24-211, maxime fls. 29 e 210; fls. 1193-1216; cd de fls. 2245, pasta “CA”, ficheiro “(305) 15 05 2014”; pasta “CA”, ficheiro “(306) 20 06_01 07 2014” e pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140620”, ficheiro “5. ii Com Controlo de Transacções com Partes Relacionadas”, maxime pp. 3, 4 e 13; fls. 2282-2729, maxime fls. 2287-2290; cd de fls. 3223, ficheiro “20140509_Acta Comissão de Controlo de Transacções com Partes Relacionadas”; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226 e 3226 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3686 v. e 3687; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)
111. Porém, do Prospeto não consta informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto, que ascendia a cerca de 533 milhões de euros. (fls. 24-211; 3225-3226 v., maxime fls. 3226)
112. Assim, a informação constante do Prospeto: (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2314-2518 v.; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)
a) Não é completa, porquanto não contém informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), mas apenas a 31.12.2013 (cerca de 290 milhões de euros);
b) Não é atual, porquanto não corresponde ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto, mas antes a 31.12.2013.
113. A informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211 maxime fls. 29, 34, 174, 174 v.,175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; fls. 1644-1785; fls. 4873-4896 e fls. 7297-7343)

SUBSECÇÃO II – DA INFORMAÇÃO RESPEITANTE AO BESA
114. Na secção 2.1.3 do Prospeto (“O Grupo BES está exposto às condições económicas dos mercados internacionais e a desenvolvimentos políticos, governamentais ou económicos adversos relacionados com a sua expansão internacional”) pode ler-se: (fls. 24-211, maxime fls. 45-45 v.)
“(…) Em Angola, o Grupo BES desenvolve a sua atividade através da sua subsidiária BES Angola, na qual detém 55,7% do capital, que opera nas áreas de banca comercial e de investimento, estando também presente neste país na área de gestão de ativos através do BESA – ACTIF. A expansão da atividade em Angola assume um caráter estratégico para o Grupo BES, que tem vindo a posicionar-se como um banco de referência no mercado angolano.
No âmbito da implementação do plano estratégico 2013-2017, foi efetuado em 2013 um aumento de capital do BESA no valor de USD 500 milhões, com o objetivo de reforçar a sua base de capital para fazer face à execução da estratégia. Este plano que pressupunha a nomeação de uma nova administração (concretizada já em 2013), tem ainda como principais objetivos: (i) a expansão da sua rede comercial para 100 balcões em 2017 (72 em março de 2014); (ii) o desenvolvimento de uma estratégia multicanal com maior alcance na angariação de clientes, sobretudo pequenas e médias empresas e particulares do segmento private e afluentes; e (iii) o lançamento de produtos especializados e inovadores que permitam aumentar a captação de recursos de clientes reduzindo o rácio de crédito/depósitos e os custos de financiamento.
No final de 2013, o GAP comercial do BES Angola era de € 3.115 milhões, que corresponde ao crédito a clientes líquido no montante de €5.712 milhões deduzido dos depósitos de clientes no montante de €2.597 milhões, que se traduz num rácio crédito/depósitos de 220%. O GAP comercial do BESA representava, a 31 de dezembro de 2013, 37% do seu ativo e 4% do ativo do Grupo BES. O Grupo BES pretende equilibrar o GAP comercial e o rácio crédito/depósitos do BESA nos próximos anos, especialmente através do reforço na captação de depósitos e recursos de clientes, no entanto não pode garantir que irá ser bem-sucedido na sua estratégia de captação de recursos, podendo ser forçado a recorrer a outras fontes de financiamento mais onerosas ou reduzir a sua carteira de crédito nomeadamente através da venda de ativos. O relatório de auditoria relativo às contas do BESA de 31 de dezembro de 2013 ainda não foi emitido, tendo como prazo legal para a sua emissão 30 de junho de 2014. (…)
A atividade do Grupo BES em Angola, à semelhança do que se verifica noutros mercados emergentes, está exposta aos riscos políticos, sociais ou económico-financeiros adversos, tais como instabilidade política e social, alteração da regulamentação da fiscalidade ou volatilidade cambial, que poderão ter um impacto material adverso nos resultados das operações do BES Angola e consequentemente do Grupo BES. (…)”.
115. A secção 2.1.23 (“Garantia autónoma prestada pelo Estado Angolano a favor do BESA, relativa a operações realizadas com empresas angolanas”) tem a seguinte redação: (fls. 24-211, maxime fls. 54)
“Tendo como fundamento a relevância do BES Angola no financiamento das empresas Angolanas inseridas no setor privado não petrolífero, em particular em áreas consideradas estratégicas para o desenvolvimento económico de Angola e, o seu envolvimento preponderante em operações creditícias de significativa importância para a implementação dos objetivos constantes do Plano Nacional de Desenvolvimento de Médio Prazo para os anos 2013-2017, o Estado Angolano concedeu ao BESA, em 31 de dezembro de 2013, uma garantia soberana, autónoma e exigível à primeira solicitação do beneficiário, no montante global de até USD5.700 milhões (equivalente a €4.200 milhões em 31 de dezembro de 2013).
Reconhecendo que no contexto global de recuperação económica do setor empresarial Angolano as empresas e os investidores podem não apresentar as condições de tesouraria necessárias para fazer face ao cumprimento atempado das respetivas responsabilidades, o Estado Angolano estabeleceu esta garantia como forma de proteger o banco de eventuais atrasos e incumprimentos na liquidação dos ativos, cobrindo crédito e juros, que beneficiam da garantia (créditos e valores de venda de imóveis).
A garantia pessoal do Estado Angolano tem a validade de dezoito meses a contar da data da sua assinatura, tendo ainda ficado estabelecido entre o Estado Angolano e o BESA que poderá vir a ser acordado, durante o prazo de vigência da garantia, a sua substituição por outra garantia, bem como por um acordo negocial global, desde que se encontre cumprida a mesma finalidade da garantia pessoal prestada. À data do presente Prospeto, esta garantia não foi ainda acionada.
Apesar de a garantia ter sido considerada para o cálculo das imparidades do crédito a 31 de dezembro de 2013, a mesma não foi refletida nos rácios de capital do Grupo BES por ainda se encontrar em fase de apreciação pelo Banco de Portugal. Caso a garantia pessoal do Estado não seja renovada, e se venham a verificar incumprimentos nos créditos ou desvalorizações nos imóveis garantidos, a atividade, situação financeira e resultados do BESA poderão sofrer um efeito negativo, e por essa via causar um efeito negativo na situação financeira e nos resultados do Grupo BES.
Adicionalmente, esta garantia não cobre a totalidade da carteira de crédito do BESA, pelo que a parcela da carteira de crédito do BESA não coberta por esta garantia está naturalmente sujeita aos riscos acima descritos, os quais se traduziram no primeiro trimestre de 2014, no reconhecimento de €70 milhões de perdas por imparidade do crédito.”.
116. Na secção 9.2.1 (“Presença Internacional do Grupo BES”), foi inserida uma descrição relativa à presença do BES em Angola, onde pode ler-se: (fls. 24-211, maxime fls. 81-81 v.)
“O BES Angola (“BESA”), é um banco de direito angolano que presta um serviço global a clientes particulares e a empresas.
O BES Angola atua através de uma rede de 71 agências e postos de atendimento dispersos por seis províncias e um centro de atendimento private em ... para servir os clientes de private banking e afluentes.
No negócio de banca de empresas, que se desenvolve a partir de 5 centros de empresas em ..., a atividade está essencialmente orientada para o estabelecimento de parcerias comerciais de valor acrescentado mútuo com as grandes e médias empresas a operar em Angola, através do financiamento de projetos de investimento, da cobertura de necessidades de tesouraria e para o apoio às empresas e empresários estrangeiros (nomeadamente ..., ..., ... e ...) que estão a expandir a sua atividade em Angola.
O reforço da área de banca de investimento tem-se centrado na identificação de oportunidades de negócio nas áreas de project finance e corporate finance bem como na concretização de soluções de financiamento.
Na área de gestão de ativos, a BESA ACTIF - Sociedade Gestora de Fundos de Investimento, a primeira sociedade gestora de fundos em atividade em Angola, gere um fundo de investimento imobiliário fechado (e tem um segundo fundo em processo de autorização por parte das entidades competentes) e a BESAACTIF - Sociedade Gestora de Fundos de Pensões comercializa um fundo de pensões aberto de contribuição definida – o fundo BESA Opções de Reforma.
O BESA tem vindo a posicionar-se como um banco de referência no mercado angolano, a par de uma participação ativa na sociedade através da adoção de uma política de sustentabilidade, contribuindo para o processo de crescimento de Angola.”.
117. Na alínea (b) (“Expansão da atividade internacional”) da secção 9.3.2 (“Posicionamento Estratégico”) do Prospeto pode ler-se: (fls. 24-211, maxime fls. 85 v.)
“A presença do BES em países de expressão portuguesa está essencialmente centrada em Angola e ....
O ritmo de crescimento anual do PIB de Angola nos últimos dez anos foi, em média, superior a 10%, e as previsões para os próximos cinco anos mantêm-se positivas. As perspetivas para o desenvolvimento do setor bancário angolano são também positivas, prevendo-se um crescimento de 56% no produto bancário total do sistema financeiro angolano e um número de clientes bancarizados superior a 3 milhões, que se espera abram a sua primeira conta bancária até 2017, de acordo com o Global Insight Market Monitor. O BES Angola espera beneficiar destas oportunidades e definiu um conjunto de prioridades estratégicas em 2013, de forma a: (i) reforçar a sua posição financeira, (ii) expandir a rede comercial para mais de 100 balcões em 2017 e (iii) reforçar os seus serviços centrais. O capital social do BES Angola foi também reforçado em 2013 através de um aumento de capital no montante de 500 milhões de dólares, colocando esta subsidiária do BES entre as instituições financeiras mais capitalizadas de Angola. (…)”.
118. Na secção 9.5 (“Informação adicional sobre a Atividade Internacional do Grupo BES”) do Prospeto pode, ainda, ler-se: (fls. 24-211, maxime fls. 95)
“(…) o desempenho em ... registou uma menor contribuição para o resultado consolidado devido ao desempenho do BES Angola, que prosseguiu a implementação do novo plano estratégico, com adoção de um novo modelo de negócio. De referir que, em dezembro, se concretizou um aumento de capital do BES Angola no montante de 500 milhões de dólares, iniciativa que visou dotar o Banco da base de capital necessária à execução do plano de negócio naquele mercado.”.
119. (i) Das certificações legais de contas consolidadas do BESA respeitantes aos exercícios de 2011 e 2012 constam as seguintes reservas: (fls. 394-467, maxime fls. 463 v.; 468-559 v., maxime fls. 555; 1267-1340, maxime fls. 1338; 1341-1432, maxime fls. 1430)
a) Quanto às contas consolidadas do BESA respeitantes ao exercício de 2011:
“À data de 31 de dezembro de 2011, a rubrica de balanço Provisão para Créditos de liquidação Duvidosa apresenta o valor de 9.200.235 milhares de AOA.
Em relação a estas demonstrações financeiras e considerando que o Banco Espírito Santo Angola, S.A. ainda não dispõe, à presente data, de desenvolvimentos informáticos que permitam a identificação efetiva (i) das operações de crédito que foram objeto de reestruturação e (ii) do grupo económico em que cada cliente se insere, não nos é possível concluir acerca da adequação do montante registado na rubrica Provisão para Créditos de Liquidação Duvidosa, face aos requisitos estabelecidos no Aviso n.º4/2011 do Banco Nacional de Angola.”;
b) Quanto às contas consolidadas do BESA respeitantes ao exercício de 2012:
“À data de 31 de dezembro de 2012, a rubrica de balanço consolidado Provisão para Créditos de Liquidação Duvidosa apresenta o valor de 26.134.254 milhares de AOA (2011: 9.200.235 milhares de AOA).
Conforme referido no Relatório do Auditor Independente, com referência a 31 de dezembro de 2011, o Banco Espírito Santo Angola, S.A., continua a não dispor, à presente data, de desenvolvimentos informáticos que permitam a verificação do cumprimento dos requisitos do Aviso n.º 3/2012 do BNA para efeitos de constituição da Provisão para Créditos de Liquidação Duvidosa. Assim, não é possível a identificação efetiva (i) das operações de crédito que foram objeto de reestruturação e (ii) do grupo económico em que cada cliente se insere, pelo que não conseguimos concluir sobre a adequação do montante registado na rubrica Provisão para Créditos de Liquidação Duvidosa, face aos requisitos estabelecidos no Aviso n.º 3/2012 do Banco Nacional de Angola.
Adicionalmente, à data de 31 de dezembro de 2012, não foi possível testar o juro reconhecido em resultados consolidados do exercício proveniente da carteira de crédito concedido a clientes, devido a uma impossibilidade de extração da informação do sistema operacional. Por este facto, não nos foi possível analisar a informação de suporte suficiente e apropriada para validar o saldo contabilístico da referida conta de Proveitos de Créditos no montante de 67.699.602 milhares de AOA, pelo que não podemos concluir sobre o mesmo, nem quanto aos efeitos, se alguns, nas demonstrações financeiras consolidadas em 31 de dezembro de 2012, de eventuais ajustamentos que se poderiam ter identificado ser necessários, caso tivéssemos obtido o referido suporte.”.
120. As contas consolidadas do BESA respeitantes aos exercícios de 2011 e 2012 foram aprovadas pelo BES, em sede de Assembleia-Geral do BESA. (fls. 24-211, maxime fls. 45-45 v.; fls. 394-467, maxime fls. 466-466v., fls. 468-559 v.; fls. 1267-1340, maxime fls. 1339-1339 v. e fls. 1341-1432)
121. O BES não fez constar do Prospeto informação sobre:
a)   as situações detetadas pelo auditor externo do BESA nos exercícios de 2011 e 2012, que motivaram a formulação de reservas na certificação legal das contas do BESA naqueles anos; (fls. 24-211, fls. 394-467, maxime fls. 463-465 v.; fls. 468-559 v., maxime fls. 554 v.-558; fls. 1267-1340; fls. 1341-1432)
b)   o facto de as reservas formuladas pelo auditor externo do BESA às contas de 2011 e 2012 terem sido avaliadas pelo ROC do BES como não materiais para constarem na certificação legal de contas consolidadas do BES de 31 de dezembro de 2011 e 2012. (fls. 24-211, fls. 394-467, maxime fls. 463-465 v.; fls. 468-559 v., maxime fls. 554 v.-558; fls. 669-801, maxime fls. 687 v., 696 v., 722 v. e 769 v. a 770 v.; fls. 802-943, maxime fls. 810, 827 v., 856 e 909 v. a 910 v.; fls. 1267-1340; fls. 1341-1432)
122. A informação constante do Prospeto não é completa, porquanto não contém informação sobre as situações detetadas pelo auditor externo do BESA nos exercícios de 2011 e 2012, que motivaram a formulação de reservas na certificação legal das contas do BESA, nem sobre o facto de as reservas formuladas pelo auditor externo do BESA às contas de 2011 e 2012 terem sido avaliadas pelo ROC do BES como não materiais para constarem na certificação legal de contas consolidadas do BES de 31 de dezembro de 2011 e 2012. (fls. 24-211, fls. 394-467; fls. 468-559 v.; fls. 669-801; fls. 802-943; fls. 1267-1340; fls. 1341-1432)
123. A informação sobre as situações detetadas pelo auditor externo do BESA nos exercícios de 2011 e 2012, que motivaram a formulação de reservas na certificação legal das contas do BESA naqueles anos era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211, fls. 394-467; fls. 468-559 v.; fls. 1267-1340; fls. 1341-1432)
124. (ii) Em outubro de 2013, a Comissão Executiva do BESA apurou a existência de um conjunto de créditos, de valor material, considerados de cobrança duvidosa. (fls. 1521-1582)
125. Nas reuniões da assembleia-geral do BESA, realizadas em 3 e 21 de outubro de 2013, na qual esteve presente, em representação do BES, o arguido CC, foram analisados aspetos da carteira de crédito do BESA, com referência a 31 de agosto de 2013, tendo a carteira de crédito sido dividida em dois blocos de clientes (bloco A e bloco B), atendendo ao grau de conhecimento que a Comissão Executiva do BESA detinha sobre os mesmos, bem como à dimensão dos créditos concedidos pela anterior gestão. (fls. 1521-1582, maxime fls. 1524-1531, 1532-1549 e 1572)
126. O designado bloco A dos créditos representava 80% do total da carteira de crédito do BES, totalizando cerca de 5,5 mil milhões de dólares, e respeitava a um conjunto de clientes do BESA sobre os quais o Conselho de Administração do BESA, em 3 de outubro de 2014, desconhecia a identidade dos mutuários, a finalidade dos créditos e as garantias associadas aos mesmos. (fls. 1521-1582, maxime fls. 1526-1527)
127. O crédito concedido pelo BESA totalizava, em 31 de agosto de 2013, 6,9 mil milhões de dólares, dos quais, 1,8 mil milhões de dólares correspondiam a capital vencido. (fls. 1521-1582, maxime fls. 1526-1527)
128. Em 31 de agosto de 2013, os juros vencidos por liquidar juntamente com os juros de mora totalizavam cerca de 560 milhões de dólares. (fls. 1521-1582, maxime fls. 1527)
129. O BESA apresentava, em outubro de 2013, para além de uma difícil situação de liquidez, com necessidades de financiamento de cerca de 6.6 mil milhões de dólares, 4.6 mil milhões de dólares financiados através do BES e 2 mil milhões de dólares através de bancos angolanos, uma grave situação patrimonial, resultado da deteção de uma fraude ao nível da sua carteira de crédito e do seu portfólio de ativos imobiliários.
130. As atas das reuniões da assembleia-geral do BESA realizadas em 3 e 21 de outubro de 2013 foram elaboradas pelo Presidente da Mesa da Assembleia-Geral do BESA, que deu conhecimento das versões finais das mesmas aos arguidos AA e DD.
131. No dia 5 de novembro de 2013, foram enviadas pelo Presidente do Conselho de Administração e pelo Presidente da Comissão Executiva do BESA duas cartas, dirigidas ao Presidente da República de Angola, às quais foi anexo um memorando sobre a situação patrimonial do BESA àquela data, no qual pode ler-se: (fls. 1521-1582, maxime fls. 1575-1576, 1577-1578 e 1579-1580 v.)
“A nova equipa de gestão do BESA, eleita em finais de Junho de 2013, tem vindo a realizar um trabalho de diagnóstico da situação patrimonial do Banco.
O trabalho realizado permite concluir que o BESA apresenta, para além de uma difícil situação de liquidez, com necessidades de financiamento de cerca de $ 6.6 mil milhões, $4.6 mil milhões financiados através do BES e $2 mil milhões através dos bancos nacionais, uma grave situação patrimonial, resultado da deteção de uma fraude ao nível da sua carteira de crédito e do seu portfólio de activos imobiliários.
As conclusões deste trabalho foram apresentadas em Assembleia Geral ocorrida no passado dia 3 de Outubro de 2013, com conclusão no dia 21 de Outubro, em que estiveram presentes todos os acionistas. As conclusões do estudo efectuado são resumidas conforme se segue:
1. À data de 31 de Agosto de 2013, o BESA apresentava activos num total de $11.3 mil milhões, dos quais $7.4 mil milhões relativos a crédito concedido (…) e $1.6 mil milhões de activos imobiliários (…), sendo o segundo maior Banco em Angola em dimensão de activos.
2. Do total da carteira de crédito, o BESA apresenta $3.7 mil milhões de financiamentos concedidos, dos quais $1.8 mil milhões se encontram vencidos, cuja probabilidade de recuperação é extremamente reduzida, dado que da análise aos movimentos financeiros conclui-se que a maioria dos créditos não se destinaram a financiar actividades económicas ou a aquisição de activos (…).
3.O estado da carteira de crédito, descrita no ponto anterior, coloca o BESA numa situação de extrema dificuldade, tendo em consideração que o capital do Banco é de apenas $1.6 mil milhões, já considerando a incorporação do aumento de capital de $500 milhões a realizar no decurso do mês de Novembro. (…)
4. A carteira de activos imobiliários apresenta imóveis no valor de $119 milhões para os quais não se encontram registos que permitam identificar a sua existência e localização. (…)
5. Adicionalmente, o BESA apresenta um outro conjunto de créditos que estando em situação de incumprimento se consideram recuperáveis, mas que necessitam de ser reestruturados. Estes créditos totalizam $1.7 mil milhões e estima-se que o processo de reestruturação demore largos meses por estarem envolvidos várias dezenas de clientes e de operações.
6. Em resumo, o BESA apresenta créditos e activos imobiliários num total de $3.9 mil milhões cujo valor de realização é próximo de zero e um segundo conjunto de créditos no valor de $1.7 mil milhões que necessitam de reestruturação. (…)
Conclui-se que a situação encontrada tudo aponta para um caso de fraude e não apenas de negligência ou de má gestão, uma vez que o sistema de controlo interno e de aprovação de crédito foi eliminado para que estas funções não pudessem identificar as práticas abusivas aqui relatadas. (…)
Com o objetivo de evitar os impactos desta situação para o sistema financeiro Angolano, nomeadamente para o seu regulador, o Banco Nacional de Angola, os acionistas principais do BESA, bem como o seu Conselho de Administração e a respectiva Comissão Executiva, propõem a adopção de esquema de protecção de activos, associado a um plano de recuperação de créditos, que permita garantir a continuidade da actividade do BESA. (…)
Adoptando esta solução para o caso do BESA, a mesma prevê a emissão de duas garantias por parte de uma entidade do Estado Angolano. Uma no montante de cerca de $3.9 mil milhões para fazer face a eventuais perdas que se venham a verificar na carteira de crédito e no portfólio imobiliário em risco, referidos nos pontos 2 e 4. Uma segunda de $1.7 mil milhões, de cariz mais técnico, que possibilite ao BESA tempo para reestruturar o portfólio referido no ponto 5, não envolvendo esta qualquer responsabilidade efectiva por parte do Estado Angolano.” (sublinhados nossos).
132. As minutas das cartas enviadas a 5 de novembro de 2013 pelo Presidente do Conselho de Administração e pelo Presidente da Comissão Executiva do BESA ao Presidente da República de Angola, bem como do memorando sobre a situação patrimonial do BESA àquela data, em anexo às mesmas, foram elaboradas pelo Presidente da Mesa da Assembleia Geral do BESA, que delas deu conhecimento aos arguidos AA e DD.
133. O BES não fez constar do Prospeto informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação. (fls. 24-211; fls. 1521-1582)
134. A informação constante do Prospeto não é completa, porquanto não contém informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação. (fls. 24-211; fls. 1521-1582)
135. A informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 669-801, maxime fls. 687 v., 696 v. e 722 v.; fls. 802-943, maxime fls. 810, 827 v. e 856; fls.1521-1582; fls. 4829-4841, maxime fls. 4830 e 4841; fls. 5852-5863 v., maxime fls. 5852 v. e 5863 v.)
Secção IV – Da não divulgação de adendas ao Prospeto
136. (i) A 30 de maio de 2014, o BES concedeu financiamentos à ESFG e subsidiárias, no montante de cerca de 194 milhões de euros. (cd de fls. 3223, 3232-3236, maxime 3232; fls. 5167-5174, maxime fls. 5167 v., 5168, 5171 e 5174)
137. Os referidos financiamentos foram aprovados pelo Conselho Financeiro e de Crédito do BES após parecer vinculativo de não oposição pela Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas. (fls. 1583-1636, maxime fls. 1596; cd de fls. 3223; cd de fls. 2245, pasta “CA”, ficheiro “(306) 20 06_01 07 2014” e pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140620”, ficheiro “5. ii Com Controlo de Transacções com Partes Relacionadas”, maxime pp. 3, 4 e 13; fls. 3232-3236 v.; fls. 5167-5174, maxime fls. 5167 v.; fls. 5168, fls. 5171 e  fls. 5174)
138. A 30 de maio de 2014, o montante total de financiamentos do BES concedidos à ESFG e suas subsidiárias ascendia a cerca de 727 milhões de euros. (cd de fls. 3223; 3225-3226 v.; 3232-3236)
139. O BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG após a aprovação e divulgação do Prospeto. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
140. O BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG após a aprovação e divulgação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
141. A informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v.; fls. 3232-3236 v.)
142. (ii) Em 9 de junho de 2014, o BES emitiu duas cartas de conforto em favor das sociedades venezuelanas Fondo Nacional para el Desarrollo Nacional – FONDEN, S.A. e o Banco de Desarollo Economico y Social da Venezuela (ambas integrantes do grupo Petróleos da Venezuela – PDVSA). (fls. 2243-2248, maxime cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140715”, ficheiros “CE-20140715-07.03.02 Carta dirigida ao Banco de Desarrollo Economico y Social de Venezuela” e “CE-20140715-07.03.03 Carta dirigida ao Fondo de Desarollo Nacional – FONDEN” e fls. 2246-2247; cd de fls. 3223, ficheiro “Nº 269 CMVM_01 03 2018 pedido de elementos_Processo de contraordenação nº 14_2017”, pp. 3 e 4; fls. 8336-8337; fls. 8382; fls. 8384)
143. Pelas referidas cartas de conforto, o BES assumiu o compromisso de reembolsar os títulos representativos de dívida emitidos pela ESI que haviam sido adquiridas pelas sociedades destinatárias das cartas. (fls. 2243-2248, maxime cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140715”, ficheiros “CE-20140715-07.03.02 Carta dirigida ao Banco de Desarrollo Economico y Social de Venezuela” e “CE-20140715-07.03.03 Carta dirigida ao Fondo de Desarollo Nacional – FONDEN” e fls. 2246-2247; fls. 3088-3091 v., maxime fls. 3090 v.-3091; cd de fls. 3223, ficheiro “Nº 269 CMVM_01 03 2018 pedido de elementos_Processo de contraordenação nº 14_2017”, pp. 3 e 4; fls. 8336-8337; fls. 8382; fls. 8384)
144. O montante total dos títulos representativos de dívida emitidos pela ESI adquiridos pelas sociedades Fondo Nacional para el Desarrollo Nacional – FONDEN, S.A. e Banco de Desarollo Economico y Social da Venezuela ascendia a 372 milhões de dólares. (fls. 3088-3091 v., maxime fls. 3090 v.-3091; fls. 8366-8385, maxime fls. 8367 e 8368)
145. As cartas de conforto em favor das sociedades Fondo Nacional para el Desarrollo Nacional – FONDEN, S.A. e Banco de Desarollo Economico y Social da Venezuela foram subscritas pelos arguidos CC e EE. (fls. 2243-2248, maxime cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140715”, ficheiros “CE-20140715-07.03.02 Carta dirigida ao Banco de Desarrollo Economico y Social de Venezuela” e “CE-20140715-07.03.03 Carta dirigida ao Fondo de Desarollo Nacional – FONDEN” e fls. 2246-2247; cd de fls. 3223, ficheiro “Nº 269 CMVM_01 03 2018 pedido de elementos_Processo de contraordenação nº 14_2017”, pp. 3 e 4; fls. 8336-8337; fls. 8382; fls. 8384)
146. O BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre a emissão das duas cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
147. O BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre a emissão, pelo BES, das cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
148. A informação sobre a emissão, pelo BES das cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 2243-2248, maxime cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140715”, ficheiros “CE-20140715-07.03.02 Carta dirigida ao Banco de Desarrollo Economico y Social de Venezuela” e “CE-20140715-07.03.03 Carta dirigida ao Fondo de Desarollo Nacional – FONDEN” e fls. 2246-2247; fls. 3088-3091 v., maxime fls. 3090 v.-3091; cd de fls. 3223, ficheiro “Nº 269 CMVM_01 03 2018 pedido de elementos_Processo de contraordenação nº 14_2017”, pp. 3 e 4; fls. 8336-8337; fls. 8366-8385, maxime fls. 8367, 8368, 8382 e 8384)
149. (iii) Em 12 de junho de 2014, o BES concedeu um financiamento à Rio Forte no montante de 135 milhões de euros. (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiros “(1526) 11 06 2014” e “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3240-3241 v.)
150. O financiamento à Rio Forte, no montante de 135 milhões de euros, foi aprovado pela Comissão Executiva do BES, na reunião realizada em 12 de junho de 2014. (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiros “(1526) 11 06 2014” e “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038)
151. Na reunião da Comissão Executiva do BES de 12 de junho de 2014 estiveram presentes os seguintes administradores: (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1527) 12 06 2014” e fls. 3033-3038)
a)   CC;
b)   EE;
c)   HH;
d)  II;
e)   DD;
f)    BB;
g)   AA;
h)  KK;
i)    LL.
152. Os administradores presentes na reunião da Comissão Executiva do BES de 12 de junho de 2014 votaram favoravelmente a proposta de financiamento à Rio Forte, no montante de 135 milhões de euros. (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiros “(1526) 11 06 2014” e “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038)
153. A operação de concessão do financiamento à Rio Forte, no montante de 135 milhões de euros, foi apreciada na reunião da Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas do BES, na reunião de 12 de junho de 2014. (cd de fls. 3223;fls. 3240-3241 v.)
154. A Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas do BES deliberou a não oposição à concessão do financiamento à Rio Forte, no montante de 135 milhões de euros, na reunião de 12 de junho de 2014. (cd de fls. 3223, ficheiro “20140612_Acta Comissão de Controlo de Transacções com Partes Relacionadas”; fls. 3240-3241 v.)
155. A 12 de junho de 2014, o montante total de financiamentos do BES concedidos à Rio Forte e suas subsidiárias ascendia a cerca de 204 milhões de euros. (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiros “(1526) 11 06 2014” e “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3240-3241 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3686 v. e 3687 v.)
156. O BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
157. O BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou por qualquer outro meio, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital,
158. a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)

Secção V – Da participação dos arguidos nos factos em causa nos presentes autos
SUBSECÇÃO I – O BES
SUBSECÇÃO I.1. – DA FALTA DE QUALIDADE DA INFORMAÇÃO CONSTANTE DO PROSPETO
159. O BES decidiu, através da sua Comissão Executiva e do seu Conselho de Administração, proceder a um aumento de capital do BES até ao montante de até € 1.044.571.587,80 (mil e quarenta e quatro milhões quinhentos e setenta e um mil quinhentos e oitenta e sete euros e oitenta cêntimos) mediante a emissão de até 1.607.033.212 novas ações ordinárias, escriturais e nominativas, sem valor nominal, na modalidade de novas entradas em numerário, a ser realizado em dinheiro, através da oferta pública de subscrição com direito de preferência na subscrição por parte dos acionistas. (cd de fls. 2245, maxime pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1522) 14 05 2014” e pasta “CA”, ficheiro “(305) 15 05 2014”; fls. 2282-2729, maxime fls. 2283-2284 v.; fls. 2984-3004, maxime fls. 2984 v.-2985 v.)
160. A Comissão Executiva do BES aprovou, na reunião havida em 14 de maio de 2014 a proposta de aumento de capital do BES, a submeter à aprovação do Conselho de Administração do BES, na reunião que se realizaria no dia seguinte, 15 de maio de 2014. (cd de fls. 2245, maxime pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1522) 14 05 2014”; fls. 2984-3004, maxime fls. 2984 v.-2985 v.)
161. O Conselho de Administração do BES, na reunião de 15 de maio de 2014, deliberou aprovar a realização do aumento de capital do BES. (cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, ficheiro “(305) 15 05 2014”; fls. 2282-2729, maxime fls. 2283-2284 v.)
162. Na reunião de 15 de maio de 2014, o Conselho de Administração do BES aprovou a minuta do Prospeto. (fls. 660-662 v.; cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, ficheiro “(305) 15 05 2014” e pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140515”, ficheiro “3. B Prospectos enviado à CMVM”; fls. 2282-2729, maxime fls. 2283-2284 v. e 2314-2518 v.)
163. O Prospeto foi elaborado pelos Departamentos do BES, principalmente o DFME, o GRI, o DPC e o DAJ.
164. O BES divulgou o prospeto da Oferta do aumento de capital no SDI da CMVM no dia 20 de maio de 2014, após o fecho da sessão de negociação. (fls. 24-211, maxime fls. 24 v.)
165. (i) O BES não fez constar do Prospeto informação sobre o montante total dos títulos representativos de dívida emitidos pelas sociedades que, à data da aprovação do Prospeto, integravam o GES e que eram, também nessa data, detidos por clientes do Grupo BES. (fls. 24-211, maxime fls. 176; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140619”, ficheiro “CE-20140619-07.02.00-Exposição e garantias do BES face ao ramo não financeiro do GES e ao Grupo ESFG”, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140702”, ficheiro “CE-20140702-07.01.00-Plano de Contingência ESI” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140710”, ficheiro “CE-20140710-CE-20140710-07.01.00-Proposta de comunicado”; fls. 3039-3049 v.; fls. 3060-3065; fls. 3081-3082; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3688)
Com efeito:
166. O BES tinha conhecimento que, à data da aprovação do Prospeto, o montante total dos títulos representativos de dívida emitidos por sociedades do GES e detidos por clientes do Grupo BES totalizava cerca de € 3.100.000.000,00 (três mil e cem milhões de euros), dos quais perto de € 1.100.000.000,00 (mil e cem milhões de euros) foram subscritos por clientes de retalho do BES e cerca de € 2.000.000.000,00 (dois mil milhões de euros) por clientes institucionais. (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140619”, ficheiro “CE-20140619-07.02.00-Exposição e garantias do BES face ao ramo não financeiro do GES e ao Grupo ESFG”, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140702”, ficheiro “CE-20140702-07.01.00-Plano de Contingência ESI” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140710”, ficheiro “CE-20140710-CE-20140710-07.01.00-Proposta de comunicado”; fls. 3039-3049 v.; fls. 3060-3065; fls. 3081-3082; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3688)
167. O BES apenas incluiu no Prospeto informação sobre os montantes dos títulos representativos de dívida emitidos pela ESI e detidos por clientes do Grupo BES, com referência a 19 de maio de 2014 (que totalizavam 879 milhões de euros), bem como sobre os montantes dos títulos representativos de dívida emitidos pelas sociedades Rio Forte Investments, S.A. (479 milhões de euros), Espírito Santo Saúde, S.G.P.S., S.A. (38 milhões de euros), ESPART (24 milhões de euros), Quinta da Foz (13 milhões de euros), Euroamerican Finance, S.A. (9 milhões de euros) e Espírito Santo Irmãos, S.A. (2 milhões de euros) e detidos por clientes de retalho do Grupo BES, com referência a 31 de dezembro de 2013. (fls. 24-211, maxime fls. 176)
168. O BES não incluiu no Prospeto informação sobre os montantes dos títulos representativos de dívida emitidos pelas sociedades do grupo ESFG, do Grupo Rio Forte e pela Escom e pela ES Tourism e que, à data da aprovação do Prospeto, eram detidos por clientes do Grupo BES, num montante total de 1.656 milhões de euros. (fls. 24-211, maxime fls. 176; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140619”, ficheiro “CE-20140619-07.02.00-Exposição e garantias do BES face ao ramo não financeiro do GES e ao Grupo ESFG”, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140702”, ficheiro “CE-20140702-07.01.00-Plano de Contingência ESI” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140710”, ficheiro “CE-20140710-CE-20140710-07.01.00-Proposta de comunicado”; fls. 3039-3049 v.; fls. 3060-3065; fls. 3081-3082; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3688)
169. Os títulos representativos de dívida emitidos por sociedades do GES e detidos por clientes do BES encontravam-se registados junto do BES. (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140710”, ficheiro “CE-20140710-07.01.00 Proposta de comunicado”, pp. 3 e 4; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3688)
170. Os títulos representativos de dívida emitidos por sociedades do GES e detidos por clientes de outros intermediários financeiros do Grupo BES (ESAF, Best e BES Açores) encontravam-se registados ou depositados junto do BES. (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140710”, ficheiro “CE-20140710-07.01.00 Proposta de comunicado”, pp. 3 e 4; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3688)
171. O BES fez constar do Prospeto informação que não é completa, porquanto não contém informação sobre os montantes dos títulos representativos de dívida emitidos pelas sociedades do grupo ESFG, do Grupo Rio Forte e pela Escom e pela ES Tourism e que, à data da aprovação do Prospeto, eram detidos por clientes do Grupo BES, num montante total de 1.656 milhões de euros. (fls. 24-211, maxime fls. 176; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140619”, ficheiro “CE-20140619-07.02.00-Exposição e garantias do BES face ao ramo não financeiro do GES e ao Grupo ESFG”, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140702”, ficheiro “CE-20140702-07.01.00-Plano de Contingência ESI” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140710”, ficheiro “CE-20140710-CE-20140710-07.01.00-Proposta de comunicado”; fls. 3039-3049 v.; fls. 3060-3065; fls. 3081-3082; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3688)
172. O BES tinha conhecimento de que a informação sobre os montantes dos títulos representativos de dívida emitidos pelas sociedades do grupo ESFG, do Grupo Rio Forte e pela Escom e pela ES Tourism e que, à data da aprovação do Prospeto, eram detidos por clientes do Grupo BES, num montante total de 1.656 milhões de euros, era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211, maxime fls. 76 v., 174 v.-175 e 176; fls. 212-256, maxime fls. 225-226, 227-228, 233 v., 246 v. e 235; fls. 320 v.; fls. 338; fls. 944-1192, maxime fls. 950; cd de fls. 2245, maxime pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140612”, ficheiro “CE-20140612-03.03.00 Proposta de financiamento à RioForte”; cd de fls. 2245, maxime pasta “CE”, subpasta Anexos”, subpasta “CE 20140402”, ficheiro “CE-20140402-07.02.01 Anexo_Contas consolidadas de 2013 da Rioforte e relatório dos auditores”, maxime pp. 7, 12, 14, 28, 36, 41 a 45; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140619”, ficheiro “CE-20140619-07.02.00-Exposição e garantias do BES face ao ramo não financeiro do GES e ao Grupo ESFG”; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140702”, ficheiro “CE-20140702-07.01.00-Plano de Contingência ESI”; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140710”, ficheiro “CE-20140710-CE-20140710-07.01.00-Proposta de comunicado”; fls. 3039-3049 v.; fls. 3060-3065; fls. 3081-3082; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3688; fls. 3719-3719 v.; fls. 3720 v.; fls. 3721; fls. 3726-3813, maxime fls. 3733-3733 v., 3761 v., 3762, 3776, 3804 a 3808, 3786 v.; fls. 3772 v.; fls. 4858 v.; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
173. (ii) O BES não incluiu no Prospeto informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto. (fls. 24-211)
174. O BES concedia os financiamentos à ESFG através de linhas de mercado monetário. (fls. 3139; 3141-3141 v.; 3234-3236, maxime fls. 3234, 3235 v. e 3236)
175. O BES geria os financiamentos concedidos à ESFG através do DFME.
176. O BES aprovava os financiamentos à ESFG e subsidiárias através do Conselho Financeiro e de Crédito após parecer vinculativo de não oposição pela Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas do BES. (cd de fls. 3223; fls. 3224-3224 v., maxime fls. 3224 v.; 3225-3226 v., maxime fls. 3226-3226 v.; 3229-3231; 3232-3244 v.)
177. O BES fez constar do Prospeto informação sobre o montante dos financiamentos concedidos à ESFG e suas subsidiárias com referência a 31.12.2013, correspondente a cerca de 290 milhões de euros. (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106)
178. O BES não fez constar do Prospeto  o valor dos financiamentos concedidos à ESFG e suas subsidiárias a 31.03.2014, que era de cerca de 400 milhões de euros. (fls. 24-211, maxime fls. 29 e 210; fls. 1193-1216; cd de fls. 2245, pasta “CA”, ficheiros “(305) 15 05 2014”; e “(306) 20 06_01 07 2014”; cd de fls. 2245, pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140620”, ficheiro “5. ii Com Controlo de Transacções com Partes Relacionadas”, maxime pp. 3, 4 e 13; fls. 2282-2729, maxime fls. 2287-2290; cd de fls. 3223, ficheiro “20140509_Acta Comissão de Controlo de Transacções com Partes Relacionadas”; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226 e 3226 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3686 v. e 3687; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)
179. O BES, através do Conselho Financeiro e de Crédito, após parecer vinculativo de não oposição pela Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas, concedeu financiamentos à ESFG e suas subsidiárias que, à data da aprovação do prospeto, ascendiam a 533 milhões de euros. (cd de fls. 3223; fls. 3224-3244 v., maxime fls. 3226 e 3232; cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140515”, ficheiro “5.B Controlo Transacções com Partes Relacionadas”; fls. 5167-5174, maxime fls. 5167 v., 5168, 5171 e 5174)
180. O BES fez constar do Prospeto informação que: (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2314-2518 v.; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)
a) Não é completa, porquanto não contém informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), mas apenas a 31.12.2013 (cerca de 290 milhões de euros);
b) Não é atual, porquanto não corresponde ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto, mas antes a 31.12.2013.
181. O BES tinha conhecimento de que a informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211 maxime fls. 29, 34, 174, 174 v.,175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; fls. 1644-1785; fls. 4873-4896 e fls. 7297-7343; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
182. (iii) O BES não fez constar do Prospeto informação sobre as situações detetadas pelo auditor externo do BESA nos exercícios de 2011 e 2012, que motivaram a formulação de reservas na certificação legal das contas do BESA naqueles anos. (fls. 24-211, fls. 394-467, maxime fls. 463-465 v.; fls. 468-559 v., maxime fls. 554 v.-558; fls. 1267-1340; fls. 1341-1432)
183. O BES não fez constar do Prospeto informação sobre o facto de as reservas formuladas pelo auditor externo do BESA às contas de 2011 e 2012 terem sido avaliadas pelo ROC do BES como não materiais para constarem na certificação legal de contas consolidadas do BES de 31 de dezembro de 2011 e 2012. (fls. 24-211, fls. 394-467, maxime fls. 463-465 v.; fls. 468-559 v., maxime fls. 554 v.-558; fls. 669-801, maxime fls. 687 v., 696 v., 722 v. e 769 v. a 770 v.; fls. 802-943, maxime fls. 810, 827 v., 856 e 909 v. a 910 v.; fls. 1267-1340; fls. 1341-1432)
184. O BES aprovou, em sede de Assembleia-Geral do BESA, as contas consolidadas do BESA respeitantes aos exercícios de 2011 e 2012. (fls. 24-211, maxime fls. 45-45 v.; fls. 394-467, maxime fls. 466-466v.; fls. 468-559 v.; fls. 1267-1340, maxime fls. 1339-1339 v. e fls. 1341-1432)
185. O BES fez constar do Prospeto informação que não é completa, porquanto não contém informação sobre as situações detetadas pelo auditor externo do BESA nos exercícios de 2011 e 2012, que motivaram a formulação de reservas na certificação legal das contas do BESA, nem sobre o facto de as reservas formuladas pelo auditor externo do BESA às contas de 2011 e 2012 terem sido avaliadas pelo ROC do BES como não materiais para constarem na certificação legal de contas consolidadas do BES de 31 de Dezembro de 2011 e 2012. (fls. 24-211, fls. 394-467; fls. 468-559 v.; fls. 669-801; fls. 802-943; fls. 1267-1340; fls. 1341-1432)
186. O BES tinha conhecimento de que a informação sobre as situações detetadas pelo auditor externo do BESA nos exercícios de 2011 e 2012, que motivaram a formulação de reservas na certificação legal das contas do BESA naqueles anos era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211, fls. 394-467; fls. 468-559 v.; fls. 1267-1340; fls. 1341-1432; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
187. (iv) O BES participou nas reuniões da Assembleia-Geral do BESA ocorridas em 3 e 21 de outubro de 2013, através do arguido CC, Presidente da Comissão Executiva do BES. (fls. 1521-1582, maxime fls. 1524-1531, 1532-1549 e 1572)
188. Nas reuniões da Assembleia-Geral do BESA ocorridas em outubro de 2013:
a)   o Presidente da Comissão Executiva do BESA informou que a Comissão Executiva do BESA apurou a existência de um conjunto de créditos, de valor material, considerados de cobrança duvidosa; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1566)
b)   foram analisados aspetos da carteira de crédito do BESA, com referência a 31 de agosto de 2013, tendo a carteira de crédito sido dividida em dois blocos de clientes (bloco A e bloco B), atendendo ao grau de conhecimento que a Comissão Executiva do BESA detinha sobre os mesmos, bem como à dimensão dos créditos concedidos pela anterior gestão; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1524-1531, 1532-1549 e 1572)
c)   foi referido que o designado bloco A dos créditos representava 80% do total da carteira de crédito do BES, totalizando cerca de 5,5 mil milhões de dólares, e respeitava a um conjunto de clientes do BESA sobre os quais o Conselho de Administração do BESA, em 3 de outubro de 2014, desconhecia a identidade dos mutuários, a finalidade dos créditos e as garantias associadas aos mesmos; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1526-1527)
d)  foi informado que o crédito concedido pelo BESA totalizava, em 31 de agosto de 2013, 6,9 mil milhões de dólares, dos quais, 1,8 mil milhões de dólares correspondiam a capital vencido; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1526-1527)
e) foi informado que, em 31 de agosto de 2013, os juros vencidos por liquidar juntamente com os juros de mora totalizavam cerca de 560 milhões de dólares; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1527)
f) foi informado que o BESA apresentava, em outubro de 2013, para além de uma difícil situação de liquidez, com necessidades de financiamento de cerca de 6.6 mil milhões de dólares, 4.6 mil milhões de dólares financiados através do BES e 2 mil milhões de dólares através de bancos angolanos, uma grave situação patrimonial, resultado da deteção de uma fraude ao nível da sua carteira de crédito e do seu portfólio de ativos imobiliários.
189. O BES, através dos arguidos AA e DD, administradores do BES, teve conhecimento das atas das reuniões da assembleia-geral do BESA realizadas em 3 e 21 de outubro de 2013, que foram elaboradas pelo Presidente da Mesa da Assembleia-Geral do BESA.
190. O BES, através dos arguidos AA e DD, administradores do BES, teve conhecimento das cartas enviadas, no dia 5 de novembro de 2013, pelo Presidente do Conselho de Administração e pelo Presidente da Comissão Executiva do BESA, ao Presidente da República de Angola, bem como do memorando sobre a situação patrimonial do BESA àquela data, que foi enviado em anexo às cartas.
191. O BES não fez constar do Prospeto informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação. (fls. 24-211; fls. 1521-1582, fls. 2282-2729, maxime fls. 2282-2284 v. e 2314-2518 v.)
192. O BES fez constar do Prospeto informação que não é completa, porquanto não contém informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação. (fls. 24-211; fls. 1521-1582, fls. 2282-2729, maxime fls. 2282-2284 v. e 2314-2518 v.)
193. O BES tinha conhecimento de que a informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 669-801, maxime fls. 687 v., 696 v. e 722 v.; fls. 802-943, maxime fls. 810, 827 v. e 856; fls.1521-1582; fls. 4829-4841, maxime fls. 4830 e 4841; fls. 5852-5863 v., maxime fls. 5852 v. e 5863 v.; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
194. O arguido BES agiu consciente e voluntariamente na prática dos factos descritos, os quais são factos próprios, em que interveio e que praticou.
195. O arguido BES sabia que:
a) decidiu, através da sua Comissão Executiva e do seu Conselho de Administração, proceder a um aumento de capital um aumento de capital do BES até ao montante de até € 1.044.571.587,80 (mil e quarenta e quatro milhões quinhentos e setenta e um mil quinhentos e oitenta e sete euros e oitenta cêntimos) mediante a emissão de até 1.607.033.212 novas ações ordinárias, escriturais e nominativas, sem valor nominal, na modalidade de novas entradas em numerário, a ser realizado em dinheiro, através da oferta pública de subscrição com direito de preferência na subscrição por parte dos acionistas; (cd de fls. 2245, maxime pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1522) 14 05 2014” e pasta “CA”, ficheiro “(305) 15 05 2014”; fls. 2282-2729, maxime fls. 2283-2284 v.; fls. 2984-3004, maxime fls. 2984 v.-2985 v.)
b) elaborou o Prospeto da Oferta;
c) divulgou o prospeto da Oferta do aumento de capital no SDI da CMVM no dia 20 de maio de 2014, após o fecho da sessão de negociação; (fls. 24-211, maxime fls. 24 v.)
d) à data da aprovação do Prospeto, o montante total dos títulos representativos de dívida emitidos por sociedades do GES e detidos por clientes do Grupo BES totalizava cerca de € 3.100.000.000,00 (três mil e cem milhões de euros), dos quais perto de € 1.100.000.000,00 (mil e cem milhões de euros) foram subscritos por clientes de retalho do BES e cerca de € 2.000.000.000,00 (dois mil milhões de euros) por clientes institucionais; (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140619”, ficheiro “CE-20140619-07.02.00-Exposição e garantias do BES face ao ramo não financeiro do GES e ao Grupo ESFG”, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140702”, ficheiro “CE-20140702-07.01.00-Plano de Contingência ESI” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140710”, ficheiro “CE-20140710-CE-20140710-07.01.00-Proposta de comunicado”; fls. 3039-3049 v.; fls. 3060-3065; fls. 3081-3082; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3688)
e) fez constar do Prospeto informação sobre os montantes dos títulos representativos de dívida emitidos pela ESI e detidos por clientes do Grupo BES, com referência a 19 de maio de 2014 (que totalizavam 879 milhões de euros), bem como sobre os montantes dos títulos representativos de dívida emitidos pelas sociedades Rio Forte Investments, S.A. (479 milhões de euros), Espírito Santo Saúde, S.G.P.S., S.A. (38 milhões de euros), ESPART (24 milhões de euros), Quinta da Foz (13 milhões de euros), Euroamerican Finance, S.A. (9 milhões de euros) e Espírito Santo Irmãos, S.A. (2 milhões de euros) e detidos por clientes de retalho do Grupo BES, com referência a 31 de dezembro de 2013; (fls. 24-211, maxime fls. 176)
f) não fez constar do Prospeto informação sobre os montantes dos títulos representativos de dívida emitidos pelas sociedades do grupo ESFG, do Grupo Rio Forte e pela Escom e pela ES Tourism e que, à data da aprovação do Prospeto, eram detidos por clientes do Grupo BES, num montante total de 1.656 milhões de euros; (fls. 24-211, maxime fls. 176; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140619”, ficheiro “CE-20140619-07.02.00-Exposição e garantias do BES face ao ramo não financeiro do GES e ao Grupo ESFG”, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140702”, ficheiro “CE-20140702-07.01.00-Plano de Contingência ESI” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140710”, ficheiro “CE-20140710-CE-20140710-07.01.00-Proposta de comunicado”; fls. 3039-3049 v.; fls. 3060-3065; fls. 3081-3082; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3688)
g) fez constar do Prospeto informação que não é completa, porquanto não contém informação sobre os montantes dos títulos representativos de dívida emitidos pelas sociedades do grupo ESFG, do Grupo Rio Forte e pela Escom e pela ES Tourism e que, à data da aprovação do Prospeto, eram detidos por clientes do Grupo BES, num montante total de 1.656 milhões de euros; (fls. 24-211, maxime fls. 176; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140619”, ficheiro “CE-20140619-07.02.00-Exposição e garantias do BES face ao ramo não financeiro do GES e ao Grupo ESFG”, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140702”, ficheiro “CE-20140702-07.01.00-Plano de Contingência ESI” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140710”, ficheiro “CE-20140710-CE-20140710-07.01.00-Proposta de comunicado”; fls. 3039-3049 v.; fls. 3060-3065; fls. 3081-3082; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3688)
h)     a informação sobre os montantes dos títulos representativos de dívida emitidos pelas sociedades do grupo ESFG, do Grupo Rio Forte e pela Escom e pela ES Tourism e que, à data da aprovação do Prospeto, eram detidos por clientes do Grupo BES, num montante total de 1.656 milhões de euros, era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma; (fls. 24-211, maxime fls. 76 v., 174 v.-175 e 176; fls. 212-256, maxime fls. 225-226, 227-228, 233 v., 246 v. e 235; fls. 320 v.; fls. 338; fls. 944-1192, maxime fls. 950; cd de fls. 2245, maxime pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140612”, ficheiro “CE-20140612-03.03.00 Proposta de financiamento à RioForte”; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140402”, ficheiro “CE-20140402-07.02.01 Anexo_Contas consolidadas de 2013 da Rioforte e relatório dos auditores”, maxime pp. 7, 12, 14, 28, 36, 41 a 45; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140619”, ficheiro “CE-20140619-07.02.00-Exposição e garantias do BES face ao ramo não financeiro do GES e ao Grupo ESFG”, cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140702”, ficheiro “CE-20140702-07.01.00-Plano de Contingência ESI” e cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE20140710”, ficheiro “CE-20140710-CE-20140710-07.01.00-Proposta de comunicado”; fls. 3039-3049 v.; fls. 3060-3065; fls. 3081-3082; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3688; fls. 3719-3719 v.; fls. 3720 v.; fls. 3721; fls. 3726-3813, maxime fls. 3733-3733 v., 3761 v., 3762, 3776, 3804 a 3808, 3786 v.; fls. 3772 v.; fls. 4858 v.; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
i) através do Conselho Financeiro e de Crédito, após parecer vinculativo de não oposição pela Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas, concedeu financiamentos à ESFG e suas subsidiárias que, à data da aprovação do prospeto, ascendiam a 533 milhões de euros; (cd de fls. 3223; fls. 3224-3244 v., maxime fls. 3226 e 3232; cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140515”, ficheiro “5.B Controlo Transacções com Partes Relacionadas”; fls. 5167-5174, maxime fls. 5167 v., 5168, 5171 e 5174)
j) não fez constar do Prospeto informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto, que era de 533 milhões de euros; (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2314-2518 v.; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)
k) fez constar do Prospeto informação sobre o montante dos financiamentos concedidos à ESFG e suas subsidiárias com referência a 31.12.2013, correspondente a cerca de 290 milhões de euros; (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106)
l) não fez constar do Prospeto o valor dos financiamentos concedidos à ESFG e suas subsidiárias a 31.03.2014, que era de cerca de 400 milhões de euros; (fls. 24-211, maxime fls. 29 e 210; fls. 1193-1216; cd de fls. 2245, pasta “CA”, ficheiro “(305) 15 05 2014”; fls. 2282-2729, maxime fls. 2287-2290; cd de fls. 3223, ficheiro “20140509_Acta Comissão de Controlo de Transacções com Partes Relacionadas”; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226 e 3226 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3686 v. e 3687; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)
m) fez constar do Prospeto informação que não é completa, porquanto não contém informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), mas apenas a 31.12.2013 (cerca de 290 milhões de euros) e que não é atual, porquanto não corresponde ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto, mas antes a 31.12.2013; (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2314-2518 v.; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)
n) a informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma; (fls. 24-211 maxime fls. 29, 34, 174, 174 v.,175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; fls. 1644-1785; fls. 4873-4896 e fls. 7297-7343; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
o) aprovou, em sede de Assembleia-Geral do BESA, as contas consolidadas do BESA respeitantes aos exercícios de 2011 e 2012; (fls. 24-211, maxime fls. 45-45 v.; fls. 394-467, maxime fls. 466-466v.; fls. 468-559 v., fls. 1267-1340, maxime fls. 1339-1339 v. e fls. 1341-1432)
p) não fez constar do Prospeto informação sobre as situações detetadas pelo auditor externo do BESA nos exercícios de 2011 e 2012, que motivaram a formulação de reservas na certificação legal das contas do BESA naqueles anos; (fls. 24-211, fls. 394-467, maxime fls. 463-465 v.; fls. 468-559 v., maxime fls. 554 v.-558; fls. 1267-1340; fls. 1341-1432)
q) não fez constar do Prospeto informação sobre o facto de as reservas formuladas pelo auditor externo do BESA às contas de 2011 e 2012 terem sido avaliadas pelo ROC do BES como não materiais para constarem na certificação legal de contas consolidadas do BES de 31 de dezembro de 2011 e 2012; (fls. 24-211, fls. 394-467, maxime fls. 463-465 v.; fls. 468-559 v., maxime fls. 554 v.-558; fls. 669-801, maxime fls. 687 v., 696 v., 722 v. e 769 v. a 770 v.; fls. 802-943, maxime fls. 810, 827 v., 856 e 909 v. a 910 v.; fls. 1267-1340; fls. 1341-1432)
r) fez constar do Prospeto informação que que não é completa, porquanto não contém informação sobre as situações detetadas pelo auditor externo do BESA nos exercícios de 2011 e 2012, que motivaram a formulação de reservas na certificação legal das contas do BESA, nem sobre o facto de as reservas formuladas pelo auditor externo do BESA às contas de 2011 e 2012 terem sido avaliadas pelo ROC do BES como não materiais para constarem na certificação legal de contas consolidadas do BES de 31 de Dezembro de 2011 e 2012; (fls. 24-211, fls. 394-467; fls. 468-559 v.; fls. 669-801; fls. 802-943; fls. 1267-1340; fls. 1341-1432; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
s) não fez constar do Prospeto informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação; (fls. 24-211; fls. 1521-1582, fls. 2282-2729, maxime fls. 2282-2284 v. e 2314-2518 v.)
t) fez constar do Prospeto informação que não é completa, porquanto não contém informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação; (fls. 24-211; fls. 1521-1582, fls. 2282-2729, maxime fls. 2282-2284 v. e 2314-2518 v.)
u) a informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 669-801, maxime fls. 687 v., 696 v. e 722 v.; fls. 802-943, maxime fls. 810, 827 v. e 856; fls.1521-1582; fls. 4829-4841, maxime fls. 4830 e 4841; fls. 5852-5863 v., maxime fls. 5852 v. e 5863 v.; depoimento de LLL, a fls. 3199-3209, maxime fls. 3204 [linhas 2-29], 3205 [linhas 1-29], 3206 [linhas 1-30], 3207 [linhas 1-30] e 3208 [linhas 1-6 e 12-16] e fls. 9325, ficheiro DR0000_0616, minutos 09:00-50:32 e ficheiro DR0000_0618, minutos 06:59-19:15; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
196. O arguido BES quis praticar os factos supra descritos.
SUBSECÇÃO I.2. – DA NÃO DIVULGAÇÃO DE ADENDAS AO PROSPETO
197. (i) O BES concedeu, através do seu Conselho Financeiro e de Crédito, em 30 de maio de 2014, financiamentos à ESFG e subsidiárias, no montante de cerca de 194 milhões de euros. (cd de fls. 3223; fls. 3232-3236 v., maxime 3232; fls. 5167-5174, maxime fls. 5167 v., 5168, 5171 e 5174)
198. Em resultado do financiamento concedido pelo BES à ESFG e subsidiárias, em 30 de maio de 2014, o montante da exposição do BES à ESFG e subsidiárias passou a ascender, em 30 de maio de 2014, a cerca de 727 milhões de euros. (cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v.; fls. 3232-3236 v.)
199. O BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG após a aprovação e divulgação do Prospeto. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
200. O BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG após a aprovação e divulgação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
201. O BES tinha conhecimento de que a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v.; fls. 3232-3236 v.; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
202. (ii) O BES emitiu, em 9 de junho de 2014, duas cartas de conforto em favor das sociedades venezuelanas Fondo Nacional para el Desarrollo Nacional – FONDEN, S.A. e Banco de Desarollo Economico y Social da Venezuela (ambas integrantes do grupo Petróleos da Venezuela – PDVSA). (fls. 2243-2248, maxime fls. 2246-2247; fls. 8336-8337)
203. Pelas referidas cartas de conforto, o BES assumiu o compromisso de reembolsar os títulos representativos de dívida emitidos pela ESI que haviam sido adquiridas pelas sociedades destinatárias das cartas, que ascendiam a 372 milhões de dólares. (fls. 2243-2248, maxime cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140715”, ficheiros “CE-20140715-07.03.02 Carta dirigida ao Banco de Desarrollo Economico y Social de Venezuela” e “CE-20140715-07.03.03 Carta dirigida ao Fondo de Desarollo Nacional – FONDEN” e fls. 2246-2247; fls. 3088-3091 v., maxime fls. 3090 v.-3091; fls. 8336-8337)
204. O BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre a emissão das duas cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
205. O BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre a emissão, pelo BES, das cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
206. O BES tinha conhecimento de que a informação sobre a emissão, pelo BES das cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 2243-2248, cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140715”, ficheiros “CE-20140715-07.03.02 Carta dirigida ao Banco de Desarrollo Economico y Social de Venezuela” e “CE-20140715-07.03.03 Carta dirigida ao Fondo de Desarollo Nacional – FONDEN” e fls. 2246-2247; fls. 3088-3091 v., maxime fls. 3090 v.-3091; cd de fls. 3223, ficheiro “Nº 269 CMVM_01 03 2018 pedido de elementos_Processo de contraordenação nº 14_2017”, pp. 3 e 4; fls. 8336-8337; fls. 8366-8385, maxime fls. 8367, 8368, 8382 e 8384; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
207. (iii) O BES concedeu, em 12 de junho de 2014, por decisão da sua Comissão Executiva, um financiamento à Rio Forte no montante de 135 milhões de euros. (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiros “(1526) 11 06 2014” e “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3240-3241 v.)
208. Em resultado do financiamento concedido pelo BES à Rio Forte, em 12 de junho de 2014, o montante da exposição do BES à Rio Forte e suas subsidiárias passou a ascender, em 12 de junho de 2014, a cerca de 204 milhões de euros. (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiros “(1526) 11 06 2014” e “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3687 v.)
209. O BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
210. O BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou por qualquer outro meio, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
211. O BES tinha conhecimento de que a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140317”, ficheiro “9. B Anexo 6_Regulamento Comissão Controlo Transacções Partes Relaconadas”, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1513) 02 04 2014”, ponto 07.02.01 da ordem de trabalhos, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140402”, ficheiro “CE-20140402-07.02.01 Anexo_Contas consolidadas de 2013 da Rioforte e relatório dos auditores”, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiros “(1526) 11 06 2014” e “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3240-3241 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3686 v. e 3687 v.; fls. 3726-3813, fls. 5026-5031 e fls. 5680-5684; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
212. O arguido BES agiu consciente e voluntariamente na prática dos factos descritos, os quais são factos próprios, em que interveio e que praticou.
213. O arguido BES sabia que:
a)   concedeu, através do seu Conselho Financeiro e de Crédito, em 30 de maio de 2014, financiamentos à ESFG e subsidiárias, no montante de cerca de 194 milhões de euros; (cd de fls. 3223; fls. 3232-3236 v., maxime 3232; fls. 5167-5174, maxime fls. 5167 v., 5168, 5171 e 5174)
b)   em resultado do financiamento concedido pelo BES à ESFG e subsidiárias, em 30 de maio de 2014, o montante da exposição do BES à ESFG e subsidiárias passou a ascender, em 30 de maio de 2014, a cerca de 727 milhões de euros; (cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v.; fls. 3232-3236 v.)
c) não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG após a aprovação e divulgação do Prospeto; (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
d)  não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG após a aprovação e divulgação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital; (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
e)   a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma; (fls. 24-211; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v.; fls. 3232-3236 v.; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
f)    emitiu, em 9 de junho de 2014, duas cartas de conforto em favor das sociedades venezuelanas Fondo Nacional para el Desarrollo Nacional – FONDEN, S.A. e Banco de Desarollo Economico y Social da Venezuela (ambas integrantes do grupo Petróleos da Venezuela – PDVSA); (fls. 2243-2248, maxime fls. 2246-2247; fls. 8336-8337)
g)   assumiu, pelas referidas cartas de conforto emitidas em 9 de junho de 2014, o compromisso de reembolsar os títulos representativos de dívida emitidos pela ESI que haviam sido adquiridas pelas sociedades destinatárias das cartas, que ascendiam a 372 milhões de dólares; (fls. 2243-2248, maxime cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140715”, ficheiros “CE-20140715-07.03.02 Carta dirigida ao Banco de Desarrollo Economico y Social de Venezuela” e “CE-20140715-07.03.03 Carta dirigida ao Fondo de Desarollo Nacional – FONDEN” e fls. 2246-2247; fls. 3088-3091 v., maxime fls. 3090 v.-3091; fls. 8336-8337)
h)  não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre a emissão das duas cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA; (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
i)    não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre a emissão, pelo BES, das cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital; (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
j)    a informação sobre a emissão, pelo BES das cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma; (fls. 24-211; fls. 2243-2248, maxime cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140715”, ficheiros “CE-20140715-07.03.02 Carta dirigida ao Banco de Desarrollo Economico y Social de Venezuela” e “CE-20140715-07.03.03 Carta dirigida ao Fondo de Desarollo Nacional – FONDEN” e fls. 2246-2247; fls. 3088-3091 v., maxime fls. 3090 v.-3091; cd de fls. 3223, ficheiro “Nº 269 CMVM_01 03 2018 pedido de elementos_Processo de contraordenação nº 14_2017”, pp. 3 e 4; fls. 8336-8337; fls. 8366-8385, maxime fls. 8367, 8368; 8382 e 8384; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
k)   concedeu, em 12 de junho de 2014, por decisão da sua Comissão Executiva, um financiamento à Rio Forte no montante de 135 milhões de euros; (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiros “(1526) 11 06 2014” e “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3240-3241 v.)
l)    em resultado do financiamento concedido à Rio Forte, em 12 de junho de 2014, o montante da exposição do BES à Rio Forte e suas subsidiárias passou a ascender, em 12 de junho de 2014, a cerca de 204 milhões de euros; (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiros “(1526) 11 06 2014” e “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3687 v.)
m) não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto; (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
n)  não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou por qualquer outro meio, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto; (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
o)   a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; cd de fls. 2245, pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140317”, ficheiro “9. B Anexo 6_Regulamento Comissão Controlo Transacções Partes Relaconadas,”, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1513) 02 04 2014”, ponto 07.02.01 da ordem de trabalhos, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140402”, ficheiro “CE-20140402-07.02.01 Anexo_Contas consolidadas de 2013 da Rioforte e relatório dos auditores”, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiros “(1526) 11 06 2014” e “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3240-3241 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3686 v. e 3687 v.; fls. 3726-3813, fls. 5026-5031 e fls. 5680-5684; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
214. O arguido BES quis praticar os factos supra descritos.
SUBSECÇÃO II – AA
SUBSECÇÃO I – DA FALTA DE QUALIDADE DA INFORMAÇÃO CONSTANTE DO PROSPETO
215. O arguido AA foi Administrador do BES e membro da sua Comissão Executiva entre março de 2004 e 3 de agosto de 2014. (fls. 24-211, maxime fls. 143 v., 145 e 146 v.; 1583-1636, maxime fls. 1589 v., 1806-1807, 3574-3588 v., maxime fls. 3582 v.)
216. O arguido AA, na qualidade de membro da Comissão Executiva do BES tinha, à data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, para além de outros, os pelouros do DFME, do Departamento de Desenvolvimento Internacional e do acompanhamento do BESA. (fls. 24-211, maxime fls. 145-145 v.; fls. 1583-1636, maxime fls. 1595)
217. O arguido AA, na qualidade de membro da Comissão Executiva do BES, participava à data da prática dos factos objeto do presente processo de contraordenação, no Conselho Financeiro e de Crédito do BES. (fls. 24-211, maxime fls. 143 v.; fls. 1583-1636, maxime fls. 1590 v.)
218. O arguido AA participou na reunião do Conselho de Administração do BES de 15 de maio de 2014, que deliberou a realização do aumento de capital do BES até ao montante de até € 1.044.571.587,80 (mil e quarenta e quatro milhões quinhentos e setenta e um mil quinhentos e oitenta e sete euros e oitenta cêntimos) mediante a emissão de até 1.607.033.212 novas ações ordinárias, escriturais e nominativas, sem valor nominal, na modalidade de novas entradas em numerário, a ser realizado em dinheiro, através da oferta pública de subscrição com direito de preferência na subscrição por parte dos acionistas, e aprovou a minuta do Prospeto. (fls. 660-662 v.; fls. 2282-2729, maxime fls. 2283-2284 v. e 2314-2518 v.)
219. O arguido AA votou favoravelmente a deliberação de realização do aumento de capital. (fls. 2282-2729, maxime fls. 2284)
220. (i) O arguido AA, enquanto administrador com o pelouro do DFME, tinha conhecimento de que à data da aprovação do Prospeto o montante total de financiamentos do BES concedidos à ESFG e suas subsidiárias ascendia a cerca de 533 milhões de euros. (fls. 24-211, maxime fls. 145-145 v.; fls. 1583-1636, maxime fls. 1595; cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140515”, ficheiro “5.B Controlo Transacções com Partes Relacionadas)
221. O arguido AA, enquanto membro do Conselho Financeiro e de Crédito do BES, aprovou os financiamentos do BES concedidos à ESFG e suas subsidiárias que, à data da aprovação do Prospeto, ascendiam a cerca de 533 milhões de euros. (fls. 24-211, maxime fls. 145-145 v.; fls. 1583-1636, maxime fls. 1595)
222. O arguido AA tinha conhecimento de que o BES fez constar do Prospeto informação sobre o montante dos financiamentos concedidos à ESFG e suas subsidiárias com referência a 31.12.2013, correspondente a cerca de 290 milhões de euros. (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2479 v.)
223. O arguido AA tinha conhecimento de que o BES não fez constar do Prospeto o valor dos financiamentos concedidos à ESFG e suas subsidiárias a 31.03.2014, que era de cerca de 400 milhões de euros. (fls. 24-211, maxime fls. 29 e 210; fls. 1193-1216; cd de fls. 2245, pasta “CA”, ficheiro “(305) 15 05 2014”; fls. 2282-2729, maxime fls. 2287-2290; cd de fls. 3223, ficheiro “20140509_Acta Comissão de Controlo de Transacções com Partes Relacionadas”; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226 e 3226 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3686 v. e 3687; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)
224. O arguido AA tinha conhecimento de que a informação constante do Prospeto: (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2314-2518 v.; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)
a)   Não era completa, porquanto não continha informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), mas apenas a 31.12.2013 (cerca de 290 milhões de euros);
b)   Não era atual, porquanto não correspondia ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto, mas antes a 31.12.2013.
225. O arguido AA tinha conhecimento de que a informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211 maxime fls. 29, 34, 60 v., 61, 62, 143 v., 174, 174 v.,175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; fls. 1644-1785; fls. 4873-4896 e fls. 7297-7343; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
226. (ii) O arguido AA teve conhecimento, em 3 de novembro de 2013, do conteúdo das atas das reuniões da assembleia-geral do BESA realizadas em 3 e 21 de outubro de 2013, que lhe foram enviadas pelo Presidente da Mesa da Assembleia-Geral do BESA.
227. O arguido AA teve conhecimento, em 3 de novembro de 2013, de que, nas reuniões da Assembleia-Geral do BESA ocorridas em outubro de 2013 (fls. 1521-1582, maxime fls. 1550-1553, fls. 1557-1565, fls. 1566-1567 e fls. 1568-1569):
a)   o Presidente da Comissão Executiva do BESA informou que a Comissão Executiva do BESA apurou a existência de um conjunto de créditos, de valor material, considerados de cobrança duvidosa; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1566)
b)   foram analisados aspetos da carteira de crédito do BESA, com referência a 31 de agosto de 2013, tendo a carteira de crédito sido dividida em dois blocos de clientes (bloco A e bloco B), atendendo ao grau de conhecimento que a Comissão Executiva do BESA detinha sobre os mesmos, bem como à dimensão dos créditos concedidos pela anterior gestão; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1553-1554)
c)   foi referido que o designado bloco A dos créditos representava 80% do total da carteira de crédito do BES, totalizando cerca de 5,5 mil milhões de dólares, e respeitava a um conjunto de clientes do BESA sobre os quais o Conselho de Administração do BESA, em 3 de outubro de 2014, desconhecia a identidade dos mutuários, a finalidade dos créditos e as garantias associadas aos mesmos; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1554)
d)  foi informado que o crédito concedido pelo BESA totalizava, em 31 de agosto de 2013, 6,9 mil milhões de dólares, dos quais, 1,8 mil milhões de dólares correspondiam a capital vencido; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1554)
e)   foi informado que, em 31 de agosto de 2013, os juros vencidos por liquidar juntamente com os juros de mora totalizavam cerca de 560 milhões de dólares; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1554)
f)    foi informado que o BESA apresentava, em outubro de 2013, para além de uma difícil situação de liquidez, com necessidades de financiamento de cerca de 6.6 mil milhões de dólares, 4.6 mil milhões de dólares financiados através do BES e 2 mil milhões de dólares através de bancos angolanos, uma grave situação patrimonial, resultado da deteção de uma fraude ao nível da sua carteira de crédito e do seu portfólio de ativos imobiliários. (fls. 1521-1582, maxime fls. 1566)
228. O arguido AA teve conhecimento do conteúdo das cartas enviadas, no dia 5 de novembro de 2013, pelo Presidente do Conselho de Administração e pelo Presidente da Comissão Executiva do BESA, ao Presidente da República de Angola, bem como do memorando sobre a situação patrimonial do BESA naquela data que foi enviado em anexo às cartas, através das minutas dos referidos documentos, que lhe foram enviados pelo Presidente da Mesa da Assembleia-Geral do BESA, em 3 de novembro de 2013.
229. O arguido AA tinha conhecimento de que o BES não fez constar do Prospeto informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação.
230. O arguido AA tinha conhecimento de que do Prospeto constava informação que não era completa, porquanto não continha informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação.
231. O arguido AA tinha conhecimento de que a informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 669-801, maxime fls. 687 v., 696 v. e 722 v.; fls. 802-943, maxime fls. 810, 827 v. e 856; fls.1521-1582; fls. 4829-4841, maxime fls. 4830 e 4841; fls. 5852-5863 v., maxime fls. 5852 v. e 5863 v.; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “3 19-06-2014 a 01-08-2014”, ficheiro “(1528) 19 06 2014”, ponto 02:01:00 da ordem de trabalho)
232. O arguido AA, para além de ter praticado os factos descritos, não adotou, durante o período de tempo entre a decisão de realização do aumento de capital e a liquidação financeira do mesmo, qualquer medida adequada a sanar os vícios da informação constantes do Prospeto. (fls. 24-211; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, ficheiros “(305) 15 05 2014” e “(306) 20 06_01 07 2014”, ponto 2 da ordem de trabalhos; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; pen a fls. 8719)
233. O arguido AA agiu consciente e voluntariamente na prática dos factos descritos, os quais são factos próprios, em que interveio e que praticou.
234. O arguido AA sabia que:
a) participou na reunião do Conselho de Administração do BES de 15 de maio de 2014, que deliberou a realização do aumento de capital do BES até ao montante de até € 1.044.571.587,80 (mil e quarenta e quatro milhões quinhentos e setenta e um mil quinhentos e oitenta e sete euros e oitenta cêntimos) mediante a emissão de até 1.607.033.212 novas ações ordinárias, escriturais e nominativas, sem valor nominal, na modalidade de novas entradas em numerário, a ser realizado em dinheiro, através da oferta pública de subscrição com direito de preferência na subscrição por parte dos acionistas, e aprovou a minuta do Prospeto; (fls. 660-662 v.; fls. 2282-2729, maxime fls. 2283-2284 v. e 2314-2518 v.)
b) votou favoravelmente a deliberação de realização do aumento de capital; (fls. 2282-2729, maxime fls. 2284)
c) o BES divulgou o prospeto da Oferta do aumento de capital no SDI da CMVM no dia 20 de maio de 2014, após o fecho da sessão de negociação; (fls. 24-211, maxime fls. 24 v.)
d) à data da aprovação do Prospeto o montante total de financiamentos do BES concedidos à ESFG e suas subsidiárias ascendia a cerca de 533 milhões de euros;
e) do Prospeto consta informação sobre o montante dos financiamentos concedidos à ESFG e suas subsidiárias com referência a 31.12.2013, correspondente a cerca de 290 milhões de euros; (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2479 v.)
f) do Prospeto não consta o valor dos financiamentos concedidos à ESFG e suas subsidiárias a 31.03.2014, que era de cerca de 400 milhões de euros; (fls. 24-211, maxime fls. 29 e 210; fls. 1193-1216; cd de fls. 2245, pasta “CA”, ficheiro “(305) 15 05 2014”; fls. 2282-2729, maxime fls. 2287-2290; cd de fls. 3223, ficheiro “20140509_Acta Comissão de Controlo de Transacções com Partes Relacionadas”; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226 e 3226 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3686 v. e 3687; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)
g) a informação constante do Prospeto não era completa, porquanto não continha informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), mas apenas a 31.12.2013 (cerca de 290 milhões de euros), e não era atual, porquanto não correspondia ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto, mas antes a 31.12.2013; (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2314-2518 v.; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)
h) a informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma; (fls. 24-211 maxime fls. 29, 34, 60 v., 61, 62, 143 v., 174, 174 v.,175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; fls. 1644-1785; fls. 4873-4896 e fls. 7297-7343; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
i) do Prospeto não constava informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação; (fls. 24-211; fls. 1521-1582, fls. 2282-2729, maxime fls. 2282-2284 v. e 2314-2518 v.)
j) do Prospeto constava informação que não era completa, porquanto não continha informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação;
k) a informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma;
l) para além de ter praticado os factos descritos, não adotou, durante o período de tempo entre a decisão de realização do aumento de capital e a liquidação financeira do mesmo, qualquer medida adequada a sanar os vícios da informação constantes do Prospeto. (fls. 24-211; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, ficheiros “(305) 15 05 2014” e “(306) 20 06_01 07 2014”, ponto 2 da ordem de trabalhos; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; pen a fls. 8719)
235. O arguido AA quis praticar os factos supra descritos.
SUBSECÇÃO II.2. – DA NÃO DIVULGAÇÃO DE ADENDAS AO PROSPETO
236. (i) O arguido AA, enquanto administrador com o pelouro do DFME, teve conhecimento de que o BES concedeu, em 30 de maio de 2014, financiamentos à ESFG e subsidiárias, no montante de cerca de 194 milhões de euros. (fls. 3232-3236 v.; fls. 5167-5174, maxime fls. 5167 v., 5168, 5171 e 5174)
237. O arguido AA, enquanto membro do Conselho Financeiro e de Crédito do BES, não aprovou os financiamentos concedidos à ESFG e suas subsidiárias em 30 de maio de 2014, no montante de cerca de 194 milhões de euros. (fls. 3232-3236 v.; fls. 5167-5174, maxime fls. 5167 v., 5168, 5171 e 5174)
238. O arguido AA, enquanto administrador com o pelouro do DFME, tinha conhecimento de que, a 30 de maio de 2014, o montante total de financiamentos do BES concedidos à ESFG e suas subsidiárias ascendia a cerca de 727 milhões de euros.
239. O arguido AA não promoveu nem adotou, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, qualquer diligência ou medida no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG. (fls. 24-211; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245 e fls. 2249-3135, maxime fls. 3033-3038; fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832; pen a fls. 8719)
240. O arguido AA tinha conhecimento de que o BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG após a aprovação e divulgação do Prospeto. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
241. O arguido AA tinha conhecimento de que o BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG após a aprovação e divulgação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
242. O arguido AA tinha conhecimento de que a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211, maxime fls. 27, 27 v., 29, 60 v., 61 e 62, 143 v., 145, 174, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636, maxime fls. 1595; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2479 v.; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v.; fls. 3232-3236 v.; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v. e cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014)
243. (ii) O arguido AA votou favoravelmente, na reunião da Comissão Executiva do BES de 12 de junho de 2014, a concessão de um financiamento à Rio Forte no montante de 135 milhões de euros. (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3240-3241 v.)
244. O arguido AA tinha conhecimento de que o montante total de financiamentos do BES concedidos à Rio Forte e suas subsidiárias ascendia, em 12 de junho de 2014, a pelo menos 135 milhões de euros. (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiros “(1526) 11 06 2014” e “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3687 v.)
245. O arguido AA não promoveu nem adotou, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, qualquer diligência ou medida no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte. (cd de fls. 2245; fls. 2249-3135, maxime fls. 3033-3038; fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832; pen a fls. 8719)
246. O arguido AA tinha conhecimento de que o BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
247. O arguido AA tinha conhecimento de que o BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou por qualquer outro meio, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES,
248. representativas do seu aumento de capital, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
249. O arguido AA agiu consciente e voluntariamente na prática dos factos descritos, os quais são factos próprios, em que interveio e que praticou. Com efeito, (fls. 24-211; fls. 944-1192; fls. 1583-1636; cd de fls. 3223 e fls. 3224-3244 v., maxime fls. 3225-3226 v. e fls. 3232-3236 v.; fls. 5167-5174; pen a fls. 8719; fls. 3814-3832; cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140317”, ficheiro “9. B Anexo 6_Regulamento Comissão Controlo Transacções Partes Relaconadas”, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1513) 02 04 2014”, ponto 07.02.01 da ordem de trabalhos, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140402”, ficheiro “CE-20140402-07.02.01 Anexo_Contas consolidadas de 2013 da Rioforte e relatório dos auditores”, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140612”, ficheiro “CE-20140612-03.03.00 Proposta de financiamento à RioForte” e pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1525) 04 06 2014)”; fls. 3033-3038; fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v.; fls. 3726-3813; fls. 5026-5031 e fls. 5680-5684;)
250. O arguido AA sabia que:
a)   o BES concedeu, em 30 de maio de 2014, financiamentos à ESFG e subsidiárias, no            montante de cerca de 194 milhões de euros;
b)   a 30 de maio de 2014, o montante total de financiamentos do BES concedidos à ESFG e suas subsidiárias ascendia a cerca de 727 milhões de euros;
c)   não promoveu nem adotou, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, qualquer diligência ou medida no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG;
d)  o BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG após a aprovação e divulgação do Prospeto;
e) o BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG após a aprovação e divulgação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital;
f)    a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma;
g)   o BES concedeu, a 12 de junho de 2014, um financiamento à Rio Forte no montante de 135 milhões de euros;
h)  o montante total de financiamentos do BES concedidos à Rio Forte e suas subsidiárias ascendia, em 12 de junho de 2014, a pelo menos 135 milhões de euros;
i)    não promoveu nem adotou, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, desde a data da aprovação do Prospeto até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, qualquer diligência ou medida no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte;
j)    o BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto;
k)   o BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou por qualquer outro meio, desde a data da aprovação do Prospeto até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto;
251. O arguido AA quis praticar os factos supra descritos.
SUBSECÇÃO III – BB
SUBSECÇÃO III.1. – DA FALTA DE QUALIDADE DA INFORMAÇÃO CONSTANTE DO PROSPETO
252. O arguido BB foi Administrador do BES e membro da sua Comissão Executiva entre março de 2000 e 30 de julho de 2014. (fls. 24-211, maxime fls. 143 v.; 1583-1636, maxime fls. 1589 v. e 1590 v.)
253. O arguido BB foi membro da Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas do BES desde a sua criação e até 30 de julho de 2014. (fls. 24-211, maxime fls. 166; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014”, cd de fls. 2245, pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140317”, ficheiro “9. B Anexo 6_Regulamento Comissão Controlo Transacções Partes Relaconadas” e fls. cd de 2245, pasta “CA”, ficheiro “(304) 17 03 2014”; cd de fls. 3223; fls. 3224-3244 v.;)
254. O arguido BB participou na reunião do Conselho de Administração do BES de 15 de maio de 2014, que deliberou a realização do aumento de capital do BES até ao montante de até € 1.044.571.587,80 (mil e quarenta e quatro milhões quinhentos e setenta e um mil quinhentos e oitenta e sete euros e oitenta cêntimos) mediante a emissão de até 1.607.033.212 novas ações ordinárias, escriturais e nominativas, sem valor nominal, na modalidade de novas entradas em numerário, a ser realizado em dinheiro, através da oferta pública de subscrição com direito de preferência na subscrição por parte dos acionistas, e aprovou a minuta do Prospeto. (fls. 660-662 v.; fls. 2282-2729, maxime fls. 2283-2284 v. e 2314-2518 v.)
255. O arguido BB votou favoravelmente a deliberação de realização do aumento de capital. (fls. 2282-2729, maxime fls. 2284)
256. O arguido BB, enquanto membro da Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas do BES, teve conhecimento, em reunião da referida comissão havida em 9 de maio de 2014, de que à data da aprovação do Prospeto o montante total de financiamentos do BES concedidos à ESFG e suas subsidiárias ascendia a cerca de 533 milhões de euros. (fls. 24-211, maxime fls. 145; fls. 1583-1636, maxime fls. 1594 v.; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226)
257. O arguido BB tinha conhecimento de que o BES fez constar do Prospeto informação sobre o montante dos financiamentos concedidos à ESFG e suas subsidiárias com referência a 31.12.2013, correspondente a cerca de 290 milhões de euros. (fls. 24-211, maxime fls. 27 v., 29, 60 v., 61, 62, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2479 v.)
258. O arguido BB tinha conhecimento de que o BES não fez constar do Prospeto o valor dos financiamentos concedidos à ESFG e suas subsidiárias a 31.03.2014, que era de cerca de 400 milhões de euros. (fls. 24-211, maxime fls. 29 e 210; fls. 1193-1216; cd de fls. 2245, pasta “CA”, ficheiro “(305) 15 05 2014”; fls. 2282-2729, maxime fls. 2287-2290; cd de fls. 3223, ficheiro “20140509_Acta Comissão de Controlo de Transacções com Partes Relacionadas”; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226 e 3226 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3686 v. e 3687; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)
259. O arguido BB tinha conhecimento de que a informação constante do Prospeto: (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2314-2518 v.; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)
a) Não era completa, porquanto não continha informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), mas apenas a 31.12.2013 (cerca de 290 milhões de euros);
b) Não era atual, porquanto não correspondia ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto, mas antes a 31.12.2013.
260. O arguido BB tinha conhecimento de que a informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211, maxime fls. 29, 34, 174, 174 v.,175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v.; fls. 3232-3236 v.; fls. 1644-1785; fls. 4873-4896 e fls. 7297-7343; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
261. O arguido BB agiu consciente e voluntariamente na prática dos factos descritos, os quais são factos próprios, em que interveio e que praticou. Com efeito, (fls. 24-211; fls. 660-662 v.; fls. 944-1192; fls. 1193-1216; fls. 1583-1636; fls. 1644-1785; cd de fls. 2245, pasta “CA”, ficheiro “(305) 15 05 2014”, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026”; fls. 2249-3135; fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.; cd de fls. 3223; fls. 3224-3244 v.; fls. 3684-3710 v.; fls. 4873-4896 e fls. 7297-7343; fls. 7968-8276; pen a fls. 8719)
262. O arguido BB sabia que:
a)   participou na reunião do Conselho de Administração do BES de 15 de maio de 2014,        que deliberou a realização do aumento de capital do BES até ao montante de até € 1.044.571.587,80 (mil e quarenta e quatro milhões quinhentos e setenta e um mil quinhentos e oitenta e sete euros e oitenta cêntimos) mediante a emissão de até 1.607.033.212 novas ações ordinárias, escriturais e nominativas, sem valor nominal, na modalidade de novas entradas em numerário, a ser realizado em dinheiro, através da oferta pública de subscrição com direito de preferência na subscrição por parte dos acionistas, e aprovou a minuta do Prospeto; (fls. 660-662 v.; 2282-2729, maxime fls. 2283-2284 v. e 2314-2518 v.)
b)   votou favoravelmente a deliberação de realização do aumento de capital; (fls. 2282-2729, maxime fls. 2284)
c)   o BES divulgou o prospeto da Oferta do aumento de capital no SDI da CMVM no dia 20 de maio de 2014, após o fecho da sessão de negociação; (fls. 24-211 maxime fls. 24 v.)
d) à data da aprovação do Prospeto o montante total de financiamentos do BES concedidos à ESFG e suas subsidiárias ascendia a cerca de 533 milhões de euros; (fls. 24-211, maxime fls. 145; fls. 1583-1636, maxime fls. 1594 v.; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226)
e) do Prospeto consta informação sobre o montante dos financiamentos concedidos à ESFG e suas subsidiárias com referência a 31.12.2013, correspondente a cerca de 290 milhões de euros; (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2479 v.)
f) do Prospeto não consta o valor dos financiamentos concedidos à ESFG e suas subsidiárias a 31.03.2014, que era de cerca de 400 milhões de euros; (fls. 24-211, maxime fls. 29 e 210; fls. 1193-1216; cd de fls. 2245, pasta “CA”, ficheiro “(305) 15 05 2014”; fls. 2282-2729, maxime fls. 2287-2290; cd de fls. 3223, ficheiro “20140509_Acta Comissão de Controlo de Transacções com Partes Relacionadas”; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226 e 3226 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3686 v. e 3687; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)
g) a informação constante do Prospeto não era completa, porquanto não continha informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), mas apenas a 31.12.2013 (cerca de 290 milhões de euros), e não era atual, porquanto não correspondia ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto, mas antes a 31.12.2013; (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2314-2518 v.; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)
h)  a informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma; (fls. 24-211, maxime fls. 29, 34, 174, 174 v.,175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v.; fls. 3232-3236 v.; fls. 1644-1785; fls. 4873-4896 e fls. 7297-7343; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
i) para além de ter praticado os factos descritos, não adotou, durante o período de tempo entre a decisão de realização do aumento de capital e a liquidação financeira do mesmo, qualquer medida adequada a sanar os vícios da informação constantes do Prospeto. (fls. 24-211; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, ficheiro “(305) 15 05 2014”; fls. 2249-3135, maxime fls. 3033-3038; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; pen a fls. 8719)
263. O arguido BB quis praticar os factos supra descritos.
SUBSECÇÃO III.2. – DA NÃO DIVULGAÇÃO DE ADENDAS AO PROSPETO
264. (i) O arguido BB, enquanto membro da Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas do BES, emitiu parecer de não oposição ao financiamento concedido pelo BES, em 30 de maio de 2014, à ESFG e subsidiárias, no montante de cerca de 194 milhões de euros. (cd de fls. 3223; fls. 3232-3236 v.)
265. O arguido BB, enquanto membro da Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas do BES, tinha conhecimento de que, a 30 de maio de 2014, o montante total de financiamentos do BES concedidos à ESFG e suas subsidiárias ascendia a cerca de 727 milhões de euros. (cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v.; fls. 3232-3236 v.)
266. O arguido BB não promoveu nem adotou, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, qualquer diligência ou medida no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG. (fls. 24-211; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245 e fls. 2249-3135, maxime fls. 3033-3038; fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832; pen a fls. 8719)
267. O arguido BB tinha conhecimento de que o BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG após a aprovação e divulgação do Prospeto. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
268. O arguido BB tinha conhecimento de que o BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG após a aprovação e divulgação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
269. O arguido BB tinha conhecimento de que a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636, maxime fls. 1594 v.; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v.; fls. 3232-3236 v.; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
270. (ii) O arguido BB votou favoravelmente, na reunião da Comissão Executiva do BES de 12 de junho de 2014, a concessão de um financiamento à Rio Forte no montante de 135 milhões de euros. (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3240-3241 v.)
271. O arguido BB tinha conhecimento de que o montante total de financiamentos do BES concedidos à Rio Forte e suas subsidiárias ascendia, em 12 de junho de 2014, a pelo menos 135 milhões de euros. (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiros “(1526) 11 06 2014” e “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3687 v.)
272. O arguido BB não promoveu, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, qualquer diligência no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte. (fls. 24-211, maxime fls. 141 v.-142, 143 v., 145 e 166; fls. 1583-1636, maxime fls. 1590 v., 1594 v. e 1619 v.; cd de fls. 2245; fls. 2249-3135, maxime fls. 3033-3038; fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832; pen a fls. 8719)
273. O arguido BB tinha conhecimento de que o BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
274. O arguido BB tinha conhecimento de que o BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou por qualquer outro meio, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital,
275. A informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
276. O arguido BB agiu consciente e voluntariamente na prática dos factos descritos, os quais são factos próprios, em que interveio e que praticou.
277. O arguido BB sabia que:
a)   o BES concedeu, em 30 de maio de 2014, financiamentos à ESFG e subsidiárias, no            montante de cerca de 194 milhões de euros; (fls. 3232-3236 v.; fls. 5167-5174, maxime fls. 5167 v., 5168, 5171 e 5174)
b)   a 30 de maio de 2014, o montante total de financiamentos do BES concedidos à ESFG e suas subsidiárias ascendia a cerca de 727 milhões de euros; (cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v.; fls. 3232-3236 v.)
c) não promoveu, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, qualquer diligência no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG; (fls. 24-211; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245 e fls. 2249-3135, maxime fls. 3033-3038; fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832; pen a fls. 8719)
d)  o BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG após a aprovação e divulgação do Prospeto; (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
e)   o BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG após a aprovação e divulgação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital; (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
f)    a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma; (fls. 24-211; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v.; fls. 3232-3236 v.; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
g)   o BES concedeu, a 12 de junho de 2014, um financiamento à Rio Forte no montante de 135 milhões de euros; (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiros “(1526) 11 06 2014” e “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3240-3241 v.)
h)  o montante total de financiamentos do BES concedidos à Rio Forte e suas subsidiárias ascendia, em 12 de junho de 2014, a pelo menos 135 milhões de euros; (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiros “(1526) 11 06 2014” e “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3240-3241 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3687 v.)
i) não promoveu, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, qualquer diligência no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte;
j)    o BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto;
k)   o BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou por qualquer outro meio, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto.
278. O arguido BB quis praticar os factos supra descritos.
SUBSECÇÃO IV – EE
SUBSECÇÃO IV.1. – DA FALTA DE QUALIDADE DA INFORMAÇÃO CONSTANTE DO PROSPETO
279. O arguido EE foi Administrador do BES e membro da sua Comissão Executiva entre abril de 1992 e 13 de julho de 2014. (fls. 24-211, maxime fls. 143 v.; 1583-1636, maxime fls. 1590 v.)
280. O arguido EE era, à data da prática dos factos, administrador da ESI. (fls. 24-211, maxime fls. 149 v.; 1583-1636, maxime fls. 1598 v.)
281. O arguido EE era, à data da prática dos factos, Vice-Presidente do Conselho de Administração da ESFG. (fls. 24-211, maxime fls. 149; 1583-1636, maxime fls. 1599)
282. O arguido EE participou na reunião do Conselho de Administração do BES de 15 de maio de 2014, que deliberou a realização do aumento de capital do BES até ao montante de até € 1.044.571.587,80 (mil e quarenta e quatro milhões quinhentos e setenta e um mil quinhentos e oitenta e sete euros e oitenta cêntimos) mediante a emissão de até 1.607.033.212 novas ações ordinárias, escriturais e nominativas, sem valor nominal, na modalidade de novas entradas em numerário, a ser realizado em dinheiro, através da oferta pública de subscrição com direito de preferência na subscrição por parte dos acionistas, e aprovou a minuta do Prospeto. (fls. 660-662 v.; fls. 2282-2729, maxime fls. 2283-2284 v. e fls. 2314-2518 v.)
283. O arguido EE votou favoravelmente a deliberação de realização do aumento de capital. (fls. 2282-2729, maxime fls. 2284)
284. O arguido EE, enquanto administrador executivo do BES e Vice-Presidente do Conselho de Administração da ESFG, tinha conhecimento de que à data da aprovação do Prospeto o montante total de financiamentos do BES concedidos à ESFG e suas subsidiárias ascendia a cerca de 533 milhões de euros.
285. O arguido EE tinha conhecimento de que o BES fez constar do Prospeto informação sobre o montante dos financiamentos concedidos à ESFG e suas subsidiárias com referência a 31.12.2013, correspondente a cerca de 290 milhões de euros. (fls. 24-211, maxime fls. 27 v., 29, 60 v., 61, 62, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2479 v.)
286. O arguido EE tinha conhecimento de que o BES não fez constar do Prospeto o valor dos financiamentos concedidos à ESFG e suas subsidiárias a 31.03.2014, que era de cerca de 400 milhões de euros. (fls. 24-211, maxime fls. 29 e 210; fls. 1193-1216; cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, ficheiro “(305) 15 05 2014” e pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140515”, ficheiro “5.B Controlo Transacções com Partes Relacionadas”; fls. 2282-2729, maxime fls. 2287-2290; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226 e 3226 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3686 v. e 3687; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)
287. O arguido EE tinha conhecimento de que a informação constante do Prospeto: (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2314-2518 v.; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)
a)   Não era completa, porquanto não continha informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), mas apenas a 31.12.2013 (cerca de 290 milhões de euros);
b)   Não era atual, porquanto não correspondia ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto, mas antes a 31.12.2013.
288. O arguido EE tinha conhecimento de que a informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211 maxime fls. 29, 34, 174, 174 v.,175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; fls. 1644-1785; fls. 4873-4896 e fls. 7297-7343; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
289. O arguido EE não adotou, durante o período de tempo entre a decisão de realização do aumento de capital e a liquidação financeira do mesmo, qualquer medida adequada a sanar os vícios da informação constantes do Prospeto. (fls. 24-211; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, ficheiro “(305) 15 05 2014”; fls. 2249-3135, maxime fls. 3033-3038; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; pen a fls. 8719)
290. O arguido EE agiu consciente e voluntariamente na prática dos factos descritos, os quais são factos próprios, em que interveio e que praticou. Com efeito, (fls. 24-211; fls. 660-662 v.; fls. 944-1192; fls. 1193-1216; fls. 1583-1636; fls. 1644-1785; cd de fls. 2245, maxime pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014”, pasta “CA”, ficheiro “(305) 15 05 2014” e pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140515”, ficheiro “5.B Controlo Transacções com Partes Relacionadas”; fls. 2249-3135, maxime fls. 2282-2729 e fls. 3033-3038; cd de fls. 3223; fls. 3224-3244 v., maxime fls. 3225-3226 v.; fls. 3684-3710 v.; fls. 4873-4896; fls. 7297-7343; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139; pen a fls. 8719; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
291. O arguido EE sabia que:
a) participou na reunião do Conselho de Administração do BES de 15 de maio de 2014, que deliberou a realização do aumento de capital do BES até ao montante de até € 1.044.571.587,80 (mil e quarenta e quatro milhões quinhentos e setenta e um mil quinhentos e oitenta e sete euros e oitenta cêntimos) mediante a emissão de até 1.607.033.212 novas ações ordinárias, escriturais e nominativas, sem valor nominal, na modalidade de novas entradas em numerário, a ser realizado em dinheiro, através da oferta pública de subscrição com direito de preferência na subscrição por parte dos acionistas, e aprovou a minuta do Prospeto;
b) votou favoravelmente a deliberação de realização do aumento de capital; (fls. 2282-2729, maxime fls. 2284)
c) o BES divulgou o prospeto da Oferta do aumento de capital no SDI da CMVM no dia 20 de maio de 2014, após o fecho da sessão de negociação; (fls. 24-211, maxime fls. 24 v.)
d) à data da aprovação do Prospeto o montante total de financiamentos do BES concedidos à ESFG e suas subsidiárias ascendia a cerca de 533 milhões de euros; (fls. 24-211, maxime fls. 29, 143 v., 145, 149 e 210; fls. 660-662 v.; fls. 1193-1216; fls. 1583-1636, maxime fls. 1590 v., 1594 v. e 1599; cd de fls. 2245, pasta “CA”, ficheiro “(305) 15 05 2014” e pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140515”, ficheiro “5.B Controlo Transacções com Partes Relacionadas”; fls. 2282-2729, maxime fls. 2287-2290; cd de fls. 3223, maxime ficheiro “20140509_Acta Comissão de Controlo de Transacções com Partes Relacionadas”; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226 e 3226 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3686 v. e 3687; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)
e) do Prospeto consta informação sobre o montante dos financiamentos concedidos à ESFG e suas subsidiárias com referência a 31.12.2013, correspondente a cerca de 290 milhões de euros; (fls. 24-211, maxime fls. 27 v., 29, 60 v., 61, 62, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2479 v.)
f) do Prospeto não consta o valor dos financiamentos concedidos à ESFG e suas subsidiárias a 31.03.2014, que era de cerca de 400 milhões de euros; (fls. 24-211, maxime fls. 29 e 210; fls. 1193-1216; cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, ficheiro “(305) 15 05 2014” e pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140515”, ficheiro “5.B Controlo Transacções com Partes Relacionadas”; fls. 2282-2729, maxime fls. 2287-2290; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226 e 3226 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3686 v. e 3687; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)
g) a informação constante do Prospeto não era completa, porquanto não continha informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), mas apenas a 31.12.2013 (cerca de 290 milhões de euros), e não era atual, porquanto não correspondia ao montante total do dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto, mas antes a 31.12.2013; (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2314-2518 v.; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)
h) a informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma; (fls. 24-211 maxime fls. 29, 34, 174, 174 v.,175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; fls. 1644-1785; fls. 4873-4896 e fls. 7297-7343; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
i) não adotou, durante o período de tempo entre a decisão de realização do aumento de capital e a liquidação financeira do mesmo, qualquer medida adequada a sanar os vícios da informação constantes do Prospeto. (fls. 24-211; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, ficheiro “(305) 15 05 2014”; fls. 2249-3135, maxime fls. 3033-3038; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; pen a fls. 8719)
292. O arguido EE quis praticar os factos supra descritos
SUBSECÇÃO IV.2. – DA NÃO DIVULGAÇÃO DE ADENDAS AO PROSPETO
293. (i) O arguido EE, enquanto administrador executivo do BES e Vice-Presidente do Conselho de Administração da ESFG, teve conhecimento de que o BES concedeu, em 30 de maio de 2014, financiamentos à ESFG e subsidiárias, no montante de cerca de 194 milhões de euros. (fls. 24-211, maxime fls. 143 v. e 149; fls. 1583-1636, maxime fls. 1590 v. e 1599; cd de fls. 3223; fls. 3232-3236 v.; fls. 5167-5174, maxime fls. 5167 v., 5168, 5171 e 5174;)
294. O arguido EE, enquanto administrador executivo do BES e Vice-Presidente do Conselho de Administração da ESFG, tinha conhecimento de que, a 30 de maio de 2014, o montante total de financiamentos do BES concedidos à ESFG e suas subsidiárias ascendia a cerca de 727 milhões de euros. (fls. 24-211, maxime fls. 143 v. e 149; fls. 1583-1636, maxime fls. 1590 v. e 1599; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226; fls. 3232-3236 v.; fls. 5167-5174, maxime fls. 5167 v., 5168, 5171 e 5174;)
295. O arguido EE não promoveu, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, qualquer diligência no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG. (fls. 24-211; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245 e fls. 2249-3135, maxime fls. 3033-3038; fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832; pen a fls. 8719)
296. O arguido EE tinha conhecimento de que o BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG após a aprovação e divulgação do Prospeto. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
297. O arguido EE tinha conhecimento de que o BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG após a aprovação e divulgação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
298. O arguido EE tinha conhecimento de que a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
299. (ii) O arguido EE assinou as duas cartas de conforto emitidas pelo BES, em 9 de junho de 2014, em favor das sociedades venezuelanas Fondo Nacional para el Desarrollo Nacional – FONDEN, S.A. e Banco de Desarollo Economico y Social da Venezuela (ambas integrantes do grupo Petróleos da Venezuela – PDVSA), pela quais o BES assumiu o compromisso de reembolsar os títulos representativos de dívida emitidos pela ESI que haviam sido adquiridas pelas sociedades destinatárias das cartas, no valor de 372 milhões de dólares. (fls. 2243-2248, maxime cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140715”, ficheiros “CE-20140715-07.03.02 Carta dirigida ao Banco de Desarrollo Economico y Social de Venezuela” e “CE-20140715-07.03.03 Carta dirigida ao Fondo de Desarollo Nacional – FONDEN” e fls. 2246-2247; fls. 3088-3091 v., maxime fls. 3090 v.-3091; cd de fls. 3223, ficheiro “Nº 269 CMVM_01 03 2018 pedido de elementos_Processo de contraordenação nº 14_2017”, pp. 3 e 4; fls. 8336-8337; fls. 8366-8385, maxime fls. 8367, 8368, 8382 e 8384;)
300. O arguido EE não promoveu, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, qualquer diligência no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre a emissão das duas cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA. (fls. 24-211; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245, maxime pasta “CE”, subpasta “3 19-06-2014 a 01-08-2014”, ficheiro “(1539) 15 07 2014”, pontos 07.03.02 e 07.03.03 da ordem de trabalhos; fls. 2249-3135, maxime fls. 3033-3038; fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832; pen a fls. 8719).
301. O arguido EE tinha conhecimento de que o BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre a emissão das duas cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
302. O arguido EE tinha conhecimento de que o BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre a emissão, pelo BES, das cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
303. O arguido EE tinha conhecimento de que a informação sobre a emissão, pelo BES das cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 1583-1636; fls. 2243-2248, maxime cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140715”, ficheiros “CE-20140715-07.03.02 Carta dirigida ao Banco de Desarrollo Economico y Social de Venezuela” e “CE-20140715-07.03.03 Carta dirigida ao Fondo de Desarollo Nacional – FONDEN” e fls. 2246-2247; fls. 3088-3091 v., maxime fls. 3090 v.-3091; cd de fls. 3223, ficheiro “Nº 269 CMVM_01 03 2018 pedido de elementos_Processo de contraordenação nº 14_2017”, pp. 3 e 4; fls. 8336-8337; fls. 8366-8385, maxime fls. 8367, 8368, 8382 e 8384; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
304. (iii) O arguido EE votou favoravelmente, na reunião da Comissão Executiva do BES de 12 de junho de 2014, a concessão de um financiamento à Rio Forte no montante de 135 milhões de euros. (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiros “(1526) 11 06 2014” e “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3240-3241 v.)
305. O arguido EE tinha conhecimento de que o montante total de financiamentos do BES concedidos à Rio Forte e suas subsidiárias ascendia, em 12 de junho de 2014, a pelo menos 135 milhões de euros. (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiros “(1526) 11 06 2014” e “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3687 v.)
306. O arguido EE não promoveu, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, qualquer diligência no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte. (cd de fls. 2245; fls. 2249-3135, maxime fls. 3033-3038; fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832; pen a fls. 8719)
307. O arguido EE tinha conhecimento de que o BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
308. O arguido EE tinha conhecimento de que o BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou por qualquer outro meio, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital,
309. a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
310. O arguido EE agiu consciente e voluntariamente na prática dos factos descritos, os quais são factos próprios, em que interveio e que praticou.
311. O arguido EE sabia que:
a)   o BES concedeu, em 30 de maio de 2014, financiamentos à ESFG e subsidiárias, no            montante de cerca de 194 milhões de euros;
b)   a 30 de maio de 2014, o montante total de financiamentos do BES concedidos à ESFG e suas subsidiárias ascendia a cerca de 727 milhões de euros;
c)   não promoveu, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, qualquer diligência no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG;
d)  o BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG após a aprovação e divulgação do Prospeto;
e)   o BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG após a aprovação e divulgação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital;
f)    a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma;
g)   o BES emitiu, em 9 de junho de 2014, duas cartas de conforto em favor das sociedades venezuelanas Fondo Nacional para el Desarrollo Nacional - FONDEN, S.A. e Banco de Desarollo Economico y Social da Venezuela (ambas integrantes do grupo Petróleos da Venezuela - PDVSA), pelas quais assumiu o compromisso de reembolsar os títulos representativos de dívida emitidos pela ESI que haviam sido adquiridas pelas sociedades destinatárias das cartas, que ascendiam a 372 milhões de dólares;
h)  não promoveu, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, qualquer diligência no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre a emissão das duas cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA;
i)    o BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre a emissão das duas cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA;
j)    o BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre a emissão, pelo BES, das cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital;
k)   a informação sobre a emissão, pelo BES das cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma;
l)    o BES concedeu, a 12 de junho de 2014, um financiamento à Rio Forte no montante de 135 milhões de euros;
m) o montante total de financiamentos do BES concedidos à Rio Forte e suas subsidiárias ascendia, em 12 de junho de 2014, a pelo menos 135 milhões de euros;
n)  não promoveu, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, qualquer diligência no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte;
o)   o BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou por qualquer outro meio, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto;
p)  o BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto.
312. O arguido EE quis praticar os factos supra descritos.

SUBSECÇÃO V – CC
SUBSECÇÃO V.1. – DA FALTA DE QUALIDADE DA INFORMAÇÃO CONSTANTE DO PROSPETO
313. O arguido CC foi Administrador do BES e presidente da sua Comissão Executiva entre setembro de 1991 e 13 de julho de 2014. (fls. 24-211, maxime fls. 143 v.; 1583-1636, maxime fls. 1590 v.)
314. O arguido CC, na qualidade de presidente da Comissão Executiva do BES tinha, à data da prática dos factos, para além de outros pelouros, o Departamento de Planeamento e Contabilidade e o Gabinete de Relação com os Investidores. (fls. 24-211, maxime fls. 144-144 v.; 1583-1636, maxime fls. 1594)
315. O arguido CC era, à data da prática dos factos, Presidente do Conselho de Administração da ESFG. (fls. 24-211, maxime fls. 148; 1583-1636, maxime fls. 1598)
316. O arguido CC era, à data da prática dos factos, administrador da ESI. (fls. 24-211, maxime fls. 148; 1583-1636, maxime fls. 1598)
317. O arguido CC participou na reunião do Conselho de Administração do BES de 15 de maio de 2014, que deliberou a realização do aumento de capital do BES até ao montante de até € 1.044.571.587,80 (mil e quarenta e quatro milhões quinhentos e setenta e um mil quinhentos e oitenta e sete euros e oitenta cêntimos) mediante a emissão de até 1.607.033.212 novas ações ordinárias, escriturais e nominativas, sem valor nominal, na modalidade de novas entradas em numerário, a ser realizado em dinheiro, através da oferta pública de subscrição com direito de preferência na subscrição por parte dos acionistas, e aprovou a minuta do Prospeto. (fls. 660-662 v.; fls. 2282-2729, maxime fls. 2283-2284 v. e fls. 2314-2518 v.)
318. O arguido CC votou favoravelmente a deliberação de realização do aumento de capital. (fls. 2282-2729, maxime fls. 2284)
319. (i) O arguido CC, enquanto administrador executivo do BES e Presidente do Conselho de Administração da ESFG, tinha conhecimento de que à data da aprovação do Prospeto o montante total de financiamentos do BES concedidos à ESFG e suas subsidiárias ascendia a cerca de 533 milhões de euros. (fls. 24-211, maxime fls. 143 v., 144-144 v. e 148; fls. 1583-1636, maxime fls. 1590 v., 1594 e 1598; fls. 660-662 v.; cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, ficheiro “(305) 15 05 2014” e pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140515”, ficheiro “5.B Controlo Transacções com Partes Relacionadas”; fls. 2282-2729, maxime fls. 2283-2284 v. e 2314-2518 v.; cd de fls. 3223, maxime ficheiro “20140509_Acta Comissão de Controlo de Transacções com Partes Relacionadas”; fls. 3224-3244 v., maxime fls. 3225-3226 v.;)
320. O arguido CC tinha conhecimento de que o BES fez constar do Prospeto informação sobre o montante dos financiamentos concedidos à ESFG e suas subsidiárias com referência a 31.12.2013, correspondente a cerca de 290 milhões de euros. (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2479 v.)
321. O arguido CC tinha conhecimento de que o BES não fez constar do Prospeto o valor dos financiamentos concedidos à ESFG e suas subsidiárias a 31.03.2014, que era de cerca de 400 milhões de euros. (fls. 24-211, maxime fls. 29 e 210; fls. 1193-1216; cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, ficheiro “(305) 15 05 2014” e pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140515”, ficheiro “5.B Controlo Transacções com Partes Relacionadas”; fls. 2282-2729, maxime fls. 2287-2290; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226 e 3226 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3686 v. e 3687; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)
322. O arguido CC tinha conhecimento de que a informação constante do Prospeto: (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2314-2518 v.; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)
a)   Não era completa, porquanto não continha informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), mas apenas a 31.12.2013 (cerca de 290 milhões de euros);
b)   Não era atual, porquanto não correspondia ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto, mas antes a 31.12.2013.
323. O arguido CC tinha conhecimento de que a informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211 maxime fls. 29, 34, 174, 174 v.,175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; fls. 1644-1785; fls. 4873-4896 e fls. 7297-7343; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
324. (ii) O arguido CC participou, em representação do BES, nas reuniões da Assembleia-Geral do BESA ocorridas em outubro de 2013. (fls. 1521-1582, maxime fls. 1524-1549 e 1572)
325. O arguido CC teve conhecimento de que, nas reuniões da Assembleia-Geral do BESA ocorridas em outubro de 2013:
a)   o Presidente da Comissão Executiva do BESA informou que a Comissão Executiva do     BESA apurou a existência de um conjunto de créditos, de valor material, considerados de cobrança duvidosa; (fls. 1521-1582)
b)   foram analisados aspetos da carteira de crédito do BESA, com referência a 31 de agosto de 2013, tendo a carteira de crédito sido dividida em dois blocos de clientes (bloco A e bloco B), atendendo ao grau de conhecimento que a Comissão Executiva do BESA detinha sobre os mesmos, bem como à dimensão dos créditos concedidos pela anterior gestão; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1524-1531, 1532-1549 e 1572)
c)   foi referido que o designado bloco A dos créditos representava 80% do total da carteira de crédito do BES, totalizando cerca de 5,5 mil milhões de dólares, e respeitava a um conjunto de clientes do BESA sobre os quais o Conselho de Administração do BESA, em 3 de outubro de 2014, desconhecia a identidade dos mutuários, a finalidade dos créditos e as garantias associadas aos mesmos; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1526-1527)
d)  foi informado que o crédito concedido pelo BESA totalizava, em 31 de agosto de 2013, 6,9 mil milhões de dólares, dos quais, 1,8 mil milhões de dólares correspondiam a capital vencido; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1526-1527)
e)   foi informado que, em 31 de agosto de 2013, os juros vencidos por liquidar juntamente com os juros de mora totalizavam cerca de 560 milhões de dólares; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1527)
f)    foi informado que o BESA apresentava, em outubro de 2013, para além de uma difícil situação de liquidez, com necessidades de financiamento de cerca de 6.6 mil milhões de dólares, 4.6 mil milhões de dólares financiados através do BES e 2 mil milhões de dólares através de bancos angolanos, uma grave situação patrimonial, resultado da deteção de uma fraude ao nível da sua carteira de crédito e do seu portfólio de ativos imobiliários. (fls. 1521-1582, maxime fls. 1575)
326. O arguido CC tinha conhecimento de que o BES não fez constar do Prospeto informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação. (fls. 24-211; fls. 1521-1582; fls. 2282-2729, maxime fls. 2282-2284 v. e fls. 2314-2518 v.)
327. O arguido CC tinha conhecimento de que do Prospeto constava informação que não era completa, porquanto não continha informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação. (fls. 24-211; fls. 1521-1582; fls. 2282-2729, maxime fls. 2282-2284 v. e fls. 2314-2518 v.)
328. O arguido CC tinha conhecimento de que a informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 1521-1582; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245, maxime pasta “CE”, subpasta “3 19-06-2014 a 01-08-2014”, ficheiro “(1528) 19 06 2014”, ponto 02:01:00 da ordem de trabalho e pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140620”, ficheiro “2. Resultados do aumento de capital do BES”, p. 17; fls. 4829-4841, maxime fls. 4830 e 4841; fls. 5852-5863 v., maxime fls. 5852 v. e 5863 v.; fls. 5864-5882 v., maxime fls. 5872 v.; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
329. O arguido CC, para além de ter praticado os factos descritos, não adotou, durante o período de tempo entre a decisão de realização do aumento de capital e a liquidação financeira do mesmo, qualquer medida adequada a sanar os vícios da informação constantes do Prospeto. (fls. 24-211, maxime fls. 39 v.; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, ficheiros “(305) 15 05 2014” e “(306) 20 06_01 07 2014”, ponto 2 da ordem de trabalhos; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; pen a fls. 8719)
330. O arguido CC agiu consciente e voluntariamente na prática dos factos descritos, os quais são factos próprios, em que interveio e que praticou.
331. O arguido CC sabia que:
a) participou na reunião do Conselho de Administração do BES de 15 de maio de 2014, que deliberou a realização do aumento de capital do BES até ao montante de até € 1.044.571.587,80 (mil e quarenta e quatro milhões quinhentos e setenta e um mil quinhentos e oitenta e sete euros e oitenta cêntimos) mediante a emissão de até 1.607.033.212 novas ações ordinárias, escriturais e nominativas, sem valor nominal, na modalidade de novas entradas em numerário, a ser realizado em dinheiro, através da oferta pública de subscrição com direito de preferência na subscrição por parte dos acionistas, e aprovou a minuta do Prospeto; (fls. 660-662 v.; fls. 2282-2729, maxime fls. 2283-2284 v. e fls. 2314-2518 v.)
b) votou favoravelmente a deliberação de realização do aumento de capital; (fls. 2282-2729, maxime fls. 2284)
c) o BES divulgou o prospeto da Oferta do aumento de capital no SDI da CMVM no dia 20 de maio de 2014, após o fecho da sessão de negociação; (fls. 24-211, maxime fls. 24 v.)
d) à data da aprovação do Prospeto o montante total de financiamentos do BES concedidos à ESFG e suas subsidiárias ascendia a cerca de 533 milhões de euros; (fls. 24-211, maxime fls. 143 v., 144-144 v. e 148; fls. 1583-1636, maxime fls. 1590 v., 1594 e 1598; fls. 660-662 v.; cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, ficheiro “(305) 15 05 2014” e pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140515”, ficheiro “5.B Controlo Transacções com Partes Relacionadas”; fls. 2282-2729, maxime fls. 2283-2284 v. e 2314-2518 v.; cd de fls. 3223, maxime ficheiro “20140509_Acta Comissão de Controlo de Transacções com Partes Relacionadas”; fls. 3224-3244 v., maxime fls. 3225-3226 v.)
e) do Prospeto consta informação sobre o montante dos financiamentos concedidos à ESFG e suas subsidiárias com referência a 31.12.2013, correspondente a cerca de 290 milhões de euros; (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2479 v.)
f) do Prospeto não consta o valor dos financiamentos concedidos à ESFG e suas subsidiárias a 31.03.2014, que era de cerca de 400 milhões de euros; (fls. 24-211, maxime fls. 29 e 210; fls. 1193-1216; cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, ficheiro “(305) 15 05 2014” e pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140515”, ficheiro “5.B Controlo Transacções com Partes Relacionadas”; fls. 2282-2729, maxime fls. 2287-2290; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226 e 3226 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3686 v. e 3687; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)
g) a informação constante do Prospeto não era completa, porquanto não continha informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), mas apenas a 31.12.2013 (cerca de 290 milhões de euros), e não era atual, porquanto não correspondia ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto, mas antes a 31.12.2013; (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2314-2518 v.; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)
h) a informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma; (fls. 24-211 maxime fls. 29, 34, 174, 174 v.,175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; fls. 1644-1785; fls. 4873-4896 e fls. 7297-7343; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
i) do Prospeto não consta informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação; (fls. 24-211; fls. 1521-1582; fls. 2282-2729, maxime fls. 2282-2284 v. e fls. 2314-2518 v.)
j) do Prospeto constava informação que não era completa, porquanto não continha informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação; (fls. 24-211; fls. 1521-1582; fls. 2282-2729, maxime fls. 2282-2284 v. e fls. 2314-2518 v.)
k) a informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma; (fls. 24-211; fls. 1521-1582; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245, maxime pasta “CE”, subpasta “3 19-06-2014 a 01-08-2014”, ficheiro “(1528) 19 06 2014”, ponto 02:01:00 da ordem de trabalho e pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140620”, ficheiro “2. Resultados do aumento de capital do BES”, p. 17; fls. 4829-4841, maxime fls. 4830 e 4841; fls. 5852-5863 v., maxime fls. 5852 v. e 5863 v.; fls. 5864-5882 v., maxime fls. 5872 v; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
l) para além de ter praticado os factos descritos, não adotou, durante o período de tempo entre a decisão de realização do aumento de capital e a liquidação financeira do mesmo, qualquer medida adequada a sanar os vícios da informação constantes do Prospeto. (fls. 24-211, maxime fls. 39 v.; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, ficheiros “(305) 15 05 2014” e “(306) 20 06_01 07 2014”, ponto 2 da ordem de trabalhos; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; pen a fls. 8719)
332. O arguido CC quis praticar os factos supra descritos.

SUBSECÇÃO V.2. – DA NÃO DIVULGAÇÃO DE ADENDAS AO PROSPETO
333. (i) O arguido CC, enquanto administrador executivo do BES e Presidente do Conselho de Administração da ESFG, teve conhecimento de que o BES concedeu, em 30 de maio de 2014, financiamentos à ESFG e subsidiárias, no montante de cerca de 194 milhões de euros.
334. O arguido CC, enquanto administrador executivo do BES e Presidente do Conselho de Administração da ESFG, tinha conhecimento de que, a 30 de maio de 2014, o montante total de financiamentos do BES concedidos à ESFG e suas subsidiárias ascendia a cerca de 727 milhões de euros. (fls. 24-211, maxime fls. 143 v. e 148; fls. 1583-1636, maxime fls. 1590 v. e 1599; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226; fls. 3232-3236 v.; fls. 5167-5174, maxime fls. 5167 v., 5168, 5171 e 5174;)
335. O arguido CC não promoveu, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, qualquer diligência no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG. (fls. 24-211; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245 e fls. 2249-3135, maxime fls. 3033-3038; fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832; pen a fls. 8719)
336. O arguido CC tinha conhecimento de que o BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG após a aprovação e divulgação do Prospeto. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
337. O arguido CC tinha conhecimento de que o BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG após a aprovação e divulgação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
338. O arguido CC tinha conhecimento de que a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
339. (ii) O arguido CC assinou as duas cartas de conforto emitidas pelo BES, em 9 de junho de 2014, em favor das sociedades venezuelanas Fondo Nacional para el Desarrollo Nacional – FONDEN, S.A. e Banco de Desarollo Economico y Social da Venezuela (ambas integrantes do grupo Petróleos da Venezuela – PDVSA), pela quais o BES assumiu o compromisso de reembolsar os títulos representativos de dívida emitidos pela ESI que haviam sido adquiridas pelas sociedades destinatárias das cartas, no valor de 372 milhões de dólares. (fls. 2243-2248, maxime cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140715”, ficheiros “CE-20140715-07.03.02 Carta dirigida ao Banco de Desarrollo Economico y Social de Venezuela” e “CE-20140715-07.03.03 Carta dirigida ao Fondo de Desarollo Nacional – FONDEN” e fls. 2246-2247; fls. 3088-3091 v., maxime fls. 3090 v.-3091; cd de fls. 3223, ficheiro “Nº 269 CMVM_01 03 2018 pedido de elementos_Processo de contraordenação nº 14_2017”, pp. 3 e 4; fls. 8336-8337; fls. 8366-8385, maxime fls. fls. 8367, 8368, 8382 e 8384;)
340. O arguido CC não promoveu, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, qualquer diligência no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre a emissão das duas cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA. (fls. 24-211; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245, maxime pasta “CE”, subpasta “3 19-06-2014 a 01-08-2014”, ficheiro “(1539) 15 07 2014”, pontos 07.03.02 e 07.03.03 da ordem de trabalhos; fls. 2249-3135, maxime fls. 3033-3038; fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832; pen a fls. 8719)
341. O arguido CC tinha conhecimento de que o BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre a emissão das duas cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
342. O arguido CC tinha conhecimento de que o BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre a emissão, pelo BES, das cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
343. O arguido CC tinha conhecimento de que a informação sobre a emissão, pelo BES das cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma.
344. (iii) O arguido CC votou favoravelmente, na reunião da Comissão Executiva do BES de 12 de junho de 2014, a concessão de um financiamento à Rio Forte no montante de 135 milhões de euros. (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3240-3241 v.)
345. O arguido CC tinha conhecimento de que o montante total de financiamentos do BES concedidos à Rio Forte e suas subsidiárias ascendia, em 12 de junho de 2014, a pelo menos 135 milhões de euros. (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiros “(1526) 11 06 2014” e “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3687 v.)
346. O arguido CC não promoveu nem adotou, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, qualquer diligência ou medida no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte. (cd de fls. 2245; fls. 2249-3135, maxime fls. 3033-3038; fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832; pen a fls. 8719)
347. O arguido CC tinha conhecimento de que o BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
348. O arguido CC tinha conhecimento de que o BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou por qualquer outro meio, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital,
349. a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto. (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
350. O arguido CC agiu consciente e voluntariamente na prática dos factos descritos, os quais são factos próprios, em que interveio e que praticou.
351. O arguido CC sabia que:
a)   o BES concedeu, em 30 de maio de 2014, financiamentos à ESFG e subsidiárias, no            montante de cerca de 194 milhões de euros;
b)   a 30 de maio de 2014, o montante total de financiamentos do BES concedidos à ESFG e suas subsidiárias ascendia a cerca de 727 milhões de euros;
c) não promoveu, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, qualquer diligência no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG; (fls. 24-211; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245 e fls. 2249-3135, maxime fls. 3033-3038; fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832; pen a fls. 8719)
d)  o BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG após a aprovação e divulgação do Prospeto; (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
e) o BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG após a aprovação e divulgação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital; (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
f) a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma; (fls. 24-211; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
g)   o BES emitiu, em 9 de junho de 2014, duas cartas de conforto em favor das sociedades venezuelanas Fondo Nacional para el Desarrollo Nacional – FONDEN, S.A. e Banco de Desarollo Economico y Social da Venezuela (ambas integrantes do grupo Petróleos da Venezuela – PDVSA), pelas quais assumiu o compromisso de reembolsar os títulos representativos de dívida emitidos pela ESI que haviam sido adquiridas pelas sociedades destinatárias das cartas, que ascendiam a 372 milhões de dólares; (fls. 2243-2248, maxime cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140715”, ficheiros “CE-20140715-07.03.02 Carta dirigida ao Banco de Desarrollo Economico y Social de Venezuela” e “CE-20140715-07.03.03 Carta dirigida ao Fondo de Desarollo Nacional – FONDEN” e fls. 2246-2247; fls. 3088-3091 v., maxime fls. 3090 v.-3091; cd de fls. 3223, ficheiro “Nº 269 CMVM_01 03 2018 pedido de elementos_Processo de contraordenação nº 14_2017”, pp. 3 e 4; fls. 8336-8337; fls. 8360-8365; fls. 8366-8385, maxime fls. 8367, 8368, 8382 e 8384;)
h)  não promoveu, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, qualquer diligência no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre a emissão das duas cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA; (fls. 24-211; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245, maxime pasta “CE”, subpasta “3 19-06-2014 a 01-08-2014”, ficheiro “(1539) 15 07 2014”, pontos 07.03.02 e 07.03.03 da ordem de trabalhos; fls. 2249-3135, maxime fls. 3033-3038; fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832; pen a fls. 8719)
i)  o BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre a emissão das duas cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA; (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
j) o BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre a emissão, pelo BES, das cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital; (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
k)  a informação sobre a emissão, pelo BES das cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma;
l)  o BES concedeu, a 12 de junho de 2014, um financiamento à Rio Forte no montante de 135 milhões de euros; (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3240-3241 v.)
m) o montante total de financiamentos do BES concedidos à Rio Forte e suas subsidiárias ascendia, em 12 de junho de 2014, a pelo menos 135 milhões de euros; (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiros “(1526) 11 06 2014” e “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3687 v.)
n)  não promoveu, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, qualquer diligência no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte; (cd de fls. 2245; fls. 2249-3135, maxime fls. 3033-3038; fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832; pen a fls. 8719)
o)   o BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto; (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
p)  o BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou por qualquer outro meio, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto- (fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
352. O arguido CC quis praticar os factos supra descritos

SUBSECÇÃO VI – DD
SUBSECÇÃO VI.1. – DA FALTA DE QUALIDADE DA INFORMAÇÃO CONSTANTE DO PROSPETO
353. O arguido DD foi Administrador do BES e membro da sua Comissão Executiva entre março de 2000 e 30 de julho de 2014. (fls. 24-211, maxime fls. 143 v.; 1583-1636, maxime fls. 1590 v.)
354. O arguido DD, na qualidade de membro da Comissão Executiva do BES tinha, à data da prática dos factos, para além de outros, o pelouro do Departamento de Assuntos Jurídicos (DAJ). (fls. 24-211, maxime fls. 145; 1583-1636, maxime fls. 1594 v.)
355. O arguido DD participou na reunião do Conselho de Administração do BES de 15 de maio de 2014, que deliberou a realização do aumento de capital do BES até ao montante de até € 1.044.571.587,80 (mil e quarenta e quatro milhões quinhentos e setenta e um mil quinhentos e oitenta e sete euros e oitenta cêntimos) mediante a emissão de até 1.607.033.212 novas ações ordinárias, escriturais e nominativas, sem valor nominal, na modalidade de novas entradas em numerário, a ser realizado em dinheiro, através da oferta pública de subscrição com direito de preferência na subscrição por parte dos acionistas, e aprovou a minuta do Prospeto. (fls. 660-662 v.; fls. 2282-2729, maxime fls. 2283-2284 v. e fls. 2314-2518 v.)
356. O arguido DD votou favoravelmente a deliberação de realização do aumento de capital. (fls. 2282-2729, maxime fls. 2284)
357. O arguido DD teve conhecimento, em 3 de novembro de 2013, do conteúdo das atas das reuniões da assembleia-geral do BESA realizadas em 3 e 21 de outubro de 2013, que lhe foram enviadas pelo Presidente da Mesa da Assembleia-Geral do BESA.
358. O arguido DD teve conhecimento, em 3 de novembro de 2013, de que, nas reuniões da Assembleia-Geral do BESA ocorridas em outubro de 2013 (fls. 1521-1582, maxime fls. 1550-1553, fls. 1557-1565, fls. 1566-1567 e fls. 1568-1569):
a)   o Presidente da Comissão Executiva do BESA informou que a Comissão Executiva do     BESA apurou a existência de um conjunto de créditos, de valor material, considerados de cobrança duvidosa; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1566)
b)   foram analisados aspetos da carteira de crédito do BESA, com referência a 31 de agosto de 2013, tendo a carteira de crédito sido dividida em dois blocos de clientes (bloco A e bloco B), atendendo ao grau de conhecimento que a Comissão Executiva do BESA detinha sobre os mesmos, bem como à dimensão dos créditos concedidos pela anterior gestão; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1553-1554)
c)   foi referido que o designado bloco A dos créditos representava 80% do total da carteira de crédito do BES, totalizando cerca de 5,5 mil milhões de dólares, e respeitava a um conjunto de clientes do BESA sobre os quais o Conselho de Administração do BESA, em 3 de outubro de 2014, desconhecia a identidade dos mutuários, a finalidade dos créditos e as garantias associadas aos mesmos; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1554)
d)  foi informado que o crédito concedido pelo BESA totalizava, em 31 de agosto de 2013, 6,9 mil milhões de dólares, dos quais, 1,8 mil milhões de dólares correspondiam a capital vencido; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1554)
e)   foi informado que, em 31 de agosto de 2013, os juros vencidos por liquidar juntamente com os juros de mora totalizavam cerca de 560 milhões de dólares; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1554)
f)    foi informado que o BESA apresentava, em outubro de 2013, para além de uma difícil situação de liquidez, com necessidades de financiamento de cerca de 6.6 mil milhões de dólares, 4.6 mil milhões de dólares financiados através do BES e 2 mil milhões de dólares através de bancos angolanos, uma grave situação patrimonial, resultado da deteção de uma fraude ao nível da sua carteira de crédito e do seu portfólio de ativos imobiliários. (fls. 1521-1582, maxime fls. 1566)
359. O arguido DD teve conhecimento do conteúdo das cartas enviadas, no dia 5 de novembro de 2013, pelo Presidente do Conselho de Administração e pelo Presidente da Comissão Executiva do BESA, ao Presidente da República de Angola, bem como do memorando sobre a situação patrimonial do BESA àquela data que foi enviado em anexo às cartas, através das minutas dos referidos documentos, que lhe foram enviados pelo Presidente da Mesa da Assembleia-Geral do BESA, em 3 de novembro de 2013.
360. O arguido DD tinha conhecimento de que o BES não fez constar do Prospeto informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação.
361. O arguido DD tinha conhecimento de que do Prospeto consta informação que não é completa, porquanto não contém informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação.
362. O arguido DD tinha conhecimento de que a informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 1521-1582; fls. 1583-1636, maxime fls. 1594 v.; cd de fls. 2245, pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140620”, ficheiro “2. Resultados do aumento de capital do BES”, p. 17; fls. 4829-4841, maxime fls. 4830 e 4841; fls. 5852-5863 v., maxime fls. 5852 v. e 5863 v.; fls. 5864-5882 v., maxime fls. 5872 v.; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.).
363. O arguido DD não adotou, durante o período de tempo entre a decisão de realização do aumento de capital e a liquidação financeira do mesmo, qualquer medida adequada a sanar os vícios da informação constantes do Prospeto. (fls. 24-211; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, ficheiros “(305) 15 05 2014” e “(306) 20 06_01 07 2014”, ponto 2 da ordem de trabalhos; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; pen a fls. 8719)
364. O arguido DD agiu consciente e voluntariamente na prática dos factos descritos, os quais são factos próprios, em que interveio e que praticou. Com efeito, (fls. 24-211; fls. 660-662 v.; fls. 1521-1582; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, ficheiros “(305) 15 05 2014” e “(306) 20 06_01 07 2014”, ponto 2 da ordem de trabalhos e pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140620”, ficheiro “2. Resultados do aumento de capital do BES”, p. 17; fls. 2282-2729, maxime fls. 2282-2284 v. e 2314-2518 v.; fls. 3684-3710 v.; fls. 4829-4841, maxime fls. 4830 e 4841; fls. 5852-5863 v., maxime fls. 5852 v. e 5863 v.; fls. 5864-5882 v., maxime fls. 5872 v.; pen a fls. 8719; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
365. O arguido DD sabia que:
a) participou na reunião do Conselho de Administração do BES de 15 de maio de 2014, que deliberou a realização do aumento de capital do BES até ao montante de até € 1.044.571.587,80 (mil e quarenta e quatro milhões quinhentos e setenta e um mil quinhentos e oitenta e sete euros e oitenta cêntimos) mediante a emissão de até 1.607.033.212 novas ações ordinárias, escriturais e nominativas, sem valor nominal, na modalidade de novas entradas em numerário, a ser realizado em dinheiro, através da oferta pública de subscrição com direito de preferência na subscrição por parte dos acionistas, e aprovou a minuta do Prospeto; (fls. 660-662 v.; fls. 2282-2729, maxime fls. 2283-2284 v. e fls. 2314-2518 v.)
b) votou favoravelmente a deliberação de realização do aumento de capital; (fls. 2282-2729, maxime fls. 2284)
c) o BES divulgou o prospeto da Oferta do aumento de capital no SDI da CMVM no dia 20 de maio de 2014, após o fecho da sessão de negociação; (fls. 24-211 maxime fls. 24 v.)
d)     do Prospeto não consta informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação; (fls. 24-211; fls. 1521-1582, maxime fls. 1550-1569 e fls. 1574-1581; fls. 2282-2729, maxime fls. 2282-2284 v. e 2314-2518 v.)
e) do Prospeto consta informação que não é completa, porquanto não contém informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação; (fls. 24-211; fls. 1521-1582, maxime fls. 1550-1569 e fls. 1574-1581; fls. 2282-2729, maxime fls. 2282-2284 v. e 2314-2518 v.)
f) a informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma;
g) não adotou, durante o período de tempo entre a decisão de realização do aumento de capital e a liquidação financeira do mesmo, qualquer medida adequada a sanar os vícios da informação constantes do Prospeto.
366. O arguido DD quis praticar os factos supra descritos.
SUBSECÇÃO VI.2. – DA NÃO DIVULGAÇÃO DE ADENDAS AO PROSPETO
367. O arguido DD votou favoravelmente, na reunião da Comissão Executiva do BES de 12 de junho de 2014, a concessão de um financiamento à Rio Forte no montante de 135 milhões de euros. (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiros “(1526) 11 06 2014” e “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3240-3241 v.)
368. O arguido DD tinha conhecimento de que o montante total de financiamentos do BES concedidos à Rio Forte e suas subsidiárias ascendia, em 12 de junho de 2014, a pelo menos 135 milhões de euros. (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiros “(1526) 11 06 2014” e “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3687 v.)
369. O arguido DD não promoveu, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, qualquer diligência no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte. (cd de fls. 2245; fls. 2249-3135, maxime fls. 3033-3038; fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832; pen a fls. 8719)
370. O arguido DD tinha conhecimento de que o BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto. (cd de fls. 2245; fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
371. O arguido DD tinha conhecimento de que o BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou por qualquer outro meio, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital,
372. a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto. (cd de fls. 2245; fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
373. O arguido DD agiu consciente e voluntariamente na prática dos factos descritos, os quais são factos próprios, em que interveio e que praticou. Com efeito, (fls. 24-211; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140317”, ficheiro “9. B Anexo 6_Regulamento Comissão Controlo Transacções Partes Relaconadas”, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1513) 02 04 2014”, ponto 07.02.01 da ordem de trabalhos, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140402”, ficheiro “CE-20140402-07.02.01 Anexo_Contas consolidadas de 2013 da Rioforte e relatório dos auditores”, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiros “(1526) 11 06 2014” e “(1527) 12 06 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140612”, ficheiro “CE-20140612-03.03.00 Proposta de financiamento à RioForte”; fls. 2249-3135, maxime fls. 3033-3038; fls. 3240-3241 v.; fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v.; fls. 3726-3813; fls. 3814-3832; fls. 5026-5031 e fls. 5680-5684; pen a fls. 8719; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
374. O arguido DD sabia que:
a) o BES concedeu, a 12 de junho de 2014, um financiamento à Rio Forte no montante de     135 milhões de euros; (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiros “(1526) 11 06 2014” e “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3240-3241 v.)
b) o montante total de financiamentos do BES concedidos à Rio Forte e suas subsidiárias ascendia, em 12 de junho de 2014, a pelo menos 135 milhões de euros; (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiros “(1526) 11 06 2014” e “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3687 v.)
c) não promoveu, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, qualquer diligência no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte; (cd de fls. 2245; fls. 2249-3135, maxime fls. 3033-3038; fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832; pen a fls. 8719)
d)  o BES não requereu à CMVM, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a aprovação de uma adenda ao Prospeto, contendo informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto; (cd de fls. 2245; fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
e)   o BES não divulgou, através de adenda ao Prospeto ou por qualquer outro meio, desde a data da aprovação do Prospeto e até à data da admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte após a aprovação e divulgação do Prospeto. (cd de fls. 2245; fls. 3485 e fls. 3486-3515 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; fls. 3814-3832 e pen a fls. 8719)
375. O arguido DD quis praticar os factos supra descritos.
Factos provados constantes dos doutos articulados de recurso de impugnação
376. Ao mesmo tempo que o Prospeto estava a ser elaborado, decorreu uma auditoria ao negócio (business due diligence) e de natureza legal (legal due diligence) ao BES, realizada pelas instituições financeiras internacionais que tomaram firme a totalidade do aumento de capital (underwriters). (fls. 4829-4841, 4850 v., 5838-5839, 5840-5846 v., 5850, 5851, 5852-5863 v.; depoimento de PP, a fls. 3212-3220, maxime fls. 3213 [linhas 25 a 29] e 3214 [linhas 1 a 3] e fls. 9200, ficheiro DR0000_0603, minutos 24:15-25:15 e 26:24-31:24, e ficheiro DR0000_0606, minutos 18:49-19:50 e 25:50-27:19; depoimento de MMM, a fls. 9309, ficheiro DR0000_0610, minutos 12:03-15:14, NNN, a fls. 9316, ficheiro DR0000_0613, minutos 11:37-17:00 e 39:59-42:08, ficheiro DR0000_0614, minutos 35:03-37:15, ficheiro DR0000_0615, minutos 09:10-09:54 e 23:53-24:49 e OOO, a fls. 9328, ficheiro DR0000_0619, minutos 03:02-14:43 e ficheiro DR0000_0620, minutos 01:44-06:19)
377. No âmbito da auditoria de natureza legal (legal due diligence), o BES organizou um repositório físico de informação (data room) sobre o Grupo BES, para consulta das referidas instituições financeiras internacionais e das equipas de advogados que as assessoravam. (fls. 4829-4841, 4850 v., 5850, 5851, 5852-5863 v.; depoimentos de PP, a fls. 9200, ficheiro DR0000_0603, minutos 29:15-31:24, ficheiro DR0000_0605, minutos 58:13-58:44, e ficheiro DR0000_0606, minutos 25:30-25:44, MMM, a fls. 9309, ficheiro DR0000_0610, minutos 14:40-15:14, NNN, a fls. 9316, ficheiro DR0000_0613, minutos 16:59-18:54, ficheiro DR0000_0614, minutos 51:15-51:39, ficheiro DR0000_0615, minutos 09:10-09:54 e OOO, a fls. 9328, ficheiro DR0000_0619, minutos 13:20-14:05)
378. No âmbito da auditoria de natureza legal (legal due diligence), realizada entre 2 e 15 de maio de 2014, foi disponibilizada aos subscritores do contrato de tomada firme do aumento de capital do BES (underwriters) uma versão das atas das Assembleias Gerais do BESA, de 3 e 21 de outubro de 2013, em que foram omitidos os nomes dos clientes mutuários e as referências a concretas operações, para preservar o segredo bancário angolano. (fls. 1570-1571, 4829-4841, 4850 v., 5850, 5851, 5852-5863 v.; depoimento de PP, a fls. 3212-3220, maxime fls. 3217 [linhas 17 a 22] e 3219 [linhas 8, 9 e 15 a 28], e fls. 9200, ficheiro DR0000_0604, minutos 20:05-21:56 e 43:30-43:37, ficheiro DR0000_0605, minutos 58:13-58:44 e ficheiro DR0000_0606, minutos 37:28-41:33 e 51:14-51:25)
379. Em 15 de maio de 2014, foi celebrado pelo BES um contrato de underwriting, nos termos do qual os underwriters assumiram o compromisso de, com sujeição a certas condições, e com produção de efeitos a partir do último dia do período de subscrição, colocar junto de investidores institucionais ou subscrever em nome próprio as ações novas que não viessem a ser subscritas na oferta pública de subscrição. (fls. 24-211, maxime fls. 30 v., 41, 41 v., 60, 63 v., 64, 65, 65 v. e 67; fls. 5785-5831 v.)
Doutos recursos de impugnação judicial
380. O Recorrente DD designou PP, SS e TT, colaboradores do DAJ de que era administrador peloureiro, para acompanharem a operação do aumento de capital aqui em causa.
381. No quadro do descrito no ponto 377 supra, o BES contratou a firma L..., incluindo os Srs. Drs. Advogados UU e VV.
382. A K... Portugal emitiu, em 20 de Maio de 2014, uma carta de conforto relativamente ao prospeto .
383. O Asset Quality review (AQR) à carteira de crédito do BESA, promovido pelo BNA (supervisor Angolano) e pelo BCE no quadro dos preparativos de implementação do mecanismo único de supervisão e com referência a 2013, iniciou-se em 10 de Junho de 2014.
384. Em janeiro de 2014, no quadro da atividade corrente de cerificação legal das contas do BESA, a K... Angola iniciou procedimentos de auditoria, incluindo a revisão da carteira de crédito do BESA.
385. No âmbito dos procedimentos de auditoria sobre as demonstrações financeiras individuais do BESA e consolidadas do BES e com referência a 31.12.2013, a K... Angola obteve, do Ministério das Finanças, a confirmação dos termos da garantia soberana, através de carta de 1 de Abril de 2014, dirigida à K... Angola, pelo Gabinete do Senhor Ministro das Finanças.
386. Em Abril de 2014, a K... Angola considerou que a emissão da garantia soberana permitia a eliminação da reserva relativa à carteira de crédito e proveitos de juros, que vinha sendo incluída nos relatórios do Auditor Independente de 2011 e 2012.
387. Entre 15 de Maio de 2014 e até 9 de Junho de 2014, os lead underwriters responderam a centenas de questões de investidores interessados, colocadas por telefone ou em reuniões presenciais.
388. O BES remeteu, por comunicação de correio eletrónico, a «versão preliminar» do Prospeto de aumento de capital ao Banco de Portugal, em 8 de Maio de 2014 .
389. O Recorrente DD foi condenado nos autos de RCO n.º 74/19...., que correu termos no J... do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, por sentença transitada em julgado, na coima de 120 mil euros, acompanhada de sanção acessória de publicação, pelo Banco de Portugal, da punição definitiva.
Condições pessoais
390. O Recorrente DD é jurista de formação, tendo-se licenciado em Direito, pela Faculdade de Direito da Universidade ... em Junho de 1978 e sido eleito, em Abril de 2000, pela Assembleia Geral, para o Conselho de Administração do BES, cargo em que foi sucessivamente reconduzido nos anos de 2004, 2008 e 2012.
391. Por força de arresto judicial, em Agosto de 2022 o Recorrente teve penhorado, no rendimento mensal que aufere do fundo de pensões do BES, o montante de €4.785.
392. O rating nacional e internacionalmente concedido à ESFG, em 31.12.2013, era de nível “bbb-”.
393. O BES fazia parte do Grupo financeiro encabeçado pela ESFG, beneficiando a exposição a esta entidade de uma isenção aos limites dos grandes riscos, para efeitos prudenciais e de reporte ao Banco de Portugal.
394. Durante o processo de due diligence, os bancos envolvidos foram colocando diversas questões, que foram sendo respondidas por vários colaboradores e administradores do BES, tendo o arguido BB e o Sr. Dr. NN feito uma exposição sobre o risco da atividade do BES a pedido da equipa responsável pelo aumento de capital e pela elaboração do Prospeto, em especial sobre o risco da carteira de crédito do Banco.
395. No momento histórico em que o BES, na altura, se encontrava, o risco associado ao papel comercial da ESI – sobretudo, tendo em conta as medidas que tiveram de ser adotadas pelo Banco para proteção dos clientes de retalho por imposição do BdP – interessava aos investidores.
396. BB esteve presente numa segunda sessão de esclarecimento de questões adicionais, essencialmente relacionadas com a qualidade da carteira de crédito do BES e sobre a exposição de clientes do Banco ao papel comercial da ESI, nunca lhe tendo sido colocadas questões sobre a ESFG, a Rio Forte ou sobre a exposição do BES às referidas entidades.
397. As linhas de mercado monetário, pela facilidade que existe no saque e no reembolso dos montantes utilizados (desde que incluídos no valor global do montante aprovado para a linha em causa), são um instrumento de concessão de crédito mais volátil, no sentido em que estão (ou podem estar) sujeitas a grandes variações ao nível do capital utilizado.
398. Na reunião da CCTPR de 9 de maio de 201, foi comunicado que o valor médio de exposição do BES à ESFG desde dezembro de 2013, era de 400 milhões.
399. A CCTPR ratificou, a 30 de maio de 2014, a concessão de três financiamentos colateralizados à ESFG e respetivas subsidiárias, no valor de EUR 70 milhões (concedido a 6 de maio de 2014), EUR 80 milhões (concedido a 29 de maio de 2014) e de EUR 44 milhões (concedido a 29 de maio de 2014)
RIO FORTE
400. O financiamento de EUR 135 milhões concedido pelo BES à Rio Forte estava integralmente colateralizado, através de um mandato de venda irrevogável das ações da ES Saúde e de um penhor sobre 2,5% das ações do BES.
401. A concessão do financiamento de EUR 135 milhões à Rio Forte foi previamente debatida com o Banco de Portugal, tendo as suas condições – uma das quais foi a exigência de colateralização integral do financiamento – obtido a anuência do supervisor bancário, tendo, posteriormente, sido aprovada por todos os administradores executivos do BES que marcaram presença nas reuniões da Comissão Executiva de 11 e 12 de junho de 2014.
402. O Recorrente BB é gestor, encontrando-se profissionalmente ocupado, exercendo funções remuneradas de gestão de um fundo de ativos turísticos.
403. Exerceu funções remuneradas no BES desde 1995, assumindo funções de director de marketing, antes de ali exercer funções como Administrador.
404. No dia 7 de Junho de 2014, o título da primeira página do ..., foi o seguinte:
«BES ANGOLA PERDEU O RASTO A 5,7 MIL MILHÕES»
405. Seguido dos seguintes subtítulos:
Ø   Banco desconhece beneficiários de 80% da carteira de crédito
Ø   Ex-CEO MM foi incapaz de esclarecer a situação
Ø   Levantamentos em numerário superiores a 500 milhões de dólares
406. Nas páginas 6 e 7 do ..., com o título SAQUE AO BESA, podia ler-se:
«BES Angola. O banco não sabe a quem emprestou 5,7 mil milhões de dólares. Administração atual acredita que 745 milhões foram parar às mãos de MM, presidente do banco até 2012.»
407. A operação de aumento de capital foi noticiada como um êxito, com «procura a superar 178% a oferta».
408. À data dos factos aqui em causa, a Rio Forte era uma empresa com capital próprio robusto, com as contas aprovadas e auditadas pela E....
409. O ETRICC 2 levado a cabo pela PW... detetou problemas na ESI, mas não na RIO FORTE.
410. Durante o período de oferta do Prospeto foram publicadas as notícias com títulos como “BES admite erros graves”; “Os grandes problemas do BES”; “Holding do GES com irregularidades”; “Aumento de capital obriga BES a expor fragilidades do grupo”; “Uma dúzia de coisas sobre o GES que talvez preferisse não saber”.
411. O Recorrente AA foi condenado, por decisão transitada em julgado nos autos de RCO n.º 182/16...., que correu termos no J... do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, na coima única de € 350.000 (trezentos e cinquenta mil euros).
412. O Recorrente AA encontra-se a proceder ao pagamento voluntário e fracionado quer das custas, quer da coima em que foi condenado.
413. O Recorrente AA foi condenado, com trânsito em julgado, nos autos de recurso de contraordenação n.º 178/20.... (condenado em coima de € 180.000,00), n.º 249/17.... (condenado em coima de € 100.00,00), que correram termos neste Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, encontrando-se a proceder ao pagamento faseado daquelas coimas.
414. O Recorrente AA foi condenado, com sentença transitada em julgado, nos autos de RCO n.º 74/19.... e 280/20...., na coima única de 3,5 milhões de euros.
Recorrente CC
415. Em Abril de 2014, foram escolhidos os 16 bancos que passariam a constituir o chamado sindicato bancário, encarregado da colocação e subscrição do aumento de capital e que celebraram um chamado contrato de subscrição (Underwriting), sujeito à lei inglesa, nos termos do qual os subscritores (Underwriters) assumiram o compromisso de, em certas condições e com produção de efeitos a partir do último dia do período de subscrição, colocar junto de investidores institucionais (contrato de colocação) ou subscrever em nome próprio as novas ações que não viessem a ser adquiridas na Oferta Pública de Subscrição.
416. Ainda em Abril de 2014, estes bancos foram chamados a participar numa auditoria ao negócio (business due diligence), e numa auditoria legal (legal due diligence), de acordo com a lei portuguesa e com a lei inglesa, esta última aplicável em virtude do contrato de subscrição (Underwriting).
417. Em 10 de Abril de 2014, foi enviado ao BES, pelos bancos que integravam o sindicato bancário, um primeiro questionário destinado a preparar a auditoria ao negócio (business due diligence) designado «Shortlist of Key Due Diligence Questions», (lista restrita das questões chaves para a auditoria), bem como o questionário que visava organizar uma auditoria presencial, intitulado «Due diligence questionnaire» (questionário de auditoria).
418. Em 24 de Abril de 2014, verificou-se uma auditoria ao negócio (business due diligence) que consistiu numa reunião presencial, na sede do BES, entre os vários serviços e departamentos deste, os representantes dos bancos subscritores que constituíam o sindicato bancário e os respectivos advogados.
419. Os quadros dos Departamentos do BES, DRG, DPC, GRI, o DFME, DDI, DME e o ESR efetuaram apresentações verbais perante os representantes dos bancos subscritores (Underwriters), destinadas a responder a perguntas por estes formuladas e a prestar as informações consideradas necessárias ao esclarecimento dos possíveis investidores acerca da situação patrimonial, financeira e técnica do BES.
420. Para além desta sessão de apresentações, os vários serviços e departamentos do BES foram esclarecendo, em paralelo, todas as questões adicionais suscitadas ao longo deste período pelos bancos subscritores (Underwriters) em sessões de conferências telefónicas («Due Diligence Conference Call») a que assistiam igualmente os advogados e que ocorreram em 12, 15, 16 e 20 de Maio de 2014.
421. Entre 2 e 15 de Maio de 2014, o DAJ do BES e a L... organizaram uma due diligence, com a disponibilização física de um conjunto de documentos sobre o BES (data room), para que os bancos participantes no contrato de underwritting ou tomada firme pudessem consultar e analisar, o que, efectivamente, ocorreu.
422. Entre 2 e 15 de Maio de 2014, os bancos subscritores (Underwriters), através dos respectivos advogados, visitaram o «data room» e colocaram as questões que entenderam, designadamente as que consideraram suscetíveis de ser formuladas pelos potenciais investidores ou essenciais para esclarecer estes.
423. Em 14 de Maio de 2014, na reunião da Comissão Executiva do BES, o ora Recorrente e os demais administradores executivos do BES foram informados que, em face da due diligence que terminaria no dia seguinte, os bancos subscritores (Underwriters) estavam já prontos para assinar o contrato de underwritting ou tomada firme (cfr. página 2 da apresentação anexa à acta da CE do BES, de 14 de Maio de 2014, gravada no suporte digital de fls. 2.245, pasta “CE”, “Anexos”, “CE 20140514”, ficheiro “CE-20140514-01.02.00 Aumento de Capital do BES”).
424. Entre Abril e maio de 2014, o BES remeteu à Recorrida informação recolhida pelos departamentos operacionais do BES (DFME, DRG, DAJ e DPC) e diversas versões da minuta do prospeto de aumento de capital, comentados pela CMVM e pela L... através de conference calls.
425. O BES remeteu à CMVM, por correio eletrónico, o calendário do road show junto dos investidores internacionais .
426. O Recorrente CC não participou nas sobreditas interações regulares que ocorreram entre os técnicos dos departamentos do BES e os técnicos da CMVM.
427. O Recorrente CC apenas integrou o road show do aumento de capital do BES em 2014, numa reunião ocorrida em Londres
428. Nos termos do comunicado público, emitido pelo BES em 30 de Junho de 2014, o Recorrente CC subscreveu 3.806.915 ações do BES, aquando do aumento de capital do BES, pelo que passou a ser titular de 5.329.681 do BES .
429. Através da carta circular ..., de 30 de Dezembro de 2013, o Banco de Portugal manteve a equivalência da regulamentação e supervisão exercida pelo Banco Nacional de Angola.
430. Em Janeiro de 2014, o BESA apresentou ao Banco Nacional de Angola um ponto de situação do seu plano estratégico até 2017.
431. Em entrevista publicada, no ..., em 22 de Maio de 2014, o Recorrente CC assinalou os erros cometidos pela anterior gestão, nomeadamente por MM.
432. Em 7 de Fevereiro de 2014, LLL, Presidente da comissão Executiva do BESA, remeteu a RR, a quem se dirigiu na qualidade de «Exmo. Senhor Professor» carta com o seguinte teor:
«Assunto: Garantia do Estado Angolano
Exmo. Senhor,
Para os devidos efeitos, confirmamos que os créditos constantes do Anexo 1 à Garantia supra- referenciada, objeto da mesma garantia, se encontram regularmente escrituradas nas contas do BESA, podendo nós assegurar a sua existência e exigibilidade, bem como garantias que lhe estão associadas.
Com os melhores cumprimentos
LLL
Presidente da Comissão Executiva .»
433. Em 30 de Maio de 2014, a K... reuniu com o Banco de Portugal e em representação da K..., XX informou que «do seu conhecimento não existem questões relevantes sobre o BESA. Afirmou ainda que a opinião da K... local ainda não tinha sido emitida e no âmbito da revisão da carteira de crédito desta filial, não tinham sido encontradas deficiências relevantes, sobretudo tendo em consideração a existência da garantia soberana do Estado Angolano.
Sobre a garantia do Estado Angolano, o Dr. PPP questionou os representantes da K... sobre a amplitude da perda, caso esta garantia não existisse, ou a magnitude dos benefícios associados à garantia, tendo os representantes da K... respondido que não dispunham desta informação.
Ainda assim, foi solicitada pelo Dr. QQQ uma justificação para o montante de 50M € de imparidades extraordinárias que o BESA realizou durante o primeiro trimestre de 2014, tendo também sido solicitada informação sobre as carteiras de crédito às quais estavam afetas estas imparidades.
Em resposta, os representantes da K... afirmaram que não dispunham desses elementos, tendo ficado de obter a informação necessária ».
434. Em 16 de Junho de 2014, RRR, coordenadora do Departamento de Supervisão Prudencial do Banco de Portugal, em resposta a comunicação de correio eletrónico de SSS, com o título «Ratings Angola» :
«Cara dra. SSS
De Acordo com o nosso entendimento do Manual: a utilização de garantias de terceiros pode ser tida em conta, mas sua validade/enforcibilitty tem de ser analisada.
Existem casos em que o credit rating do emitente justifica por si só a aceitação da garantia (o emitente tem credit quality superior a 3)
É nosso entendimento que a garantia do Estado Angolano, de acordo com pareceres jurídicos enviados ao Banco de Portugal, deve ser considerada para efeitos de avaliação de imparidade dos devedores selecionados. Os referidos pareceres ser-lhe-ão disponibilizados».
435. Em 1 de Julho de 2014, o Banco Nacional de Angola enviou ao Banco de Portugal na pessoa do Diretor de Supervisão, os resultados preliminares do AQR, levada a cabo ao BESA pela E....
436. No âmbito do processo de liquidação do BES, os créditos reclamados pelo Banco de Desarollo Economico y Social Venezuela e pelo Fondo de Desarollo Nacional Fondem foram incluídos na lista de créditos não reconhecidos pela Comissão Liquidatária do BES , com os seguintes fundamentos:
“não pode ser dada como certa pela Comissão liquidatária a existência de um crédito por parte da Reclamante, sem que essa pretensão seja, caso os interessados assim o entendam, submetida ao crivo da produção e apreciação da prova judicial, com o contraditório dos demais credores, e decidida em última instância pelo tribunal, de acordo com as normas que regulam a verificação de créditos no processo de insolvência”.
437. Em 14 de Julho de 21, o médico neurologista TTT, em exercício de funções no serviço de Radiologia do Centro Clínico ..., declarou como segue, relativamente ao Recorrente CC:
«Tendo em conta a presença de alterações compatíveis com a doença degenerativa SNC, contactei o Professor Doutor UUU, experiente neste tipo de doenças e director Clínico do Campus Neurológico Sénior, centro que participou num ensaio clínico com aducanumab, medicamento que pode controlar a formação de placas de beta amiloide no cérebro, a quem pedi a avaliação do doente e que concordou recebê-lo em consulta».
438. Em 12 de Julho de 21, o Professor Doutor UUU, em exercício de funções no ..., na sequência de consulta em 22 de Junho de 2021, declarou como segue, relativamente ao Recorrente CC:
«Embora estejam a decorrer os exames que permitirão complementar a investigação já realizada, posso desde já atestar que o Dr. CC apresenta queixas compatíveis com um declínio cognitivo progressivo iniciado há 3-4 anos. Este quadro de declínio cognitivo tem evoluído com uma dificuldade crescente para a realização de tarefas cognitivas e perda progressiva de autonomia.
Após a conclusão dos exames complementares em curso será possível caracterizar com maior precisão a gravidade do defeito cognitivo apresentado e ser mais conclusivo no diagnóstico etiológico mais provável. (…)
Com a prudência de ainda aguardar elementos de avaliação clínica e exames adicionais em curso, posso partilhar que toda a investigação já realizada e em planeamento tem por objectivo investigar um quadro clínico de síndrome demencial, nomeadamente uma Doença de Alzheimer.
439. Em 12 de Outubro de 2021, o Médico acima identificado, declarou como segue, relativamente ao Recorrente CC:
«Após toda a investigação realizada, podemos concluir pelo diagnóstico de Doença de Alzheimer. (…)
O Quadro clínico de defeito cognitivo que apresenta atualmente, nomeadamente o efeito de memória, limita a sua capacidade para prestar declarações em pleno uso das suas faculdades cognitivas. Mais se acrescenta que, num contexto de stress emocional ou ansiedade é expectável um agravamento do defeito cognitivo apresentado.»
440. Com reporte a rendimento de trabalho auferido pelo exercício de funções no BES, o Recorrente CC auferiu, no mês de Abril de 2021, o valor bruto de € 78.516,18,
441. Foram arrestados diversos bens ao Recorrente CC, correspondentes a recheio de habitação, que alega pertencerem em exclusivo à mulher, VVV, com quem é casado em regime de separação de bens.
442. O Recorrente CC foi condenado, por decisão transitada em julgado em 6 de novembro de 2020, nos autos de RCO n.º 182/16...., que correu termos no J... deste TCRS, na coima única de 3,7 milhões de euros.
443. O Recorrente CC não procedeu ao pagamento voluntário da coima, nem peticionou ao Tribunal o seu pagamento fracionado.
444. O Recorrente CC foi condenado, por decisão transitada em julgado em 15.01.2021, nos autos n.º 164/19...., que correu termos neste TCRS, na coima de €75.000 (setenta e cinco mil euros), coima a cujo pagamento voluntário não procedeu.
445. O Recorrente CC foi condenado, por decisão transitada em julgado em 15.01.2021, nos autos n.º 249/17...., que correu termos neste TCRS, na coima de €290.000 (duzentos e noventa mil euros), coima a cujo pagamento voluntário não procedeu.
446. O Recorrente CC foi condenado, por decisão transitada em julgado em 22, nos autos de RCO n.º 74/19.... e 280/20...., na coima única de 4 milhões de euros, a cujo pagamento voluntário não procedeu.
447. O Recorrente CC tem arrestado património nos autos de processo crime n.º 324/14.... e n.º 207/11...., cujo valor não indicou, onde prestou cauções no valor total de 3 milhões de euros.
448. O Recorrente EE era reconhecido pelas suas valências na angariação e manutenção de clientes (private) e em matéria de representação externa do Banco.
449. Quer o Banco, quer o Grupo, tinham uma liderança marcada e forte, concentrada na figura de CC, líder incontestado há mais de 20 (vinte) anos, e principal responsável pela sua gestão estratégica, financeira e de risco, em quem o Recorrente depositava especial confiança.
450. O Recorrente EE investiu no aumento de capital em causa, mais tendo aconselhado familiares seus a fazê-lo, maxime uma das suas filhas.
451. O Recorrente, por carácter, hábito e formação, sempre delegou bastante, confiando quer nos colegas, quer nas estruturas e serviços.
452. O Recorrente assinou estas cartas porque tal lhe foi solicitado pelo Arguido CC, que já as assinara de antemão, o que não estranhou pela confiança que depositava no bom critério de decisão do líder incontestado do BES.
453. Por douta sentença, proferida pelo Juízo Local Cível ... (J...), do Tribunal da Comarca ..., transitada em julgado em 1 de Junho de 2021, foi julgada procedente a ação especial de acompanhamento do Recorrente EE, fundada na verificação de que sofre de patologia (adveniente de acidente vascular cerebral e importantes défices cognitivos motores) que o impede de reger a sua pessoa e bens, fixando-se em 23 de Outubro de 2019, o começo da incapacidade de exercício do Requerido.
454. Em 16 de Dezembro de 2014, no âmbito da audição realizada na comissão de inquérito, que ocorreu na Assembleia da República, o Recorrente EE pediu desculpa pela queda do BES e do GES a colaboradores e investidores.
455. O Recorrente EE tem património mobiliário e imobiliário, bem como a sua pensão de reforma (excetuado o valor correspondente a três salários mínimos nacionais), arrestados à ordem do processo-crime n.º 324/14...., e o valor remanescente é afeto, quase na totalidade, às despesas a que a actual condição de saúde do Recorrente obrigam.
456. Ao Recorrente EE, no mês de Julho de 2022, foi penhorado, no quadro de arresto judicialmente decretado, o montante de € 24.335, 70, do rendimento de pensão que aufere do Novo Banco.
457. O Recorrente EE foi condenado, com trânsito em julgado, na sanção de admoestação, nos autos de RCO n.º 74/19.... que correu termos neste TCRS.

Factos não provados:

Com interesse para os autos, não se provou que:
A. A informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma (ponto 158 da decisão recorrida)
B. O arguido AA tinha conhecimento de que a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma (al. l) ponto 250 decisão recorrida).
C. O arguido BB tinha conhecimento de que a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma (ponto 275 da decisão recorrida).
D. O arguido EE tinha conhecimento de que a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma (ponto 309 da decisão recorrida).
E. O arguido CC tinha conhecimento de que a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma (ponto 349 da decisão recorrida e al. q) do 351).
F. O arguido DD tinha conhecimento de que a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma (ponto 352 e al. f) do 374 decisão recorrida).
G. O Recorrente AA e o DFME não intervieram na elaboração do Prospeto, nem na determinação do seu conteúdo, nem quanto ao que devia constar, nem quanto ao que poderia faltar.
H. A função de determinação do conteúdo do prospeto foi acometida a especialistas na matéria internos do DAJ e externos da L....
I. O DFME apenas serviu de interface entre outros departamentos do BES e o DAJ/L... quanto ao envio de informação.
J. Os investidores e o mercado em geral tiveram conhecimento, em 30 de maio de 2014, em pleno período da Oferta, de que a exposição do BES à ESFG e subsidiária tivesse crescido para € 409,204 milhões.
K. O prospeto só tinha que informar sobre alterações significativas na posição financeira ou comercial do grupo BES não refletidas no relatório e contas consolidado e individual do 1.º trimestre de 2014 (publicado pelo BES em 30.5.2014).
L. O Prospeto só tinha que refletir alterações significativas em relação à posição financeira ou comercial do grupo [BES] que não constassem da última informação financeira divulgada.
M. O aumento do valor dos financiamentos concedidos à ESFG e suas subsidiárias, de cerca de €409 milhões (da última informação financeira divulgada), para cerca de €533 milhões (montante alegadamente existente na data de publicação do Prospeto), não corresponde a uma alteração significativa em relação à posição financeira ou comercial do grupo [BES].
N. Como o BES detinha uma carteira de crédito superior a 51.000. 000.000 de euros, então, dentro da sua atividade, não se pode considerar relevante um aumento ou diminuição de algumas centenas de milhões de euros de crédito concedido, também porque o crédito fora concedido a uma entidade considerada solvente e sem quaisquer incidentes de crédito.
O. Por ser informação falsa, o Prospeto não continha a informação de que o BESA, no final do ano de 2013, era titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero.
P. Como qualquer outro Banco com dimensão a ele comparável, o BES tinha uma significativa carteira de crédito com um valor de realização próximo de zero, não fossem as garantias prestadas, aquando da concessão dos créditos ou posteriormente.
Q. Nunca, alguma vez, a CMVM exigiu aos bancos cotados em bolsa, que tenham feito aumentos de capital com subscrição pública (o BCP, por exemplo) que informassem nos respetivos Prospetos sobre o valor dos seus créditos com valor de realização próximo de zero, não fossem as garantias prestadas.
R. Por considerar que a informação era irrelevante para a decisão dos investidores e perante a notícia do ... de 7 de junho de 2014, a CMVM não suspendeu a oferta nem determinou ao BES qualquer adenda.
S. O prospeto informava claramente sobre o risco de crédito malparado no montante de USD 5,7 mil milhões do BESA e que o mesmo foi coberto por uma garantia soberana do estado angola, sendo esta última a informação relevante para a tomada de decisão dos investidores.
T. Competia ao DAJ a verificação da informação que legalmente devesse constar do prospeto.
U. O Diretor do DAJ, PP, informou o arguido AA que toda a informação relevante para o BESA constava do data room.
V. A CMVM atestou que a informação constante do Prospeto era a informação relevante.
W. O Banco de Portugal conheceu o prospeto antes dele ser aprovado e não deu conta de qualquer informação incorreta ou omissa.
X. O DAJ, nas pessoas (nas pessoas dos seus diretores Dr. SS e Dr. PP), em estrita articulação com os especialistas da L..., determinava o detalhe da informação disponibilizada no Data Room, competindo-lhe assegurar a legalidade da prestação de informação tendo em conta os deveres legais de confidencialidade de informação bancária, decorrentes quer da lei nacional quer  das leis dos países em que o Grupo BES detinha filiais ou sucursais, como era o caso de Angola.
Y. O Recorrente AA teve sempre a convicção de que a informação constante do prospeto era verdadeira e completa, dada a extensão, senioridade e competências das equipas que o elaboraram e o rigor e profundidade da due diligence.
Z. O Recorrente AA não tinha por função verificar se estavam a ser efetuadas as alterações ou as adendas ao prospeto, legal e regularmente requeridas.
AA. Por força da divisão de tarefas entre Administradores, conferindo-lhes pelouros de que se encarregam, o Recorrente EE não tinha conhecimento de que a informação constante no prospeto não era atual ou completa e que havia sido omitida, posteriormente, à sua aprovação e divulgação, a divulgação por meio de adenda, de informação necessária para a formulação de juízos fundados sobre a Oferta.
BB. Ao Recorrente EE não cabia, no BES, na ESFG ou na ESI, a gestão de assuntos financeiros, de contabilidade, tesouraria, estratégia de investimento, política de crédito/financiamento, jurídicos, de compliance, risco, marketing, informação ao mercado, auditoria ou inspecção e afins.
CC. O Recorrente não teve envolvimento no processo de preparação do aumento de capital e o prospeto foi elaborado por profissionais independentes nas áreas jurídicas, contabilística e financeira.
DD. O Recorrente EE não interveio nos atos e omissões censurados na decisão recorrida, nem deles teve conhecimento.
EE. Não cabia ao Recorrente EE avaliar a necessidade de divulgação de informação posterior à sua aprovação ou divulgação e/ou à sua relevância na tomada de decisões de potenciais investidores, pois nem sequer sabia fazê-lo com o rigor e detalhe necessários.
FF. O Recorrente EE agiu de boa fé, na medida em que as informações que lhe eram disponibilizadas no âmbito das deliberações em que participou sobre o aumento de capital, não eram por si recolhidas.
GG. O Recorrente EE reputava a informação como completa e atual e não tinha motivo para duvidar, dadas as suas funções e competências.
HH. O recorrente EE confiou, como podia ter confiado, que os deveres de divulgação de informação com qualidade no prospeto eram da responsabilidade de outros e estavam a ser por terceiros integralmente cumpridos. 
II. Atendendo ao complexo modelo organizativo que caracterizava o BES, era legítimo ao Recorrente EE, confiar que o processo de preparação da operação de aumento de capital (e correspondente prospeto) tinha sido levado a cabo dentro da legalidade e que a informação nele vertida, em cada momento, era atual e verdadeira.
JJ. O Recorrente EE não teve intervenção no processo que culminou no aumento de capital do BES realizado em maio de 2014 e no correspondente prospeto.
KK. Tanto quanto era do exigível conhecimento do Recorrente EE, a informação vertida no prospeto era atual e completa, não lhe competindo o dever de conferir, analisar e comparar toda a informação dele constante, sob pena de inutilização da estrutura de divisões implementada.
LL. O projecto continha todas as advertências e declarações relevantes para qualquer investidor.
MM. O Recorrente EE não tinha conhecimento dos financiamentos concedidos pelo BES ao grupo ESFG, seja no âmbito do BES, seja na qualidade de Vice-Presidente do Conselho de Administração da ESFG.
NN.    O Recorrente EE não tinha, relativamente à exposição à ESFG, conhecimento de que a informação no prospeto não era atual ou completa e por isso não podia ter adoptado qualquer medida adequada a sanar vícios de informação que desconhecia.
OO. A informação constante do prospeto a este respeito era a mais atual possível.
PP. A exposição à ESFG era materialmente despicienda, em face do concreto montante total de tais financiamentos, à data da aprovação do prospeto.
QQ. A CMVM também concluiu, ao aprovar o prospeto, que a informação sobredita era irrelevante.
RR. O Recorrente EE não era responsável pela divulgação de informação adicional ao prospeto, nem pela avaliação da sua eventual necessidade de divulgação (para o que nem sequer possuíra os necessários e sofisticados conhecimentos técnicos).
SS. O Recorrente EE não teve conhecimento de omissão na divulgação de informação sobre a exposição do BES ao grupo ESFG e, por isso, não podia ter promovido diligência para suprir essa omissão.
TT. A informação relativa às cartas emitidas pelo BES em 9 de Junho de 2014, não era passível de influir, muito menos de forma significativa, na situação patrimonial, económica e financeira do BES, não sendo, por isso, informação necessária à formação de juízos fundados sobre a oferta.
UU. Em consequência, o Recorrente EE não podia ter promovido qualquer diligência no sentido da sua divulgação ao mercado.
VV. As aludidas cartas não são uma forma de compromisso ou garantia de reembolso assumida pelo BES, dando, apenas e só, conta da intenção de reestruturação do GES, restruturação essa que asseguraria o reembolso dos referidos investimentos.
WW.   A declaração manifestada nas cartas estava dependente de uma condição: a RIOFORTE devia emitir títulos de dívida que substituíssem os títulos de divida da ESI, que haviam sido subscritos pela FONDEN e BANDES (condição que nunca se verificou).
XX. Nunca foram levantadas quaisquer questões a respeito da solidez financeira da acionista maioritária do BES, a ESFG, entidade sujeita a supervisão BdP e que consolidava as contas do Grupo BES, estando a referida entidade as suas participadas diretas e indiretas sujeitas a um escrutínio apertado do regulador bancário.
YY. A exposição do BES à ESFG era irrelevante para efeitos de avaliação dos riscos do Banco, por a ESFG não ser uma parte relacionada distante (ao contrário do que se poderia dizer quanto a outras sociedades do GES) não podendo ser considerada uma contraparte normal, uma vez que estava sujeita a apertado escrutínio pelo BdP.
ZZ. A definição genérica adotada pela CMVM quanto às relações com partes relacionadas não é aplicável in casu, porquanto: não estava em causa um conjunto alargado e complexo de relações e estruturas societárias; os financiamentos à ESFG foram concedidos em condições de mercado; e dada a natureza das obrigações e o facto de as entidades em causa estarem sujeitas a supervisão do BdP, não se verificava qualquer risco de inadequado relato financeiro.
AAA. A ESFG e respetivas subsidiárias não eram fonte de qualquer preocupação para o BES, para o regulador bancário ou para a CMVM durante o processo de aprovação do Prospeto.
BBB. Para além da presença em duas reuniões, o arguido BB não teve qualquer papel na preparação do aumento de capital, nem contribuiu, direta ou indiretamente, para a elaboração do Prospeto.
CCC.   A CMVM nunca colocou quaisquer questões ao BES sobre a existência de informação financeira posterior à incluída no Prospeto, nem deu qualquer indicação ao Banco quanto à necessidade de inclusão de informação financeira posterior a 31 de dezembro de 2013 (nomeadamente, de informação financeira reportada ao final do primeiro trimestre de 2014) no Prospeto, designadamente, para efeitos de informação sobre os níveis de exposição a partes relacionadas, em especial à ESFG e à Rio Forte.
DDD. O risco de exposição a partes relacionadas estava claramente identificado no Prospeto nos exatos termos em que tinha de o estar e permitia a todos os investidores tomarem conhecimento da existência de exposição a tais entidades, uma vez que o Prospeto incluía um capítulo sobre transações com partes relacionadas, com indicação dos níveis de exposição a tais entidades por referência a 31 de dezembro de 2011, 31 de dezembro de 2012 e 31 de dezembro de 2013 (contas auditadas dos três exercícios económicos anteriores ao do lançamento da oferta), demonstrativas da variação natural da exposição do BES às entidades relacionadas – onde se incluíam a ESFG e respetivas subsidiárias.
EEE.    As linhas de mercado monetário não eram acompanhadas por BB, pelo que o arguido não sabia, a cada momento, qual era o valor da exposição do BES à ESFG e respetivas subsidiárias.
FFF. O valor da exposição do BES à ESFG não referida no Prospeto ascenderia a EUR 313 milhões e a perda máxima que o BES sofreria seria de apenas EUR 273 milhares, valor de diminuta expressão, tendo em conta o valor dos capitais próprios do Banco.
GGG. À luz da sua intervenção – limitada a um momento muito embrionário do aumento de capital – e do facto de a equipa responsável pelo aumento de capital e pela elaboração do Prospeto não integrar membros dos departamentos sob a sua responsabilidade, o Recorrente BB não tinha qualquer motivo para crer que a informação constante do Prospeto não cumpria os requisitos do artigo 135.º do CVM por referência à exposição do BES à ESFG e respetivas subsidiárias aquando da aprovação do Prospeto.
HHH. O Recorrente BB tinha razões fundadas e legítimas para confiar nos departamentos e diretores do BES que lidaram, diretamente, quer com a preparação e elaboração do Prospeto, quer com os financiamentos que ocorreram durante a pendência do aumento de capital, tanto no que diz respeito às entidades da ESFG, não tendo tido conhecimento de factos suscetíveis de infirmar o teor do Prospeto ou de omissões capazes de alterar o respetivo alcance.
III. A aprovação do Prospeto pela CMVM materializou-se num ato administrativo com efeito legalizador do seu conteúdo (e omissões).
JJJ. O aumento de exposição verificado entre 31 de dezembro de 2013 e 20 de maio de 2014 não se revestia claramente de materialidade, tendo os investidores todos os elementos ao seu dispor para formar um juízo fundado sobre o aumento de capital do BES.
KKK.   A concessão de financiamento colateralizado à ESFG, a 29 de maio de 2014, não constitui um facto relevante para a tomada de decisão pelos investidores destinatários da oferta.
LLL. O Prospeto e a informação dele constante não era do conhecimento do Recorrente BB, que não tinha obrigação de a conhecer, por não ser o administrador a quem reportavam os membros da equipa responsável pela estruturação do aumento de capital e pela elaboração do Prospeto.
MMM.   O risco associado ao papel comercial da ESI era o único que interessava aos investidores.
NNN. O aumento de exposição a partes relacionadas era algo normal no contexto da actividade do Banco, não se justificando a promoção da aprovação de adendas ao prospeto.
OOO.  O risco associado aos financiamentos concedidos à ESFG e respetivas subsidiárias era praticamente nulo, tendo em conta o rating atribuído e o facto de os financiamentos estarem integralmente colateralizados.
PPP. Competia ao DFME o dever de controlo sobre a operação de aumento de capital e sobre a elaboração do prospeto.
QQQ. O Recorrente DD esteve afastado da preparação do Prospeto de aumento de capital, por estar focado noutras matérias prementes do BES.
RRR. O Recorrente DD não teve conhecimento de factos suscetíveis de infirmar o teor do Prospeto ou de omissões capazes de alterar o respetivo alcance e de modificar a decisão de investir dos destinatários, tendo sempre acreditado na conformidade do conteúdo do Prospeto com os requisitos legais por ser conhecida a competência dos técnicos escolhidos (em particular, a L... PORTUGAL) para se incumbirem da tarefa de elaboração do documento.
SSS. Com reporte ao objeto destes autos, a L... teve acesso a toda a informação relevante para o prospeto.
TTT. Decorre do e-mail de 3 de novembro de 2013 do Dr. PP que, à data dos factos e face aos dados conhecidos, não se poderia sequer concluir que se encontraria confirmada uma situação de fraude no BESA.
UUU.  Não decorria das minutas das atas das reuniões de 3 e 21 de outubro de 2013 da Assembleia Geral do BESA, anexadas ao e-mail do Dr. PP, datado de 3 de novembro de 2013, uma situação de fraude, que apenas podia ser confirmada mediante investigação, mas sim de falta de informação sobre a carteira de créditos do BESA.
VVV.   Para o que releva nestes autos, o Recorrente DD verificou que a garantia soberana emitida pela República de Angola a favor do BESA imunizava o BES de quaisquer potenciais consequências que pudessem advir da carteira de créditos e imobiliário do BESA.
WWW.  Com interesse para estes autos e para a omissão em causa, entre Maio e Junho de 2014, o Recorrente DD não dispunha de informação concreta e detalhada sobre a situação real da carteira de crédito do BESA, apurada em Outubro de 2013.
XXX.   Com interesse para estes autos e para a omissão em causa, em 2014, realizavam-se diversas auditorias à carteira de crédito do BESA para apurar a real situação.
YYY.   Os bancos subscritores da Oferta tiveram acesso à garantia soberana de Angola.
ZZZ. O aumento de capital do BES em causa ocorreu em decorrência de uma determinação do Banco de Portugal
AAAA. As desconformidades do prospeto não tinham qualquer materialidade ao ponto de não permitir a formulação de juízos fundados sobre a oferta das ações objecto do aumento de capital.
BBBB. O aumento da exposição verificada não suscitava – à data – qualquer impacto no juízo fundado de subscrever ações do BES, no aumento de capital, pois o relatório do ETRICC 2 atestara a viabilidade económica do BES.
CCCC.   Em 25 de Março de 2014, o Banco de Portugal remeteu uma carta ao Presidente do Conselho de Administração do BES (então, o Dr. YY), na qual determinou a realização do aumento de capital, em montante superior a € 750 milhões.
DDDD. Eximindo-o do dever legal que sobre si impendia, o Recorrente CC confiou, de modo justificado, nas equipas de operacionais do BES que executaram a tarefa de redação do prospeto.
EEEE. Os departamentos do BES, que executaram a tarefa de processar e incluir informação relevante no prospeto, atuaram com autonomia (por modo próprio) e sem pré-determinação dos Recorrentes, enquanto Administradores que, em sede de Conselho de Administração do BES, aprovaram o aumento de capital.
FFFF.  Os quadros do BES do DPC é que tomaram, de modo próprio, sem pré-determinação dos Recorrentes e de modo autónomo face à deliberação, do Conselho de Administração, de determinar o aumento de capital do BES, a decisão sobre a informação a constar do Prospeto, quanto à exposição do BES à ESFG.
GGGG. Para o que ora releva, toda a informação foi disponibilizada aos investidores institucionais, que integraram o sindicato bancário de tomada firme e estes não apresentaram objeções e assumiram o compromisso de tomada firme do aumento de capital.
HHHH. Para o que ora releva, o Recorrente CC tinha a percepção e consciência que, na preparação do prospeto, os quadros do BES e BESI e ainda os respectivos assessores (v.g. os Advogados do Escritório L...) tinham acedido e organizado toda esta informação, tendo instruções para transpor a sua essência para o prospeto.
IIII. A variação na exposição do BES à ESFG e subsidiárias não era material e não era susceptível de interferir ou impedir a formação de juízos fundados dos investidores quanto à subscrição das novas ações do BES, para efeitos de análise da situação patrimonial, económica e financeira do BES.
JJJJ. Eximindo-o do dever legal que sobre si impendia ou justificando a sua conduta, a existência da comissão de controlo de transações com partes relacionadas, permitia ao Recorrente CC confiar que a informação constante do Prospeto, seja explicitamente, seja por remissão, era verdadeira, completa e actual.
KKKK. A informação omitida quanto ao BESA não era susceptível de interferir ou impedir a formação de juízos fundados dos investidores quanto à subscrição de novas ações do BES.
LLLL. Com a emissão da garantia soberana de Angola, em 31 de Dezembro de 2013, a informação que era conhecida em Outubro e Novembro de 2013, deixou de ser atual e era em irrelevante, pelo que a sua inclusão no prospeto tornaria o mesmo desatualizado e não claro.
MMMM. A CMVM teve conhecimento da entrevista dada pelo Recorrente CC ao ..., em 22 de Maio de 2014.
NNNN. O aumento da exposição do BES à ESFG a que se reporta a Decisão Recorrida é irrelevante “para a decisão dos destinatários” do prospeto, para efeitos de formarem o juízo de subscrição ou investimento nas novas ações emitidas pelo BES, no âmbito do aumento de capital de 2014.
OOOO. As cartas de conforto assinadas eram «fracas» e destinavam-se apenas a prestar uma mera informação aos clientes destinatários, estando a sua efetivação dependente de um pressuposto baseado numa mera intenção, que nunca se verificou.
PPPP. O Recorrente CC recusou assinar uma primeira versão das «cartas de conforto» que lhe foi apresentada porque queria evitar qualquer risco de prestação de garantia ou assunção de uma obrigação de resultado do BES.
QQQQ. Ao assinar as cartas de conforto em causa, o Recorrente CC confiou, de forma justificada, que não estava a gerar qualquer obrigação de resultado incondicional para o BES.
RRRR. Eximindo-o do seu dever legal aqui em causa e com reporte ao tema do ring-fencing, o Recorrente CC andou ocupado com outros temas do BES, na qualidade de CEO do mesmo.
SSSS.  O Recorrente CC ignorava que a informação incluída no prospeto, a respeito do montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, não era completa, por existir uma discrepância no valor de € 133 milhões, nem que teria materialidade suficiente para fazer concluir que a informação ali incluída não seria completa ou que a mesma permitia «aos destinatários formar juízos fundados sobre a oferta».
TTTT. O Recorrente CC ignorava que a informação incluída no prospeto, a respeito do BESA, não seria completa, nem que a inclusão de tal informação fosse necessária para que os destinatários formassem juízos fundados sobre a oferta.
***
A requerimento dos recorrentes AA e CC, foi designada audiência nos termos do artigo 411º do CPP, ex vi artigo 74º, nº 4, do RGCO, a qual decorreu com observância das formalidades legais, como consta da respectiva acta.
***
III. Fundamentação de Direito.

O âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. os artigos 119°, n.° 1, 123°, n.° 2 e 410°, n.° 2, als. a), b) e c) do Código de Processo Penal).
Estando em causa o recurso de sentença que conheceu de impugnação judicial de uma decisão administrativa proferida em processo de contraordenação, o disposto no artigo 75° n.° 1 do DL n.° 433/82, de 27/10 (RGCO) estabelece que, em regra, e salvo se o contrário resultar do diploma, este Tribunal apenas conhece de matéria de direito.

Sem prejuízo de este Tribunal da Relação não poder reapreciar a matéria de facto julgada pelo Tribunal recorrido, pode tomar conhecimento das nulidades previstas no artigo 410°, n° 2, do Código de Processo Penal, segundo o qual ‘mesmo nos casos em que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum:
a) a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada;
b) a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão;
c) erro notório na apreciação da prova.’
Acontece que, tal como se extrai do referido preceito legal, aqueles vícios têm de resultar do texto da decisão recorrida e não de elementos processuais a ela estranhos, ainda que produzidos no âmbito da discussão judicial do caso, pelo que, designadamente a insuficiência da matéria de facto provada, a contradição insanável da fundamentação, ou contradição entre a fundamentação e a decisão e o erro notório na apreciação da prova devem resultar de per si do texto da decisão recorrida e ser analisados em função do aí consignado.
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Questões a decidir

As questões suscitadas pelos recorrentes e que importa conhecer podem agrupar-se em três categorias:
I –   Prescrição do procedimento contraordenacional
II – Nulidades, ilegalidades e vícios da decisão da CMVM e/ou da sentença recorrida
III – Concurso de infracções e medida concreta das coimas e sanções acessórias [constitucionalidade do artigo 388º, nº 1, alínea a), do CdVM]

Atenta a sua natureza de excepção, extintiva do procedimento contraordenacional nos termos do artigo 27º do RGCO, trataremos em primeiro lugar da prescrição invocada com fundamentos vários por todos os recorrentes, antes de passar  à análise das demais questões e das múltiplas sub-questões em que se desdobram, de acordo com o alegado por cada um deles, como elencado a continuação.

Recurso de AA:
I – Prescrição do procedimento contraordenacional
I.1 – O procedimento contraordenacional pelas contraordenações em causa nos presentes autos prescreveu em 17.06.2019;
I.2 – Não verificação de causa de interrupção de prescrição nos termos do artigo 28º, nº 1, alínea b), do RGCO;
I.3 - Inconstitucionalidade do artigo 28º, nº 1, alínea b), do RGCO;
I.4 - Aplicação ilegal e/ou inconstitucional pela sentença recorrida do prazo de prescrição previsto no artigo 418º, nº 1, alínea a), do CdVM, na redacção introduzida pela Lei nº 28/2017 de 30 de maio;

II – Nulidades, ilegalidades e vícios da decisão da CMVM e/ou da sentença recorrida
II.1 – Nulidade da decisão da CMVM (e consequentemente da sentença recorrida) por violação do princípio de igualdade;
II.2 – Vícios da matéria de facto da sentença recorrida (artigo 410º, nº 2, do   CPP):
II.2.1 - Insuficiência para a decisão da matéria de facto;
II.2.2 - Contradições insanáveis na fundamentação;
II.2.3 - Erros notórios na apreciação da prova;
II.3 – Erro quanto à existência de actualidade no prospeto de informação relativo à exposição do BES à ESFG e subsidiárias;
II.4 – Actualidade e completude da informação contida no prospeto;
II.5 – Inexistência de dolo ou negligência;
II.6 – Inexigibilidade de conduta diversa dos arguidos.

III – Concurso de infracções e medida concreta das coimas e sanções acessórias [constitucionalidade do artigo 388º, nº 1, alínea a), do CdVM]
III.1 – Número de contraordenações praticadas em violação dos artigos 135º e 142º do CdVM:
II.1.1 – Contraordenação continuada.
Recurso de BB:
I – Prescrição do procedimento contraordenacional
I.1 – O procedimento contraordenacional pelas contraordenações em causa nos presentes autos prescreveu em 17.06.2019 ou, quando muito, em 4.11.2022 ou, no limite, em 24.11.2022;
I.2 – Não verificação de causa de interrupção de prescrição nos termos do artigo 28º, nº 1, alínea b), do RGCO;
I.3 - Inconstitucionalidade do artigo 28º, nº 1, alínea b), do RGCO;
I.4. – Não verificação das causas de suspensão da prescrição previstas na Lei nº 1-A/2020 de 19 de março e na Lei nº 4-B/2021 de 1 de fevereiro;
I.5 - Aplicação ilegal e/ou inconstitucional pela sentença recorrida do prazo de prescrição previsto no artigo 418º, nº 1, alínea a), do CdVM, na redacção introduzida pela Lei nº 28/2017 de 30 de maio;
I.6 - Inconstitucionalidade da suspensão do prazo de prescrição previsto no artigo 418º, nº 2, do CdVM, na redacção introduzida pela Lei nº 28/2017 de 30, interpretado no sentido de ser aplicado  aos processos contraordenacionais pendentes aquando da entrada em vigor dessa lei;

II – Nulidades, ilegalidades e vícios da decisão da CMVM e/ou da sentença recorrida
II.1 - Nulidade da sentença recorrida por falta de fundamentação;
II.2 - Vícios da matéria de facto da sentença recorrida (art. 410° n° 2 do CPP):
II.2.1 – Contradições insanáveis da fundamentação;
II.2.2 - Erros notórios na apreciação da prova;
II.3 – Erro na interpretação dos artigos 135º e 142º do CdVM;
II.4 – Inconstitucionalidade da hipotética interpretação dos artigos 135º e 142º do CdVM a realizar pelo Tribunal ad quem;

Recurso de CC:

I – Prescrição do procedimento contraordenacional
I.1 – O procedimento contraordenacional relativo às putativas contraordenações por violação dos artigos 135º e 142º do CdVM prescreve a 26.11.2022;
I.2 – Inconstitucionalidade da suspensão do prazo de prescrição previsto no artigo 418º, nº 2, do CdVM, na redacção introduzida pela Lei nº 28/2017 de 30 de, interpretado no sentido de ser aplicado  aos processos contraordenacionais pendentes aquando da entrada em vigor dessa lei;
II – Nulidades, ilegalidades e vícios da decisão da CMVM e/ou da sentença recorrida
II.1 -  Nulidade da decisão da CMVM (e consequentemente da sentença recorrida) por imputação genérica de factos;
II.2 - Vícios da matéria de facto da sentença recorrida (art. 410° n° 2 do CPP):
II.2.1. - insuficiência para a decisão recorrida da matéria de facto (factos 323, 331 (h), 338 e 351(f);
II.2.2 - Contradições insanáveis na fundamentação (inconsistência entre as datas mencionadas nos factos provados 112 e 133-134, com referência às quais vem requeridas informação, quanto à ESFG e subsidiárias e quanto ao BESA, respectivamente)
II.3 - Nulidade da sentença recorrida por imputação de factos com recurso a juizos conclusivos e valorativos;
II.4 - Nulidade da sentença recorrida por omissão de pronúncia;
II.5 – Inconstitucionalidade do artigo 393º, nº 2, alíneas c) e d) do CdVM;
II.6 – Actualidade e completude da informação constante do prospeto;
II.7 - Inexistência de dolo ou negligência;
II.8 – Erro sobre a factualidade típica;

III – Concurso de infracções e medida concreta das coimas e sanções acessórias [constitucionalidade do artigo 388º, nº 1, alínea a), do CdVM]
III.1 – Número de contraordenações praticadas em violação dos artigos 135º e 142º do CdVM:
III.1.1 – Contraordenações continuadas;
III.1.2 – Concurso aparente das contraordenações por falta de qualidade da informação constante do prospeto;
III.2 – Errada determinação da medida concreta da coima:
III.2.1 – Erro da sentença recorrida quanto `ponderação da situação pessoal do recorrente na determinação da coima aplicável;
III.2.2 - Erro da sentença recorrida quanto `ponderação do tempo decorrido desde a prática da infracção;
III.2.3 – Violação do princípio da igualdade e da proporcionalidade na determinação da medida da coima única;
III.2.4 – Erro da sentença recorrida na apreciação da absolvição do recorrente quanto à infracção relativa à Rio Forte;
III.2.5 -  Erro da sentença recorrida quanto à existência de antecedentes                                  contraordenacionais;
III.3 - Cúmulo jurídico por conhecimento superveniente do concurso das coimas  fixadas nos presentes autos com as do Processo nº 293/21.....

Recurso de DD:

I – Prescrição do procedimento contraordenacional
I.1 – O dies a quo da contagem do prazo de prescrição ocorreu a 15.05.2014, tendo o procedimento contraordenacional pelas contraordenações em causa nos presentes autos prescrito em 15.05.2019 ou, quando muito, em 22.10.2022;
I.2 – Inconstitucionalidade dos artigos 135º e 393º, nº 2, alínea d), do CdVM;
I.3 – Não verificação de causa de interrupção de prescrição nos termos do artigo 28º, nº 1, alínea b), do RGCO;
I.4 - Inconstitucionalidade do artigo 28º, nº 1, alínea b), do RGCO;
I.5. – Não verificação das causas de suspensão da prescrição previstas na Lei nº 1-A/2020 de 19 de março e na Lei nº 4-B/2021 de 1 de fevereiro;
1.6 – Inconstitucionalidade da suspensão do prazo de prescrição previsto no artigo 418º, nº 2, do CdVM, na redacção introduzida pela Lei nº 28/2017 de 30, interpretado no sentido de ser aplicado  aos processos contraordenacionais pendentes aquando da entrada em vigor dessa lei;
I.7 – Duração máxima de 6 meses das causas de suspensão do prazo de prescrição;
I.8 - Aplicação ilegal e/ou inconstitucional pela sentença recorrida do prazo de prescrição previsto no artigo 418º, nº 1, alínea a), do CdVM, na redacção introduzida pela Lei nº 28/2017 de 30 de maio;
I.9 – Inconstitucionalidade da suspensão do prazo de prescrição previsto no artigo 418º, nº 2, do CdVM, na redacção introduzida pela Lei nº 28/2017 de 30, interpretado no sentido de ser aplicado  aos processos contraordenacionais pendentes aquando da entrada em vigor dessa lei;

II – Nulidades, ilegalidades e vícios da decisão da CMVM e/ou da sentença recorrida
II.1 – Ilegalidade da sentença por inclusão de conclusões jurídicas na matéria de facto provada;
II.2 -  Vícios da matéria de facto da sentença recorrida (art. 410° n° 2 do CPP):
II.2.1. - Insuficiência para a decisão recorrida da matéria de facto;
II.2.2 - Contradições insanáveis na fundamentação;
II.2.3 – Erros notórios na apreciação da prova;
II.3 – Actuação dos arguidos segundo o princípio da confiança;
II.4 – Violação do princípio da acusação e da vinculação temática;
II.5 – Inconstitucionalidade do artigo 393º, nº 2, alíneas c) e d) do CdVM;
II.6 – Actualidade e completude da informação constante do prospeto;
II.7 - Inexistência de dolo ou negligência;
III – Concurso de infracções e medida concreta das coimas e sanções acessórias [constitucionalidade do artigo 388º, nº 1, alínea a), do CdVM]
III.1 – Desproporcionalidade e desconformidade com os critérios legais da coima aplicada pelo Tribunal recorrido;
III.2 – Inconstitucionalidade do artigo 388º, nº 1, alínea a) do CdVM.

Cumpre decidir:

I –  Da prescrição do procedimento contraordenacional
Alegam os Recorrentes AA (conclusões 2ª a 21ª), BB (conclusões IX a XXXIV), CC (conclusões 12 a 37) e DD (conclusões 1 a 24), que o o procedimento contraordenacional objecto dos presentes autos se encontra prescrito desde 15.05.2019 (DD), 19.06.2019 (AA e BB), 15.05.2022, 22.10.2022 ou 4.11.2022 (DD) e 26.11.2022 (CC), com os fundamentos que em seguida se sintetizam:
- O prazo de prescrição consubstanciada na falta de qualidade do prospeto conta-se desde a data da aprovação da minuta do prospeto, em 15.05.2014, e não do final da operação de aumento de capital, em 17.06.2014, sendo inconstitucionais - por violação dos princípios de legalidade e tipicidade previstos nos artigos 1º, 2º e 29º, nºs 1, 3 e 4 da CRP- os artigos 135º e 393º, nº 2, alínea d), do CdVM, interpretados ‘no sentido de que ume pretensa omissão de informação num Prospeto de uma oferta pública de subscrição se considera praticada até ao final da operação de aumento de capital (no caso concreto, 17 de junho de 2014), e não no dia de aprovação do Prospeto (no caso concreto, 15 de maio de 2014)’ (conclusões 1ª a 3ª do Recorrente DD);
- o procedimento contraordenacional prescreveu antes da notificação da acusação aos arguidos, tendo o prazo de prescrição de 5 anos expirado sem que tivesse ocorrido qualquer causa de interrupção da prescrição, já que as diligências probatórias realizadas pela CMVM antes da notificação da acusação carecem de efeito interruptivo da prescrição, nos termos do artigo 28º, nº 1, alínea b), do RGCO, sendo inconstitucional a interpretação deste normativo efectuada em sentido diverso pela sentença recorrida, por violação dos artigos 2º e 32º, nºs 1 e 10 da CRP (conclusões 8ª a 21ª do Recorrente AA, conclusões XIII e XIV do Recorrente BB e conclusões 12 a 15 do Recorrente DD);
- São inaplicáveis aos presentes autos as designadas ‘suspensões covidianas’ previstas na Lei nº 1-A/2020, de 19 de março, e na Lei 4-B/2021, de 1 de fevereiro, por violação dos princípios da aplicação da lei mais favorável e da não aplicação retroactiva da lei penal, sendo inconstitucionais tais disposições e a sua aplicação a processos de contraordenação relativos a factos ocorridos antes da sua entrada em vigor, por violação dos artigos 2º, 13º nº 1, 19º nº 6, 18º nº 3, 29º e 32º nºs 1 e 10 da CRP (conclusões XVI a XXV do Recorrente BB e conclusões 16, 17, 20 a 22 e 24 do Recorrente DD);
- O prazo máximo legal da prescrição é de 8 anos e ocorreu em 15.05.2022, por aplicação do prazo de prescrição de 5 anos, acrescido de metade (2 anos e 6 meses), sem que se tenha verificado qualquer causa de suspensão que, a ter-se verificado, não pode ultrapassar 6 meses (conclusões 16 e 17 do Recorrente DD);
- É ilegal e/ou inconstitucional a aplicação retroactiva do artigo 418º, nº 1, alínea a), do CdVM, na redacção introduzida pela Lei nº 28/2017, de 30 de maio, efectuada pela sentença recorrida (conclusões XXVI, XXVII, XXX, XXXI, XXXII e XXXIII do Recorrente BB, conclusões 4 a 6 e 10 do Recorrente DD e conclusões 5ª a 7ª do Recorrente AA);
- É ilegal e inconstitucional a aplicação retroactiva do artigo 418º, nº 2, do CdVM, na redacção introduzida pela Lei nº 28/2017, d 30 de maio, efectuada pela sentença recorrida (conclusões XXVI, XXVII, XXX, XXXI, XXXII e XXXIII do Recorrente BB, conclusões 24 a 37 do Recorrente CC e conclusões 4, 7 e 8 a 11 do Recorrente DD).
I.1 Do dies a quo da contagem do pazo de prescrição
Alega o recorrente DD (conclusões 1 e 2) que o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional relativo à infracção pela qual foi condenado, consubstanciada na violação da qualidade do prospeto, deve contar-se do momento da aprovação deste pelo recorrente e demais administradores do BES, em 15.05.2014, nesse momento se consumando e cristalizando o que considera uma contraordenação instantânea, e não de 17.06.2014, data considerada na sentença recorrida como como dies a quo da contagem do prazo prescricional, por então aí se ter por consumada a infracção.
A sentença recorrida fundamentou designadamente do seguinte modo a sua posição na matéria, em termos que subscrevemos (pp. 38-39, ênfase aditado):
‘[…] como é sabido, a contagem do prazo de prescrição inicia-se com a consumação do facto ilícito.
Dispõe o artigo 27.º do RGCO,
“[o] procedimento por contra-ordenação extingue-se por efeito da prescrição logo que sobre a prática da contra-ordenação hajam decorrido os seguintes prazos”.
O artigo 5.º do RGCO prevê que “[o] ato considera-se praticado no momento em que o agente atuou ou, no caso de omissão, deveria ter atuado, independentemente do momento em que o resultado típico se tenha produzido”.
E o n.º 1 do artigo 119.º do Código Penal determina que “[o] prazo de prescrição do procedimento criminal corre desde o dia em que o facto se tiver consumado” (realce e sublinhado nosso).
Donde, salvo melhor entendimento, o dies a quo a considerar, no que respeita às contraordenações imputadas aos arguidos é o dia 17 de junho de 2014.
Não se divisa, pois, fundamento para a pretensão dos Arguidos DD - segundo o qual o dies a quo a ter em conta, no que respeita à violação do dever de qualidade da informação constante do Prospeto, seria o dia 15 de maio de 2014, data da aprovação, pelo Conselho de Administração do BES da minuta do Prospeto […].
Senão vejamos.
O dia 15 de maio de 2014 corresponde à data em que, de acordo com a delimitação operada na decisão recorrida, ocorreu um dos contributos causais (por ação) dos Arguidos, e, designadamente, do Arguido DD, para a prática das contraordenações. Segundo o entendimento preconizado na decisão recorrida, importa destrinçar a data em que ocorreu um dos contributos causais para a prática da infração da data da prática dos factos que consubstanciam as infrações em causa.
É que, a contagem do prazo de prescrição inicia-se com a consumação material do facto ilícito e não com a prática do(s) contributo(s) causal(ais) de cada um dos agentes para a realização do mesmo, conforme melhor se explicitará abaixo caso se apure a responsabilidade do agente, nos termos constantes no n.º 1 do artigo 16.º do RGCO. […]
Segundo a construção normativa preconizada na decisão censurada, durante o período da prática dos factos aqui em causa, o arguido era titular de um dever legal de garante: quer porque na qualidade de membro do órgão de administração do emitente de valores mobiliários e intermediário financeiro era responsável por garantir o cumprimento dos deveres previstos no CdVM que disciplinam a atividade dos emitentes e dos intermediários financeiros, quer porque, depois de, com a sua decisão de aprovação da minuta do prospeto, ter criado o risco de lesão dos bens jurídicos, tinha o dever de obstar a que tal ação se atualizasse no resultado típico (com a divulgação do prospeto em 20/05/2014 e durante todo o período de duração da oferta).
O sobredito risco de lesão dos interesses jurídicos manteve-se até à data da admissão à negociação das novas ações do BES, sendo essa a data até à qual poderia ter sido requerida a aprovação de adenda ao prospeto – i.e., 17 de junho de 2014.’
Com efeito, as infracções em causa nos presentes autos, relativas à violação do dever de qualidade da informação constante do prospeto (artigo 135º, nº 1, do CdVM), assim como do dever de publicação de adendas ao mesmo (artigo 142º, nº 1, do CdVM), revestem natureza permanente.
O momento da consumação do ilícito perdura durante todo o período em que, após a divulgação do prospeto, o bem ou interesse jurídico continua a ser lesado por inércia e vontade do agente, ou seja até à admissão à negociação das acções emitidas pelo BES em resultado da Oferta, período durante o qual o prospeto cumpre a sua função informativa.
Por outras palavras, a consumação da infracção não cessa enquanto o recorrente podia e devia ter atuado para assegurar a qualidade da informação constante do prospeto, através de correspondentes alterações/adendas, ou seja, durante todo o período da Oferta divulgada no prospeto.
Ora, a contagem do prazo de prescrição inicia-se com a consumação material do facto ilícito e não com a prática do contributo causal de cada um dos agentes, imputando-se a cada um destes a autoria do facto típico contraordenacional, de acordo com o conceito extensivo de autor que vigora no direito de mera ordenação social, nos termos do artigo 16º, nº 1, do RGCO.
De resto, nos termos do artigo 5.º do RGCO, “[o] ato considera-se praticado no momento em que o agente atuou ou, no caso de omissão, deveria ter atuado, independentemente do momento em que o resultado típico se tenha produzido”. (ênfase aditado).
Como lembra o Tribunal a quo (pp. 34-35, ênfase aditado):
‘[…] Na medida em que, a lesão do bem jurídico não subsiste nas infrações instantâneas o legislador, de modo adequado e proporcional, determina que contagem do prazo de prescrição opera a partir desse momento.
Contudo, isso não sucede nas designadas infrações duradouras ou permanentes: nestas existe um momento de consumação, tipicamente conexionado com a lesão primária do bem ou interesse jurídico, seguido de um período de consumação material, no decurso do qual, por vontade do agente, perdura a lesão do bem jurídico ou interesse jurídico tutelado.
A este respeito, a propósito do ilícito penal, mas cujos subsídios dogmáticos consentem transposição, ensina Figueiredo Dias que
“[n]estes crimes [permanentes] a consumação, anote-se, ocorre logo que se cria o estado antijurídico; só que ela persiste (ou dura) até que tal estado tenha cessado.”[1].
Ora, salvo melhor entendimento, as infrações em causa nos presentes autos, relativas à violação do dever de qualidade da informação constante do prospeto, assim como do dever de publicação de adendas ao mesmo, são de natureza permanente.’
Não se está, assim, nos presentes autos, perante infracção de natureza instantânea, mas permanente, cuja consumação se tem por materializada até à conclusão da Oferta divulgada no prospeto (17.06.2014), e não com a aprovação deste pelo recorrente DD e demais administradores do BES, em 15.05.2014.

As contraordenações são imputadas ao Recorrente DD por este ter dado (por ação e por omissão) contributos causais para a prática do facto, traduzidos:
(i) No facto de o recorrente DD ter aprovado a minuta de prospeto;
(ii) No facto de o recorrente DD não ter feito constar no prospeto de aumento de capital, divulgado no dia 20 de maio de 2014, informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, estar numa grave situação patrimonial, resultado da deteção de uma fraude ao nível da sua carteira de crédito e do seu portfólio de ativos imobiliários, que era do seu conhecimento e necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma;
(iii) No facto o recorrente DD não ter adotado, durante o período de tempo entre a decisão de realização do aumento de capital e a liquidação financeira do mesmo, qualquer medida adequada a sanar os vícios da informação constantes do prospeto.

Durante o período da prática dos factos aqui em causa, o recorrente DD era titular de um dever legal de garante: quer porque na qualidade de membro do órgão de administração do emitente de valores mobiliários e intermediário financeiro era responsável por garantir o cumprimento dos deveres previstos no CdVM que disciplinam a atividade dos emitentes e dos intermediários financeiros, quer porque, depois de, com a sua decisão de aprovação da minuta do prospeto, ter criado o risco de lesão dos bens jurídicos, tinha o dever de obstar a que tal ação se atualizasse no resultado típico (com a divulgação do prospeto em 20.05.2014 e durante todo o período de duração da oferta).

Ora, tal risco de lesão dos interesses jurídicos manteve-se até à data em que o BES podia ter, através de adenda ao prospeto, corrigido a falta de qualidade da informação divulgada no prospeto – i.e., até 17 de junho de 2014, data da liquidação financeira da oferta.

Pelo que é essa, e não o dia 15.05.2014,  a data do início da contagem da prescrição, nos termos dos artigos 5.º e 27.º do RGCO ex vi do artigo 407.º do CdVM, improcedendo por conseguinte a correspondente pretensão recursiva do recorrente DD.


I.2 -  Da alegada inconstitucionalidade dos artigos 135º e 393º, nº 2, alínea d), do CdVM

Alega o Recorrente DD que os artigos 135.º e 393.º, n.º 2, alínea d), CdVM, interpretados no “sentido de que uma pretensa omissão de informação num Prospeto de uma oferta pública de subscrição se considera praticada até ao final da operação de aumento de capital (no caso concreto, 17 de junho de 2014), e não no dia de aprovação do Prospeto (no caso concreto, 15 de maio de 2014)”, são inconstitucionais por violação dos princípios da legalidade e tipicidade vertidos nos artigos 1.º, 2.º e 29.º, n.ºs 1, 3 e 4, da CRP (cfr. conclusão 3).

É manifesta a improcedência da alegada inconstitucionalidade da referida interpretação dos artigos 135.º e 393.º, n.º 2, alínea d), CdVM, na medida em que estas normas constituem a norma de dever e a norma sancionatória da infração pela qual o Recorrente DD veio condenado, nada dispondo quanto à determinação do momento da prática da infração (e, consequentemente, do dies a quo da contagem do prazo de prescrição), a qual se prende, antes, com a interpretação e aplicação do artigo 5º do RGCO.

Inconstitucionalidade essa que, aliás, foi objeto de apreciação pela sentença recorrida (pp. 55-61), nos seguintes termos, que subscrevemos (ênfase aditado):
‘[…] Segundo a narração circunstanciada vertida na decisão recorrida e apreendida pelo Recorrente, a prática do facto (comissivo) ilícito – a prestação, no prospeto, de informação sem qualidade –, resulta de ter dado contributos causais por ação (ter aprovado a minuta do prospeto) e por omissão (não ter feito constar do prospeto informação de que tinha conhecimento, e não ter adotado durante o período de tempo entre a decisão de realização do aumento de capital e a liquidação financeira do mesmo, qualquer medida adequada a sanar os vícios da informação constantes do Prospeto).

Neste enquadramento, o facto ilícito em causa teve lugar, de acordo com a narração circunstanciada constante na decisão sob censura, desde a publicação do prospeto no SDI da CMVM (20 de maio de 2014) até à admissão à negociação das novas ações emitidas pelo BES.

Com tal interpretação normativa não se nos afigura que a Recorrida tenha colocado em crise o princípio da tipicidade, pois a norma de dever cuja violação é imputada ao Arguido observa, enquanto pré-tipo, o princípio da legalidade, na sua dimensão de tipicidade, na medida em que o conteúdo da conduta que é imposta (a prestação de informação com qualidade) e, consequentemente, a conduta proibida (a prestação de informação sem qualidade) estão perfeitamente recortadas no tipo de ilícito.

Pela sua leitura, o destinatário da norma – um destinatário específico, altamente qualificado - sabe que tem a obrigação de divulgar um prospeto, no quadro de uma oferta pública, e sabe que esse protesto tem de conter informação com determinados requisitos de qualidade.

Sabe, igualmente, que esse prospeto se destina a ser divulgado junto dos destinatários da oferta, de forma a assegurar a prestação da informação necessária à tomada da decisão de investimento, a qual apenas se torna definitiva no termo do período da oferta.

Por conseguinte, o destinatário da norma sabe, necessariamente, que a qualidade da informação constante do prospeto tem se manter até ao termo da oferta (sob pena de subversão da função – informativa – desempenhada pelo prospeto).

Conclui-se, assim, que a função de tipicidade, ou de legalidade na vertente de tipicidade, é no caso cumprida pelo artigo 135.º do CdVM e não pelo artigo 5.º do RGCO, norma que se limita a prever e determinar o momento da prática do facto.

Inexiste, pois, qualquer ilegalidade ou inconstitucionalidade, não se divisando a inobservância de normas ou princípios legais ou constitucionais, assim improcedendo o peticionado.’

Com efeito, no que respeita à infração imputada ao arguido por violação do dever de qualidade da informação constante do prospeto, consagrado no artigo 135.º do CdVM, a infração tem-se por praticada entre 20.05.2014 (data da aprovação do prospeto pela CMVM e divulgação no SDI da CMVM) e 17.06.2014 (data até à qual poderia ter sido requerida a aprovação de adenda ao prospeto), revestindo a mesma um cariz duradouro.

Isto porque o dever de qualidade da informação constante do prospeto, previsto no artigo 135.º do CdVM, é, como referimos (ponto I.1), dirigido à prestação de informação durante o período da Oferta, sendo assim por esta limitado: isto é, enquanto durar a oferta pública, a informação prestada pelo Emitente tem de revestir a qualidade prevista na lei.

Os contributos causais – por ação ou por omissão – dos arguidos para a violação do dever de qualidade da informação constante do prospeto, i.e., o contributo para a prática da contraordenação, nos termos do artigo 16.º do RGCO, repercutem-se durante o período da Oferta e não se confundem com uma parte do contributo causal que deu para a prática do facto ilícito típico – ter aprovado a minuta do prospeto em reunião do Conselho de Administração do BES ocorrida em 15 de maio de 2014.

Tal como consta da sentença recorrida, a contraordenação é imputada ao recorrente DD por este ter dado um contributo causal para a prática do facto, traduzido não apenas no facto de ter aprovado a minuta de prospeto (contributo causal por ação), mas ainda nos factos de:
(a) não ter feito constar no Prospeto de aumento de capital, divulgado no dia 20 de maio de 2014, informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, estar numa grave situação patrimonial, resultado da deteção de uma fraude ao nível da sua carteira de crédito e do seu portfólio de ativos imobiliários, que era do seu conhecimento e necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma, e
(b) não ter adotado, durante o período de tempo entre a decisão de realização do aumento de capital e a liquidação financeira do mesmo, qualquer medida adequada a sanar os vícios da informação constantes do Prospeto (contributos causais por omissão).
Ou seja, para a prática do facto (comissivo) ilícito – a prestação, no prospeto, de informação sem qualidade –, o recorrente DD deu contributos causais por ação (ter aprovado a minuta do prospeto) e por omissão (não ter feito constar do prospeto informação de que tinha conhecimento, e não ter adotado durante o período de tempo entre a decisão de realização do aumento de capital e a liquidação financeira do mesmo, qualquer medida adequada a sanar os vícios da informação constantes do Prospeto).

Ora, o facto ilícito em causa teve lugar desde a publicação do prospeto no SDI da CMVM (20 de maio de 2014) até, pelo menos, à admissão à negociação das novas ações emitidas pelo BES (17 de junho de 2014).

Tal não implica qualquer violação do princípio da tipicidade, pois a norma de dever cuja violação é imputada ao arguido DD – artigo 135.º do CdVM – cumpre (enquanto pré-tipo) o princípio da legalidade, na sua dimensão de tipicidade, na medida em que o conteúdo da conduta que é imposta (a prestação de informação com qualidade) e, consequentemente, a conduta proibida (a prestação de informação sem qualidade) estão perfeitamente recortadas no tipo de ilícito em moldes perfeitamente inteligíveis e determináveis para o destinatário a quem se dirige.

O destinatário da norma – profissional do sector, altamente qualificado - sabe que tem a obrigação de divulgar um prospeto, no quadro de uma oferta pública, e que esse prospeto tem de conter informação com determinados requisitos de qualidade. Sabe, igualmente, que esse prospeto se destina a ser divulgado junto dos destinatários da oferta, de forma a assegurar a prestação da informação necessária à tomada da decisão de investimento, a qual se apenas se torna definitiva no termo do período da oferta.

Assim, o destinatário da norma sabe, necessariamente, que a qualidade da informação constante do prospeto tem se manter até ao termo da oferta (sob pena de subversão da função – informativa – desempenhada pelo prospeto), nenhum entorse se vislumbrando aos princípios da tipicidade e da legalidade na interpretação dada pela sentença recorrida aos artigos 135º e 393º, nº 2, do CdVM.

Termos em que improcede a inconstitucionalidade invocada pelo recorrente DD neste segmento recursivo.


I.3 – Da não verificação de causa de interrupção do prazo de prescrição nos termos do disposto no artigo 28º, nº 1, alínea b), do RGCO

Os recorrentes AA (conclusões 8ª a 21ª), BB (conclusões XIII e XIV) e DD (conclusões 12 a 14) alegam nos respetivos recursos que o procedimento contraordenacional prescreveu ainda antes da notificação da acusação aos arguidos, porquanto se verificou o decurso do prazo de prescrição (5 anos) sem que tivesse ocorrido qualquer causa de interrupção da prescrição, uma vez que as diligências probatórias realizadas pela CMVM antes da notificação da acusação não tiveram efeito interruptivo da prescrição, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 28.º do RGCO, nos seguintes termos:

- o recorrente AA, que as diligências probatórias realizadas pela CMVM antes da notificação da acusação, traduzidas na inquirição de 8 testemunhas, não tiveram efeito interruptivo da prescrição, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 28.º do RGCO;
- o recorrente BB, que não se verificaram quaisquer causas interruptivas da prescrição (artigo 28.º, n.º 1, alínea b), do RGCO) porque não foi previamente constituído como arguido (artigo 58.º CPP);
-  o recorrente DD, que o artigo 28.º, n.º 1, alínea b), RGCO “apenas se pode aplicar quando as diligências de prova em causa atinjam diretamente a esfera do visado / arguido”.

Este ponto foi apreciado na sentença recorrida (pp. 25-30 e 40-47), nos seguintes termos (ênfase aditado):
pp. 25-30:
“[…] Na fase administrativa do processo de contraordenação, a autoridade administrativa pode, sempre que necessário, praticar atos de instrução (cf. artigo 54.º, n.º 2, do RGCO), de forma a apurar a infração e/ou a recolher elementos de prova que permitam sustentar a sua decisão final, sendo que a inquirição de testemunhas, antes da acusação e até à decisão final, inscreve-se precisamente nos atos de instrução que são admitidos na fase administrativa do processo de contraordenação, e encontram a sua legitimação não só, em geral, no artigo 54.º do RGCO, mas também, em especial, no disposto no artigo 408.º do CdVM.

As inquirições de testemunhas realizadas em 22.02.2018, 06.03.2018, 09.03.2018, 15.05.2019, 27.05.2019 e 29.05.2019, ou seja, em momento prévio à dedução da acusação, consubstanciam, pois, diligências probatórias levadas a cabo pela Recorrida no âmbito do presente processo de contraordenação, tendo a sua realização seguido os trâmites e as limitações próprias dos depoimentos em processo de contraordenação.

De igual sorte, a notificação da Comissão Liquidatária do BES e do Banco de Portugal para que fornecessem aos presentes autos de contraordenação documentos na respetiva posse (fls. 2173 e 2176) corporizam diligências de prova realizadas no âmbito do presente processo de contraordenação.

Ora, em face da normação inscrita na alínea b) do artigo 28.º, n.º 1, do RGCO, afigura-se que quaisquer diligências de prova, sem distinção e, incluindo a inquirição de testemunhas, é apta a interromper a prescrição, independentemente do momento processual em que essa realização tenha lugar. […]

A realização, no âmbito de um processo de contraordenação, de qualquer diligência de prova, necessária e relevante para a descoberta da verdade material – como o foram as inquirições de testemunhas realizadas pela CMVM no âmbito do presente processo de contraordenação –, reflete uma manifestação da manutenção do interesse do Estado na efetivação da responsabilidade sancionatória do agente, pelo que, na senda da jurisprudência trilhada, não se divisa fundamento para lhes retirar capacidade interruptiva face ao prazo de prescrição em curso.

Sem esforço hermenêutico de maior, conclui-se que as inquirições das testemunhas realizadas previamente à dedução da acusação inserem-se no conceito de diligências probatórias, porquanto: (i) integram aa atividade probatória, entendida como um processo de recolha de elementos probatórios (prova) tendente a averiguar os factos denunciados pela supervisão e a sustentar a acusação e (ii) traduzem um momento de produção de prova testemunhal.

Assim, todas as diligências de prova realizadas pela Recorrida em momento prévio à notificação da Acusação eram – e foram –, sem exceção (nem o arguido AA alegou ou sequer procurou demonstrar o contrário), necessárias e relevantes para o apuramento da responsabilidade contraordenacional do arguido e para a descoberta da verdade material.

A relevância das inquirições de testemunhas promovidas pela Recorrida em momento prévio à notificação da Acusação resulta, ainda, (i) do facto de a inquirição das referidas seis testemunhas ter sido também requerida pelos co-arguidos BB, CC e DD nas respetivas defesas e (ii) do teor e extensão das declarações prestadas por cinco das referidas seis testemunhas na fase pós acusatória, no seguimento das questões que lhe foram colocadas pela mandatária do arguido AA e dos mandatários dos demais co-arguidos que também as indicaram nas respetivas defesas (cf. depoimentos gravados em suporte áudio digital a fls. 9200 (pen-drive n.º 01), 9316 (pen-drive n.º 06), 9325 (pen-drive n.º 07), 9328 (pen-drive n.º 08) e 9419 (pen-drive n.º 17) dos presentes autos).

A normação ínsita na alínea b) do artigo 28.º, n.º 1, do RGCO não demanda que tais diligências sejam realizadas em momento posterior à notificação do arguido, sinalizando-se que o CdVM nada refere sobre o momento em que deve ocorrer a constituição de arguido, pelo que o artigo 50.º do RGCO (e o artigo 414.º-A do CdVM) esgota o problema da constituição do arguido na fase administrativa do procedimento contraordenacional, sendo inequívoco que, apenas no momento em que é deduzida acusação, o agente visado assume a condição de arguido. []

Cumpre sinalizar que, o artigo 28.º, n.º 1, alínea b), do RGCO não condiciona a eficácia interruptiva de diligências de prova realizadas em função do momento processual em que a sua realização ocorra, sendo, por isso, absolutamente indiferente, para o efeito previsto no mencionado preceito, se o arguido já foi notificado dessa sua qualidade, tanto mais que, conforme já se referiu, tal apenas se verificará, por definição, aquando da sua notificação para o exercício do direito de audição e defesa.

Ex abundantis, a alínea b) do artigo 28.º, n.º 1, do RGCO (ao contrário do que decorre das alíneas a) e c) do mesmo artigo) também não exige que tais diligências sejam levadas ao conhecimento do arguido, o que bem se compreende, umas vez que (i) as diligências de prova na fase administrativa do processo de contraordenação podem ser realizadas, quer antes da dedução da acusação, quer posteriormente à dedução da acusação (e antes da prolação da decisão final), (ii) em sede de processo de contraordenação, a constituição como arguido apenas ocorre com a notificação da acusação e, (iii) em sede de processo de contraordenação, até à dedução de acusação, vigora o segredo de justiça interno (cfr. artigo 408.º-A, n.º 2, do CdVM). […].”

pp. 40-47:
“Conforme se explicitou supra, a causa interruptiva da prescrição prevista no artigo 28.º, n.º 1, alínea b), do RGCO assume a seguinte redação: a “realização de quaisquer diligências de prova”.

Donde e desde logo, o elemento gramatical não concorre no sentido aventado pelo Recorrente.
(…)
Neste enquadramento, atenta a abrangência da linguagem normativa levada àquele preceito, preconiza-se que ali se incluem quaisquer actos de obtenção de prova, de natureza documental e testemunhal, como ocorreu nos presentes autos.

De igual sorte, não se divisam argumentos de natureza literal, teleológica, sistémica ou histórica que amparem a alegação do Recorrente no sentido de que tais diligências só têm idoneidade para interromper a prescrição quando delas for dado conhecimento ao arguido.

Como o Recorrente bem sabe, nem o RGCO, nem o CdVM, preveem a prática, pela autoridade administrativa, ora Recorrida, de um ato formal de instauração do procedimento por contraordenação, tal como não preveem a prática de qualquer ato de constituição de arguido.

Por outro lado, na fase administrativa do processo de contraordenação e num momento prévio à notificação da acusação, a autoridade administrativa pode, sempre que necessário, praticar atos de instrução (cfr. artigo 54.º, n.º 2, do RGCO ex vi do artigo 407.º do CdVM), de forma a apurar a infração e/ou a recolher elementos de prova que permitam sustentar a sua decisão final.

A inquirição de testemunhas e/ou o pedido de documentos a entidades supervisionadas ou a terceiros, antes da acusação e até à decisão final, consubstancia, pois, um dos atos de instrução que são admitidos na fase administrativa do processo de contraordenação, fundados quer artigo 54.º do RGCO, quer no disposto no artigo 408.º do CdVM, nos termos do qual, no âmbito do procedimento de contraordenação, a CMVM “[…] pode solicitar a quaisquer pessoas e entidades todos os esclarecimentos e informações, na medida em que os mesmos se revelem necessários às averiguações ou à instrução de processos da sua competência.”.

Em consequência, resulta da jurisprudência e doutrina que abaixo se respinga, a conclusão da inexistência de um princípio acusatório em sede contraordenacional, de um lado; e, de outro, a afirmação da concomitância da aquisição da qualidade de arguido com a notificação da acusação:
[…]
Isto é, o feixe de direitos e deveres que decorrem do estatuto de arguido, vertidos no artigo 61.º do Código de Processo Penal, não têm aplicabilidade a autos de natureza contraordenacional em momento anterior à dedução da acusação.

E, por conseguinte, é destituído de fundamento a invocação de que tais diligências probatórias careciam de prévio conhecimento do arguido, para que lhes fosse reconhecida aptidão adjetiva para interromper a prescrição, nos termos constantes no artigo 28.º, número 1, alínea b) do RGCO.”.

A sentença recorrida fez uma correta interpretação e aplicação do artigo 28.º, n.º 1, alínea b), do RGCO, ex vi do artigo 407.º do CdVM, em termos que subscrevemos.

Com efeito, na fase administrativa do processo de contraordenação a autoridade administrativa pode, sempre que necessário, praticar atos de instrução (cf. artigo 54.º, n.º 2, do RGCO[2]), de forma a apurar a infração e/ou a recolher elementos de prova que permitam sustentar a sua decisão final, sendo que a inquirição de testemunhas, antes da acusação e até à decisão final, se inscreve nos atos de instrução admitidos na fase administrativa do processo de contraordenação, cuja legitimação decorre não só do artigo 54.º do RGCO, mas também, especificamente, do disposto no artigo 408.º do CdVM.

As inquirições de testemunhas realizadas em 22.02.2018, 06.03.2018, 09.03.2018, 15.05.2019, 27.05.2019 e 29.05.2019, ou seja, em momento prévio à dedução da acusação, consubstanciam, de forma inequívoca, diligências probatórias levadas a cabo pela CMVM no âmbito do presente processo de contraordenação, de acordo com os trâmites e as limitações próprias dos depoimentos em processos desta natureza.

Também a notificação da Comissão Liquidatária do BES e do Banco de Portugal para que fornecessem aos presentes autos de contraordenação documentos na respetiva posse (fls. 2173 e 2176) configuram diligências de prova realizadas no âmbito do presente processo de contraordenação.

Nos termos do artigo 28.º, n.º 1, alínea b) do RGCO, é manifesto que a realização de quaisquer diligências de prova, sem distinção (e, portanto, também a inquirição de testemunhas)[3], é apta a interromper a prescrição, independentemente do momento processual em que essa realização tenha lugar.

A referência, no artigo 28.º, n.º 1, alínea b), do RGCO, a ‘exames ou buscas’ e a pedidos de ‘auxílio às autoridades policiais ou a qualquer autoridade administrativa’ não visa delimitar, ainda que indicativamente, o tipo de diligências de prova que são aptas a interromper a prescrição (o que sempre seria contraditório com a referência prévia a ‘quaisquer diligências’ e com o advérbio ‘designadamente’ que se lhe segue), mas apenas clarificar que, para além das diligências de prova tipicamente realizadas pelas próprias autoridades administrativas no uso dos seus poderes de instrução e investigação nos termos do artigo 54.º, n.º 2, do RGCO, também quaisquer outras - como as efectuadas ao abrigo do nº 3 deste artigo - serão de molde a interromper a prescrição.

Assim, a realização, no âmbito de um processo de contraordenação, de qualquer diligência de prova necessária e relevante para a descoberta da verdade material, como as inquirições realizadas pela CMVM no âmbito do presente processo de contraordenação, constitui manifestação da manutenção do interesse do Estado na efetivação da responsabilidade sancionatória do agente. Neste sentido, designadamente, os acórdãos do TRP de 26.20.2017 [4] e do TRC de 17.01.2018[5].

As inquirições das testemunhas realizadas previamente à dedução da acusação inserem-se no conceito de diligências probatórias na medida em que: (i) se inserem no âmbito da atividade probatória, entendida como um processo de recolha de prova tendente a averiguar os factos denunciados pela supervisão e sustentar a acusação, e (ii) traduzem um momento de produção de prova testemunhal.

A alínea b) do artigo 28.º, n.º 1, do RGCO não exige, aliás, que tais diligências sejam realizadas em momento posterior à notificação do arguido, nada se referindo no CdVM - relativamente às contraordenações da competência da CMVM - sobre o momento em que deve ocorrer a constituição de arguido, pelo que os artigos 50.º do RGCO e 414.º-A do CdVM esgotam o tema da constituição do arguido na fase administrativa do procedimento contraordenacional, assumindo o arguido essa condição apenas no momento em que é deduzida acusação.

No que respeita ao argumento de que as diligências de prova aptas, nos termos do artigo 28.º, n.º 1, alínea b), do RGCO, a interromper o prazo de prescrição são apenas aquelas realizadas no momento posterior à notificação do arguido dessa sua qualidade, importa recordar que, como bem refere, a propósito do mesmo preceito, Paulo Pinto nde Albuquerque[6]: “[a]s diligências de prova, mesmo ilegais, têm o efeito interruptivo da prescrição” podendo “ser realizadas quer antes quer depois da constituição do suspeito como arguido [...].”.

O artigo 28.º, n.º 1, alínea b), do RGCO não condiciona a eficácia interruptiva de diligências de prova realizadas em função do momento processual em que a sua realização ocorra, sendo, por isso, absolutamente indiferente, para o efeito previsto no mencionado preceito, se o arguido já foi notificado dessa sua qualidade, tanto mais que, conforme já se referiu, tal apenas se verificará, por definição, aquando da sua notificação para o exercício do direito de audição e defesa.

A alínea b) do artigo 28.º, n.º 1, do RGCO (ao contrário do que decorre das alíneas a) e c) do mesmo artigo) também não exige que tais diligências sejam levadas ao conhecimento do arguido, o que bem se compreende, umas vez que (i) as diligências de prova na fase administrativa do processo de contraordenação podem ser realizadas, quer antes da dedução da acusação, quer posteriormente à dedução da acusação (e antes da prolação da decisão final), (ii) em sede de processo de contraordenação, a constituição como arguido apenas ocorre com a notificação da acusação e, (iii) em sede de processo de contraordenação, até à dedução de acusação, vigora o segredo de justiça interno (cfr. artigo 408.º-A, n.º 2, do CdVM).

A interpretação contrária, além de carecer de suporte na letra da lei, implicaria, no caso de diligências de prova realizadas antes da dedução da acusação em processo de contraordenação, a violação do segredo de justiça interno que vigora no processo de contraordenação até à dedução da acusação.

A este propósito não se pode deixar de salientar, como refere Miguel Resende Relvas [7] (ênfase aditado), que;
[…] a realização, no âmbito de um processo de contraordenação, de qualquer diligência de prova (corresponda a mesma a uma inquirição de testemunha, a um pedido de elementos probatórios ao Arguido ou a terceiras entidades, a uma perícia, a uma busca ou exame) funcionalmente dirigida à instrução do processo, constitui manifestação, clara e inequívoca, da manutenção do interesse do Estado na efetivação da responsabilidade sancionatória do agente, o que certamente justificou a opção do legislador de atribuir, em sede contraordenacional, eficácia interruptiva à prática de qualquer ato dirigido a essa finalidade.”.

Improcede, assim, a pretensão recursiva dos recorrentes AA, BB e DD, quanto à não verificação de causa interruptiva do prazo prescricional nos termos do artigo 28º, nº 1, alínea b) do RGCO, e consequente prescrição do presente procedimento contraordenacional ainda antes da notificação da acusação.

I.4 – Da alegada inconstitucionalidade do artigo 28º, nº 1, alínea b), do
 RGCO

Tal como referido supra, os Recorrentes AA, BB e DD invocaram a inconstitucionalidade do artigo 28.º, n.º 1, alínea b), do RGCO, nos seguintes termos:

- o arguido AA, na interpretação segundo a qual a mesma “é aplicável mesmo naqueles casos em que tenha havido inércia por parte da autoridade administrativa que conduziu o procedimento contraordenacional, sendo a realização tardia e sem conhecimento do arguido das diligências probatórias em causa apenas imputável à própria autoridade administrativa”, por violação do princípio do Estado de Direito (artigo 2.º da CRP) e dos direitos, liberdades e garantias dos arguidos (artigo 32.º, n.ºs 1 e 10, da CRP) – cfr. conclusão 21ª;

- O arguido BB, na interpretação segundo a qual “a prescrição do procedimento por contraordenação interrompe-se com a realização de quaisquer diligências de prova, designadamente exames e buscas, ou com o pedido de auxílio às autoridades policiais ou a qualquer autoridade administrativa, ainda que tais diligências ou pedidos ocorram antes da comunicação ao arguido de qualquer despacho, decisão ou medida contra ele tomada, ou antes de qualquer notificação que lhe seja dirigida na qualidade de arguido”, por violação do artigo 2.º da CRP – conclusão XIV;

- O arguido DD, na interpretação segundo a qual “a mera realização de diligências de prova sem que o arguido tenha qualquer conhecimento da realização das mesmas (ou tenha sequer conhecimento da existência do processo contraordenacional) teria o efeito de interromper a prescrição relativamente a esse mesmo arguido”, por violação das garantias de defesa do arguido (artigo 32.º, n.ºs 1 e 10, da CRP) e dos princípios da confiança e segurança ínsitos no estado de Direito (artigo 2.º da CRP) – conclusões 14 e 15.

A este propósito, pronunciou-se a sentença recorrida (pp. 47-54) nos seguintes termos (ênfase aditado):
Soçobra, igualmente, a invocação dos parâmetros constitucionais convocados pelo Recorrente.
[…]
Segundo o disposto no n.º 10 do artigo 32.º da CRP “são assegurados ao arguido os direitos de audiência e defesa”, não se divisando referência à matéria de duração, contagem, causas interruptivas ou suspensivas dos processos de contraordenação, pelo que, com todo o respeito, não se compreende cabalmente a invocação deste preceito.

De qualquer modo, é manifesto que, nestes autos, foram observados os direitos de audição e defesa dos arguidos na medida em que i) todos os arguidos foram notificados da acusação (fls. 3985, 3988, 3990-3991, 3992-3994 e 3998 e 4053-4054), tendo ii) apresentado as respetivas defesas (fls. 4298 a 4451, 4491 a 5209, 5211 a 6481, 6482 a 8508, 8509 a 8561 e 8630 a 8646).
[…]
Por último, também não se alcança arrimo na convocação dos artigos 1.º e 2.º da CRP, respeitantes à natureza de República soberana e de Estado de Direito Democrático da República Portuguesa, na dimensão de segurança e certeza jurídica.
[…]
A terminologia ínsita no artigo 28.º, alínea b) do RGCO não acarreta qualquer incerteza para o arguido, advertido que está, mediante a sua singela leitura, que qualquer diligência independentemente da sua natureza, testemunhal, documental, pericial ou outra, constitui causa de interrupção da prescrição, normação que, salvo melhor entendimento, se encontra em perfeita consonância com a teleologia do instituto da prescrição.
[…]
Não se divisa, pois, a postergação de qualquer norma ou princípio jusfundamental, improcedendo o peticionado. […].’

Conforme já referido (ponto I.3), a causa interruptiva da prescrição prevista no artigo 28.º, n.º 1, alínea b), do RGCO refere-se à “realização de quaisquer diligências de prova”, as quais incluem a obtenção de prova documental e testemunhal, como ocorreu nos presentes autos, não exigindo que tais diligências sejam do conhecimento dos arguidos (ao contrário de outras causas interruptivas da prescrição, como as previstas nas alíneas a) e c) do mesmo artigo), como parecem pretender os arguidos AA, BB e DD.

A interpretação e aplicação do artigo 28.º, n.º 1, alínea b), do RGCO efetuada pela douta sentença recorrida – assente, nomeadamente, nos elementos literal, sistemático e teleológico – não viola os artigos 2.º e 32.º, n.ºs 1 e 10, da Constituição da República Portuguesa, como alegado pelos arguidos.

Note-se que, nem o RGCO, nem o CdVM, preveem a prática, pela autoridade administrativa (in casu, a CMVM), de um ato formal de instauração do procedimento por contraordenação, tal como não preveem a prática de qualquer ato de constituição de arguido.

Na fase administrativa do processo de contraordenação e num momento prévio à notificação da acusação, a autoridade administrativa pode, sempre que necessário, praticar atos de instrução (cfr. artigo 54.º, n.º 2, do RGCO ex vi do artigo 407.º do CdVM), de forma a apurar a infração e/ou a recolher elementos de prova que permitam sustentar a sua decisão final.

A inquirição de testemunhas e/ou o pedido de documentos a entidades supervisionadas ou a terceiros, antes da acusação e até à decisão final, inscreve-se precisamente nos atos de instrução que são admitidos na fase administrativa do processo de contraordenação, e encontram a sua legitimação não só, em geral, no artigo 54.º do RGCO, mas também, em especial, no disposto no artigo 408.º do CdVM, nos termos do qual, no âmbito do procedimento de contraordenação, a CMVM ‘[…] pode solicitar a quaisquer pessoas e entidades todos os esclarecimentos e informações, na medida em que os mesmos se revelem necessários às averiguações ou à instrução de processos da sua competência.’.

O n.º 10 do artigo 32.º da CRP apenas estabelece que ‘são assegurados ao arguido os direitos de audiência e defesa’, nada dispondo em matéria de duração, contagem, causas interruptivas ou suspensivas dos processos de contraordenação.

Ora, no presente processo foram inteiramente assegurados os direitos de audição e defesa dos arguidos na medida em que todos os arguidos foram notificados da acusação, tendo apresentado as respetivas defesas, do que os recursos ora em apreciação dão, aliás, testemunho.

Improcede igualmente a invocada violação do artigo 2.º da CRP, respeitante à natureza de Estado de Direito Democrático da República Portuguesa, em particular, quanto à alegada violação dos princípios constitucionais da segurança e certeza jurídica.

Os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança assumem-se como princípios classificadores do Estado de Direito Democrático e implicam um mínimo de certeza e segurança nos direitos das pessoas e nas expectativas juridicamente criadas, a que está imanente uma ideia de proteção da confiança dos cidadãos e da comunidade na ordem jurídica e na atuação do Estado.

Não resulta que a interpretação e aplicação da norma constante do artigo 28.º, n.º 1, alínea b), do RGCO efetuada pela sentença recorrida viole qualquer confiança que os arguidos pudessem ter quanto aos casos em que é aplicável a causa de interrupção de prescrição nele prevista, a saber: com a “realização de quaisquer diligências de prova”.

Improcede, assim, o presente segmento recursivo, relativo a inconstitucionalidade do artigo 28.º, n.º 1, alínea b), do RGCO, invocada pelos recorrentes AA, BB e DD.

I.5 – Da não verificação das causas de suspensão da prescrição previstas na Lei nº 1-A/2020, de 19 de março, e na Lei nº 4-B/2021, de 1 de fevereiro
 
Invocam os Recorrentes BB (cfr. conclusões XVI a XXV) e DD (cfr. conclusões 16 e 17) a inaplicabilidade aos presentes autos das “suspensões covidianas” da prescrição previstas na Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, e na Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, por suposta violação dos princípios da aplicação da lei mais favorável, bem como da não aplicação retroativa da lei penal, arguindo a inconstitucionalidade de tais disposições.

A este propósito, decidiu o Tribunal a quo (pp. 30-32, ênfase aditado) que:
“Dispõe o artigo 28.º, n.º 3, do RGCO, ex vi do artigo 407.º do CdVM, que ‘A prescrição do procedimento tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo da prescrição acrescido de metade.’

Precisamente no que tange às causas de suspensão da prescrição previstas no artigo 28.º, número 3 do RGCO, no caso dos autos verificam-se as seguintes:
- a denominada suspensão covidiana, ocorrida entre 09.03.2020 e 02.06.2020 (portanto, durante 86 dias), por força do disposto no artigo 7.º, n.ºs 1, 6, alínea d), 3, 9 alínea b), da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, na redação dada pelo artigo 2.º da Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril, com produção de efeitos a 09.03.2020, nos termos do artigo 6.º, n.º 2, da Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril; artigos 8.º e 10.º da Lei n.º 16/2020, de 29 de maio.

- ainda no quadro da pandemia mundial, mas desta feita no ano de 2021, os artigos 2.º e 4.º da Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro (que aditou o artigo 6.º-C à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março), e os artigos 6.º e 7.º da Lei n.º 13-B/2021, de 5 de abril (artigo 6.º-C, n.ºs 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março), determinaram a suspensão da prática de actos processuais em procedimentos contraordenacionais, assim como a suspensão dos respectivos prazos prescricionais em curso entre 22.01.2021 e 05.04.2021 (ou seja, durante 74 dias).

A aplicabilidade das sobreditas causas de suspensão da prescrição a autos de natureza contraordenacional foi já discutida no Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, assim como no Colendo Tribunal Constitucional, tendo ambos, invariavelmente, confluído no sentido da sua conformidade jusfundamental, nos arestos n.º 660/2021, n.º 798/2021, e n.º 500/21, ambos disponíveis no site do Tribunal Constitucional.

Em síntese, afirmou-se que:
- a suspensão dos prazos de prescrição foi imposta pela impossibilidade de tramitação dos processos em virtude do “confinamento de emergência”;

- o artigo 27.º-A do RGCO contém um enunciado não taxativo de causas de suspensão que admite a remissão para diplomas autónomos e posteriores sem colidir com os princípios da legalidade e da tipicidade;

- a suspensão em apreço não configura um caso de retroatividade direta ou de primeiro grau, aplicando-se a factos presentes e projetando os seus efeitos para o futuro;

- e tal medida não é arbitrária, nem desproporcional.
Dá-se aqui por reproduzida a sobredita Jurisprudência, incorporando integralmente os subsídios resultantes dos Tribunais Superiores e, não se divisando razão que demande uma inversão daquele trilho, conclui-se pela improcedência do argumentário dos Recorrentes.”

Trata-se de questão já recorrente e que não suscita dúvidas quanto ao entendimento jurisprudencial no sentido contrário ao da pretensão recursiva dos recorrentes, ou seja, da aplicabilidade a procedimentos contraordenacionais como o presente, pendentes à data da entrada em vigor dos referidos diplomas por factos ocorridos com anterioridade, da suspensão de prazos prescricionais prevista nas Leis 1-A/2020 de 19 de março e 4-B/2021 de 1 de fevereiro.

Na verdade, verificou-se nos presentes autos a causa de suspensão prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 27.º-A do RGCO, nos termos da qual (ênfase aditado) “[a] prescrição do procedimento por contra-ordenação suspende-se, para além dos casos especialmente previstos na lei, durante o tempo em que o procedimento:
a) Não puder legalmente iniciar-se ou continuar por falta de autorização legal.”

Por força do disposto no artigo 7.º, n.os 1 e 3, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, na redação dada pelo artigo 2.º da Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril, com produção de efeitos a 09.03.2020, nos termos do artigo 6.º, n.º 2, da Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril; artigos 8.º e 10.º da Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, verificou-se a suspensão, ocasionada pela pandemia por COVID-19, entre 09.03.2020 e 02.06.2020 (ou seja, durante 86 dias), quer dos prazos para a prática de atos processuais (artigo 7.º, n.º 1, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março), quer dos prazos de prescrição (artigo 7.º, n.º 3, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março) dos processos de contraordenação (artigo 7.º, n.º 6, alínea d), da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, na sua redação inicial).

Por seu lado, o artigo 7.º, n.º 1, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, na redação dada pelo artigo 2.º da Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril, estabelece que “[s]em prejuízo do disposto nos números seguintes, todos os prazos para a prática de atos processuais e procedimentais que devam ser praticados no âmbito dos processos e procedimentos que corram termos nos tribunais judiciais, tribunais administrativos e fiscais, Tribunal Constitucional, Tribunal de Contas e demais órgãos jurisdicionais, tribunais arbitrais, Ministério Público, julgados de paz, entidades de resolução alternativa de litígios e órgãos de execução fiscal ficam suspensos até à cessação da situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, a decretar nos termos do número seguinte.” – sublinhados nossos.

Nos termos da alínea b) do n.º 9 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, na redação dada pelo artigo 2.º da Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril, “[o] disposto nos números anteriores aplica-se, com as necessárias adaptações, aos prazos para a prática de atos em: (…) b) Procedimentos contraordenacionais, (…) que corram termos em (…), designadamente entidades administrativas independentes, incluindo a (…) a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (…)” (ênfase aditado).

Nos termos do artigo 6.º, n.º 2, da Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril, “[o] artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, na redação introduzida pela presente lei, produz os seus efeitos a 9 de março de 2020 (…)”.

O artigo 8.º da Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, veio revogar o artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, cujos efeitos se produziram no quarto dia seguinte ao da publicação da Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, nos termos do seu artigo 10.º, ou seja, em 03.06.2020.

Assim, o prazo prescricional das infrações em apreço encontrou-se suspenso, entre 9 de março de 2020 e 2 de junho de 2020 (i.e., durante 86 dias), por força do disposto no artigo 27.º-A do RGCO, conjugado com artigo 7.º, n.º 1 da Lei n.º 1-A/2020, e com os artigos 8.º e 10.º da Lei n.º 16/2020, de 29 de maio.

Acresce que, por força do disposto nos artigos 2.º e 4.º da Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro (que aditou o artigo 6.º-C à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março), e nos artigos 6.º e 7.º da Lei n.º 13-B/2021, de 5 de abril, verificou-se a suspensão, ocasionada pela pandemia por COVID-19, entre 22.01.2021 e 05.04.2021 (ou seja, durante 74 dias), quer dos prazos para a prática de atos processuais em “Procedimentos contraordenacionais (…) que corram termos em serviços da administração direta, indireta, regional e autárquica, e demais entidades administrativas, designadamente (…) a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários” (artigo 6.º-C, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março), quer dos respetivos prazos de prescrição (artigo 6.º-C, n.ºs 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março).

Com efeito, o artigo 2.º da Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, aditou o artigo 6.º-C à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, o qual dispõe (i) no seu n.º 1, alínea b), a suspensão dos prazos para a prática de atos em procedimentos contraordenacionais que corram termos junto da CMVM, (ii) no seu n.º 3 a suspensão dos “prazos de prescrição e de caducidade relativos a todos os procedimentos identificados no n.º 1” e (iii) no seu n.º 4 que “O disposto no número anterior prevalece sobre quaisquer regimes que estabeleçam prazos máximos imperativos de prescrição ou caducidade, aos quais acresce o período de tempo em que vigorar a suspensão.” (ênfase aditado), dispondo o artigo 4.º da Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, que “o disposto nos artigos 6.º-B a 6.º-D da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, produz efeitos a 22 de janeiro de 2021”.

Ora, a Lei n.º 13-B/2021, de 5 de abril, que entrou em vigor em 06.04.2021 (artigo 7.º), ao revogar o artigo 6.º-C da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março (artigo 6.º), determinou a cessação do regime de suspensão de prazos processuais e procedimentais adotado no âmbito da pandemia da doença COVID-19, previsto no artigo 6.º-C da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março.
A aplicação dos n.os 1 e 3 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março (na sua redação original), e bem assim, no artigo 6.º-C, nºs 1 e 3, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março de 2020, na redação dada pela Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, aos processos de contraordenação da competência da CMVM, determina que o legislador estabeleceu, na verdade, (i) a suspensão dos prazos para a prática de atos processuais (n.º 1 do artigo 7.º, com as exceções estatuídas nos n.os seguintes, e n.º 1 do artigo 6.º-C), bem como (ii) uma causa de suspensão dos prazos de prescrição (n.º 3 do artigo 7.º e n.º 1 do artigo 6.º-C).

Termos em que, ao contrário do pretendido pelos recorrentes BB e DD, se verificaram as causas de suspensão da prescrição previstas na Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março e na Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro no presente procedimento contraordenacional, improcedendo assim o correspondente segmento recursivo.

I.6 – Da inconstitucionalidade das normas relativas à aplicação das causas de suspensão da prescrição previstas na Lei nº 1-A/2020, de 19 de março, e na Lei nº 4-B/2021, de 1 de fevereiro

Alegam os recorrentes BB (conclusões XXI e XXV) e DD (conclusões 20, 22 e 24), que a aplicação ao presente procedimento contraordenacional das causas de suspensão da prescrição em apreço (previstas nas Leis 1-A/2020, de 19 de março, e 4-B/2021, de 1 de fevereiro) colide de forma constitucionalmente inadmissível com os preceitos constitucionais que consignam os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança que enformam o princípio do Estado de Direito (artigo 2.º da CRP) e os valores protegidos pelos princípios da proibição da retroatividade de lei desfavorável e da retroatividade de lei favorável (artigo 29.º da CRP).

Mais invoca, o recorrente DD (conclusões 20, 21 e 22), a inconstitucionalidade das normas relativas à aplicação das causas de suspensão da prescrição previstas na Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março e na Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, por violação dos artigos 13.º, n.º 1, (princípio da igualdade), 19.º, n.º 6, (nos termos do qual “A declaração do estado de sítio ou do estado de emergência em nenhum caso pode afectar os direitos à vida, à integridade pessoal, à identidade pessoal, a capacidade civil e à cidadania, a não retroactividade da lei criminal, o direito de defesa dos arguidos e a liberdade de consciência e de religião”), 18.º, n.º 3 (princípio da proporcionalidade) e 32.º, n.ºs 1 e 10, (garantias do direito de defesa do arguido) da CRP.

A propósito, pronunciou-se a sentença recorrida nos seguintes termos (i. a. pp. 30-33, ênfase aditado):

De um lado, a denominada suspensão covidiana, ocorrida entre 09.03.2020 e 02.06.2020 (portanto, durante 86 dias), por força do disposto no artigo 7.º, n. os 1, 6, alínea d), 3, 9 alínea b), da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, na redação dada pelo artigo 2.º da Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril, com produção de efeitos a 09.03.2020, nos termos do artigo 6.º, n.º 2, da Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril; artigos 8.º e 10.º da Lei n.º 16/2020, de 29 de maio.
Por outro lado, ainda no quadro da pandemia mundial, mas desta feita no ano de 2021, os artigos 2.º e 4.º da Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro (que aditou o artigo 6.º-C à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março), e os artigos 6.º e 7.º da Lei n.º 13-B/2021, de 5 de abril (artigo 6.º-C, n.ºs 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março), determinaram a suspensão da prática de actos processuais em procedimentos contraordenacionais, assim como a suspensão dos respectivos prazos prescricionais em curso entre 22.01.2021 e 05.04.2021 (ou seja, durante 74 dias).
A aplicabilidade das sobreditas causas de suspensão da prescrição a autos de natureza contraordenacional foi já discutida no Venerando Tribunal da Relação de Lisboa[8], assim como no Colendo Tribunal Constitucional, tendo ambos, invariavelmente, confluído no sentido da sua conformidade jusfundamental, nos arestos n.º 660/2021, n.º 798/2021, e n.º 500/21, ambos disponíveis no site do Tribunal Constitucional.
Em síntese, afirmou-se que:
- a suspensão dos prazos de prescrição foi imposta pela impossibilidade de tramitação dos processos em virtude do “confinamento de emergência”;
- o artigo 27.º-A do RGCO contém um enunciado não taxativo de causas de suspensão que admite a remissão para diplomas autónomos e posteriores sem colidir com os princípios da legalidade e da tipicidade;
- a suspensão em apreço não configura um caso de retroatividade direta ou de primeiro grau, aplicando-se a factos presentes e projetando os seus efeitos para o futuro;
- e tal medida não é arbitrária, nem desproporcional.
Dá-se aqui por reproduzida a sobredita Jurisprudência, incorporando integralmente os subsídios resultantes dos Tribunais Superiores e, não se divisando razão que demande uma inversão daquele trilho, conclui-se pela improcedência do argumentário dos Recorrentes.
No caso subjudice, as dúvidas suscitadas pela legislação covidiana foram colocadas, pelos Recorrentes, à Recorrida, em atuação de transparência, boa-fé e segurança jurídica:
- através de requerimentos de 20.03.2020 e 24.03.2020, os arguidos CC, DD e BES requereram a clarificação do termo do prazo para apresentação da defesa atento o disposto no artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, que aprovou medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19 (fls. 4246-4254, 4255-4258 e 4259-4260);
- Em 25.03.2020, o Conselho de Administração da CMVM deliberou esclarecer todos os arguidos que é entendimento da CMVM que, nos termos do disposto no artigo 10.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, o regime previsto no artigo 7.º daquela lei produzia efeitos desde 09.03.2020 e que, em consequência, o prazo para apresentação das contestações se suspendeu nessa data, retomando a sua contagem quando, nos termos do disposto no artigo 7.º, n.º 2, da referida lei, cessasse o referido regime, tendo notificado todos os arguidos dessa decisão (fls. 4268-4279 e 4280-4297);
- Através de requerimento de 29.05.2020, o arguido CC requereu a clarificação do termo do prazo para apresentação da defesa (fls. 4452-4464), tendo o Conselho de Administração da CMVM, em 09.06.2020, deliberado esclarecer todos os arguidos ser entendimento da CMVM que a contagem do prazo para apresentação de defesa se havia iniciado em 20.02.2020, suspendido em 09.03.2020, retomada a contagem em 03.06.2020, pelo que terminava em 01.07.2020, tendo notificado todos os arguidos dessa decisão (fls. 4465-4471 e 4472-4489).
Os Recorrentes tiveram, assim, devidamente acautelado o exercício do direito de defesa, contraditório e acesso ao direito, na dimensão acesso a tutela jurisdicional efetiva.

Com efeito, no Acórdão n.º 500/2021, decidiu o Tribunal Constitucional “[n]ão julgar inconstitucional o artigo 7.º, n.ºs 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, interpretado no sentido de que a causa de suspensão do prazo de prescrição do procedimento contraordenacional aí prevista é aplicável aos processos a correr termos por factos cometidos antes do início da respetiva vigência”.

E, no Acórdão n.º 660/2021, decidiu o Tribunal Constitucional “[n]ão julgar inconstitucional a interpretação do artigo 7.º, n.ºs 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, no sentido «de que a causa de suspensão dos prazos de prescrição do procedimento contraordenacional aí prevista se aplica aos prazos que, à data da sua entrada em vigor, se encontram já em curso»”.

Como pode ler-se no Acórdão n.º 500/2021 do Tribunal Constitucional, a ratio decidendi do Tribunal Constitucional alicerçou-se no “particular e especialíssimo contexto que está subjacente à fixação, por lei parlamentar, de uma causa de suspensão a prescrição que não somente é transitória, como se destinou a vigorar apenas e só durante o período em que se mantivesse – e se manteve – o condicionamento à atividade dos tribunais determinado pela situação excecional de emergência sanitária e pelo concomitante imperativo de proteção da vida e da saúde dos operadores e utentes do sistema judiciário: suspendeu-se o decurso do prazo de prescrição, porque se suspenderam os prazos previstos para a prática de atos suscetíveis de obstar à sua verificação; suspenderam-se os prazos previstos para a prática desses (e de outros) atos processuais porque se suspendeu a atividade normal dos tribunais de modo a prevenir e conter o risco de infeção dos intervenientes no sistema da administração da justiça, incluindo dos próprios arguidos”.

Concluindo que: “ao proibir que qualquer cidadão seja «sentenciado criminalmente senão em virtude de lei anterior que declare punível a ação ou a omissão» ou sofra pena que não esteja expressamente cominada «em lei anterior» ou mais grave do que a prevista «no momento da correspondente conduta ou da verificação dos respetivos pressupostos», o artigo 29.º da Constituição, respetivamente nos seus n.ºs 1, 3 e 4, não se opõe à aplicação de uma causa de suspensão da prescrição com a função e o recorte daquela que foi prevista no artigo 7.º, n.ºs 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, a procedimentos contraordenacionais pendentes por factos praticados antes do início da respetiva vigência”.

Por seu turno, no Acórdão n.º 660/2021, o Tribunal Constitucional consignou que  (ênfase aditado):
‘[...] a causa de suspensão da prescrição prevista no artigo 7.º, n.ºs 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, deve ser lida como uma decorrência necessária da paralisação da atividade dos tribunais portugueses e da sustação do rito processual, quase generalizado, durante o período de 9 de março a 3 de junho de 2020, dos processos de grande parte das jurisdições.

Naturalmente, a sua consagração não radicou em nenhum objetivo de política criminal. (...)
A razão de ser desta causa de suspensão derivou, única e exclusivamente, da situação de emergência sanitária e que originou o estancamento da atividade judiciária, por um determinado período.
Tal premissa conduz-nos à conclusão de que as finalidades subjacentes ao próprio regime da prescrição, que ditam a sujeição desta causa de suspensão ao princípio da proibição da aplicação retroativa da lei penal, não se verificam, porquanto não presidiu à sua consagração uma finalidade de política criminal que reclame o freio do princípio da legalidade, como defesa do cidadão perante o ius puniendi do Estado: pelas razões descritas, nem está em causa reverter sobre o arguido as consequências da inércia pretérita do Estado, nem uma violação do princípio da confiança, já que o evento era imprevisível, para além do arguido, para qualquer outro sujeito processual e para o próprio Estado titular da ação penal, não sendo a situação de pandemia, pela sua imprevisibilidade, apta a constituir um quadro de referência sobre o qual se possa falar de “confiança” (essencialmente no mesmo sentido, v. o já citado Acórdão n.º 500/2021).

Acresce que nos parece evidente que a intenção do legislador era a aplicação desta causa de suspensão da prescrição a processos em curso, aquando da sua entrada em vigor, isto é, a factos cometidos antes dessa data, por serem esses mesmos procedimentos que sofreram uma “torção” na sua tramitação com a sustação da respetiva tramitação. Como tem sido evidenciado pela jurisprudência constitucional acima elencada, para além de não existir um direito subjetivo à prescrição do procedimento criminal, é também legítimo que o legislador contemple causas de suspensão em diplomas especiais, desde que sejam suficientemente precisas e emitidas pela Assembleia da República, o que se verifica neste caso (cfr. Acórdão n.º 449/2002).

Assim, consideramos que a aplicação imediata desta causa de suspensão a processos em curso não colide com as garantias asseguradas pelo princípio da proibição da aplicação retroativa da lei penal, quando, como é o caso, no momento da sua entrada em vigor, o prazo de prescrição já se tinha iniciado e, apesar de se encontrar em curso, não se havia ainda extinto – aliás, encontra-se fora do respetivo âmbito de proteção (v., de novo, o Acórdão n.º 500/2021)”.

Em idêntico sentido, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 798/2021[9], proferido em 21.10.2021, no âmbito do processo n.º 164/2021, igualmente citado na decisão recorrida, decidiu (ênfase aditado):
‘não julgar inconstitucional a norma contida no artigo 7.º, n.º 3, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, interpretado no sentido de que a suspensão da prescrição aí prevista é aplicável aos processos contraordenacionais em que estejam em causa alegados factos ilícitos imputados ao arguido praticados antes da data da sua entrada em vigor, que nessa data se encontrem pendentes;’.

Em sentido concordante com a jurisprudência constitucional vinda referir, pronunciou-se já esta Secção P.I.C.R.S. do Tribunal da Relação de Lisboa nos Acórdãos proferidos nos processos n.ºs 164/19...., 124/18.8YUSTR.L2, 309/20.7YUSTR-L1, 178/20.7YUSTR.L1 e 290/20.2YUSTR.L1.

Com efeito, por Acórdão de 06.04.2021, proferido no processo n.º 178/20.7YUSTR.L1, o Tribunal da Relação de Lisboa sustentou a aplicação da causa de suspensão imposta pelo artigo 7.º, n.º 3, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, aos prazos em curso, bem como a conformidade constitucional dessa solução, com fundamento designadamente nos seguintes argumentos (ênfase aditado):
- ‘[A causa de suspensão dos prazos de prescrição] corresponde a uma réplica legislativa a uma vera impossibilidade física, a saber, a de promover e materializar a tramitação dos processos em virtude do confinamento de emergência”, não surgindo como “vontade e acção do legislador mas da força inelutável de fenómeno físico que a todos se impõe’;

- ‘[O n.º 1 do artigo 27.º-A do RGCO contém, a propósito da suspensão, enunciado não taxativo, ao ressalvar os casos previstos na lei”, técnica essa que “não agride os princípios da legalidade e sua derivada tipicidade que requerem enunciado, verbalização precisa, mas não exigem concentração das fórmulas ou carácter coevo do enunciado podendo, pois, a norma constar de um diploma autónomo e ser posterior’;

- ‘Não estamos perante retroactividade directa ou de primeiro grau, no sentido de aplicação de regra nova a contexto passado mas face a aplicação de preceito a quadro temporal futuro relativo a realidade contemporânea a pendência processual’;

- ‘[Inexiste qualquer inconstitucionalidade, posto que] [n]ão há arbitrariedade, surpresa, desproporção ou um gorar de expectativas” e que “[o] princípio da confiança não reclama que se materialize a possibilidade de serem conhecidas todas as causas de suspensão do prazo de prescrição no momento da consumação do ilícito”, sob pena de ser “retirado ao Estado a possibilidade de reagir em emergência perante situação física portadora de particular gravidade colectiva, imprevisível no contexto temporal da aludida consumação.’.

A ratio decidendi deste Acórdão é clara: (i) a suspensão dos prazos de prescrição foi imposta pela impossibilidade de tramitação dos processos em virtude do “confinamento de emergência”; (ii) o artigo 27.º-A do RGCO contém um enunciado não taxativo de causas de suspensão que admite a remissão para diplomas autónomos e posteriores sem colidir com os princípios da legalidade e da tipicidade; (iii) a suspensão em apreço não configura um caso de retroatividade direta ou de primeiro grau, aplicando-se a factos presentes e projetando os seus efeitos para o futuro; e (iv) tal medida não é arbitrária, nem desproporcional.

Tendo decidido que “[n]ão há, efectivamente, qualquer quadro de inconstitucionalidade no reconhecimento da validade da intervenção normativa de suspensão dos prazos processuais.” (ênfase aditado).

Conforme decidido no citado aresto, inexiste qualquer inconstitucionalidade, posto que “[n]ão há arbitrariedade, surpresa, desproporção ou um gorar de expectativas” e que “[o] princípio da confiança não reclama que se materialize a possibilidade de serem conhecidas todas as causas de suspensão do prazo de prescrição no momento da consumação do ilícito”, sob pena de ser “retirado ao Estado a possibilidade de reagir em emergência perante situação física portadora de particular gravidade colectiva, imprevisível no contexto temporal da aludida consumação.”.

Sendo certo que o Tribunal Constitucional, no Acórdão n.º 500/2021, asseverou que “[n]ão é diferente a conclusão a que se chega se encararmos a proibição da retroatividade in pejus a partir da proteção da confiança, como fez o Tribunal recorrido. Se tal proibição visa garantir ao destinatário uma previsibilidade razoável das consequências com que se deparará ao violar o preceito penal, é relativamente evidente, quando se trate de estender o respetivo âmbito de incidência para além dos limites traçados pela letra dos n.ºs 1, 3 e 4, do artigo 29.º, que a sua invocação deixará de ter fundamento se o evento em causa se situar no mais elevado grau daquilo que não é por natureza antecipável, como sucede com a paralisação do sistema de administração da justiça penal ditada pelo súbito e inesperado surgimento de uma pandemia à escala global”.

Do exposto resulta, pois, a improcedência do alegado pelos recorrentes BB e DD, posto que a aplicação aos factos que constituem o objeto do presente processo de contraordenação da causa de suspensão do prazo de prescrição em função do contexto pandémico, não ofende a proibição constitucional da aplicação retroativa de lei sancionatória desfavorável.

Note-se, aliás, que a circunstância de a suspensão do prazo para a prática dos actos ditada pelo artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, que impede o prosseguimento do procedimento contraordenacional não traduz qualquer inércia do Estado no exercício dos ius puniendi, sendo um fator exógeno e não removível pela autoridade competente.

No caso concreto, a “suspensão do prazo para a prática dos atos” determinada pela Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março e pela Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, impediu efetivamente o prosseguimento pela CMVM do presente processo contraordenacional.

Com efeito, por um lado, a primeira suspensão covidiana (entre 09.03.2020 e 02.06.2020, i.e., durante 86 dias) levou a que o decurso do prazo de apresentação de defesa dos arguidos tivesse ficado igualmente suspenso.

Circunstância que aproveitou aos recorrentes BB e DD, que  aproveitaram de mais 86 dias para apresentaram as respetivas defesas por efeito da suspensão de prazos decorrente da Lei nº 1-A/2020 de 19 de março que, em total transparência e a requerimento dos próprios, lhes foi notificada, como recordado na sentença recorrida (citação supra, pp. 32-33).
 
Não há, assim, qualquer inconsistência entre a suspensão da prescrição do presente procedimento contraordenacional, decorrente da aplicação das normas de contingência aprovadas para acudir à situação pandémica (máxime Leis 1-A/2020, de 19 de março, e 4-B/2021, de 1 de fevereiro), e direitos fundamentais constitucionalmente tutelados, designadamente da segurança jurídica (artigo 2º da CRP), e da proibição da retroactividade de lei desfavorável (artigo 29º da CRP).

Tratando-se de normas decorrentes de situação pandémica e por conseguinte por natureza contingentes e de aplicação transversal, não se vislumbra, igualmente, entorse ao princípio da igualdade acautelado pelo artigo 2º da CRP, nos termos do qual ‘Todos os cidadãos são iguais perante a lei’, contrariamente ao alegado pelo recorrente DD.

Não decorrendo das ditas normas qualquer restrição ao direito de defesa dos arguidos ou aplicação retroactiva da lei criminal, já que, por um lado, nos encontramos em contexto contraordenacional e, por outro lado, a referida legislação aprovada para acudir à situação pandémica não contém normas incriminatórias, mas de mera gestão (suspensão) processual, Tão pouco se vislumbram as inconstitucionalidades invocadas pelo recorrente DD, por violação dos artigos 19º, nº 6 (nos termos do qual  ‘A declaração do estado de […] emergência em nenhum caso pode afectar […] a não retroactividade da lei criminal, o direito de defesa dos arguidos […]’), e 32º, nºs 1 e 10 (garantias do direito de defesa do arguido) da CRP.

Finalmente, como amplamente reconhecido já nos arestos citados supra, tais normas não são nem arbitrárias, nem desproporcionais, não se verificando a inconsistência com o princípio da proporcionalidade acautelado no artigo 18º, nº 3, da CRP, invocada pelo recorrente DD.

Termos em que improcedem, quanto a estes pontos, as alegações dos recorrentes BB e DD.

I.7 – Da duração máxima de 6 meses das causas de suspensão do prazo de prescrição

Vem o Recorrente DD defender o decurso do prazo de prescrição (5 anos) acrescido de metade (2 anos e 6 meses), sem que se tenha verificado qualquer causa de suspensão (que não pode ultrapassar 6 meses), pelo que o prazo máximo legal da prescrição é de 8 anos e ocorreu em 15.05.2022 – conclusões 16 e 17.

Vejamos.
Como se recorda na sentença recorrida (p. 30, ênfase aditado):
‘Dispõe o artigo 28.º, n.º 3, do RGCO, ex vi do artigo 407.º do CdVM, que a prescrição do procedimento tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo da prescrição acrescido de metade.’

Relativamente à suspensão da prescrição, determina o artigo 27.º-A do RGCO, aplicável ex vi do artigo 407.º do CdVM, que (ênfase aditado):
‘1. A prescrição do procedimento por contraordenação suspende-se, para além dos casos especialmente previstos na lei, durante o tempo em que o procedimento:
a) Não puder legalmente iniciar-se ou continuar por falta de autorização legal;
b) Estiver pendente a partir do envio do processo ao Ministério Público até à sua devolução à autoridade administrativa, nos termos do artigo 40.º.
c) Estiver pendente a partir da notificação do despacho que procede ao exame preliminar do recurso da decisão da autoridade administrativa que aplica a coima, até à decisão final do recurso.
2. Nos casos previstos nas alíneas b) e c) do número anterior, a suspensão não pode ultrapassar seis meses.’

Do exposto resulta que as causas de suspensão reconduzíveis à alínea a) do n.º 1 do artigo 27.º-A do RGCO – como é o caso das suspensões decorrentes da situação pandémica (entre 09.03.2020 e 02.06.2020, i.e., durante 86 dias e entre 22.01.2021 e 05.04.2021, i.e., durante 74 dias) – não se encontram sujeitas ao prazo máximo de 6 meses previsto no n.º 2 do artigo 27.º-A do RGCO.

Devem, assim, ser considerados, na contagem da prescrição a totalidade dos 160 dias (86 dias + 74 dias) correspondentes às também chamadas ‘suspensões covidianas’, reconduzíveis à alínea a) do n.º 1 do artigo 27.º-A do RGCO.

A que acresce, ainda, a suspensão prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 27.º-A do RGCO, a qual, essa sim, ‘não pode ultrapassar seis meses’, nos termos do n.º 2 do artigo 27.º-A do RGCO.

Como resulta claro da mera leitura do disposto na alínea c) do n.º 1 da norma, o prazo de prescrição suspende-se desde a data da notificação aos sujeitos processuais do despacho proferido que procede ao exame preliminar do recurso – a qual teve lugar em 1.04.2022 – até à decisão final do recurso, a qual não teve ainda lugar, pois que se encontram pendentes os Recursos a que ora se responde.

Com efeito, a referência a “decisão final do recurso” não se refere à decisão proferida, em primeira instância, pelo Tribunal a quo, mas à última decisão que venha a ser proferida nos presentes autos.

Isso mesmo foi afirmado pelo Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 4/2011, nos termos do qual:
A suspensão do procedimento por contra-ordenação cuja causa está prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 27.0º-A do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, inicia-se com a notificação do despacho que procede ao exame preliminar da impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa e cessa, sem prejuízo da duração máxima imposta pelo n.º 2 do mesmo artigo, com a última decisão judicial que vier a ser proferida na fase prevista no capítulo IV da parte II do Regime Geral das Contra-Ordenações.

Esclarecendo-se, na parte dispositiva do referido Acórdão de Uniformização de Jurisprudência que:
O conhecimento do fim visado pelo legislador e das circunstâncias que motivaram a decisão legislativa habilitam a definir o exacto sentido da expressão «decisão final do recurso» como sendo a última decisão judicial que vier a ser proferida na fase de recurso do procedimento contra-ordenacional.’

Ou, nas palavras de Paulo Pinto de Albuquerque[10], ‘a expressão «decisão final do recurso» reporta-se à última decisão jurisdicional que põe fim ao processo contra-ordenacional e não à decisão em primeira instância’.

Isto, sem prejuízo da causa de suspensão prevista no n.º 2 do artigo 418.º do CdVM.

Improcede, assim, este segmento da pretensão recursiva do recorrente DD, no sentido de o presente procedimento contraordenacional ter em qualquer caso a duração máxima de 8 anos, a contar da data da infracção, porquanto o prazo máximo de suspensão seria sempre de 6 meses, encontrando-se já prescrito.

I.8 -  Da ilegalidade e inconstitucionalidade da aplicação do prazo de prescrição previsto no artigo 418º, nº 1, alínea na), do CdVM, na redacção introduzida pela Lei nº 28/2017, de 30 de maio

O recorrente BB alega a ilegalidade e inconstitucionaldade da aplicação retroativa do artigo 418.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na redação da Lei n.º 28/2017, de 30 de maio, por contrariar o artigo 3.º do RGCO (que determina a aplicação da lei para o futuro, exceto se a lei nova for mais favorável) e os artigos 2º (Estado de direito democrático) e 29º (não retroactividade da lei criminal) da CRP  (conclusões XXVI, XXVII, XXX).

Também o recorrente DD alega que a sentença recorrida padece de erro de direito e inconstitucionalidade, por aplicação ao caso concreto do artigo 418.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio, em violação (i) do artigo 3.º RGCO aplicável ex vi do artigo 407.º CdVM, ou subsidiariamente, da alínea a) do n.º 2 do artigo 5.º do CPP, aplicável ex vi do artigo 407.º do CVM e do artigo 41.º do RGCO, e (ii) dos artigos 1º (República baseada na dignidade da pessoa humana), 18º (A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmemte protegidos) e 29º (não retroactividade em matéria incriminatória) da CRP (conclusões 4 a 6 e 10).

Sobre a matéria em apreciação, a sentença recorrida menciona o seguinte (p. 43, ênfase aditado):
‘Segundo jurisprudência preconizada pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, nos autos de RCO n.º 293/21.... (J... deste TCRS),

III. Atentos os interesses públicos subjacentes às alterações introduzidas no CdVM, de garantir a execução efetiva da política europeia destinada a assegurar a integridade dos mercados financeiros, impõe-se aplicar a suspensão do prazo de prescrição prevista na nova redação do art. 418º do CdVM, aos processos contraordenacionais pendentes por factos praticados antes da sua entrada em vigor.

Tal Jurisprudência encontra-se em coerência com o mesmo sentido jurisprudencial que foi acolhido para o RGISCSF, considerando, de igual modo, o Venerando Tribunal Superior que os interesses públicos subjacentes, acomodavam a aplicação, a autos contraordenacionais, de prazos prescricionais em vigor à data da entrada em juízo dos recursos de impugnação. Assim sucedeu, nos autos de RCO n.º 249/17.... e RCO n.º 74/19...., ambos do J... deste TCRS.
Em conformidade com tal Jurisprudência, que se acha sedimentada pelo menos quanto aos autos decorrentes deste J... por estar transitada em julgado, sempre haveria que aplicar a estes autos o artigo 418.º do CdVM na redação introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de Maio, por ser a que estava em vigor à data do recebimento do recurso de impugnação judicial (2022).
Donde, nos termos constantes na alínea a) do número 1 do artigo 418.º do CdVM, o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional é de 8 anos.’

Não obstante a declaração da admissibilidade da aplicabilidade do artigo 418.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na redação introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio, à luz da jurisprudência citada, a sentença recorrida não retirou qualquer consequência jurídica dessa declaração.

Resulta evidente do dispositivo da sentença que a sentença recorrida aplicou o artigo 418.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na redação em vigor à data da prática dos factos (pp. 824-825, ênfase aditado):
‘[…] Não obstante, os autos surgem para apreciação judicial deste Tribunal, (apenas) em 2022 e apenas a 6 meses da prescrição, tendo-se exaurido, na fase administrativa, todas as causas de suspensão da prescrição, incluindo as de natureza superveniente e imprevisível, como as decorrentes da legislação aprovada no quadro da pandemia mundial (Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março e subsequentes alterações). […].’

Tal afirmação é incompatível com a aplicação pela sentença recorrida do prazo de prescrição de 8 anos previsto no artigo 418.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na redação introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio.

Note-se, aliás, que – ainda antes de considerar aplicável o artigo 418.º do CdVM na redação introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de Maio ‘em conformidade com tal Jurisprudência’ – o Tribunal a quo já tinha julgado (p. 42, ênfase aditado) que, na data em que foi proferida sentença, o procedimento contraordenacional não se encontrava prescrito:
‘Não assiste, pois, razão aos Recorrentes e não se verifica a prescrição do procedimento contraordenacional, de acordo com a legislação em vigor à data da prática dos factos.’

Não tendo sido aplicado pela sentença recorrida o prazo de prescrição previsto no artigo 418.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na redação introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio, fica prejudicada a apreciação da questão da ilegalidade ou inconstitucionalidade da aplicação da referida norma invocada pelos Recorrentes BB e DD.

I.9 – Da ilegalidade e inconstitucionalidade da aplicação da nova suspensão do prazo de prescrição prevista no artigo 418º, nº 2, do CdVM

Os recorrentes BB (conclusões XXVI, XXVII, XXX), CC (conclusão 34) e DD (conclusões 4, 7 e 10) alegam que o n.º 2 do artigo 418.º do CdVM interpretado e aplicado pelo Tribunal a quo na página 43 da Sentença recorrida, redundaria na aplicação retroativa de uma norma prejudicial ao Recorrente, proibida pelo artigo 3.º do RGCO ex vi artigo 407.º CdVM, que determina a aplicação da lei para o futuro, exceto se a lei nova for mais favorável, ou subsidiariamente, da alínea a) do n.º 2 do artigo 5.º do CPP, aplicável ex vi do artigo 407.º do CVM e do artigo 41.º do RGCO.

Mais invocaram os recorrentes BB (conclusões XXXI, XXXII e XXXIII), CC (conclusões 24 a 37) e DD (conclusões 7, 8, 9 e 11) que a norma constante do n.º 2 do artigo 418.º do CdVM, que estabelece uma “nova causa de suspensão” do prazo de prescrição, na interpretação efetuada pelo Tribunal a quo (no sentido de que a mesma é aplicável a processos contraordenacionais pendentes quando da sua entrada em vigor, por factos ocorridos antes da sua entrada em vigor), é inconstitucional por violação dos artigos 2.º, 18.º, n.º 3, 29.º, n.ºs 1 e 4, e 32.º, n.ºs 1 e 10 da Constituição.

A este propósito, refere-se na sentença recorrida o seguinte (p. 43, ênfase aditado):
‘E, a final, é susceptível de operar a causa de suspensão da prescrição a que alude o número 2 do artigo 418.º do Código de Valores Mobiliários, na versão introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de Maio.’

Assim, a sentença recorrida não aplicou a suspensão do prazo de prescrição prevista no artigo 418.º, n.º 2, do CdVM, na redação introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio, tendo-se limitado a referir que ‘a final’, tal suspensão ‘é susceptível de operar’.

Na verdade, o Tribunal a quo limitou-se a declarar (p. 42, ênfase aditado) que, na data em que foi proferida sentença, o procedimento contraordenacional não se encontrava prescrito:
‘Não assiste, pois, razão aos Recorrentes e não se verifica a prescrição do procedimento contraordenacional, de acordo com a legislação em vigor à data da prática dos factos.’

O que bem se compreende, pois a prolação de sentença confirmando total ou parcialmente a decisão condenatória da decisão administrativa de condenação (in casu, da CMVM) é pressuposto, e termo inicial, da dita suspensão.

Não tendo sido aplicado pela sentença recorrida a causa de suspensão da prescrição prevista no artigo 418.º, n.º 2, do CdVM, na redação introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio, fica prejudicada a apreciação da questão ilegalidade e/ou inconstitucionalidade da aplicação da referida norma invocada pelos recorrentes BB, CC e DD, por extravasar o âmbito do dispositivo impugnado.

Sempre se dirá, porém, que a suspensão da contagem do prazo de prescrição num processo contraordenacional por força da aplicação do disposto no artigo 418.º, n.º 2 do CdVM não corresponde a um caso de retroatividade legal ou constitucionalmente proibida.

Dispõe o n.º 2 do artigo 418.º do CdVM (ênfase aditado):

 ‘[s]em prejuízo de outras causas de suspensão ou de interrupção da prescrição, o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional suspende-se em caso de confirmação, total ou parcial, pelo tribunal de primeira instância ou pelo tribunal de recurso da decisão administrativa de condenação’.

A referida disposição não vem alterar a qualificação do facto típico nem sequer o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional previsto na lei antiga, mas apenas estabelecer uma causa de suspensão da contagem do dito prazo.

Enquanto norma que prevê uma causa de suspensão da contagem do prazo de prescrição, não se encontra numa sucessão de leis contraordenacionais que obrigue à escolha do regime concretamente mais favorável, na medida em que, nomeadamente, não substitui uma lei anterior, que fixa o prazo de prescrição.

A suspensão do prazo de prescrição prevista no artigo 418.º, n.º 2, do CdVM, dispondo sobre o procedimento contraordenacional e não sobre o facto (ilícito), é uma lei especial de natureza processual, estando a possibilidade de uma lei especial suspender a prescrição antecipadamente prevista no artigo 27.º-A, n.º 1, do RGCO, como, de resto, no artigo 120.º, n.º 1, do Código Penal.

A suspensão do prazo de prescrição a partir da prolação da sentença ora recorrida não pode constituir um caso de retroatividade (proibida), já que a causa de suspensão, tal como se encontra prevista no artigo 418.º, n.º 2, do CdVM, opera por via da verificação de um facto jurídico – a confirmação da decisão condenatória da autoridade administrativa – que, no caso em apreço, ocorreu após a entrada em vigor da lei.

Este regime legal é, assim, perfeitamente compatível com os valores do Estado de Direito: legalidade, igualdade, proporcionalidade, previsibilidade e segurança jurídica e garantias de defesa no processo, como, aliás, já decidido por este por Acórdão de 2.12.2021 do TRL perante norma semelhante do RGICSF (artigo 209.º) no âmbito do Processo n.º 127/19.5YUSTR.L1 e, ainda, por Despacho proferido no processo 249/17.....

Em ambas as decisões deste Tribunal, entendeu-se, com fundamento na jurisprudência fixada nos Acórdãos 500/2021 e 660/2020, referidos supra, e estribando-se nas posições doutrinais defendidas por Gian Luigi Gatta e por Frederico da Costa Pinto, que as soluções legislativas que estabelecem causas de suspensão da prescrição, ainda que em data posterior à prática dos factos objeto do processo, são aplicáveis à contagem do prazo de prescrição nos processos de contraordenação em que o prazo de prescrição vigente à data da prática dos factos não tenha ainda decorrido.

Veja-se o decidido no referido Acórdão de 2 de dezembro de 2021, proferido no âmbito do Processo n.º 127/19.5YUSTR.L1 (ênfase aditado):
‘[…] Ora, em face da jurisprudência citada e muito recente do Tribunal Constitucional em matéria de aplicação aos processos pendentes em matéria de causas e prazos de suspensão do procedimento contra-ordenacional decorrentes da legislação publicada por força da pandemia que tem assolado o mundo, e dos argumentos ali invocados, não encontramos razão que justifique a não aplicação do prazo mais longo de suspensão, desde logo atenta a natureza contra-ordenacional (e não criminal) das infracções em causa, e bem assim a circunstância de se tratar disso mesmo, de um alargamento do prazo de suspensão, e não de uma causa de interrupção, não inutilizando o tempo decorrido até à sua entrada em vigor, apenas se aplicando para o futuro desde a data da entrada em vigor do diploma que prevê tal alargamento. […]

Ora, não se podendo inferir do princípio da confiança, que constitui corolário do Estado de direito democrático, a exata cognoscibilidade de todas as causas de suspensão do prazo de prescrição do procedimento criminal no momento da prática do facto consideramos que a aplicação imediata desta causa de suspensão a processos em curso não colide com as garantias asseguradas pelo princípio da proibição da aplicação retroativa da lei penal, quando, como é o caso, no momento da sua entrada em vigor, o prazo de prescrição já se tinha iniciado e, apesar de se encontrar em curso, não se havia ainda extinto – aliás, encontra-se fora do respetivo âmbito de proteção (cf., de novo, o Acórdão n.º 500/2021).

Quer isto dizer que, na linha de pensamento de GIAN LUIGI GATTA, e FREDERICO COSTA PINTO a que já fizemos referência, quando o prazo de prescrição não tenha ainda atingido o seu fim, ao determinar o prolongamento da suspensão do mesmo prazo, a lei superveniente não torna punível um facto não punível – o legislador não altera, no preceito indicado, a sua valoração sobre o facto típico ou a imputação do mesmo - nem agrava a sanção respetiva: o legislador limita-se a conceder ao Estado, por qualquer motivo, neste caso por força de crise financeira de efeitos devastadores da economia mundial, e dos rendimentos e poupanças dos contribuintes (que estiveram sujeitos a severas medidas de restrição), mais tempo para apurar os factos e a responsabilidade criminal.

Não estamos, pois, perante um caso de sucessão de leis penais no tempo, pelo que não estamos no âmbito do artigo 29º, n.º 4 da CRP ou do artigo 3º, n.º 1 do RGCO, mas antes no âmbito do disposto no artigo 5º do Código de Processo Penal e do artigo 32º da Constituição, pois o preceito não incide sobre o instituto da prescrição em si mesmo, antes apenas estabelece a suspensão da contagem de um prazo pré-existente e não inutiliza o que entretanto passou.

E já vimos que tal interpretação tem acolhimento pleno quer no TEDH, quer no TJUE. […]’.

As considerações vertidas no Acórdão acabado de citar permitem, mutatis mutandis, sustentar que ‘a final, é susceptível de operar a causa de suspensão da prescrição a que alude o número 2 do artigo 418.º do Código de Valores Mobiliários, na versão introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de Maio’, como referido pela decisão recorrida (cfr. p. 43), assim como afirmar a conformidade constitucional da referida interpretação e aplicação da norma.

Veja-se, ainda a este propósito que, como defende Duarte Contreiras Roseiro (ênfase aditado)[11]:
‘[…] é admissível, à luz da Constituição, a aplicação da causa de suspensão consignada no artigo 418.º, n.º 2, do CdVM a prazos de prescrição que se encontravam em curso à data da entrada em vigor da mencionada norma. Isto é, encontrando-se a correr um prazo de prescrição pela prática de uma contraordenação ocorrida antes da entrada em vigor da norma, tal prazo suspende-se em caso de confirmação, total ou parcial, pela Tribunal da Concorrência, Regulação ou Supervisão, ou pelo Tribunal da Relação de Lisboa (cessando a suspensão quando haja uma decisão absolutória proferida, em recurso, pelo Tribunal da Relação de Lisboa, nos termos do n.º 3 do artigo 418.º do CdVM).
Com efeito, na apreciação da conformidade constitucional de soluções normativas respeitantes a garantias do arguido em processo de contraordenação, os pressupostos metodológicos e dogmáticos acolhidos recorrentemente pelo Tribunal Constitucional são, em apertada síntese, os seguintes: (i) existe uma diferenciação qualitativa entre o ilícito penal e o ilícito contraordenacional, fundada na relevância ético-social dos ilícitos e na carga ética das sanções; e (ii) a diferente natureza substantiva dos ilícitos penal e contraordenacional reflete-se nos regimes processuais aplicáveis, o que determina a não aplicabilidade direta e global aos processos contraordenacionais dos princípios constitucionais próprios do processo penal e um poder de conformação do legislador ordinário mais amplo em matéria contraordenacional. Consequentemente, o Tribunal Constitucional tem reiteradamente consentido a diferenciação entre o processo penal e o processo contraordenacional, fruto da diferenciação que a própria Constituição estabelece nas garantias outorgadas aos arguidos num e noutro regime processual.’
Termos em que improcedem as inconstitucionalidades invocadas pelos recorrentes BB, CC e DD relativamente à aplicação aos presentes autos do artigo 418º, nº 2 do CdVM, na redacção da Lei nº 28/2017, de 30 de maio, nenhuma censura merecendo nesse particular a Sentença recorrida.

I.10. Da improcedência da alegada prescrição do procedimento contraordenacional

Consideram os recorrentes que o presente procedimento contraordenacional, (i) ou já prescrevera antes da notificação da acusação aos arguidos (em 15.05.2019, segundo o recorrente DD; em 17.06.2019, segundo os recorrentes AA e BB), (ii) ou prescreveu entretanto (em 22.10.2022, segundo o recorrente DD; em 04.11.2022 ou, no limite, em 24.11.2022 segundo o recorrente BB; em 26.11.2022 segundo o recorrente CC), contrariamente ao entendimento sufragado na sentença recorrida, plasmado designadamente no seguinte extrato (pp. 35-42, ênfase aditado):

 ‘[…] Ora, salvo melhor entendimento, as infrações em causa nos presentes autos, relativas à violação do dever de qualidade da informação constante do prospeto, assim como do dever de publicação de adendas ao mesmo, são de natureza permanente.
Com efeito, tal como delimitado na douta decisão recorrida, o momento da consumação ou lesão primária do bem ou interesse jurídico, que ocorre com a divulgação do Prospeto (quanto à primeira infração), ou na(s) data(s) da ocorrência dos factos geradores da obrigação da divulgação de adenda ao Prospeto (nos casos da violação esse dever), seguiu-se um período de consumação material, em que o bem ou interesse jurídico continua a ser lesado por vontade do autor (persistência da lesão do bem jurídico por vontade do autor), o qual perdurou até à admissão à negociação das ações emitidas pelo BES em resultado da Oferta.
Sinaliza a Recorrente que, neste contexto, o Prospeto cumpre a sua função informativa ao longo de todo o período da oferta.
Com efeito, o Prospeto é, nas ofertas públicas de distribuição – como era o caso da Oferta em causa nos presentes autos – “a peça obrigatória a congregar a dose de informação relevante relativa ao emitente e à oferta”[12], prosseguindo, essencialmente, o desiderato de reduzir as assimetrias de informação[13] existentes no mercado.
Em coerência, recorda Paulo Câmara que um dos princípios fundamentais aplicáveis em matéria de ofertas públicas é o princípio da igualdade do tratamento dos investidores, do qual decorre a “necessidade de acautelar uma igualdade informativa, o que é proporcionado pelo prospeto e pela proibição de disseminação assimétrica de informação relevante, visando que todos os destinatários da oferta estejam em igualdade de condições quanto à informação necessária para tomar uma decisão de investimento esclarecida.”[14].
O Prospeto assume a função axial de acautelar a igualdade de tratamento dos investidores, desiderato que deve, necessariamente, ser assegurado durante todo o período da oferta, de modo a que todos os destinatários da oferta estejam em igualdade de condições no momento da tomada de decisão de investimento esclarecida e até que esta se torne definitiva.
Acolhendo e aderindo o critério gizado por Eduardo Correia[15] - “a existência do dever de cessar o estado antijurídico criado, faz distinguir os crimes permanentes dos crimes de efeitos permanentes, aqueles que se esgotam num único momento, mas cujos efeitos se podem prolongar no tempo” – afigura-se ser, pois, de concluir que está aqui causa uma infração de natureza permanente.
No caso em apreço, tal como delimitado na decisão recorrida e cujo mérito só adiante se apreciará, constata-se a existência de um “dever de cessar o estado antijurídico criado”, fundado na circunstância de ser possível e legalmente exigível aos agentes tanto a correção das deficiências da informação constante do prospeto, como a publicação de adendas ao prospeto. Durante todo o período da oferta, está o oferente (e os seus administradores) obrigado a assegurar a todos os destinatários da Oferta toda a informação útil para motivar as decisões de investimento.
Revertendo, em concreto, à narração de factos empreendida na decisão recorrida verifica-se que,
(i) a minuta do prospeto de aumento de capital do BES de 2014 foi aprovada pelo Conselho de Administração do BES em 15.05.2014,
(ii) o prospeto foi aprovado pelo Conselho Diretivo da CMVM em deliberação tomada a 20.05.2014 e notificada ao BES na mesma data,
(i) o prospeto, tal como aprovado pela CMVM, foi divulgado pelo BES no SDI da CMVM no dia 20.05.2014, após o fecho da sessão de negociação e
(ii) (iv) o prospeto, tal como aprovado pela CMVM e divulgado no SDI no dia 20.05.2014, podendo tê-lo sido, não foi, de acordo com a decisão recorrida, objeto de qualquer adenda até à data da admissão à negociação das ações novas, em 17.06.2014.
Neste enquadramento, afigura-se-nos que assiste razão à Recorrente quando conclui que as contraordenações atinentes à violação dos deveres relativos à qualidade de informação constante do prospeto consideram-se praticadas entre 20.05.2014 (data da aprovação do prospeto pela CMVM e divulgação no SDI da CMVM) e, pelo menos, 17.06.2014 (data até à qual poderia ter sido requerida a aprovação de adenda ao prospeto).
E, por seu turno, as concernentes à violação do dever de proceder à publicação de adenda ao prospeto, previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CdVM, consideram-se praticadas, igualmente, em 17.06.2014, data até à qual poderia ter sido requerida a aprovação de adenda ao prospeto.
Então e como é sabido, a contagem do prazo de prescrição inicia-se com a consumação do facto ilícito.
Dispõe o artigo 27.º do RGCO,
“[o] procedimento por contra-ordenação extingue-se por efeito da prescrição logo que sobre a prática da contra-ordenação hajam decorrido os seguintes prazos”.
O artigo 5.º do RGCO prevê que “[o] ato considera-se praticado no momento em que o agente atuou ou, no caso de omissão, deveria ter atuado, independentemente do momento em que o resultado típico se tenha produzido”.
E o n.º 1 do artigo 119.º do Código Penal determina que “[o] prazo de prescrição do procedimento criminal corre desde o dia em que o facto se tiver consumado” (realce e sublinhado nosso).
Donde, salvo melhor entendimento, o dies a quo a considerar, no que respeita às contraordenações imputadas aos arguidos é o dia 17 de junho de 2014.
[…] Como se referiu supra, a prestação pelos arguidos de informação no prospeto sem a qualidade exigida pelo artigo 135.º, n.º 1, do CdVM perdurou, pelo menos, até à data da admissão à negociação das novas ações, e consequente registo das mesmas nas contas dos acionistas subscritores do aumento de capital (17.06.2014) e não apenas até à data do termo da Oferta.
  Não assiste, pois, razão aos Recorrentes e não se verifica a prescrição do procedimento contraordenacional, de acordo com a legislação em vigor à data da prática dos factos. […]’

A sentença recorrida foi proferida em 10.10.2022 e confirmou a decisão da CMVM que condenou os Arguidos AA, BB, CC e DD pela prática de contraordenações relativas à violação do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM e do dever de requerer adenda ao prospeto, previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CdVM, pelo que se verificou, nessa data, facto que se subsume à causa de suspensão da prescrição prevista no artigo 418.º, n.º 2, do CdVM, na versão introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio.

Estabelece, com efeito, o artigo 418.º, n.º 2, do CdVM, na versão introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio, que ‘Sem prejuízo de outras causas de suspensão ou de interrupção da prescrição, o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional suspende-se em caso de confirmação, total ou parcial, pelo tribunal de primeira instância ou pelo tribunal de recurso da decisão administrativa de condenação.’ (ênfase aditado).

Estaria assim suspenso, desde 10.10.2022, o prazo de prescrição do presente procedimento contraordenacional, caso ainda em curso naquela data, como constatado na sentença recorrida.

Vejamos, pois, se ocorreu a prescrição do procedimento contraordenacional.

A prescrição corre a partir da data da prática dos factos (art.° 27° RGCO) e suspende-se ou interrompe-se, nas condições referidas nos artigos 27°-A e 28° do RGCO. Independentemente disso, a prescrição do procedimento tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal de prescrição acrescido de metade - art.° 28° n° 3 do RGCO.

Desta norma resulta, em conjugação com o disposto no art.° 27°-A n.°2 do RGCO quanto ao prazo da suspensão (6 meses) que, no caso de o prazo de prescrição ser de cinco anos, o prazo máximo de prescrição será de sete anos e seis meses, a que poderão acrescer 6 meses por causa suspensiva ocorrida designadamente nos termos do art. 27°-A n° 1 al. c) e n° 2 do RGCO, no máximo de oito anos.

Relativamente ao início de contagem do prazo de prescrição secundamos o raciocínio perfilhado pelo tribunal a quo, face à qualificação das infrações cometidas pelos aqui recorrente como contraordenações permanentes, pelas razões acima melhor expostas (secção I.1 supra) que se dão por reproduzidas, de acordo com a qual e o disposto no artigo 119º, nº 2, alínea a) do CP (ex vi artigos 407º do CdVM e 32º do RGCO) - articulado com o teor dos factos dados como provados, designadamente nos pontos 32-90, 215-263, 252-268, 313-352 e 353-375 - os prazos de prescrição ter-se-ão iniciado em 17.06.2014 (data da admissão à negociação das novas acções objecto da Oferta divulgada no prospeto, até à qual este poderia ter sido alvo de rectificação ou adenda), pelo que, quando foi proferido o despacho de recebimento dos recursos de impugnação judicial em 17.12.2021, em circunstâncias normais já se mostraria esgotado o prazo de prescrição de 5 anos, correspondente às infracções em causa nos termos do artigo 27º, alínea a), do RGCO.

Porém, assim não aconteceu, porquanto as diligências probatórias efectuadas entre 7.02.2018 e 29.05.2019, antes do termo do referido prazo de 5 anos sobre a data da consumação da infracção (17.06.2019), tiveram por efeito interromper o dito prazo de prescrição nos termos do artigo 28º, nº 1, alínea b) do RGCO (secção I.3, supra), como também o teve a notificação da acusação aos arguidos para exercício do direito de audição, ocorrida em 20.01.2020 (recorrentes BB e DD), 22.01.2022 (recorrente AA) e 19.02.2020 (recorrente CC), nos termos do artigo 28º, nº 1, alínea c), do RGCO, pelo que àquele prazo há que somar metade da sua duração, seja 2 anos e 6 meses, perfazendo um total de 7 anos e 6 meses, nos termos do artigo 28º, nº 3, do RGCO, o qual expiraria em 17.12.2021.

No entanto, tão pouco prescreveu nesta data, porquanto se entende que àqueles prazos de prescrição deverão somar-se os dois períodos de suspensão da prescrição consagrados pelas Lei n° 1-A/2020 e n° 4-B/2021, regime decorrente das medidas excepcionais adoptadas na situação de pandemia por Covid 19 que assolou o país, pelas razões mencionadas supra (secções I.5 e I.6) e adiante desenvolvidas.

A Lei 1-A/2020, alterada pela Lei 4-A/2020, no artigo 7.°, n°s 3 e 4, determinou a suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade relativos a todos os tipos de processos e procedimentos, desde 9 de Março de 2020.

Uma vez que a Lei 16/2020, de 29 de Maio, revogou o artigo 7.° da Lei 1­A/2020, alterada pela Lei 4-A/2020, pondo termo à suspensão dos aludidos prazos de prescrição e caducidade (cf. artigo 8.° da Lei 16/2020), a partir do dia 3 de junho de 2020 os prazos de prescrição e caducidade que haviam ficado suspensos por força da Lei 1-A/2020 retomaram a respetiva contagem.

Segundo o artigo 6.° da Lei 16/2020, os prazos de prescrição e caducidade que ‘deixem de estar suspensos por força das alterações introduzidas por tal lei são alargados pelo período de tempo em que vigorou a sua suspensão’.

Assim sendo, no caso em apreço, ao aludido prazo de prescrição de sete anos e meio, acresce o prazo em que foi determinada a mencionada nova causa de suspensão decorrente da situação de emergência nacional e de calamidade determinada pela pandemia causada pelo Covid19, que por força da Lei n° 1-A/2020 é de 86 dias (entre 9/3/2020 e 2/6/2020) e que abrangeu o procedimento dos autos, uma vez que o prazo de prescrição nessa altura ainda não se esgotara.

Posteriormente, pela Lei n° 4-B/2021 de 1/2 foi aditado o art. 6°-B n° 3 e 4 da Lei n° 1-A/2020, voltando a suspender os prazos de prescrição com efeitos reportados a 22/1/2021 até 5/4/2021 (Lei n° 13-B/2021 de 5/4), no total de 74 dias, e que abrangeu o procedimento dos autos uma vez que o prazo de prescrição nessa altura também ainda não se esgotara.

Tendo ficado expressamente previsto no referido art. 6°-B nº 4 que, ‘prevalece sobre quaisquer regimes que estabeleçam prazos máximos imperativos de prescrição ou caducidade, aos quais acresce o período de tempo em que vigorar a suspensão’.

A aplicabilidade destes prazos de suspensão tem sido reiteradamente aceite por este Tribunal da Relação-Secção PICRS[16], no seguimento dos consistentes entendimentos nesse sentido do Tribunal Constitucional, que enjeita qualquer das inconstitucionalidades invocadas pelos recorrentes, designadamente a alegada violação dos arts. 2° e 29° n° 1 e 4 da CRP, já apreciadas e regeitadas supra (secções I.5 e I.6).

Assim sendo, ao referido prazo de prescrição das contraordenações em causa nestes autos, acresceram o/os período(s) de tempo em que vigorou a suspensão, por força dos referidos regimes de suspensão da Lei n° 1-A/2020 (com as apontadas alterações), num total de 160 dias.

Deste modo, quando foi proferido o despacho de recebimento dos recursos de impugnação judicial em 17.12.2021, ainda não se completara o prazo de prescrição de nenhuma das infrações em causa e, nesse momento iniciou-se novo período de suspensão do prazo de prescrição de 6 meses, previsto no art. 27°-A n° 1 al. c) do RGCO, que, acrescido aos 7 anos e 6 meses e aos 160 dias decorrentes da suspensão pandémica, dá um total de 8 anos e 160 dias, que expiraria em 26.11.2022.

Porém, tal não ocorreu, pois, para além desse acréscimo do prazo de suspensão de prescrição, entendemos ser de aplicar a nova causa de suspensão do prazo de prescrição prevista no actual art. 418° n° 2 do CdVM introduzido pela Lei n.° 28/2017, de 30 de maio.

Senão vejamos.
Os aqui recorrentes foram condenados, por decisão proferida pela CMVM, pela prática das referidas contraordenações, previstas e punidas pelos artigos 393, nº 2, alínea c) e/ou d) e 388º, nº 1, alínea a), com referência aos artigos 135º, nº 1 e/ou 142º, nº 1, todos do CdVM.

Inconformados com a referida decisão proferida pela CMVM, os aqui recorrentes dela interpuserams recurso de impugnação judicial, tendo sido proferido despacho de recebimento desse recurso pelo TCRS em 17.12.2021.

Foi precisamente a partir da notificação daquele despacho - despacho que procedeu ao exame preliminar do recurso da decisão da autoridade administrativa que aplicou a coima - que se iniciou o prazo de suspensão da prescrição do procedimento relativo às referidas contraordenações consagradas no CdVM, prevista no art. 27°-A n° 1 al. c) do RGCO.

Nessa mesma data, já se encontrava em vigor a nova redação do art. 418° do CdVM, introduzida pela Lei n.° 28/2017, de 30/05[17], que revê o regime sancionatório do direito dos valores mobiliários, a qual introduziu significativas alterações ao CdVM, nomeadamente no regime da prescrição, passando o art. 418° a ter o seguinte teor:

1 - O procedimento contraordenacional prescreve:
a) No prazo de oito anos, nas contraordenações muito graves; e
b) No prazo de cinco anos, nas contraordenações graves e menos graves.

2 - Sem prejuízo de outras causas de suspensão ou de interrupção da prescrição, o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional suspende-se em caso de confirmação, total ou parcial, pelo tribunal de primeira instância ou pelo tribunal de recurso da decisão administrativa de condenação.

3 - A suspensão prevista no número anterior cessa em relação às infrações imputadas em que seja proferida, em sede de recurso, uma decisão de absolvição.

4 - No caso das infrações sucessivas ou simultâneas referidas no artigo 402.°-A, o prazo de prescrição do procedimento por contraordenação conta-se a partir da data de execução do último ato praticado.

5 - O prazo de prescrição das sanções é de cinco anos a contar do dia em que se torna definitiva ou transita em julgado a decisão que determinou a sua aplicação.’

Os ilícitos contraordenacionais previstos no CdVM, pelos quais os aqui recorrente foram condenados, continuaram a ser punidos nos termos dessa legislação, apenas se impuseram algumas alterações em função da necessidade de transposição das mencionadas Diretivas do Parlamento Europeu e do Conselho.

Parte dos argumentos utilizados para a admissão da aplicação da nova causa de suspensão do prazo de prescrição introduzida pela Lei n° 1-A/2020, são transponíveis para a decisão de admissão desta nova causa de suspensão do mesmo prazo prevista na redação do art. 418° n° 2 do CdVM introduzida pela Lei nº 28/2017 de 30 de maio, com plena aplicabilidade aos procedimentos contraordenacionais em curso, apesar de a prática dos factos ser anterior à entrada em vigor desta última.

Como vimos, o art. 27°-A n° 1 do RGCO admite outras causas de suspensão do prazo de prescrição para além das hipóteses ali previstas (não contendo enunciado taxativo), nos casos especialmente previstos na lei, admitindo outras causas de suspensão que só sejam consagradas por lei posterior, como é o caso.

Na génese da Lei n° 28/2017, de 30 de maio, está a Proposta de Lei n° 53/XIII de 12.1.2017, com vista à alteração do CdVM, em cuja Exposição de Motivos se pode ler (ênfase aditado):
‘O Programa do XXI Governo Constitucional estabelece o objetivo de assegurar uma regulação eficaz, particularmente sobre o setor financeiro. Casos recentes ocorridos no sistema financeiro português, alguns relacionados com a prática de ilícitos, além de evidenciarem falhas na supervisão e regulação financeiras, provocaram sérios prejuízos diretos e indiretos para a economia nacional, para as finanças públicas e, sobretudo, para os portugueses. Na maioria daqueles casos, a ausência ou demora na obtenção de uma sanção efetiva dos responsáveis afetou a credibilidade e reputação das entidades encarregues da regulação e supervisão do setor financeiro, assim como a confiança no sistema judicial e na realização da justiça.
O reforço da eficácia dos poderes de supervisão, de fiscalização e de sanção de  infrações, tendo em vista a proteção dos direitos e interesses dos consumidores de  produtos e serviços financeiros, aconselha o estabelecimento de um regime sancionatório substantivamente mais robusto e proporcional às consequências das infrações cometidas e processualmente mais ágil e eficaz na obtenção de uma decisão.
A adaptação do direito português ao Regulamento (UE) n.° 596/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de abril de 2014, relativo ao abuso de mercado (regulamento abuso de mercado), e a transposição da Diretiva n.° 2014/57/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de abril de 2014, relativa às sanções penais aplicáveis ao abuso de informação privilegiada e à manipulação de mercado (abuso de mercado), e da Diretiva de Execução (UE) n.° 2015/2392, da Comissão, de 17 de dezembro de 2015, relativa à comunicação de infrações, constituem o momento oportuno para proceder a uma revisão do regime sancionatório dos valores mobiliários – que vigora há cerca de 25 anos, desde o Código dos Mercados de Valores Mobiliários de 1991 –, num esforço de melhoria de soluções processuais e substantivas já consagradas e na previsão de novos regimes.’

O alargamento dos prazos de prescrição do procedimento contraordenacional e a introdução da causa de suspensão mostra-se assim justificada:

‘[…] consagra-se uma nova causa de suspensão do prazo de prescrição, assente na confirmação judicial, total ou parcial, da decisão administrativa, à semelhança do modelo já acolhido no Código Penal. O novo regime fundamenta-se no facto de, nestes casos, o prolongamento da tramitação processual não se dever a qualquer inércia do Estado no exercício do poder sancionatório. Também por isso, a suspensão cessa em função da prolação de uma decisão subsequente de absolvição.’

Foi propósito expresso do legislador consagrar uma nova causa de suspensão do prazo de prescrição, assente na confirmação da condenação administrativa por tribunal de primeira instância, em moldes já previstos no CP, uma vez que, se terá considerado ser de dar prevalência aos poderes punitivos do Estado, na medida em que os direitos de defesa dos arguidos nessa fase estavam já adequadamente protegidos face à análise judicial efectuada em sede de impugnação judicial da decisão administrativa, justificando-se que, perante aquela confirmação por decisão judicial condenatória, a prescrição em curso se suspendesse até que a decisão judicial transitasse, só voltando o prazo de prescrição a correr caso seja proferida sentença de absolvição no recurso da 2ª Instância (igual suspensão já vigorava no art. 120° n° 1 al. e) do CP).

A este propósito, como recordam Jorge Miranda e Rui Medeiros[18]:

É preciso não esquecer que, em virtude da permanente alteração das dinâmicas sociais e económicas, quantas vezes de forma imprevisível, o legislador se vê frequentemente confrontado com a necessidade de interferir nos efeitos futuros de situações jurídicas constituídas no passado - o que faz, em nome da prossecução de interesses públicos de grande relevância e ao abrigo da normal revisibilidade das soluções legais e da liberdade de conformação que lhe cabe, enquanto poder democraticamente legitimado. Proibir em absoluto a modificação de efeitos vindouros de todas e quaisquer situações jurídicas já existentes no momento da emanação da lei (restritiva) nova constituiria uma solução demasiado rígida, susceptível de tolher a liberdade de movimentos de que o legislador precisa para adptar a ordem jurídica às constantes mutações da realidade.’

Ora, afigura-se-nos que, atentos os interesses públicos subjacentes às alterações introduzidas no CdVM, de garantir a execução efetiva da política europeia destinada a assegurar a integridade dos mercados financeiros (estabelecida no Regulamento (UE) n° 596/2014) e, nomeadamente, as finalidades que conduziram à nova redação do art. 418° do CdVM - estabelecimento de um regime sancionatório substantivamente mais robusto e proporcional às consequências das infrações cometidas e processualmente mais ágil e eficaz na obtenção de uma decisão - impõe-se aplicar a suspensão do prazo de prescrição aí prevista aos processos contraordenacionais pendentes na autoridade administrativa e que deram entrada em tribunal após a sua publicação, como é o caso dos autos.

Ao período de suspensão da prescrição do procedimento por contraordenação previsto no art. 27°-A n° 2 al. c) do RGCO ex vi do art. 407° do CdVM, que se iniciou a partir da notificação do despacho que procedeu ao exame preliminar do recurso da decisão da autoridade administrativa que aplicou as coimas até à decisão final do recurso - que no regime geral das contraordenações (RGCO) não podia ultrapassar seis meses – acresce assim, no caso das contraordenações previstas no CdVM (regime especial), a suspensão do prazo de prescrição caso haja confirmação, total ou parcial, pelo tribunal de primeira instância da decisão administrativa de condenação, como foi o caso dos presentes autos.

Não estamos perante um caso de violação do princípio da retroactividade da lei mais desfavorável, como exaustivamente tratado nos mencionados Acórdãos do TC n° 500/2021, n° 660/2021 e n° 798/2021, mais não seja porque não se está a aplicar retroativamente a lei, mas a aplicar-se para futuro a processo contraordenacional ainda pendente, embora por factos cometidos com anterioridade.

No mesmo sentido, no contexto da aplicação das ‘Leis Covid’, mas com argumentos transversais, Frederico de Lacerda da Costa Pinto[19] (ênfase aditado):

‘o regime adoptado incide sobre a suspensão do prazo de prescrição em curso e a sua contagem futura, constitui um caso de retroconexão (criação de um regime para o presente e o futuro a partir de um facto pressuposto anterior) e não está abrangido pela proibição de retroatividade da lei penal nem pelo princípio da aplicação da lei penal mais favorável ao arguido em caso de sucessão de leis penais no tempo - regimes estes que se reportam ao facto, à sua imputação e à pena, mas não ao regime processual de suspensão da prescrição.’

Essa aplicação imediata aos processos pendentes não ofende de forma arbitrária, inesperada ou desproporcional expectativas do arguido - não violando os princípios da segurança, confiança e proporcionalidade - porquanto o legislador, em matéria contraordenacional, tem mais amplos poderes de conformação da legislação, em função de relevantes interesses de ordem pública subjacentes à punição daquele tipo de ilícios contraordenacionais, como acima deixamos exarado, tendo sido o legislador a entender por bem consagrar uma nova causa de suspensão do prazo de suspensão da prescrição na fase judicial do processo contraordenacional desse tipo de ilícitos, entendendo que o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional se suspende em caso de confirmação, total ou parcial, pelo tribunal de primeira instância ou pelo tribunal de recurso, da decisão administrativa de condenação, suspensão essa que acresce às demais previstas na lei, pois se aplica sem prejuízo de outras causas de suspensão ou de interrupção da prescrição.

O princípio da confiança também não impõe, como se pode ler nos já mencionados Acórdãos do Tribunal Constitucional, a exacta cognoscibilidade de todas as causas de suspensão do prazo de prescrição do procedimento contraordenacional no momento em que o arguido comete o ilícito.

No ensinamento do Acórdão do Tribunal Constitucional nº 297/2016[20] :

 ‘a autonomia material do ilícito de mera ordenação social em relação ao ilícito penal, que dá origem a um sistema punitivo próprio, com espécies de sanção, com procedimentos punitivos e agentes sancionadores distintos, obsta a que se proceda a uma transposição automática e imponderada para o direito de mera ordenação social dos princípios constitucionais que regem a legislação penal. Tais ilícitos não se distinguem apenas pelo diferente tipo de cominação-uma coima ou uma pena-mas sobretudo por um critério material que atende à diferença de bens jurídicos protegidos e à diferente ressonância ética dos ilícitos.

A submissão do direito das contraordenações às garantias essenciais do direito penal, isto é, as garantias relativas à segurança, certeza, confiança e previsibilidade dos cidadãos, não significa que as normas e princípios constitucionais em matéria penal tenham que ser aplicados ao domínio contraordenacional com a mesma intensidade e com as mesmas exigências, como se recorda no seguinte Acórdão do Tribunal Constitucional nº 297/2016:

‘(...) No domínio contraordenacional, cabe ainda na margem de conformação do legislador a configuração em concreto da dimensão processual do instituto da prescrição do procedimento e, deste modo, a determinação do tempo necessário para o adequado desenvolvimento do mesmo procedimento com vista à prossecução das referidas finalidades.’

A este propósito, tem sido entendimento sufragado, de forma reiterada e consistente pelo Tribunal Constitucional, designadamente nos referidos Acórdãos (secção I.6, supra), que a nova lei que consagre uma nova causa de suspensão da prescrição (como acontece, como vimos, quanto à aplicação da nova causa de suspensão do prazo da prescrição promovida pela lei n° 1-A/2020) é imediatamente aplicável aos processos de contraordenação pendentes, ainda que a data da prática do facto ilícito seja anterior, a isso não obstando os princípios constitucionais cuja violação foi apontada pelos recorrentes.

Assim, no Acórdão do TC n° 500/2021 ficou decidido:

‘não julgar inconstitucional o artigo 7° n° 3 e 4 da lei n° 1-A/2020 de 19 de março, interpretado no sentido de que a causa de suspensão do prazo de prescrição do procedimento contraordenacional aí prevista é aplicável aos processos a correr termos por factos cometidos antes do início da respectiva vigência.’

Dele se extraem, com especial relevo para o caso em apreço, os seguintes enxertos (ênfase aditado):

‘Em suma: para além de absolutamente congruente com o mais amplo critério seguido na jurisprudência do TEDH e do TJUE, a norma extraída dos n.°s 3 e 4 do artigo 7.° da Lei n.° 1-A/2020, interpretados no sentido de que a causa de suspensão do prazo de prescrição do procedimento aí prevista é aplicável aos processos a correr termos por factos cometidos antes do início da respetiva vigência, não se encontra abrangida, nem pela letra, nem pela ratio da proibição da retroatividade in pejus a que a Constituição, no seu artigo 29.º, n.ºs 1, 3 e 4, sujeita a aplicação das leis que definem as ações e omissões puníveis e fixam as penas correspondentes.

[…] A circunstância de a interpretação sindicada se cingir aos procedimentos contraordenacionais pendentes por factos anteriores ao início da vigência da Lei n.° 1-A/2020 apenas serve para tornar mais evidente a conclusão que acima se alcançou. Com efeito, apesar de o direito das contraordenações, enquanto direito sancionatório público, ser influenciado ou “matizado” pelos princípios constitucionais do direito penal, a autonomia material do ilícito de mera ordenação social em relação ao ilícito penal obsta a que tais princípios possam ser transpostos deste para aquele de forma automática ou imponderada ou que possam aí valer com a mesma exata extensão ou com o mesmo grau de intensidade (cf. Acórdão n.° 76/2016; no mesmo sentido, a propósito da liberdade de conformação do legislador na modelação do instituto da prescrição, v.Acórdão n.° 297/2016). No que diz respeito à proibição constitucional da retroatividade in pejus, isso significa que ela se estenderá ao direito contraordenacional somente enquanto manifestação nuclear da função de garantia do princípio legalidade, exigida pela ideia de Estado de Direito e oponível ao arbítrio ex post facto.

Resta concluir, assim, que, ao proibir que qualquer cidadão seja «sentenciado criminalmente senão em virtude de lei anterior que declare punível a ação ou a omissão» ou sofra pena que não esteja expressamente cominada «em lei anterior» ou mais grave do que a prevista «no momento da correspondente conduta ou da verificação dos respetivos pressupostos», o artigo 29.° da Constituição, respetivamente nos seus n.°s 1, 3 e 4, não se opõe à aplicação de uma causa de suspensão da prescrição com a função e o recorte daquela que foi prevista no artigo 7.°, n.°s 3 e 4, da Lei n.° 1-A/2000, a procedimentos contraordenacionais pendentes por factos praticados antes do início da respetiva vigência.

Também no Acórdão do TC n° 660/2021 (atrás citado), com relevo para o caso concreto, pode ler-se o seguinte (ênfase aditado):

‘[…] é reconhecido na jurisprudência constitucional que inexiste suporte explícito na Lei Fundamental que consagre a regra da imprescritibilidade do procedimento criminal e que são valores como a certeza e a paz jurídica, ínsitos ao princípio do Estado de direito democrático, que reclamam que o instituto da prescrição, em sede criminal, seja ponderado e perspetivado como valor constitucional (cfr. Acórdãos 483/2002 e 629/2005).

Igualmente nesta senda, tem sido afirmado que o princípio da proibição da imprescritibilidade das penas ou das sanções equiparáveis não ancora um direito subjetivo do arguido à prescrição (cfr. Acórdãos n.' 483/2002 e 366/2018), sendo lícito ao legislador estabelecer causas de suspensão e de interrupção da prescrição, ou prever limites máximos temporais a causas de suspensão, desde que isso não implique, em concreto, a ineficácia do instituto de que o arguido possa vir a beneficiar.

Como tem sido evidenciado pela jurisprudência constitucional acima elencada, para além de não existir um direito subjetivo à prescrição do  procedimento criminal, é também legítimo que o legislador contemple causas de suspensão em diplomas especiais, desde que sejam suficientemente precisas e emitidas pela Assembleia da República, o que se verifica neste caso (cfr. Acórdão n.' 449/2002).

Assim, consideramos que a aplicação imediata desta causa de suspensão a processos em curso não colide com as garantias asseguradas pelo princípio da proibição da aplicação retroativa da lei penal, quando, como é o caso, no momento da sua entrada em vigor, o prazo de prescrição já se tinha iniciado e, apesar de se encontrar em curso, não se havia ainda extinto – aliás, encontra-se fora do respetivo âmbito de proteção (v., de novo, o Acórdão n.' 500/2021).

Quer isto dizer que, na linha de pensamento de GIAN LUIGI GATTA, quando o prazo de prescrição não tenha ainda atingido o seu fim, ao determinar o prolongamento – como no caso da suspensão motivada pela pandemia –, a lei superveniente não torna punível um facto não punível: ela limita-se a conceder ao Estado, por qualquer motivo, neste caso por força de uma emergência sanitária, mais tempo para apurar os factos e a responsabilidade criminal. O direito de defesa não resulta, de modo algum, comprometido e o Estado não abusa do poder punitivo, nem frustra aquela exigência de previsibilidade das consequências da violação da norma penal: como mostra a própria disciplina da prescrição do crime (...) o momento em que se cumpre a prescrição é, na verdade, variável e em boa medida imprevisível antes da prática do facto, quando o agente nem sequer sabe se alguma vez será alvo de um procedimento criminal (cfr. “Lockdown da justiça penal, suspensão da prescrição do crime e princípio da irretroatividade: um curto-circuito”, in Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Separata, Ano 30, n.° 20, maio-agosto 2020, Gestlegal, pág. 312 e 313).

[…] A construção perfilhada pelo TJUE, nos dois arestos da Saga Taricco, posiciona-se na mesma linha jurisprudencial do TEDH, no sentido de a proibição da retroatividade em matéria de prescrição poder ter por referência o terminus do prazo de prescrição, previsto na lei em vigor à data da prática dos factos, uma vez que o artigo 7.° da CEDH não impede a aplicação imediata aos procedimentos em curso das leis que estendem prazos de prescrição, quando os factos imputados ainda não  tenham prescrito e quando essa extensão não seja arbitrária (cfr. Acórdão de 22 de junho de 2000, proferido no Caso Coëme and Others v. Belgium; Acórdão de 8 de dezembro de 2009, proferido no Caso Cesare Preveti v. l’Italie; ponto 22 do Acórdão n.° 500/2021; e Gatta, Gian Luigi, Ob. Cit. pág. 316).

Muito embora a apreciação da conformidade constitucional da aplicação da causa de suspensão da prescrição prevista nos n.°s 3 e 4 do artigo 7.° da Lei n.° 1­A/2020 aos procedimentos em curso se tenha feito por referência à sua natureza criminal, os argumentos que sustentam o presente juízo de não inconstitucionalidade  são replicáveis para os procedimentos de natureza contraordenacional. Com efeito, e não obstante a jurisprudência do Tribunal se encontrar estabilizada no sentido de os princípios constitucionais com relevo em matéria penal não serem transponíveis, com a mesma extensão e intensidade, para o domínio contraordenacional (cfr. entre outros Acórdãos n.°s 344/93, 278/99, 160/04, 537/2011, 85/2012, 76/2016, 297/2016 e 175/2021), é para nós claro, na senda do decidido no Acórdão n.° 500/2021, que, “no que diz respeito à proibição constitucional da retroatividade in pejus, isso significa que ela se estenderá ao direito contraordenacional somente enquanto manifestação nuclear da função de garantia do princípio da legalidade, exigida pela ideia de Estado de Direito e oponível ao arbítrio ex post facto.

Assim, pelos fundamentos e considerações jurídicas acima expendidas, concluímos que a interpretação extraída do artigo 7.°, n.°s 3 e 4, da Lei n.° 1-A/2020, de 19 de março, no sentido de ser aplicável a causa de suspensão da prescrição do  procedimento aí prevista aos procedimentos contraordenacionais pendentes aquando da entrada em vigor daquele diploma, não viola o princípio da proibição da  aplicação retroativa da lei penal in malam partem, consagrado no artigo 29.°, n.°s 1 e  4, da CRP.’

Já no Acórdão do Tribunal Constitucional n° 449/2002 havia ficado decidido que, para além de não existir um direito subjectivo à prescrição do procedimento criminal, é também legítimo que o legislador contemple causas de suspensão em diplomas especiais, desde que sejam suficientemente precisas e emitidas pela AR.

Deste modo, considerando o Tribunal Constitucional conforme à Constituição da República Portuguesa a aplicação da lei nova, que cria uma nova causa de suspensão da prescrição, aos processos a correr termos por factos cometidos antes do início da respectiva vigência, aos prazos que, à data da sua entrada em vigor, se encontravam já em curso, não vemos qualquer obstáculo à aplicação da actual redação do art. 418° n° 2 do CdVM aos presentes autos.

Estar-se-á a aplicar aos processos pendentes de natureza contraordenacional outra causa de suspensão do prazo da prescrição, de um prazo ainda em curso, que não se havia esgotado à luz da lei anterior, não se tratando de uma causa de interrupção, pois que não inutiliza o tempo decorrido até à sua entrada em vigor.

Assim, na senda do que tem vindo a ser decidido pelo Tribunal Constitucional, não se vislumbram obstáculos constitucionais à aplicação imediata da causa de suspensão do prazo de prescrição prevista no n° 2 do art. 418° do CdVM ao procedimento contraordenacional em curso relativamente às contraordenações pelas quais foram condenados os aqui recorrentes e que são objecto destes autos.

Salienta-se que argumentos semelhantes, especificamente no que se refere à aplicação de lei nova a processos pendentes, quanto ao alargamento ou introdução de novas causas de suspensão da prescrição, foram já sustentados por este mesmo Tribunal da Relação de Lisboa, designadamente no Acórdão proferido nos Processos n° 249/17.... e nº 127/19.5YUSTR.L1, embora a propósito de ilícitos contraordenacionais de natureza distinta e sujeitos a regimes também eles distintos, mas cuja razão de ser tem aqui plena aplicabilidade face à sua similitude.

Deve, pois, considerar-se adequada e conforme aos princípios constitucionais a aplicação, ao caso sub judice, do prazo de suspensão da prescrição estabelecido no actual art. 418° n° 2 do CdVM, e consequentemente declarar-se que não se verifica a prescrição, uma vez que, quando a sentença recorrida foi proferida pelo tribunal de primeira instância em 10.10.2022, ainda não se havia esgotado o prazo de prescrição, tendo o tribunal a quo confirmado parcialmente a decisão administrativa de condenação quanto aos aqui recorrentes.

Termos em que a prescrição do presente procedimento contraordenacional se encontra suspensa desde 10.10.2022, por força da aplicação do disposto no artigo 418.º, n.º 2, do CdVM, na versão introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio.

Sendo que, como decorre do disposto no artigo 28.º, n.º 3, do RGCO, ex vi do artigo 407.º do CdVM, a suspensão da prescrição é sempre ressalvada na determinação do prazo máximo de prescrição.

Assim decidindo, conclui-se que o prazo de prescrição do presente procedimento contraordenacional está suspenso desde 10.10.2022 e só se retomará se vier a ser proferida decisão de absolvição em sede do presente recurso (art. 418°, n° 3 do CdVM).

Improcede, pois, este segmento recursivo.

II – Nulidades, ilegalidades, inconstitucionalidades e vícios da decisão da CMVM e/ou da sentença recorrida

Assente que o procedimento contraordenacional deve prosseguir, por se não encontrar prescrito, passemos à análise das nulidades, ilegalidades, inconstitucionalidades e vícios imputados pelos recorrentes à sentença impugnada.

II.1 – Da nulidade da decisão, por violação do princípio da igualdade

O recorrente AA alega (conclusões 135ª a 148ª) – em reiteração do que já havia feito em sede de impugnação judicial (cfr. §§ 377 a 388 e conclusões 105ª a 113ª, a fls. 16076-16250) – a nulidade do processo de contraordenação, da decisão da CMVM e da sentença recorrida, por violação do princípio da igualdade (artigos 13.º e 18.º da CRP), uma vez que foi condenado por factos que eram do conhecimento de outros arguidos (quanto ao valor da exposição BES às entidades da ESFG à data da aprovação do prospeto e quanto aos financiamentos concedidos à ESFG e subsidiárias durante a Oferta), contra os quais não foi deduzida acusação.

A este propósito, decidiu a sentença recorrida (pp. 157-160, ênfase aditado) que:
‘[…] O exercício de competências sancionatórias é uma prerrogativa da CMVM, sendo que este Tribunal intervém e tem a medida da sua jurisdição delimitada pela conjugação do disposto no artigo 112.º, número 1 da LOSJ, 416.º, números 1 e 2 do Código de Valores Mobiliários e 417.º do CdVM.
Neste enquadramento, salvo melhor opinião e não se confundindo este Tribunal, na sua atuação jurisdicional e desiderato de reconstrução histórica dos factos de acordo com um procedimento próprio e pré-determinado, não há, desde logo, interpenetração com os juízos de responsabilidade contraordenacional que aqui se aquilatam com a censura de natureza política ou social.
Nestes autos e ao Tribunal compete (apenas) a sindicância jurisdicional de uma decisão condenatória prolatada por uma entidade administrativa (in casu, a CMVM), competindo-nos apurar se a decisão administrativa se encontra fundada e se a mesma é, por essa via, apreensível e inteligível.
E, de facto, não se divisa razão para concluir em sentido negativo.
Desde logo, sinaliza, com acerto a Recorrida que, “(…) a CMVM apenas deduziu acusação contra os agentes relativamente aos quais nos autos existiam elementos probatórios suficientes para sustentar a prática das contraordenações em causa ou um contributo causal para a prática das mesmas. (…) não assume relevância para a avaliação do preenchimento dos elementos objectivos (e subjectivos) do tipo de ílicito em causa relativamente a AA (…) e DD a análise, neste caso, da alegada atuação de outros administradores. Para a aferição da actuação dos arguidos da imputação da contraordenação aqui em causa, apenas releva a conduta dos próprios (…)”.
Em segundo lugar e compulsados os autos, não se divisa arbítrio ou violação do princípio da igualdade (artigo 13.º da CRP) na decisão recorrida.
É que, o sobredito princípio da igualdade não confere aos arguidos, salvo melhor opinião, o direito de exigir que pessoas terceiras (ex-administradores) sejam constituídas arguidas e lhes seja imputada a violação de normas contraordenacionais. Senão vejamos.
Dispõe o artigo 13.º da Constituição que
“Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social”.
 Ora, a proteção concedida a este direito fundamental inclui a proibição do arbítrio (proíbe diferenciações de tratamento sem justificação objectiva razoável ou identidade de tratamento em situações objetivamente iguais) e da discriminação (não permite diferenciações apoiadas em categorias subjetivas ou em razão dessas categorias).
Neste sentido, clarificam os Professores Gomes Canotilho e Vital Moreira[21]: ‘na vertente de proibição de arbítrio constitui um limite externo da liberdade de conformação ou de decisão dos poderes públicos, servindo o princípio da igualdade como princípio negativo de controlo: nem aquilo que é fundamentalmente igual deve ser tratado arbitrariamente como desigual, nem aquilo que é essencialmente desigual deve ser arbitrariamente tratado como tal’.
Valendo como princípio objectivo de controlo esta regra “não significa em si mesma, simultaneamente, um direito subjectivo público e igual tratamento, a não ser que se violem direitos fundamentais de igualdade concretamente positivados (por exemplo, igualdade dos cônjuges) ou que a lei arbitrária tenha servido de fundamento legal para actos de administração ou da jurisdição lesivos de direitos e interesses constitucionalmente protegidos”.
Já no que refere à vertente de proibição da discriminação, o princípio não impõe que exista uma igualdade cega e absoluta em todas as situações, nem veda a existência de diferenciações de tratamento: “O que se exige é que as medidas de diferenciação sejam materialmente fundadas sob o ponto de vista da segurança jurídica, da proporcionalidade, da justiça e da solidariedade e não se baseiem em qualquer motivo constitucionalmente impróprio”.
Assim, o que se mostra proibido são as diferenciações de tratamento de cariz arbitrário ou irrazoáveis; ou seja, as distinções de tratamento que não tenham justificação e fundamento material bastante.
Compulsada a acusação verifica-se que se edificou no seguinte:
 “477. Ora, dos factos provados infra resulta que os arguidos AA, BB, CC e DD sabiam que:
(i)  o BES concedeu, em 12.06.2014, com os seus votos favoráveis, um financiamento à Rio Forte no montante de 135 milhões de euros; (factos provados 243, 244, 270, 271, 304, 305, 344, 345, 367 e 368)
(ii) a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte era relevante para a decisão dos destinatários da Oferta; (factos provados 248, 275, 309, 349 e 372)
(iii) não promoveram nem adotaram, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, durante o período de duração da oferta, qualquer diligência ou medida no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte. (factos provados 245, 272, 306, 346 e 369)
478. cumpre recordar que foi imputada aos arguidos, na acusação, a violação do dever previsto no 142.º, n.º 1, do CdVM, nos termos dos artigos 401.º, n.ºs 1 e 5, do CdVM, conjugado com o artigo 16.º do RGCO.
479. Ora, o conhecimento, por parte dos referidos arguidos de um facto superveniente à aprovação, por estes, do prospeto, sem que durante o período de duração da oferta tenham promovido qualquer diligência no sentido de o BES requerer adenda ao prospeto quanto a esse facto, consubstanciaram “contributos relevantes” para a violação, por parte do BES, do dever de divulgação de adendas ao prospeto, previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CdVM.”
Os factos traduzem a imputação aos agentes que a decisão recorrida logrou apurar que concorreram causalmente para a violação das normas, por ação e por omissão.
Do acima exposto, improcede, por isso, o alegado, não se divisando a violação de qualquer norma ou princípio, legal ou jusfundamental.

E, mais adiante (p. 378, ênfase aditado), refere-se que:
‘[…] É o apuramento da participação, pessoal e direta, de cada um dos arguidos nestas quatro temáticas (incluindo a demonstração do seu conhecimento e motivação quanto às mesmas) que justifica a conclusão pela existência, ou não, de responsabilidade contraordenacional.
Por outro lado, é precisamente o apuramento da sobredita intervenção, pessoal e direta, de cada um dos arguidos que:

i) Enjeita a alegação de que a sua responsabilização opera apenas a partir da circunstância de serem administradores executivos do BES – dado que com isso não se basta, nem apenas nisso se funda;
ii) Justifica a razão pela qual outros Administradores do BES, que aprovaram a operação do aumento de capital, não são visados nestes autos.’

Das referidas passagens resulta, em síntese, que (i) a responsabilização dos arguidos não se se funda apenas e só na sua qualidade de administradores do BES, mas sim no apuramento da sua intervenção, pessoal e direta, nos factos, e que (ii) para a avaliação do preenchimento dos elementos objetivos e subjetivos do tipo de ilícito em causa relativamente a cada um dos arguidos visados nos presentes autos releva apenas a conduta dos próprios, sendo irrelevante a análise da alegada atuação de outros administradores não visados nos presentes autos.

E, na verdade, o facto de outos eventuais agentes não terem sido visados na decisão da autoridade administrativa, por razões que não cabe no âmbito do presente recurso sindicar, em nada interfere com a responsabilidade dos recorrentes, única aqui em causa e que deve ser apreciada em função da actuação e circunstâncias que lhes são próprias, não da comparação com o tratamento reservado a terceiros não visados no presente procedimento.

Dispõe o artigo 13.º da Constituição que:
“Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social”.
 
A proteção concedida a este direito fundamental inclui, como se recorda na sentença recorrida, a proibição do arbítrio (proíbe diferenciações de tratamento sem justificação objectiva razoável ou identidade de tratamento em situações objetivamente iguais) e da discriminação (não permite diferenciações apoiadas em categorias subjetivas ou em razão dessas categorias), não resultando dos autos qualquer arbitrariedade ou diferenciação em função das categorias enunciadas no citado normativo ou em quaisquer outros.

Louvamo-nos, assim, no que a propósito decidiu o Tribunal a quo, que não merece censura, para concluir, sem necessidade de mais considerações, pela improcedência do alegado entorse ao princípio da igualdade, invocado pelo recorrente AA no presente segmento recursivo.

III.2. Da nulidade da decisão por imputação genérica de factos

Alega o recorrente CC (conclusões 1 a 11) a nulidade da decisão da CMVM e, consequentemente, da sentença recorrida, por imputação de factos com recurso a juízos conclusivos, porquanto, em síntese:
(i) Os factos 101, 113, 123, 135, 141, 148, 158, 323, 328, 331, alíneas h) e k), 338, 343, 349 e 351, alíneas f) e k) contêm referência a “informação necessária”, que é um conceito jurídico;
(ii) os factos 329 e 331, alínea l) referem a “não adoção de medida adequada a sanar os vícios da informação”, expressão de cariz conclusivo, vago e genérico.

Imputação essa que, na perspetiva do recorrente CC, viola o artigo 58.º, n.º 1, alínea b), do RGCO ex vi do artigo 407.º do CdVM e os artigos 374.º, n.º 2, e 283.º, n.º 3, alínea b), do CPP.

Para sustentar a sua tese, o arguido faz apelo ao disposto no artigo 283.º, n.º 3, alínea b), do CPP, o qual disciplina o conteúdo da acusação pelo Ministério Público em processo penal.

A este propósito refere a sentença recorrida (pp. 138-143, ênfase aditado) o seguinte:
Em sede de douto articulado de recurso de impugnação, veio o arguido CC[22], arguir a nulidade da decisão administrativa, nos termos do disposto nos artigos 283.º, n.º 3, alínea b), 374.º, n.º 2 e artigo 122.º, nº 2 do CPP (ex vi artigo 41, n.º 1 do RGCO), alegando falta de concretização dos factos que lhe são imputados, em violação do disposto no artigo 58.º, n.º 1, alínea b) do RGCO (ex vi artigo 407.º do CdVM) e no artigo 414.º-A, n.º 2 do CdVM.
Para o efeito, alega que os factos provados na decisão, agora em crise, sob os artigos 101, 113, 123, 135, 141, 148, 158, 323, 328, 329, 331, alínea h), l), e k), 338, 343, 349, 351, alíneas f), k) e q) são “genéricos e conclusivos”, na medida em que:
- “O conceito de informação “necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma” é um conceito jurídico, o qual não poderia integrar a matéria de facto provada.
-  Com efeito, esta expressão está, evidentemente, associada aos elementos constitutivos do tipo da contra-ordenação pela falta de qualidade da informação constante do prospeto imputada na Decisão Recorrida e à previsão legal do artigo 135.º, n.º 1, do CVM, que terá alegadamente sido violado pelo ora Recorrente.
- Nesta medida, a expressão que consta dos artigos 101, 113, 123, 135, 141, 148, 158, 323, 328, 331, alínea h), e k), 338, 343, 349, 351, alíneas f), k) e q) da Decisão Recorrida constitui um juízo conclusivo de natureza meramente jurídica, que resultará (ou não) da eventual prova de factos concretos e objectivos.
- a matéria de facto dos artigos 329 e 331, alínea l), das páginas 274 e 277 da Decisão Recorrida (respectivamente) também consubstancia matéria de cariz conclusivo, vago e genérico, a qual não poderia ter sido dada como provada pela CMVM.
- A “não adopção de medida adequada a sanar os vícios da informação” não é um facto em si mesmo.
- A expressão “medida adequada” não só representa um conceito subjectivo e genérico, como constitui um juízo conclusivo e normativo sobre uma determinada realidade factual.
- Repare-se que a expressão “não adopção de medida adequada a sanar os vícios da informação” tem, inclusive, correspondência com a previsão legal do artigo 401.º, n.º 4, do CVM.
- Acresce que a CMVM nem sequer delimita quais seriam as medidas que considera adequadas e que o Recorrente deveria, na tese da Decisão, ter adoptado para sanar os alegados vícios da informação prestada no Prospeto…
- … muito menos dá como provado as medidas concretas que o Recorrente não tomou para sanar os alegados vícios da informação constante no Prospeto.”
Cumpre apreciar e decidir.
De novo e antes de mais, cumpre atermo-nos nos concretos normativos invocados pelo Recorrente para estribar a sua pretensão, dado que a sua convocação encerra em si uma antinomia e denuncia per se o cariz infundado deste argumentário.
Sem curar de aquilatar se tais preceitos se aplicam à decisão administrativa aqui objecto de recurso, importa realçar que o Recorrente tanto invoca ter sido violado o artigo 283.º, número 3 do CPP, atinente à acusação penal; como aventa a postergação do disposto no artigo 374.º do CPP, atinente à sentença penal.
Desde logo, não se alcança como se possa invocar, simultânea e concomitantemente, vícios atinentes à acusação penal e à sentença penal e ainda menos com reporte a uma decisão administrativa proferido no quadro contraordenacional.
Em segundo lugar, não se verificam os pressupostos que, nos termos previstos no artigo 41.º, número 1 do RGCO, consentem a aplicação subsidiária do direito processual penal.
É que, desde logo, não há lacuna a suprir.
Com efeito, o ilícito contraordenacional contém normas próprias e expressas quer sobre a acusação, sobre a decisão final administrativa, quer sobre a sentença a proferir em sede de ilícito contraordenacional, a saber os artigos 58.º do RGCO (decisão condenatória), o artigo 414.º-A do CdVM e o artigo 64.º do RGCO (sentença).
Em terceiro lugar, nem a decisão recorrida constitui uma acusação penal, nem muito menos uma sentença penal, sendo que, na esteira da doutrina e jurisprudência jusfundamental acima explanada, reitera-se que razões de substância e destrinça material entre crime e contraordenação interditam essa equiparação.
O nível de garantismo assegurado ao arguido é distinto no processo penal e no ilícito contraordenacional, aduzindo-se, ainda que, razões de simplicidade adjetiva e celeridade norteiam o regime que disciplina as exigências que subjazem aos articulados a proferir em sede de ilícito contraordenacional, o que se encontra em perfeita consonância com as garantias jusfundamentais cometidas ao arguido no artigo 32.º, número 10 da Constituição.
Finalmente, mesmo aceitando, para efeitos de mero exaurimento de todas as soluções (ainda que pouco) plausíveis de direito, que as normas do CPP invocadas são aplicáveis, ainda assim a pretensão não merece senão indeferimento. É que, a alegada narração de factos supostamente conclusivos não constitui nulidade prevista em nenhum daqueles preceitos.
Ainda menos tal questão constitui qualquer questão prévia, que obste ao conhecimento do mérito da causa e deva ser conhecida nesta fase da sentença.
O que releva, nos termos constantes no artigo 58.º do RGCO e 32.º, número 10 da Constituição, é a observância das exigências a que alude aquele preceito, de modo a que o arguido possa apreender as circunstâncias de tempo, lugar, execução e motivação que lhe são imputadas e sobre as mesmas exercer efetivo direito de contraditório e defesa.
Tais preceitos foram observados na decisão recorrida, como acima se apreciou e para o que se remete.
O Recorrente apreendeu, de modo cabal e pleno, as sobreditas circunstâncias de imputação fáctico-normativas e sobre as mesmas exerceu o correspondente contraditório e direito ao recurso, conforme reflecte a sentença que ora se produz, na sequência de recurso de impugnação judicial impulsionado pelo Recorrente.
Em complemento, e na senda do argumentário aduzido pela Recorrida, aduz-se como segue:
Os factos provados 101, 113, 123, 135, 141, 148, 158, 323, 328, 331, alínea h) e k), 338, 343, 349, 351, alíneas f), k) e q), e 329 e 331, alínea l), da Decisão recorrida, consubstanciam elementos normativos[23] dos tipos de contraordenação em causa nos autos.
E, como sinaliza a Recorrida, são «necessariamente objecto de prova».
Está aqui, por isso em causa, a apreciação do mérito do pleito e a verificação, ou não, dos elementos dos tipos contraordenacionais em causa, asserção que compete expender infra a propósito da fundamentação da matéria de facto.
Sem prejuízo, salienta-se que, os factos provados 101, 113, 123, 135, 141, 148 e 158 dizem respeito à qualificação da informação constante do Prospeto respeitante:
 (a) aos montantes dos títulos representativos de dívida emitidos por sociedades dos Grupos ESFG, Rio Forte e Escom e pela ES Tourism, no montante de 1656 milhões de euros, detidos por clientes do grupo BES à data da aprovação do Prospeto;
(b) ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto;
(c) às situações detetadas pelo auditor externo do BESA nos exercícios de 2011 2012, que motivaram a formulação de reservas na certificação legal de contas do BESA;
(d) ao facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação;
(e) ao aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG até à data de encerramento da Oferta;
(f) à emissão, pelo BES das cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA;
(g) ao aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte até à data de encerramento da Oferta ser necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma.
Os factos provados 323, 328, 331, alínea h) e k), 338, 343, 349 e 351, alíneas f), k) e q) respeitam ao conhecimento do Arguido CC quanto aos factos provados 113, 135, 141, 148 e 158.
Os factos provados 329 e 331, alínea l), respeitam ao facto de o Arguido não ter adotado qualquer medida adequada a sanar os vícios de informação constantes do Prospeto e, bem assim, sobre o conhecimento de tal facto pelo Arguido.
Todo aquele acervo factual foi objecto, repte-se, de narração circunstanciada, apreensível, na sua plenitude, pelo Recorrente.
O sobredito acervo foi, ainda, levado de modo devidamente fundamentado à decisão recorrida, permitindo ao Recorrente apreender o raciocínio lógico e hermenêutico empreendido pela Recorrida no quadro da valoração da prova que levou a cabo – cfr.  pontos 109 a 119, da Subsecção X, da Secção I (Factos constantes da acusação) do Capítulo I (Factos provados) do Título III (Fundamentação da decisão da matéria de facto).
Não se divisa a existência de qualquer vício, de nulidade ou outro, nem a postergação de qualquer norma ou princípio, de natureza legal ou jusfundamental, improcedendo o peticionado.’

Como acertadamente se recorda na sentença recorrida, o disposto no artigo 283.º, n.º 3, alínea b), do CPP, a que o recorrente faz apelo em abono da sua pretensão, disciplina o conteúdo da acusação pelo Ministério Público em processo penal.
 e não é aplicável aos processos de contraordenação.

Na verdade, o conteúdo da decisão condenatória proferida pela autoridade administrativa no âmbito de processo de contraordenação encontra-se regulado no artigo 58.º do RGCO, cuja aplicação afasta, nos termos do disposto no artigo 41.º, n.º 1, do RGCO, a necessidade e admissibilidade de recurso aos preceitos do processo penal.

Quanto ao artigo 58.º do RGCO (aplicável ex vi do artigo 407.º do CdVM), estipula que a decisão deve conter, nomeadamente;
a) a identificação dos arguidos;
b) a descrição dos factos imputados, com indicação das provas obtidas;
c) a indicação das normas segundo as quais se pune e a fundamentação da decisão;
d) a coima e as sanções acessórias.

O artigo 58.º do RGCO esgota o tema dos requisitos da decisão, não havendo lugar à aplicação do regime processual penal previsto no artigo 283.º do CPP.

O que releva, nos termos constantes no artigo 58.º do RGCO e 32.º, número 10 da Constituição, é a observância das exigências a que alude aquele preceito, de modo a que o arguido possa apreender as circunstâncias de tempo, lugar, execução e motivação que lhe são imputadas e sobre as mesmas exercer efetivo direito de contraditório e defesa.

Tais preceitos foram observados na decisão recorrida, como se apreciou no extrato da sentença recorrida acabado de citar, e termos que subscrevemos e para que se remete, donde resulta que  ‘O Recorrente apreendeu, de modo cabal e pleno, as sobreditas circunstâncias de imputação fáctico-normativas e sobre as mesmas exerceu o correspondente contraditório e direito ao recurso, conforme reflecte a sentença que ora se produz, na sequência de recurso de impugnação judicial impulsionado pelo Recorrente.’ (ênfase aditado).

Com efeito, a CMVM descreve de maneira exaustiva e circunstanciada todos os factos que fundamentam a sua Decisão, e, em concreto, os referidos pelo recorrente relativos (i) ao conhecimento pelo arguido de que a informação omitida ou não divulgada era necessária para a decisão dos destinatários da oferta e (ii) ao facto de o arguido não ter, durante o período de duração da oferta, adotado qualquer medida adequada a sanar os vícios da informação que conhecia e conscientemente não reflectiu no prospeto.

A título de exemplo, e como resulta da sentença impugnada (pp. 141-143, ênfase aditado):
 ‘Os factos provados 101, 113, 123, 135, 141, 148, 158, 323, 328, 331, alínea h) e k), 338, 343, 349, 351, alíneas f), k) e q), e 329 e 331, alínea l), da Decisão recorrida, consubstanciam elementos normativos dos tipos de contraordenação em causa nos autos.
E, como sinaliza a Recorrida, são «necessariamente objecto de prova».
Está aqui, por isso em causa, a apreciação do mérito do pleito e a verificação, ou não, dos elementos dos tipos contraordenacionais em causa, asserção que compete expender infra a propósito da fundamentação da matéria de facto.
Sem prejuízo, salienta-se que, os factos provados 101, 113, 123, 135, 141, 148 e 158 dizem respeito à qualificação da informação constante do Prospeto respeitante:
 (a) aos montantes dos títulos representativos de dívida emitidos por sociedades dos Grupos ESFG, Rio Forte e Escom e pela ES Tourism, no montante de 1656 milhões de euros, detidos por clientes do grupo BES à data da aprovação do Prospeto;
(b) ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto;
(c) às situações detetadas pelo auditor externo do BESA nos exercícios de 2011 2012, que motivaram a formulação de reservas na certificação legal de contas do BESA;
(d) ao facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação;
(e) ao aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG até à data de encerramento da Oferta;
(f) à emissão, pelo BES das cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA;
(g) ao aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte até à data de encerramento da Oferta ser necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma.
Os factos provados 323, 328, 331, alínea h) e k), 338, 343, 349 e 351, alíneas f), k) e q) respeitam ao conhecimento do Arguido CC quanto aos factos provados 113, 135, 141, 148 e 158.
Os factos provados 329 e 331, alínea l), respeitam ao facto de o Arguido não ter adotado qualquer medida adequada a sanar os vícios de informação constantes do Prospeto e, bem assim, sobre o conhecimento de tal facto pelo Arguido.’

Como constata na mesma sentença (ênfase aditado), ‘’Todo aquele acervo factual foi objecto, repete-se, de narração circunstanciada, apreensível, na sua plenitude, pelo Recorrente’ e ‘foi, ainda, levado de modo devidamente fundamentado à decisão recorrida, permitindo ao Recorrente apreender o raciocínio lógico e hermenêutico empreendido pela Recorrida no quadro da valoração da prova que levou a cabo – cfr.  pontos 109 a 119, da Subsecção X, da Secção I (Factos constantes da acusação) do Capítulo I (Factos provados) do Título III (Fundamentação da decisão da matéria de facto).’

O que a “narração dos factos da decisão que aplique uma coima ao arguido” tem de assegurar é que as circunstâncias de modo, tempo e lugar em que os factos ocorreram sejam suficientemente percetíveis de modo a que o arguido possa exercer o seu direito de defesa, o que se mostra plenamente assegurado na decisão da CMVM, como bem decidiu o Tribunal a quo.

Como recorda a sentença recorrida (cfr. pp. 139-143, ênfase aditado):
‘[…] O Recorrente apreendeu, de modo cabal e pleno, as sobreditas circunstâncias de imputação fáctico-normativas e sobre as mesmas exerceu o correspondente contraditório e direito ao recurso, conforme reflecte a sentença que ora se produz, na sequência de recurso de impugnação judicial impulsionado pelo Recorrente. […]

Todo aquele acervo factual foi objecto, repete-se, de narração circunstanciada, apreensível, na sua plenitude, pelo Recorrente.

O sobredito acervo foi, ainda, levado de modo devidamente fundamentado à decisão recorrida, permitindo ao Recorrente apreender o raciocínio lógico e hermenêutico empreendido pela Recorrida no quadro da valoração da prova que levou a cabo […]

Face ao exposto, secundamos a constatação do Tribunal a quo de que ‘[n]ão se divisa a existência de qualquer vício, de nulidade ou outro, nem a postergação de qualquer norma ou princípio, de natureza legal ou jusfundamental, improcedendo o peticionado’, não restando senão concluir-se pela manifesta improcedência da nulidade alegada pelo recorrente CC e, por conseguinte, do presente segmento recursivo.

II.3 – Da ilegalidade por inclusão na sentença recorrida de conclusões jurídicas na matéria de facto

Alega o recorrente DD (conclusões 25 a 27) que dos factos provados na sentença recorrida constam conceitos jurídicos, o que viola o disposto no artigo 607.º, n.º 4, do CPC, aplicável ex vi dos artigos 4.º CPP, 41.º RGCO e 407º CdVM, devendo os mesmos ter-se por não escritos.
Concretamente:
(i) Dos factos 134 e 361 consta a referência a completude;
(ii) Dos factos 135 e 362 consta o segmento informação “necessária para que os destinatários da oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma”.

É o seguinte o teor dos factos em causa (sublinhado aditado):
134.  A informação constante do Prospeto não é completa, porquanto não contém informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação. (fls. 24-211; fls. 1521-1582).
135.  A informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 669-801, maxime fls. 687 v., 696 v. e 722 v.; fls. 802-943, maxime fls. 810, 827 v. e 856; fls.1521-1582; fls. 4829-4841, maxime fls. 4830 e 4841; fls. 5852-5863 v., maxime fls. 5852 v. e 5863 v.).
361.  O arguido DD tinha conhecimento de que do Prospeto consta informação que não é completa, porquanto não contém informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação.
362.  O arguido DD tinha conhecimento de que a informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 1521-1582; fls. 1583-1636, maxime fls. 1594 v.; cd de fls. 2245, pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140620”, ficheiro “2. Resultados do aumento de capital do BES”, p. 17; fls. 4829-4841, maxime fls. 4830 e 4841; fls. 5852-5863 v., maxime fls. 5852 v. e 5863 v.; fls. 5864-5882 v., maxime fls. 5872 v.; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.).

Diga-se, a título liminar, que inexiste qualquer lacuna em matéria do conteúdo da sentença em sede de processo contraordenacional, que consinta na invocada aplicação subsidiária do artigo 607.º, n.º 4, do CPC, relativo à elaboração da sentença em processo civil.

Como assinala a sentença recorrida (p. 140, ênfase aditado):
‘o ilícito contraordenacional contém normas próprias e expressas quer sobre a acusação, sobre a decisão final administrativa, quer sobre a sentença a proferir em sede de ilícito contraordenacional, a saber os artigos 58.º do RGCO (decisão condenatória), o artigo 414.º-A do CdVM e o artigo 64.º do RGCO (sentença).’

As expressões “completa” e “necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma” utilizadas nos factos provados 134, 135, 361 e 362 constituem realidades perfeitamente apreensíveis e compreensíveis pelo intelecto humano, nomeadamente, do homem médio, pelo que não se reconduzem a conceitos jurídicos, cuja inserção na matéria de facto se encontra vedada.

Quando o mesmo termo é usado na linguagem jurídica e na comum, deve entender-se que foi utilizado no sentido comum[24]. Assim, a circunstância de um determinado conceito constar da lei, não veda que possa ser considerado matéria de facto, desde seja utilizado com o sentido de acontecimento ou manifestação do mundo exterior, mesmo que se reporte a atuações dos seres humanos do foro interno.

Ora, as expressões utilizadas assentam em critérios de carácter prático do homem comum, situando-se no domínio da matéria de facto, passíveis, enquanto tais, de compreensão e apreensão lógico-racional e intelectual do julgador da realidade factual que neles se contém, mediante a correspondente prova judicial.

Como refere a sentença recorrida (pp. 150-155, ênfase aditado):
‘[…] o Tribunal Constitucional no douto Acórdão n.º 500/2021 do Tribunal Constitucional (com referência, igualmente, ao Acórdão n.º 76/2016108), precisamente a propósito dos conceitos de «informação completa, verdadeira, atual, clara e objectiva» vertidos no artigo 388.º, número 1, alínea c) e artigo 389.º, número 1, alínea c), do CdVM, que «não julgou inconstitucionais»:

[…] Em boa verdade, a apreensibilidade dos requisitos que definem a qualidade da informação a prestar pelas entidades sujeitas à supervisão da CMVM, vertidos nos artigos 7.º e 389.º, n.º 1, alínea c) do CdVM, não requer sequer particular sagacidade. Isto porque: informação completa só pode ser aquela que, tendo em conta o âmbito da solicitação formulada pelo regulador, reúna a totalidade dos elementos na disponibilidade do regulado, sem ocultação ou sonegação de qualquer dado relevante; informação verdadeira é a que não enferma de qualquer desconformidade entre a descrição feita e a realidade relatada; informação atual é aquela que está disponível no momento em que deve ser prestada; informação clara e objetiva é aquela que não padece de imprecisões ou ambiguidade; e, por fim, informação lícita é a que é obtida, reunida e prestada sem violação da lei.

Acresce que tais requisitos são exigidos para a prestação de informação específica, respeitante «a instrumentos financeiros, a formas organizadas de negociação, às atividades de intermediação financeira, à liquidação e à compensação de operações, a ofertas públicas de valores mobiliários e a emitentes» (artigo 7.º, n.º 1, do CdVM).’

Como vem sendo entendido[25], apenas é vedada a inclusão de ‘um ponto da matéria de facto [que] integre uma afirmação ou valoração de factos que se insira na análise das questões jurídicas a decidir, comportando uma resposta, ou componente de resposta àquelas questões’.

O que não é, manifestamente, o caso das expressões ‘completa’ e ‘necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma’ utilizadas nos factos provados 134, 135, 361 e 362.

A propósito desta distinção entre juízos de facto e juízos de valor, lembra o Acórdão do STJ de 7.01.1999[26] que (ênfase aditado):

I - Há que distinguir entre juízos (puros) de facto e juízos de valor acerca dos factos - aqueles são as ocorrências concretas da vida real, incluindo as realidades puramente psicológicas; estes são integrados por apreciações, valorizações dos puros factos.

II - Nos juízos de valor há que distinguir entre os que são formulados apenas mediante a aplicação aos puros factos de critérios próprios do homem comum, prudente, bom pai de família, daqueles para cuja formulação é necessário fazer apelo a regras jurídicas ou à sensibilidade e intuição do jurista.

III - Os puros factos e os juízos de valor da primeira categoria integram matéria de facto, da competência das instâncias, que não pode ser censurada pelo tribunal de revista.

IV - Os juízos de valor da segunda categoria integram matéria de direito que pode ser censurada pelo STJ.

Ora, os factos provados 134, 135, 361 e 362 não encerram “conclusões jurídicas” como o recorrente DD alega, na medida em que não encerram em si matéria normativa ou integram qualquer afirmação que dê resposta a uma questão jurídica.

Exorbita, assim, do âmbito da sindicância deste Tribunal, sob pena de alterar a matéria de facto dada como provada pela primeira instância, o que lhe está vedado nos termos do disposto no artigo 75.º, n.º 1, do RGCO e no artigo 410.º, n.º 2, do CPP.

Pelo que improcede a pretensão recursiva a esse título formulada pelo recorrente DD.

II.4 – Da alegada nulidade por falta de fundamentação

Alega o Recorrente BB, a título subsidiário relativamente à nulidade por erro notório na apreciação da prova que também invoca e adiante se apreciará, que a sentença recorrida enferma de nulidade por falta de fundamentação, nos termos dos artigos 374.º, n.º 2, e 375.º do CPP (conclusões XLIII, XLIV e XLV), quanto às duas contraordenações por que foi condenado, ambas relativas à ESFG e subsidiárias.

Argumenta que (ênfase aditado):
‘a prova constante dos autos não permite que a decisão (de facto e de direito) quanto à ESFG seja distinta da decisão do Tribunal a quo quanto à Rio Forte, no que concerne ao aqui recorrente’;

‘[e]rros notórios na apreciação da prova impõem uma solução distinta quanto à matéria de facto, pelo menos […] quanto aos factos provados números 1029, 257, 258, 259, 260, 261, 262(d)(f)(g)(h)(i), 263, 269, 277(f) e 278’; e

‘na medida em que tais erros decorrem diretamente de um erro na apreciação da prova ou, no limite, corresponde a uma percepção deficiente derivada da forma como o Tribunal a quo fundamenta a apreciação que faz da prova, a sentença padece de falta de fundamentação no que concerne ao resultado atingido nos factos provados e não provados em violação do disposto nos artigos 374º, nº 2, e 375º do CPP, o que tem por consequência a nulidade da sentença’.
Vejamos.
Nos termos do artigo 374.º, n.º 2, do CPP, ‘[a]o relatório segue-se a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.’ (ênfase aditado).
Por seu lado, dispõe a alínea a) do n.º 1 do artigo 379.º do CPP que ‘[é] nula a sentença […] que não contiver as menções referidas no n.º 2 e na alínea b) do n.º 3 do artigo 374.º.
Pelo que, para se verificar a nulidade da sentença cominada pelo disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 379.º do CPP será necessário que falte, em absoluto, a fundamentação quanto aos aspetos indicados no n.º 2 do artigo 374.º do CPP.
Neste sentido, esclareceu o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15.12.2011[27] que (ênfase aditado):
A nulidade da sentença por falta de fundamentação não se verifica quando apenas tenha havido uma justificação deficiente ou pouco persuasiva, antes se impondo, para a verificação da nulidade, a ausência de motivação que impossibilite o anúncio das razões que conduziram à decisão proferida a final’.

Nos termos da própria norma citada, uma fundamentação concisa é suficiente para dar cumprimento ao disposto no n.º 2 do artigo 374.º do CPP, na medida em que o que releva é que o destinatário da sentença consiga percepcionar os motivos, de facto e de direito, que sustentam a decisão proferida.

Ou seja, como tem vindo a ser sustentado[28], ‘O exame crítico das provas não constitui nem uma escalpelização nem uma reprodução das provas ou depoimentos produzidos em audiências, bastando na decisão ser indicado os aspectos essenciais e o modo como se formou o juízo da sua veracidade.

De acordo com o exposto, para que se considere que o Tribunal deu cumprimento ao dever de fundamentação revela-se necessário que o Tribunal indique, na sentença, quais os aspetos essenciais da sua decisão e que explique o percurso para alcançar o sentido da decisão proferida.

Na sua fundamentação da matéria de facto, oTribunal tem que explicar o modo como se formou a sua convicção e como valorou determinado meio de prova, de modo a que o leitor da decisão proferida consiga percecionar as razões que estiveram subjacentes ao sentido da decisão, da forma mais completa possível, não se exigindo que o Tribunal fundamente, de forma autónoma, todos os pontos da matéria de facto provada.

Por outras palavras, ‘[a] motivação de facto não tem de ser ou tentar ser uma recriação do julgamento. Tem de assegurar que o processo de decisão seja inteligível. Isto de forma sucinta, ainda que tão completa quanto possível. O que importará maiores e melhores informações e explicações sempre que a complexidade do thema decidendum e da prova que sobre ele tenha versado tal imponham’ [29].

Ora, a mera leitura da sentença permite concluir que a mesma dá inteiro cumprimento ao dever de fundamentação ínsito no n.º 2 do artigo 374.º do CPP, não padecendo a mesma da nulidade que lhe pretende assacar o Recorrente BB.

Na verdade, a motivação da matéria de facto é aí explanada em detalhe, nomeadamente no que toca aos factos provados e não provados respeitantes ao recorrente BB, ao longo de dezenas de páginas, como resulta das seguintes passagens da sentença recorrida:
(i) os factos provados que fundamentaram a condenação do Recorrente BB (factos provados 88, 89, 102 a 113, 136 a 141, 252 a 263 e 264 a 278, nas pp. 208, 209, 219 a 221, 235 a 236 e 284 a 295);
(ii) os factos não provados alegados pelo Recorrente BB (factos não provados BBB) a OOO), nas pp. 362 a 365);
(iii) a motivação da sentença relativamente aos factos dados como provados e não provados (pp. 409 a 429, 465 a 471 e 541 a 563).

Estamos longe de uma total ausência de motivação da matéria de facto, pressuposto da invocada nulidade por falta de fundamentação invocada pelo recorrente BB, que assim improcede, tal como o presente segmento recursivo.

II.5 – Da alegada nulidade por omissão de pronúncia

O recorrente CC invoca (conclusões 114 a 120) a nulidade da Sentença recorrida, ao abrigo do artigo 379.º, n.ºs 1, alínea c), e 2 do CPP ex vi do artigo 41.º, n.º 1, do RGCO, por omissão de pronúncia sobre o teor das decisões da Comissão liquidatária no processo de liquidação/insolvência do BES.

Concretamente, censura que a decisão recorrida tenha dado como provado, no facto 436, apenas parte do texto das decisões da Comissão Liquidatária do BES (abaixo reproduzida e em parte enfatizada), relativa ao não reconhecimento dos créditos reclamados pelas sociedades do grupo PDVSA:

‘436. No âmbito do processo de liquidação do BES, os créditos reclamados pelo Banco de Desarollo Economico y Social Venezuela e pelo Fondo de Desarollo Nacional Fondem foram incluídos na lista de créditos não reconhecidos pela Comissão Liquidatária do BES, com os seguintes fundamentos:

“não pode ser dada como certa pela Comissão liquidatária a existência de um crédito por parte da Reclamante, sem que essa pretensão seja, caso os interessados assim o entendam, submetida ao crivo da produção e apreciação da prova judicial, com o contraditório dos demais credores, e decidida em última instância pelo tribunal, de acordo com as normas que regulam a verificação de créditos no processo de insolvência”.’

Considera que teriam, assim, sido omitidos excertos relevantes da decisão da Comissão Liquidatária do BES, invocados expressamente nos artigos 964 a 988 das alegações de impugnação judicial do recorrente, de onde resulta que a Comissão Liquidatária do BES (C. L. BES):
(i) entendeu que as ‘cartas de conforto’ não consubstanciam qualquer garantia de reembolso da dívida titulada da ESI subscrita pelo BANDES e o FONDEN (2º, 5º e 7º parágrafos das decisões da C. L. BES);
(ii) rejeitou a existência de qualquer ‘compromisso de reembolso’ do BES, na medida em que as ‘cartas de conforto’ estavam dependentes de uma condição que nunca se verificou ((parágrafo 6º das decisões da C. L. BES) e
(iii) as condutas descritas nas ‘cartas de conforto’ não implicam uma obrigação de reembolso de títulos de dívida da ESI, à custa do património do BES (parágrafos 5º e 6º das decisões da C.L. BES).

Mais alega (conclusões 121 a 126) que, nos termos do artigo 128.º, n.º 5, do CIRE só se pode afirmar a existência de créditos contra o BES, caso os mesmos sejam reconhecidos no processo de liquidação do BES, o que não foi o caso dos créditos reclamados pelo BANDES e FONDEN.

Vejamos.

Prevê a alínea c) do n.º 1 do artigo 379.º do CPP que ‘[é] nula a sentença: […] c) Quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento’ (ênfase aditado).

Ou seja, ao Tribunal a quo não cabe pronunciar-se sobre todos os argumentos aduzidos pelas partes, mas apenas ‘sobre questões que devesse apreciar’, como recorda a seguinte passagem do Acórdão do STJ de 15.12.2005[30] (ênfase aditado):
‘Não se verifica omissão de pronúncia quando o Tribunal conhece da questão que lhe é colocada, mesmo que não aprecie todos os argumentos invocados pela parte em apoio da sua pretensão. A omissão de pronúncia só se verifica quando o juiz deixa de se pronunciar sobre questões que lhe foram submetidas pelas partes ou de que deve conhecer oficiosamente, entendendo-se por questões os problemas concretos a decidir e não os simples argumentos, opiniões ou doutrinas expendidos pelas partes na defesa das teses em presença’.

No mesmo sentido, o Acórdão do STJ de 15.12.2011[31], onde se conclui (ênfase aditado) que:
 ‘A pronúncia cuja omissão determina a consequência prevista no art. 379.º, n.º 1, al. c), do CPP – a nulidade da sentença – deve incidir sobre problemas, os concretos problemas, as questões específicas sobre que é chamado a pronunciar-se o tribunal (o thema decidendum), e não sobre motivos ou argumentos; é referida ao concreto objecto que é submetido à cognição do tribunal e não aos motivos ou razões alegadas.

A doutrina e jurisprudência distinguem entre questões e razões ou argumentos; a falta de apreciação das primeiras consubstancia a verificação da nulidade; o não conhecimento dos segundos, será irrelevante.’

Refira-se que a aplicação do direito visa a resolução de problemas (jurídicos) concretos e não a análise de argumentos.

O que significa que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos invocados pelas partes a propósito de cada matéria, mas apenas a decidir os problemas concretos que as partes pretendem ver apreciados.

Ora, uma das questões a apreciar pelo Tribunal a quo é justamente a fundamentação dos factos dados como provados, in casu, as razões pelas quais deu como provado que as duas cartas assinadas pelo Recorrente CC, em 09.06.2014, tinham a natureza de cartas de conforto (factos provados 142, 143, 145, 146, 147, 148, 202, 203, 204, 205, 206, 213, alíneas f), g), h), i) e j), 339, 340, 341, 342, 343, 351, alíneas g), h), i), j) e k)).

O que se mostra feito na sentença recorrida (pp. 471-482), nos seguintes termos (ênfase aditado):
‘[…] Convocando o critério a que alude o artigo 236.º do Código Civil, afigura-se límpido que, atento o sentido normal das palavras ali empregue, através das referidas cartas, o BES assumiu o compromisso de reembolsar os títulos representativos de dívida emitidos pela ESI que haviam sido adquiridas pelas sociedades destinatárias das mesmas (FONDEN e BANDES), uma vez que nelas é indicado o ISIN do produto e referido que o BES “nas datas de vencimento” “[a]ssegurará a liquidez necessária de forma a permitir o reembolso programado

Donde, é forçoso concluir que, com a emissão pelo BES, em 09.06.2014, de duas cartas de conforto em favor das sociedades venezuelanas Fondo Nacional para el Desarrollo Nacional – FONDEN, S.A. e Banco de Desarollo Economico y Social da Venezuela (ambas integrantes do grupo Petróleos da Venezuela – PDVSA), o BES assumiu o compromisso de reembolsar os títulos representativos de dívida emitidos pela ESI que haviam sido adquiridas pelas sociedades destinatárias das cartas, no valor de 372 milhões de dólares (e não apenas os 365 milhões de dívida da ESI que, por lapso, nelas foram expressamente referidos). […]

Sintetizando, o teor gramatical explícito das cartas de conforto, o acto per se de emissão, a designação escolhida pelo BES para o efeito sabendo o sentido comum que assumem no contexto da actividade bancária, o facto de terem sido assinadas por 2 Administradores do BES, incluindo pelo Presidente da sua Comissão Executiva, conduziu o Tribunal à convicção de que o BES assumiu, de modo expresso e sem reservas ou condicionantes, o compromisso de assegurar o reembolso dos referidos títulos de dívida da ESI através de uma de duas vias: colocação em mercado secundário ou assegurando a liquidez (em substituição da ESI). Não colhe, por isso, neste quadro, a alegação dos Recorrentes CC e EE, infirmada pelo que antecede. […]

Em síntese, a apreciação crítica e conjugada do que antecede, à luz das regras da experiência comum e da normalidade social, inculcou no Tribunal a convicção de que o BES (e os Recorrentes) conhecia o efeito jurídico das declarações que fez constar das cartas que emitiu em 09.06.2014 e fez chegar às destinatárias (FONDEN e BANDES).’

Acresce que, sem que precisasse de o ter feito, a sentença recorrida apreciou também o argumento do Recorrente CC quanto à apreciação feita pela Comissão Liquidatária do BES relativa aos créditos reclamados pelo BANDES e FONDEN com fundamento nas referidas cartas.

Como consta da sentença recorrida (pp. 391-392), o Tribunal a quo concluiu o seguinte (ênfase aditado):
“Com reporte, às cartas de conforto e à posição sobre as mesmas assumida pela Comissão Liquidatária do BES, conforme resulta de fls. 8360 e 8363 dos autos, afigura-se que o entendimento perfilhado não é de que a Comissão Liquidatária considerou que aqueles créditos não são devidos; na verdade, com rigor, o que dali decorre, outrossim, é que “não pode ser dada como certa pela Comissão Liquidatária a existência de um crédito por parte da Reclamante, sem que essa pretensão seja, caso os interessados assim o entendam, submetida ao crivo da produção e apreciação da prova judicial, com o contraditório dos demais credores, e decidida em última instância pelo tribunal, de acordo com as normas que regulam a verificação de créditos no processo de insolvência”.

Contrariando assim, expressamente, o argumento do recorrente CC no sentido de que o não reconhecimento, pela Comissão Liquidatária do BES, dos créditos reclamados pelo BANDES e FONDEN com fundamento nas referidas cartas, demonstra que as mesmas não implicavam um compromisso de reembolso, por parte do BES, dos títulos de dívida da ESI nelas referidos.

A apreciação da natureza das cartas de conforto emitidas em 09.06.2014 (a fls. 8336 a 8337) decorre da interpretação das declarações negociais delas constantes pelo Tribunal a quo, não estando dependente de qualquer juízo de terceiros, nomeadamente, do efetuado pela Comissão Liquidatária no âmbito do processo de insolvência do BES.

Não se constata, assim, a invocada nulidade por omissão de pronúncia, nos termos conjugados do disposto nos artigos 374.º, n.º 2 e 379.º n.º 1, alínea c), do CPP, improcedendo a correspondente pretensão recursiva.

II.6 – Dos vícios da matéria de facto da sentença recorrida (art. 410º nº 2 do CPP)

O âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. os artigos 119°, n.° 1, 123°, n.° 2 e 410°, n.° 2, als. a), b) e c) do Código de Processo Penal).

Estando em causa recurso de sentença que conheceu de impugnação judicial de uma decisão administrativa proferida em processo de contraordenação, o disposto no artigo 75° n.° 1 do RGCO estabelece que, em regra, e salvo se o contrário resultar do diploma, este Tribunal de 2ª instância apenas conhece de matéria de direito.

Apesar de este Tribunal da Relação não poder reapreciar a matéria de facto  julgada pelo Tribunal recorrido, pode tomar conhecimento das nulidades previstas no artigo 410°, n° 2, do Código de Processo Penal, segundo o qual:

‘2. Mesmo nos casos em que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum:
a) a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada;
b)  a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão;
c)  erro notório na apreciação da prova.

Assim, aqueles vícios tem de resultar do texto da decisão recorrida e não de elementos processuais a ela estranhos, ainda que produzidos no âmbito da discussão judicial do caso, designadamente depoimentos testemunhais ou documentos particulares, pelo que a insuficiência da matéria de facto provada, a contradição insanável da fundamentação, ou contradição entre a fundamentação e a decisão e, o erro notório na apreciação da prova, devem resultar de per si do texto da decisão recorrida e ser analisados em função do aí consignado, conjugado com as regras de experiência comum.

Por conseguinte, ‘fica excluída da previsão do preceito toda a tarefa de apreciação e/ou valoração da prova produzida, em audiência ou fora dela, nomeadamente a valoração de depoimentos, mesmo que objecto de gravação, documentos ou outro tipo de provas, tarefa reservada para o conhecimento do recurso em matéria de facto’ [32], objecto de recurso que, em matéria contraordenacional, está excluído do  Tribunal de 2ª instância, conforme decorre do referido art. 75°, n° 1, do RGCO.

II.6.1 – Da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada

Os recorrentes AA, CC e DD alegam que a Sentença recorrida padece de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, nos termos do disposto no artigo 410.º, n.º 2, alínea a), do CPP.

Importa, a este propósito ter presente que o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, a que se refere a alínea a) do n.º 2 do 410.º do CPP, se traduz na circunstância de os factos provados não serem suficientes para sustentarem a decisão que foi proferida.

Com efeito, só nos encontramos perante um caso de “(…) insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, quando a decisão de direito não encontre na matéria de facto provada uma base tal que suporte um raciocínio «lógico-subsuntivo»[33].

Como ensina Germano Marques da Silva, a propósito da alínea a) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, ‘Para se verificar este fundamento é necessário que a matéria de facto se apresente como insuficiente para a decisão que deveria ter sido proferida por se verificar lacuna no apuramento da matéria de facto necessária para uma decisão de direito”.[34]

Ou seja, a previsão do artigo 410.º, n.º 2, alínea a), do CPP, limita-se às situações em que a sentença recorrida sustenta a decisão de direito em factos que não foram dados como provados, isto é, quando a conclusão extravasa as premissas[35].

Neste sentido tem-se pronunciado, abundantemente, o Supremo Tribunal de Justiça, como, a título de exemplo, no acórdão de 24.11.2004[36]:
‘[…] insuficiência da prova para a decisão de facto, que só se verifica quando as provas produzidas e os factos nela apoiados são insuficientes para a decisão de direito proferida.’;

Ou no acórdão de 13.02.1991[37]:
‘O fundamento a que se refere a al. a) do n.º 2 do art. 410.º do CPP é a insuficiência da matéria de facto para a decisão de direito, que não se confunde com a insuficiência da prova para a decisão de facto proferida, coisa bem diferente.’


Examinemos, pois, em concreto o que alegam os recorrentes AA, CC e DD.

II.6.1.1 – Recorrente AA

O recorrente AA sustenta que não se pode considerar suficiente, para a decisão, a matéria de facto provada, através da mera remissão para uma profusão de documentos, dos quais não resulta que o arguido sabia que a informação omitida ‘era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma’. (conclusões 235ª a 238ª, abaixo reproduzidas).

235ª. Ora, e em primeiro lugar, não procede a técnica imputativa usada pela CMVM e reproduzida na douta Sentença recorrida, consistente em referenciar milhares de documentos que alegadamente suportam a conclusão de que o arguído AA sabia que a dita informação era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma.

236ª. Os milhares de documentos referenciados em nada, em absolutamente nada, suportam ou sequer indiciam que a informação em causa era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma!


237ª. Porque não pode ser com a remissão para uma profusão de documentos, sem fundamentação, que se possa considerar suficiente, para a decisão, a matéria de facto provada (art. 410º/2/a) do CPP).

238ª. A douta Sentença recorrida, como resulta do seu próprio texto, não contém a matéria probatória para poder considerar provado que o arguido AA tinha conhecimento de que a informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma.

A própria formulação do recorrente AA (‘não contém a matéria probatória para poder considerar provado’)  mostra que o que está em causa, na verdade, não é a alegação de uma qualquer insuficiência da matéria de facto provada para a decisão, mas sim a impugnação da matéria de facto dada como provada na sentença recorrida, o que lhe está vedado nos termos do disposto no artigo 75.º, n.º 1, do RGCO e no artigo 410.º, n.º 2, do CPP.

Com efeito, foram dados como provados na sentença recorrida, designadamente nos factos provados 255, 231, 234(h), 242 e 250(f) (infra reproduzidos, ênfase aditado) os factos atinentes ao conhecimento, por parte do arguido (ora recorrente) AA, de que a informação omitida ou não divulgada no prospeto ‘era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma’:
225. O arguido AA tinha conhecimento de que a informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211 maxime fls. 29, 34, 60 v., 61, 62, 143 v., 174, 174 v.,175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; fls. 1644-1785; fls. 4873-4896 e fls. 7297-7343; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.).

231. O arguido AA tinha conhecimento de que a informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 669-801, maxime fls. 687 v., 696 v. e 722 v.; fls. 802-943, maxime fls. 810, 827 v. e 856; fls.1521-1582; fls. 4829-4841, maxime fls. 4830 e 4841; fls. 5852-5863 v., maxime fls. 5852 v. e 5863 v.; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “3 19-06-2014 a 01-08-2014”, ficheiro “(1528) 19 06 2014”, ponto 02:01:00 da ordem de trabalho)

232. O arguido AA sabia que:
[…]
h) a informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma; (fls. 24-211 maxime fls. 29, 34, 60 v., 61, 62, 143 v., 174, 174 v.,175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; fls. 1644-1785; fls. 4873-4896 e fls. 7297-7343; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
[…]
k)  a informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma.

242.   O arguido AA tinha conhecimento de que a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211, maxime fls. 27, 27 v., 29, 60 v., 61 e 62, 143 v., 145, 174, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636, maxime fls. 1595; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2479 v.; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v.; fls. 3232-3236 v.; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v. e cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014)

250. O arguido AA sabia que:
[…]
i) a informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma; (fls. 24-211 maxime fls. 29, 34, 60 v., 61, 62, 143 v., 174, 174 v.,175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; fls. 1644-1785; fls. 4873-4896 e fls. 7297-7343; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)

Não questiona a suficiência da matéria de facto para a decisão sob censura, mas a susceptibilidade de tal matéria de facto resultar do acervo de documentos nela referenciados, o que exorbita do âmbito da nulidade invocada nos termos do artigo 410º, nº 2, alínea a) do CPP e nem se mostra minimamente ser o caso.

Termos em que se não verifica a alegada insuficiência da matéria de facto para a decisão proferida, improceder a nulidade alegada pelo recorrente AA, e com ela o presente segmento recursivo.

II.6.1.1 – Recorrente CC

Também o recorrente CC sustenta a insuficiência da matéria de facto provada para a decisão recorrida, quer quanto às condenações pela omissão de informação sobre a exposição do BES à ESFG e subsidiárias (conclusões 41 a 56, infra reproduzidas), quer quanto à condenação pela omissão de informação quanto às cartas de conforto emitidas em 9.06.2014.

Relativamente às condenações pela omissão de informação sobre a exposição do BES à ESFG e subsidiárias, alega em síntese que (i) ‘o elenco de factos provados da Sentença é omisso quanto a quaisquer factos concretos que permitam a conclusão de que aqueles diferenciais eram relevantes para a decisão de investimento dos destinatários da oferta’, (ii) ‘não é suficiente […] afirmar, em termos absolutamente conclusivos e genéricos, que a informação alegadamente omitida no Prospecto a este respeito era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma e tinha relevo para a tomada de decisão de investimento, e (iii) 'sempre faltaria demonstrar, através de factos concretos e objectivos, que a informação sobre o relato financeiro tinha efectivamente relevo para a decisão de investimento’ (conclusões 94 a 101, infra reproduzidas):

41. Na tese da Sentença Recorrida, é imputada uma suposta falta de completude e actualidade do prospecto por umsuposto diferencial de EUR 243 milhões, no que diz respeito à exposição do BES à ESFG, atenta a referência de EUR 290 milhões que constava do Prospecto.

42.  É, igualmente, imputada uma contra-ordenação ao ora Recorrente, relativa à não divulgação de uma adenda ao prospecto, em função do aumento da exposição do BES à ESFG e subsidiárias, por, em 30 de Maio de 2014, o BES ter concedido financiamentos à ESFG e subsidiárias de cerca de EUR 194 milhões.

43. No entanto, da mera leitura da Sentença Recorrida, resulta que o elenco de factos provados da Sentença é omisso quanto a quaisquer factos concretos que permitam a conclusão de que aqueles diferenciais eram relevantes para a decisão de investimento dos destinatários da oferta.

44. Não resulta dos factos provados na Sentença Recorrida, que os alegados diferenciais de (i) EUR 243 milhões, no que diz respeito à exposição do BES ao grupo ESFG, entre 31.12.2013 e a data da aprovação do prospecto, e de (ii)EUR 194 milhões, no que diz respeito à exposição do BES ao Grupo ESFG em 30.05.2014, fossem significativos ou tivessem uma materialidade ou relevância tal que pudessem interferir na decisão dos investidores de participar na oferta pública de subscrição.

45. Para efeitos da imputação objectiva das contra-ordenações aqui em causa, não é suficiente o Tribunal de 1.ª instância afirmar, em termos absolutamente conclusivos e genéricos, que a informação alegadamente omitida no Prospecto a este respeito era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma e tinha relevo para a tomada de decisão de investimento.

46. Como é lógico, estando emcausa um elemento constitutivo do tipo das contra-ordenações aqui imputadas, o mesmo tem de ser aferido com recurso a factos concretos e objectivos (os quais, de resto, seriam apenas susceptíveis de ser demonstrados por perícia financeira ou, no limite, por prova testemunhal).

47. Se as operações com partes relacionadas, e in casu, os financiamentos concedidos ao Grupo ESFG configuram operações que, pela sua própria natureza, envolvem um risco de inadequado relato financeiro, e, por esse motivo, é relevante para os investidores conhecer o montante dessas operações, o Tribunal deveria ter dado tal premissa como provada.

48. Deveria, pelo menos, resultar dos factos provados que as operações com partes relacionadas configuram operações que, pela sua própria natureza, envolvem um risco de inadequado relato financeiro, o que, como é evidente, não foi o caso.

49. Por outro lado, sempre faltaria demonstrar, através de factos concretos e objectivos, que a informação sobre o relato financeiro tinha efectivamente relevo para a decisão de investimento.

50. No entanto, não foi produzida qualquer prova nesse sentido.

51. Em rigor, está em causa uma insuficiência da matéria de facto, que resulta da mera leitura da própria Sentença Recorrida, e que releva, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 410.º, n.º 2 - al. a), do CPP, ex vi artigos 41.º, n.º 1, e 74.º, n.º 4, do RGCO.

52. Pelo exposto, a insuficiência da matéria de facto provada resultante da falta de factos provados na Sentença Recorrida que permitam sustentar que a informação sobre o montante total dos financiamentos concedidos à ESFG e o aumento da exposição do BES ao Grupo ESFG era relevante para a conformação da decisão de investimento pelos destinatários na oferta de aumento de capital configura um vício da sentença recorrida, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 410.º, n.º 2, alínea a) do CPP aplicável ex vi artigo 41.º, n.º 1 e 74.º, n.º 4, do RGCO, devendo a mesma ser revogada, ordenando-se a baixa do processo para correcção do vício, o que se REQUER.

53.  A necessidade e/ou relevância da informação no prospecto para a tomada de decisão de investimento pelos destinatários da oferta é um elemento constitutivo dos tipos contra-ordenacionais imputados ao ora Recorrente nos presentes autos, traduzidos na violação dos
deveres previstos nos artigos 135.º, n.º 1 e 142.º, n.º 1, do CVM.

54. Conforme resulta do exposto, na Sentença Recorrida não resultou provado qualquer facto concreto e objectivo a propósito da relevância da informação económica e financeira alegadamente omitida para a conformação da decisão de investimento pelos destinatários na oferta de aumento de capital.

55. Por conseguinte, é forçoso concluir que, à luz da matéria de facto provada na Sentença Recorrida, não está preenchido o tipo objectivo das contra-ordenações aqui imputadas, pela violação do disposto no artigo 135.º, n.º 1, e no artigo 142.º, n.º 1, do CVM.

56. Nestes termos, as imputações feitas na Sentença Recorrida ao ora Recorrente a respeito da falta de qualidade da informação do prospecto e da não divulgação de adenda ao prospecto quanto ao aumento da exposição do BES à ESFG devem cair pela base, e, em consequência, o Recorrente deve ser absolvido.

Relativamente à omissão de informação quanto às cartas de conforto emitidas em 9.06.2014, alega em síntese que a sentença recorrida nos factos 343 a 351, alínea k), dá como provado em termos genéricos que o recorrente tinha conhecimento de que a informação omitida era necessária para que os destinatários pudessem fazer juízos fundados sobre a mesma (conclusões 94 a 101, infra reproduzidas):

94. Na Sentença Recorrida, o Tribunal de 1.ª instância limita-se a dar como provado, nos factos provados n.º 343 e 351, k), em termos genéricos e abstractos, que o ora Recorrente tinha conhecimento de que a informação sobre a emissão,pelo BES, das cartasde conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma.

95. O Tribunal limita-se a referir que o ora Recorrente sabia que esta informação era necessária para a decisão de investimento pelos destinatários da Oferta apenas com base no facto de o Recorrente as ter assinado e conhecer o seu conteúdo.

96. No entanto, tal é, evidentemente, insuficiente para concluir pela relevância dessa matéria para a conformação da decisão de investimento pelos destinatários na oferta de aumento de capital.

97. A relevância desta informação deve ser efectivamente demonstrada e provada na decisão, através da realização de produção de prova, designadamente de uma perícia financeira ou, no limite, através da produção de prova testemunhal, mas tal não foi o caso da Sentença Recorrida.

98. Nesta medida, resulta evidente que, da mera leitura da Sentença Recorrida, não constam quaisquer factosprovados concretos que permitam concluir que a informação sobre a emissão, pelo BES, das cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma.

99.  Pelo exposto, a insuficiência da matéria de facto provada resultante da falta de factos provados na Sentença Recorrida que permitam sustentar que a necessidade da informação sobre a emissão pelo BES das “cartas de conforto” em favor das sociedades do grupo PDVSA para a decisão de investimento dos destinatários da Oferta configura um vício da sentença recorrida, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 410.º, n.º 2, alínea a) do CPP aplicável ex vi artigo 41.º, n.º 1 e 74.º, n.º 4, do RGCO, devendo a mesma ser revogada, ordenando-se a baixa do processo para correção do vício, o que se REQUER.

100. De resto, e como já referimos supra, a necessidade e/ou relevância da informação no prospecto para a tomada de decisão de investimento pelos destinatários da oferta é um elemento constitutivo do tipo contra-ordenacional imputado ao ora Recorrente nos presentes autos.

101. Por conseguinte, na falta de prova de factos concretos e objectivos que permitam sustentar que a necessidade da informação sobre a emissão pelo BES das “cartas de conforto” em favor das sociedades do grupo PDVSA para a decisão de investimento dos destinatários da Oferta, será forçoso concluir que não está preenchido o tipo objectivo das contra-ordenações aqui imputadas, pela violação do disposto no artigo 142.º, n.º 1, do CVM.

Vejamos.

Resulta da matéria de facto dada como provada pelo Tribunal a quo e que não cabe a esta instância sindicar (artigo 75.º, n.º 1, do RGCO e no artigo 410.º, n.º 2, do CPP), que (i) a informação omitida ou não divulgada no prospeto ‘era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma’ (factos provados 113, 135, 141 e 148, infra reproduzidos), quer que o arguido (ora recorrente) CC disso tinha conhecimento (factos provados 323, 328, 331, alíneas h) e k), 338, 343 e 351, alíneas f) e k), infra reproduzidos).

113. A informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211 maxime fls. 29, 34, 174, 174 v.,175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; fls. 1644-1785; fls. 4873-4896 e fls. 7297-7343)

135.  A informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 669-801, maxime fls. 687 v., 696 v. e 722 v.; fls. 802-943, maxime fls. 810, 827 v. e 856; fls.1521-1582; fls. 4829-4841, maxime fls. 4830 e 4841; fls. 5852-5863 v., maxime fls. 5852 v. e 5863 v.)

141.   A informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v.; fls. 3232-3236 v.)

148.   A informação sobre a emissão, pelo BES das cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 2243-2248, maxime cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140715”, ficheiros “CE-20140715-07.03.02 Carta dirigida ao Banco de Desarrollo Economico y Social de Venezuela” e “CE-20140715-07.03.03 Carta dirigida ao Fondo de Desarollo Nacional – FONDEN” e fls. 2246-2247; fls. 3088-3091 v., maxime fls. 3090 v.-3091; cd de fls. 3223, ficheiro “Nº 269 CMVM_01 03 2018 pedido de elementos_Processo de contraordenação nº 14_2017”, pp. 3 e 4; fls. 8336-8337; fls. 8366-8385, maxime fls. 8367, 8368, 8382 e 8384)

323.   O arguido CC tinha conhecimento de que a informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211 maxime fls. 29, 34, 174, 174 v.,175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; fls. 1644-1785; fls. 4873-4896 e fls. 7297-7343; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)

328.   O arguido CC tinha conhecimento de que a informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 1521-1582; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245, maxime pasta “CE”, subpasta “3 19-06-2014 a 01-08-2014”, ficheiro “(1528) 19 06 2014”, ponto 02:01:00 da ordem de trabalho e pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140620”, ficheiro “2. Resultados do aumento de capital do BES”, p. 17; fls. 4829-4841, maxime fls. 4830 e 4841; fls. 5852-5863 v., maxime fls. 5852 v. e 5863 v.; fls. 5864-5882 v., maxime fls. 5872 v.; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)

331.   O arguido CC sabia que:
[…]
h)    a informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma; (fls. 24-211 maxime fls. 29, 34, 174, 174 v.,175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; fls. 1644-1785; fls. 4873-4896 e fls. 7297-7343; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
          […]
j) a informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma; (fls. 24-211; fls. 1521-1582; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245, maxime pasta “CE”, subpasta “3 19-06-2014 a 01-08-2014”, ficheiro “(1528) 19 06 2014”, ponto 02:01:00 da ordem de trabalho e pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140620”, ficheiro “2. Resultados do aumento de capital do BES”, p. 17; fls. 4829-4841, maxime fls. 4830 e 4841; fls. 5852-5863 v., maxime fls. 5852 v. e 5863 v.; fls. 5864-5882 v., maxime fls. 5872 v; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)

338.   O arguido CC tinha conhecimento de que a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)

343.   O arguido CC tinha conhecimento de que a informação sobre a emissão, pelo BES das cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma.

351.   O arguido CC sabia que:
[…]
f) a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma; (fls. 24-211; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)
                 […]
k) a informação sobre a emissão, pelo BES das cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma;

Destes se infere, de forma clara e inequívoca, a decisão quanto à relevância da dita informação para um juízo fundado dos destinatários da Oferta e o conhecimento, por parte do recorrente CC, de tal relevância.

O que no fundo vem censurado à decisão recorrida, a este título, pelo recorrente CC, reporta-se, antes, à imputação genérica de factos não suficientemente concretizados, já objecto de apreciação (secção II.2, supra), designadamente quanto à circunstância de os factos provados 101, 113, 123, 135, 141, 148, 158, 323, 328, 331, alíneas h) e k), 338, 343, 349 e 351, alíneas f) e K), conterem referência a ‘informação necessária’, alegadamente um conceito jurídico.

Foram dados como provados na sentença recorrida, designadamente nos supra aludidos 113, 135, 141 e 148, 323, 328, 331, alíneas h) e k), 338, 343 e 351, alíneas f) e k), atinentes ao conhecimento, por parte do arguido (ora recorrente) CC, de que a informação omitida ou não divulgada no prospeto ‘era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma’, e que o recorrente disso tinha conhecimento, pelo que se não verifica a invocada insuficiência da matéria de facto para a decisão proferida, improcedendo a correspondente nulidade e, com ela, o presente segmento recursivo.

II.6.1.1 – Recorrente DD

Também o recorrente DD sustenta a insuficiência da matéria de facto provada para a decisão recorrida, alegando que esta não tomou em consideração que corriam auditorias ao BESA (conclusões 53, 54, 55 e 56, infra reproduzidas) e se não pronuncia sobre (i) o facto invocado pela defesa (artigo 1214º do recurso) relativo às declarações do Governador do Banco de Portugal de 18.07.2014 (conclusões 45, 46 e 47, infra reproduzidas), (ii) o artigo 1211º do recurso (conclusões 45, 46 e 47, infra reproduzidas), (iii) o artigo 848º do recurso (conclusões 48, 49 e 50, infra reproduzidas) e os artigos 1165º a 1175º do recurso relativas às conclusões da K... Angola sobre a carteira de crédito do BESA (conclusões 57, 58 e 59, infra reproduzidas):

45. Em primeiro lugar, e salvo melhor opinião, a sentença recorrida incorre em vício por insuficiência da matéria de facto dada como provada ao nem sequer se pronunciar sobre o facto invocado na defesa do Recorrente – artigo 1214.º do recurso de impugnação judicial – segundo o qual o próprio Governador do Banco de Portugal declarou, em 18 de julho de 2014, que – e cita-se – “o BdP não antecipa um impacto negativo relevante na posição de capital do BES resultante da situação financeira da filial BES Angola (BESA), tendo em consideração que a Garantia do Estado Angolano cobre uma parte substancial da carteira de crédito e que existe uma forte interação entre as entidades de ambos os países” (cfr. fls. 5548 dos autos).

46. Este facto – provado com base em prova documental e reiterado nas declarações da testemunha OO – é relevante para a defesa do Recorrente e deveria ter sido incluído na matéria de facto dada como provada, pois, como é evidente, encontra-se em total concordância coma defesa do Recorrente segundo a qual o prospeto se encontrava completo, na medida em que, da perspetiva do emitente(BES), a Garantia Soberana imunizava quaisquer consequências indiretas que pudesse advir de um potencial incumprimento da carteira de créditos do BESA.

47. Assim, é manifesto que a sentença recorrida incorre num vício de insuficiência da matéria de facto dada como provada, na medida em que nem sequer se pronunciou sobre o supra alegado facto, relevante para a defesa do Recorrente, razão pela qual deve ser dado como provado que, em 18 de julho de 2014, o Governador do Banco de Portugal declarou que “o BdP não antecipa um impacto negativo relevante na posição de capital do BES resultante da situação financeira da filial BES Angola (BESA), tendo em consideração que a Garantia do Estado Angolano cobre uma parte substancial da carteira de crédito e que existe uma forte interação entre as entidades de ambos os países” (cfr. fls. 5548 dos autos), nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP.

48. Em segundo lugar, a sentença recorrida incorreu igualmente em vício por insuficiência da matéria de facto dada como provada ao nem sequer se pronunciar sobre o facto invocado na defesa do Recorrente – artigo 1211.º do recurso de impugnação judicial – segundo o qual resulta das contas do BESA de 2013 que, “[e]m 31 de dezembro de 2013, toda a carteira de crédito concedido e respetivo juro corrido, sob a garantia soberana, foi considerado como crédito reestruturado, estando classificado como crédito vincendo” (cfr. fls. 560 dos autos).

49. Salvo melhor opinião, é absolutamente evidente que este facto é igualmente relevante para a defesa do Recorrente, pois demonstra que – com a Garantia Soberana – jamais seria correto dar-se por demonstrado o baluarte factual da contraordenação imputada ao Recorrente, isto é, que o BESA, “no final do ano de 2013, [seria] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação”.

50. Assim, é manifesto que a sentença recorrida incorre num vício de insuficiência da matéria de facto dada como provada, na medida em que nem sequer se pronunciou sobre o supra alegado facto, relevante para a defesa do Recorrente, razão pela qual deve ser dado como provado que resulta das contas do BESA de 2013 que “[e]m 31 de dezembro de 2013, toda a carteira de crédito concedido e respetivo juro corrido, sob a garantia soberana, foi considerado como crédito reestruturado, estando classificado como crédito vincendo” (cfr. fls. 560 dos autos), nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP.

51. Em terceiro lugar, a sentença recorrida incorreu em vício por insuficiência da matéria de facto dada como provada ao nem sequer se pronunciar sobre o facto invocado na defesa do Recorrente – artigo 848.º do recurso de impugnação judicial – segundo o qual o Recorrente jamais transmitiu à equipa do DAJ que acompanhou a operação de aumento do capital do BES de 2014 – isto é, PP, TT e SS – qualquer instrução no sentido de não ser levada informação relevante ao prospeto, o que, naturalmente é relevante para a descoberta da verdade e para a defesa até porque foi imputado dolo ao Recorrente.

52. Assim, é manifesto que a sentença recorrida incorre num vício de insuficiência da matéria de facto dada como provada, na medida em que nem sequer se pronunciou sobre o supra alegado facto, relevante para a defesa do Recorrente, razão pela qual deve ser dado como provado que o Recorrente jamais transmitiu à equipa do DAJ que acompanhou a operação de aumento do capital do BES de 2014 – isto é, Dr. PP, TT e SS – qualquer instrução no sentido de não ser levada informação relevante ao prospeto, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP.

53. Em quarto lugar, a sentença recorrida incorreu em insuficiência da matéria de facto dada como provada ao nem sequer se pronunciar sobre o facto de o Recorrente ter sido informado pelo peloureiro do BESA, Dr. AA, que corriam auditorias ao BESA para “definitivamente, conhecer, circunscrever, quantificar e avaliar, de forma, objetiva e esclarecida, os problemas da carteira de créditos do BESA” (cfr. Pasta 5, fls. 2245, CA – CA2006_01072014).

54. Naturalmente que este facto é relevante para a defesa do Recorrente, visto que, tanto quanto era do conhecimento do Recorrente, estavam em curso auditorias à carteira de créditos do BESA, nas palavras do próprio peloureiro do BESA, para “definitivamente, conhecer, circunscrever, quantificar e avaliar, de forma, objetiva e esclarecida, os problemas da carteira de créditos do BESA”, pelo que a pretensa informação segundo a qual o “BESA, no final do ano de 2013, ser[ia] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor totalde1.7mil milhões de dólares que careciam de reestruturação” não estava– tal como o Recorrente havia sido informado – sequer confirmada à data em que foi elaborado e aprovado o prospeto (maio de 2014).

55. Saliente-se que este argumento factual de defesa do Recorrente é sempre sem prejuízo de se entender que o prospeto é completo em matéria de BESA dada a emissão da Garantia Soberana pelo Estado Angolano em 31 de dezembro de 2013 que imunizou o BESA e, consequentemente, o BES, em relação a qualquer potencial incumprimento da carteira de crédito debaixo da Garantia Soberana.

56. Assim, é manifesto que a sentença recorrida incorre num vício de insuficiência da matéria de facto dada como provada, na medida em que nem sequer se pronunciou sobre o supra referido facto, relevante para a defesa do Recorrente, razão pela qual deve ser dado como provado que o Recorrente foi informado pelo peloureiro do BESA, Dr. AA, que corriam auditorias ao BESA para “definitivamente, conhecer, circunscrever, quantificar e avaliar, de forma, objetiva e esclarecida, os problemas da carteira de créditos do BESA”, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP.

57. Em quinto lugar, a sentença recorrida incorreu ainda em vício por insuficiência da matéria de facto dada como provada ao nem sequer se pronunciar sobre o facto invocado na defesa do Recorrente e que foi demonstrado durante a fase de produção de prova – artigos 1165.º a 1175.º do recurso de impugnação judicial – segundo o qual, entre janeiro e abril de 2014, a K... Angola auditou o equivalente a 80% do volume da carteira de crédito do BESA e não concluiu que o BESA fosse titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões que careciam de reestruturação.

58. Naturalmente que este facto – que resultou, entre outros, do depoimento da testemunha XX da K... Angola – é relevante para a descoberta da verdade, visto que contraria frontalmente os pretensos factos provados n.os 133, 134, 135, 360, 361 e 362 da sentença recorrida.

59. Assim, é manifesto que a sentença recorrida incorre num vício de insuficiência da matéria de facto dada como provada, na medida em que nem sequer se pronunciou sobre o supra referido facto, relevante para a defesa do Recorrente, razão pela qual deve ser dado como provado que, entre janeiro e abril de 2014, a K... Angola auditou o equivalente a 80% do volume da carteira de crédito do BESA e não concluiu que o BESA fosse titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões que careciam de reestruturação, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP.

Vejamos.

Constam da Sentença recorrida, não só os factos que sustentam a condenação do recorrido DD (factos provados 353 a 366 e 376 a 391, infra reproduzidos), que não cabe a esta instância sindicar nos termos do artigo 75.º, n.º 1, do RGCO e no artigo 410.º, n.º 2, do CPP, como  a motivação que justificou terem sido dados como provados (pp. 605-642 da Sentença):

353. O arguido DD foi Administrador do BES e membro da sua Comissão Executiva entre março de 2000 e 30 de julho de 2014. (fls. 24-211, maxime fls. 143 v.; 1583-1636, maxime fls. 1590 v.)

354. O arguido DD, na qualidade de membro da Comissão Executiva do BES tinha, à data da prática dos factos, para além de outros, o pelouro do Departamento de Assuntos Jurídicos (DAJ). (fls. 24-211, maxime fls. 145; 1583-1636, maxime fls. 1594 v.)

355.  O arguido DD participou na reunião do Conselho de Administração do BES de 15 de maio de 2014, que deliberou a realização do aumento de capital do BES até ao montante de até € 1.044.571.587,80 (mil e quarenta e quatro milhões quinhentos e setenta e um mil quinhentos e oitenta e sete euros e oitenta cêntimos) mediante a emissão de até 1.607.033.212 novas ações ordinárias, escriturais e nominativas, sem valor nominal, na modalidade de novas entradas em numerário, a ser realizado em dinheiro, através da oferta pública de subscrição com direito de preferência na subscrição por parte dos acionistas, e aprovou a minuta do Prospeto. (fls. 660-662 v.; fls. 2282-2729, maxime fls. 2283-2284 v. e fls. 2314-2518 v.)

356.  O arguido DD votou favoravelmente a deliberação de realização do aumento de capital. (fls. 2282-2729, maxime fls. 2284)

357.  O arguido DD teve conhecimento, em 3 de novembro de 2013, do conteúdo das atas das reuniões da assembleia-geral do BESA realizadas em 3 e 21 de outubro de 2013, que lhe foram enviadas pelo Presidente da Mesa da Assembleia-Geral do BESA.

358.  O arguido DD teve conhecimento, em 3 de novembro de 2013, de que, nas reuniões da Assembleia-Geral do BESA ocorridas em outubro de 2013 (fls. 1521-1582, maxime fls. 1550-1553, fls. 1557-1565, fls. 1566-1567 e fls. 1568-1569):
a. o Presidente da Comissão Executiva do BESA informou que a Comissão Executiva do BESA apurou a existência de um conjunto de créditos, de valor material, considerados de cobrança duvidosa; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1566)
b. foram analisados aspetos da carteira de crédito do BESA, com referência a 31 de agosto de 2013, tendo a carteira de crédito sido dividida em dois blocos de clientes (bloco A e bloco B), atendendo ao grau de conhecimento que a Comissão Executiva do BESA detinha sobre os mesmos, bem como à dimensão dos créditos concedidos pela anterior gestão; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1553-1554)
c. foi referido que o designado bloco A dos créditos representava 80% do total da carteira de crédito do BES, totalizando cerca de 5,5 mil milhões de dólares, e respeitava a um conjunto de clientes do BESA sobre os quais o Conselho de Administração do BESA, em 3 de outubro de 2014, desconhecia a identidade dos mutuários, a finalidade dos créditos e as garantias associadas aos mesmos; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1554)
d. foi informado que o crédito concedido pelo BESA totalizava, em 31 de agosto de 2013, 6,9 mil milhões de dólares, dos quais, 1,8 mil milhões de dólares correspondiam a capital vencido; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1554)
e. foi informado que, em 31 de agosto de 2013, os juros vencidos por liquidar juntamente com os juros de mora totalizavam cerca de 560 milhões de dólares; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1554)
f. foi informado que o BESA apresentava, em outubro de 2013, para além de uma difícil situação de liquidez, com necessidades de financiamento de cerca de 6.6 mil milhões de dólares, 4.6 mil milhões de dólares financiados através do BES e 2 mil milhões de dólares através de bancos angolanos, uma grave situação patrimonial, resultado da deteção de uma fraude ao nível da sua carteira de crédito e do seu portfólio de ativos imobiliários. (fls. 1521-1582, maxime fls. 1566)

359.  O arguido DD teve conhecimento do conteúdo das cartas enviadas, no dia 5 de novembro de 2013, pelo Presidente do Conselho de Administração e pelo Presidente da Comissão Executiva do BESA, ao Presidente da República de Angola, bem como do memorando sobre a situação patrimonial do BESA àquela data que foi enviado em anexo às cartas, através das minutas dos referidos documentos, que lhe foram enviados pelo Presidente da Mesa da Assembleia-Geral do BESA, em 3 de novembro de 2013.

360.  O arguido DD tinha conhecimento de que o BES não fez constar do Prospeto informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação.

361.  O arguido DD tinha conhecimento de que do Prospeto consta informação que não é completa, porquanto não contém informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação.

362. O arguido DD tinha conhecimento de que a informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 1521-1582; fls. 1583-1636, maxime fls. 1594 v.; cd de fls. 2245, pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140620”, ficheiro “2. Resultados do aumento de capital do BES”, p. 17; fls. 4829-4841, maxime fls. 4830 e 4841; fls. 5852-5863 v., maxime fls. 5852 v. e 5863 v.; fls. 5864-5882 v., maxime fls. 5872 v.; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.).

363. O arguido DD não adotou, durante o período de tempo entre a decisão de realização do aumento de capital e a liquidação financeira do mesmo, qualquer medida adequada a sanar os vícios da informação constantes do Prospeto. (fls. 24-211; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, ficheiros “(305) 15 05 2014” e “(306) 20 06_01 07 2014”, ponto 2 da ordem de trabalhos; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3708 v.; pen a fls. 8719).

364. O arguido DD agiu consciente e voluntariamente na prática dos factos descritos, os quais são factos próprios, em que interveio e que praticou. Com efeito, (fls. 24-211; fls. 660-662 v.; fls. 1521-1582; fls. 1583-1636; cd de fls. 2245, maxime pasta “CA”, ficheiros “(305) 15 05 2014” e “(306) 20 06_01 07 2014”, ponto 2 da ordem de trabalhos e pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140620”, ficheiro “2. Resultados do aumento de capital do BES”, p. 17; fls. 2282-2729, maxime fls. 2282-2284 v. e 2314-2518 v.; fls. 3684-3710 v.; fls. 4829-4841, maxime fls. 4830 e 4841; fls. 5852-5863 v., maxime fls. 5852 v. e 5863 v.; fls. 5864-5882 v., maxime fls. 5872 v.; pen a fls. 8719; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)

365. O arguido DD sabia que:
a. participou na reunião do Conselho de Administração do BES de 15 de maio de 2014, que deliberou a realização do aumento de capital do BES até ao montante de até € 1.044.571.587,80 (mil e quarenta e quatro milhões quinhentos e setenta e um mil quinhentos e oitenta e sete euros e oitenta cêntimos) mediante a emissão de até 1.607.033.212 novas ações ordinárias, escriturais e nominativas, sem valor nominal, na modalidade de novas entradas em numerário, a ser realizado em dinheiro, através da oferta pública de subscrição com direito de preferência na subscrição por parte dos acionistas, e aprovou a minuta do Prospeto; (fls. 660-662 v.; fls. 2282-2729, maxime fls. 2283-2284 v. e fls. 2314-2518 v.)
b. votou favoravelmente a deliberação de realização do aumento de capital; (fls. 2282-2729, maxime fls. 2284)
c.    o BES divulgou o prospeto da Oferta do aumento de capital no SDI da CMVM no dia 20 de maio de 2014, após o fecho da sessão de negociação; (fls. 24-211 maxime fls. 24 v.)
d.  do Prospeto não consta informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação; (fls. 24-211; fls. 1521-1582, maxime fls. 1550-1569 e fls. 1574-1581; fls. 2282-2729, maxime fls. 2282-2284 v. e 2314-2518 v.)
e. do Prospeto consta informação que não é completa, porquanto não contém informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação; (fls. 24-211; fls. 1521-1582, maxime fls. 1550-1569 e fls. 1574-1581; fls. 2282-2729, maxime fls. 2282-2284 v. e 2314-2518 v.)
f.    a informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma;
g. não adotou, durante o período de tempo entre a decisão de realização do aumento de capital e a liquidação financeira do mesmo, qualquer medida adequada a sanar os vícios da informação constantes do Prospeto.

366.  O arguido DD quis praticar os factos supra descritos.

380. O Recorrente DD designou PP, SS e TT, colaboradores do DAJ de que era administrador peloureiro, para acompanharem a operação do aumento de capital aqui em causa.

381.  No quadro do descrito no ponto 377 supra, o BES contratou a firma L..., incluindo os Srs. Drs. Advogados UU e VV.

382. A K... Portugal emitiu, em 20 de Maio de 2014, uma carta de conforto relativamente ao prospeto[38].

383. O Asset Quality review (AQR) à carteira de crédito do BESA, promovido pelo BNA (supervisor Angolano) e pelo BCE no quadro dos preparativos de implementação do mecanismo único de supervisão e com referência a 2013, iniciou-se em 10 de Junho de 2014.

384. Em janeiro de 2014, no quadro da atividade corrente de cerificação legal das contas do BESA, a K... Angola iniciou procedimentos de auditoria, incluindo a revisão da carteira de crédito do BESA.

385. No âmbito dos procedimentos de auditoria sobre as demonstrações financeiras individuais do BESA e consolidadas do BES e com referência a 31.12.2013, a K... Angola obteve, do Ministério das Finanças, a confirmação dos termos da garantia soberana, através de carta de 1 de Abril de 2014, dirigida à K... Angola, pelo Gabinete do Senhor Ministro das Finanças.

386. Em Abril de 2014, a K... Angola considerou que a emissão da garantia soberana permitia a eliminação da reserva relativa à carteira de crédito e proveitos de juros, que vinha sendo incluída nos relatórios do Auditor Independente de 2011 e 2012.

387. Entre 15 de Maio de 2014 e até 9 de Junho de 2014, os lead underwriters responderam a centenas de questões de investidores interessados, colocadas por telefone ou em reuniões presenciais.

388. O BES remeteu, por comunicação de correio eletrónico, a «versão preliminar» do Prospeto de aumento de capital ao Banco de Portugal, em 8 de Maio de 2014[39].

389. O Recorrente DD foi condenado nos autos de RCO n.º 74/19...., que correu termos no J... do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, por sentença transitada em julgado, na coima de 120 mil euros, acompanhada de sanção acessória de publicação, pelo Banco de Portugal, da punição definitiva.

Condições pessoais

390.  O Recorrente DD é jurista de formação, tendo-se licenciado em Direito, pela Faculdade de Direito da Universidade ... em Junho de 1978 e sido eleito, em Abril de 2000, pela Assembleia Geral, para o Conselho de Administração do BES, cargo em que foi sucessivamente reconduzido nos anos de 2004, 2008 e 2012.

391. Por força de arresto judicial, em Agosto de 2022 o Recorrente teve penhorado, no rendimento mensal que aufere do fundo de pensões do BES, o montante de €4.785.

O que, no fundo, vem censurado à decisão recorrida, a título do artigo 410º, nº 2, alínea a) do CPP, pelo recorrente DD, reporta-se, antes, à omissão de pronúncia (pela sentença recorrida relativamente a argumentos invocados pela defesa), já objecto de apreciação a propósito da correspondente nulidade invocada pelo recorrente CC (secção II.3, supra), reiterando-se o que aí se deixou sobre não caber ao Tribunal a quo pronunciar-se sobre todos os argumentos aduzidos pelas partes, mas apenas sobre questões que devesse apreciar.

Nos tremos do artigo 374º, nº 2, do CPP, a fundamentação da sentença consta da ‘enumeração dos factos provados e não provados’, bem como de ‘uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal’.

Foram apurados na sentença recorrida, designadamente nos supra reproduzidos 353 a 366 e 376 a 391, factos que sustentam a condenação do recorrente DD, bem como as razões que levaram o Tribunal a quo a dá-los como provados (pp. 605 a 642), pelo que se não verifica a invocada insuficiência da matéria de facto para a decisão proferida.

De resto, a sentença pronuncia-se sobre a irrelevância dos argumentos do recorrente DD relativos às declarações do Governador do Banco de Portugal de 18.07.2014, ao facto de correrem auditorias do BESA e às conclusões da K... Angola sobre a carteira do BESA (pp. 379-380, 385, 388 e 390-391, ênfase aditado):
Sem prejuízo, como se alcança sem esforço de maior, o acervo de factos aqui em causa decorre, desde logo e em larga (praticamente esgotante) medida, do cotejo do teor do Prospeto de aumento de capital objecto dos autos e da demais documentação detalhada em cada ponto de facto supra.

Por seu turno, as omissões informativas imputadas ao sobredito prospeto resultam da contraposição do teor do prospeto com outros documentos, onde a informação, em falta e tida por relevante e necessária, se encontrava suportada, com o conhecimento dos Recorrentes e sem que estes, cientes desse conhecimento e omissão, tivessem logrado carrear tal informação para o Prospeto.

Neste iter e salvo melhor opinião, a aferição da demonstração do que antecede opera, no essencial, a partir do cotejo crítico da prova documental junta aos autos, na medida em que a perscrutação desta se revela probatoriamente idónea para considerar demonstradas as circunstâncias de tempo, lugar e atuação vertidas no Prospeto, assim como o contexto em que o mesmo foi aprovado, a sua motivação e os desideratos prosseguidos (vertidos nas atas das reuniões da Comissão Executiva do BES de 12.3.2014, de 2 de Abril de 2014, de 14 de Maio de 2014 e de 15 de Maio de 2015).

Donde, salvo melhor entendimento, a prova pessoal produzida, quer em sede de audiência de discussão e julgamento, quer em fase administrativa (valorada como prova documental, nos termos do artigo 127.º e 164.º ambos do Código Penal, aplicável por remissão) reveste, no que ao cerne da imputação respeita, menor aptidão probatória, ressalvadas as declarações prestadas pelos arguidos, em sede de audiência de julgamento.

Efetivamente, a prova testemunhal produzida, em audiência de discussão e julgamento, assumiu uma dimensão meramente contextualizadora e enquadrante da empreitada de aumento de capital levada a cabo pelo BES, pois que, quanto aos factos concretos aqui imputados aos arguidos (qualidade, completude e suficiência da informação vertida no prospeto), as testemunhas apenas relataram, na maioria das vezes, factos exógenos à imputação incidente sobre cada Recorrente, denotando não terem razão de ciência direta, logo atendível sobre aquela imputação (artigo 128.º, número 1 do CPP, aplicável por remissão).

Recorde-se que a aprovação do prospeto ocorreu em Conselho de Administração do BES (pontos 39 a 84 dos factos provados), órgão que a larguíssima maioria das testemunhas inquiridas em Tribunal, não integrava, nem nele participava, ainda menos na ocasião específica de aprovação do aumento de capital e ulteriormente do respetivo prospeto.
[…]
A imputação factual-normativa assacada a cada arguido, circunstanciada de modo explícito e detalhado na douta decisão recorrida, respeita à aprovação do Prospeto e não à sua elaboração material. Os factos encontram-se espacial e temporalmente balizados, de modo perfeitamente apreensível para os recorrentes.
[…]
Sinaliza-se que, ressalvados alguns pontos específicos – objecto de apreciação crítica autónoma quando se justificar – as circunstâncias de tempo, lugar e execução descritas nos pontos 1 a 158 da decisão recorrida, que narram circunstanciadamente i) a natureza e composição do BES, ii) o percurso funcional e pelouros de cada Recorrente, iii) a oferta pública de subscrição, iv) a informação vertida no prospeto e v) aquela que foi considerada relevante e que se acha omissa do sobredito Prospeto (incluindo as adendas) não é colocada em crise pelos Recorrentes.

E, bem se compreende que o não seja, pois que, como se mencionou, funda-se, em larguíssima medida, em prova documental que, criticamente apreciada, detém aptidão adjetiva para a evidenciação daquelas circunstâncias de tempo, lugar e execução (artigo 127.º do CPP). O inconformismo dos Recorrentes estriba-se, essencialmente, i) na contestação da sua representação e vontade quanto aos factos que lhes são assacados, de um lado; e ii) em argumentários de direito, de outro.
[…]
Expurgaram-se, designadamente, das doutas conclusões de recurso de impugnação judicial, considerações, alegações de teor conclusivo, matéria irrelevante e/ou de direito ali vertida, designadamente aquelas respeitantes a actos praticados entre intervenientes exógenos ao pleito ou destituídos de conexão temporal com a circunstanciação referida na decisão recorrida e agora considerada provada.

Para melhor compreensão, por exemplo, o Recorrente CC (assim como o Recorrente DD) invoca, em sua defesa, sem que se alcance a plausibilidade do alegado ou a forma como se projecta na imputação que sobre si impede, interações que tiveram lugar entre a K... e o Banco de Portugal, sem demonstração de que também lhe foi dado oportuno conhecimento e, por conseguinte, foi um elemento que teria concorrido para a formação da sua vontade (conclusão 225); entre o Banco de Portugal e a E... (em 16.6.2014, conclusão 226); em 1 de Julho de 2014 (portanto, sem qualquer ligação à baliza temporal aqui em causa), entre o BNA e o Banco de Portugal (conclusão 228); em 4 de Julho de 2014, sem qualquer conexão com a delimitação espacial e temporal aqui em causa, entre a K... Angola e o BESA (conclusão 229) e sem qualquer suporte documental para o alegado na conclusão 231.

Também não se alcança relevância fatual ou normativa, aptidão probatória ou idoneidade, para esclarecimento da imputação que impende sobre os Recorrentes, da convocação das declarações de um terceiro, em julho de 2014, numa comissão parlamentar de inquérito (vg. conclusão 233 do Recorrente CC e do Recorrente DD).

Os factos não provados resultaram, além do que antecede, de a seu respeito não ter sido produzida prova que os demonstrasse ou de se acharem infirmados, contrariados ou prejudicados pelos factos considerados provados.
[…]
Neste âmbito, são irrelevantes e destituídos de aptidão probatória, os documentos atinentes às comissões parlamentares de inquérito levadas a cabo pela Assembleia da República e documentos atinentes à atuação de terceiros, fora de território português, por manifesta ausência de ligação com a imputação individual que incide sobre cada Recorrente (v.g. K... Angola ou BNA no quadro do AQR).

No mesmo sentido, da irrelevância das declarações do recorrente DD sobre as auditorias que estariam a decorrer, as seguintes passagens da sentença recorrida (pp. 620 e 622, ênfase aditado):
‘Ora, desde logo, a alegação de que havia auditorias em curso carece de respaldo, não tendo sido junto qualquer prova documental que o ateste, desde logo porque não se alcança verdadeiramente em que sentido a palavra «auditoria» é aqui utilizada.

Na verdade, em juízo, precisamente porque tal alegação não vinha suportada em qualquer elemento probatório que a refletisse e porque se afigurava pertinente delimitar e precisar o sentido e alcance da expressão («auditorias») empregue, o Tribunal instou o Recorrente, no decurso das suas declarações na audiência de julgamento, a esclarecer que i) auditorias eram essas, ii) por quem estavam a ser levadas a cabo, iii) qual era o seu escopo, iv) o seu âmbito e a sua v) relação com a génese da garantia soberana, aqui em causa.

Perante esta instância do Tribunal, o Recorrente reconheceu que não tinha elementos para dilucidar o Tribunal e que se tratava de uma mera alegação genérica, que lhe fora transmitida por terceiros, mas sem que lhe fosse facultada – e o Recorrente DD tivesse exigido – evidência ou documento corroborativo do seu âmbito, duração e desideratos.’

‘Este argumentário de pretensas auditorias em curso, alegadamente incidentes sobre a génese da garantia soberana soçobra, ainda, por outras razões de lógica e coerência, que suscitam, à luz das regras da experiência comum e da normalidade social, outro tipo de interrogações.’

Quanto à alegada omissão de pronúncia pela sentença recorrida sobre as alegadas (i) nulidade da acusação e, consequentemente, da decisão da CMVM, por falta de indicação dos meios de prova que sustentam a imputação das pretensas contraordenações ao recorrente DD e (ii) inconstitucionalidade do artigo 50.º do RGCO, aplicável ex vi artigo 407.º do CVM, no sentido de a nota de ilicitude da entidade administrativa não ter de conter a indicação individualizada dos meios de prova por referência a cada facto imputado, por violação do disposto nos n.º 1 e 10 do artigo 32.º da CRP, reportam-se a alegada nulidade (da acusação da CMVM) e inconstitucionalidade (de norma legal), não recondutíveis à alegada insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.

Tendo, de resto, tais questões mostram-se identificadas e apreciadas na sentença recorrida  (pp. 12 e 102-111), como ilustra a seguinte passagem (ênfase aditado):
‘Por seu turno, e como se referiu, as normas do ilícito contraordenacional que regem o teor da acusação administrativa e da decisão final, foram observadas.

Foi observado o disposto no artigo 50.º do RGCO e consequentemente, assegurado o disposto no artigo 32.º, número 10 da Constituição.

Não se verifica a postergação de qualquer norma ou princípio, legal ou jusfundamental, pelo que improcede o peticionado.’

Termos em que se não verifica a alegada insuficiência da matéria de facto para a decisão proferida, improceder a nulidade alegada pelo recorrente DD, e com ela o presente segmento recursivo.

II.6.2 – Da contradição insanável da fundamentação da sentença
 recorrida

Os recorrentes AA, BB, CC e DD alegam que a sentença recorrida padece de contradição insanável da fundamentação e de contradição insanável entre esta e a decisão, nos termos do artigo 410º, nº 2, alínea b) do CPP.

Tenhamos, mais uma vez, presente que este tribunal de recurso não conhece de facto, apenas de direito, a não ser que ocorra o vício da matéria de facto apontado pelo recorrente e previsto no art. 410° n° 1 al. b) do CPP, vício esse a detectar atendo-nos apenas ao teor do texto da sentença recorrida e, se necessário, às regras da experiência comum.

A contradição tanto pode emergir entre factos contraditoriamente provados entre si, como entre estes e os não provados, como entre a fundamentação (em sentido amplo, abrangendo a fundamentação de facto e também a de direito) e a decisão.
O Acórdão do STJ de 11.01.2017[40] é elucidativo quanto a este vício, dele se podendo ler (ênfase aditado):
‘O vício da contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão a que alude a al. b) do n° 2 do art. 410° do CPP, verifica-se quando no texto da decisão, e sobre a mesma questão, constem posições antagónicas ou inconciliáveis, que se excluem mutuamente ou não possam ser compreendidas simultaneamente dentro da perpectiva de lógica interna da decisão, tanto na coordenação possível dos factos e respectivas consequências, como nos pressupostos de uma solução de direito.

Há contradição insanável da fundamentação quando, através de um raciocínio lógico, se conclua pela existência de oposição insanável entre os factos provados, entre estes e os não provados, ou até entre a fundamentação probatória da matéria de facto, ou seja, quando se dá como provado e não provado determinado facto, quando ao mesmo tempo se afirma ou nega a mesma coisa, quando simultaneamente se dão como assentes factos contraditórios e ainda quando se estabelece confronto insuperável e contraditório entre a fundamentação probatória da matéria de facto.

Só é de considerar relevante, para os fins do preceituado nesta alínea b) do nº 2, a contradição que se apresente como insanável, irredutível, que não possa ser integrada com recurso à decisão, ou seja, quando a fundamentação justifica decisão oposta, ou não justifica a decisão.’

Importa, pois, salientar que, para ser juridicamente relevante à luz do disposto no artigo 410º, nº 2, alínea b) do CPP, tem de ser uma contradição que não possa ser ultrapassada pelo próprio texto da decisão recorrida, como referem Simas Santos e Leal Henriques (ênfase aditado):

‘[…] há contradição insanável da fundamentação quando, fazendo um raciocínio lógico, for de concluir que a fundamentação leva precisamente a uma decisão contrária àquela que foi tomada ou quando, de harmonia com o mesmo raciocínio, se concluir que a decisão não é esclarecedora, face á colisão entre os fundamentos invocados; há contradição entre os fundamentos e a decisão quando haja oposição entre o que ficou provado e o que é referido como fundamento da decisão tomada; e há contradição entre os factos quando os provados e os não provados se contradigam entre si ou por forma a excluirem-se mutuamente.’ [41]

Examinemos, pois, em concreto o que alegam os recorrentes AA, CC e DD.

II.6.2.1 – Recorrente AA

O recorrente AA sustenta que a sentença recorrida padece de contradição insanável da fundamentação, pois dá como provado que a ‘informação desactualizada não actual e falsa à data do Prospeto (de que até 31.12.2013, data em que foi emitida a garantia soberana, o BESA era titular de créditos e activos imobiliários no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero) era necessária para que os investidores pudessem formar juízos fundados sobre a Oferta’, com base na fundamentação constante de pp. 437 e 462, quando na realidade ‘à data do Prospeto (20/05/2014) a real situação financeira e patrimonial do BESA era a que lhe foi dada pela garantia soberana da República de Angola, e não a situação que detinha antes desta garantia soberana ter sido emitida (ou seja, até 30/12/2013), contra o que, erradamente, a douta Sentença recorrida insiste em dizer vezes sem conta, mas sempre com a mesma inelutável falha de razão e de sentido lógico” (cfr. conclusões 150ª e 160ª a 165ª, abaixo reproduzidas).

150ª. Com o devido respeito, a douta Sentença recorrida lavra a este propósito em vários vícios, um erro de Direito, um erro notório na apreciação da prova e uma contradição insanável da fundamentação, todos resultantes do próprio texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum.

160ª. Por outro lado, só podia ter sido praticada a contraordenação sub judice se tal informação fosse necessária para que os destinatários da Oferta pudessem fazer juízos fundados sobre a mesma.

161ª. A douta Sentença recorrida dá como provado que esta informação desatualizada – não atual e falsa à data do Prospeto (de que, até 31/12/2013, data em que foi emitida a garantia soberana, o BESA era titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero), era necessária para que os investidores pudessem formar juízos fundados sobre a oferta.

162ª. Fá-lo, porém, com manifesta insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e com contradição insanável da fundamentação, conforme resulta do seu próprio texto.

163ª. Na verdade, a douta Sentença recorrida dá este facto como provado (necessidade da informação para os destinatários da oferta) com base nas seguintes fundamentações:

Pág. 437:
- Uma vez que o BESA, por um lado, era uma subsidiária do BES, consolidando nas contas deste e, por outro lado, era uma importante subsidiária do BES no seu plano de negócios de expansão internacional, afigura-se manifesto que os problemas detetados na carteira de crédito daquele (“titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação”) seriam suscetíveis de se refletir negativamente, não apenas nas contas do próprio BESA, mas também nas contas do BES, bem como no plano de negócios do BES, que assentava na expansão internacional, “crucial para compensar o abrandamento da atividade doméstica.” (fls. 24-211, maxime fls. 83).

Donde, a informação acerca da real situação financeira e patrimonial do BESA (para mais, com origem em fraude imputável ao anterior Presidente da Comissão Executiva do BESA, segundo o próprio BES) era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma.

Pág. 462:
Em síntese, dos elementos probatórios acima escalpelizados (de natureza documental e pessoal) criticamente conjugados e apreciados à luz do disposto no artigo 127.º do CPP, resulta que:
  (i) em momento anterior à realização da OPS foi detetada, no BESA, uma situação         de fraude, que colocou o BESA numa grave situação financeira e patrimonial,

(ii) o BESA era uma subsidiária do BES que consolidava nas contas o BES,
(iii) o BESA era uma importante subsidiária do BES no plano de negócios do BES, assente na expansão internacional, pelo que a informação acerca da real situação financeira e patrimonial do BESA (para mais, com origem em fraude imputável ao anterior Presidente da Comissão Executiva do BESA.

É, assim, mister concluir que a informação aposta no prospeto sobre o BESA era, por um lado, incompleta; e, por outro lado, a informação omitida era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma.

164ª. Ou seja: a douta sentença recorrida simplesmente considera evidente que a informação acerca da real situação financeira e patrimonial do BESA [anterior à emissão da garantia soberana…] era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma.

165ª. Sucede que, à data do Prospeto (20/05/2014) a real situação financeira e patrimonial do BESA era a que lhe foi dada pela garantia soberana da República de Angola, e não a situação que detinha antes desta garantia soberana ter sido emitida (ou seja, até 30/12/2013), contra o que, erradamente, a douta Sentença recorrida insiste em dizer vezes sem conta, mas sempre com a mesma inelutável falha de razão e de sentido lógico.

Como decorre das próprias alegações acabadas de citar, o recorrente limita-se a discordar do juízo formulado pelo Tribunal a quo (infra reproduzido), sem apontar nenhuma contradição ínsita na fundamentação da sentença recorrida e que do seu próprio texto decorra, sustentando que tal juízo deveria ser alterado em função do que considera falta de actualidade da informação omitida:

‘É, assim, mister concluir que a informação aposta no prospeto sobre o BESA era, por um lado, incompleta; e, por outro lado, a informação omitida era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma.’

Tal redundaria, no fundo, em alteração da matéria de facto dada como provada, quanto à falta de completude e necessidade da informação omitida no prospeto relativa ao BESA, o que exorbita quer do âmbito do presente recurso, ex vi artigo 75º, nº 1, do RGCO, quer do artigo 410º, nº 2, alínea b) do CPP.

Não há qualquer contradição, antes total consistência, entre a fundamentação factica da sentença, no que tange à falta de completuda da informação relativa ao BESA no prospeto da Oferta (e a necessidade desta para que os respectivos destinatários formem juízos fundaos sobre a mesma) e a decisão condenatória por violação do dever de, no no dito prospeto, fazer constar ‘informação completa…que permita aos destinatários fazer juízos fundados sobre a oferta […]’, nos termos do artigo 135º do CdVM.

Pois é essa falta de completude e qualidade que se assaca ao respondente a propósito a informação relativa ao BESA, como mostram as seguintes passagens da decisão impugnada (pp. 738, ênfase aditado):
‘A incompletude da informação vertida no prospeto respeita, repete-se, ao facto de nele ter sido omitida a deteção, em Outubro de 2013, de graves problemas na carteira de crédito e portefólio de ativos imobiliários do BESA, enquadramento que, precisamente, fundou a necessidade de ser obtida uma garantia soberana, no valor de 5,7 mil milhões de dólares.’

Quanto à alegada desnecessidade de tal informação para os juízos fundados dos investidores, alegada pelo recorrente AA, encontra-se ela rebatida na decisão impugnada, em termos perfeitamente consistentes com a matéria de facto apurada a que está inexoravelmente ligada, como lembram a seguintes passagens da sentença (pp. 726-730, ênfase aditado):

‘o Recorrente […] aventa que a informação constante do prospeto relativamente ao BESA era completa, verdadeira e atual, à luz das circunstâncias conhecidas em 15 e 20 de maio de 2014[42]; […]

Como se sinalizou aquando da delimitação do objeto dos autos, estes argumentários encontram-se inexoravelmente ligados à matéria de facto […].

Donde, salvo melhor entendimento, inexistindo acervo factual que suporte estes argumentários – não se provaram e até se provaram factos que são intrinsecamente inconciliáveis com aqueles – as questões suscitadas estão solucionadas no plano dos factos. […]

Revertendo aos factos apurados,
Constata-se que a fundamentação aposta no Prospeto (factor de risco 2.1.23) respeitava à «relevância do BES Angola no financiamento das empresas Angolanas inseridas no sector privado não petrolífero», que podiam «não apresentar condições de tesouraria necessárias para fazer face ao cumprimento atempado das suas responsabilidades», sendo assim, emitida a garantia no valor de 5,7 mil milhões de dólares americanos para «proteger o banco de eventuais atrasos e incumprimentos na liquidação de ativos». (cfr. factos 114 a 118)

Sucede que, contrariando o que antecede, logrou apurar-se que a garantia soberana fundou-se na situação financeira e patrimonial do BESA detetada em final de 2013, pela nova administração do BESA, liderada por LLL, situação essa que colocava em causa a solvabilidade do Banco e havia sido qualificada pelo próprio BES (na qualidade de acionista e casa-mãe) e BESA (subsidiária e consolidante nas contas) como de natureza fraudulenta. (cfr. factos 122 a 135)

Que a emissão da garantia soberana teve como fundamento a situação financeira e patrimonial do BESA detetada, em finais de 2013, pela nova Administração Executiva, resultava, ainda, dos depoimentos prestados, em fase administrativa, para os quais se remete.[43]

Isto é, as razões de ser que conduziram à emissão da garantia soberana não constavam do Prospeto, devendo constar, nos termos prescritos pela norma de dever aqui em causa.

O artigo 135.º, número 1 do CdVM exige a inscrição, no Prospeto, de informação completa, verdadeira, atual e clara (…) que permita aos destinatários formar juízos fundados sobre a oferta.

Aquelas exigências normativas não foram observadas pelos Recorrentes.

Reitera-se o que se explanou supra sobre o texto deste factor de risco: a sua redação é falaciosa, incompleta e obscura, e é-o por ação e por omissão. Senão vejamos.

Por ação, na medida em que identifica como causa da sua emissão uma situação exógena ao Banco, estribada em imponderáveis da economia angolana, que podem, ou não, vir a verificar-se, inculcando no leitor (investidor) a convicção de que se trata de uma medida antecipatória e de prudência, perante um risco futuro e incerto;

por omissão, porque em lado algum do factor de risco, vertido no prospeto, se transmite que o BESA tinha créditos em risco de incumprimento no valor de 5,7 mil milhões de dólares, inexistindo referência a qualquer problema específico da carteira de crédito do BESA, ou tão pouco qualquer conexão entre a emissão da garantia soberana e perdas materiais na carteira de crédito e de ativos imobiliários do Banco Angolano.

Contrariamente ao sustentado pelos Recorrentes, a informação sobre a grave situação detetada na carteira de crédito e portfólio de ativos do BESA, divisada em final de 2013, era relevante para os investidores, porquanto […] ii) o BESA era uma subsidiária do BES (detida em 55,7 por cento), pelo que a situação financeira e resultados do BESA teria reflexos na situação financeira e nos resultados do Grupo BES, (iii) o BESA era apresentado no prospeto como uma importante subsidiária no plano de negócios do BES de expansão internacional, “crucial para compensar o abrandamento da atividade doméstica” (fls. 24-211, maxime fls. 83).

É o próprio Prospeto que, dando nota da ação internacional do Banco, destaca, nesse quadro, a actividade desenvolvida em Angola, não se divisando razão plausível para, mediante esse destaque, deixar de aportar, no Prospeto, toda a informação real, atualizada e já do conhecimento dos Recorrentes sobre a situação do BESA.’

Não resultando qualquer incoerência ou contradição na fundamentação da sentença impugnada, quer entre a matéria de facto apurada e não apurada, quer entre esta e a decisão relativa ao recorrente AA, improcede o vício por este alegado nos termos do artigo 410º, nº 2, alínea b) do CPP e o correspondente segmento recursivo, o que se consigna.

II.6.2.3 – Recorrente BB

O recorrente BB sustenta que a sentença recorrida ‘padece de contradição insanável da fundamentação (cfr. artigo 410º, nº 2, alínea b) do CPP), porquanto a decisão de facto e de direito quanto à Rio Forte não possibilita a adoção de decisão distinta quanto à ESFG.’ (conclusão XXXV).

Alega ser incompreensível o critério em que se baseou o Tribunal a quo para, por ujm lado, atribuir relevância à supervisão bancária quanto aos factos respeitantes à Rio Forte e à regulamentação emanada do Banco de Portugal sobre o cálculo das imparidades,  mas, por outro lado, considerar irrelevante o facto de o BES ser supervisionado pelo Banco de Portugal e inaplicável o disposto no Aviso do Banco de Portugal n.º .../2010 sobre cálculo dos limites dos grandes riscos no caso da ESFG (conclusões XXXVI e XXXVII, infra reproduzidas):
XXXVI. O Tribunal a quo atribui relevância à supervisão bancária relativamente aos factos respeitantes à Rio Forte («A concessão do sobredito financiamento foi, em momento anterior à sua aprovação, discutida com o Banco de Portugal, que impôs a colateralização integral do financiamento, o que veio a ser acatado pelo BES e seus Administradores (cfr. depoimento de OO, do Banco de Portugal e declarações do Recorrente BB, em juízo).», cfr. p. 492 da sentença) e à regulamentação emanada pelo Banco de Portugal a respeito do cálculo das imparidades («Donde, impõe-se concluir, à luz das regras da experiência comum e da normalidade social que se, como resulta das reservas constantes das certificações legais de contas consolidadas do BESA respeitantes aos exercícios de 2011 e 2012, nesses anos não foi possível extrair do sistema informático do BESA informação acerca “[d]a identificação efetiva (i) das operações de crédito que foram objeto de reestruturação e (ii) do grupo económico em que cada cliente se insere”, então também o auditor das contas consolidadas do BES de 2011 e 2012 (a K... Portugal) não dispôs da necessária informação quanto à carteira de crédito do BESA para que pudesse concluir acerca da adequação do valor das perdas por imparidade, à luz das regras de cálculo destas (Instrução do Banco de Portugal n.º .../2013).», a p. 434 da sentença), tendo, porém, considerado irrelevante o facto de o BES ser supervisionado pelo Banco de Portugal e inaplicável o disposto no Aviso do Banco de Portugal n.º .../2010 sobre cálculo dos limites dos grandes riscos no caso da ESFG, sendo incompreensível o critério que baseou tais decisões.
XXXVII. A ESFG, sendo a cabeça do grupo financeiro que integrava o BES, não era, por um lado, uma parte relacionada distante (contrariamente ao que sucedia quanto a outras empresas do GES, nomeadamente, a Rio Forte), e, por outro lado, não era uma parte relacionada normal: o facto de estar sujeita a supervisão pelo Banco de Portugal, e de o BES consolidar contas com a referida entidade, determinava uma confiança adicional na entidade; ao que acrescia que, em virtude dessa relação de grande proximidade e do facto de BES e ESFG serem entidades supervisionadas em base consolidada pelo Banco de Portugal, não só não existia risco de inadequado relato financeiro, como não havia «conjunto alargado e complexo de relações e estruturas» de que resultasse qualquer tipo de risco relacionado com as operações de financiamento e o seu reporte (cfr. p. 425 da sentença).

A sentença teria, assim, valorado aspectos para a Rio Forte que não considerou para a ESFG (designadamente a supervisão exercida pelo Banco de Portugal) e desconsiderado a especial relação existente entre a ESFG e o BES (aplicação dos limites de grandes riscos do Aviso nº .../2010, enquanto parte relacionada não distante e normal), concluindo que (artigo 230º das alegações de recurso, ênfase aditado):

‘Pelo que a identidade material das situações (ESFG vs Rio Forte) não permite que o decidido (de facto e de direito) quanto à ESFG seja distinto do decidido (de facto e direito) quanto à Rio Forte, impondo-se, também quanto às infrações referentes à ESFG, a absolvição do Recorrente.’

A sentença recorrida teria, assim, tratado de forma desigual (contraditória) situações idênticas, absolvendo relativamente à Rio Forte e condenando no que respeita à ESFG.

Vejamos.

Resulta da sentença recorrida que a absolvição do recorrente BB pela contraordenação relativa à Rio Forte deriva de dúvidas do Tribunal quanto à prova produzida quanto a esta matéria, dúvidas obviamente não extrapoláveis para a contraordenação relativa à ESFG, pela qual o recorrente veio a ser condenado (pp. 491-493, ênfase aditado):
‘Relativamente ao facto provado 158, nos termos do qual a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma, o Tribunal ficou colocado em situação de dúvida quanto ao juízo de necessidade atinente a essa informação.

Em face dessa dúvida, convocando e observando o princípio constitucional de inocência de que os arguidos beneficiam, considerou-se tal facto não provado, pelas razões que se explanam de seguida.

Demonstrou-se em juízo que o financiamento de 135 milhões concedido à Rio Forte se encontra integralmente colateralizado[44].

O colateral apresentado consistia num mandato de venda irrevogável das ações da ES Saúde e de um penhor de 2,5 das ações do BES.

A concessão do sobredito financiamento foi, em momento anterior à sua aprovação, discutida com o Banco de Portugal, que impôs a colateralização integral do financiamento, o que veio a ser acatado pelo BES e seus Administradores (cfr. depoimento de OO, do Banco de Portugal e declarações do Recorrente BB, em juízo).

Donde, no singular contexto em que o BES se encontrava – já sujeito a várias determinações específicas do Banco de Portugal relacionadas com a exposição do BES a terceiros – afigura-se que o comportamento adoptado pelo BES, em particular a impulso do Recorrente BB, foi orientado pela normatividade vigente.

A sua conduta revelou compreensão da situação do BES e do risco associado à operação, contribuindo, de modo empenhado e adequado, para a mitigação desse risco através da obtenção de um colateral, nos moldes preconizados pelo Banco de Portugal.

Neste enquadramento, pode aceitar-se que os Recorrentes não tenham representado que tal operação era necessária para que os subscritores da oferta pública formulassem um juízo adequado sobre a operação de aumento de exposição à Rio Forte.

Razão porque tal fatualidade foi considerada não provada, retirando-se as ulteriores consequências desta asserção em sede de fundamentação de direito.’

Porém, o próprio Tribunal rejeita qualquer paralelismo com a situação da ESFG (p. 493, ênfase aditado):
‘Esta argumentação não consente paralelismo para a operação de aumento de exposição da ESFG (de 30.5.2014) quer por causa do valor em causa (que, não sendo decisivo é um critério ponderador e era superior ao montante concedido à Rio Forte) quer porque, decisivamente, naquele caso tratou-se de uma operação atomística; ao passo que a operação de financiamento à ESFG e subsidiárias de 30 de Maio de 2014 se insere na sequência de outras operações pretéritas, fazendo incrementar o valor de exposição global à ESFG e subsidiárias, a 727 milhões de euros (parte relacionada e já visada em determinações específicas do Banco de Portugal).’

O próprio respondente reconhece não se tratar (no caso da Rio Forte e da ESFG) de situações assimiláveis, ao constatar na citada conclusão XXXVII que (ênfase aditado):
‘A ESFG, sendo a cabeça do grupo financeiro que integrava o BES, não era, por um lado, uma parte relacionada distante (contrariamente ao que sucedia quanto a outras empresas do GES, nomeadamente, a Rio Forte), e, por outro lado, não era uma parte relacionada normal […]’

De resto, contrariamente ao que sucedia com a ESFG e subsidiárias, não constava do prospeto qualquer referência à exposição relativa à Rio Forte no quadro da exposição do BES a ‘entidades terceiras especialmente relacionadas’,

Por conseguinte, não resultando qualquer incoerência ou contradição na fundamentação da sentença impugnada, quer entre a matéria de facto apurada e não apurada, quer entre esta e a decisão relativa ao recorrente BB, improcede o vício por este alegado nos termos do artigo 410º, nº 2, alínea b) do CPP e o correspondente segmento recursivo, o que se consigna.

II.6.2.3 – Recorrente CC

O recorrente CC sustenta que a sentença recorrida padece de contradição insanável na fundamentação de facto (artigo 410º, nº 2, alínea b) do CPP), porquanto requer, quanto à ESFG e subsidiárias, informação com referência à data de aprovação do prospeto (facto provado 112), mas, quanto ao BESA, requer informação reportada a 31.12.2013 (factos provados 133 e 134) - conclusões 75º a 85º do recurso, infra reproduzidas:

75. Na Sentença Recorrida, o Tribunal tanto entende que, no que se refere à exposição do BES ao Grupo ESFG, deveria estar indicado no Prospecto o montante total de financiamentos à data da aprovação do prospecto (ou seja, com referência a Maio de 2014), mas os ora Recorrentes apenas atenderam à informação de 31.12.2013 (cfr. facto provado n.º 112 da Sentença)...

76. ...como depois afirma que, no caso da situação financeira do BESA, haveria que informar da situação do BESA no final de 2013, mas o BES e o ora Recorrente apenas atenderam à informação à data de aprovação do prospecto, incluindo a referência à garantia soberana de Angola (cfr. factos provados n.º 133 e 134).

77. Por um lado, o Tribunal defende que divulgar a informação por referência à data do prospecto equivale a prestar informação incompleta, e que se deveria incluir informação do ano anterior, mas, por outro lado, limitar-se a divulgar informação por referência ao ano anterior reconduz-se a prestar informação incompleta e desactualizada, pelo que os arguidos deveriam prestar informação por referência à data do prospecto.

78. Assim, verifica-se uma contradição insanável na fundamentação de facto da Sentença Recorrida a qual deve deve ser revogada, nos termos e para os efeitos do disposto na al. b) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, aplicável ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO, e, em consequência, ser ordenada a baixa do processo com vista à sanação deste vício.

79. Acresce que,atenta a referência temporal referida pela CMVM – i.e., “no final do ano de 2013” – é forçoso concluir que as imputações feitas ao ora Recorrente não lhe podem ser imputadas.

80. Ora, tendo em conta que, em 15 e 20 de Maio de 2020, o BES já dispunha de informação sobre o BESA mais actual do que a informação que era conhecida no “final do ano de 2013”, a imputação feita pela Decisão Recorrida, por referência a Outubro e Novembro de 2013 não tem qualquer fundamento (cfr. factos provadosn.os 114 a 118 e 124. a 132. da SentençaRecorrida).

81. De facto, mediante a emissão da Garantia Soberana de Angola em 31 de Dezembro de 2013, a favor do BESA e com impacto positivo no BES – à luz dos factos conhecidos em 15 e 20 de Maio de 2020 –, a informação que era conhecida em Outubro e Novembro de 2013 deixou de ser actual e era em absoluto irrelevante, pelo que a sua inclusão faria com que o prospecto contivesse informação desactualizada e não fosse claro.

82. A referência feita à Garantia Soberana de Angola no ponto 2.1.23 na página 60 do prospecto do aumento de capital do BES, em sede de “Factores de Risco”, dada como provada no facto provado n.º 115, foi – em face dos factos então conhecidos – completa, actual e verdadeira.

83. A verdade é que, em face dos factos conhecidos em 15 e 20 de Maio de 2014, a garantia soberana emitida pela República de Angola assegurava, de forma consistente, os riscos da carteira de crédito do BESA (e, nessa medida, a exposição do BES ao BESA estava, igualmente, assegurada).

84. Pelo que é forçoso concluir que em face dos factos conhecidos em 15 e 20 de Maio de 2014, a informação inserida no prospecto de aumento de capital do BES relativa à situação do BESA correspondia aà informação conhecida àquela data pelo ora Recorrente.

85. Nestes termos, deve o presente recurso ser julgado procedente e a Sentença Recorrida revogada na parte em que condenou o ora Recorrente pela infracção relativa à incompletude da informação que constava do prospecto de aumento de capital em Maio de 2014, relativa à situação do BESA em finais de 2013, e, em consequência, o ora Recorrente deve ser absolvido.’

A sentença recorrida teria, assim, reportado a datas distintas a exigência de informação sobre a exposição do grupo BES a inserir no prospeto,  referindo-se ora à data da aprovação deste, quanto à ESFG e subsidiárias, ora a 31.12.2013, quanto ao BESA.

Vejamos.

Resulta da sentença recorrida que, enquanto a imputação relativa à ESFG e subsidiárias se funda na falta de informação completa e actual, a relativa à Rio Forte funda-se apenas no facto de tal informação não ser completa (pp. 591 e 593, sublinhado aditado):
O Recorrente, CC, conhecedor da situação financeira e patrimonial que motivou a emissão da garantia soberana referida no fator de risco 2.1.23 do prospeto de aumento de capital e da informação que foi divulgada no Prospeto, sabia que fez constar do Prospeto informação que não era completa, porquanto não continha informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação. (fls. 24-211; fls. 1521-1582, fls. 2282-2729, maxime fls. 2282-2284 v. e 2314-2518 v.)

Sabia o Recorrente CC que a informação constante do Prospeto não era completa, porquanto não continha informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), mas apenas a 31.12.2013 (cerca de 290 milhões de euros), e não era atual, porquanto não correspondia ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto, mas antes a 31.12.2013; (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2314-2518 v.; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139).

Ora, tratando-se de imputações diversas e não estando em causa no que toca ao BESA, contrariamente à ESFG e subsidiárias, a actualidade da informação, mas apenas a sua completude, não há qualquer contradição em que a exigência se reporte a datas distintas num e noutro caso, não se vislumbrando, neste particular, qualquer contradição, muito menos insanável, na fundamentação da sentença recorrida, invocada pelo recorrente CC nos termos do artigo 410º, nº 2, alínea b) do CPP.

Improcede, pois, o presente segmento recursivo.

II.6.2.4 – Recorrente DD

Também o recorrente DD sustenta que a sentença recorrida padece de contradição insanável na fundamentação de facto (artigo 410º, nº 2, alínea b) do CPP). Concretamente, alega existir tal contradição entre:
(i) os factos provados 134, 135, 360, 361 e 362, e os factos provados 384, 385, 386, 432, 433 e 434 (conclusão 28, infra reproduzida);
(ii) os factos provados 384, 385, 386, 432, 433 e 434, e os factos não provados O), VVV) e LLLL) (conclusões 29 a 34, infra reproduzidas);
(iii) os factos provados 384, 385 e 386, e o facto não provado XXX) (conclusões 35 e 36, infra reproduzidas).

28. Em primeiro lugar, e salvo melhor opinião, a sentença recorrida incorre em vício por contradição entre a própria matéria de facto provada, especificamente entre os factos n.os 134, 135, 360, 361 e 362 e os factos n.os 384, 385, 386, 432, 433 e 434, ao dar por demonstrado o pretenso facto base que enforma todos os supostos factos n.os 133, 134, 135, 360, 361 e 362 da sentença recorrida, isto é, que o “BESA, no final do ano de 2013, ser[ia] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação”, razão pela qual os pretensos factos n.os 133, 134, 135, 360, 361 e 362 da sentença recorrida devem ser dados como não provados, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP.

29. Em segundo lugar, e salvo melhor opinião, a sentença recorrida incorre em vício por contradição entre os já referidos factos provados n.os 384, 385, 386, 432, 433 e 434 e as alíneas O), VVV) e LLLL) dos factos não provados.

30. Desde logo, salvo melhor opinião, e por força dos acima referidos factos provados n.os 384, 385, 386, 432, 433 e 434 revela-se contraditório dar por não provado – como se faz na alínea O) da sentença recorrida – que seria falsa a informação de que o BESA, no final do ano de 2013, seria titular de créditos e ativos imobiliários no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero.

31. Acresce que, e por força dos acima referidos factos provados n.os 384, 385, 386, 432, 433 e 434 revela-se igualmente contraditório dar por não provado – como se faz na alínea VVV) da sentença recorrida – que o Recorrente DD verificou que a garantia soberana emitida pela República de Angola a favor do BESA imunizava o BES de quaisquer potenciais consequências que pudessem advir da carteira de créditos e imobiliário do BESA.

32. Efetivamente,e conforme decorre do facto provado n.º434 da sentença recorrida, em junho de 2014, o Banco de Portugal considerou que a garantia do Estado Angolano, de acordo com pareceres jurídicos enviados ao Banco de Portugal, deve ser considerada para efeitos de avaliação de imparidade dos devedores selecionados, tendo o Recorrente tido acesso ao parecer jurídico do Professor Doutor RR enviado ao Banco de Portugal e elaborado, em fevereiro de 2014, um memorando a sustentar que a Garantia Soberana do Estado Angolano deveria, inclusivamente, ser considerada para efeitos prudenciais no BES (cfr. fls. 2209 dos autos), pois, para efeitos de cobertura de risco de crédito – que é o que interessaparaos presentesautos –jamaishouvequalquer dúvidadequea Garantia Soberana do Estado Angolano cobria o risco de crédito, conforme decorre do facto provado n.º 434.

33. Por outro lado, e por força dos acima referidos factos provados n.os 384, 385, 386, 432, 433 e 434 revela-se igualmente contraditório dar por não provado – como se faz na alínea LLLL) da sentença recorrida – que, com a emissão da garantia soberana, a pretensa informação segundo a qual o “BESA, no final do ano de 2013, ser[ia] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valortotalde1.7milmilhõesdedólaresquecareciamdereestruturação”(queéqueenformaaacusação) deixou de ser atual e irrelevante.

34. Em suma, salvo melhor opinião, é manifesto que a sentença recorrida incorre num vício por contradição na fundamentação ao dar por não demonstradas as alíneas O), VVV) e LLLL), razão pela qual os pretensos factos não provados das alíneas O), VVV) e LLLL) da sentença recorrida devem ser dados como provados, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, sendo que, relativamente à alínea LLLL) com a seguinte formulação:

“LLLL). Com a emissão da garantia soberana de Angola, em 31 de dezembro de 2013, a informação de que o BESA, no final do ano de 2013, ser[ia] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação” deixou de ser atual e era irrelevante, pelo que a sua inclusão no prospeto tornaria o mesmo desatualizado e não claro” (cfr. facto não provado LLLL), página 368 da sentença recorrida).

35. Em terceiro lugar,e salvo melhor opinião, a sentença recorrida incorre igualmente em vício por contradiçãoentre osjá referidos factosprovadosn.os 384, 385e386 eaalínea XXX)dos factos não provados, na medida em que, tendo o Tribunal a quo concluído que a K... Angola se encontrava a efetuar uma revisão da carteira de créditos do BESA no facto provado n.º 384, não se compreende, salvo melhor opinião, como é que, simultaneamente, dá por não provado a alínea XXX.

36. Em suma, salvo melhor opinião, é manifesto que a sentença recorrida incorre num vício por contradição na fundamentação ao dar por demonstrados os factos n.os 384, 385 e 386 da sentença recorrida e, simultaneamente,dar por não provado o facto da alínea XXX., razãopela qual deve o facto não provado da alínea XXX. ser dado como provado, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP.

No caso sub judice as contradições invocadas pelo recorrente dizem respeito a contradição entre factos.

Vejamos.

(i) Da contradição entre os factos provados 134, 135, 360, 361 e 362, e os factos provados 384, 385, 386, 432, 433 e 434

Da sentença recorrida constam designadamente os seguintes factos provados:

134.  A informação constante do Prospeto não é completa, porquanto não contém informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação. (fls. 24-211; fls. 1521-1582)

135.  A informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 669-801, maxime fls. 687 v., 696 v. e 722 v.; fls. 802-943, maxime fls. 810, 827 v. e 856; fls.1521-1582; fls. 4829-4841, maxime fls. 4830 e 4841; fls. 5852-5863 v., maxime fls. 5852 v. e 5863 v.
[…]
360.  O arguido DD tinha conhecimento de que o BES não fez constar do Prospeto informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação.

361.  O arguido DD tinha conhecimento de que do Prospeto consta informação que não é completa, porquanto não contém informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação.

362.  O arguido DD tinha conhecimento de que a informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 1521-1582; fls. 1583-1636, maxime fls. 1594 v.; cd de fls. 2245, pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140620”, ficheiro “2. Resultados do aumento de capital do BES”, p. 17; fls. 4829-4841, maxime fls. 4830 e 4841; fls. 5852-5863 v., maxime fls. 5852 v. e 5863 v.; fls. 5864-5882 v., maxime fls. 5872 v.; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.).
[…]
384. Em janeiro de 2014, no quadro da atividade corrente de cerificação legal das contas do BESA, a
K... Angola iniciou procedimentos de auditoria, incluindo a revisão da carteira de crédito do BESA.

385. No âmbito dos procedimentos de auditoria sobre as demonstrações financeiras individuais do BESA e consolidadas do BES e com referência a 31.12.2013, a K... Angola obteve, do Ministério das Finanças, a confirmação dos termos da garantia soberana, através de carta de 1 de Abril de 2014, dirigida à K... Angola, pelo Gabinete do Senhor Ministro das Finanças.

386. Em Abril de 2014, a K... Angola considerou que a emissão da garantia soberana permitia a eliminação da reserva relativa à carteira de crédito e proveitos de juros, que vinha sendo incluída nos relatórios do Auditor Independente de 2011 e 2012.

Salvo o devido respeito, não vemos onde está a contradição. Dar como provado que:
- a informação divulgada no prospeto não é completa por omitir informação sobre o facto de, no final de 2013, o BESA deter créditos e activos imobiliários no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização é quase nulo e um conjunto de créditos no montante de 1.7 mil milhões de dólares necessitando restruturação, o que era do conhecimento do arguido DD (factos 134, 360 e 361);
- a informação assim omitida é necessária para que os destinatários da Oferta façam juízos fundados sobre a mesma, o que também era do conhecimento do arguido DD (factos 135 e 362);

Em nada colide com a constatação, consignada na matéria provada da sentença impugnada, de que:
- em Janeiro de 2014, a K... Angola iniciou  procedimentos de auditoria, incluindo revisão da carteira de créditos do BESA, no quadro da actividade corrente de revisão das contas deste (facto 384);
- no âmbito de tais procedimentos de auditoria, a K... Angola obteve do Ministério das Finanças a confirmação dos termos da garantia soberana, através de carta de 1 de Abril de 2014 que lhe foi dirigida pelo Gabinete do Ministro (facto 385);
- em Abril de 2014 a K... Angola considerou que a emissão da garantia soberana permitia a eliminação da reserva à carteira de crédito, que vinha sendo incluída nos relatórios do Auditor Independente de 2011 e 2012 (facto 386).

A omissão de determinada informação sobre circunstâncias susceptíveis de afectar o valor de créditos do BESA no final de 2013 e da necessidade de tal informação para que os investidores destinatários da Oferta formem juízos fundados sobre a mesma, do que o arguido era sabedor, em nada contradiz [ou é contraditado  pel]o facto de a filial em Angola de um gabinete privado de consultadoria iniciar procedimentos de auditoria à carteira de crédito do BESA e nesse âmbito considerar que, face à confirmação dos termos da garantia soberana constante de carta de 1 de Abril de 2014 do Gabinete do Ministro das Finanças, que tal garantia permitia eliminar a reserva à carteira de crédito que vinha sendo incluída nos relatórios do Auditor Independente de 2011 e 2012.

Uma coisa é a omissão factual de uma informação num prospeto, a a correlação de necessidade entre tal informação e a formulação de juízos fundados pelos destinatários da Oferta nele divulgada ou o conhecimento dessa omissão e correlação por parte do arguido DD, outra bem diferente é a posição expressa pela filial em Angola de um grupo de consultoria privado, no quadro de auditoria às contas do BESA, relativamente às ilações a extrair da confirmação dos termos da garantia soberana, que lhe foi comunicada por carta de 1 de Abril de 2014 do Gabinete do Ministro das Finanças. 

Os dois conjuntos de factos não se contradizem, são perfeitamente compatíveis e podem co-existir sem qualquer atropelo da lógica, não se vislumbrando qualquer contradição entre eles, e muito menos insanável, susceptível de consubstanciar o vício de contradição insanável da fundamentação previsto no artigo 410º, nº 2, alínea b), do CPP.

(ii) Da contradição entre os factos provados 384, 385, 386, 432, 433 e 434, e os factos não provados O), VVV) e LLLL)

Da sentença recorrida constam igualmente os seguintes factos provados e não provados:

432. Em 7 de Fevereiro de 2014, LLL, Presidente da comissão Executiva do BESA, remeteu a RR, a quem se dirigiu na qualidade de «Exmo. Senhor Professor», carta com o seguinte teor:
«Assunto: Garantia do Estado Angolano
Exmo. Senhor,
Para os devidos efeitos, confirmamos que os créditos constantes do Anexo 1 à Garantia supra- referenciada, objeto da mesma garantia, se encontram regularmente escrituradas nas contas do BESA, podendo nós assegurar a sua existência e exigibilidade, bem como garantias que lhe estão associadas.
Com os melhores cumprimentos
LLL
Presidente da Comissão Executiva[45]

433. Em 30 de Maio de 2014, a K... reuniu com o Banco de Portugal e em representação da K..., XX informou que «do seu conhecimento não existem questões relevantes sobre o BESA”. Afirmou ainda que a opinião da K... local ainda não tinha sido emitida e no âmbito da revisão da carteira de crédito desta filial, não tinham sido encontradas deficiências relevantes, sobretudo tendo em consideração a existência da garantia soberana do Estado Angolano.
Sobre a garantia do Estado Angolano, o Dr. PPP questionou os representantes da K... sobre a amplitude da perda, caso esta garantia não existisse, ou a magnitude dos benefícios associados à garantia, tendo os representantes da K... respondido que não dispunham desta informação.
Ainda assim, foi solicitada pelo Dr. QQQ uma justificação para o montante de 50M € de imparidades extraordinárias que o BESA realizou durante o primeiro trimestre de 2014, tendo também sido solicitada informação sobre as carteiras de crédito às quais estavam afetas estas imparidades.
Em resposta, os representantes da K... afirmaram que não dispunham desses elementos, tendo ficado de obter a informação necessária[46]».
434. Em 16 de Junho de 2014, RRR, coordenadora do Departamento de Supervisão Prudencial do Banco de Portugal, em resposta a comunicação de correio eletrónico de SSS, com o título «Ratings Angola»[47]:
«Cara dra. SSS
De Acordo com o nosso entendimento do Manual: a utilização de garantias de terceiros pode ser tida em conta, mas sua validade/enforcibilitty tem de ser analisada.
Existem casos em que o credit rating do emitente justifica por si só a aceitação da garantia (o emitente tem credit quality superior a 3)
É nosso entendimento que a garantia do Estado Angolano, de acordo com pareceres jurídicos enviados ao Banco de Portugal, deve ser considerada para efeitos de avaliação de imparidade dos devedores selecionados. Os referidos pareceres ser-lhe-ão disponibilizados».

O. Por ser informação falsa, o Prospeto não continha a informação de que o BESA, no final do ano de 2013, era titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero.
VVV. Para o que releva nestes autos, o Recorrente DD verificou que a garantia soberana emitida pela República de Angola a favor do BESA imunizava o BES de quaisquer potenciais consequências que pudessem advir da carteira de créditos e imobiliário do BESA.
LLLL. Com a emissão da garantia soberana de Angola, em 31 de Dezembro de 2013, a informação que era conhecida em Outubro e Novembro de 2013, deixou de ser atual e era em irrelevante, pelo que a sua inclusão no prospeto tornaria o mesmo desatualizado e não claro.

Não se vislumbra onde está a contradição. Dar como provado que:
- em Janeiro de 2014, a K... Angola iniciou  procedimentos de auditoria, incluindo revisão da carteira de créditos do BESA, no quadro da actividade corrente de revisão das contas deste (facto 384);
- no âmbito de tais procedimentos de auditoria, a K... Angola obteve do Ministério das Finanças a confirmação dos termos da garantia soberana, através de carta de 1 de Abril de 2014 que lhe foi dirigida pelo Gabinete do Ministro (facto 385);
- em Abril de 2014 a K... Angola considerou que a emissão da garantia soberana permitia a eliminação da reserva à carteira de crédito, que vinha sendo incluída nos relatórios do Auditor Independente de 2011 e 2012 (facto 386).
- o Presidente da Comissão Executiva do BESA considera, em carta de 7 de Fevereiro de 2014 dirigida ao Professor RR, poder assegurar a existência e exigibilidade dos créditos constantes do Anexo I à garantia do Estado Angolano (facto 432);
- numa reunião de 30 de Maio de 2014 com o Banco de Portugal, a K... afirmou que não dispunha de informação sobre a amplitude da perda, caso esta garantia não existisse, ou a magnitude dos benefícios associados à garantia do Estado Angolano, nem sobre a carteira de créditos que estavam associados às imapridades extraordinárias no montante de  50 milhões que o BESA realizou no primeiro trimestre de 2014 (facto 433);
- em mensagem de correio electrónico de 14 de Junho de 2014, a coordenadora do Departamento de Supervisão Prudencial do Banco de Portugal afirmar ser seu entendimento que a garantia do Estado Angolano, de acordo com pareceres jurídicos enviados ao Banco de Portugal, deve ser considerada para efeitos de avaliação de imparidade dos devedores selecionados (facto 434)

Em nada colide com a constatação, consignada na sentença impugnada, de não se ter provado que:
-   a omissão no Prospeto da informação de que o BESA, no final do ano de 2013, era titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero se devia ao facto de tal informação ser falsa (facto não provado O));
- o recorrente DD verificou que a garantia soberana emitida pela República de Angola a favor do BESA imunizava o BES de quaisquer potenciais consequências que pudessem advir da carteira de créditos e imobiliário do BESA (facto não VVV));
- a emissão da garantia soberana de Angola em 31 de Dezembro de 2013 tornou desactual e irrelevante a informação que era conhecida em Outubro e Novembro de 2013, pelo que a sua inclusão no prospeto tornaria o mesmo desatualizado e não claro (facto não provado LLLL)).

Desde logo porque, confrontando-se factos provados e não provados, só existiria contradição se se tratassem dos mesmos factos, o que manifestamente não é o caso. De um lado, estão auditorias e opiniões de uma consultora privada e entendimentos do Presidente da Comissão Executiva do BESA ou da coordenadora do Departamento de Supervisão Prudencial do Banco de Portugal sobre a pertinência de considerar a garantia soberana do Estado Angolano na avaliação da carteira de créditos e imparidades daquele banco, do outro, a constatação de se não ter provado que tal garantia tornava desactual ou irrelevante determinada informação, que a inclusão desta tornaria o prospeto desactual e não claro ou que a omissão no prospeto de determinada informação [que no final de 2013 o BESA era titular de créditos e activos imobiliários no valor de 3.9 mil milhões de dólares cujo valor de realização era próximo de zero] se deveu a esta ser falsa.

A falta de prova de um facto não demonstra o seu contrário, pelo que se não vê sequer possibilidade de contradição, sendo distintas as realidades ontológicas espelhadas nos factos provados 384, 385, 386, 432, 433 e 434, das que se dão como não provadas nas alíneas O), VVV) e LLLL) da sentença recorrida.

A prova de uns (384, 385, 386, 432, 433 e 434) não é infirmada pela não prova de outros (O), VVV), LLLL)), antes é com esta perfeitamente compatível, ambas podendo co-existir sem qualquer atropelo da lógica, não se vislumbrando qualquer contradição entre a prova dos primeiros e a falta de prova dos segundos, e muito menos insanável, susceptível de consubstanciar o vício de contradição insanável da fundamentação previsto no artigo 410º, nº 2, alínea b), do CPP.

(iii) Da contradição entre os factos provados 384, 385 e 386, e o facto não provado XXX)

Da sentença recorrida consta igualmente o seguinte facto não provado:

XXX) Com interesse para estes autos e para a omissão em causa, em 2014, realizavam-se diversas auditorias à carteira de crédito do BESA para apurar a real situação.
Não se vislumbra onde está a contradição com os factos provados 384, 385 e 386 (supra reproduzidos). Dar como provado que:
- em Janeiro de 2014, a K... Angola iniciou  procedimentos de auditoria, incluindo revisão da carteira de créditos do BESA, no quadro da actividade corrente de revisão das contas deste (facto 384);
- no âmbito de tais procedimentos de auditoria, a K... Angola obteve do Ministério das Finanças a confirmação dos termos da garantia soberana, através de carta de 1 de Abril de 2014 que lhe foi dirigida pelo Gabinete do Ministro (facto 385);
- em Abril de 2014 a K... Angola considerou que a emissão da garantia soberana permitia a eliminação da reserva à carteira de crédito, que vinha sendo incluída nos relatórios do Auditor Independente de 2011 e 2012 (facto 386).

Em nada colide com a constatação, consignada na sentença recorrida, de se não ter provado que matéria provada da sentença impugnada, de que ‘em 2014, realizavam-se diversas auditorias à carteira de crédito do BESA para apurar a real situação’ (facto não provado XXX), sublinhado aditado).

Desde logo porque, confrontando-se factos provados e não provados, só existiria contradição se se tratassem dos mesmos factos, o que manifestamente não é o caso, pois nos factos provados apenas se refere ter a K... Angola iniciado  procedimentos de auditoria (factos provados 384-386), ou seja uma auditoria iniciada em 2014, enquanto a falta de prova se refere a diversas auditorias realizadas nesse ano (à carteira de créditos do BESA).

.É perfeitamente compatível constatar-se o início de procedimentos de auditoria pela filial de uma consultora privada em 2014 e a falta de prova de nesse ano terem sido realizadas diversas auditorias à carteira de créditos do BESA.

De resto, o facto não provado XXX) refere diversas auditorias com interesse para a omissão em causa (de determinada informação relativa a créditos e activos imobiliários do BESA no prospeto), pelo que a falta de prova se refere igualmente ao interesse de tais auditorias para a omissão da dita informação, matéria que não é objecto dos aludidos factos provados e por isso insusceptível de com eles entrar em contradição.

A falta de prova de um facto não demonstra o seu contrário, pelo que se não vê sequer possibilidade de contradição, sendo distintas as realidades espelhadas nos factos provados 384, 385, 386, 432, 433 e 434, das que se dá como não provada na alínea XXX) da sentença recorrida.

A prova de uns (384, 385, 386, 432, 433 e 434) não é infirmada pela não prova de outro (XXX)), antes é com esta perfeitamente compatível, ambas podendo co-existir sem qualquer atropelo da lógica, naõ se vislumbrando qualquer contradição entre a prova dos primeiros e a falta de prova dos segundos, muito menos insanável, susceptível de consubstanciar o vício de contradição insanável da fundamentação previsto no artigo 410º, nº 2, alínea b), do CPP.

Improcede, assim, o vício de contradição insanável da fundamentação invocado pelos recorrentes AA, BB, CC e DD, nos termos do artigo 410º, nº 2, alínea b) do CPP, e com ele o presente segmento recursivo.

II.6.3 – Dos erros notórios na apreciação da prova

Os recorrentes AA, BB e DD alegam que a sentença recorrida padece de erros notórios na apreciação da prova, nos termos do artigo 410º, nº 2, alínea c) do CPP.

Segundo Manuel Simas Santos e Manuel Leal-Henriques, há erro notório na apreciação da prova ‘quando um homem médio, perante o que consta do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com o senso comum, facilmente se dá conta de que o tribunal violou as regras da experiência ou se baseou em juízos ilógicos, arbitrários ou mesmo contraditórios ou se desrespeitaram regras sobre o valor da prova vinculada ou das leges artis.
(...) Assim, não poderá incluir-se no erro notório na apreciação da prova a sindicância que os recorrentes possam pretender efectuar à forma como o tribunal recorrido valorou a matéria de facto produzida perante si em audiência, valoração que aquele tribunal é livre de fazer, de harmonia com o preceituado no art. 127º’.[48]

Tem entendido a jurisprudência que, para que tal vício se verifique, tem de haver incompatibilidade manifesta e evidente entre o facto e a realidade, de tal forma que resulte do texto da decisão sem margem para dúvidas que a prova foi mal apreciada:

 ‘Esse vício é caracterizado por uma incompatibilidade evidente e manifesta entre o facto e a realidade, de tal forma que para o tribunal resulte, sem margem para dúvidas, que a prova foi mal apreciada, devendo esse erro resultar do texto da decisão e não da apreciação da prova recolhida.’[49]

‘(...) O mesmo verifica-se quando, partindo do texto da decisão recorrida, a matéria de facto considerada provada e não provada pelo tribunal a quo, atenta, de forma notória, evidente ou manifesta, contra as regras da experiência comum,  avaliadas de acordo com o padrão do homem médio. É um vício intrínseco da sentença, isto é, que há-de resultar do texto da decisão recorrida, de tal forma que, lendo-o, logo o cidadão comum se dê conta que os fundamentos são contraditórios entre si, ou com a decisão tomada.’[50]

Não se trata de reapreciar a matéria de facto, como lembra o Tribunal da Relação de Lisboa (ênfase aditado):

‘De facto, estando este tribunal impedido de reapreciar a matéria de facto, é destituída de qualquer relevância a referência pela recorrente, ao longo das suas motivações, a elementos de prova concretos, nomedamente a documentos juntos aos autos (fls. 2, 9 a 14 das motivações) ou a depoimentos testemunhais (fls. 12 e 19 das motivações).[51]

Examinemos, pois, em concreto o que alegam os recorrentes AA, CC e DD.

II.6.3.1 – Recorrente AA

O recorrente AA alega que a sentença recorrida padece de ‘erros manifestos’ de julgamento dos factos, ao considerar, relativamente às contraordenações por que foi condenado relativas à ESFG e subsidiárias, que:
(i) o aumento da exposição relevante é apenas relativo à ESFG e subsidiárias (e não em relação a todas as entidades relacionadas referidas no capítulo 12.2. do prospeto) - conclusões 26ª e 48ª a 59ª;
(ii) os destinatários da Oferta não tinham informação sobre o aumento da exposição à ESFG e subsidiárias, de 290 milhões a 31.12.2013 para € 400 milhões a 31.03.2014 (conclusões 26ª e 60ª a 72ª);
(iii) o aumento da exposição do BES à ESFG e subsidiárias (entre 31.12.2013 e 20.05.2014) representava uma alteração significativa na posição financeira ou comercial do grupo BES (conclusões 26ª e 73ª a 86ª);
(iv) a informação omitida no prospeto, relativa ao valor da exposição do BES à ESFG e subsidiárias, na data da aprovação do prospeto, era necessária para que os destinatários da oferta formassem juízos fundados sobre a mesma (cfr. §§ 180 a 204 e conclusões 87ª a 109ª);
(v) a informação não divulgada através de adenda ao prospeto era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma (conclusões 110ª a 134ª).

Conforme se referiu, não configuram erros notórios de apreciação da prova aqueles que demandam o confronto com elementos constantes dos autos.

Para sustentar os dois primeiros alegados erros manifestos de julgamento dos factos, o recorrente AA convoca o teor do prospeto de aumento de capital (capítulo 12.2., sob o título “Operações com entidades terceiras especialmente relacionadas”), bem como o teor do Relatório e Contas Consolidado e Individual relativo ao 1º trimestre de 2014, divulgado no SDI da CMVM em 30.05.2014.

Estando em causa a apreciação pelo Tribunal a quo da completude e atualidade da informação constante do prospeto relativamente à exposição do BES à ESFG e subsidiárias, é evidente que, nessa avaliação aquele Tribunal apenas poderia ter considerado, como considerou, a informação relativamente a essas entidades (e não a outras entidades terceiras especialmente relacionadas, como pretende o recorrente AA).

A improcedência do argumento do recorrente AA, relativo à alegada omissão de 13 das 18 entidades terceiras ligadas ao BES, foi expressamente afirmada na decisão recorrida nos seguintes termos (pp. 426-427, ênfase aditado):
‘[…] Apreciando dir-se-á que, constata-se que o quadro que veio a constar do prospeto divulgado (cfr. fls. 175), em matéria de operações com entidades terceiras especialmente relacionadas, se refere a outras entidades terceiras especialmente relacionadas com o BES que não apenas a ESFG e suas subsidiárias, sendo que, nesta sentença, atento o seu objecto, foram consideradas apenas a informação quanto a estas últimas.
[…]
A análise comparativa dos valores da exposição do BES à ESFG e subsidiárias com referência aos períodos de 31.12.2014, 31.03.2014 ou 20.05.2014, circunscreveu-se – relativamente a todos os períodos de referência –, ao valor da exposição do BES à ESFG e suas subsidiárias.

Relativamente ao segundo alegado erro manifesto de julgamento dos factos, refira-se que o facto de, posteriormente à divulgação em 20.05.2014 do prospeto, o BES ter divulgado em 30.05.2014 no SDI da CMVM o Relatório e Contas Consolidado e Individual relativo ao 1º Trimestre de 2014, do qual constava o valor da exposição do BES à ESFG e subsidiárias, com referência a 31.03.2014, em nada altera a imputação ao recorrente AA da contraordenação relativa à omissão no prospeto de informação completa e atual, com referência à data da aprovação do prospeto, relativamente à exposição do BES à ESFG e subsidiárias.

Sendo posterior, tal divulgação exógena ao prospeto em nada altera os factos provados 110 (no sentido de que do prospeto não constava informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias em 31.03.2014, de cerca de 400 milhões de euros) e 111 (no sentido de que do prospeto não constava informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto, de cerca de 533 milhões de euros).

Os restantes três alegados erros manifestos de julgamento dos factos, não passam, no fundo, de mera discordância do juízo efetuado pelo Tribunal a quo quanto à relevância ou necessidade da informação não omitida ou não divulgada para a decisão dos destinatários da oferta, relativa à exposição do BES à ESFG e subsidiárias, quer com referência à data da aprovação do prospeto (no valor de cerca de 533 milhões de euros), quer na sequência dos financiamentos concedidos pelo BES em 30.05.2014 (no valor de cerca de 194 milhões de euros).

Assim, o recorrente AA sustenta que o ‘aumento de exposição do BES à ESFG e suas subsidiárias, de 290 para 533 milhões de euros, não constitui nenhuma alteração, quanto mais significativa, na posição financeira ou comercial do BES, quanto mais do grupo BES’ (conclusão 78ª), por referência à sua carteira de crédito total, no valor de 51 mil milhões de euros (conclusão 79ª).

Considerar que um aumento de quase 250 milhões de euros na exposição do BES à ESFG e subsidiárias não altera a posição financeira ou comercial do BES é uma opinião do recorrente AA, que de modo algum demonstra ter havido erro notório na apreciação da prova, pois o que o tribunal considerou foi que tal informação deveria constar do prospeto, por forma a permitir aos investidores ajuizar por si próprios da relevância de tal alteração, independentemente da importância relativa que a mesma revista para o BES no conjunto da sua carteira de crédito.

Como recorda a sentença recorrida, as transações com partes relacionadas ‘não correspondem ao core business ou à atividade corrente do Banco’ (p. 724), devendo ser divulgadas no prospeto atenta a sua especial natureza, independentemente do concreto montante em causa: ‘a exposição tinha um risco próprio e por natureza decorrente da relação de partes relacionadas existente entre o BES e a ESFG e subsidiárias, razão porque interessava aos investidores conhecer o montante de exposição.” (p. 722, ênfase aditado).

A sentença recorrida fundamentou (pp. 424-426, 428, 468-471, 494-498 e 720-725), de forma clara e detalhada, as razões pelas quais a informação omitida ou não divulgada, relativamente ao aumento do valor da exposição do BES à ESFG e subsidiárias era necessária para a decisão dos destinatários da oferta, como resulta dos factos provados 113 e 141, e o arguido AA disso tinha conhecimento, como resulta dos factos provados 225 e 242.

Conforme aí vem resumidamente referido (cfr. p. 724, ênfase aditado):
‘[…] não são esses os parâmetros decisivos para a norma que protege a qualidade da informação a verter no prospeto e que impunha aos Recorrentes outra conduta. São antes e como sabem: a natureza de partes relacionadas; o contexto de determinações específicas e ring-fencing; a situação degradada da ESFG; a duplicação do montante de exposição; a ocorrência de um incremento expressivo de exposição em sentido contrário ao que se vinha verificando e que fora assumido como objectivo do BES. […] O aumento relevante da exposição do BES a partes relacionadas acarretava uma alteração da situação financeira e comercial do emitente, tal como inicialmente divulgada.’

O Tribunal a quo conclui, assim, acertadamente, que ‘a observação do dever que decorre da norma não demanda a aferição, pelos Recorrentes, da dosimetria (materialidade) das operações de financiamento para o BES, mas antes um juízo de aferição da relevância e necessidade da informação para a decisão fundada e racional dos investidores” (p. 784, ênfase aditado).

Assim, ao contrário do que afirma o recorrente AA, inexiste qualquer contradição entre a referida afirmação da sentença recorrida [não consideração da ‘dosimetria (materialidade) das operações de financiamento para o BES’ (pp. 784)] e as afirmações acerca da consideração da ‘dosimetria concreta do aumento de exposição’ (p. 471) e do ‘montante significativo desses financiamentos por referência à informação que constava do prospeto sobre a exposição do BES à ESFG e subsidiárias’ (p. 786, ênfase aditado).

Quanto à contraordenação por que foi condenado relativa à violação do dever de inclusão no prospeto de informação sobre o BESA, alega o recorrente AA que a sentença recorrida padece de erro notório na apreciação da prova ao dar por provado que a informação constante do prospeto quanto ao BESA não é completa (facto provado 134), porque a informação omitida não é atual e era falsa à data do prospeto, uma vez que ‘tais créditos, em 31/12/2013, passaram a estar garantidos pela garantia soberana da República de Angola’ (conclusões 149ª a 159ª).

A este propósito cabe recordar que o recorrente AA não veio condenado pela violação do dever de inclusão no prospeto de informação atual sobre a situação financeira e patrimonial do BESA, mas sim do dever de inclusão no prospeto de informação completa sobre a situação financeira e patrimonial do BESA que esteve na origem da emissão da garantia soberana referida no prospeto.

Em sede de fundamentação, a sentença recorrida afastou as alegações de que a informação omitida relativamente ao BES fosse falsa e de que a emissão da garantia soberana a 31.12.2013 tornava desnecessária a divulgação da informação omitida no prospeto sobre a situação financeira e patrimonial do BESA apurada em outubro de 2013 que esteve na origem daquela garantia, nos seguintes termos (pp. 462-463, ênfase aditado):
O arguido AA alega que os factos vertidos nos pontos 134 e 135 da decisão recorrida constituem «informação falsa», o que, como se mencionou supra, muito mal se compreende em face dos elementos probatórios constantes dos autos e a envolvência direta do Recorrente, na qualidade de Administrador Peloureiro, de um lado; e obreiro da obtenção de uma garantia soberana junto da República Angolana, de outro. (…).’

Tendo reiterado mais adiante, a propósito da relevância da informação omitida para a decisão dos destinatários da oferta (pp. 531-532, ênfase aditado), que:
‘o que está aqui em causa é o dever do Recorrente de assegurar que é colocada, no prospeto, informação verdadeira e completa, de forma a que os subscritores da Oferta possam levar a cabo juízos fundados sobre a mesma.

Neste âmbito, não se nos afigura aceitável, à luz da normatividade vigente e que o Recorrente bem conhecia, que o agente pudesse cumprir tal desiderato através da formulação de um juízo pessoal, por si levado a cabo, de equivalência entre a informação que verteu sobre a garantia soberana e a existência de um grau de deterioração de tal ordem da carteira de crédito do BESA que estava em causa, na sequência de acto reputado pelo BES de «fraude», a sua própria solvabilidade.

Ao pretender estabelecer esta putativa «equivalência», considerando com tal juízo justificada a omissão de informação, o Recorrente AA retirou aos subscritores da Oferta a possibilidade de por si, e com acesso a informação completa, atual e documentada, concluírem pela existência, ou não, de tal (alegada) cobertura total.

Não se nos afigura que seja intenção do legislador, no detalhe terminológico que empregou quanto aos deveres de informação a observar no prospeto, transferir para os Emitentes juízos definitivos sobre a informação da oferta de subscrição.

O que competia ao Recorrente AA e aos demais, era, precisamente, assegurar que, tal como o Recorrente AA, considerou os riscos mitigados por força da emissão da garantia soberana, também os subscritores o pudessem, ou não, fazer.

Ao sonegar informação sobre a real situação encontrada e ao estabelecer equivalências de questionável correspondência, colocaram os Recorrentes, propositadamente, em crise o comando legal que obriga à veiculação de informação completa e verdadeira, o que o arguido bem sabia, assim o tendo representado e querido.’

Bem como a propósito da subsunção do direito aos factos (pp. 739-741, ênfase aditado):
‘Como já se referiu, para efeitos de apuramento da subsunção dos factos à norma postergada, não está em casa a existência, a validade e os efeitos da garantia soberana de 5,7 mil milhões de euros nas contas do BESA.

A incompletude da informação vertida no prospeto respeita, repete-se, ao facto de nele ter sido omitida a deteção, em Outubro de 2013, de graves problemas na carteira de crédito e portefólio de ativos imobiliários do BESA, enquadramento que, precisamente, fundou a necessidade de ser obtida uma garantia soberana, no valor de 5,7 mil milhões de dólares.

Reitera-se que, não existe no texto do fator de risco qualquer menção à existência de problemas na carteira de crédito do BESA, nem que o apuramento de problemas nessa mesma carteira de crédito fossem a razão de ser da emissão da garantia.

O texto da garantia inculca no leitor a percepção de que a sua emissão tem uma finalidade eminentemente preventiva e motivada por fatores exógenos ao BESA, sem qualquer referência à existência de problemas já materializadas na carteira de crédito e portefólio de ativos imobiliários do BESA.

Ao contrário do veiculado pelo próprio BES, no Memorando sobre a situação patrimonial do BESA, subscrito pelo DAJ (de que era Peloureiro o Recorrente DD), no prospeto não consta - e devia constar - por se tratar de informação relevante para a formulação de juízes fundados por parte dos subscritores da oferta pública de subscrição, o facto de, no final do ano de 2013, o BESA ser titular de crédito e ativos imobiliários, no valor de 3,9 milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1,7 milhões de dólares que careciam de reestruturação.

A informação vertida no prospeto a este respeito não era, pois, completa, conforme exigido pelo preceito aqui em análise. Remete-se e dá-se por reproduzida a explicação do sentido e alcance normativos destes conceitos preconizada pelo Colendo Tribunal Constitucional, no aresto acima convocado.

Para concluir pela recondução da conduta dos Recorrentes à norma incriminadora o que se exige e se logrou demonstrar nos autos é que:
(a) conheciam informação divulgada no prospeto, na medida em que o aprovaram;
(b) conheciam a informação omitida no prospeto (os graves problemas detetados no final de 2013 na carteira de crédito e portfólio de ativos imobiliários do BESA, com origem em fraude do anterior Presidente da Comissão Executiva do BESA, que esteve na origem da emissão da garantia soberana pela República de Angola em 31.12.2013);
e (c) sabiam que a informação omitida era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma, assim postergando o dever previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM.

Os Arguidos CC, DD e AA pela participação, envolvência e conhecimento que tiveram da situação apurada no BESA (em Outubro de 2013) e que fundou a emissão da garantia soberana, dispunham das condições e conhecimento para assegurar a qualidade da informação divulgada no Prospeto a este respeito.

Não o tendo feito, bem sabendo que sobre si impendia um dever legal de aportar informação verdadeira e completa, violaram aquele dever.

Verificam-se, pois, os elementos objetivo e subjetivo, exigidos pela norma infracional, não se tendo apurado circunstâncias que excluam qualquer um daqueles elementos ou que constituam causa de exclusão da culpa ou da ilicitude.’

Do texto da decisão impugnada, designadamente dos extratos acabados de citar, não resulta, assim, qualquer erro, muito menos notório, na apreciação da prova, susceptível de consubstanciar o correspondente vício invocado pelo recorrente AA, nos termos do artigo 410º, nº 2, alínea c) do CPP, o que se consigna.


II.6.3.2 – Recorrente BB

Alega o recorrente BB, quanto às duas contraordenações por que foi condenado, ambas relativas à ESFG e subsidiárias, que a sentença recorrida enferma de nulidade por erro notório na apreciação da prova, nos termos do artigo 410.º, n.º 2, alínea c), do CPP (conclusões XLIII, XLIV e XLV).

Invoca, para o efeito:
(i)   desconsideração da prova documental (§§ 257º a 271º e conclusões XLIII e XLIV);
(ii) desconsideração e não aplicação das regras da experiência comum (‘em especial, quanto à intervenção do Recorrente no processo de elaboração do Prospeto’) - §§ 272º a 309º e conclusões XLIII e XLIV;
(iii) desconsideração de factos públicos e notórios (‘em especial, por desconsideração de notícias públicas de onde resulta que o Recorrente não teve qualquer contributo causal, por ação ou omissão, para os factos aqui em causa’) -§§ 310.º a 325º e conclusões XLIII e XLIV;
(iv)  desconsideração da aprovação do prospeto pela CMVM (§§ 326.º a 353º e conclusões XLIII e XLIV).

Como se deixou já referido, a nulidade por erro notório na apreciação da prova tem de resultar evidente do próprio texto da sentença recorrida, sendo vedada ‘a referência […] a elementos de prova concretos, nomeadamente a documentos juntos aos autos’, o que dispensa apreciação do primeiro dos fundamentos invocados (desconsideração de prova documental), por exorbitar do âmbito da nulidade invocada a este título nos termos do artigo 410º, nº 2, alínea c) do CPP, o que se consigna.

Relativamente à alegação de que a sentença recorrida desconsiderou/não aplicou regras da experiência comum ao decidir que o arguido tinha o dever de conhecer os supostos vícios da informação e de agir, o que implicaria a alteração dos factos provados 263 e 278 (‘O arguido BB quis praticar os factos supra descritos’), foi dado como provado que o recorrente BB conhecia, enquanto membro da Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas do BES, presente nas reuniões da referida Comissão de 09.05.2014 (fls. 3225-3226 v. dos autos) e 30.05.2014 (fls. 3232-3236 v.),  a informação omitida ou não divulgada no prospeto (factos provados 256, 259, 260, 264, 265 e 269), pelo que a questão de saber se ‘o arguido tinha o dever de conhecer os supostos vícios da informação’ se encontra respondida a nível da matéria de facto, insuscetível de sindicância por este Tribunal, nos termos do artigo 75º, nº 1, do RGCO.

Quanto à questão de saber ‘se o arguido tinha o dever de agir’ é insusceptível de sindicância em sede da nulidade invocada (erro notório de apreciação da prova), uma vez que se trata de matéria de direito e como tal considerada na sentença recorrida, como resulta da seguinte passagem (pp. 385-386, ênfase aditado):

‘Aquilatar se, à luz da norma de dever, o agente que aprova o prospeto é, ou não, responsável pelo cumprimento das normas legais atinentes à qualidade da informação nele veiculada e, bem assim, se a sua postergação gera, ou não, responsabilidade contraordenacional, é matéria de direito, que se apreciará infra.’

Relativamente à alegação de que a sentença recorrida desconsiderou factos públicos e notórios, que apontavam no sentido de que o Recorrente não teve qualquer contributo causal, por ação ou omissão, para os factos aqui em causa’, referindo-se à notícia do Semanário ... de 29 de julho de 2022, sob o título ‘Clientes, gestores e até auditores: todos foram enganados’, resultou dos factos provados que o recorrente BB conhecia a informação omitida ou não divulgada no prospeto relativamente ao valor da exposição do BES à ESFG e subsidiárias, quer na data da aprovação do prospeto (factos provados 256 e 259, infra reproduzidos), quer na sequência dos financiamentos concedidos em 30 de maio de 2014 (factos provados 264 e 265, infra reproduzidos):

256. O arguido BB, enquanto membro da Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas do BES, teve conhecimento, em reunião da referida comissão havida em 9 de maio de 2014, de que à data da aprovação do Prospeto o montante total de financiamentos do BES concedidos à ESFG e suas subsidiárias ascendia a cerca de 533 milhões de euros. (fls. 24-211, maxime fls. 145; fls. 1583-1636, maxime fls. 1594 v.; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226)

259. O arguido BB tinha conhecimento de que a informação constante do Prospeto: (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2314-2518 v.; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)
a) Não era completa, porquanto não continha informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), mas apenas a 31.12.2013 (cerca de 290 milhões de euros);
b) Não era atual, porquanto não correspondia ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto, mas antes a 31.12.2013.

264. (i) O arguido BB, enquanto membro da Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas do BES, emitiu parecer de não oposição ao financiamento concedido pelo BES, em 30 de maio de 2014, à ESFG e subsidiárias, no montante de cerca de 194 milhões de euros. (cd de fls. 3223; fls. 3232-3236 v.)

265. O arguido BB, enquanto membro da Comissão de Controlo de Transações com Partes Relacionadas do BES, tinha conhecimento de que, a 30 de maio de 2014, o montante total de financiamentos do BES concedidos à ESFG e suas subsidiárias ascendia a cerca de 727 milhões de euros. (cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v.; fls. 3232-3236 v.)

Como resulta que era ciente de que tal informação ‘era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma’ (factos provados 260 e 269, infra reproduzidos), nada tendo feito para levar a referida informação ao conhecimento dos destinatários da oferta, durante o período de duração desta (factos provados 262, alínea i), 266 e 277, alínea c), infra reproduzidos):

260.  O arguido BB tinha conhecimento de que a informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211, maxime fls. 29, 34, 174, 174 v.,175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v.; fls. 3232-3236 v.; fls. 1644-1785; fls. 4873-4896 e fls. 7297-7343; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)

269.  O arguido BB tinha conhecimento de que a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636, maxime fls. 1594 v.; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v.; fls. 3232-3236 v.; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.)

O facto de o recorrente BB não ter sido sequer constituído arguido na sede penal a que alude a notícia do Semanário ... de 29 de julho de 2022, relativo a ‘factos relacionados com o aumento de capital do BES, em especial, a falta de informação no Prospeto sobre os riscos a que o BES estava exposto’, não interfere na apreciação da prova no presente procedimento contraordenacional, uma vez que a falta de acusação ou mesmo absolvição em sede penal não implica que não hajam sido praticado factos de relevância contraordenacional.

Finalmente, quanto à alegada desconsideração, pela sentença recorrida, da aprovação do prospeto pela CMVM, não se constata qualquer vício na sentença recorrida, porquanto esta refere expressamente que ‘O Prospeto foi aprovado pelo Conselho Diretivo da CMVM em deliberação tomada a 20 de maio de 2014 e notificada ao BES na mesma data.’ (facto provado 75, p. 203, infra reproduzido):

75. O Prospeto foi aprovado pelo Conselho Diretivo da CMVM em deliberação tomada a 20 de maio de 2014 e notificada ao BES na mesma data. (fls. 3814-3832; fls. 4944-4980 do processo administrativo de aprovação do prospeto, contante de pen a fls. 8719 dos presentes autos)

Mas, a sentença dá ainda como não provado o facto alegado pelo recorrente na impugnação judicial da decisão da CMVM, no sentido de que ‘A aprovação do Prospeto pela CMVM materializou-se num ato administrativo com efeito legalizador do seu conteúdo (e omissões).’ (facto não provado III), p. 364 da sentença recorrida, infra reproduzido):
III) A aprovação do Prospeto pela CMVM materializou-se num ato administrativo com efeito legalizador do seu conteúdo (e omissões).

Tendo a sentença recorrida concluido expressamente pela inadmissibilidade da conclusão de direito que o recorrente BB pretendia retirar do facto 75 dado como provado (p. 530, ênfase aditado):

‘Improcede, assim, a alegação dos Recorrentes quanto à propalada «aprovação» pela CMVM do prospeto, com a significância, alegada pelos Recorrentes e manifestamente não demonstrada, de que a Recorrida tivera conhecimento da informação omitida, com isso se conformando.’

Termos em que inexistindo qualquer erro notório na apreciação da prova, nada há a censurar à douta Sentença recorrida.

Do texto da decisão impugnada, designadamente dos extratos acabados de citar, não resulta, assim, qualquer erro, muito menos notório, na apreciação da prova, susceptível de consubstanciar o correspondente vício invocado pelo recorrente AA, nos termos do artigo 410º, nº 2, alínea c) do CPP, o que se consigna.

II.6.3.3 – Recorrente DD

Alega o recorrente DD que a sentença recorrida errou notoriamente na apreciação da prova (artigo 410.º, n.º 2, alínea c), do CPP):
(i) ao dar como provados os factos provados 133, 134, 135, 360, 361 e 362, quanto ao segmento ‘no final do ano de 2013’ (conclusões 37, 38 e 39, infra reproduzidas);
(ii) ao dar como não provados os factos WWW) e XXX), que deveriam ser dados como provados em razão da ‘prova documental junta aos autos, em particular das atas do Conselho de Administração do BES de 20 de junho de 2014 e 1 de julho de 2014’ (conclusões 40, 41 e 42 infra reproduzidas, ênfase aditado);
(iii) ao dar como provados o facto provado 132, ‘quando decorreu da prova produzida, em particular das declarações prestadas pelo Dr. PP, que quer a minuta da carta para a Presidência da República Angolana, quer o memorando sobre a situação patrimonial do BESA, não foram redigidos pelo Dr. PP, mas apenas revistos’ (conclusões 43 e 44 infra reproduzida, ênfase aditado).
37. Em primeiro lugar, e salvo melhor opinião, a sentença recorrida incorre no vício de erro notório de apreciação da prova, ao abrigo do disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, aplicável ex vi artigo 41.º do RGCO, ao dar como provados os factos n.os 133, 134, 135, 360, 361 e 362.

38. O pretenso facto base que enforma todos os supostos factos n.os 133, 134, 135, 360, 361 e 362 da sentença recorrida, isto é, que o “BESA, no final do ano de 2013, ser[ia] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação”, não é, desde logo, verdadeiro, na medida em que, precisamente no final de 2013, isto é, em 31 de dezembro de 2013, foi emitida a Garantia Soberana do Estado Angolano a favor do BESA (cfr. fls. 8278 dos autos), pelo que eventuais créditos e ativos imobiliários cujo valor de realização fosse “próximo de zero” ou conjunto de créditos que carecessem de reestruturação estavam a coberto da aludida Garantia Soberana emitida, justamente, no final de 2013.

39. Assim, e salvo melhor opinião, a sentença recorrida incorre em erro notório na apreciação da prova produzida nos presentes autos ao concluir que o BESA, “no final do ano de 2013, [fosse] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação”, razão pela qual os factos n.os 133, 134, 135, 360, 361 e 362 da sentença recorrida devem ser dados como não provados, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP.

40. Em segundo lugar, a sentença recorrida incorre igualmente em erro notório na apreciação da prova quando dá por não provados os factos WWW. e XXX., constantes da página 366:
“WWW. Com interesse para estes autos e para a omissão em causa, entre Maio e Junho de 2014, o Recorrente DD não dispunha de informação concreta e detalhada sobre a situação real da carteira de crédito do BESA, apurada em Outubro de 2013” (cfr. facto não provado WWW. – página 366 da sentença recorrida).
“XXX. Com interesse para estes autos e para a omissão em causa, em 2014, realizavam-se diversas auditoriasàcarteira decréditodoBESAparaapurara realsituação”(cfr.factonãoprovadoXXX. – página 366 da sentença recorrida).

41. Efetivamente, decorre de prova documental junta aos autos, em particular das atas do Conselho de Administração do BES de 20 de junho de 2014 e 1 de julho de 2014, que o peloureiro do BESA, Dr. AA, informou os administradores, incluindo o ora Recorrente, de que decorriam auditorias ao BESA para, “definitivamente, conhecer, circunscrever, quantificar e avaliar, de forma, objetiva e esclarecida, os problemas da carteira de créditos do BESA”, pelo que, à data em que o prospeto foi elaborado e aprovado (maio de 2014), a pretensa informação que o “BESA, no final do ano de 2013, ser[ia] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximode zero, bemcomodeconjuntodecréditos,novalortotal de1.7milmilhõesdedólares que careciam de reestruturação”, não se encontrava confirmada, tanto quanto o Recorrente foi informado (tendo sido informado do decurso dessas auditorias à carteira de créditos do BESA ainda antes da aprovação do prospeto).

42. Assim, é manifesto que a sentença recorrida incorre num erro notório de apreciação da prova ao dar por não demonstrados os factos XXX. e WWW. da sentença recorrida, razão pela qual devem os mesmos ser dados como provados, pois resultam de um erro notório na apreciação da prova, nos termos e paraos efeitosdo disposto na alínea c)do n.º 2do artigo 410.º do CPP.

43. Em terceiro lugar, a sentença recorrida incorre em erro notório na apreciação da prova quando no artigo 132.º da matéria de facto dada como provada sustenta que o Dr. PP teria elaborado os documentos aí elencados, quando decorreu da prova produzida, em particular das declarações prestadas pelo Dr. PP,  que quer a minuta da carta para a Presidência da República Angolana, quer o memorando sobre a situação patrimonial do BESA, não foram redigidos pelo Dr. PP, mas apenas revistos.

44. Assim, é manifesto que a sentença recorrida incorre num erro notório de apreciação da prova ao dar por demonstrado no artigo 132.º da matéria de facto provada da sentença recorrida (cfr. página 234) que teria sido oDr. PP a redigiras “minutas das cartas enviadas a 5 de novembro de 2013 pelo Presidente do Conselho de Administração e pelo Presidente da Comissão Executiva do BESA ao Presidente da República de Angola, bem como do memorando sobre a situação patrimonial do BESA àquela data”, razão pela qual deve o artigo 132.º da matéria de facto provada da sentença recorrida ser alterado no sentido de que o Dr. PP apenas reviu os documentos elencados no artigo 132.º (e não redigiu), nos termos e para os efeitos do disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP.

São os seguintes os factos, provados e não provados, em causa (sublinhado aditado):
132. As minutas das cartas enviadas a 5 de novembro de 2013 pelo Presidente do Conselho de Administração e pelo Presidente da Comissão Executiva do BESA ao Presidente da República de Angola, bem como do memorando sobre a situação patrimonial do BESA àquela data, em anexo às mesmas, foram elaboradas pelo Presidente da Mesa da Assembleia Geral do BESA, que delas deu conhecimento aos arguidos AA e DD.

133. O BES não fez constar do Prospeto informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação. (fls. 24-211; fls. 1521-1582)

134.  A informação constante do Prospeto não é completa, porquanto não contém informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação. (fls. 24-211; fls. 1521-1582)

135.  A informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 669-801, maxime fls. 687 v., 696 v. e 722 v.; fls. 802-943, maxime fls. 810, 827 v. e 856; fls.1521-1582; fls. 4829-4841, maxime fls. 4830 e 4841; fls. 5852-5863 v., maxime fls. 5852 v. e 5863 v.)

360.  O arguido DD tinha conhecimento de que o BES não fez constar do Prospeto informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação.

361.  O arguido DD tinha conhecimento de que do Prospeto consta informação que não é completa, porquanto não contém informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação.

362.  O arguido DD tinha conhecimento de que a informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 1521-1582; fls. 1583-1636, maxime fls. 1594 v.; cd de fls. 2245, pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140620”, ficheiro “2. Resultados do aumento de capital do BES”, p. 17; fls. 4829-4841, maxime fls. 4830 e 4841; fls. 5852-5863 v., maxime fls. 5852 v. e 5863 v.; fls. 5864-5882 v., maxime fls. 5872 v.; cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014” e pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v.).
[…]
WWW.  Com interesse para estes autos e para a omissão em causa, entre Maio e Junho de 2014, o Recorrente DD não dispunha de informação concreta e detalhada sobre a situação real da carteira de crédito do BESA, apurada em Outubro de 2013.
XXX. Com interesse para estes autos e para a omissão em causa, em 2014, realizavam-se diversas auditorias à carteira de crédito do BESA para apurar a real situação.

Vejamos.
Desde já, anota-se que a alegada incongruência entre a situação precária de créditos e activos imobiliários do BESA no valor de vários milhares de milhões de dólares ‘no final do ano de 2013’ constante dos factos provados 133, 134, 135, 360, 361 e 362, não é incompatível com o facto de, em 31.12.2013 ter sido ‘emitida a Garantia Soberana do Estado Angolano a favor do BESA’.

Como se constata na decisão recorrida (p. 739), foi justamente o apuramento da situação financeira e patrimonial do BESA, em outubro de 2013 (temporalmente compatível com ‘[n]o final do ano de 2013’), que originou a emissão da referida garantia soberana em 31.12.2013, informação que não constava do prospeto, concretamente do fator de risco 2.1.23, como resulta do facto provado 115, como refere a sentença recorrida (p. 739, ênfase aditado):

‘A incompletude da informação vertida no prospeto respeita, repete-se, ao facto de nele ter sido omitida a deteção, em Outubro de 2013, de graves problemas na carteira de crédito e portefólio de ativos imobiliários do BESA, enquadramento que, precisamente, fundou a necessidade de ser obtida uma garantia soberana, no valor de 5,7 mil milhões de dólares.

Reitera-se que, não existe no texto do fator de risco qualquer menção à existência de problemas na carteira de crédito do BESA, nem que o apuramento de problemas nessa mesma carteira de crédito fossem a razão de ser da emissão da garantia.’

Como se referiu supra, a nulidade por erro notório na apreciação da prova tem de resultar evidente do próprio texto da sentença recorrida, sendo vedada a referência elementos de prova concretos, nomeadamente a documentos juntos aos autos ou prova testemunhal produzida, pelo que exorbita do âmbito do mencionado vício a alegada desconsideração de ‘prova documental junta aos autos, em particular das atas do Conselho de Administração do BES de 20 de junho de 2014 e 1 de julho de 2014’, ou das declarações prestadas pelo Dr. PP’ quanto à revisão (e não elaboração) ‘quer [d]a minuta da carta para a Presidência da República Angolana, quer [d]o memorando sobre a situação patrimonial do BESA’.

Sem prejuízo, sempre se dirá o seguinte:

A sentença recorrida deu como não provado (factos WWW) e XXX), ênfase aditado) que:
- ‘entre Maio e Junho de 2014, o Recorrente DD não dispunha de informação concreta e detalhada sobre a situação real da carteira de crédito do BESA, apurada em Outubro de 2013’” e
- ‘em 2014, realizavam-se diversas auditorias à carteira de crédito do BESA para apurar a real situação’.

Relativamente às alegadas auditorias em curso, a sentença recorrida fundamentou ter julgado não provado que as mesmas estivessem a decorrer auditorias ao BESA nos seguintes termos (p. 620, ênfase aditado):
‘Ora, desde logo, a alegação de que havia auditorias em curso carece de respaldo, não tendo sido junto qualquer prova documental que o ateste, desde logo porque não se alcança verdadeiramente em que sentido a palavra «auditoria» é aqui utilizada.

Na verdade, em juízo, precisamente porque tal alegação não vinha suportada em qualquer elemento probatório que a refletisse e porque se afigurava pertinente delimitar e precisar o sentido e alcance da expressão («auditorias») empregue, o Tribunal instou o Recorrente, no decurso das suas declarações na audiência de julgamento, a esclarecer que i) auditorias eram essas, ii) por quem estavam a ser levadas a cabo, iii) qual era o seu escopo, iv) o seu âmbito e a sua v) relação com a génese da garantia soberana, aqui em causa.

Perante esta instância do Tribunal, o Recorrente reconheceu que não tinha elementos para dilucidar o Tribunal e que se tratava de uma mera alegação genérica, que lhe fora transmitida por terceiros, mas sem que lhe fosse facultada – e o Recorrente DD tivesse exigido – evidência ou documento corroborativo do seu âmbito, duração e desideratos.’

Quanto à alegada não disposição de informação concreta e detalhada sobre a real situação da carteira de créditos do BESA (apurada em Outubro de 2013) por parte do recorrente DD, refere-se a sentença que (ênfase aditado):
(i) ‘[…] os movimentos de transferência de fundos do BESA para terceiros, os seus exatos montantes, a sua forma de transferência, o recetor dos mesmos, a mobilização de fundos em dinheiro vivo e o seu ulterior depósito em contas bancárias concretas encontrava-se detalhada e documentadamente apurado, de modo definitivo, em Outubro de 2013, como resulta, de modo límpido, do sentido normal das palavras vertidas nas Actas.’ (p. 518);

(ii) ‘A documentação junta, designadamente a subscrita pelos colaboradores do próprio BES (memorando de 5.11.2013, de PP, de que foi destinatário) e BESA (atas das Assembleias Gerais) aventa, de modo assertivo e definitivo, que a situação detetada pela nova gestão do BESA (cuja CE era presidida por LLL), em Outubro de 2013, decorria de uma fraude, revelada por um trabalho de apuramento, minucioso e detalhado, empreendido junto dos ativos da carteira de crédito e de ativos imobiliários do BESA.
Em concreto, o nível de informação obtido fora tal que a nova direção do BESA logrou mesmo segmentar e expor aos acionistas (incluindo o BES, casa-mãe), para melhor compreensão e cabal compreensão da envergadura da depauperada situação patrimonial do BESA, os seguintes segmentos: BLOCO A de clientes e Bloco B de clientes, foram detalhados e objetivados, identificando quem autorizou os financiamentos, a forma como os fundos foram movimentados, o seu montante, o tipo de garantias associadas, a existência, ou não, de racional económico, quem eram os destinatários dos fundos e quem tinha sido, ou não, identificado como beneficiário efetivo dos mesmos (fls. 1526 e 1534 dos autos).’ (p. 623),

(iii) ‘Estas razões de ser, pese embora a invulgaridade subjacente – uma garantia soberana e no valor de 5,7 mil milhões de dólares – não foram levadas ao Prospeto, embora o Recorrente DD soubesse exatamente o que justificara a emissão da sobredita garantia e é essa a imputação fáctico-normativa que sobre si impede.’ (p. 627);

(iv) ‘Ora, como o Recorrente bem sabe, porque uma vez mais isso consta de documentos subscritos por PP (de que foi destinatário) foi, precisamente, a comprovação e objetivação desses dados que conduziu à emissão da garantia soberana (p. 628);

(v) ‘tal exercício [AQR ao BESA] em nada se interliga ou repercute no quadro apurado pela nova gestão do BESA logo em Outubro de 2013 e que fundou a emissão da garantia, o qual se encontrava, devidamente estabilizado, razão porque a garantia foi emitida.’ (p. 630);

(vi) ‘O Recorrente não tinha, pois, qualquer empreitada ou exercício em curso destinados a aferir a concretude e completude da situação financeira e patrimonial do BESA detetada em Outubro de 2013, que se encontrava já devidamente estabilizada e documentada, tendo o próprio BESA (na pessoa de LLL e demais acionistas destinatários das Atas da AG de 3 e 21.10.2013) e o BES (nas pessoas dos Recorrentes CC, AA e DD) dispensado a necessidade de ulteriores procedimentos de detalhe ou comprovação, antes avançando para a obtenção da garantia soberana, em 31.12.2013.’ (p. 631).

Da conjugação deste conjunto de factos e considerações, não se vislumbra qualquer erro notório na apreciação da prova em dar-se como não provado que o recorrente não dispunha de informação concreta e detalhada sobre a situação precária dos créditos e activos imobiliários do BESA, em Outubro de 2013, ou que diversas auditorias tivessem sido realizadas em 2014 à carteira do BESA para apurar a real situação.

De resto, a aceitar-se a existência de auditorias em curso para apurar a real situação económico-financeira do BESA – o que, como se referiu supra, não resultou demonstrado – as mesmas, sendo posteriores à emissão da garantia (ocorrida em 31.12.2013), não podiam logicamente estar na base da sua emissão.

Como refere a sentença recorrida (p. 632, ênfase aditado):
‘essas condutas, paralelas e exógenas, são deveras posteriores e fáctico-normativamente irrelevantes face à imputação assacada aos Recorrentes: a omissão no prospeto das razões que fundaram a emissão da garantia soberana, em 31 de Dezembro de 2013, no valor de 5,7 mil milhões de dólares, fundada na grave situação financeira e patrimonial detetada em Outubro de 2013.

Relativamente ao facto provado 132, onde se refere ‘elaboração’ pelo Presidente da Mesa da Assembleia Geral do BESA das ‘minutas das cartas enviadas a 5 de novembro de 2013 pelo Presidente do Conselho de Administração e pelo Presidente da Comissão Executiva do BESA ao Presidente da República de Angola, bem como do memorando sobre a situação patrimonial do BESA àquela data, em anexo às mesmas’, insurgindo-se o Recorrente DD contra a referida expressão, uma vez que o mesmo se teria limitado a rever os referidos documentos.

Ora, é irrelevante para a imputação da contraordenação pela qual o recorrente DD veio condenado, o grau de participação da testemunha PP na elaboração dos referidos documentos.

O que conta é que o recorrente DD teve conhecimento do teor das atas das reuniões da Assembleia Geral do BESA realizadas em 3 e 21 de outubro de 2013, bem como dos referidos documentos, conforme resulta dos factos provados 130, 131 e 132.

Inexiste, assim, qualquer erro notório na apreciação da prova, devendo a alegação apresentada pelo Recorrente DD improceder in totum.

Do texto da decisão impugnada, designadamente dos extratos acabados de citar, não resulta, assim, qualquer erro, muito menos notório, na apreciação da prova, susceptível de consubstanciar o correspondente vício invocado pelo recorrente AA, nos termos do artigo 410º, nº 2, alínea c) do CPP, o que se consigna.

Improcede, assim, o vício de erro notório na apreciação da prova invocado pelos recorrentes AA, BB e DD, nos termos do artigo 410º, nº 2, alínea c) do CPP, e com ele o presente segmento recursivo.

II.7 – Da exclusão da culpa por aplicação do princípio da confiança

Vem o recorrente DD alegar (conclusões 112 a 114), que ‘sempre confiou – e tinha razões objetivas para o fazer – na competência e profissionalismo de todos os intervenientes na operação de aumento de capital em causa nos presentes autos contraordenacionais, sendo que, numa instituição de crédito com a dimensão e o volume de atividade que evidenciava o BES, não havia qualquer outra hipótese lícita e justificada senão confiar nos quadros técnicos competentes que o BES, efetivamente, possuía e que se encontram responsáveis pela condução do aumento de capital, assim como nos reputados e reconhecidos assessores externos especializados que prestaram assessoria nesta matéria’, o que excluiria a sua culpa na infracção por que vem condenado.

Segundo Jorge de Figueiredo Dias, o princípio da confiança, que “encontra o seu fundamento material no princípio da autorresponsabilidade de terceiros[52], ‘quem se comporta no tráfico de acordo com a norma de cuidado deve poder confiar que o mesmo sucederá com os outros; salvo se tiver razão concretamente fundada para pensar ou dever pensar doutro modo’[53].

Este princípio, como bem sublinhou a sentença recorrida em termos que subscrevemos (pp. 709-715, infra parcialmente reproduzida, ênfase aditado) tem aplicação no âmbito do tipo de ilícito negligente: com efeito, nomeadamente em situações de divisão de tarefas no seio de uma equipa, o princípio da confiança permite afirmar a não responsabilidade do agente que atua de forma negligente, quando este pudesse legitimamente confiar que outros cumpririam os respetivos deveres de cuidado.
‘o princípio da confiança detém, em abstrato, aptidão para arredar a conduta negligente daquele que, cumprindo os deveres de cuidado a que está adstrito, espera legitimamente que os demais também os cumpram. Trata-se por isso da regulação da expetativa que se pode ter sobre os outros. Sucede que, tal princípio não tem aplicação quando o dever é, por força de lei, próprio e específico, como sucede no caso.

Por outras palavras, os Administradores é que são os responsáveis, por força da Lei, pela informação vertida no prospeto e não os seus inferiores hierárquicos, atuando em concretização da deliberação aprovado pela Administração, e menos ainda os Advogados externos ao Banco, atuando apenas e só com base na informação remetida pelo BES e seus administradores e sem que estejam legalmente incumbindo de fornecer, sobre o Prospeto, uma legal opinion. No caso, não está em causa uma atuação de subordinados hierárquicos, em inobservância ou contra instruções emanadas por superiores hierárquicos (cfr. fundamentação da matéria de facto).

Além disso, o princípio da confiança não exime quem atue ilicitamente por facto próprio, nem o agente que, como sucede, no caso, atue com dolo (representação e atuação com intenção de postergar a norma que impõe a obrigação de aportar no Prospeto informação com qualidade).

(...) Não estando aqui em causa uma atuação negligente – que não só não se provou como é incompatível com o quadro de atuação dolosa demonstrado – e tendo-se apurado que os Recorrentes contribuíram causalmente para a postergação do dever, próprio e específico, que sobre si impendia, é normativamente irrelevante a expectativa que pudessem fomentar quanto à atuação de terceiros.
Carece, pois, de fundamentação, de facto e de direito, a invocação do princípio da confiança.

Tratando-se, in casu, de actuação dolosa de administradores, sobre quem especificamente impendia o dever de actuar em conformidade com a norma contraordenacional em causa, é manifesta a improcedência da questão suscitada pelo recorrente DD.

Com efeito, a confiança de que outros cumpram os seus deveres não impede, nem o cuidado devido nas circunstâncias concretas em que se atua se existirem razões para tal, nem o cumprimento dos deveres de cuidado a que pessoalmente se está obrigado pela natureza dos cargos, pelas matérias em que se intervém e a necessidade de cumprir a lei vigente.

Repare-se que os membros do órgão de administração são sujeitos de um dever de garante[54], encontrando-se juridicamente obrigados a assegurar o cumprimento, pelo emitente dos deveres previstos no CdVM; ora, tal dever de garante é manifestamente incompatível com a argumentação do recorrente DD.

Improcede, pois, este segmento recursivo.

II.8 – Da violação do princípio da acusação e vinculação temática

Alega ainda o recorrente DD (conclusões 61 a 66, supra reproduzidas) que a Sentença recorrida violou o ‘princípio da acusação e vinculação temática’, que diz consagrado no artigo 62.º, n.º 1 do RGCO, pois  ‘distanciou-se, ilegalmente, do caráter específico e concreto da acusação – a que o Tribunal de 1.ª Instância se encontra, evidentemente, vinculado – alargando, de forma totalmente ilegal, a imputação ao Recorrente vertida na acusação para aquilo que apelida a «razão de ser» da emissão, pelo Estado Angolano, da garantia soberana,  a favor do BESA (ver, por exemplo, páginas 377, 605, 616, 617, 618 e 799 da sentença recorrida’ (ênfase aditado).
61.    A sentença recorrida faz, salvo o devido respeito, tábua rasa dos mais elementares princípios que enformam o direito contraordenacional, em particular o princípio da acusação e da vinculação temática, aplicável ao processo contraordenacional com a conversão da decisão condenatória da autoridade administrativa em acusação, incorrendo em Erro de Direito por errada interpretação e aplicação do disposto no n.º 1 do artigo 62.º do RGCO.

62. No caso concreto, a acusação, que delimita e fixa, perante o tribunal, o objeto do processo, imputa ao Recorrente a omissão da seguinte pretensa informação do prospeto em causa nos autos: “[o] BESA, no final do ano de 2013, ser[ia] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil
milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação”.

63. Todavia, a sentença recorrida distanciou-se, ilegalmente, do caráter específico e concreto da acusação – a que o Tribunal de 1.ª Instância se encontra, evidentemente, vinculado – alargando, de forma totalmente ilegal, a imputação ao Recorrente vertida na acusação para aquilo que apelida a “razão de ser” da emissão, pelo Estado Angolano, da garantia soberana, a favor do BESA (ver, por exemplo, páginas 377, 605, 616, 617, 618 e 799 da sentença recorrida).

64. Assim, a sentença recorrida incorre em erro de Direito pois a concreta imputação que é efetuada ao Recorrente na acusação – única que releva – jamais poderia proceder, na medida em que a informação segundo a qual o “BESA, no final do ano de 2013, ser[ia] titular de créditos e ativos
imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação” (e que segundo a CMVM deveria constar do prospeto) não era, à data de maio de 2014, atual, verdadeira, objetiva e lícita, pelo que não podia ter sido incluída no prospeto.

65. Em primeiro lugar, porqueobjetivamente, no final de 2013, isto é, em 31 dedezembro de 2013, foi emitida a Garantia Soberana pelo Estado Angolano a favor do BESA, pelo que, à data de maio de 2014, não seria atual, verdadeiro, objetivo e lícito incluir informação no prospeto segundo a qual [o] BESA, no final do ano de 2013, ser[ia] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total
de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação”.

66. Em segundo lugar, porque o Recorrente foi informado – pelo administrador com o pelouro do BESA no BES – que corriam auditorias ao BESA para conhecer, circunscrever, quantificar e avaliar, de formaobjetivaeesclarecida,os problemas da carteira de crédito do BESA, mas que com a Garantia Soberana emitida pelo Estado Angolano o BESA estava imunizado dos impactos financeiros que pudessem decorrer de eventuais incumprimentos (cfr. Pasta 5 – Fls. 2245 – CA – CA 2006_0107 2014 – ata do Conselho de Administração do BES de 20 de junho de 2014).

Considera o recorrente que o objeto do processo é delimitado pela acusação, sendo que esta ‘imputa ao Recorrente a omissão da seguinte pretensa informação do prospeto em causa nos autos: «[o] BESA, no final do ano de 2013, ser[ia] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor de 3,9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação».  

Vejamos.
A decisão da CMVM condenou o recorrente nos seguintes termos (sublinhado aditado):
a) Quanto à violação do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto
1. uma coima de € 400.000,00 (quatrocentos mil euros), pela violação, a título doloso, do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM (quanto à situação financeira e patrimonial do BESA detetada em finais de 2013 que esteve origem na emissão pela República de Angola, em 31.12.2013, da garantia soberana a favor do BESA), o que constitui, nos termos do artigo 393.º, n.º 2, alínea d), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, punível com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM”. (sublinhado nosso)

Do elenco de factos provados constantes da decisão da CMVM constavam os seguintes, em sustento da referida imputação:
‘115. A secção 2.1.23 (“Garantia autónoma prestada pelo Estado Angolano a favor do BESA, relativa a operações realizadas com empresas angolanas”) tem a seguinte redação:
Tendo como fundamento a relevância do BES Angola no financiamento das empresas Angolanas inseridas no setor privado não petrolífero, em particular em áreas consideradas estratégicas para o desenvolvimento económico de Angola e, o seu envolvimento preponderante em operações creditícias de significativa importância para a implementação dos objetivos constantes do Plano Nacional de Desenvolvimento de Médio Prazo para os anos 2013-2017, o Estado Angolano concedeu ao BESA, em 31 de dezembro de 2013, uma garantia soberana, autónoma e exigível à primeira solicitação do beneficiário, no montante global de até USD5.700 milhões (equivalente a €4.200 milhões em 31 de dezembro de 2013).
Reconhecendo que no contexto global de recuperação económica do setor empresarial Angolano as empresas e os investidores podem não apresentar as condições de tesouraria necessárias para fazer face ao cumprimento atempado das respetivas responsabilidades, o Estado Angolano estabeleceu esta garantia como forma de proteger o banco de eventuais atrasos e incumprimentos na liquidação dos ativos, cobrindo crédito e juros, que beneficiam da garantia (créditos e valores de venda de imóveis).
A garantia pessoal do Estado Angolano tem a validade de dezoito meses a contar da data da sua assinatura, tendo ainda ficado estabelecido entre o Estado Angolano e o BESA que poderá vir a ser acordado, durante o prazo de vigência da garantia, a sua substituição por outra garantia, bem como por um acordo negocial global, desde que se encontre cumprida a mesma finalidade da garantia pessoal prestada. À data do presente Prospeto, esta garantia não foi ainda acionada.
Apesar de a garantia ter sido considerada para o cálculo das imparidades do crédito a 31 de dezembro de 2013, a mesma não foi refletida nos rácios de capital do Grupo BES por ainda se encontrar em fase de apreciação pelo Banco de Portugal. Caso a garantia pessoal do Estado não seja renovada, e se venham a verificar incumprimentos nos créditos ou desvalorizações nos imóveis garantidos, a atividade, situação financeira e resultados do BESA poderão sofrer um efeito negativo, e por essa via causar um efeito negativo na situação financeira e nos resultados do Grupo BES.
Adicionalmente, esta garantia não cobre a totalidade da carteira de crédito do BESA, pelo que a parcela da carteira de crédito do BESA não coberta por esta garantia está naturalmente sujeita aos riscos acima descritos, os quais se traduziram no primeiro trimestre de 2014, no reconhecimento de €70 milhões de perdas por imparidade do crédito.”.

129. O BESA apresentava, em outubro de 2013, para além de uma difícil situação de liquidez, com necessidades de financiamento de cerca de 6.6 mil milhões de dólares, 4.6 mil milhões de dólares financiados através do BES e 2 mil milhões de dólares através de bancos angolanos, uma grave situação patrimonial, resultado da deteção de uma fraude ao nível da sua carteira de crédito e do seu portfólio de ativos imobiliários.

131. No dia 5 de novembro de 2013, foram enviadas pelo Presidente do Conselho de Administração e pelo Presidente da Comissão Executiva do BESA duas cartas, dirigidas ao Presidente da República de Angola, às quais foi anexo um memorando sobre a situação patrimonial do BESA àquela data, no qual pode ler-se: (fls. 1521-1582, maxime fls. 1575-1576, 1577-1578 e 1579-1580 v.)
“A nova equipa de gestão do BESA, eleita em finais de Junho de 2013, tem vindo a realizar um trabalho de diagnóstico da situação patrimonial do Banco.
O trabalho realizado permite concluir que o BESA apresenta, para além de uma difícil situação de liquidez, com necessidades de financiamento de cerca de $ 6.6 mil milhões, $4.6 mil milhões financiados através do BES e $2 mil milhões através dos bancos nacionais, uma grave situação patrimonial, resultado da deteção de uma fraude ao nível da sua carteira de crédito e do seu portfólio de activos imobiliários.
As conclusões deste trabalho foram apresentadas em Assembleia Geral ocorrida no passado dia 3 de Outubro de 2013, com conclusão no dia 21 de Outubro, em que estiveram presentes todos os acionistas. As conclusões do estudo efectuado são resumidas conforme se segue:
1. À data de 31 de Agosto de 2013, o BESA apresentava activos num total de $11.3 mil milhões, dos quais $7.4 mil milhões relativos a crédito concedido (…) e $1.6 mil milhões de activos imobiliários (…), sendo o segundo maior Banco em Angola em dimensão de activos.
2. Do total da carteira de crédito, o BESA apresenta $3.7 mil milhões de financiamentos concedidos, dos quais $1.8 mil milhões se encontram vencidos, cuja probabilidade de recuperação é extremamente reduzida, dado que da análise aos movimentos financeiros conclui-se que a maioria dos créditos não se destinaram a financiar actividades económicas ou a aquisição de activos (…).
3.O estado da carteira de crédito, descrita no ponto anterior, coloca o BESA numa situação de extrema dificuldade, tendo em consideração que o capital do Banco é de apenas $1.6 mil milhões, já considerando a incorporação do aumento de capital de $500 milhões a realizar no decurso do mês de Novembro. (…)
4. A carteira de activos imobiliários apresenta imóveis no valor de $119 milhões para os quais não se encontram registos que permitam identificar a sua existência e localização. (…)
5. Adicionalmente, o BESA apresenta um outro conjunto de créditos que estando em situação de incumprimento se consideram recuperáveis, mas que necessitam de ser reestruturados. Estes créditos totalizam $1.7 mil milhões e estima-se que o processo de reestruturação demore largos meses por estarem envolvidos várias dezenas de clientes e de operações.
6. Em resumo, o BESA apresenta créditos e activos imobiliários num total de $3.9 mil milhões cujo valor de realização é próximo de zero e um segundo conjunto de créditos no valor de $1.7 mil milhões que necessitam de reestruturação. (…)
Conclui-se que a situação encontrada tudo aponta para um caso de fraude e não apenas de negligência ou de má gestão, uma vez que o sistema de controlo interno e de aprovação de crédito foi eliminado para que estas funções não pudessem identificar as práticas abusivas aqui relatadas. (…)
Com o objetivo de evitar os impactos desta situação para o sistema financeiro Angolano, nomeadamente para o seu regulador, o Banco Nacional de Angola, os acionistas principais do BESA, bem como o seu Conselho de Administração e a respectiva Comissão Executiva, propõem a adopção de esquema de protecção de activos, associado a um plano de recuperação de créditos, que permita garantir a continuidade da actividade do BESA. (…)
Adoptando esta solução para o caso do BESA, a mesma prevê a emissão de duas garantias por parte de uma entidade do Estado Angolano. Uma no montante de cerca de $3.9 mil milhões para fazer face a eventuais perdas que se venham a verificar na carteira de crédito e no portfólio imobiliário em risco, referidos nos pontos 2 e 4. Uma segunda de $1.7 mil milhões, de cariz mais técnico, que possibilite ao BESA tempo para reestruturar o portfólio referido no ponto 5, não envolvendo esta qualquer responsabilidade efectiva por parte do Estado Angolano.” (sublinhados nossos).

133. O BES não fez constar do Prospeto informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação.

134. A informação constante do Prospeto não é completa, porquanto não contém informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação.

135. A informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma.

359. O arguido DD teve conhecimento do conteúdo das cartas enviadas, no dia 5 de novembro de 2013, pelo Presidente do Conselho de Administração e pelo Presidente da Comissão Executiva do BESA, ao Presidente da República de Angola, bem como do memorando sobre a situação patrimonial do BESA àquela data que foi enviado em anexo às cartas, através das minutas dos referidos documentos, que lhe foram enviados pelo Presidente da Mesa da Assembleia-Geral do BESA, em 3 de novembro de 2013.

360. O arguido DD tinha conhecimento de que o BES não fez constar do Prospeto informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação.
 
361. O arguido DD tinha conhecimento de que do Prospeto consta informação que não é completa, porquanto não contém informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação.

362. O arguido DD tinha conhecimento de que a informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma.

Os mesmos factos constam do elenco dos factos provados da sentença recorrida (factos provados 115, 129, 131, 133-135 e 359-362), que decidiu condenar o recorrente DD nos seguintes termos (dispositivo, p. 858, ênfase aditado):

‘CONDENAR o Recorrente DD, na coima de € 400.000,00 (quatrocentos mil euros), pela violação, a título doloso, do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM (quanto à situação financeira e patrimonial do BESA detetada em finais de 2013 que esteve origem na emissão pela República de Angola, em 31.12.2013, da garantia soberana a favor do BESA), consubstanciando, nos termos do artigo 393.º, n.º 2, alínea d), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, punível, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM.

Resulta evidente do mero confronto do segmento decisório da decisão da CMVM e da sentença recorrida que a imputação feita ao recorrente é exatamente a mesma, não se tendo, por conseguinte, ‘afastado’ da acusação ou ‘desrespeitado a vinculação temática’ dos presentes autos.

A imputação da infração no ponto 133 dos factos provados (da sentença e da decisão da CMVM) é apenas um dos factos que sustenta a imputação, extendendo-se a contraordenação imputada ao arguido (na decisão da CMVM como na sentença), igualmente, à violação dolosa do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM, por não constar do prospeto informação completa quanto à situação financeira e patrimonial do BESA detetada em finais de 2013 que esteve origem na emissão pela da garantia soberana a favor do BESA, em 31.12.2013.

Ao identificar como uma das temáticas [a propósito da qual é apreciada a ‘falta de informação […] necessária para a formulação de juízos fundados por parte dos subscritores da Oferta’ objecto dos presentes autos] a ‘difícil situação de liquidez divisada no BESA em Outubro de 2013 e a sua grave situação patrimonial, resultado de uma fraude ao nível da carteira de crédito e do portfólio de ativos imobiliários, que conduziu à emissão de uma garantia soberana, pelo Estado Angolano no valor de 5,7 mil milhões de dólares americanos, com o prazo de 18 meses’ (p. 377), ou se referir à ‘informação sobre a razão de ser da emissão, pelo Estado Angolano, da garantia soberana a favor do BESA (ou seja, a situação financeira e patrimonial do BESA, detetada em finais de 2013)’ (p. 605), às ‘razões de ser que levaram à emissão da garantia soberana’ (pp. 616, 617 e 618 e 799), a sentença recorrida em nada alarga ou se afasta da imputação constante da decisão da CMVM, cujo objecto fielmente replica.

Não se verifica, assim, a violação do princípio da acusação e vinculação temática invocada pelo recorrente DD, improcedendo o correspondente segmento recursivo.

II.9 – Do erro na interpretação dos artigos 135º e 142º do CdVM

Alega o recorrente BB (conclusões XLVI a LIV, infra reproduzidas, ênfase aditado) que o Tribunal a quo incorreu em erro de direito na interpretação do disposto nos artigos 135.º e 142º do CdVM, uma vez que o ‘sentido normativo’ a atribuir ao critério de relevância constante destas normas deverá ser o de ‘price sensitivity’, no sentido de que só é relevante, para a tomada de decisão pelos destinatários da Oferta, informação que possa influenciar de maneira sensível o preço de determinado valor mobiliário.
XLVI. O critério (jurídico) de relevância da informação subjacente à aplicação dos artigos 135.º e 142.º do CVM é um critério indeterminado, tendo de ser densificado através de lugares paralelos.
XLVII. O conceito convocado pelo Tribunal a quo – que convoca uma Diretiva que estabelece um critério ainda mais geral de seleção do que o estabelecido nos artigos 135.º e 142.º do CVM – carece de corporização.
XLVIII. O critério que deve nortear a seleção da informação a incluir num prospeto, nos termos e para os efeitos dos artigos 135.º e 142.º do CVM, é o conceito de price sensitivity, uma vez que todas as alterações significativas da situação financeira do emitente normativamente relevantes são suscetíveis de afetar o valor das ações objeto da oferta.
XLIX. O critério de price sensitivity não está longe da Diretiva, sendo, antes, a forma de concretização da Diretiva. Por outras palavras, a Diretiva, quando se refere a “alterações significativas”, reporta-se a alterações da situação financeira do emitente que sejam suscetíveis de alterar o preço dos valores mobiliários objeto de uma oferta – parâmetro que serve para avaliar o que é relevante para o investidor e, consequentemente, tomar a decisão sobre o que deve, ou não, constar de um prospeto.
L. Informação relevante para o investidor é a informação que possa influenciar, de maneira sensível, o preço de um determinado valor mobiliário, tendo a relevância da informação de ser aferida de acordo com um critério de price sensitivity (cfr. esclarecimentos constantes do site da CMVM sobre o conceito de price sensitive information, disponíveis em https://www.cmvm.pt/pt/Legislacao/Legislacaonacional/Recomendacoes/Anexos/Pages/Abuso-de-Informa%C3%A7%C3%A3o-Privilegiada.aspx).
LI. A verdade é que, por todas as razões supra expostas, a informação sobre a variação da exposição à ESFG entre 1 de janeiro e 20 de maio de 2014 e entre 20 de maio e 30 de maio de 2014 não era relevante para que os investidores pudessem formar um juízo fundado sobre a Oferta, uma vez que, não representando uma alteração significativa da situação financeira do emitente (que tinha capitais próprios muito elevados), em virtude da “perda esperada” praticamente nula (considerando que se estava perante um dos melhores ratings da carteira de crédito do BES, bem como a alargada colateralização), não era suscetível de afetar o preço das ações objeto da Oferta.
LII. As exigências dos artigos 135.º e 142.º do CVM, em particular no que respeita à atualidade da informação, não podem ser aplicadas tout court, tendo de ser analisadas em função do setor concreto de atividade de uma determinada entidade.
LIII. No contexto da atividade bancária, apenas se pode considerar relevante – por representar uma alteração significativa da posição financeira do emitente – uma variação da exposição a partes relacionadas que seja price sensitive, isto é, que seja suscetível de influenciar o valor das ações objeto da Oferta, devendo ser este o sentido normativo a atribuir aos artigos 135.º e 142.º do CVM.
LIV. Qualquer outra solução corresponderá a uma má aplicação do direito, traindo-se a teleologia do disposto nos artigos 135.º e 142.º do CVM, ou seja, violando estas normas.

Vejamos, não sem antes recordar, a título liminar, que a aferição da necessidade ou relevância da informação sobre o montante total dos financiamentos e aumento da exposição do BES à ESFG constitui matéria de facto incluída na sentença recorrida (factos 113 e 141, infra reproduzidos), nessa medida exorbitando do âmbito do presente recurso, nos termos do artigo 75º, nº 1, do RGCO:
113. A informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211 maxime fls. 29, 34, 174, 174 v.,175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; fls. 1644-1785; fls. 4873-4896 e fls. 7297-7343)

141. A informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v.; fls. 3232-3236 v.)

O conceito de ‘informação (...) que permita aos destinatários formar juízos fundados sobre a oferta’ constitui um elemento normativo[55] dos tipos infracionais previsto no artigo 135.º, n.º 1 (conjugado com o artigo 393.º, n.º 2, alínea d)) e no artigo 142.º, n.º 1, (conjugado com o artigo 393.º, n.º 2, alínea c), todos do CdVM que, enquanto tal, faz apelo a um juízo valorativo global, determinável pelos destinatários da norma (oferente, emitente, imtermediário financeiro…), à luz da função desempenhada pelo prospeto enquanto documento informativo: reduzir as assimetrias de informação entre o oferente e os destinatários da oferta, impondo que o oferente faculte aos destinatários da oferta, através do prospeto (e, eventualmente, de adendas a este), toda a informação ‘que permita a estes últimos formar juízos fundados sobre a oferta’.

Com efeito, o prospeto ‘é o documento sujeito a fiscalização administrativa que, em termos padronizados, concentra a informação relevante sobre o emitente, os valores mobiliários por este emitidos e o processo da oferta ou a admissão em mercado regulamentado’[56], assumindo-se assim como ‘a peça obrigatória a congregar a dose de informação relevante relativa ao emitente e à oferta[57].

Ora, atenta a função desempenhada pelo prospeto da oferta – eliminar assimetrias de informação, concentrando numa mesma ‘peça obrigatória’ toda a informação relevante sobre o emitente e a oferta –, os agentes de mercado, nomeadamente o Oferente, sabem que devem fazer constar do prospeto ‘informação completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita, que permita aos destinatários formar juízos fundados sobre a oferta’ (artigo 135.º, n.º 1, do CdVM).

Como também sabem que, em caso de factos novos  ou anteriores não considerados no prospeto de que venham a tomar conhecimento ‘que sejam relevantes para a decisão dos destinatários’ (artigo 142.º, n.º 1, do CdVM) devem requerer imediatamente à CMVM a aprovação de adenda ao prospeto.

O conceito de ‘informação (...) que permita aos destinatários formar juízos fundados sobre a oferta’  tem de ser apreciado face às circunstâncias do caso concreto, nomeadamente à luz da função desempenhada pelo prospeto no contexto de uma oferta pública, no intuito de assegurar que aos destinatários da oferta é prestada, num mesmo documento, toda a informação (e não apenas a que seja ‘price sensitive’) que permita a estes formar um juízo global fundado acerca da oferta (e não apenas do respectivo preço).
Uma vez que constava do prospeto informação sobre a exposição do BES à ESFG e subsidiárias (enquanto parte relacionada) com referência a 31.12.2013 (factos provados 109 e 177), o emitente tinha o dever de divulgar no prospeto (ou adenda ao mesmo, relativamente a factos posteriores ou de conhecimento superveniente à divulgação do prospeto) alterações significativas quanto a essa matéria, face à informação que resultava das últimas contas auditadas, o que de qualquer modo era imposto pelo n.º 20.9 do Anexo I do Regulamento (CE) n.º 809/2004, da Comissão, de 29 de abril então em vigor sob a epígrafe ‘Alteração significativa na situação financeira ou comercial do emitente’, ao exigir que fossem descritas ‘todas as alterações significativas na posição financeira ou comercial do grupo registadas desde o final do último período financeiro em relação ao qual tenham sido publicadas informações financeiras auditadas ou informações financeiras intercalares, ou uma declaração negativa adequada’.

Neste mesmo sentido se pronuncia a sentença recorrida em sede de fundamentação da matéria de facto provada, ao referir (pp. 425-426, ênfase aditado) que:
‘[…] relativamente ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, constava no prospeto informação com referência a 31.12.2013, mas não à data de aprovação do prospeto.
 
Donde, considerando que, por decisão do próprio BES foi levada ao prospeto informação relativamente ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias com referência a 31.12.2013, não pode senão concluir-se que, tal informação foi valorada, pelos responsáveis pela elaboração do prospeto, como relevante ou necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma. A ser assim, inexiste razão, lógica e fundada, para arredar tal juízo de relevância e necessidade quanto ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias com referência à data da aprovação do prospeto (15 de Maio de 2014).

Ex abundantis, assiste razão à Recorrida quando enfatiza que, as «operações com entidades terceiras especialmente relacionadas, na medida em que envolvem muitas vezes um conjunto alargado e complexo de relações e estruturas e podem não ser realizadas segundo termos e condições de mercado normais, são operações que, pela sua própria natureza, envolvem um risco de inadequado relato financeiro, sendo assim relevante para os investidores conhecer o montante dessas operações».

Para além do BES ser um Banco com experiência e saber adquirido na empreitada de aumento de capital (já tinha realizado vários em momento anterior), não podia, igualmente, deixar de estar bem ciente do risco, pela própria natureza das coisas, subjacente às operações com partes relacionadas, dado que no seio do BES existia uma comissão própria para aferição das mesmas, o que reforça a convicção do Tribunal no sentido de que existia integral aquiescência dos riscos subjacentes e da relevância da prestação de informação transparente e fidedigna relativamente às partes relacionadas.

Mais adiante, a propósito da exigibilidade da informação relativa à exposição do BES à ESFG, vem ainda referido na sentença recorrida o seguinte (pp. 722-723, ênfase aditado):
Reitera-se que, no caso subjudice, apurou-se que, no seu juízo de ponderação e compreensão do sentido e alcance daquela norma – que os Recorrentes conheciam – aportaram ao Prospeto a exposição do BES à ESFG e subsidiárias, com referência a 31.12.2013 (secção 12.2 do prospeto) – o que não fizeram foi vertê-la devidamente atualizada com reporte à data de aprovação do prospeto (20.5.2014).
 
Donde, não se compreende a alegação de que ocorrendo i) um aumento relevante dessa exposição por comparação com o vertido a 31.12.2013; e ii) estando em causa uma parte relacionada não tenham curado de replicar a mesma ponderação e, atuando em consequência e conformidade, aportado a alteração ocorrida ao Prospeto.

Reitera-se que, como os Recorrentes bem sabem, a exposição tinha um risco próprio e por natureza, decorrente da relação de partes relacionadas existente entre o BES e a ESFG e subsidiárias, razão porque interessava aos investidores conhecer o montante de exposição.

Precisamente por força desse risco próprio não está aqui em causa aferir a materialidade da dosimetria da exposição, que não é decisiva (mas, no caso, até é expressiva), nem apreciar e valorar o montante de perda esperada ou a dosimetria de carteira de crédito em causa, conforme propugnado pelos Recorrentes.

O que está em causa é que a informação era relevante e necessária para a formulação de decisões de investimento: um significativo aumento da exposição do BES a um conjunto de entidades com partes relacionadas em virtude do risco que, por força dessa natureza, acarretavam.
 
Os Recorrentes bem sabem que assim é, até porque, bem sabem, as operações com partes relacionadas mobilizavam, no quadro da actividade do Banco, um tratamento também próprio e diferenciado no segmento da fiscalidade (ISA 550), da contabilidade (IAS 24) e da prevenção do branqueamento de capitais (convocando o compliance e a DPC).

Acresce que, como os Recorrentes bem sabem, impende sobre si um especial dever de acompanhar a evolução da actividade, conforme consta da norma supracitada, o que concorre para fundar a conclusão de que esse acompanhamento destina-se, precisamente, a impor a imediata divulgação de desvios que se verifiquem, como aquele que ocorreu no caso dos autos.

Esse dever de divulgação tinha, ainda, particular intensidade no contexto vivido no BES, decorrente das determinações específicas emitidas pelo Banco de Portugal e da política de ring-fencing determinada pelo supervisor que se projetara já na ESFG, sinalizando-se que, contrariando o histórico de diminuição da exposição, verificava-se, então, um aumento significativo dessa mesma exposição.

É este conjunto de características subjacentes à exposição do BES à ESFG e subsidiárias que demandava uma conduta distinta da perpetrada pelos Recorrentes, que podiam e deviam ter observado a norma infracional.’

Não se verifica, assim, o erro na interpretação dos artigos 135º e 142º do CdVM invocado pelo recorrente DD, improcedendo o correspondente segmento recursivo.


II.10 – Da inconstitucionalidade da interpretação dos artigos 135º e 142º do CdVM a realizar pelo Tribunal ad quem

Alega ainda o recorrente BB (conclusão LV, ênfase aditado) que ‘se o Tribunal ad quem viesse a entender que a densificação do disposto nos artigos 135.º e 142.º do CVM constitui impugnação da matéria de facto – e não questão de direito -, estaria a aplicar uma norma segundo a qual «a delimitação normativa de um conceito indeterminado, através do exercício de adequação ao setor concretamente regulado, não constitui questão de direito suscetível de recurso para uma segunda instância judicial em processo de contraordenação»; norma que seria inconstitucional, por violação da certeza jurídica e do Estado de Direito e por inadmissível restrição do direito ao recurso (cfr. artigos 2.º e artigo 32.º, números 1 e 10, da CRP).

Enquanto inconstitucionalidade de uma hipotética interpretação  que este Tribunal venha a fazer dos artigos 135º e 142º do CdVM (‘se o Tribunal ad quem viesse a entender’), mostra-se a correspondente arguição manifestamente extemporânea e estranha ao âmbito do presente recurso, que tem por objecto a sentença recorrida (e respectivos vícios, incluindo por aplicação de normas alegadamente inconstitucionais) e não a decisão que sobre o mesmo venha a recair por parte deste Tribunal da Relação, a sindicar em sede própria e no momento oportuno, o que obsta ao seu conhecimento.

Não obstante, sempre se dirá que o conceito de ‘informação […] que permita aos destinatários formar juízos fundados sobre a oferta’, enquanto elemento normativo dos tipos infracionais previstos no artigo 135.º, n.º 1 (conjugado com o artigo 393.º, n.º 2, alínea d)) e no artigo 142.º, n.º 1 (conjugado com o artigo 393.º, n.º 2, alínea c)), todos do CdVM, constitui necessariamente matéria de facto e, nessa medida, subtraída do conhecimento do Tribunal de segunda instância em processo de contraordenação, nos termos do disposto no artigo 75.º do RGCO.

Pelo que a invocada inconstitucionalidade sempre teria de improceder, o que se consigna.

II.11 – Da inconstitucionalidade dos artigos 393º, nº 2, alíneas c) e d) e 142º, nº 1, do CdVM

Invoca o recorrente CC (conclusões 159 a 183, infra reproduzidas) a inconstitucionalidade das normas previstas no artigo 393.º, nº 2, alíneas c) e d) e 142º, nº 1, do CdVM, por indeterminação dos respetivos tipos contraordenacionais.

Concretamente, a alínea d) do referido normativo padeceria de indeterminação, ao exigir a inclusão de informação ‘completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita’ e ‘permita aos destinatários formar juízos fundados sobre a oferta’, enquanto que, relativamente ao artigo 142º, nº 1, do CdVM, ‘Atenta a inclusão do conceito indeterminado subjectivo “sejam relevantes para a decisão dos destinatários”, não é apreensível para o destinatário se os supra referidos davam origem ao dever de divulgação de uma adenda ao prospecto.’

159. Por imposição do princípio da legalidade, as leis sancionatórias têm que ser redigidas com clareza, rigor e determinabilidade, para que seja apreensível tanto o seu conteúdo, como os seus limites, sob pena de violação do princípio da legalidade, consagrado nos artigos 2.º do RGCO e 1.º, n.º 1,do Código Penal (aplicávelex viartigo 407.º do CVM e artigo 32.º do RGCO).

160. Todo o direito sancionatório está submetido às garantias essenciais do direito penal, isto é, às garantias referentes à segurança, certeza, confiança e previsibilidade, por força do princípio do Estado de Direito consagrado no artigo 2.º da CRP.

161. Uma das vertentes do princípio da legalidade é a tipicidade (que impõe que a lei seja também estrita e certa), reportando-se à adequação da conduta ao tipo.

162. A legalidade dos ilícitos é obtida através da técnica da tipicidade, que consiste na descrição, de forma clara, precisa, rigorosa e determinável, da conduta ou dos factos considerados criminalmente reprováveis, para que seja apreensível tanto o seu conteúdo, como os seus limites.

163. Importa que a descrição da matéria proibida e de todos os demais requisitos de que dependa em concreto uma punição seja levada, pelo menos, a um ponto em que se tornem objectivamente determináveis os comportamentos proibidos e sancionados.

164. Reportando-nos às concretas contra-ordenações em causa – previstas no artigo 393.º, n.º 2 – al. d), e al. c),do CVM – constata-se que as mesmas contêm normas que impõem deveres de actuação positiva, o que, já por si, obrigaria à concreta determinação do que são aqueles deveres (previstos nos artigos 135.º, n.º 1, e 142.º, n.º 1, do CVM).

165. Com efeito, os tipos de ilícito (seja penal, seja contra-ordenacional) que impõem uma conduta positiva – como os que estão aqui em causa – têm, obrigatoriamente, de determinar os concretos pressupostos em que esta conduta deve ter lugar e, ainda, os termos em que pode ser prestada.

166. Porém, no caso concreto, o legislador usou conceitos normativos, genéricos, indeterminados e subjectivos, que obstam à determinabilidade objectiva das condutas proibidas – e, em particular, dos concretos pressupostos da conduta positiva que deve ter lugar – e demais elementos de punibilidade requeridos.

167. EM PRIMEIRO LUGAR, no que diz respeito à alegada contra-ordenação por violação do dever de qualidade da informação, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CVM, pretende-se sancionar a violação do dever de incluir, no prospecto, de informação completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita, que permita aos destinatários formar juízos fundados sobre a oferta, segundo os modelosprevistos no Regulamento (CE) n.º 809/2004, da Comissão,de 29 de Abril (cfr. artigos 393.º, n.º 2 – al. d) e 135.º, n.º 1 do CVM).

168. Aquela norma tem um duplo grau de indeterminação.

169. Isto porque, por um lado, exige-se a inclusão de informação «completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita».

170. E, por outro lado, exige-se a inclusão de tal informação completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita que «permita aos destinatários formar juízos fundados sobre a oferta»
171. Como é que se define o que é informação completa?

172. No contexto de um prospecto com vista à realização de um aumento de capital social de uma sociedade, o que é que constituiu informação completa?

173. E mais: como é que se define qual é a informação que permite aos destinatários formar juízos fundados sobre a oferta e que dá origem ao dever de inclusão no prospecto?

174. Como é evidente, todos estes conceitos se revelam indeterminados e subjectivos, os quais violam o princípio da legalidade.

175. EM SEGUNDO LUGAR, no que diz respeito à contra-ordenação por alegada violação do dever de actualizar o prospecto do aumento de capital do BES de 2014, pretende-se sancionar a violação do dever de requerer a aprovação de adenda de um prospecto quando ocorrer qualquer facto novo ou se tomar conhecimento de qualquer facto anterior não considerado no prospecto, que seja relevante para a decisão dos destinatários (cfr. artigos 393.º, n.º 2 – al. c) e 142.º, n.º 1 do CVM).

176. Importa, assim, aferir, o que são factos novos que sejam relevantes para a decisão dos destinatários e que dão origem ao dever de divulgação de uma adenda ao prospecto.

177. Como é evidente, o conceito de factos novos que sejam relevantes para a decisão dos destinatários, e que dá origem ao dever de divulgação de uma adenda ao prospecto, é igualmente um conceito indeterminado e subjectivo.

178. Estamos, uma vez mais, perante um conceito de tal modo aberto, indeterminado e, manifestamente, subjectivo que não respeita o princípio da legalidade contra-ordenacional.

179. O conceito «relevantes para a decisão dos destinatários» é de tal forma indeterminado, que não é possível apreender os concretos pressupostos em que a conduta deve ter lugar.

180. Em suma, os conceitos normativos utilizados nos artigos 393.º, n.º 2 - al. d) e 135.º, n.º 1 e nos artigos 393.º, n.º 2 - al. c) e 142.º, n.º 1, todos do CVM são de tal modo abertos, indeterminados e subjectivos que, evidentemente, não respeitam o princípio da legalidade contra-ordenacional.

181. A garantia de que as normas sejam objectivamente determináveis é, como já se disse supra, uma exigência legal(prevista nos artigos 2.º do RGCOe 1.º, n.º 1, do Código Penal– aplicável ex vi artigo 407.º do CVM e artigo 32.º do RGCO) e constitucional (artigo 29.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa), a qual não é respeitada nos artigos 393.º, n.º 2 – al. d) e 135.º, n.º 1 e nos artigos 393.º, n.º 2 – al. c) e 142.º, n.º 1, do CVM.

182. Desta forma, não restam dúvidas que tais preceitosestão feridos de inconstitucionalidade, por violação do princípio da legalidade consagrado no artigo 29.º, n.º 1, da CRP, e violação das garantias de segurança, certeza, confiança e previsibilidade, por força do princípio do Estado de Direito consagrado no artigo 2.º da CRP.

183. Em face do exposto, requer-se que seja declarada a inconstitucionalidade das alíneas c) e d) do número 2, do artigo 393.º do CVM, interpretadas e aplicadas nos sentidos normativos acima referidos, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 72.º da LOTC, o que determina a revogação da Sentença Recorrida.

Também o recorrente DD alega (conclusão 60, ênfase aditado) ter a sentença recorrida incorrido em erro de direito, ao fazer o que designa
‘errada interpretação e aplicação dos artigos 1.º, 2.º e 29.º da Constituição da República Portuguesa ao considerar que o tipo previsto na alínea d) do n.º 2 do artigo 393.º do CVM respeitaria o princípio da tipicidade e da legalidade, visto que, salvo melhor opinião, é evidente que o aludido tipo contraordenacional é inconstitucional por violação das garantias referentes à segurança, certeza, confiança e previsibilidade, por força do princípio do Estado de Direito consagrado no artigo 2.º e das garantias previstas no artigo 29.º da Constituição, em particular o n.º 1, por indeterminação do tipo contraordenacional previsto na alínea d) do n.º 2 do artigo 393.º do CVM.’

Esta questão foi já apreciada na sentença recorrida, nos seguintes termos (pp. 145-150, sublinhado aditado):

‘Contrariamente à generalidade dos tipos incriminadores que preveem condutas proibidas e, em imediata conexão com elas, uma pena, a técnica legislativa no direito de mera ordenação social não tem de obedecer a este paradigma rígido da tipicidade – o que constitui uma afirmação da sua autonomia dogmática. 
[…]
Donde, a teleologia do princípio da legalidade em sede contraordenacional não pode ser desenquadrada da natureza específica que subjaz à norma contraordenacional, nem olvidar os particulares interesses que a norma incriminadora tutela.

Ora, a este respeito, o Tribunal Constitucional vem proferindo Jurisprudência, com relevantes subsídios para a compreensão da axiologia e alcance do princípio constitucional da legalidade em sede contraordenacional, respingando-se, pela sua impressividades, os arestos do Tribunal Constitucional, n.ºs 730/95 e 666/94[58]:
“a regra da tipicidade das infrações, corolário do princípio da legalidade, consagrado no n.º 1 do artigo 29.º da Constituição (nullum crimen, nulla poena, sine lege), só vale, qua tale, no domínio do direito penal, pois que, nos demais ramos do direito público sancionatório (maxime, no domínio do direito disciplinar), as exigências da tipicidade fazem-se sentir em menor grau: as infrações não têm, aí, que ser inteiramente tipificadas”.

Em coerência, o mesmo Tribunal, no seu Acórdão do n.º 115/2008[59], a propósito de uma norma incriminadora que remete parte da sua previsão para regras técnicas que devam ser observadas no âmbito da construção civil, sustentou que a questão deve ser analisada em torno da cognoscibilidade, por parte do sujeito, do elemento do tipo que está definido na norma concretizadora[60]:
 “uma norma penal em branco só é suscetível de violar o princípio da legalidade (no sentido de exigência de lei formal expressa que contemple o tipo legal de crime) e, como seu corolário, o princípio da tipicidade (no sentido da exigência de uma descrição clara e precisa do facto punível) quando a remissão feita para a norma complementar põe em causa a certeza e determinabilidade da conduta tida como ilícita, impedindo que os destinatários possam apreender os elementos essenciais do tipo de crime”.

De acordo com o iter desenvolvido pelo Tribunal Constitucional, naquele caso, “a concretização da norma penal em branco é feita através da remissão para regras que o agente não poderá deixar de conhecer, por respeitarem ao âmbito da sua própria atividade profissional”.

Assim, no quadro do ilícito contraordenacional o que se afigura decisivo – e constitucionalmente conformeé que os comportamentos interditos sejam objetivamente determináveis para os específicos destinatários das normas, devendo, para tanto, ser dotados de um patamar mínimo de determinabilidade

Aduz, por isso, com particular acerto e pertinência, a Recorrida o seguinte: «o mercado de instrumentos financeiros é um meio altamente complexo e em permanente mutação (inovação), que abre espaço a um vasto conjunto de atuações distintas e combinações de atos, pelo que é impossível ao legislador abranger na previsão das normas de dever, com exaustividade, todos os comportamentos devidos
[…]
Vejamos, então, se as normas infracionais aqui em causa cumprem os requisitos de determinabilidade mínima constitucionalmente exigidos.

Vêm imputadas aos arguidos, de um lado, contraordenações pela violação (i) do dever de qualidade da informação previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM, sancionada nos termos do artigo 393.º, n.º 2, alínea d), do CdVM, como contraordenação muito grave e, de outro lado, pela violação (ii) do dever de realizar adenda ao prospeto previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CdVM, sancionada nos termos do artigo 393.º, n.º 2, alínea c), do CdVM, como contraordenação muito grave.

Cotejando o texto das normas, conclui-se que que o tipo infracional é constituído por uma tríade de pressupostos típicos:

a. A informação no prospeto;
b. que permita aos destinatários formar juízos fundados sobre a oferta, os valores mobiliários que dela são objeto e os direitos que lhe são inerentes, sobre as características específicas, a situação patrimonial, económica e financeira e as previsões relativas à evolução da atividade e dos resultados do emitente e de um eventual garante;
c. (a informação prestada) não respeite os requisitos de qualidade enunciados: completude, verdade, atualidade, clareza, objetividade e licitude.

Por seu turno, os requisitos de qualidade da informação referidos no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM demandam que seja:

a. Completa, isto é, caracterizando-se pela correspondência entre a mensagem e o referente;
b. Verdadeira, isto é, coincidente com a realidade dos factos;
c. Atual, isto é, pressupondo correspondência temporal entre o referente e a mensagem;
d. Clara, ou seja, tem os elementos necessários à compreensão da informação prestada;
e. Objetiva, ou seja, tem aptidão para descrever o referente de forma rigorosa, direta e concisa.; e
f. Lícita, ou seja, conforme com a ordem jurídica.

Os sobreditos requisitos são aplicáveis à qualidade da informação vertida no prospeto, de modo a que a mesma permita aos destinatários formar juízos fundados sobre a oferta, isto é, assegurando que os mesmos estão dotados da informação necessária e/ou relevante para tomarem uma decisão quanto à subscrição, ou não, da oferta.

Ora, neste enquadramento, em que os destinatários da norma são destinatários específicos, dotados de particular conhecimento e experiência, os conceitos de informação “completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita”, e de informação “que permita aos destinatários formar juízos fundados sobre a oferta” constantes do artigo 135.º, n.º 1, do CdVM não consubstanciam conceitos indeterminados destituídos de determinabilidade mínima, pelo que, não postergam nem o princípio da legalidade penal (artigo 29.º da CRP) nem o princípio da segurança jurídica e do Estado de Direito (artigo 2.º da CRP).

A sua cognoscibilidade está assegurada, quer pela literalidade ínsita, quer pela sistematização em que se integram, quer ainda pelas particulares características, de experiência e qualificação, que revestem os agentes a quem a norma é dirigida.

Como se refere na sentença recorrida, em termos que subscrevemos e não merecem censura, a cognoscibilidade dos conceitos de informação ‘completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita’, e de informação ‘que permita aos destinatários formar juízos fundados sobre a oferta’ constantes do artigo 135.º, n.º 1, do CdVM’ está assegurada, no contexto do sector em causa (mercado dos instrumentos financeiros), não só pela sua literalidade e sistematização, como pelas particulares características de experiência e qualificação, que revestem os agentes a quem a norma (artigo 135º, nº 1, como artigo 393º, nº 2, alíneas d) do CdVM) é dirigida, em termos consentâneos com o princípio de tipicidade mitigada próprio do enquadramento contraordenacional, que se não confunde com o que vigora em matéria penal.

O mesmo raciocínio, que subscrevemos, vale para a expressão ‘que sejam relevantes para a decisão dos destinatários’, incluída no artigo 142º, nº 1, do CdVM em referência a[o dever de incluir no prospeto] factos posteriores ou conhecidos supervenientemente à aprovação do prospeto e aí não considerados, também ela perfeitamente apreensível para os agentes de intermediação financeira, emitentes ou oferentes, destinatários da norma em causa.

Com referência aos requisitos de qualidade de informação previstos no artigo 7.º do CdVM – que correspondem aos previstos nos artigo 135.º, n.º 1, e 393º, nº 2, alínea d) do CdVM: informação “completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita” – já o Tribunal Constitucional[61] e, anteriormente, o Tribunal da Relação de Lisboa[62], se pronunciaram no sentido da conformidade constitucional dos artigos 7.º e 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM por violação do princípio da legalidade, na vertente da tipicidade (ênfase aditado):
‘[…] o conceito de “informação” não pode, contrariamente ao que alega o recorrente, ser considerado como indeterminado, nem tão pouco como vago ou pouco claro, encontrando-se perfeitamente circunscrito no artigo 7.º do CdVM que delimita não só o conteúdo abrangido pela mesma […] como os veículos da mesma.

‘[…] Da conjugação dos art. 389.º n.º 1 al. a), e art. 7.º do CdVM, reportando-se aquele à informação e este, à qualidade da informação, na medida em que o seu âmbito de aplicação é garantido pela dupla conexão, normativa e temática e o conceito de informação é claro e preciso, não se pode asseverar que há falta de determinação da norma.’

Mais recentemente, o Tribunal Constitucional decidiu ‘[n]ão julgar inconstitucional a norma extraída dos artigos 7.°, 388.°, n.º 1, alínea d), e 389.°, n.º 1, alínea c), todos do Código de Valores Mobiliários, ao prever que a prestação de informação à CMVM que não seja completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita ou a omissão dessa prestação gera uma contraordenação muito grave, punível com coima até ao limite máximo de cinco milhões de euros’, porquanto ‘não viola os princípios da tipicidade e da proporcionalidade, consagrados, respetivamente, nos artigos 29.°, n.os 1 e 3, e 18.°, n.º 2, da Constituição’. Estas considerações são perfeitamente transponíveis para  a contraordenação muito grave pela violação do dever de ‘inclusão de informação no prospeto […] que seja completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita’, prevista no artigo 393º, nº 2, alínea d) do CdVM, quanto à conformidade constitucional do uso dos conceitos ‘completa’, ‘verdadeira’, objectiva’ e ‘lícita’que qualificam a informação devida, como bem se assinala na sentença recorrida.

Nesse aresto, o Tribunal Constitucional refere expressamente, a propósito da alegada violação do princípio da legalidade, na vertente tipicidade que (ênfase aditado):
‘Em boa verdade, a apreensibilidade dos requisitos que definem a qualidade da informação a prestar pelas entidades sujeitas à supervisão da CMVM, vertidos nos artigos 7.° e 389.°, n.º 1, alínea c) do CdVM, não requer sequer particular sagacidade. Isto porque; informação completa só pode ser aquela que, tendo em conta o âmbito da solicitação formulada pelo regulador, reúna a totalidade dos elementos na disponibilidade do regulado, sem ocultação ou sonegação de qualquer dado relevante; informação verdadeira é a que não enferma de qualquer desconformidade entre a descrição feita e a realidade relatada; informação atual é aquela que está disponível no momento em que deve ser prestada; informação clara e objetiva é aquela que não padece de imprecisões ou ambiguidade; e, por fim, informação lícita é a que é obtida, reunida e prestada sem violação da lei.

Acresce que tais requisitos são exigidos para a prestação de informação específica, respeitante «a instrumentos financeiros, a formas organizadas de negociação, às atividades de intermediação financeira, à liquidação e à compensação de operações, a ofertas públicas de valores mobiliários e a emitentes» (artigo 7.°, n.º 1, do CdVM).

Daí que, ao conferir relevância contraordenacional à «prestação de informação à CMVM que não seja completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita», o tipo legal constante da alínea c) do n.º 1 do artigo 389.° do CdVM não comprometa a apreensibilidade do conteúdo do ilícito pelos respetivos (e particulares) destinatários, conclusão que, como se verá de seguida, não é afetada pela fixação, respetivamente em € 25.000 e € 5.000.000, dos limites mínimo e máximo da coima aplicável. Como se escreveu no Acórdão n.º 85/2012, em termos aqui inteiramente aplicáveis, «o tipo contraordenacional em causa resulta da interpretação conjugada das três normas referidas» — no caso presente, os artigos 7.°, 388.°, n.º 1, alínea a), e 389.°, n.º 1, alínea c), do CdVM —; «através da conjugação destes preceitos, a descrição do comportamento sancionado como contraordenação — e a sanção — resultam objetivamente determináveis para os destinatários, não podendo considerar-se violado o princípio previsto no artigo 29.° da Constituição».’

Do mesmo modo, uma vez que os comportamentos sancionados pelos artigos 142.º, n.º 1, e 393.º, n.º 2, alíneas c) e d), ambos do CdVM são objetivamente determináveis, permitindo ao destinatário apreender exatamente em que termos deve orientar a sua conduta, também se não verifica a alegada violação do princípio da segurança jurídica e do Estado de Direito, constitucionalmente consagrado no artigo 2.º da CRP.

Não se constata, assim, a inconstitucionalidade dos artigos 142º, nº 1 e 393º, nº 2, alíneas c) e d) do CdVM, invocada pelos recorrentes CC e DD, improcedendo o correspondente segmento recursivo.

II.12 – Do erro quanto à exigência de actualidade no prospeto da informação relativa à exposição do BES à ESFG e subsidiárias

Alega o recorrente AA (conclusões 27ª a 47ª, infra reproduzidas) que a informação constante do prospeto sobre operações com entidades terceiras especialmente relacionadas respeita o modelo constante do Anexo I do Regulamento (CE) 809/2004, da Comissão, de 29 de abril, sendo que neste se não exige que a informação seja reportada à data da aprovação do prospeto, mas antes às últimas contas aprovadas.

27ª. Sobre o primeiro erro, o Cap. 12.2 do Prospeto (sob o título Operações com entidades terceiras especialmente relacionadas) informa sobre o montante global dos ativos e passivos do Grupo BES que se referem a operações realizadas com entidades subsidiárias, associadas e relacionadas do Grupo ESFG (holding do Banco), apresentando para o efeito tabelas com informação comparativa reportada a 31/12/2011, 31/12/2012 e 31/12/2013 (vd. facto provado 89).

28ª. Esta informação foi prestada no Prospeto exatamente nos termos previstos no n.º 19 do Anexo I do Regulamento (CE) n.º 809/2004, da Comissão, de 29 de abril, com a epígrafe: OPERAÇÕES COM ENTIDADES TERCEIRAS LIGADAS, que estipulava que deviam constar do Prospeto:
Se pertinente, as informações sobre as operações com entidades terceiras ligadas [que para os presentes efeitos são definidas em conformidade com as normas adoptadas nos termos do Regulamento (CE) n. o 1606/2002], realizadas pelo emitente durante o período coberto pelo historial financeiro, até à data do prospecto, devem ser fornecidas em conformidade com a norma correspondente adoptada nos termos do Regulamento (CE) n.o 1606/2002, se aplicável.

29ª. Pois foi isto mesmo que se fez: o Prospeto informou sobre (vd. facto provado 89).:
- as operações com entidades terceiras ligadas,
- realizadas pelo emitente  durante o período coberto pelo historial financeiro, até à data do prospecto - ou seja pelo período coberto pelos documentos de prestação de contas do BES mais recentes em relação à data do Prospeto – que eram as relativas ao exercício findo em 31/12/2013.

30ª. A contraordenação aqui em causa é a prevista no artigo 393.º, n.º 2, alínea d), do CdVM, segundo o qual constitui contraordenação muito grave a violação do dever de inclusão de informação no prospeto que seja completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita segundo os modelos previstos no Regulamento (CE) n.º 809/2004, da Comissão, de 29 de abril.

31ª. Pelo que só pode existir contraordenação relativa à informação de um Prospeto se não forem observados os modelos previstos no Regulamento (CE) n.º 809/2004, da Comissão, de 29 de abril.

32ª. Dito de outro modo: para efeitos contraordenacionais, não basta simplesmente, como parece ser a posição da douta Sentença recorrida, que a informação contida no Prospeto não seja completa, ou verdadeira, ou atual, ou clara, ou objetiva ou lícita.

33ª. Era necessário averiguar se foi ou não respeitado o Regulamento (CE) n.º 809/2004, que determinava o tipo de informação que devia constar de cada Prospeto de cada tipo de oferta pública e especificava os conceitos genéricos previstos no CdVM, nomeadamente sobre a atualidade da informação a ser prestada.

34ª. Ora, o n.º 19 do Anexo I do Regulamento (CE) n.º 809/2004, da Comissão, de 29 de abril, com a epígrafe: OPERAÇÕES COM ENTIDADES TERCEIRAS LIGADAS, que estipulava que o Prospeto devia conter:

Se pertinente, as informações sobre as operações com entidades terceiras ligadas [que para os presentes efeitos são definidas em conformidade com as normas adoptadas nos termos do Regulamento (CE) n. o 1606/2002], realizadas pelo emitente durante o período coberto pelo historial financeiro, até à data do prospecto, devem ser fornecidas em conformidade com a norma correspondente adoptada nos termos do Regulamento (CE) n.o 1606/2002, se aplicável.

35ª. Desta norma resulta que as informações sobre as operações com entidades terceiras ligadas que deviam constar do Prospeto eram as que constassem dos documentos de prestação de contas do emitente mais recentes em relação à data do Prospeto (o que, neste caso do aumentodecapitaldoBESdemaiode 2014, eram osseusdocumentos de prestação de contas relativos ao exercício findo em 31/12/2013).

36ª. Depois, o n.º 20.8 do Anexo I do Regulamento (CE) n.º 809/2004, previa que o Prospeto devia informar sobre as eventuais alterações significativas na posição financeira ou comercial do grupo registadas desde o final do último período financeiro em relação ao qual tenham sido publicadas informações financeiras auditadas ou informações financeiras intercalares, ou uma declaração negativa adequada.

37ª. Este n.º 20.8 do Anexo I do Regulamento (CE) n.º 809/2004) insere-se num capítulo que começa assim:

20. INFORMAÇÕES FINANCEIRAS ACERCA DO ACTIVO E DO PASSIVO, DA SITUAÇÃO FINANCEIRA E DOS LUCROS E PREJUÍZOS DO EMITENTE
20.1. Historial financeiro
Fornecer as informações financeiras históricas auditadas relativas aos 3 últimos exercícios (ou a um período mais curto correspondente ao período de actividade do emitente) e os relatórios de auditoria de cada exercício.
Se o emitente tiver alterado a sua data de referência contabilística durante o período em relação ao qual são requeridas as informações financeiras históricas, as informações históricas auditadas devem abranger o mais curto dos seguintesperíodos:36 mesespelo menos,ou todaaduração da actividade do emitente.
Tais informações financeiras devem ter sido elaboradas em conformidade com o Regulamento (CE) n.o 1606/2002 ou, se o mesmo não for aplicável, com as normas nacionais de contabilidade de um Estado- -Membro, no caso de um emitente da Comunidade. Relativamente aos emitentes de países terceiros, estas informações financeiras devem ter sido elaboradas em conformidade com as normas internacionais de contabilidade adoptadas nos termos do procedimento do artigo 3.o do Regulamento (CE) n.o 1606/2002 ou com as normas nacionais de contabilidade de um país terceiro equivalentes a estas normas. No caso de estas informações financeiras não seremequivalentes a estas normas, devemser apresentadas sob formade uma reformulação das informações financeiras.

38ª. Ou seja, no que respeita a informações financeiras acerca do activo e do passivo, da situação financeira e dos lucros e prejuízos do emitente, devia o Prospeto utilizar a informação constante dos seus documentos de prestação de contas relativas aos 3 últimos exercícios.

39ª. E devia o Prospeto atualizar essa informação apenas se, e na medida em que, tivessem alterações significativas na posição financeira ou comercial do grupo registadas desde o final do último período financeiro em relação ao qual tenham sido publicadas informações financeiras auditadas ou informações financeiras intercalares, ou uma declaração negativa adequada (n.º 20.8 do Anexo I do Regulamento (CE) n.º 809/2004).

40ª. Portanto, um aumento de exposição a Entidade Terceira Ligada, desde a data de referência dos últimos documentos de prestação de contas (in casu, 31/12/2013) até à data do Prospeto (in casu, 20/05/2014) só teria que constar do Prospeto, se e na medida em que fosse de tal maneira relevante que representasse uma alteração significativa na posição financeira ou comercial do grupo [in casu, BES] relativamente àquela que consta do útimo documento de prestação de contas do emitente [grupo [in casu, BES]].

41ª. A informação sobre Entidades Terceiras Ligadas faz parte da informação contabilística que deve constar dos relatórios e contas das sociedades, nos termos das normas internacionais de contabilidade (mais concretamente a IAS 24, como reconhece a douta Sentença recorrida na pág. 723).

42ª. Devendo os Prospetos usar a última informação contabílistica existente e não tendo que a atualizar à data do próprio Prospeto, sob pena de a entidade emitente ter que encerrar a atividade (“fechar para balanço” como antigamente se dizia) para elaborar documentos de prestação de contas reportados à data do próprio Prospeto – o que ainda assim seria uma tarefa impossível, pois a entidade parada sofreria depreciaçõese prejuízos queem permanência desatualizariam as contas em elaboração...

43ª. Aliás, existe sempre desatualização entre a data em que os documentos de prestação de contas são encerrados e a data a que os mesmos se reportam!

44ª. Depois de encerrado exercício (normalmente coincidente com o ano civil, ou seja, a 31 de dezembro) é que são elaborados os documentos de prestação de contas desse mesmo exercício.

45ª. O que, no caso de sociedades de grande complexidade (como era o caso de um banco como o BES), pode demorar 2 a 3 meses a concluir.

46ª. E, como também parece óbvio, as sociedades não ficam encerradas e congeladas desde 1 de janeiro até que consigam fechar os documentos de prestação de contas.

47ª. Por isso, nunca em lado algum se exigiu que a informação financeira constante de um Prospeto fosse reportada à data do próprio Prospeto – isso seria absurdo e impossível de realizar.

A este propósito, convém recordar que o requisito de atualidade da informação divulgada no prospeto, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM, impõe a divulgação de informação com referência ao período temporal mais recente disponível relativamente ao qual a informação deva ser divulgada.

Enquanto documento informativo que orienta a decisão de investimento, é importante para os destinatários o conhecimento das alterações (desde que relevantes) à informação nele divulgada, decorrendo da própria função do prospeto que os responsáveis pela informação dele constante devem garantir a qualidade da informação aí divulgada, nesta se incluindo a respectiva atualidade.

Com interesse para a questão em apreciação, consta da sentença recorrida, designadamente, o seguinte (pp. 422-425, sublinhado aditado):
‘Assim, concluiu o Tribunal que, na informação divulgada no prospeto, no valor apurado de cerca de 290 milhões de euros foi considerada apenas a exposição à ESFG e suas subsidiárias bancárias e financeiras (como posteriormente, também foram consideradas no comunicado do BES, de 31.07.2014, no SDI da CMVM, sobre a atividade e resultados do Grupo Banco Espírito Santo relativa ao 1.º semestre de 2014 (fls. 3684-3710 v., maxime 3686 v. e 3687) para efeitos de apuramento da exposição do BES à ESFG e suas subsidiárias, com referência às datas de 31.12.2013157 - e não a atual à data de aprovação do Prospeto, no valor de € 533 milhões de euros.

[…] a conclusão pela atualidade da informação demanda a existência de correspondência temporal entre o referente e a mensagem, o que, de igual sorte se não verifica, dado que, o que se logrou demonstrar foi que a informação constante do prospeto:

(i) não era completa, porque o valor do montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias era, na verdade, de cerca de 533 milhões de euros e não apenas de cerca de 290 milhões de euros, como constava do prospeto;

(ii) nem atual, porquanto à data da aprovação do prospeto (em 20.05.2014) havia informação relativa ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias que era mais atual que a dele constante (referente a 31.12.2013).

À semelhança do que se expôs supra, a conclusão de que a informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma resultou da conjugação crítica dos seguintes elementos, que refletem, desde logo, um comportamento concludente do próprio Banco no sentido do reconhecimento da relevância da informação em falta:
- Do prospeto (fls. 24-211, maxime fls. 34, 174 e 174 v.), do Relatório de Governo da Sociedade do BES de 2013 (fls. 1583-1636) e dos Relatórios e Contas da ESFG de 2012 (fls. 1644-1785) e 2013 (fls. 4873-4896 e 7297-7343), retira-se que o próprio BES sinalizou que, que, à data da prática dos factos, a ESFG era uma sociedade de direito luxemburguês, que detinha uma participação qualificada no BES;

- Do ponto 12.2. do prospeto (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210), sob a epígrafe “Operações com Entidades Terceiras Especialmente Relacionadas”, conjugado com o Relatório e Contas do BES de 2013 (fls. 944-1192, maxime fls. 1106), resulta que o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias a 31.12.2013 era de cerca de 290 milhões de euros;

- a matéria acerca de “Operações com entidades terceiras especialmente relacionadas” constava do prospeto, nomeadamente, que o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias a 31.12.2013 era de cerca de 290 milhões de euros (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210 e facto provado 109), concluindo-se, assim, que o próprio BES a considerou como informação relevante para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma;

- também se apurou que, constituem entidades terceiras especialmente relacionadas com o BES as sociedades do grupo ESFG (holding do BES): Espírito Santo Financial Group, S.A. e ESFIL (fls. 24-211, maxime fls. 125 e 175).

- E, relativamente ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, constava no prospeto informação com referência a 31.12.2013, mas não à data de aprovação do prospeto.

Donde, considerando que, por decisão do próprio BES foi levada ao prospeto informação relativamente ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias com referência a 31.12.2013, não pode senão concluir-se que, tal informação foi valorada, pelos responsáveis pela elaboração do prospeto, como relevante ou necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma. A ser assim, inexiste razão, lógica e fundada, para arredar tal juízo de relevância e necessidade quanto ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias com referência à data da aprovação do prospeto (15 de Maio e 2014).’

Como bem assinalado na sentença recorrida, o cumprimento do disposto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM, nos termos do qual do prospeto deve constar informação atual sobre a situação financeira do emitente, conjugado com o n.º 20.9 do Anexo I do Regulamento (CE) n.º 809/2004, da Comissão, de 29 de abril, que exigia que no prospeto fossem descritas ‘todas as alterações significativas na posição financeira ou comercial do grupo registadas desde o final do último período financeiro em relação ao qual tenham sido publicadas informações financeiras auditadas ou informações financeiras intercalares’, não pode assim conceber-se sem que se faça constar do prospeto, aprovado pela CMVM em 20.05.2014, informação acerca do montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do prospeto, no total de cerca de 533 M €.

No caso concreto, a evolução da exposição do BES à ESFG e subsidiárias ao longo de 2014 é de tal montante (aumento superior a 80% [€ 533 milhões] face ao montante com referência a 31.12.2013 publicado no prospeto [€ 290 milhões]) que torna desactualizada a informação nele divulgada com referência à referida data.

Não se constata, assim, o erro quanto à exigência de actualidade no prospeto, relativamente à informação sobre a exposição do BES à ESFG, invocada pelo recorrente AA, improcedendo o correspondente segmento recursivo.

II.13 – Da actualidade e completude da informação constante do prospecto

Alega o recorrente AA (conclusões 151ª a 232ª, que aqui se dão por reproduzidas) que a informação constante do prospeto relativa à garantia soberana é completa e atual, já que a informação que o Tribunal imputa estar em falta era falsa, e em qualquer caso irrelevante para os investidores.

Também o recorrente CC (conclusões 57 a 74, 86 a 93 e 102 a 113, que aqui se dão por reproduzidas) alega que (i) a informação relativa aos aumentos de exposição do BES à ESFG não tinha materialidade face ao disposto nos artigos 29º-T e 249.º-B, n.º 1, do CdVM , desde logo atenta a sua reduzida expressão no ativo do BES (0.29%), sendo por isso irrelevante; (ii) a informação constante do prospeto relativa à garantia soberana é completa e atual; e (iii) as cartas de conforto emitidas pelo BES em favor do FONDEN e PDVSA não implicavam qualquer compromisso de reembolso, pelo que não eram suscetíveis de afetar os juízos dos destinatários da oferta.

Por seu lado,  o recorrente DD (conclusões 67 a 75, que aqui se dão por reproduzidas) alega que a sentença recorrida incorreu em erro de direito por errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 135.º do CVM e do tipo contraordenacional previsto na alínea d) do n.º 2 do artigo 393.º do CVM, pois a matéria de facto provada não permite concluir que se encontrem verificados os pressupostos do tipo contraordenacional, uma vez que a informação constante do prospeto relativa ao BESA e à garantia soberana era completa e permitia aos destinatários da oferta fazer juízos fundados sobre a mesma, sendo a que o Tribunal a quo imputa estar em falta falsa, e em qualquer caso irrelevante para os investidores, como demonstra o facto de a CMVM não ter solicitado ao BES qualquer informação na decorrência da publicação da notícia do ... de 7 de junho de 2014.

Vejamos.
Constam do elenco dos factos provados da sentença recorrida, designadamente os seguintes (sublinhado aditado):
111.  Porém, do Prospeto não consta informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto, que ascendia a cerca de 533 milhões de euros. (fls. 24-211; 3225-3226 v., maxime fls. 3226)
112.  Assim, a informação constante do Prospeto: (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 2282-2729, maxime fls. 2288-2290 e 2314-2518 v.; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139)

(i) Não é completa, porquanto não contém informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), mas apenas a 31.12.2013 (cerca de 290 milhões de euros);

(ii) Não é atual, porquanto não corresponde ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do Prospeto, mas antes a 31.12.2013.

113. A informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211 maxime fls. 29, 34, 174, 174 v.,175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; fls. 1583-1636; fls. 1644-1785; fls. 4873-4896 e fls. 7297-7343)

134.  A informação constante do Prospeto não é completa, porquanto não contém informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação. (fls. 24-211; fls. 1521-1582)

135.  A informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 669-801, maxime fls. 687 v., 696 v. e 722 v.; fls. 802-943, maxime fls. 810, 827 v. e 856; fls.1521-1582; fls. 4829-4841, maxime fls. 4830 e 4841; fls. 5852-5863 v., maxime fls. 5852 v. e 5863 v.)

141.  A informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106; cd de fls. 3223; fls. 3225-3226 v.; fls. 3232-3236 v.)

142. Em 9 de junho de 2014, o BES emitiu duas cartas de conforto em favor das sociedades venezuelanas Fondo Nacional para el Desarrollo Nacional – FONDEN, S.A. e o Banco de Desarollo Economico y Social da Venezuela (ambas integrantes do grupo Petróleos da Venezuela – PDVSA). (fls. 2243-2248, maxime cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140715”, ficheiros “CE-20140715-07.03.02 Carta dirigida ao Banco de Desarrollo Economico y Social de Venezuela” e “CE-20140715-07.03.03 Carta dirigida ao Fondo de Desarollo Nacional – FONDEN” e fls. 2246-2247; cd de fls. 3223, ficheiro “Nº 269 CMVM_01 03 2018 pedido de elementos_Processo de contraordenação nº 14_2017”, pp. 3 e 4; fls. 8336-8337; fls. 8382; fls. 8384)

143. Pelas referidas cartas de conforto, o BES assumiu o compromisso de reembolsar os títulos representativos de dívida emitidos pela ESI que haviam sido adquiridas pelas sociedades destinatárias das cartas. (fls. 2243-2248, maxime cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140715”, ficheiros “CE-20140715-07.03.02 Carta dirigida ao Banco de Desarrollo Economico y Social de Venezuela” e “CE-20140715-07.03.03 Carta dirigida ao Fondo de Desarollo Nacional – FONDEN” e fls. 2246-2247; fls. 3088-3091 v., maxime fls. 3090 v.-3091; cd de fls. 3223, ficheiro “Nº 269 CMVM_01 03 2018 pedido de elementos_Processo de contraordenação nº 14_2017”, pp. 3 e 4; fls. 8336-8337; fls. 8382; fls. 8384)

148.  A informação sobre a emissão, pelo BES das cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma. (fls. 24-211; fls. 2243-2248, maxime cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140715”, ficheiros “CE-20140715-07.03.02 Carta dirigida ao Banco de Desarrollo Economico y Social de Venezuela” e “CE-20140715-07.03.03 Carta dirigida ao Fondo de Desarollo Nacional – FONDEN” e fls. 2246-2247; fls. 3088-3091 v., maxime fls. 3090 v.-3091; cd de fls. 3223, ficheiro “Nº 269 CMVM_01 03 2018 pedido de elementos_Processo de contraordenação nº 14_2017”, pp. 3 e 4; fls. 8336-8337; fls. 8366-8385, maxime fls. 8367, 8368, 8382 e 8384)

Da referida matéria de facto apurada, consta designadamente que a informação constante do prospeto não era completa nem actual, e que a informação omitida – (i) financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, (ii) aumento da exposição do BES à ESFG e subsidiárias, (iii) detenção pelo BESA de créditos e activos imobiliários no valor de 3.9 mil milhões de dólares cujo valor de realização era próximo de zero e de créditos no total de 1.7 mil milhões de dólares carecidos de reestruturação e (iv) cartas de conforto em que o BES assumia o compromisso de reembolsar títulos representativos de dívida emitidos pela ESI adquiridos pelas sociedades destinatárias das cartas – era necessária (e consequentemente relevante) para que os investidores destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma.

Donde, o invocado a coberto de erro de direito (actualidade e completude da informação, irrelevância ou desnecessidade da informação pretensamente omitida no prospeto, porque falsa) redundaria em impugnação da matéria de facto dada como provada, o que exorbita do âmbito do presente recurso, por força do disposto no artigo 75.º do RGCO.

Sem prejuízo, sempre se dirá que, como decorre do disposto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM  sobre o dever de incluir no prospeto informação ‘que permita aos destinatários formar juízos fundados sobre a oferta’ e da própria função do prospeto enquanto documento informativo que orienta a decisão de investimento dos destinatários, o que releva saber é se a informação, designadamente acerca do aumento da exposição do BES à ESFG e subsidiárias, é ou não relevante ou necessária para a decisão de investimento dos investidores (e não para o oferente, emitente ou intermediário financeiro).

A sentença recorrida justificou que a informação omitida sobre a exposição do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do prospeto era relevante ou necessária para a decisão dos destinatários da oferta, designadamente nos seguintes termos (pp. 424 e 425, ênfase aditado):

‘À semelhança do que se expôs supra, a conclusão de que a informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma resultou da conjugação crítica dos seguintes elementos, que refletem, desde logo, um comportamento concludente do próprio Banco no sentido do reconhecimento da relevância da informação em falta:
- Do prospeto (fls. 24-211, maxime fls. 34, 174 e 174 v.), do Relatório de Governo da Sociedade do BES de 2013 (fls. 1583-1636) e dos Relatórios e Contas da ESFG de 2012 (fls. 1644-1785) e 2013 (fls. 4873-4896 e 7297-7343), retira-se que o próprio BES sinalizou que, que, à data da prática dos factos, a ESFG era uma sociedade de direito luxemburguês, que detinha uma participação qualificada no BES;
- Do ponto 12.2. do prospeto (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210), sob a epígrafe “Operações com Entidades Terceiras Especialmente Relacionadas”, conjugado com o Relatório e Contas do BES de 2013 (fls. 944-1192, maxime fls. 1106), resulta que o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias a 31.12.2013 era de cerca de 290 milhões de euros;
- a matéria acerca de “Operações com entidades terceiras especialmente relacionadas” constava do prospeto, nomeadamente, que o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias a 31.12.2013 era de cerca de 290 milhões de euros (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210 e facto provado 109), concluindo-se, assim, que o próprio BES a considerou como informação relevante para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma;
- também se apurou que, constituem entidades terceiras especialmente relacionadas com o BES as sociedades do grupo ESFG (holding do BES): Espírito Santo Financial Group, S.A. e ESFIL (fls. 24-211, maxime fls. 125 e 175).
- E, relativamente ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, constava no prospeto informação com referência a 31.12.2013, mas não à data de aprovação do prospeto.

Donde, considerando que, por decisão do próprio BES foi levada ao prospeto informação relativamente ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias com referência a 31.12.2013, não pode senão concluir-se que, tal informação foi valorada, pelos responsáveis pela elaboração do prospeto, como relevante ou necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma. A ser assim, inexiste razão, lógica e fundada, para arredar tal juízo de relevância e necessidade quanto ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias com referência à data da aprovação do prospeto (15 de Maio e 2014).

Nada há a apontar ao raciocínio lógico efectuado pelo Tribunal a quo, que subscrevemos. Se o próprio BES incluiu informação no prospeto sobre a sua exposição à parte relacionada ESFG e subsidiárias, reportada à data de 31.12.2013 (cerca de 290 milhões de euros), é porque considerou tal informação relevante para que os investidores destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma, pelo que não há razão para não incluir no prospeto informação sobre o montante de tal exposição reportada à data da respectiva aprovação em 15.05.2015 (533 milhões de euros).

A este propósito, cumpre relembrar que, na esteira da sentença recorrida (p. 425), que as transações com partes relacionadas, na medida em que envolvem muitas vezes um conjunto alargado e complexo de relações e estruturas e podem não ser realizadas segundo termos e condições de mercado normais, são operações que, pela sua própria natureza, envolvem um risco de inadequado relato financeiro, sendo assim relevante para os investidores conhecer o montante dessas operações.’

O aumento significativo (de 290 para 533 milhões de euros) da exposição do BES à ESFG e subsidiárias entre 31.12.2013 (referida no prospeto) e a data da aprovação do prospeto, torna não atual a informação constante do prospeto nessa matéria, levando a que a informação nele divulgada seja suscetível de induzir em erro os destinatários da informação, por lhe faltar uma das componentes da qualidade exigida (a atualidade).

Aumento significativo que, traduzindo-se num aumento da exposição do BES a entidades com ele relacionadas, introduzia uma alteração da situação financeira e comercial do emitente tal como fora inicialmente divulgada.

O critério que preside à inclusão da informação no prospeto não é um critério de materialidade da informação relativamente às contas do emitente, mas antes um critério de relevância ou necessidade da informação para formar juízos fundados sobre a oferta (i.e., decisões de investir ou não por parte dos investidores, destinatários da Oferta), que se não confunde com a materialidade da informação em causa.

Acresce que, para a definição da informação que deve constar do prospeto ou o juízo sobre a sua relevância para que os destinatários da oferta possam formar juízos fundados sobre a mesma, não releva o disposto nos artigos 249.º-B, n.º 1 e 29.º-T do CdVM, que não têm por objeto disciplinar os requisitos das Ofertas Públicas, designadamente em termos da informação a incluir ou não no respectivo prospeto, como a que está em causa nos presentes autos.

Relativamente à alegada completude da informação constante do prospeto relativamente ao BESA, em razão da existência, validade e efeitos da garantia soberana a que se faz referência no fator de risco 2.1.23 do prospeto, cabe recordar, como resultou provado nos autos, que a informação relativa à existência de graves problemas na carteira de crédito e portfólio de ativos imobiliários do BESA (que esteve na origem da garantia soberana emitida em 31.12.2013 pela República de Angola) era relevante ou necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma e não constava do prospeto.

O que constava do prospeto, concretamente, do fator de risco 2.1.23 era a emissão da referida garantia soberana ‘como forma de proteger o banco de eventuais atrasos e incumprimentos na liquidação dos ativos, cobrindo crédito e juros, que beneficiam da garantia (créditos e valores de venda de imóveis).’, não decorrendo do referido texto a prévia materialização do risco que a garantia visou resolver (e não acautelar ou precaver, como sugere o texto do prospeto no fator de risco relativo à referida garantia soberana).

Uma vez que, contrariamente ao alegado pelos recorrentes AA, CC e DD, da referência no fator de risco 2.1.23. do prospeto à existência, validade e efeitos da referida garantia soberana emitida pela República de Angola em 31.12.2013, não resultava a existência de problemas na carteira de crédito do BESA, apurados em finais de 2013, na origem da emissão daquela garantia, a informação constante do prospeto não era completa quanto à situação financeira e patrimonial do BESA que determinou a emissão da referida garantia, não se vislumbrando qualquer erro no que nesse sentido decidiu na sentença recorrida.

Também a restante informação relativa ao BESA constante do prospeto, nomeadamente relativa às ‘alterações nas condições económicas e de negócio em Angola” e aos “riscos políticos, sociais ou económico-financeiros adversos, tais como instabilidade política e social, alteração da regulamentação da fiscalidade ou volatilidade cambial’, não permitia aos destinatários da oferta detectar a existência de graves problemas na carteira de crédito e portfólio de ativos imobiliários do BESA, na origem da emissão da garantia soberana pela República de Angola em 31.12.2013.

Uma vez que existiam problemas na carteira de crédito e portfólio de ativos imobiliários do BESA e estes não estavam refletidos no prospeto, a informação aí divulgada sobre o BESA – necessária para a decisão dos destinatários da oferta –  carecia de qualidade, porque incompleta.

Não merece, pois, qualquer censura a sentença recorrida, quando concluiu que a informação constante do prospeto não era completa, por omitir o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como créditos no total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação (cuja cobertura visava a garantia soberana emitida em 31.12.2013).

Quanto às cartas de conforto emitidas pelo BES em favor do BANDES e FONDEN estas implicavam, como bem decidiu o Tribunal a quo e resulta inequivocamente do seu texto, enquadramento (assinadas por dois administradores) e vocação deste tipo de instrumento no sector em causa, um compromisso do BES de reembolsar as sociedades destinatárias das mesmas dos títulos representativos de dívida emitidos pela ESI, na respetiva data de vencimento, no valor de 372 milhões de dólares (factos provados 143, 144, 299 e 339), uma vez que nelas é indicado o ISIN dos produtos subscritos pelas sociedades destinatárias (títulos de dívida da ESI) e referido que o BES nas datas de vencimento […] [a]ssegurará a liquidez necessária de forma a permitir o reembolso programado’.
Como refere o Supremo Tribunal de Justiça[63] (ênfase aditado) a propósito da noção de cartas de conforto:
na medida em que delas resulta um compromisso assumido por uma parte (o confortante) e validamente aceite pela outra (o confortado), nos dias de hoje, é pacificamente aceite a sua juridicidade[10], defendendo até certa doutrina, atento o carácter profissional dos sujeitos que as utilizam (sociedades comerciais e bancos) e a natureza das relações a que se referem, uma presunção de juridicidade destas cartas, no sentido de que existe uma intenção e uma consciência de que as mesmas são produtivas de vínculos jurídicos ou, pelo menos, de efeitos relevantes para o declarante no plano jurídico.’
Assim, a emissão das referidas cartas de conforto não só impactava na situação financeira do BES, como em si mesma representava informação nova, em sentido diverso da constante do prospeto (que o BES não era responsável pelo reembolso dos instrumentos de dívida da ESI –  facto provado 86), o que também tornava a correspondente informação necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma.
O compromisso nelas assumido pelo BES tinha reflexo nas suas contas, pelo que, devendo o emitente prestar aos investidores, através do prospeto, informação acerca da sua situação financeira, a informação relativa àquele compromisso era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma.
No próprio prospeto (secção 2.1.18, sob a epígrafe ‘Riscos reputacionais associados à potencial deterioração ou perceção de deterioração da posição financeira da Espírito Santo International ou das suas subsidiárias’, fls. 24-211) se referia que (ênfase aditado):
Foram subscritos por clientes do BES – investidores institucionais e não institucionais – determinados instrumentos de dívida, nomeadamente papel comercial, emitidos pela Espírito Santo International e por algumas das suas subsidiárias.
[…]
Embora o BES não seja responsável pelo reembolso dos referidos instrumentos de dívida, no caso de uma alteração da confiança dos investidores na capacidade financeira das respetivas entidades emitentes para cumprir pontualmente as suas obrigações associadas aos instrumentos de dívida ou na eventualidade de um incumprimento, isso poderá afetar, de forma negativa, a reputação do BES ou dar origem a um conjunto de litígios contra o BES, o que poderá ter um efeito substancial negativo na sua situação financeira e nos seus resultados.
Ou seja, o BES entendeu como necessário incluir no prospeto informação acerca do risco reputacional para o BES do eventual incumprimento pela ESI do reembolso de dívida por esta emitida, colocada em clientes institucionais e não institucionais do BES, não obstante o BES não fosse responsável pelo reembolso dos referidos instrumentos de dívida.
Ora, a divulgação da informação relativa à emissão, em 09.06.2014, de duas cartas de conforto a favor das sociedades venezuelanas FONDEN e BANDES (ambas integrantes do grupo Petróleos da Venezuela – PDVSA), assume-se ainda mais relevante face à informação já divulgada no prospeto, pois, através delas o BES assumiu uma responsabilidade direta pelo reembolso a clientes institucionais de dívida emitida pela ESI, no valor de 372 milhões de USD.
Assim, à semelhança das demais alegações dos recorrentes AA, CC e DD relativas à alegada completude e actualidade da informação constante do prospeto, improcedem igualmente as do recorrente CC, no sentido de que a informação sobre as cartas de conforto emitidas pelo BES em 09.06.2014 era irrelevante para a decisão dos destinatários da oferta, nenhuma censura merecendo a sentença recorrida.
Improcede, pois, o presente segmento recursivo.

II.14 – Da inexistência do dever de actuação dos recorrentes
Alega o recorrente DD (conclusões 76 a 87, que aqui se dão por reproduzidas) que a sentença recorrida incorreu em erro de direito, por errada interpretação e aplicação do disposto nos artigos 135.º e 393.º, n.º 2, alínea d) do CdVM, ao concluir que cabia ao recorrente incluir no prospeto a informação em falta respeitante ao BESA, porquanto não só tal informação seria falsa, como o recorrente diligenciou no sentido de dotar o BES de todos os meios necessários para a elaboração do prospeto.
Como já se apreciou atrás (i. a. secção II.13, supra), resultou provado que a informação constante do prospeto relativa ao BESA e à garantia soberana não era completa, e que o recorrente DD disso tinha conhecimento (pp. 605 a 642 da sentença recorrida, de onde consta a extensa e detalhada fundamentação da prova dos factos provados 353 a 360, infra reproduzidos, ênfase aditado):
353.  O arguido DD foi Administrador do BES e membro da sua Comissão Executiva entre março de 2000 e 30 de julho de 2014. (fls. 24-211, maxime fls. 143 v.; 1583-1636, maxime fls. 1590 v.)
354. O arguido DD, na qualidade de membro da Comissão Executiva do BES tinha, à data da prática dos factos, para além de outros, o pelouro do Departamento de Assuntos Jurídicos (DAJ). (fls. 24-211, maxime fls. 145; 1583-1636, maxime fls. 1594 v.)
355. O arguido DD participou na reunião do Conselho de Administração do BES de 15 de maio de 2014, que deliberou a realização do aumento de capital do BES até ao montante de até € 1.044.571.587,80 (mil e quarenta e quatro milhões quinhentos e setenta e um mil quinhentos e oitenta e sete euros e oitenta cêntimos) mediante a emissão de até 1.607.033.212 novas ações ordinárias, escriturais e nominativas, sem valor nominal, na modalidade de novas entradas em numerário, a ser realizado em dinheiro, através da oferta pública de subscrição com direito de preferência na subscrição por parte dos acionistas, e aprovou a minuta do Prospeto. (fls. 660-662 v.; fls. 2282-2729, maxime fls. 2283-2284 v. e fls. 2314-2518 v.
356. O arguido DD votou favoravelmente a deliberação de realização do aumento de capital. (fls. 2282-2729, maxime fls. 2284
357. O arguido DD teve conhecimento, em 3 de novembro de 2013, do conteúdo das atas das reuniões da assembleia-geral do BESA realizadas em 3 e 21 de outubro de 2013, que lhe foram enviadas pelo Presidente da Mesa da Assembleia-Geral do BESA.
358. O arguido DD teve conhecimento, em 3 de novembro de 2013, de que, nas reuniões da Assembleia-Geral do BESA ocorridas em outubro de 2013 (fls. 1521-1582, maxime fls. 1550-1553, fls. 1557-1565, fls. 1566-1567 e fls. 1568-1569):
a. o Presidente da Comissão Executiva do BESA informou que a Comissão Executiva do BESA apurou a existência de um conjunto de créditos, de valor material, considerados de cobrança duvidosa; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1566)
b. foram analisados aspetos da carteira de crédito do BESA, com referência a 31 de agosto de 2013, tendo a carteira de crédito sido dividida em dois blocos de clientes (bloco A e bloco B), atendendo ao grau de conhecimento que a Comissão Executiva do BESA detinha sobre os mesmos, bem como à dimensão dos créditos concedidos pela anterior gestão; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1553-1554)
c. foi referido que o designado bloco A dos créditos representava 80% do total da carteira de crédito do BES, totalizando cerca de 5,5 mil milhões de dólares, e respeitava a um conjunto de clientes do BESA sobre os quais o Conselho de Administração do BESA, em 3 de outubro de 2014, desconhecia a identidade dos mutuários, a finalidade dos créditos e as garantias associadas aos mesmos; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1554)
d. foi informado que o crédito concedido pelo BESA totalizava, em 31 de agosto de 2013, 6,9 mil milhões de dólares, dos quais, 1,8 mil milhões de dólares correspondiam a capital vencido; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1554)
e. foi informado que, em 31 de agosto de 2013, os juros vencidos por liquidar juntamente com os juros de mora totalizavam cerca de 560 milhões de dólares; (fls. 1521-1582, maxime fls. 1554)
f. foi informado que o BESA apresentava, em outubro de 2013, para além de uma difícil situação de liquidez, com necessidades de financiamento de cerca de 6.6 mil milhões de dólares, 4.6 mil milhões de dólares financiados através do BES e 2 mil milhões de dólares através de bancos angolanos, uma grave situação patrimonial, resultado da deteção de uma fraude ao nível da sua carteira de crédito e do seu portfólio de ativos imobiliários. (fls. 1521-1582, maxime fls. 1566)
359. O arguido DD teve conhecimento do conteúdo das cartas enviadas, no dia 5 de novembro de 2013, pelo Presidente do Conselho de Administração e pelo Presidente da Comissão Executiva do BESA, ao Presidente da República de Angola, bem como do memorando sobre a situação patrimonial do BESA àquela data que foi enviado em anexo às cartas, através das minutas dos referidos documentos, que lhe foram enviados pelo Presidente da Mesa da Assembleia-Geral do BESA, em 3 de novembro de 2013.
360. O arguido DD tinha conhecimento de que o BES não fez constar do Prospeto informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação.
Resultou provado que o recorrente DD era administrador executivo do BES e, nessa qualidade, não só aprovou o prospeto, como esteve diretamente envolvido na sua elaboração.
Atentas as funções que exercia no BES, a concreta participação que teve no processo de elaboração e aprovação do prospeto, e o facto de conhecer a informação omitida, e que era necessária para a decisão dos destinatários da oferta, o arguido DD tinha o dever de agir no sentido de assegurar que a mesma figurasse no prospeto, em cumprimento das obrigações que sobre o emitente BES incumbiam, nos termos dos artigos 135.º, n.º 1, e 142.º, n.º 1, do CdVM.
Por outras palavras, não só estava na disponibilidade do recorrente DD orientar o emitente – de que era administrador e membro da Comissão Executiva - para o cumprimento do dever de garantir a qualidade da informação constante do prospeto (e de requerer a divulgação de adendas ao mesmo), como este tinha o dever – inerente às suas funções - de o fazer.
Enquanto administrador do emitente e conhecedor da informação omitida no prospeto e da sua relevância para a decisão dos destinatários da oferta, cabia-lhe à luz dos deveres de diligência a que está sujeito (artigo 64.º do CSC), atuar no sentido de garantir que o emitente divulgue essa informação no prospeto ou através de adendas ao prospeto, à luz dos deveres de diligência adstritos ao exercício daquelas funções nos termos do artigo 64º do Código das Sociedades Comerciais, o que comprovadamente não fez.
Relativamente a este tipo de dever violado valem, no geral, as considerações tecidas com anterioridade relativamente ao conceito extensivo de autoria.
Por força daquele conceito extensivo de autoria, o dever de prestação de informação com qualidade impendia quer sobre o BES, na qualidade de emitente na Oferta divulgada no prospeto, quer sobre o recorrente, enquanto membro do Conselho de Administração do emitente (cfr. artigos 304.', n.' 5, e artigo 305.'-D, n.' 1, do CdVM).
Com efeito, o dever de prestação de informação com qualidade impõe um conjunto de requisitos de qualidade da informação que têm de ser observados por todos os agentes ou entidades que prestam serviços no mercado de valores mobiliários.
Contrariamente ao que alega, sobre o recorrente DD incumbia, de acordo com as correspondentes normas do CdVM (artigos 135.º, n.º 1, e 142.º, n.º 1), a obrigação de conformar a sua conduta com o dever de assegurar a qualidade de informação constante do prospeto, o que estava perfeitamente ao seu alcance, pois não só conhecia a informação omitida, como sabia da sua relevância para a decisão dos destinatários da oferta emitida pelo BES, de que era administrador.

II.15 – Da inexistência de dolo ou negligência
Alega o recorrente AA (conclusões 233ª a 258ª) que o Tribunal a quo não só não devia ter dado como provados os factos 225 e 242, como não retirou as ‘devidas consequências’ dos factos provados 21 a 23, 108, 308 e 381, dos quais resultaria a inexistência de culpa do recorrente.
Por seu lado, alega o recorrente CC (conclusões 184 a 201) que, em resultado da alegada indeterminação dos tipos contraordenacionais resultantes dos artigos 135º, n.º 1, e 393º, n.º 2, alínea d), por um lado, e 142.º, n.º 1, e 393º, n.º 2, alínea c), por outro, o recorrente não representou que (i) a não inclusão no prospeto da informação relativa à exposição do BES à ESFG à data da aprovação do prospeto, (ii) a não inclusão no prospeto de informação da situação financeira e patrimonial do BESA em finais de 2013, que originou a emissão da garantia soberana e (iii) a informação sobre a concessão de financiamentos adicionais à ESFG  na pendência da Oferta, configuravam informações necessárias para que os destinatários da Oferta formulassem juízos fundados sobre a mesma.
Também o recorrente DD (conclusões 88 a 94 e 100 a 110 e 111) alega que não pode afirmar-se a existência de dolo ou negligência por parte do recorrente, atenta a factualidade apurada.
Vejamos, um por um, os vícios alegados por cada um dos recorrentes:
Recorrente AA
Resulta da matéria provada (factos provados 215-251 da sentença recorrida) que:
- o recorrente AA era administrador executivo do BES e aprovou o prospeto (factos provados 215 e 234 a));
- o recorrente AA tinha conhecimento de que o BES tinha concedido à ESFG e suas subsidiárias financiamentos que, à data da aprovação do Prospeto, ascendiam a cerca de 533 milhões de euros, e de tal informação não constava do Prospeto (factos provados 225 e 234 g));
- o recorrente AA tinha conhecimento de que a informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma (facto provado 234 h));
- o recorrente AA tinha conhecimento de que o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação, e de que tal informação não constava do Prospeto (factos provados 228, 229, 230 e 234 i) e j));
- o recorrente AA tinha conhecimento de que a informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma (facto provado 231);
- o recorrente AA tinha conhecimento de que o BES concedeu, em 30 de maio de 2014, financiamentos à ESFG e subsidiárias, no montante de cerca de 194 milhões de euros, e que, em consequência, a 30 de maio de 2014, o montante total de financiamentos do BES concedidos à ESFG e suas subsidiárias ascendia a cerca de 727 milhões de euros (factos provados 236 e 238);
- o recorrente AA tinha conhecimento de que a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma, e, ainda assim, não promoveu nem adotou, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, qualquer diligência ou medida no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG (factos provados 242, 245 e 246).
O Tribunal a quo detalhou exaustivamente a prova de tais factos (pp. 494 a 540 da sentença recorrida, de que se reproduz infra um extrato de pp. 585-590, ênfase aditado), em termos convincentes, que subscrevemos, donde resulta não poder deixar de concluir-se pela sustentação do conhecimento da conduta e sua imputação, a título doloso, ao recorrente AA, nos termos  que constam da sentença recorrida e que não merecem reparo:
‘Resulta do teor do próprio prospeto (fls. 24-211, maxime fls. 60 v., 61 e 62) que o Recorrente AA, enquanto vogal do Conselho de Administração do BES, era responsável pela informação contida no prospeto, nos termos do artigo 149.º do CdVM, e que “As pessoas/entidades que, nos termos consignados supra ou em qualquer secção deste Prospeto, são responsáveis pela informação contida no Prospeto ou numa determinada parte do mesmo declaram que, após terem efetuado todas as diligências razoáveis para se certificarem de que tal é o caso e, tanto quanto é do seu conhecimento, a informação constante do Prospeto ou de partes do mesmo pelas quais são responsáveis está em conformidade com os factos, não existindo quaisquer omissões suscetíveis de afetar o seu alcance.”
O Recorrente estava, pois, ciente das exigências legais que norteiam o aumento de capital, particularmente no que tange à necessidade de assegurar que no mesmo é vertida informação completa, verdadeira, atual, clara e objetiva[64]. Atuou, pois, com representação da anti-normatividade da sua conduta e com intenção de a postergar.
O Recorrente, pela sua significativa experiência e aprofundados conhecimentos bancários e financeiros, não pode ter deixado de representar que a informação em falta no prospeto constituía alteração a informação constante do prospeto (com referência a 31.12.2013), relativa a “Operações com Entidades Terceiras Especialmente Relacionadas”, representando uma variação superior a 83 % (de 290 M € para 533 M €)[65].
Além disso, como se referiu supra, a acrescer à dosimetria da variação da exposição do BES entre 31.12.2014 e 31.3.2014, bem sabia o Recorrente que as operações com entidades terceiras especialmente relacionadas, na medida em que envolvem muitas vezes um conjunto alargado e complexo de relações e estruturas e podem não ser realizadas segundo termos e condições de mercado normais, são operações que, como sinaliza a Recorrida, pela sua própria natureza, envolvem um risco de inadequado relato financeiro, sendo assim relevante para os investidores conhecer o montante dessas operações.
O arguido AA prestou, em audiência de discussão e julgamento, declarações que contribuíram, de modo relevante, para a compreensão, pelo Tribunal, da dinâmica subjacente ao aumento de capital.
Revelou conhecimento, pormenorizado e aturado, do teor do Prospeto, dado que, além de o ter aprovado em CA do BES, participou, conforme explicitou, ativamente no road show de divulgação do Prospeto, tarefa levada a cabo junto de investidores internacionais, no âmbito do qual o Recorrente (e o Recorrente BB) expunha as linhas diretrizes do Prospeto e respondia às perguntas que lhe eram colocadas.
Com efeito, logrando merecer a credibilidade do Tribunal pela coerência e espontaneidade das suas explicações, clarificou que a decisão de aumento de capital «é uma decisão estratégica do Conselho de Administração» e «um ritual fundacional» vivido pelo CA, na senda, aliás, das declarações de SS[66], em juízo, que atestou que «o prospeto é um documento da Administração».’
De acordo com o disposto no artigo 14.º, n.º 1, do Código Penal (aplicável ex vi artigo 32.º do RGCO), para que o agente tenha atuado com dolo é necessário que tenha atuado com conhecimento (elemento cognitivo) e vontade (elemento volitivo) de realização do tipo objectivo de ilícito[67].
No caso presente, ambos os elementos (intelectual e volitivo) estão preenchidos, tendo resultado demonstrado na sentença recorrida o conhecimento e vontade do recorrente AA na prática dos factos descritos. Com efeito, o recorrente AA conhecia os factos descritos no elenco de factos provados, porquanto se trata de factos próprios, em que interveio e que controlou.
Não obstante, quis praticar aqueles factos, decidindo:
(i) não incluir no prospeto informação que era do seu conhecimento e necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma e (ii) não requerer adenda ao prospeto relativamente a factos ocorridos após a divulgação do prospeto e até à admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, que eram do seu conhecimento e eram relevantes para a decisão dos destinatários.
Assim, a decisão de não levar ao conhecimento dos investidores, no prospeto de aumento de capital do BES de 2014 e através de adendas ao mesmo, informação que era do seu conhecimento e necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma, nos termos referidos, foi um ato representado, pretendido e atuado pelo recorrente AA.
Improcede, pois, o alegado pelo recorrente AA, com fundamento na inexistência de dolo ou negligência.
Recorrente CC
Resulta da matéria provada (factos provados 313-251 da sentença recorrida) que:
- o recorrente CC era administrador executivo do BES e aprovou o prospeto (factos provados 313 e 331 a));
- o recorrente CC tinha conhecimento de que o BES tinha concedido à ESFG e suas subsidiárias financiamentos que, à data da aprovação do prospeto, ascendiam a cerca de 533 milhões de euros, e de tal informação não constava do prospeto (factos provados 319 e 531 g));
- o recorrente CC tinha conhecimento de que a informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros), era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma (facto provado 331 h));
- o recorrente CC tinha conhecimento de que o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação, e de que tal informação não constava do prospeto (factos provados 326, 327 e 331 1) e j));
- o recorrente CC tinha conhecimento de que a informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma (factos provados 328 e 331 k));
- o recorrente CC tinha conhecimento de que o BES concedeu, em 30 de maio de 2014, financiamentos à ESFG e subsidiárias, no montante de cerca de 194 milhões de euros, e que, em consequência, a 30 de maio de 2014, o montante total de financiamentos do BES concedidos à ESFG e suas subsidiárias ascendia a cerca de 727 milhões de euros (factos provados 351 a) e b));
- o recorrente CC tinha conhecimento de que a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG até à data de encerramento da Oferta era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma, e, ainda assim, não promoveu nem adotou, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, qualquer diligência ou medida no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre o aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG (factos provados 351 c), 351 d), 351 e) e 351 f));
- o recorrente CC  assinou as duas cartas de conforto emitidas pelo BES, em 9 de junho de 2014, em favor das sociedades venezuelanas Fondo Nacional para el Desarrollo Nacional – FONDEN, S.A. e Banco de Desarollo Economico y Social da Venezuela (ambas integrantes do grupo Petróleos da Venezuela – PDVSA), pela quais o BES assumiu o compromisso de reembolsar os títulos representativos de dívida emitidos pela ESI que haviam sido adquiridas pelas sociedades destinatárias das cartas, no valor de 372 milhões de dólares (facto provado 339);
- o recorrente CC tinha conhecimento de que a informação sobre a emissão, pelo BES das cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma e, ainda assim, não promoveu nem adotou, em sede de Comissão Executiva ou de Conselho de Administração do BES, qualquer diligência ou medida no sentido de divulgar, através de adenda ao Prospeto ou de qualquer outro meio, a informação sobre a emissão, pelo BES, das cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA (factos provados 341, 342 e343).
O Tribunal a quo detalhou exaustivamente a prova de tais factos (pp.  582 a 604 da sentença recorrida, de que se reproduz infra um extrato de pp. 585-593, ênfase aditado), em termos convincentes, donde resulta não poder deixar de concluir-se pela sustentação do conhecimento da conduta e sua imputação, a título doloso, ao recorrente CC, nos termos  que constam da sentença recorrida e que não merecem reparo:
‘- Resulta do próprio prospeto que (i) “Qualquer decisão de investimento deverá basear-se na informação do Prospeto no seu conjunto e ser tomada após avaliação independente da condição económica, situação financeira e demais elementos relativos ao Emitente e Oferente” (fls. 24-211, maxime fls. 27 v.), (ii) a ESFG detinha uma participação qualificada no BES, sendo o seu principal acionista (fls. 24-211, maxime fls. 174) e que (iii) a informação acerca do montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias configurava informação acerca de operações com partes relacionadas, a prestar aos investidores, sendo de cerca de 290 milhões de euros com referência a 31.12.2013 (fls. 24-211, maxime fls. 29, 175 e 210; fls. 944-1192, maxime fls. 1104 v. a 1106).
- Resulta do prospeto (fls. 24-211, maxime fls. 60 v., 61 e 62) que o arguido CC, enquanto vogal do Conselho de Administração do BES, era responsável pela informação contida no prospeto, nos termos do artigo 149.º do CdVM, e que “As pessoas/entidades que, nos termos consignados supra ou em qualquer secção deste Prospeto, são responsáveis pela informação contida no Prospeto ou numa determinada parte do mesmo declaram que, após terem efetuado todas as diligências razoáveis para se certificarem de que tal é o caso e, tanto quanto é do seu conhecimento, a informação constante do Prospeto ou de partes do mesmo pelas quais são responsáveis está em conformidade com os factos, não existindo quaisquer omissões suscetíveis de afetar o seu alcance.”
Ora, o Recorrente sabia que a informação sobre o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto (cerca de 533 milhões de euros) era necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma, na medida em que a informação em falta no prospeto constituía alteração a informação constante do prospeto (com referência a 31.12.2013), relativa a “Operações com Entidades Terceiras Especialmente Relacionadas”, representando uma variação superior a 83 % (de 290 M € para 533 M €). (fls. 24-211, maxime fls. 29 e 210; fls. 1193-1216; cd de fls. 2245, pasta “CA”, ficheiro “(305) 15 05 2014”; fls. 2282-2729, maxime fls. 2287-2290; cd de fls. 3223, ficheiro “20140509_Acta Comissão de Controlo de Transacções com Partes Relacionadas”; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226 e 3226 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3686 v. e 3687; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139).
Sabia, também e a regras da experiência comum não acomodam distinta asserção, que as operações com entidades terceiras especialmente relacionadas, na medida em que envolvem muitas vezes um conjunto alargado e complexo de relações e estruturas e podem não ser realizadas segundo termos e condições de mercado normais, são operações que, pela sua própria natureza, envolvem um risco de inadequado relato financeiro, sendo assim relevante para os investidores conhecer o montante dessas operações. […]
Repete-se: o Recorrente CC tinha, por força das suas funções, uma visão singular sobre toda a atuação do GES, decorrendo dos factos provados que, em todos os momentos, independentemente da tarefa material de elaboração do prospeto (em execução do pré-determinado pelo Conselho de Administração), manteve, na qualidade de presidente da CE do BES, o domínio, de facto (e de direito) sobre a elaboração do Prospeto, dado que toda a informação omitida era do seu conhecimento pessoal e direto.
Os factos imputados ao Recorrente CC são factos próprios, em que, sem prejuízo do conhecimento (e envolvência) dos seus inferiores hierárquicos (e dos demais Recorrentes), teve atuação pessoal e direta (assim sucedeu nas AGs do BESA de 3 e 21 ed Outubro de 2013, na obtenção da garantia soberana, nas cartas de conforto que entregou ao Recorrente EE já previamente por si assinadas, no aumento da exposição do BES à ESFG, ocorrido no quadro das determinações específicas do Banco de Portugal de que, também, era destinatário directo, conforme resulta, à saciedade, da documentação supra escalpelizada e criticamente analisada que, de modo bastante, retrata essa mesma intervenção).
Os factos refletem, de modo consistente, que atuou com representação da anti-normatividade da conduta e com intenção de violar as normas de dever que sobre si impendiam. […]
Desde logo, o Recorrente bem sabia que um dos principais riscos a que o BES estava sujeito era o risco de crédito (cfr. prospeto de aumento de capital a fls. 24-211, maxime fls. 37 v., 50 v., 51, 182 e 184 v.), bem sabendo que  o BESA era uma subsidiária do BES, a qual consolidava nas contas do BES (cfr. prospeto de aumento de capital a fls. 24-211, maxime fls. 33 v., 45-45 v., 54, 81-81 v., 85 v. e 95 v.) e que o BESA era uma importante subsidiária do BES no seu plano de negócios de expansão internacional (cfr. prospeto de aumento de capital a fls. 24-211, maxime fls. 83).
O Recorrente CC (fls. 1521-1582, maxime fls. 1524 a 1549 e 1572) participou nas reuniões da Assembleia Geral do BESA de 3 e 21 de outubro de 2013, em representação do BES, tendo (pelo menos) nessa sede e datas tomado conhecimento direto sobre a grave situação financeira e patrimonial do BESA, resultante da deteção de uma fraude ao nível da sua carteira de crédito e do seu portfólio de ativos imobiliários.
Compulsada a acta da reunião da Comissão Executiva do BES de 19.06.2014 verifica-se que o Recorrente CC participou pessoalmente nas diligências que conduziram à decisão de emissão da garantia soberana a favor do BESA pelo Presidente da República de Angola, com vista a resolver a grave situação financeira e patrimonial do BESA detetada em outubro de 2013 (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “3 19-06-2014 a 01-08-2014”, ficheiro “(1528) 19 06 2014”, ponto 02:01:00 da ordem de trabalho).
Donde, não pode senão concluir-se, que o Recorrente CC sabia que os problemas detetados ao nível da carteira de crédito e do portfólio de ativos imobiliários do BESA eram suscetíveis de refletir-se negativamente, não apenas nas contas do próprio BESA, mas também nas contas do BES e no plano de negócios do BES de expansão internacional, pelo que a informação acerca da real situação financeira e patrimonial do BESA (para mais, com origem em fraude imputável ao anterior Presidente da Comissão Executiva do BESA) era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma.
Que o Recorrente sabia que a informação omitida no prospeto era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma, resulta evidenciado no facto de tal informação respeitar ao real motivo na origem da emissão da garantia soberana pela República de Angola referida no prospeto, constituindo, portanto, alteração a informação constante do prospeto.
Na verdade, do ponto 2.1.23 do prospeto (fls. 24-211, maxime fls. 54) constava que:
 “Tendo como fundamento a relevância do BES Angola no financiamento das empresas Angolanas inseridas no setor privado não petrolífero, em particular em áreas consideradas estratégicas para o desenvolvimento económico de Angola e, o seu envolvimento preponderante em operações creditícias de significativa importância para a implementação dos objetivos constantes do Plano Nacional de Desenvolvimento de Médio Prazo para os anos 2013-2017, o Estado Angolano concedeu ao BESA, em 31 de dezembro de 2013, uma garantia soberana, autónoma e exigível à primeira solicitação do beneficiário, no montante global de até USD5.700 milhões (equivalente a €4.200 milhões em 31 de dezembro de 2013).
Reconhecendo que no contexto global de recuperação económica do setor empresarial Angolano as empresas e os investidores podem não apresentar as condições de tesouraria necessárias para fazer face ao cumprimento atempado das respetivas responsabilidades, o Estado Angolano estabeleceu esta garantia como forma de proteger o banco de eventuais atrasos e incumprimentos na liquidação dos ativos, cobrindo crédito e juros, que beneficiam da garantia (créditos e valores de venda de imóveis).”
O Recorrente CC desempenhava funções de Presidente da Comissão Executiva do BES, pelo que, bem sabia também que tal informação era necessária para que os destinatários da oferta pudessem fazer juízos fundados sobre a mesma, na medida em que se reportava ao BESA, uma subsidiária importante do BES, em Angola, que tinha reflexos a nível das contas consolidadas do BES, bem como no plano de negócios do BES de expansão internacional.
A relevância do BESA enquanto subsidiária do BES resulta também evidente da lista de informação solicitada pelo sindicato bancário no âmbito da due diligence levada a cabo por aqueles ao BES em paralelo com o processo de elaboração do prospeto de aumento de capital (a fls. 4829-4841, maxime fls. 4830 e 4841 e fls. 5852-5863, maxime fls. 5852 v. e 5863 v.).
[…]
Por outro lado, decorre da apresentação acerca do aumento de capital efetuada ao Conselho de Administração do BES em 20.06.2014 (cd de fls. 2245, pasta “CA”, subpasta “Anexos”, subpasta “CA 20140620”, ficheiro “2. Resultados do aumento de capital do BES”, p. 17 e fls. 5864-5882 v., maxime fls. 5872 v.), quanto ao feedback do roadshow, que uma das principais preocupações dos investidores era Angola, concretamente “Concerns related to asset quality (namely guarantee), leverage/LTD and corporate governance. Low visibility to improve depressed profitability”, ou seja, havia preocupações dos investidores com a qualidade dos ativos do BESA e com a garantia soberana emitida a favor daquele.
Na verdade, que a garantia soberana fora emitida para resolver a grave situação financeira e patrimonial do BESA detetada no final de 2013 com reporte à carteira de crédito do BESA (informação que era do conhecimento do arguido CC e foi omitida no prospeto) resulta da mera leitura do sentido normal das palavras vertido na ata da reunião da Comissão executiva de 19.06.2014, na qual o arguido CC refere que
“em Outubro de 2013, tinha tido ocasião de ser recebido, juntamente com o Dr. AA e o Dr. LLL, pelo Senhor Presidente da República de Angola, para agradecer a decisão de conceder uma garantia soberana ao BES Angola para cobertura de uma carteira de créditos detidos por esta entidade” (cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “3 19-06-2014 a 01-08-2014”, ficheiro “(1528) 19 06 2014”, ponto 02:01:00 da ordem de trabalho).
O Recorrente, CC, conhecedor da situação financeira e patrimonial que motivou a emissão da garantia soberana referida no fator de risco 2.1.23 do prospeto de aumento de capital e da informação que foi divulgada no Prospeto, sabia que fez constar do Prospeto informação que não era completa, porquanto não continha informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação. (fls. 24-211; fls. 1521-1582, fls. 2282-2729, maxime fls. 2282-2284 v. e 2314-2518 v.)
O Recorrente CC pese embora a sua participação e envolvência diretas, representação e conhecimento dos factos que antecede, não adotou durante o período de tempo entre a decisão de realização do aumento de capital e a liquidação financeira do mesmo, qualquer medida adequada a sanar os vícios da informação constantes do Prospeto quanto à situação financeira e patrimonial do BESA detetada em finais de 2013.
[…]
O Recorrente representou e quis tudo o que antecede, atuando livre, deliberada e conscientemente, não tendo sobrevindo qualquer evidência em contrário. Atuou com representação da anti-normatividade da sua conduta e com intenção de a postergar.
Não se apurou facto, condição ou circunstância que tenha retirado a formação da vontade e a representação e motivação com que o Recorrente atuou.
As suas particulares condições, pessoais e funcionais, acima discriminadas concorrem, apreciadas à luz das regras da experiência comum e da normalidade social, para uma atuação reconduzível ao disposto no artigo 14.º, número 1 do Código Penal. Além de se ter demonstrado uma atuação dolosa, o que arreda qualquer atuação em erro ou existência de causa de exclusão da culpa ou da ilicitude, a verdade é que não sobreveio qualquer elemento de facto que perfuntoriamente indicie falta de representação e vontade ou atuação em erro sobre a fatualidade típica, ou qualquer outra.’
Nos termos do disposto no artigo 14.º, n.º 1, do Código Penal ex vi artigo 32.º do RGCO, para que o agente tenha atuado com dolo é necessário que tenha atuado com conhecimento (elemento cognitivo) e vontade (elemento volitivo) de realização do tipo objectivo de ilícito[68].
No caso presente, ambos os elementos (intelectual e volitivo) estão preenchidos, tendo resultado demonstrado na sentença recorrida o conhecimento e vontade do recorrente CC na prática dos factos descritos.
Com efeito, o recorrente CC conhecia os factos descritos no elenco de factos provados, porquanto se trata de factos próprios, em que interveio e que controlou.
Não obstante, quis praticar aqueles factos, decidindo:
(i) não incluir no prospeto informação que era do seu conhecimento e necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma e
(ii) não requerer adenda ao prospeto relativamente a factos ocorridos após a divulgação do prospeto e até à admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, que eram do seu conhecimento e eram relevantes para a decisão dos destinatários.
Assim, a decisão de não levar ao conhecimento dos investidores, no prospeto de aumento de capital do BES de 2014 e através de adendas ao mesmo, informação que era do seu conhecimento e necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma, nos termos referidos, foi um ato representado, pretendido e atuado pelo recorrente CC.
Improcede, pois, o alegado pelo recorrente CC, com fundamento na inexistência de dolo ou negligência.
Recorrente CC
Apurou-se na sentença recorrida que:
- o recorrente DD era administrador executivo do BES e aprovou o prospeto (factos provados 353 e 365 a));
- o recorrente DD tinha conhecimento de que o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação, e de que tal informação não constava do Prospeto Factos provados (factos provados 360, 361 e 365 d) e e));
- o recorrente DD tinha conhecimento de que a informação sobre o facto de o BESA, no final do ano de 2013, ser titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização era próximo de zero, bem como de conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma (factos provados 362 e 365 f).
O Tribunal a quo detalhou exaustivamente a prova de tais factos (pp.  605 a 642 da sentença recorrida, de que se reproduz infra um extrato de pp. 627-642, ênfase aditado), em termos convincentes, donde resulta não poder deixar de concluir-se pela sustentação do conhecimento da conduta e sua imputação, a título doloso, ao recorrente CC, nos termos  que constam da sentença recorrida e que não merecem reparo:
‘[…] Estas razões de ser, pese embora a invulgaridade subjacente – uma garantia soberana e no valor de 5,7 mil milhões de dólares – não foram levadas ao Prospeto, embora o Recorrente DD soubesse exatamente o que justificara a emissão da sobredita garantia e é essa a imputação fáctico-normativa que sobre si impede.
Ora, como o Recorrente bem sabe, porque uma vez mais isso consta de documentos subscritos por PP (de que foi destinatário) foi, precisamente, a comprovação e objetivação desses dados que conduziu à emissão da garantia soberana, que tinha um objecto delimitado – vertido nos Anexos, que não foram divulgados nem ao Banco de Portugal nem no data-room – com características próprias de acionamento (que suscitaram, por exemplo, dúvidas ao Banco de Portugal sobre se poderia merecer a qualificação de on first demand) e com a duração de apenas 18 meses.
[…]
Com efeito, resulta de fls. 1809, pasta 5, CD, CE ANEXOS, CE 20140219, qual é, exatamente, o escopo do AQR, não sendo aquele que procurou transmitir ao Tribunal, pois que na reunião da Comissão Executiva o mesmo foi apresentado como segue:
O Recorrente não tinha, pois, qualquer empreitada ou exercício em curso destinados a aferir a concretude e completude da situação financeira e patrimonial do BESA detetada em Outubro de 2013, que se encontrava já devidamente estabilizada e documentada, tendo o próprio BESA (na pessoa de LLL e demais acionistas destinatários das Atas da AG de 3 e 21.10.2013) e o BES (nas pessoas dos Recorrentes CC, AA e DD) dispensado a necessidade de ulteriores procedimentos de detalhe ou comprovação, antes avançando para a obtenção da garantia soberana, em 31.12.2013.
Naturalmente que, o que antecede, não inviabiliza que, terceiros, exógenos à gestão, direcção e apresentação das contas do BES e do BESA, no quadro das suas próprias prerrogativas de atuação e sindicância estivessem a supervisionar o BES e o BESA (como a E...), debruçando-se sobre a qualidade da sua carteira de crédito e de ativos imobiliários e, nesse decurso, se tivessem deparado com a garantia soberana, aquilatando, para as respectivas e próprias finalidades, os corolários decorrentes da mesma.
Sem prejuízo, essas condutas, paralelas e exógenas, são deveras posteriores e fáctico-normativamente irrelevantes face à imputação assacada aos Recorrentes: a omissão no prospeto das razões que fundaram a emissão da garantia soberana, em 31 de Dezembro de 2013, no valor de 5,7 mil milhões de dólares, fundada na grave situação financeira e patrimonial detetada em Outubro de 2013.
[…]
A argumentação de que a garantia soberana permitiria melhorar os ratios prudenciais do BES é exógena ao objecto dos autos (trata-se de matéria da competência do Banco de Portugal e não da CMVM) e inócua, fatual e normativamente, pois, como o Recorrente bem sabe, o Banco de Portugal, nunca reconheceu a garantia soberana para esse efeito (pese embora as diligências empreendidas pelo BES para tanto).
A este propósito, remete-se, de novo, para o depoimento de OO, à data em funções no Departamento de Supervisão do Banco de Portugal, cujo depoimento foi já acima escalpelizado, que assim o confirmou.
XI. O Recorrente DD argumenta que só teve conhecimento dos concretos termos da garantia soberana em 31 de Janeiro de 2014, aquando da apresentação da mesma no CA do BES, por parte do Recorrente AA.
E, de facto, tal alegação pode aceitar-se, mas a mesma nem põe em causa a imputação: a omissão no prospeto, pelo Recorrente DD (na qualidade de Administrador Peloureiro do DAJ e atento o seu conhecimento e envolvência nos temas associados às Atas da AG do BESA) aprovado em 15 de Maio de 2014, das reais razões de ser que levaram à emissão da garantia soberana (situação financeira e patrimonial detetada no BES em Outubro de 2013).
Veja-se, contrariando uma vez mais a versão do Recorrente e reforçando a convicção do Tribunal no sentido da demonstração dos factos tal como descritos na decisão recorrida, a documentação junta aos autos.
Compulsando o teor da sobredita reunião do CA de 12.2.2014 (pasta 5, fls. 2245) é inequívoco que - contrariamente ao vertido no Prospeto - a mesma é ali comunicada e tida como «determinante» porque «cobre um montante muito relevante de ativos de crédito e imobiliários na carteira do Banco».
Reitera-se: não existe, por seu turno no prospeto, menção ou elemento que inculque em qualquer destinatário médio, a convicção de que existe alguma interligação entre a génese da emissão da garantia soberana e a carteira de crédito e de ativos de imobiliário do BESA (cfr. fls. 54 dos autos).
De igual sorte, a documentação exibida na acta da reunião do CA de 15 de Maio de 2014, dá nota de uma conexão entre a emissão da garantia soberana e protecção de ativos da carteira de crédito e imobiliário do BES, mas essa interligação não só não foi carreada para o Prospeto, como, no mesmo, foi ensaiada uma fundamentação relacionada com a economia Angolana e dificuldades de tesouraria de empresas petrolíferas, com o que se justificou a necessidade de obtenção de uma garantia soberana a favor de um banco privado.
XII. Não se alcança em que medida a discussão, em 12 de Fevereiro de 2014, na sobredita reunião do Conselho de Administração do BES, de um Parecer Jurídico atinente à validade, eficácia e caractér on first demand da Garantia atenua as exigências, que recaem sobre o arguido, de aportar informação atual, verdadeira e completa para o Prospeto.
 Na verdade, essa discussão e controvérsia concorrem em sentido contrário, isto é, agudizando a intensidade dos deveres que recaiam sobre o Recorrente.
Com efeito, a existência de um Parecer Jurídico, de natureza não graciosa, sobre a garantia soberana reforça a convicção do Tribunal de que a garantia soberana suscitou, invariavelmente, junto de terceiros equidistantes, reservas, dúvidas e incertezas.
De que outra maneira se compreende a necessidade de ser obtido um Parecer Jurídico Português sobre uma garantia soberana emitida por um Estado Soberano, no quadro da sua autodeterminação e a favor de um Banco Angolano privado? Por que razão pretende um parecer jurídico incidir e, nessa medida, substituir, o cotejo crítico, por terceiros equidistantes, do teor dos anexos da Garantia (segmento onde constava a extensão e detalhe da cobertura) cujo teor foi, invariavelmente, sonegado quer ao sindicato bancário, quer ao Banco de Portugal?
[…]
XIII. O comportamento de sonegação da realidade fundante da emissão da garantia soberana assumiu tal dimensão, que foi até tida por necessária a validação, por parte de uma sociedade de Advogados terceira, para que as Atas das AG do BESA de 3 e 21 de Outubro de 2012, fossem disponibilizadas nos data-room do aumento de capital (pasta 5, fls. 2245), nos termos constantes nos factos provados (facto 378).
E isto pese embora, logo em 28 de Abril de 2014, o coordenado do DAJ do BES ter aventado que essas atas «deveriam ser exibida juntamente com a restante documentação que o BESA venha a disponibilizar para a due diligence», pois, como assinala, «temos mais de um pedido dos Advogados do aumento de capital para analisar a documentação referente ao BESA» - cfr. fls. 1570 dos autos
XIV. Por último, uma palavra para a menção, reiterada pelos Recorrentes, à veiculação de notícias sobre o BESA, em Junho de 2014, particularmente a capa do Semanário ... de 7 de Junho (junto a fls. 10506).
Ao longo do julgamento e nos doutos articulados de recurso, o Recorrente (e alguns dos demais) manifestaram, reiteradamente, incómodo pela veiculação da notícia, que dá nota de que o «BES ANGOLA perdeu o rasto a 5,7 mil milhões». 
Como o Recorrente bem sabe, a notícia tinha informação que há muito era do seu conhecimento e há muito se encontrava devidamente documentada, não se compreendendo porque é que não tendo o Recorrente atuado no sentido de que tal informação fosse veiculada aos subscritores da Oferta Pública de Subscrição nem aos supervisores, então, a partir daquela notícia considerava, por si, «satisfeito» o dever de comunicação, transparência e aporte para o Prospeto de informação atual, completa e verdadeira.
Ainda menos se compreende a alegação de que, em face da notícia (da entrevista concedida pelo Recorrente CC ao ...), a Recorrida, CMVM, deveria ter impulsionado a promoção de uma Adenda ao Prospeto.
Como o Recorrente bem sabe, eram os Recorrentes quem i) detinham o controlo e acesso da informação relevante; ii) tinham o dever legal de promover, verificados os respectivos requisitos legais, a inscrição de uma Adenda ao Prospeto; iii) não eram os Autores ou os responsáveis pelo conteúdo da notícia, pelo que não é, certamente, a partir da mesma que se observa o dever legal que sobre si impendia nem é a partir do seu cotejo, que é exógeno à vontade do emitente, que a Recorrida podia exercer os seus poderes de atuação.
[…]
O Recorrente atuou com representação da anti-normatividade da sua conduta e com intenção de inobservar a norma de dever legal que sobre si impendia.
Não sobreveio a demonstração de qualquer factualidade que arredasse a atuação dolosa com que atuou, nem se demonstrou factualidade que permitisse suportar a alegada atuação «em erro», excludente da ilicitude da sua conduta, nem outra causa de exclusão da ilicitude ou da culpa.
O Recorrente atuou, invariavelmente, de modo livre, deliberado e conscientemente.’
Com efeito., nos termos do disposto no artigo 14.º, n.º 1, do Código Penal (aplicável ex vi artigo 32.º do RGCO), para que o agente tenha atuado com dolo é necessário que tenha atuado com conhecimento (elemento cognitivo) e vontade (elemento volitivo) de realização do tipo objectivo de ilícito[69].
No caso presente, ambos os elementos (intelectual e volitivo) estão preenchidos, tendo resultado demonstrado na Sentença recorrida o conhecimento e vontade do recorrente DD na prática dos factos descritos.
Com efeito, o arguido recorrente DD conhecia os factos descritos no elenco de factos provados, porquanto se trata de factos próprios, em que interveio e que controlou.
Não obstante, quis praticar aqueles factos, decidindo:
(i) não incluir no prospeto informação que era do seu conhecimento e necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma e
(ii) não requerer adenda ao prospeto relativamente a factos ocorridos após a divulgação do prospeto e até à admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, que eram do seu conhecimento e eram relevantes para a decisão dos destinatários.
Assim, a decisão de não levar ao conhecimento dos investidores, no prospeto de aumento de capital do BES de 2014 e através de adendas ao mesmo, informação que era do seu conhecimento e necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma, nos termos referidos, foi um ato representado, pretendido e atuado pelo recorrente DD.
Improcede, pois, igualmente, o alegado pelo recorrente DD, com fundamento na inexistência de dolo ou negligência, bem como a totalidade do presente segmento recursivo.

II.16 – Da inexigibilidade de conduta diversa aos arguidos
Alega o recorrente AA (conclusões 259ª a 270ª) que não lhe era exigível conduta diversa da que teve, tendo em conta:
(i) as funções desempenhadas no BES, designadamente durante o aumento de capital,
(ii) a impossibilidade de verificar a correção da informação constante do prospeto,
(iii) o facto de ter dotado o BES dos meios necessários e
(iv) o facto de os departamentos do BES terem assegurado a legalidade da informação,.
Vejamos.
Quando se afirma que não era exigível ao agente a adoção do comportamento que lhe era imposto pela norma não está em causa a ilicitude do facto, mas a exclusão da culpa do agente: o homem médio, uma vez colocado na posição em que se encontrou o agente, não teria adotado um comportamento distinto do adotado pelo agente.
Enquanto causa de exclusão da culpa, a inexigibilidade ocorre quando
relativamente a certos factos se revele uma sensível desconformidade entre a sua censurabilidade externo-objetiva e a «essência de valor» da personalidade neles plasmada, tal como resulta nomeadamente da atitude global do agente ou das suas «intenções fundamentais» perante as exigências jurídico-penais. Verificando-se que uma tal desconformidade tem a sua origem numa pressão imperiosa de momentos exteriores à própria pessoa, que não encontram nesta um «eco» favorável, antes «estorvaram» ou «desviaram» o cumprimento normal das suas intenções fundamenais, deverá então a culpa considerar-se excluída por inexigibilidade de um comportamento conforme ao direito.”[70]
A inexigibilidade não configura uma causa geral de exclusão da culpa, operando apenas ‘nas hipóteses em que a lei tenha entendido exprimi-la’ [71] – o estado de necessidade desculpante (artigo 35.º do CP) e o excesso de legítima defesa desculpante (artigo 33.º do CP).
Independentemente da discussão sobre a aplicabilidade da figura da inexigbilidade enquanto cláusula geral de exclusão da culpa (não legalmente prevista no direito penal ou no de mera ordenação social), apreciemos se procedem os fundamentos avançados pelo recorrente AA em sustento da alegada inexigibilidade de conduta distinta da que adotou.
Resulta dos factos provados, que o Recorrente AA era administrador e membro da Comissão Executiva do BES e aprovou e participou no processo de elaboração do prospeto (factos 215, 218 e 234 a)), sendo, por isso, responsável pelo seu conteúdo.
O recorrente AA tinha o dever de agir no sentido de garantir o cumprimento, pelo emitente, dos deveres previstos nos artigos 135.º, n.º 1, e 142.º, n.º 1, do CdVM, designadamente quanto à qualidade da informação constante do prospeto, tendo em conta:
(i) as funções que exercia no BES,
(ii) a concreta participação que teve no processo de elaboração e aprovação do prospeto (melhor detalhada supra, secção II.15), e
(iii) o facto de conhecer a informação omitida que era necessária para a decisão dos destinatários da oferta (como descrito supra, secção II.15).
Enquanto administrador executivo, estava na disponibilidade do recorrente AA orientar o emitente para o cumprimento do dever de garantir a qualidade da informação constante do prospeto, bem como do dever de requerer a divulgação de adendas ao prospeto, actuando no sentido de nele fazer constar informação omitida, relevante para a decisão dos destinatários da Oferta, de que tem conhecimento.
Não só era exigível ao recorrente que atuasse de acordo com as citadas normas  –conformando a sua conduta com o dever de assegurar a qualidade de informação constante do prospeto – como tal lhe era possível: o recorrente conhecia a informação omitida e que esta era relevante para a decisão dos destinatários da Oferta, enquanto administrador do emitente BES.
Improcede, pois, a inexigibilidade de conduta diversa invocada pelo recorrente AA, e com ela o presente segmento recursivo.

II.17 – Do erro sobre a factualidade típica
Alegam os recorrentes CC (conclusões 202 a 209, infra reproduzidas) e DD (conclusões 95 a 99) que teriam atuado em erro sobre a factualidade típica, o que excluiria o dolo, nos termos do artigo 8. °, n.º 2, do RGCO, ex vi artigo do 407. ° do CdVM.
‘202. Sem prejuízo do supra exposto, a verdade é que, atenta a indeterminabilidade dos tipos contra-ordenacionais aqui em causa, o ora Recorrente sempre teria actuado com erro, quer sobre a factualidade típica, o que sempre excluiria o dolo.
203. Como vimos, no caso concreto, atenta a indeterminabilidade dos tipos contra-ordenacionais previstos e punidos do artigo 393.º, n.º 2 - als. c) e d) do CVM, o ora Recorrente ignorava que os factos imputados preenchessem os elementos dos ilícitos-típicos das contra-ordenações.
204. Primeiro, o ora Recorrente ignorava que a informação incluída no prospecto, a respeito do montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, não seria completa, por existir uma discrepância no valor de € 243 milhões, nem que teria materialidade suficiente para fazer concluir que a informação ali incluída não seria completa ou que a mesma permitia «aos destinatários formar juízos fundados sobre a oferta».
205. Segundo, o ora Recorrente ignorava que a informação incluída no prospecto, a respeito do BESA, não seria completa, nem que a inclusão de tal informação fosse necessária para que os destinatários formassem juízos fundados sobre a oferta.
206. Tanto que, como já referido, o risco de crédito do BESA estava plenamente assegurado pela garantia soberana prestada pelo Estado Angolano, motivo pelo qual a K... nunca exigiu provisionamento do crédito (ou registo de imparidades) concedido pelo BES ao BESA, em cerca de € 3.6 mil milhões, nem do crédito concedido pelo BESA a clientes, precisamente por causa da validade e eficácia da garantia.
207. Terceiro, o ora Recorrente ignorava que a concessão do financiamento de € 194 milhões à ESFGtivesse materialidade suficiente, para constituir uma informação relevante para a decisão dos destinatários.
208. Quarto, se o BES nunca se constituiu na posição de garante da obrigação de reembolso da ESI a favor das sociedades do grupo PDVSA, é evidente que a emissão de tais cartas de conformo não podem constituir um facto relevante para a decisão dos destinatários que justificasse a aprovação de uma adenda e, desse modo, que a respectiva omissão pudesse consubstanciar uma violação do dever de actualizar o prospecto do aumento de capital do BES de 2014, prevista e punida no artigo 393.º, n.º 2 – al. c) do CVM.
209. Em suma, e subsidiariamente, é forçoso concluir que o ora Recorrente sempre teria actuado com erro sobre a factualidade típica, o que sempre afastaria o dolo, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 8.º, n.º 2, do RGCO, ex vi artigo 407.º do CVM.’
’95. Sem prejuízo do supra exposto, a verdade é que, em qualquer caso, a sentença recorrida incorre em Erro de Direito – em particular, a errada interpretação e aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 8.º do RGCO, aplicável ex vi artigo 407.º do CVM – quando afasta a aplicação (invocada a título subsidiário) do instituto do erro sobre a factualidade típica que sempre afastaria a pretensa atuação dolosa do Recorrente DD.
96. Atendendo à matéria de facto provada, o Recorrente DD sempre teria atuado em erro sobre a factualidade típica, o que sempre afastaria o dolo, ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 8.º do RGCO, aplicável ex vi artigo 407.º do CVM, na medida em que, por dois motivos essenciais, o Recorrente ignoravaque apretensa informação segundoaqual oBESA, “no final de 2013, [seria] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares,cujovalorderealização[seria]próximo de zero, bem comodeum conjuntode créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação” (alicerce da acusação e da decisão em matéria do BESA) pudesse e devesse ser incluída no Prospeto.
97. Em primeiro lugar, porquanto o efeito imunizatório da Garantia Soberana emitida pelo Estado Angolanoem31de dezembro de2013 relativamenteaum potencialriscode crédito da carteira de crédito do BESA torna, salvo melhor opinião, e de per si, incorreto, desatualizado, ilícito, falso e enganador afirmar-se, à data da elaboração e aprovação do prospeto (isto é, maio de 2014) que o BESA, “no final de 2013, [seria] titular de créditos e ativos imobiliários, no valor total de 3.9 mil milhões de dólares, cujo valor de realização [seria] próximo de zero, bem como de um conjunto de créditos, no valor total de 1.7 mil milhões de dólares que careciam de reestruturação” (alicerce da acusação e da decisão em matéria do BESA), conforme resulta dos factos provados n.os 384, 385, 386, 432, 433 e 434 da sentença recorrida
98. Em segundo lugar, e sem prejuízo de se entender que a informação prestada no Prospeto em matéria de BESA era completa, atual, verdadeira, objetiva e lícita, o Recorrente – que jamais foi peloureiro do BESA – foi informado de que a carteira de créditos do BESA se encontrava a ser auditada, tendo o peloureiro do BESA, Dr. AA, transmitido em sede do conselho deadministraçãodo BESde 20de junhode 2014 e1 de julhode 2014 (eque já havia transmitido ao Recorrente em data anterior), sendo certo que ficou demonstrado que corriam auditorias à carteira de créditos do BESA (cfr. factos provados n.os 383, 384, 385 e 433 da sentença recorrida).
99. Em face do supra exposto, e ao contrário do que sustentou a sentença recorrida, o Recorrente DD sempre teria atuado em erro sobre a factualidade típica, o que sempre afastaria o dolo, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 8.º do RGCO, aplicável ex vi artigo 407.º do CVM.’
Os recorrentes teriam, assim, alegadamente agido sem representação dos elementos do tipo de ilícito ‘prestação de informação sem qualidade’ (previsto nos artigos 135.º, n.º 1, do CdVM, conjugado o artigo 393.º, n.º 2, alínea d), do CdVM e no artigo 142.º, n.º 1, do CdVM, conjugado com o artigo 393.º, n.º 2, alínea c), do CdVM), por ignorarem  que a informação omitida no prospeto e em adendas ao mesmo era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma.
Vejamos.
Nos termos do disposto no artigo 8.º, n.º 2, do RGCO, o ‘erro sobre elementos do tipo, sobre a proibição ou sobre um estado de coisas que, a existir, afastaria a ilicitude do facto ou a culpa do agente exclui o dolo’.
Por outras palavras, o ‘erro sobre os elementos de facto e de direito do tipo exclui o dolo, ou seja, a falta ou a errada representação dos elementos do tipo afasta o dolo do tipo da contraordenação’[72].
Esta questão foi já apreciada na sentença recorrida, na qual se pode ler, quanto ao recorrente CC, o seguinte (pp. 699-701, ênfase aditado):
Segundo aventa, agiu sem representação dos elementos do tipo-de-ilícito prestação de informação sem qualidade (previsto nos artigos 135.º, n.º 1, do CdVM, conjugado o artigo 393.º, n.º 2, alínea d), do CdVM e no artigo 142.º, n.º 1, do CdVM, conjugado com o artigo 393.º, n.º 2, alínea c), do CdVM), em virtude de (alegadamente) ignorar que a informação omitida – (i) quanto ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data da aprovação do Prospeto, (ii) quanto à situação financeira e patrimonial do BESA apurada em finais de 2013, na origem da emissão pela República de Angola, em 31.12.2013, da garantia soberana a favor do BESA e quanto à exposição do BES ao Grupo Rio Forte, (iii) quanto ao aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG, na sequência dos financiamentos concedidos em 30.05.2014, (iv) quanto à emissão, pelo BES, das cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA e (v) quanto ao aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo Rio Forte, por força do financiamento concedido em 12.06.2014 – era necessária para que os destinatários da Oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma.
Estaria, portanto, conclui o arguido CC, em erro sobre a relevância da informação omitida para a decisão dos destinatários a Oferta.
Esta alegação é inconciliável e infirmada pelos elementos probatórios constantes dos autos e que, concorrendo para a formação da convicção do Tribunal, suportaram a matéria de facto que se apurou, em juízo, abaixo discriminada.
O arguido CC sabia que:
(i) do prospeto devia constar informação acerca da situação financeira do BES para que os destinatários da oferta pudessem formar juízos fundados sobre a mesma;
(ii) o Grupo ESFG e subsidiárias constituía parte relacionada do BES;
(iii) a informação acerca de operações com partes relacionadas devia ser divulgada no prospeto;
(iv) a informação constante do prospeto quanto à exposição do BES ao Grupo ESFG, com referência a 31.12.2013, (290 M €) era muito inferior à exposição do BES ao Grupo ESFG à data da aprovação do prospeto (533 M€);
(v) na sequência dos financiamentos concedidos pelo BES ao Grupo ESFG, em 30.05.2014, a exposição do BES ao Grupo ESFG aumentou para 727 M €, um valor muito superior ao valor da exposição do BES ao Grupo ESFG constante do prospeto, com referência a 31.12.2013, (290 M€);
(vi) o BESA era uma subsidiária do BES, a qual consolidava nas contas do BES e era importante subsidiária no plano de negócios do BES, assente na expansão internacional; e
(vii) os graves problemas, detetados em final de 2013, na carteira de crédito e portfólio de ativos imobiliários do BESA estiveram na origem da garantia soberana emitida em 31.12.2013 pela República de Angola, referida no fator de risco 2.1.23 do prospeto;
(viii) através das duas cartas emitidas em 09.06.2014, o BES assumia o compromisso de reembolsar os títulos representativos de dívida emitidos pela ESI, que ascendiam a 372 milhões de dólares, a dois investidores institucionais, o que contrariava o constante do fator de risco 2.1.19. do prospeto, nos termos do qual o BES não era responsável pelo reembolso dos instrumentos de dívida emitidos pela ESI.
Para se poder concluir pela verificação do dolo do tipo-de-ilícito prestação (aos investidores) no prospeto de informação sem qualidade, o que se exige é a verificação de que o agente tivesse tomado conhecimento que (i) estava a ser prestada informação aos investidores, (ii) que essa informação não tinha qualidade e (iii) era necessária para a decisão dos destinatários da oferta. Ora, como se sinalizou, apurou-se em audiência de discussão e julgamento que o arguido CC (i) sabia e quis que fosse prestada informação aos investidores sobre a situação financeira e patrimonial do BES, (ii) sabia e quis que fosse prestada (aos investidores) informação sem qualidade (quanto à exposição direta do BES ao Grupo ESFG, quanto à situação financeira e patrimonial do BESA e quanto à responsabilidade do BES pelo reembolso de instrumentos de dívida emitidos pela ESI) e (iii) sabia que a referida informação era necessária para a decisão dos destinatários da oferta.
Improcede o peticionando, por carecer de respaldo de facto e de direito’.
Quanto ao alegado pelo recorrente DD, refere-se a sentença recorrida nos seguintes termos (pp. 704-705, ênfase aditado):
Dão-se por reproduzidos os subsídios da doutrina e da Juriprudência convocados supra a propósito de semelhante alegação por parte do Recorrente CC, a bem da economia desta sentença.
Tais subsídios arredam in totum o que alega, quer por que soçobram os pressupostos de facto, quer por que soçobram os de direito.
O acervo de factos apurado – atuação dolosa, de modo livre, deliberado e consciente – não ampara o alegado, que não encontra respaldo, sequer perfuntório, nos factos.
Reitera-se que os elementos que integram a norma de dever não contêm a pretendida indeterminabilidade e são dirigidos a um destinatário específico e qualificado, como era o caso do Recorrente DD.
No quadro das concretas idiossincrasias em que exercia as suas funções, o Recorrente deteve, invariavelmente, o domínio de facto da informação que era vertida e omitida no prospeto, sendo que, com a sua conduta (acima escalpelizada) concorreu, por ação e por omissão, para a postergação da norma de dever, bem sabendo que a mesma exigia conduta distinta e que atuava contra as suas exigências normativas.’
Da simples leitura destes excertos decorre que a alegação dos recorridos, no sentido terem actuado sem representação da factualidade típica (máxime prestação de informação sem qualidade e sua relevância para as decisões dos investidores) é, parafraseando a sentença recorrida ‘inconciliável e infirmada pelos elementos probatórios constantes dos autos e que, concorrendo para a formação da convicção do Tribunal, suportam a matéria de facto que se apurou, em juízo’ (p. 700).
Não se verificando qualquer erro sobre a factualidade típica por parte dos recorrentes CC e DD, antes perfeita representação da falta de qualidade e omissão de informação no prospeto e da sua relevância para as decisões fundadas dos destinatários da Oferta, improcede o correspondente segmento recursivo.

III – Concurso de infracções e medida concreta das coimas e sanções acessórias [constitucionalidade do artigo 388º, nº 1, alínea a), do CdVM]

III.1 – Do número de contraordenações praticadas em violação dos artigos 135º e 142º do CdVM
Alega o recorrente AA (conclusão 129ª) ter sido condenado pela prática de duas contraordenações relativas ao valor da exposição do BES à ESFG e subsidiárias (à data da aprovação do prospeto, em violação do artigo 135.º, n.º 1, do CdVM, e na sequência dos financiamentos concedidos em 30.05.2014, em violação do artigo 142.º, n.º 1, do CdVM), quando na realidade estava em causa a prática de uma única contraordenação.
Também o recorrente CC (conclusões 127 a 138 e 139 a 145) sustenta estar em causa a prática de apenas uma contraordenação pela violação do dever de prestar informação com qualidade no prospecto de aumento de capital do BES de 2014, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM, e apenas uma contraordenação pela violação do dever previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CdVM.
Vejamos.
Nos termos do artigo 30.º, n.º 1, do CP, (aplicável ex vi do artigo 32.º do RGCO):
O número de crimes determina-se pelo número de tipos de crime efectivamente cometidos, ou pelo número de vezes que o mesmo tipo de crime for preenchido pela conduta do agente.’
Assim, e no que se refere aos processos de contraordenação, para que se possa afirmar a existência de um concurso efetivo é necessário que se verifique (i) violação de várias normas infracionais, e/ou (ii) realização múltiplo do mesmo tipo.
A sentença recorrida (pp. 796-799, infra parcialmente reproduzidas, ênfase aditado), concluiu, à luz do artigo 30.º, n.º 1, do CP, ex vi do artigo 32.º do RGCO, pela verificação de uma situação de concurso efetivo, e, consequentemente, pela condenação:
(i) do arguido AA pela prática de duas contraordenações pela violação do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto, previstas no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM e uma contraordenação pela violação do dever de requerer adenda ao prospeto, previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CdVM, e
(ii) do arguido CC pela prática de duas contraordenações pela violação do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto, previstas no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM e duas contraordenações pela violação do dever de requerer adenda ao prospeto, previstas no artigo 142.º, n.º 1, do CdVM, atenta a pluralidade de vezes que os arguidos violaram as referidas normas de dever.
‘Quanto ao arguido AA
1. O arguido AA é responsável, em concurso efetivo de infrações, a título doloso (artigo 14.º, número 1 do Código Penal), pela prática:
a. Da contraordenação muito grave consubstanciada na violação do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto (artigo 135.º, n.º 1, do CdVM), relativamente à informação acerca do montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data de aprovação do prospeto;
b. Da contraordenação muito grave consubstanciada na violação do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto (artigo 135.º, n.º 1, do CdVM), relativamente à informação acerca da situação financeira e patrimonial do BESA decorrente das reuniões da AG de 03.10.2013 e 21.10.2013 e cartas de 05.11.2013 ao Presidente da República de Angola;
c. Da contraordenação muito grave consubstanciada na violação do dever de requerer adenda ao prospeto (artigo 142.º, n.º 1, do CdVM), relativamente à informação relativa aos financiamentos concedidos pelo BES à ESFG e subsidiárias em 30.05.2014.
[…]
Quanto ao arguido CC
2. O arguido CC é responsável, em concurso efetivo de infrações, pela prática, a título doloso (artigo 14.º, número 1 do Código Penal):
a. Da contraordenação muito grave consubstanciada na violação do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto (artigo 135.º, n.º 1, do CdVM), relativamente à informação acerca do montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias, à data de aprovação do prospeto;
b. Da contraordenação muito grave consubstanciada na violação do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto (artigo 135.º, n.º 1, do CdVM), relativamente à informação acerca da situação financeira e patrimonial do BESA decorrente das reuniões da AG de 03.10.2013 e 21.10.2013 e cartas de 05.11.2013 ao Presidente da República de Angola;
c. Da contraordenação muito grave consubstanciada na violação do dever de requerer adenda ao prospeto (artigo 142.º, n.º 1, do CdVM), relativamente à informação relativa aos financiamentos concedidos pelo BES à ESFG e subsidiárias em 30.05.2014;
d. Da contraordenação muito grave consubstanciada na violação do dever de requerer adenda ao prospeto (artigo 142.º, n.º 1, do CdVM), relativamente à informação relativa à emissão de duas cartas de conforto em 09.06.2014 a garantir a duas sociedades do Grupo PDVSA o reembolso de títulos de dívida da ESI no valor de 372 milhões de dólares.
Com efeito, estava em causa diversa informação omitida no prospeto ou não divulgada através de adenda ao prospeto.
No caso do arguido AA, estava em causa a múltipla violação do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM relativamente:
(i) ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do prospeto;
(ii) à situação financeira e patrimonial do BESA detetada em finais de 2013 que esteve na origem da emissão pela República de Angola, em 31.12.2013, da garantia soberana a favor do BESA; e
(iii) ao aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG, por força dos financiamentos concedidos pelo BES àquelas em 30.05.2014.
No caso do arguido CC, estava em causa a múltipla violação do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM, relativamente:
(i) ao montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do prospeto;
(ii) à situação financeira e patrimonial do BESA detetada em finais de 2013 que esteve na origem da emissão pela República de Angola, em 31.12.2013, da garantia soberana a favor do BESA
Bem como a múltipla violação do dever do dever de requerer adenda ao prospeto, previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CdVM, relativamente:
(iii) ao aumento da exposição direta do BES às sociedades do Grupo ESFG, por força dos financiamentos concedidos pelo BES àquelas em 30.05.2014.
(iv) à emissão, pelo BES, em 09.06.2014, de duas cartas de conforto em favor das sociedades do grupo PDVSA.
Atento o número de vezes que o tipo infracional foi preenchido pela actuação dos agentes, em função da diversa informação omitida ou não aditada ao prospeto, estão em causa múltiplas múltiplas violações das contraordenações previstas nos artigos 135º e 142º do CdVM, como bem decidiu a sentença recorrida, nenhuma censura merecendo quanto ao número de contraordenações pelas quais os recorrentes AA e CC vêm condenados.
Improcede, pois, o presente segmento recursivo.

III.2 – Da existência de infracções continuadas
Alegam os recorrentes AA (conclusões 271ª a 279ª) e CC (conclusões 127 a 138 e 139 a 145) que estaria em causa a prática de uma única contraordenação continuada, por se verificar uma mesma solicitação externa que diminui consideravelmente a culpa do agente, nos termos do artigo 30.º, n.º 2, CP ex vi do artigo 32.º RGCO.
Vejamos.
Nos termos do artigo 30.º, nº 2, do Código Penal (ênfase aditado):
‘Constitui um só crime continuado a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente.’
Decorre da norma vinda de transcrever que são, fundamentalmente, três os pressupostos (cumulativos) para que uma realização plúrima da mesma contraordenação possa ser qualificada como continuada:
(a) proteção do mesmo bem jurídico;
(b) execução de forma essencialmente homogénea e
(c) no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente.
Esta questão foi já apreciada na sentença recorrida (pp. 800-803, infra parcialmente reproduzidas, ênfase aditado), concluindo pela inaplicabilidade em sede de processo de contraordenação da figura do crime continuado, bem como pela não verificação dos respetivos pressupostos legais, ainda que tal figura fosse aplicável:
O legislador conhece e inscreveu opções legislativas, no RGCO, em matéria de concurso de infrações – artigo 19.º - que encerram normatividade própria e, nesse âmbito, não acolheu a figura da contraordenação continuada.
Por outro lado, também o elemento histórico, concorre no sentido da não aplicação da sobredita figura ao ilícito contraordenacional.
Com efeito, no contexto da revisão de 1995, operada ao RGCO através do D.L. n.º 244/95, de 14 de Setembro, havia sido proposta a consignação de uma norma expressa que consagrasse a contraordenação continuada, o que, contudo, após discussão e maturação, não veio a merecer acolhimento.
Finalmente, salvo melhor opinião, a axiologia da figura não encontra amparo no domínio contraordenacional, conforme sustentado pelo Professor Paulo Pinto de Albuquerque[73], acompanhado de subsídios carreados, no mesmo sentido pelo Professor Faria Costa, na obra já aqui citada:
«não se verifica no direito das contraordenações o efeito de diminuição da culpa ética inerente à construção clássica do crime continuado, pela simples razão de que o juízo de culpa no direito das contraordenações se funda apenas na atribuição ao agente de responsabilidade social pelo fato.»
Donde, nem a teleologia, nem o elemento sistémico, nem histórico que presidem ao exercício hermenêutico que aqui se leva a cabo, consentem a convocação do artigo 30.º do Código Penal para estes autos.
Mesmo que assim não se entendesse e em esforço de exaurimento de ponderação de outras soluções de direito, então, impor-se-ia perscrutar, nos factos provados, pela verificação de uma conduta «homogénea» no quadro de uma mesma situação exterior que diminua «consideravelmente a culpa do agente».
Ora, tais exigências, manifestamente, se não verificam no caso sub judice.
Como sinaliza a Recorrida, o supra referido preceito [artigo 30º, nº 2, do CP] exige a constatação de uma situação exógena ao agente, que concorre para a uma diminuição considerável da sua culpa.
Contudo, os factos aqui imputados aos Recorrentes são factos próprios, não respeitam a qualquer unidade de contexto situacional e não se vislumbra qualquer diminuição acentuada da sua culpa; pelo contrário, dado que a manutenção da redação do prospeto correspondeu à vontade dos Recorrentes que, a todo o momento, tiveram o domínio do facto para o alterar e, não o tendo feito, quanto a factos que eram do seu conhecimento, passados ou supervenientes, inobservam o dever de divulgação de informação com qualidade, ínsito nos artigos 135.º, n.º 1, e 142.º, n.º 1, do CdVM.
De igual sorte, também não se divisa a sobredita diminuição sensível da culpa, porquanto, como refere Paulo Pinto de Albuquerque[74],
“[a] diminuição sensível da culpa só tem lugar quando a ocasião favorável à prática do crime se repete sem que o agente tenha contribuído para essa repetição. Isto é, quando a ocasião se proporciona ao agente e não quando ele ativamente a provoca”.[75]
Por último, sempre soçobraria, igualmente, o requisito que exige homogeneidade de execução das condutas, dado que, os factos novos ocorridos após a divulgação do prospeto, tiveram origem em diferentes tipos de condutas ativas – de um lado, operações de financiamento (em 30.05.2014 e 12.06.2014) e, do outro lado, a prestação de garantias através da emissão de cartas de conforto (em 09.06.2014) – e mesmo as operações de financiamento por parte do BES, ocorreram em datas diferentes (30.05.2014 e 12.06.2014) e tiveram diferentes contrapartes (ESFG e subsidiárias, por um lado e Rio Forte, por outro).
Donde e decisivamente, o acervo de factos ilícitos, respeitante à violação do dever de qualidade de informação constante do prospeto, não é o mesmo e foi perpetrado em ocasiões distintas, ainda que a conduta seja, por mais do que uma vez, reconduzível ao mesmo tipo de ilícito, o que também arreda a figura da unidade da resolução ilícita.
Cada conduta reflecte uma resolução ilícita própria e autónoma, pelo que, inexiste óbice à punição dos factos como constituindo tantas contraordenações como o número de vezes em que preencheram o tipo de ilícito que lhes vem imputado – inexistindo uma situação de concurso aparente.
Improcede, pois, o argumentário dos Recorrentes, concluindo-se pela existência de uma relação de concurso real e efetivo entre as contraordenações apuradas (artigo 19.º do RGCO).’
Como bem se recorda na sentença, em termos que subscrevemos e não merecem reparo, não se mostram verificados os pressupostos da figura do crime continuado previstos no artigo 30º, nº 2, do CP, ainda que se admitisse a sua aplicação no quadro contraordenacional em que nos inserimos.
No presente caso, não existe, desde logo, o quadro de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente.
A este propósito, sublinha Jorge de Figueiredo Dias que ‘decisivo para a continuação não é o lugar e o dia das violações, mas a unidade de contexto situacional em que ocorram, isto é, que elas se relacionem contextualmente umas com as outras. Sem prejuízo de dever reconhecer-se que uma proximidade de espaço e de tempo pode ser indício forte da unidade de contexto situacional referida’.[76]
Ora, não obstante a informação conhecida dos recorrentes AA e CC e necessária para que os destinatários da Oferta formassem juízos fundados sobre a mesma devesse ter constado do mesmo prospeto de aumento de capital, ou adenda ao mesmo, durante o limitado período temporal em que durou a Oferta (de 20.05.2014 a 16.06.2014), tais factos não configuram uma situação exógena susceptível de determinar uma diminuição da culpa do agente, porquanto se trata de actos próprios dos recorrentes, como bem se indica na sentença recorrida.
Para que haja uma situação exógena, que do exterior se imponha ao agente por forma a diminuir a culpa deste, não pode ser criada pelo próprio agente.
Tendo-se apurado que foram os recorrentes que, através de atos próprios, por ação e omissão, contribuíram para a violação, por parte do BES da violação das normas previstas nos artigos 135.º, n.º 1, e 142.º, n.º 1, do CdVM, inexiste o contexto situacional exógeno pressuposto da continuação nos termos do artigo 30º, nº 2, do CP.
Ao decidirem divulgar o prospeto sem a necessária qualidade de informação, os recorrentes não se encontram perante a solicitação de uma mesma situação exterior que diminua a respectiva.
Com efeito, a criação e manutenção da redação do prospeto é criada pelo próprio agente, que, em qualquer um dos momentos da preparação, elaboração, aprovação e divulgação daquele documento tem a oportunidade para a alterar no sentido exigido pelo cumprimento das normas contraordenacionais infringidas.
Não o fazendo relativamente a factos que eram do seu conhecimento, quer à data da aprovação do prospeto, quer ocorridos ou conhecidos entre esta e a data da admissão à negociação das novas ações do BES, o agente - conscientemente e sem qualquer situação exterior que o condicione - decide manter a redação do prospeto, na parte em que o mesmo não dá cumprimento ao dever de divulgação de informação com qualidade, decorrente dos artigos 135.º, n.º 1, e 142.º, n.º 1, do CdVM.
Como refere Maia Gonçalves, em consonância com o entendimento jurisprudencial dominante quanto ao requisito em apreço, a ‘diminuição considerável da culpa do agente deve radicar em solicitações de uma mesma situação exterior que o arrasta para o crime, e não em razões de carácter endógeno’.[77]
Assim, entendeu o Tribunal da Relação de Coimbra[78] que ‘a pedra de toque deste requisito será sempre um condicionalismo exógeno ao agente que lhe facilita a recaída e o torna, na circunstância, menos culpado. Assim, se o agente concorre, minimamente que seja, para que esse quadro exterior se desenhe, não pode obviamente aproveitar-se das condições que criou e ver configurada uma situação de continuação criminosa’.
Ora, o conteúdo da informação divulgada no prospeto de aumento de capital do BES de 2014 traduz uma atuação (ativa ou omissiva) querida do agente e sob o seu controlo, em violação do dever que lhe é imposto pelos artigos 135.º, n.º 1, e 142.º, n.º 1, do CdVM, de assegurarem que a informação divulgada no prospeto cumpre com todos os requisitos legais de qualidade de informação, desde a data da publicação do prospeto em 20.05.2014 até à liquidação financeira da Oferta em 17.06.2014.
De resto, tão pouco se verifica a requerida homogeneidade de execução das condutas, na medida em que, pelo menos quanto aos factos novos ocorridos após a divulgação do prospeto, os mesmos se reportam a diferentes tipos de condutas ativas – de um lado, operações de financiamento (em 30.05.2014) e, do outro lado, da prestação de garantias através da emissão de cartas de conforto (em 09.06.2014).
Não obstante preencherem o mesmo tipo de ilícitos, os factos ilícitos respeitantes à violação do dever de qualidade de informação constante do prospeto não são os mesmos e foram praticados em momentos diferentes, expressando diferentes resoluções ilícitas da parte do(s) agente(s).
Neste sentido, o Tribunal da Relação de Évora[79] recordou que (ênfase aditado):
‘[a] chave para determinar a prática de uma única contra-ordenação ou de uma pluralidade de contra-ordenações vai-se encontrar no número de resoluções (uma ou mais do que uma) subjacentes às actividades subsumíveis a determinado tipo contra-ordenacional doloso. Se as diversas actividades são expressão de uma única resolução que a todas elas preside deve afirmar-se a prática de uma única contra-ordenação; se, pelo contrário, há pluralidade de resoluções, as actividades que preenchem um determinado tipo contra-ordenacional integram tantas contra-ordenações quantas as resoluções tomadas.’
Tendo-se apurado o preenchido múltiplo do mesmo tipo de ilícito por parte dos recorrentes AA e CC, incorreram estes na prática de igual número de contraordenações, em regime de concurso efectivo, como bem decidiu o Tribunal a quo.
Improcede, pois, o presente segmento recursivo,

III.3 – Do concurso aparente entre as contraordenações por falta de qualidade da informação constante do prospeto
Subsidiariamente, alega o recorrente CC (conclusões 146 a 156, infra reproduzidas) a ‘existência de um concurso aparente, por consumpção’, por estar em causa ‘uma única resolução típica’ e ‘a salvaguarda do mesmo bem jurídico: a protecção dos investidores e a tutela da confiança destes no regular funcionamento do mercado’, quer no caso da violação do artigo 135.º, n.º 1, do CdVM, quer no caso da violação do artigo 142.º, n.º 1, do CdVM, sob pena de violação do princípio ne bis in idem.
146. A Sentença Recorrida andou mal ao entender que existiria um concurso efectivo entre duas contra-ordenações pela violação do dever de prestar informação com qualidade no prospecto de aumento de capital do BES de 2014, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CVM e entre duas contra-ordenações pela violação do dever de requerer adenda ao prospecto, previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CVM (cfr. páginas 834 e 835 da Sentença Recorrida), porquanto não têm autonomia entre si, reconduzindo-se a situações de claros concursos aparentes (sem conceder).
147. POR UM LADO, sem prejuízo de as infracções imputadas ao ora Recorrente em matéria de violação do dever de prestar informação com qualidade no prospecto, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CVM relativamente ao (i) o montante total dos financiamentos do BES à ESFG e subsidiárias à data da aprovação do prospecto e situação financeira e (ii) à situação financeira e patrimonial do BESA detectada em finais de 2013, que esteve origem na emissão da República de Angola, em 31.12.2013, da garantia soberana a favor do BESA, não têm autonomia entre si, estando, em causa, quando muito, uma única contra-ordenação ou, no limite, uma contra-ordenação continuada, sempre será forçoso concluir pela existência de um concurso aparente, por consumpção.
148. Em primeiro lugar, é imputada ao ora Recorrente uma única pretensa conduta: a aprovação do prospecto conhecendo a informação nele omitida e a não adopção, durante o período de duração da oferta, de qualquer conduta no sentido de sanar os vícios de qualidade de informação do prospecto, que é a expressão de uma única resolução típica (sem conceder).
149. É combase na mesma e única conduta do ora Recorrente, que a Sentença lhe imputa a dupla violação do artigo 135.º, n.º 1, do CVM.
150. Em segundo lugar, está em causa a salvaguarda do mesmo bem jurídico: a protecção dos investidores e a tutela da confiança destes no regular funcionamento do mercado, pelo que é evidente que o desvalor jurídico por cada pretensa violação do n.º 1 do artigo 135.º do CVM é exactamente o mesmo.
151. Assim, as duas contra-ordenações pela violação do n.º 1 do artigo 135.º do CVM não podem ser simultaneamente imputadas ao ora Recorrente por se encontrarem numa relação de concurso aparente, por consumpção.
152. Por conseguinte, caso se considere que o Recorrente praticou as aludidas infracções (sem conceder) apenas poderá, no limite, ser imputada a prática de uma única contra-ordenação ao Recorrente, por cada pretensa violação do n.º 1 do artigo 135.º do CVM, sob pena de violação do princípio ne bis in idem previsto no artigo 29.º, n.º 5, da CRP.
153. POR OUTRO LADO, o que vai exposto vale, mutatis mutandis, para as duas contra-ordenações imputadas ao ora Recorrente consubstanciadas na alegada violação do dever previsto no artigo 142.º, n.º 1, do CVM (i.e., dever de actualizar o prospecto do aumento de capital do BES de 2014).
154. Em primeiro lugar, apenas é imputada ao ora Recorrente uma única pretensa conduta: a não promoção de qualquer diligência no sentido de o BES requerer adenda ao prospecto quanto aos factos supervenientes, que é expressão de uma única resolução típica (sem conceder)
155. Em segundo lugar, o desvalor jurídico por cada pretensa violação do n.º 1 do artigo 142.º do CVM é precisamente o mesmo, porquanto está em causa a mesma pretensa actuação e a salvaguarda do mesmo bem jurídico: a protecção dos investidores e a tutela da confiança destes no regular funcionamento do mercado
156. Assim, as duas contra-ordenações pela violação do n.º 1 do artigo 142.º do CVM não podem ser simultaneamente imputadas ao ora Recorrente por se encontrarem numa relação de concurso aparente, sob pena de violação do princípio ne bis in idem previsto no artigo 29.º, n.º 5, da CRP.’
Vejamos.
Esta questão foi já apreciada na sentença recorrida (p. 803, ênfase aditado), que concluiu pela inexistência de concurso aparente nos seguintes termos:
Cada conduta reflecte uma resolução ilícita própria e autónoma, pelo que, inexiste óbice à punição dos factos como constituindo tantas contraordenações como o número de vezes em que preencheram o tipo de ilícito que lhes vem imputado – inexistindo uma situação de concurso aparente.’
Como já referido no ponto III.2 supra, os recorrentes AA e CC  violaram várias vezes as normas de dever constantes dos artigos 135.º, n.º 1, e 142.º, n.º 1, do CdVM, em situação que consubstancia concurso real e efetivo entre as contraordenações apuradas (artigo 19.º do RGCO), em termos análogos aos que a respeito constam da sentença recorrida, por razões que aqui se dão por reproduzidas para evitar inútil repetição.
Diz o recorrente que a conduta imputada ao recorrente é a expressão de uma única resolução típica, que se consubstanciou num único facto típico (aprovação do prospeto conhecendo a informação nele omitida e não adopção durante o período da Oferta de qualquer conduta visando sanar os v´cios da informação nele divulgada) e que as normas violadas visam salvaguardar o mesmo bem jurídico (a proteção dos investidores e a tutela da confiança destes no regular funcionamento do mercado).
Já vimos que assim não é, as mesmas normas foram violadas várias vezes, em ocasiões temporais perfeitamente distintas, com respeito a diverso acervo de informação relativo a empresas distintas e mediante várias resoluções, tantas quantas as violações cometidas, sendo extremamente redutora a posição assumida pelo recorrente, que levada ao extermo conduziria a que, uma vez tomada a decisão aprovar o prospeto com determinada informação e não outra, tudo o mais não seria autonomamente punido (designadamente futuras violações do dever de prestar informação de qualidade decorrentes de factos entretanto ocorridos ou conhecidos durante o período da Oferta, como ocorreu com as cartas de conforto emitidas pelo emitente a 9.06.2014, com a assinatura do recorrente CC).
Pela posição assumida pelo recorrente, uma vez praticado um facto típico previsto numa determinada norma jurídica, caso voltasse a decidir violar os deveres previstos na mesma norma só seria punido por uma contraordenação, o que redundaria na atribuição de um irrazoável benefício ao infractor.
Deste modo, tal como decidido pelo tribunal a quo, conclui-se pela existência de concurso efectivo, dada a pluralidade de tipos violados preenchidos com a conduta do recorrente, a pluralidade de resoluções e a pluralidade de violações do dever de prestar informação de qualidade consagrado em cada uma das contraordenações pelas quais foi condenado.
Do mesmo modo, não se estando perante uma mesma infracção, mas uma multiplicidade de infracções de natureza contraordenacional, não resulta aplicável o princípio ne bis in idem consagrado no artigo 29º, nº 5, da CRP invocado, o que se consigna,.
Improcede, pois, o presente segmento recursivo, relativo ao alegado concurso aparente de infracções, alegado pelo recorrente CC.

III.4 – Da errada determinação da medida concreta da pena aplicada ao recorrente CC

III.4.1 – Do erro quanto à ponderação da situação pessoal do recorrente na determinação da coima aplicável
Alega o recorrente CC (conclusões 210 a 217) que o Tribunal a quo deu como provado ter atualmente o recorrente um diagnóstico clínico compatível com a doença de Alzheimer (factos provados 437 a 439), tendo reconhecido que tal facto mitigaria as exigências de prevenção especial (p. 833 da sentença recorrida), mas não procedeu a uma ‘manifesta redução’ da coima única aplicada pela CMVM, quando tais considerações deveriam determinar uma efetiva redução da coima única aplicada, dada a mitigação das exigências de prevenção geral e especial.
Vejamos.
A sentença ponderou a situação pessoal do recorrente CC, designadamente a patologia que refere, no âmbito das exigências de prevenção geral e especial, nos seguintes termos (pp. 830-833, infra parcialmente reproduzidas):
‘As exigências de prevenção especial são, de igual sorte, muito intensas.
O arguido assumia uma posição de liderança no grupo BES, registando, nesta data, diversos antecedentes contraordenacionais e condenações que não admitem recurso judicial ordinário, sempre relacionados com as funções que exercia e configurando a violação de normas sectoriais distintas, relacionadas com os seus deveres funcionais no quadro do RGCISF, da Lei de Branqueamento de Capitais e Código de Valores Mobiliários[80].
[…]
Em nenhum daqueles autos, mormente no que respeita ao desvio de fundos e actos dolosos de gestão ruinosa do BES, assumiu qualquer posição adjetiva que inculque no Tribunal a possibilidade de formular um juízo fundado de prognose positivo.
Isto é, não dispõe o Tribunal de qualquer facto que milite em favor do Recorrente e permita considerar atenuadas as necessidades de prevenção especial (2.º segmento do número 4 do artigo 405.º do CdVM).
O Recorrente CC não iniciou o pagamento voluntário de nenhuma das coimas transitadas em julgado, nem mesmo a mais temporalmente mais distante, atinente aos autos de RCO n.º 182/16.... que se encontram em fase de execução, para obtenção coerciva da coima devida. Não encetou qualquer diligência para o seu pagamento faseado.
Inexiste, pois, fundamento lógico-racional para, em face da circunstância de encimar a instituição Grupo BES e atenta a postura adjetiva que invariavelmente assumiu, considerar mitigadas as necessidades de prevenção especial.
Naturalmente que, o decurso do tempo também se projectou na esfera jurídica deste Recorrente; contudo, contrariamente aos demais, que vêm assumindo posições adjetivas que refletem a aceitação da autoridade dos Tribunais na apreciação jurisdicional das suas condutas e a interiorização crítica da necessidade de ajustar as suas condutas à normatividade vigente, o mesmo não se verifica quanto ao Recorrente CC.
O Tribunal procedeu, ainda, à análise crítica da documentação atinente à sua situação de saúde e ao diagnóstico de Alzheimer apresentado, não se questionando que o mesmo se encontra refletido em documento subscrito por especialista médico, que não constitui, contudo, perícia médico-legal na aceção exigida pelo artigo 159.º, número 1 do Código de Processo Penal.
Sem prejuízo, considerando que aquele documento não coloca em causa a integridade da saúde e capacidade do Recorrente à data da prática dos factos (2014), não se divisa causa de exclusão da culpa ou da responsabilidade contraordenacional do Recorrente.
Por outro lado, considerando que a conclusão pela responsabilidade contraordenacional do Recorrente se traduz, apenas, no seu sancionamento numa coima, não se divisa óbice à compreensão do sentido e alcance da presente decisão condenatória, nem tão pouco ao pagamento voluntário da coima a fixar.’
Porém, as considerações dos efeitos da situação pessoal do recorrente CC ao nível das exigências de prevenção especial não determinam, por si só ou automaticamente, a redução da coima única aplicada, pois que a determinação da mesma resulta da ponderação de um conjunto de regras e factores, que têm de ser ponderados na sua integralidade, como foram na sentença recorrida, que os elencou  nos seguintes termos (p. 828):
[…] Do arguido CC
Nos termos do disposto no artigo 405.º do CdVM, nos termos do disposto nos artigos 405.º do CdVM, são consideradas as seguintes circunstâncias:
a. A ilicitude concreta dos factos;
b. O nível de culpa do arguido (dolo);
c. As exigências de prevenção geral e especial;
d. A circunstância de se tratar de pessoa singular;
e. A situação económica do arguido;
f. A inexistência de antecedentes contraordenacionais.
Termos em que improcede o invocado erro na ponderação da situação pessoal do recorrente CC na determinação da coima aplicável, e com ele o presente segmento recursivo.

III.4.2 – Do erro quanto à ponderação do tempo decorrido desde a prática da infracção
Mais alega o recorrente CC (conclusões 218 a 222) que o Tribunal a quonão fez a correcta ponderação do facto de ter decorrido um período de 8 anos e 4 meses desde o momento da prática das infracções aqui em causa, o que deveria ter sido considerado como circunstância atenuante pelo Tribunal de 1.ª instância’.
Vejamos o que a propósito consta na sentença recorrida (pp. 832-833, ênfase aditado):
‘Naturalmente que, o decurso do tempo também se projectou na esfera jurídica deste Recorrente; contudo, contrariamente aos demais, que vêm assumindo posições adjetivas que refletem a aceitação da autoridade dos Tribunais na apreciação jurisdicional das suas condutas e a interiorização crítica da necessidade de ajustar as suas condutas à normatividade vigente, o mesmo não se verifica quanto ao Recorrente CC.’
Como supra referido (secção III.4.1), a coima única aplicada resulta da ponderação de um conjunto de regras e fatores, que o Tribunal a quo elencou e ponderou, não podendo atender-se isoladamente apenas a um fator, para mais exógeno ao agente e independente da sua vontade, como o mero decurso do tempo desde a prática da infracção.
Não se demonstrando a invocada falta de ponderação do tempo decorrido desde a prática da infracção na medida concreta da coima aplicada ao recorrente CC, improcede o correspondente segmento recursivo.

III.4.3 – Das violações do princípio da igualdade e da proporcionalidade na determinação da coima única
Também alega o recorrente CC (conclusões 223 a 249) que o Tribunal a quo ‘violou, por duas vezes, o princípio da igualdade, previsto no artigo 13.º da CRP, e o princípio da proporcionalidade, previsto no artigo 18.º da CRP”, porque:
(i) valorou positivamente a ‘situação de saúde’ do arguido EE, mas não o fez relativamente ao arguido CC, e
(ii) valorou positivamente o decurso de tempo desde a prática da infração quanto aos arguidos AA, BB e DD, suspendendo parcialmente a execução das coimas aplicadas, mas não o fez relativamente ao arguido CC.
Vejamos.
Considera-se que existe violação do princípio da igualdade quando duas situações idênticas são tratadas de modo distinto.
Quanto ao princípio da proporcionalidade, tem-se entendido que o mesmo se desdobra em três subprincípios:
(i) da adequação: as medidas restritivas de direitos, liberdades e garantias devem revelar-se como um meio para a prossecução dos fins visados, com salvaguarda de outros direitos ou bens constitucionalmente protegidos;
(ii) da exigibilidade: as medidas restritivas têm de ser exigidas para alcançar os fins em vista, por o legislador não dispor de outros meios menos restritivos para alcançar o mesmo desiderato;
(iii) da justa medida ou proporcionalidade em sentido estrito: não poderão adotar-se medidas excessivas, desproporcionadas para alcançar os fins pretendidos.
Como supra referido (III.4.1), a sentença recorrida menciona o seguinte relativamente à ‘situação de saúde’ do arguido CC a sentença recorrida refere que (p. 833):
‘O Tribunal procedeu, ainda, à análise crítica da documentação atinente à sua situação de saúde e ao diagnóstico de Alzheimer apresentado, não se questionando que o mesmo se encontra refletido em documento subscrito por especialista médico, que não constitui, contudo, perícia médico-legal na aceção exigida pelo artigo 159.º, número 1 do Código de Processo Penal.
Sem prejuízo, considerando que aquele documento não coloca em causa a integridade da saúde e capacidade do Recorrente à data da prática dos factos (2014), não se divisa causa de exclusão da culpa ou da responsabilidade contraordenacional do Recorrente.
Por outro lado, considerando que a conclusão pela responsabilidade contraordenacional do Recorrente se traduz, apenas, no seu sancionamento numa coima, não se divisa óbice à compreensão do sentido e alcance da presente decisão condenatória, nem tão pouco ao pagamento voluntário da coima a fixar.’
Quanto ao arguido EE, a sentença recorrida pondera o respectivo estado de saúde designadamente nos seguintes termos (pp. 825-826, ênfase aditado):
‘Donde, a ponderação do decurso do tempo na escolha da sanção, não sendo, de um lado, imputável aos Recorrentes; e, de outro, impactando esse decurso, de modo muito acentuado, nas necessidades de prevenção especial, mitigando-as muito expressivamente no caso do Recorrente EE em face da situação de saúde em que se encontra, é um fator normativo, na dimensão que reclama proporcionalidade e necessidade, a que o Tribunal não pode deixar de atendar, corolário da atuação adjetiva da Recorrida.
[…]
Depõe em favor do Recorrente a interiorização da censurabilidade da conduta, que verbalizou de modo público, institucional, comportamento assumptivo que, por ter assumido natureza pública, perdura no tempo. Esse comportamento distingue-o dos demais arguidos.
[…]
As infrações ocorreram todas no mesmo quadro conjuntural, quer em termos organizacionais, quer em termos de interações pessoais, quadro que presentemente se não se verifica, também por força da situação de saúde em que o arguido se encontra (declaração judicial, por sentença transitada em julgado, de situação de maior acompanhado, por padecer de patologia - «avc com défices cognitivos motores importantes» - que o impede de reger a sua pessoa e bens).’
A situação do recorrente CC não é idêntica à do arguido EE na medida em que, ao contrário deste, aquele não tem decretada judicialmente, por sentença transitada em julgado, medida de maior acompanhado fundada na particular situação de saúde de que padece, que o impede de reger a sua pessoa e bens.
Quanto ao decurso de tempo desde a prática da infração quanto ao arguido CC, a sentença recorrida refere o seguinte, no que toca ao recorrente CC (pp. 832-833 e 851, ênfase aditado):
‘Naturalmente que, o decurso do tempo também se projectou na esfera jurídica deste Recorrente; contudo, contrariamente aos demais, que vêm assumindo posições adjetivas que refletem a aceitação da autoridade dos Tribunais na apreciação jurisdicional das suas condutas e a interiorização crítica da necessidade de ajustar as suas condutas à normatividade vigente, o mesmo não se verifica quanto ao Recorrente CC.’
[…]
‘Atento o decurso do tempo sobre a prática dos factos, a erosão provocada nas necessidades de prevenção especial, a circunstância de terem decorridos mais de 8 anos sobre a prática dos mesmos e praticamente 8 anos quando os mesmos foram, por impulso da Recorrida, trazidos à apreciação do Tribunal, o facto de se encontrarem arredados da atividade bancária, decide-se, quanto aos Recorrentes AA, BB e DD suspender 20 por cento da execução da coima fixada, pelo período de 24 meses, nos termos constantes no artigo 415.º do Código de Valores Mobiliários, números 1 e 3.
Pelas razões supra expostas, o Tribunal não dispõe de elementos para proceder a idêntico juízo de prognose favorável quanto ao Recorrente CC, arredando-se a suspensão parcial da execução da coima única em que vai condenado.’
Constata-se, pois, que o Tribunal a quo ponderou devidamente as diversas circunstâncias susceptíveis de impactar na medida concreta da pena aplicada ao recorrente CC, incluindo o decurso do tempo, como fez com os demais arguidos incluindo o referido EE, cuja distinta situação e circunstâncias relativamente a outros critérios a ter igualmente em conta nos termos do artigo 405º do CdVM, justificou diferenciada dosimetria, sem que tal signifique entorse aos princípios da igualdade e da proporcionalidade, que se não demonstra ter ocorrido.
Uma vez que se não verifica qualquer identidade entre a situação do recorrente e dos demais arguidos, improcedem as alegadas violações do princípio da igualdade e da proporcionalidade, invocadas pelo recorrente CC, e por conseguinte o correspondente segmento recursivo.

III.4.4 – Do erro na apreciação da absolvição do recorrente quanto à infracção  relativa à Rio Forte
Alega ainda o recorrente CC (conclusões 250 a 254) que o Tribunal a quo decidiu absolvê-lo da prática da contraordenação relativa à Rio Forte e, não obstante, reduziu apenas a coima única aplicada pela CMVM de 1.000.000,00 € para 950,000,00 €, o que configuraria um ‘erro da sentença na apreciação da absolvição do ora Recorrente quanto à infracção pela falta de adenda sobre a exposição do BES à RIO FORTE’.
Vejamos.
Atenta a jurisdição plena de que goza o Tribunal a quo na apreciação do recurso de impugnação judicial e o facto de que não vigora a proibição da reformatio in pejus (artigo 416º, nº 9, do CdVM), não se afigura poder atribuir-se a ‘erro’ qualquer falta de correspondência ou proporcionalidade entre a coima única aplicada pela CMVM e pelo Tribunal recorrido.
É o que vem recordado na sentença recorrida, nos seguintes termos (pp. 11, 98 e 122, adiante parcialmente reproduzidas, ênfase aditado):
‘[…] a normação constante do número 1, do artigo 63.º do RGCO, incluindo o seu elemento gramatical, teleológico e histórico, encontra-se em integral consonância e coerência com os princípios da simplicidade e celeridade processuais que enformam o recurso de impugnação judicial, que dá lugar a um recurso de plena jurisdição’ [p. 14]
‘[…] Note-se que, conforme afirmado pela Jurisprudência do Tribunal Constitucional e invariavelmente preconizado por este Tribunal, a partir da impugnação judicial, o inconformismo dos arguidos é apreciado num recurso de jurisdição plena, que confere aos arguidos, a partir daí, Recorrentes, acesso aos Tribunais, consubstanciando o exercício efetivo do direito de recurso, efectivamente exercido.’ [p. 98]
‘[…] Salvo melhor opinião, tal matéria encontra-se, no quadro da dialética da fase administrativa, prejudicada em face da natureza de jurisdição plena que reveste o presente recurso de impugnação judicial [81] e das decisões acima mencionadas e proferidas por este TCRS.’ [p. 122]
O Tribunal era, assim, livre, no seu livre e fundamentado arbítrio, de aplicar até coima superior, não obstante a parcial absolvição referida (Rio Forte).
Termos em que, sem necessidade de mais considerações, improcede o alegado erro assacado a este título à sentença recorrida pelo recorrente CC, bem como o correspondente segmento recursivo.

III.4.5 - Do erro relativo à existência de antecedentes contraordenacionais
Finalmente, alega o recorrente CC (conclusões 255 a 261) que o Tribunal a quo errou ao considerar que ‘tem antecedentes contra-ordenacionais, uma vez que foi condenado, no âmbito dos processos n.º 182/16...., 164/19...., 249/17...., 74/19.... e 280/20....’, não podendo tais condenações relevar enquanto antecedente contraordenacional, ‘porque os factos relevantes naqueles processos não são anteriores aos factos destes autos’, antes ‘terão sido alegadamente praticadas ao tempo da alegada prática das infracções aqui arguidas’.
Vejamos.
A este propósito, consta da sentença recorrida o seguinte (pp. 830-831, ênfase aditado):
No quadro dos mesmos factos naturalísticos, o Recorrente regista antecedentes contraordenacionais relacionados com a violação de normas atinentes a:
- actos dolosos de gestão ruinosa, praticados em detrimento de depositantes, investidores e credores;
- desobediência ilegítima a determinações específicas do Banco de Portugal, designadamente obrigação de eliminar a exposição não garantida do Grupo ESFG à ESI/ESR; proibição do aumento de exposição direta e não coberta do BES à ESI; desobediência ilegítima à determinação do Banco de Portugal que impôs a proibição de comercialização, de forma direta ou indireta, de dívida de entidades do ramo não financeiro do GES junto de clientes de retalho; desobediência ilegítima à determinação do Banco de Portugal que impôs a proibição de concessão de financiamentos ou refinanciamentos, diretos ou indiretos, às entidades financeiras do GES que não integravam o GBES; desobediência ilegítima à determinação do Banco de Portugal que impôs a alimentação da conta escrow com recursos alheios ao Grupo ESFG;
- violação de regras sobre conflitos de interesses;
- não implementação de normativos ou procedimentos que reforçassem ou garantissem o acompanhamento das operações realizadas com entidades ou indivíduos relacionados com o BESA;
- não implementação de qualquer processo de análise ao risco de crédito relativamente ao crédito contratado com o BESA, não obstante a extremamente elevada materialidade dos montantes em causa e os potenciais impactos associados ao seu incumprimento;
- omissão de comunicação obrigatória ao Banco de Portugal dos problemas associados às carteiras de crédito e de imobiliário do BESA;
- incumprimento de obrigação de aplicação de medidas preventivas de combate ao branqueamento de capitais e financiamento de terrorismos, no âmbito da atividade de sucursais e filiais num país terceiro.
Em nenhum daqueles autos, mormente no que respeita ao desvio de fundos e actos dolosos de gestão ruinosa do BES, assumiu qualquer posição adjetiva que inculque no Tribunal a possibilidade de formular um juízo fundado de prognose positivo.
Isto é, não dispõe o Tribunal de qualquer facto que milite em favor do Recorrente e permita considerar atenuadas as necessidades de prevenção especial (2.º segmento do número 4 do artigo 405.º do CdVM).”.
Para efeitos de consideração de antecedentes contraordenacionais basta que estejam em causa decisões definitivas proferidas anteriormente à sentença recorrida no âmbito de processos de contraordenação, como era o caso dos antecedentes contraordenacionais nela referidos, pelo que se não verifica o apontado erro quanto à existência de antecedentes contraordenacionais, invocado pelo recorrente CC.
De resto, o artigo 405º, nº 4, do CdVM refere que ‘[n]a determinação da sanção aplicável são ainda tomadas em conta a situação económica e a conduta anterior e posterior do agente…’.
Improcede, assim, o presente segmento recursivo.

III.5 – Da desproporcionalidade, excesso e desigualdade da coima e sanção acessória aplicadas ao recorrente DD
Alega o recorrente DD (conclusões 116 a 121) que a coima de € 400.000,00 aplicada pelo Tribunal a quo, ainda que parcialmente suspensa na sua execução, é ‘totalmente desproporcional e desconforme aos critérios legais previstos na lei para fixação da medida da coima’.
Em particular, alega (conclusão 117) que a ‘sentença recorrida desconsidera o facto de que a coima inicialmente aplicada pela CMVM, no valor único de € 400.000,00, dizia respeito à alegada prática de duas contraordenações, sendo certo que a sentença recorrida revogou a condenação pela prática da segunda pretensa contraordenação, circunstância que, por si só, obriga a sentença recorrida a rever o valor da coima a aplicar’.
Vejamos.
No tocante à consideração da medida da coima aplicada ao recorrente DD, a sentença recorrida refere designadamente o seguinte (pp. 837-841, ênfase aditado):
No que diz respeito à ilicitude concreta dos factos em causa, reputa-se de elevado o desvalor das condutas imputadas ao arguido DD, na medida em que as mesmas se traduzem num contributo causal para que o BES tenha prestado – na data da divulgação do prospeto e até à admissão à negociação no mercado regulamentado Euronext Lisbon das 1.607.033.212 novas ações ordinárias do BES, representativas do seu aumento de capital – no prospeto de aumento de capital do BES de 2014 informação que não era completa nem atual (artigos 135.º, n.º 1, e 142.º, n.º 1, do CdVM).
Os factos ilícitos são idóneos a fazer perigar, de modo significativo, quer os legítimos interesses dos investidores (maxime, daqueles que subscreveram o referido aumento de capital), quer o regular funcionamento dos mercados de instrumentos financeiros.
Como assinala com acerto a Recorrida, a falta de qualidade da informação divulgada pelo BES aos investidores – para a qual o arguido DD deu um contributo causal, quer por ação, quer por omissão –, para além de impedir a adequada, esclarecida e fundada tomada de decisões de investimento por parte dos investidores, espoleta efeitos reputacionais negativos para o mercado de instrumentos financeiros nacional, colocando em crise a confiança dos investidores nos intermediários financeiros e na qualidade da informação por estes divulgada aos investidores.
À data dos factos o arguido DD era membro do Conselho de Administração e da Comissão Executiva do BES, agudizando a premência do dever que sobre si impendia de assegurar a divulgação, ao mercado, de informação com qualidade.
Com a sua conduta, o arguido DD contribuiu causalmente para que o arguido BES tivesse prestado, no prospeto de aumento de capital divulgado em 20.05.2014, informação que não cumpria os requisitos de qualidade previstos no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM relativamente à situação financeira e patrimonial do BESA detetada em finais de 2013 que esteve origem na emissão pela República de Angola, em 31.12.2013, da garantia soberana a favor do BESA.
No que tange ao grau de culpa do arguido, entende-se que é elevado, atenta a elevada experiência profissional e conhecimento das áreas bancária e de intermediação financeira, em geral, e do BES em particular, assim como o contributo funcional que o Departamento Jurídico de que era peloureiro deu ao prospeto.
O arguido na qualidade de Administrador Executivo do BES era destinatário do dever legal de assegurar a qualidade da informação divulgada, de um lado; e de outro, do dever legal de obstar à produção de efeitos negativos para o mercado de instrumentos financeiros decorrentes da sua conduta.
Atuou com dolo (artigo 14.º, número 1 do CP).
As exigências de prevenção geral são elevadas, atenta a relevância do bem jurídico postergado, sendo imperioso retomar a confiança da comunidade na força coerciva da norma violada.
Regista 1 antecedente contraordenacional relacionado com a violação do dever de comunicação ao Banco de Portugal, traduzido na omissão de comunicação obrigatória ao Banco de Portugal dos problemas associados às carteiras de crédito e de imobiliário do BESA (a título negligente). Ainda que esses autos – RCO n.º 74/19.... - se encontrem transitados em julgado, continua a pretender discutir a prescrição da sua responsabilidade contraordenacional, mas apresentou requerimento para o pagamento fracionado da coima, o que constitui um comportamento concludente adjectivo que milita em ser favor, por ora.
No que diz respeito à situação económica do arguido DD, considerou-se: (i) o Relatório de Governo Societário do BES referente ao ano de 2013 (a fls. 1583-1636 dos autos, maxime, fls. 1589 v., 1600 e 1617 v.), de onde consta uma remuneração anual de 524.000,00 € em 2013, (ii) a circunstância de o arguido exercer, à data dos factos, o cargo de Presidente da Mesa da Assembleia Geral em, pelo menos, dezanove entidades, bem como de vice-presidente da Mesa da Assembleia Geral em, pelo menos, duas outras entidades, e ainda cargos de gestão em, pelo menos, duas entidades (cfr. facto provado 35), (iii) a declaração de IRS relativa ao ano de 2019 (documento n.º 40 junto com a defesa, a fls. 6476-6481), de onde decorrem rendimentos do trabalho no valor de 184.603,58 € e (iv) a declaração de IRS relativa ao ano de 2020, junta pelo arguido ao Processo n.º 230/21...., que correu termos no Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (fls. 11607-11613 v.), da qual resulta que o mesmo obteve rendimentos de 161.000,00 € no referido ano
Neste enquadramento, afigura-se fundada, adequada e proporcional aplicar ao Recorrente DD, condenando-se o mesmo como segue:
a) Quanto à violação do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto
A aplicação de uma coima de € 400.000,00 (quatrocentos mil euros), pela violação, a título doloso, do dever de prestação de informação com qualidade no prospeto, previsto no artigo 135.º, n.º 1, do CdVM (quanto à situação financeira e patrimonial do BESA detetada em finais de 2013 que esteve origem na emissão pela República de Angola, em 31.12.2013, da garantia soberana a favor do BESA), o que constitui, nos termos do artigo 393.º, n.º 2, alínea d), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, punível com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM.’
Dos excertos supra resulta ter o Tribunal a quo apreciado em detalhe os critérios legais de determinação da medida da coima, previstos no artigo 405.º do CdVM, nomeadamente quanto ao grau de ilicitude, às exigências de prevenção e à situação económica do arguido.
Como se deixou referido supra a propósito do recorrente CC (secção III.4.4) em termos que damos aqui por reproduzidos, atenta a jurisdição plena de que goza o Tribunal a quo na apreciação do recurso de impugnação judicial e o facto de que não vigora a proibição da reformatio in pejus (artigo 416º, nº 9, do CdVM), não se afigura poder atribuir-se a ‘erro’ qualquer falta de correspondência ou proporcionalidade entre a coima única aplicada pela CMVM e pelo Tribunal recorrido.
O Tribunal era, assim, livre, no seu fundamentado arbítrio, de aplicar até coima superior, não obstante a parcial absolvição referida (Rio Forte).
De resto, embora a CMVM tenha aplicado uma coima única de 400.000,00 € pela prática de duas contraordenações, das quais só uma subsiste, também é verdade que a coima parcelar aplicada à contraordenação relativa ao BESA era igualmente de € 400.000,00, cuja execução a sentença recorrida suspendeu em 20%, pelo que se não se verificou qualquer agravamento da coima.
Improcedem, pois, quer a falta de proporcionalidade da coima concretamente aplicada (atenta a sua situação económica) quer a não aplicação dos critérios legais de determinação da medida da coima aplicada ao recorrente DD, e consequentemente o presente segmento recursivo.

III.6 – Da inconstitucionalidade do artigo 388º, nº 1, alínea a), do CdVM
Alega o recorrente DD (conclusões 115, 122 e 123, infra reproduzidas) a inconstitucionalidade da moldura penal sancionatória prevista no artigo 388º, nº 1, alínea a) do CdVM pela sua amplitude desproporcionada, por violação dos artigos 1º e 2º (princípio do Estado de Direito) e 18º (princípio da proporcionalidade) da CRP, bem como erro de direito da sentença recorrida, por desconsiderar tal inconstitucionalidade e a que decorre de normas de ilícitos contraordenacionais permitirem a aplicação de coimas a pessoas singulares superiores às multas penais, em violação do princípio da legalidade.
‘115.    A sentença recorrida incorreu ainda em Erro de Direito – por violação do princípio do Estado de Direito previsto nos artigos 1.º e 2.º e do princípio da proporcionalidade estipulado no artigo 18.º, todos da Constituição da República Portuguesa – ao não julgar procedente a invocação da inconstitucionalidade da amplitude sancionatória da coima prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 388.º do CVM aplicável aos autos, visto que a aludida coima - aplicável a pessoas singulares - vai de € 25.000,00 a € 5.000.000,00, o que revela uma amplitude sancionatória profundamente desproporcionada e, portanto, lesiva do princípio da legalidade contraordenacional, donde resulta evidente a inconstitucionalidade – por violação do princípio da legalidade – da desproporcionada amplitude da moldura sancionatória prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 388.º do CVM, pelo que a sentença recorrida incorre em erro de direito.
122. Sem prejuízo do supra exposto, a decisão em crise suscita ainda uma questão de inconstitucionalidade de elevada gravidade: a manifesta desproporcionalidade da coima aplicada, em clara violação do n.º 2 do artigo 18.º da Constituição da República Portuguesa, na medida em que:
-    a alínea a) do n.º 1 do artigo 388.º do CVM, em conjugação com a alínea d) do n.º 2 do artigo 393.º do CVM, interpretadas e aplicadas no sentido de que uma pessoa singular possa ser ou seja, efetivamente, punida com uma coima superior ao limite máximo abstrato da pena de multa previsto na lei penal para um único crime (€ 500 x 360 dias), viola o disposto no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição da República Portuguesa, que consagra o princípio da proporcionalidade; e
-    a alínea a) do n.º 1 do artigo 388.º do CVM, em conjugação com a alínea d) do n.º 2 do artigo 393.º do CVM, e o artigo 19.º do RGCO, aplicável por remissão do artigo 407.º do CVM, interpretadas no sentido de que uma pessoa singular seja, efetivamente, punida comuma coima de € 400.000,00, viola o disposto no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição da República Portuguesa, que consagra o princípio da proporcionalidade.
123. Por conseguinte, e sem prejuízo da total falta de fundamento factual e jurídico da pretensa contraordenação imputada ao Recorrente DD, a verdade é que, em qualquer caso, a decisão em crise deve ser alterada e a coima aplicada ao ora Recorrente DD substancialmente reduzida (sem conceder).’
Esta questão foi igualmente suscitada em sede de recurso de impugnação judicial e objeto de exaustiva apreciação pela sentença recorrida, que concluiu pela não verificação das referidas inconstitucionalidades, nos seguintes termos (pp. 841-850, infra parcialmente reproduzidas, ênfase aditado):
‘A propósito da moldura sancionatória aqui em causa, vem o Recorrente DD propugnar pela inconstitucionalidade, por violação do princípio da legalidade (na vertente excesso), da amplitude da moldura sancionatória prevista no artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM[82].
Segundo o Recorrente, é inconstitucional[83]:
i. O artigo 388.º, n.º 1, alínea a), em conjugação com o artigo 393.º, n.º 2, alínea d), ambos do CdVM, interpretados e aplicados no sentido de que uma pessoa singular possa ou seja, efetivamente, punida com uma coima superior ao limite máximo abstrato da pena de multa previsto na lei penal para um único crime (€ 500,00 x 360 dias), por violação do princípio da proporcionalidade, consagrado no artigo 18.º, n.º 2, da CRP.
ii. O artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, em conjugação com o artigo 393.º, n.º 2, alíneas c) e d), do CdVM, e do artigo 19.º do RGCO, aplicável por remissão do artigo 407.º do CdVM, interpretados e aplicados no sentido de que uma pessoa singular seja, efetivamente, punida com uma coima de € 400.000,00, por violação do princípio da proporcionalidade, consagrado no artigo 18.º, n.º 2, da CRP.
Apreciemos, uma e outra.
[…]
De modo reiterado, se discorreu ao longo desta sentença sobre as razões, de teleologia e substância, que apartam o direito contraordenacional e o direito penal, não se vislumbrando qualquer fundamento para, no quadro do apuramento da responsabilidade contraordenacional do recorrente DD, mobilizar os critérios de dosimetria da pena de multa a que alude o artigo 47.º do Código Penal.
Nem os factos normativos de que é acusado pela entidade administrativa contém similitude com qualquer tipo criminal previsto no Código Penal ou legislação dispersa, nem, nestes autos, se discute a possibilidade de aplicação ao Recorrente DD de uma pena de multa.
[…]
O Tribunal Constitucional foi já convocado a pronunciar-se sobre a conformidade do artigo 388.º do CdVM, que fixa a moldura sancionatória das contraordenações previstas no CdVM, não tendo divisado inconstitucionalidade [84].
Para tanto e desde logo, o Tribunal Constitucional – assim como esta sentença – sinaliza que, no quadro dos ilícitos contraordenacionais, o legislador ordinário goza de uma “livre margem de decisão quanto à fixação do legal do montante das coimas a aplicar” [85].
Em consequência, um juízo de inconstitucionalidade, edificado sobre uma violação do princípio da proporcionalidade das sanções, demanda que “as soluções legislativas cominem sanções que sejam desnecessárias, inadequadas ou manifesta e claramente excessivas, pois tal o proíbe o artigo 18º, nº 2, da Constituição” [86], o que não é de todo o caso.
A sobredita jurisprudência, que considera que a Constituição acomoda amplas dosimetrias da coima abstrata, é ainda secundada pela doutrina.
A título exemplificativo, o professor Augusto Silva Dias, enfatizava que as finalidades das coimas “são basicamente de duas espécies: o restabelecimento da expetativa normativa violada pela infração; a difusão das mensagens de que o projeto ilícito não vingou (função reafirmativa-expressiva da coima) e de que o infrator não beneficiou das vantagens patrimoniais ou económicas que almejava alcançar (função confiscatória da coima)”[87].  De acordo com este Autor, a coima desempenha uma função de prevenção geral, a saber: “[a] advertência ou admonição serve de sustento à mensagem dirigida ao agente e a todos quantos operam naquele sector da actividades de que a norma posta em causa pela infração é para valer e ser cumprida”[88].
Consequentemente, o legislador inscreveu na legislação contraordenacional montantes abstratos das coimas aptos a evidenciar as sobreditas finalidades que prossegue, levando Paulo Otero e Maria Fernanda Palma a recordarem que “a fixação de coimas com montantes irrisórios face ao benefício colhido da prática do ilícito contra-ordenacional tende a enfraquecer o próprio cumprimento da lei”[89].
Por outro lado, no que tange aos bens jurídicos protegidos com as normas infracionais de natureza contraordenacional, cumpre reiterar que estão em causa bens interesses com relevância axiológica constitucional, como sucede no caso destes autos, em que se tutelam os investidores e o regular funcionamento do mercado[90].
Acresce que, com reporte ao caso concreto, o legislador aceita que a infracção possa ser punida quer com coima, quer com sanção de admoestação, o que traduz o juízo de equilíbrio e ponderação que, na resolução do caso concreto, concedeu ao julgador, assegurando, também por esta via, a conformidade constitucional da punição aqui em causa (artigos 414.º e 405.º do Código de Valores Mobiliários, conjugados com o disposto no artigo 19.º do RGCO).
Inexiste, pois, fundamento para, ponderadas (i) as finalidades da sanção no processo de contraordenação, (ii) os bens e interesses protegidos pelo tipo contraordenacional e (iii) a gravidade das condutas imputadas, considerar inconstitucional a moldura abstrata da coima consignada no artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, conjugada com as normas de sanção previstas nos artigos 393.º, n.º 2, alíneas c) e d).
No Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 85/2012 concluiu-se que
“[o] juízo de proporcionalidade implica, neste caso, a ponderação entre dois valores: o que é sacrificado, em confronto com aquele que o legislador visa proteger. Neste contexto, apenas um manifesto desequilíbrio entre tal relação poderá fundar a violação do princípio. A contraordenação em causa visa salvaguardar um valor de inegável relevo: o da verdade e da transparência do mercado de valores mobiliários. (…) O funcionamento dos mercados de valores mobiliários constitui um instrumento específico do desenvolvimento económico do Estado. Estão em causa bens jurídicos supraindividuais afetos a um programa de desenvolvimento económico e isto explica a preocupação constitucional de tutela dos mercados. Mas não só. Em causa estão ainda os direitos patrimoniais dos aforradores, investidores e clientes das instituições financeiras. De facto, a exigência de informação corresponde ainda a uma exigência de proteção dos investidores que pretendam atuar no contexto de um mercado caracterizado por um elevado nível de risco. A contraordenação em causa visa também proteger direitos individuais, seja a salvaguarda do património próprio dos cidadãos. Por fim, as exigências de informação e transparência permitem ainda garantir um sistema de igualdade de oportunidades dos investidores. (…)
Em suma, a qualificação da comunicação ou divulgação, por qualquer pessoa ou entidade, e através de qualquer meio, de informação que não seja completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita como contraordenação muito grave fundamenta-se na necessidade de salvaguardar os referidos interesses, constitucionalmente tutelados. Face ao relevo dos valores que se pretenderam salvaguardar, não pode considerar-se que a qualificação das condutas referidas como “contraordenação muito grave” se mostre desnecessária, inadequada ou manifestamente excessiva, pelo que não pode considerar-se violado o princípio da proporcionalidade na vertente que o recorrente qualifica como “absoluta”.
E, mais recentemente, no amiúde citado Acórdão n.º 500/21, o Tribunal Constitucional renovou o juízo de conformidade constitucional, estabelecendo que “[t[endo em conta os critérios seguidos no Acórdão n.° 78/2013, dos quais se não vê razão para divergir, impõe-se concluir que moldura fixada no artigo 388. °, n.° 1, alínea a), do CdVM, não viola as exigências decorrentes dos princípios da proporcionalidade e da determinabilidade das sanções”.
Aduz, ainda, o Recorrente DD a inconstitucionalidade dos artigos 388.º, n.º 1, alínea a), 393.º, n.º 2, alínea d), e 393.º, n.º 2, alínea c), do CdVM e do artigo 19.º do RGCO, ex vi artigo 407.º do CdVM, por dois motivos:
a) Primeiro: uma pessoa singular pode ser punida com uma coima superior ao limite máximo abstrato da pena de multa previsto na lei penal;
b) Segundo: uma pessoa singular pode ser punida com uma coima única de € 400.000,00.
Reitera-se que, carece, em absoluto, de fundamento o paralelismo estabelecido entre a coima aplicada a uma pessoa singular no quadro da responsabilização contraordenacional (axiologicamente neutra) e a condenação penal em pena de multa (porque o agente faz perigar bens jurídicos essenciais da convivência social).
Ora, nem no caso concreto, nem em qualquer outro, inscreveu no quadro contraordenacional o legislador a previsão de sancionamento do comportamento do agente com pena de multa. A Recorrida, com acerto, convoca os ensinamentos do Professor Nuno Brandão[91]
“[s]e a multa, que não tenha sido substituída por trabalho, não for paga voluntária ou coercivamente, pode haver lugar à conversão dos dias de multa em dias de prisão, dita prisão subsidiária. É assim admissível uma privação da liberdade do condenado em pena de multa, sendo-lhe, no entanto, dada a possibilidade de a todo o tempo evitar a execução da prisão subsidiária, pagando, no todo ou em parte, a multa a que foi condenado. Tal como sucede com a pena de prisão, nenhuma contra-ordenação é entre nós sancionada com pena de multa.
A coima é a sanção por excelência do direito de mera ordenação social. Tem natureza exclusivamente patrimonial, dado que, diferentemente da pena de prisão, não implica a privação da liberdade do condenado e, ao contrário da pena de multa, não é susceptível de implicar uma privação da liberdade em caso de falta de pagamento voluntário ou coercivo.”
[…]
A aplicação de uma coima ao agente pessoa singular não tem pois, em nenhuma dimensão normativa, maior gravidade que a multa prevista na lei penal, a qual, além do desvalor da conduta que lhe subjaz e a diferencia da contra-ordenação, pode ser convertida em prisão subsidiária.
Com interesse, respinga-se pelos subsídios para o caso concreto, o Aresto do Tribunal Constitucional n.º 336/08[92]:
“(…) para garantir a eficácia preventiva das coimas e a ordenação da vida económica em sectores em que as vantagens económicas proporcionadas aos agentes são elevadíssimas, o artigo 18.º, n.º 2, do Decreto-lei n.º 433/82 (na redacção dada pelo Decreto-lei n.º 244/95), permite que o limite máximo da coima seja elevado até ao montante do benefício económico retirado da infracção pelo agente, ainda que essa elevação não possa exceder um terço do limite máximo legalmente estabelecido, erigindo, assim, a compensação do benefício económico como fim específico das coimas.
Estas diferenças não são nada despiciendas e deverão obstar a qualquer tentação de exportação imponderada dos princípios constitucionais penais em matéria de penas criminais para a área do ilícito de mera ordenação social.”
Preservando a natureza de «coisa diferente», impõe-se concluir que a dosimetria inscrita pelo legislador se encontra devidamente fundada, proporcional e necessária.
Recorda-se, recuperando as idiossincrasias do caso concreto que, estava em causa um aumento de capital do montante de € 1.044.571.587,80, montante muitíssimo superior ao da moldura punitiva abstratamente aplicável.
Os montantes das coimas previstos no artigo 388.º, n.º 1, do CdVM, prosseguem desideratos de protecção e salvaguarda de situações que ponham em causa a estabilidade do sistema financeiro (atenta a sua capacidade de se repercutirem, de modo sistémico, no mercado financeiro); e, por outro lado, recorda a Recorrida, os quantitativos transacionados no mercado de valores mobiliários são bastante elevados, pelo que as coimas apenas cumprem a sua finalidade se o seu montante for igualmente elevado e comparável aos benefícios económicos que os agentes possam retirar das infrações, de modo a que estes se sintam desincentivados a praticar tais infrações.
Finalmente, a decisão administrativa foi objeto de sindicância judicial, incluindo sobre a dosimetria da coima, o que assegurou todas as garantias de defesa do Recorrente.
 (b) O segundo fundamento de inconstitucionalidade alegado pelo Arguido DD, relativo à possibilidade de uma pessoa singular poder ser punida com uma coima única de € 400.000,00, também não merece acolhimento.
Com efeito,
O disposto no artigo 388.º, n.º 1, do CdVM é, necessariamente temperado pelo disposto no artigo 405.º do CdVM, no qual se encontram consignados parâmetros de fixação casuística da sanção aplicável.
Nesse iter, de modo expresso, se ordenou ao Jugador que atendesse à situação económica e a conduta anterior e posterior do agente (número 4).
Donde, encontrando-se disciplinados no CdVM que prevê, para efeitos aplicação da sanção em concreto, os critérios a ponderar, inexiste fundamento para considerar a existência de inconstitucionalidade nos artigos 388.º, n.º 1, alínea a), 393.º, n.º 2, alíneas c) e d), do CdVM e, ainda, no artigo 19.º do RGCO, ex vi artigo 407.º do CdVM, interpretados e aplicados no sentido de que uma pessoa singular possa ser punida com uma coima de € 400.000,00, viola o disposto no artigo 18.º, n.º 2, da CRP. […]’
Os termos em que o Tribunal a quo acertada e exaustivamente apreciou a questão das inconstitucionalidades do artigo 388º, nº 1, alínea a) do CdVM, a que aderimos, mostram estar já suficientemente sedimentada na jurisprudência e na doutrina a conformidade constitucional do referido normativo e da moldura sancionatória nele prevista, atenta nomeadamente a distinta natureza das coimas contraordenacionais e das multas penais (sempre mais gravosas estas porque, ao contrário daquelas, convertíveis em privação de liberdade) e os distintos desideratos por elas prosseguidos, onde ressalta, no caso das contraordenações em causa nos presentes autos, a salvaguarda de situações que ponham em causa a estabilidade do sistema financeiro, a protecção do património dos aforradores e investidores e a necessária adequação aos elevados montantes transaccionados no mercado financeiro e aos benefícios económicos que os agentes possam retirar da infracção.   
Com efeito, tem sido reiteradamente defendido pelo Tribunal Constitucional que o legislador ordinário goza de uma ‘livre margem de decisão quanto à fixação do legal do montante das coimas a aplicar[93], só sendo de censurar, quanto ao princípio da proporcionalidade das sanções, ‘as soluções legislativas que cominem sanções que sejam desnecessárias, inadequadas ou manifesta e claramente excessivas, pois tal o proíbe o artigo 18º, nº 2, da Constituição' [94].
Quanto aos bens jurídicos e interesses tutelados, importa afirmar que as contraordenações em apreço não visam tutelar simples interesses inerentes à ordenação do funcionamento da sociedade, mas antes proteger bens interesses com relevância axiológica constitucional, como é o caso da proteção dos investidores e do regular funcionamento do mercado[95].
No caso em apreço, está em causa a prática de infrações relacionadas com a tutela da qualidade da informação constante do prospeto (artigo 393.º, n.º 2, alínea d), do CdVM) e do dever de divulgação de adendas ao prospeto (artigo 393.º, n.º 2, alínea c), do CdVM), pilares essenciais do regular funcionamento do mercado de valores mobiliários e de instrumentos financeiros, designadamente no quadro das ofertas públicas, pelo que as condutas que realizam os tipos contraordenacionais em apreço constituem condutas muito graves, atentatórias dos bens e interesses em jogo nesse mercado, onde se investem e transacionam as poupanças dos aforradores, devendo as sanções mostrar-se adequadas a tal gravidade.
Acresce que o regime sancionatório em apreço é modulável, permitindo:
(i) que a prestação de informação sem qualidade no prospeto e a violação do dever de publicação de adenda ao mesmo sejam punidas com coima ou com admoestação (artigos 51.º do RGCO e 414.º, n.º 1, do CdVM);
(ii) que a coima aplicada seja suspensa total ou parcialmente na sua execução, ao abrigo do disposto no artigo 415.º do CdVM, e
(iii) que as contraordenações possam dar lugar a procedimentos de advertência, nos termos do artigo 413.º do CdVM.
Tendo o legislador consagrado no artigo 405.º do CdVM um regime próprio de determinação da coima concreta em função da ilicitude concreta do facto, da culpa do agente, dos benefícios obtidos, das exigências de prevenção, da natureza singular ou coletiva do agente, da situação económica do agente e da conduta anterior e posterior do agente.
Pelo que a apreciação da proporcionalidade da moldura abstrata não pode deixar de levar em linha de conta a existência de critérios de determinação da medida concreta da coima, permitindo que a mesma seja adequada ao caso concreto.
Assim, tendo em consideração as finalidades da sanção no processo de contraordenação, os bens e interesses protegidos pelo tipo contraordenacional e a gravidade das condutas imputadas, a moldura abstrata da coima consignada no artigo 388.º, n.º 1, alínea a), conjugada com as normas de sanção previstas nos artigos 393.º, n.º 2, alíneas c) e d), ambos do CdVM, revela-se necessária, adequada e proporcional.
Repare-se que, no caso em apreço está em causa um aumento de capital do montante de € 1.044.571.587,80, montante muitíssimo superior ao da moldura punitiva abstratamente aplicável.
Não se podendo esquecer que a determinação da medida concreta da coima – dentro da moldura abstrata definida pelo legislador – é feita, nos termos do artigo 405.º do CdVM, em função da ilicitude concreta do facto, da culpa do agente, dos benefícios obtidos, das exigências de prevenção, da natureza singular ou coletiva do agente, bem como da situação económica e da conduta anterior e posterior deste.
Em suma, não se mostram desproporcionais os valores previstos para as coimas estabelecidas no CdVM, tendo em conta as finalidades da sanção contraordenacional, os bens jurídicos e interesses protegidos e a gravidade das condutas sancionadas, não se verificando consequentemente a inconstitucionalidade apontada pelo Arguido DD.
Uma vez que o CdVM prevê, para efeitos aplicação da sanção em concreto, os critérios a ponderar, carece de fundamento a inconstitucionalidade do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, interpretado e aplicado no sentido de que uma pessoa singular possa ser punida com uma coima de €400.000,00, viola o disposto no artigo 18.º, n.º 2, da CRP (que consagra o princípio da proporcionalidade), invocada pelo recorrente DD.
Improcede, pois, o presente segmento recursivo.

III.7 – Do cúmulo jurídico por conhecimento superveniente do concurso
Finalmente, alega o recorrente CC (conclusões 262 a 266, infra reproduzidas, ênfase aditado) que, caso o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido em outro processo em que é arguido recorrente (processo nº 293/21....) venha a transitar em julgado, deverá este Tribunal revogar e substituir a sentença recorrida, para conhecer do cúmulo jurídico por conhecimento superveniente do concurso e fixar uma coima única por referência às coimas aplicadas nos presentes autos e, ainda, no dito processo nº 293/21...., nos termos dos artigos 19º, nºs 1 e 2, do RGCO e 78º, nºs 1 e 2, do CP, ex vi artigos 32º e 41º, nº 1, do RGCO, sob pena de inconstitucionalidade dos mencionados artigos do RGCO e CP.
'262. O cúmulo jurídico, por conhecimento superveniente do concurso, é aplicável em sede de processos contra-ordenacionais, quando estão em causa decisões proferidas por uma mesma entidade administrativa.
263. Sendo que, no caso vertente, o ora Recorrente foi condenado pela mesma autoridade
administrativa – a CMVM –, que também condenou o Recorrente noutro processo, no âmbito dos autos de recurso de contra-ordenação n.º 293/21...., cuja decisão veio a ser confirmada pelo J... do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, e pelo Tribunal da Relação de Lisboa.
264. O Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa naqueles autos não transitou em julgado.
265. Caso o referido Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido no âmbito do processo n.º 293/21.... venha a ser confirmado e transitar em julgado, o Tribunal da Relação de Lisboa deverá revogar e substituir a Sentença Recorrida, para conhecer do cúmulo jurídico por conhecimento superveniente do concurso e fixar uma coima única por referência às coimas aplicadas nos presentes autos e, ainda, no processo n.º 293/21...., nos termos dos artigos 19.º, n.os 1 e 2, do RGCO e artigo 78.º, n.os 1 e 2, do Código Penal ex vi artigos 32.º e 41.º, n.º 1, do RGCO.
266. Caso assim não seja, os artigos 19.º, n.os 1 e 2, do RGCO e artigo 78.º, n.os 1 e 2, do Código Penal ex vi artigos 32.º e 41.º, n.º 1, do RGCO, interpretados no sentido de que o arguido de processos contra-ordenacionais sucessivos e autónomos – por factos ilícitos todos praticados antes da primeira condenação – pode ser condenado por concurso de contra-ordenações em coima de valor superior ao dobro da coima parcelar mais elevada será inconstitucional, por violação dos artigos 2.º,18.º, n.º 2,e 32.º, n.os 1 e 10, da Constituição da República Portuguesa, que consagram respectivamente os princípios de Estado de Direito (que tem ínsito o princípio da segurança jurídica), proporcionalidade e garantias de defesa em processo contra-ordenacional.’
Conforme resulta da mera leitura das referidas conclusões, as mesmas não encerram qualquer erro de direito da douta sentença recorrida, antes se traduzem num pedido de atuação do Tribunal ad quem, uma vez verificado o trânsito em julgado do Acórdão proferido no âmbito do processo n.º 293/21.....
Pedido esse que é, de resto, extemporâneo, por prematuro, considerando que não se verificou ainda o trânsito em julgado do Acórdão proferido no âmbito do processo n.º 293/21...., como o próprio recorrente admite ao referir que ‘O Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa naqueles autos não transitou em julgado.’ (conclusão 264)
E que, de qualquer modo, exorbita do âmbito do presente recurso, destinado a sindicar a sentença recorrida, da qual não consta a questão do requerido cúmulo hipotético com sanções aplicadas ao recorrente em outros autos ainda pendentes, designadamente no referido processo nº 293/21.....
O recurso da sentença recorrida, tendo por objeto a apreciação do acerto desta, não se afigura, pois, o meio adequado para formular o referido pedido.
Termos em que não cabe, nesta sede, pronúncia sobre o requerido a este título pelo recorrente CC, o que se consigna.
*
IV. DECISÃO
Em face do exposto, deliberam os Juizes deste Tribunal da Relação, Secção da Propriedade Intelectual, Concorrência, Regulação e Supervisão, julgar totalmente improcedentes os recursos interpostos pelos recorrentes AA, BB, CC e DD, mantendo-se a decisão recorrida.
Custas pelos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça em 6 UC por cada recorrente (art.°s 513°, n.° 1, do CPP e 8°, n.° 9, do RCP e Tabela III anexa).
Notifique.

Lisboa, 21.12.2022
Luis Ferrão
Rute Lopes
Sérgio Rebelo
_______________________________________________________
[1] Jorge de Figueiredo Dias – Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, 2.ª Edição, Coimbra Editora, p. 314.
[2] Nos termos do qual “a autoridade administrativa procederá à sua investigação e instrução, finda a qual arquivará o processo ou aplicará uma coima”.
[3] Neste sentido, PEREIRA, António Beça, Regime-Geral das Contra-Ordenações e Coimas, Almedina, 2017, 12ª Edição, p. 95.
[4] Processo n.º 7/17.9T8ETR.P1, acessível em:
http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/-/0EB95254ED81DB2E802581D1004E7DBB
[5] Processo n.º 292/17.6T9MGR.C1, acessível em: http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/9a038f40e947725d8025821a003ad2eb?OpenDocument
[6] Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Regime Geral das Contraordenações à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Lisboa: Universidade Católica Editora, 2011, p. 112 (ênfase aditado).
[7] Miguel Resende Relvas, Diligências de prova e interrupção da prescrição, Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários, n.º 70, p. 75, disponível em https://www.cmvm.pt/pt/EstatisticasEstudosEPublicacoes/CadernosDoMercadoDeValoresMobiliarios/Pages/Cadernos-do-mercado-de-valores-mobiliarios.aspx?pg.
[8] Cfr. os seguintes doutos Arestos prolatados pela Secção da Propriedade Intelectual e da Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa nos processos 164/19...., 124/18.8YUSTR.L2, 309/20.7YUSTR.L1, 178/20.7YUSTR.L1 e 290/20.2YUSTR.L1 e 293/21.....
[9] Disponível em www.tribunalconstitucional.pt.
[10] Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário ao Regime Geral das Contra-Ordenações à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Universidade Católica Editora, pág. 109.
[11] Duarte Contreiras Roseira, A jurisprudência e a legislação de emergência sobre suspensão dos prazos de prescrição, Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários, n.º 70, pp. 84-106, maxime pp. 103-106 (disponível em https://www.cmvm.pt/pt/EstatisticasEstudosEPublicacoes/CadernosDoMercadoDeValoresMobiliarios/Pages/Cadernos-do-mercado-de-valores-mobiliarios.aspx?pg).
[12] Paulo Câmara, Manual de Direito dos Valores Mobiliários, 3ª Edição, 2016, Coimbra, Almedina, p. 733.
[13] Rüdiger Veil, European Capital Markets Law, 2nd Edition, Hart, 2017, pp. 282-283.
[14] Paulo Câmara, Manual de Direito dos Valores Mobiliários, 3ª Edição, 2016, Coimbra, Almedina, p. 577.
[15] Eduardo Correia, Direito Criminal, Volume I, Coimbra: Almedina, p. 309.
[16] Entre outros, Acórdão proferido no Proc. N° 164/19.... e Acórdão proferido no Proc. 309/20.7YUSTR.L1, www.dgsi.pt.
[17] Transpõe a Diretiva 2014/57/UE, do Parlamento e do Conselho, de 16 de abril de 2014, a Diretiva de Execução (UE) 2015/2392, da Comissão, de 17 de dezembro de 2015, e parcialmente a Diretiva 2013/50/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2013, e adapta o direito português ao Regulamento (UE) n.° 596/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de abril de 2014, procedendo à alteração ao Código dos Valores Mobiliários, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 486/99, de 13 de Novembro, e ao Decreto-Lei n.° 357-C/2007, de 31 de Outubro.
[18] Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Vol. I, p. 285/286.
[19] Frederico de Lacerda da Costa Pinto, Parecer sobre a Suspensão da contagem dos prazos de prescrição por força da legislação de emergência sanitária (Covid 19), 2021, junto ao Proc. Nº 353/2021 subjacente o Acórdão do TC nº 500/2021.
[20] Acórdão do TC de 12.05.2016, acessível em: https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20160297.html
[21] Gomes Cnotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. 1, 4ª edição revista, Coimbra Editora, 2007, pág. 339 e 340.
[22] Cfr. pontos 275 a 315 e conclusões pontos 70 a 80 da Impugnação Judicial.
[23] Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, 2.ª Edição, Coimbra Editora, pp. 288-289:
 ‘[d]izem-se descritivos os elementos que são apreensíveis através de uma actividade sensorial, isto é, os elementos que referem aquelas realidades materiais que fazem parte do mundo exterior e por isso podem ser conhecidas, captadas de forma imediata, sem necessidade de uma valoração (...) Elementos normativos são aqueles que só podem ser representados e pensados sob a lógica pressuposição de uma norma ou de um valor, sejam especificamente jurídicos ou simplesmente culturais, legais ou supralegais, determinados ou a determinar; elementos que assim não são sensorialmente perceptíveis, mas só podem ser espiritualmente compreensíveis ou avaliáveis. Por exemplo, o carácter alheio da coisa (art. 204.º), o documento para efeito de crime de falsificação de documento (cfr. arts. 256.º e 255.º/a), as intervenções ou tratamentos previsos no art. 156.º e as dívidas ainda não vencidas do art. 229.º são elementos normativos dos respectivos tipos incriminadores’.
[24]Neste sentido, vd. Acórdão do STJ de 22.04.2004, processo n.º 04B652, e Acórdão da Relação do Porto de 15.12.2010, processo n.º 1135/10.7TTPNF-A.P1, ambos disponíveis em www.dgsi.pt.
[25] Cf. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 01.05.2017 (Proc. n.º 476/13.6TTPRT.P1), disponível em www.dgsi.pt.
[26] Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 07.01.1999 (Proc. n.º 99B582), disponível em www.dgsi.pt.
[27] Processo n.º 2/08.9TTLMG.P1S1, acessível em www.dgsi.pt.
[28] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12.10.2000 (Processo n.º 2003/2000), disponível em BMJ, 500, 210 e em www.gddc.pt.
[29] Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 31.05.2004, proferido no Processo n.º 1861/04-1, disponível em www.dgsi.pt.
[30] Processo n.º 05P2951, disponível em www.dgsi.pt.
[31] Processo n.º 17/09.0TELSB.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[32] António Henriques Gaspar e outros, CPP Comentado, 3ª edição revista, , p. 1291.
[33] Maria João Antunes, Conhecimento dos vícios previstos no artigo 410.º, n.º 2 do Código de Processo Penal, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 4, Fasc. 1, Janeiro-Março 1994, Editorial Notícias, p. 120.
[34] Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Vol. III, Editorial Verbo, 2000, 2ª Versão revista e atualizada, p. 340.
[35] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11/10/2005, processo n.º 898/05 – 5.ª.
[36] Processo n.º 2495/04 – 3ª, in: Sumários do STJ – Secções Criminais, disponível em www.stj.pt.
[37] AJ, n.ºs 15/16.
[38] Cfr. Fls. 6192 a 6197 dos autos.
[39] Cfr. fls. 10158 dos autos.
[40] António Henriques Gaspar e outros, CPP Comentado, p. 1298.
[41] Disponível em http://www.dgsi.pt/ .
[42] Cfr. conclusão 217, a fls. 15407.
[43] LLL, à data dos factos Presidente da Comissão Executiva do BESA, referiu que (i) a situação do BESA era grave, muito complicada, e a pedido dos acionistas do BESA, a administração do BESA transmitiu essa situação ao Presidente da República de Angola para se encontrar uma solução e que (ii) a garantia soberana imunizou perante o BESA qualquer tipo de imparidades que tivessem de ser feitas (fls. 9325, ficheiro DR0000_0616, minutos 49:14-50:32 e ficheiro DR0000_0618, minutos 04:20-04:57);
PPP, à data dos factos Diretor do Departamento de Supervisão Prudencial do Banco de Portugal, referiu que (i) a garantia nunca foi posta em causa para a cobertura do risco de crédito e, até 01.07.2014, o Banco de Portugal não teve indicação que haveria perdas materiais na carteira de crédito do BESA, não fosse a existência de tal garantia, (ii) os termos da garantia não referiam nenhum problema específico na carteira de crédito do BESA, pelo que o conhecimento da garantia não significava saber da existência dos problemas na carteira de crédito do BESA, (iii) recorrentemente, desde meados de 2013, o Banco de Portugal perguntou à K... se havia problemas na carteira de crédito do BESA, (iv) à luz da informação que o BNA e a K... partilharam com o Banco de Portugal, o problema na carteira de crédito do BESA, a existir, não seria material, (v) a K... inicialmente respondeu que a carteira de crédito do BESA ainda estava a ser objeto de análise e, posteriormente, que não havia nenhum problema porque a garantia cobria a carteira de crédito toda e (vi) só na reunião de 06.06.2014 a K... respondeu à pergunta de qual seria a perda da carteira de crédito caso a garantia não existisse (fls. 9527, ficheiro DR0000_0647, minutos 27:52-28:15, 33:17-36:12 e 37:10-44:23);
WWW, à data dos factos Vice-Governador do Banco Nacional de Angola, referiu que (i) até início de julho de 2014, o BNA nunca colocou em causa que a garantia soberana imunizava o risco de crédito do BESA, ela foi emitida com esse objetivo e que (ii) apenas tomou contacto com o conteúdo da garantia depois de ter sido emitida, contacto esse que decorreu no contexto das propostas da Administração do BESA para saneamento dos problemas do BESA (fls. 9668, ficheiro DR0000_0653, minutos 11:11-11:46, 12:17-12:51 e 40:47-41:26);
XXX, à data dos factos representante de um dos acionistas do BESA, referiu que aquilo que a gestão do BESA informou foi que a garantia soberana era para fazer face à carteira de crédito, que estava numa situação muito má (fls. 9681, ficheiro DR0000_0655, minutos 08:35-09:03);
YYY, à data dos factos membro da Comissão Executiva do BESA, referiu que (i) os efeitos práticos da garantia era o Estado Angolano garantir um conjunto de créditos cuja recuperação seria muito difícil, (ii) o objetivo era resolver o problema do BESA e um passo significativo já tinha sido dado com a emissão da garantia e (iii) os problemas do BESA eram de liquidez e de qualidade dos ativos (fls. 10534, ficheiro DR0000_0668, minutos 06:09-06:38, 19:16-19:35 e 21:38-22:00).
[44] Cfr. cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiros “(1526) 11 06 2014” e (1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3240-3241 v., cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1527) 12 06 2014” e fls. 3033-3038, cd de fls. 3223, ficheiro “20140612_Acta Comissão de Controlo de Transacções com Partes Relacionadas”; fls. 3240-3241 v., ficheiro “CE-20140402-07.02.01 Anexo_Contas consolidadas de 2013 da Rioforte e relatório dos auditores”, pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiros “(1526) 11 06 2014” e “(1527) 12 06 2014”; fls. 3033-3038; fls. 3240-3241 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3686 v. e 3687 v.; fls. 3726-3813, fls. 5026-5031 e fls. 5680-5684.
[45] Cfr. fls. 8322 dos autos.
[46] Cfr. documento de fls. 15474 dos autos, 35.º volume, sublinhado supra nosso.
[47] Documento constante de fls. 15475 dos autos.
[48] Manuel Simas Santos e Manuel Leal-Henriques, Recursos Penais, 9ª edição, p. 81.
[49] Acórdão do STJ de 7.6.2017, Proc. N° 516/13.9PKLRS.L1.S1, www.dgsi.pt, ênfase aditado.
[50] Acórdão do STJ de 2.3.2016, Proc. N° 81/12.4GCBNV.L1.S1, www.dgsi.pt, ênfase aditado.
[51] Acórdão do TRL de 25.10.2011, Proc. Nº 464/09.7TFLSB.L1, www.dgsi.pt.
[52] Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal: Parte Geral, Tomo I, 3.ª Edição, 2019, Gestlegal, p. 1028.
[53] Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal: Parte Geral, Tomo I, 3.ª Edição, 2019, Gestlegal, p. 1027.
[54] Conforme defende Bernardo Feijoo Sánchez, “Autoria e participação em organizações empresariais complexas”, in (Coord.:) Maria Fernanda Palma; Augusto Silva Dias e Paulo de Paulo de Sousa Mendes, Direito penal económico e financeiro: Conferências do curso pós-graudado de aperfeiçoamento, 2012, p. 139, “a empresa tem uma posição de garante originária que é assumida por dirigentes e administradores e que vai gerando, em cadeia, uma delegação de deveres parciais”.
[55] Figueiredo Dias, in Direito Penal, Tomo I, 2ª Edição, Coimbra Editora, 2017, p. 289, refere que ‘Elementos normativos são aqueles que só podem ser representados e pensados sob a lógica pressuposição de uma norma e de um valor, sejam especificamente jurídicos ou simplesmente culturais, legais ou supralegais, determinados ou a determinar; elementos que assim não são sensorialmente perceptíveis, mas só podem ser espiritualmente compreensíveis ou avaliáveis.
[56] Paulo Câmara, Manual de Direito dos Valores Mobiliários, 3.ª edição, Coimbra, Almedina, 2016, p. 729.
[57] Idem, ibidem.
[58] Ambos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt.
[59] Disponível em www.tribunalconstitucional.pt.
[60] Cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 115/2008, disponível em www.tribunalconstitucional.pt.
[61] Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 85/2012, disponível em www.tribunalconstitucional.pt..
[62] Acórdão do Tribunal da Relação de 06.04.2011 (processo n.º 1724/09.27FLSB-3), Processo n.º 1724/09.27FLSB-3), disponível em www.dgsi.pt.
[63] Acórdão do STJ de 08.02.2018, Processo n.º 1194/14.3TVLSB.L1.S2), ponto 4.2.1, disponível em www.dgsi.pt.
[64]  Cd de fls. 2245, pasta “CE”, subpasta “Anexos”, subpasta “CE 20140312”, subpasta “Dossier BdP ADM 2014_0026”, ficheiro “Resposta BES Carta BdP_20140226_ADM 0026” e fls. 2874-2884, maxime fls. 2875 v. e pasta “CE”, subpasta “2 26-02-2014 a 12-06-2014”, ficheiro “(1506) 13 03 2014”; fls. 24-211, maxime fls. 27, 27 v. e 143 v.
[65]  Fls. 24-211, maxime fls. 29 e 210; fls. 1193-1216; cd de fls. 2245, pasta “CA”, ficheiro “(305) 15 05 2014”; fls. 2282-2729, maxime fls. 2287-2290; cd de fls. 3223, ficheiro “20140509_Acta Comissão de Controlo de Transacções com Partes Relacionadas”; fls. 3225-3226 v., maxime fls. 3226 e 3226 v.; fls. 3684-3710 v., maxime fls. 3686 v. e 3687; fls. 7968-8276, maxime fls. 8139.
[66] A Testemunha integrou o Departamento Jurídico do BES, desde 2000, integrou os seus quadros em 2003, como diretor-adjunto e assessor do CA, sendo que, entre 2011-2014, assumiu as funções de director coordenador do departamento de assuntos jurídicos, juntamente com PP, reportando ao Recorrente DD. Exerceu, depois, funções como Administrador do Novo Banco, entre Março de 2015 e até 31.12.2016.
[67] Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal (cit.), p. 407.
[68] Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal (cit.), p. 407.
[69] Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal (cit.), p. 407.
[70] Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal: Parte Geral, Tomo I, 3.ª Edição, 2019, Gestlegal, pp. 710-711.
[71] Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal: Parte Geral, Tomo I, 3.ª Edição, 2019, Gestlegal, p. 712.
[72] Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Regime Geral das Contra-Ordenações à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Lisboa: Universidade Católica Editora, 2011, p. 63.
[73] «Comentário do Regime Geral das Contra-Ordenaçãoes à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem», Ed. UCP, pág. 91.
[74] Acompanhado, também, de Maia Gonçalves, sublinhando que [a] diminuição considerável da culpa do agente deve radicar em solicitações de uma mesma situação exterior que o arrastar para o crime, e não em razões de carácter endógeno”.
[75] Cfr. Comentário do Código Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Universidade Católica Editora, p. 139.
[76] Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal (cit.), p. 1197.
[77] Maia Gonçalves, Código Penal Português, Anotado e Comentado, Almedina, 6.ª Edição, p. 126.
6 Acórdão de 26.09.2012 do Tribunal da Relação de Coimbra, Processo n.º 842/10.9PEAVR.C1 (ênfase aditado).
[79]  Acórdão do TRE de 11.11.2008, Proc. n.º 2490/08-1, disponível em www.dgsi.pt .
[80] RCO n.º 293/21...., que correu termos no J... deste TCRS e foi objecto de confirmação pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa em 13 de Julho de 2022, não sendo susceptível de recurso ordinário, mas não tendo transitado em julgado, por força da interposição de recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade para o Colendo Tribunal Constitucional.
[81] Neste sentido, entre outros, Nuno Brandão, “O controlo judicial da decisão administrativa condenatória manifestamente infundada no processo contraordenacional”, in Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, 94, 2018, pp. 309-332, maxime pág. 313 (e demais doutrina aí mencionada).
[82] Cfr. pontos 1620 a 1692 e conclusão 233.
[83] Cfr pontos 1693 a 1724 e conclusões 234 e 235.
[84] Cfr. Acórdão n.º 78/2013 (Proc. n.º 624/12) que apreciava a constitucionalidade da leitura conjugada dos artigos 108.º, n.os 1 e 3, 113.º, n.º 1, sss) (alínea ttt), na redação do Decreto-Lei n.º 176/2007, de 8 de maio) e n.º 2, do mesmo artigo 113.º, da Lei n.º 5/2004, de 10 de fevereiro, enquanto sancionava como uma contraordenação, punível com uma coima de € 5.000 a € 5.000.000, a violação da obrigação de prestação de informações prevista nos n.os 1 e 3 do artigo 108.º, do mesmo diploma, praticada por pessoa coletiva.
Também com interesse o Acórdão n.º 41/2004.
[85] Vejam-se os Acórdãos do Tribunal Constitucional n.os 304/94, 574/95, 547/00, 62/2011, 132/2011, 360/2011, 400/2017 e 397/2019.
[86] Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 574/95.
[87] Augusto Silva Dias, Direito das Contra-ordenações, 2018, Almedina, p. 165
[88] Augusto Silva Dias, Direito das Contra-ordenações, 2018, Almedina, p. 166
[89] Paulo Otero e Maria Fernanda Palma, “Revisão do Regime Legal do Ilícito de Mera Ordenação Social, in Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (Separata), 1996, n.º 2, p. 562-563, apud Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 67/2011.
[90] Sobre a supervisão dos mercados e a tutela constitucional do sistema financeiro, cf. Frederico de Lacerda da Costa Pinto, “Supervisão do mercado, legalidade da prova e direito de defesa em processo de contra-ordenação (parecer)”, in AA.VV., Supervisão, direito ao silêncio e legalidade da prova, Coimbra, Almedina, 2009, p. 70-77. Desenvolvidamente em Frederico de Lacerda da Costa Pinto, “A supervisão no novo Código dos Valores Mobiliários”, in Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários, n.º 7, 2000, pp. 91-101.
[91] Nuno Brandão, Crimes e Contra-Ordenações: da Cisão à Convergência Material, Coimbra Editora, 1.ª Edição, Janeiro de 2016, p. 832 e 833.
[92] Disponível no site do Tribunal Constitucional.
[93] Vejam-se os Acórdãos do Tribunal Constitucional n.os 304/94, 574/95, 547/00, 62/2011, 132/2011, 360/2011, 400/2017 e 397/2019.
[94] Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 574/95.
[95] Sobre a supervisão dos mercados e a tutela constitucional do sistema financeiro, vd. Frederico Lacerda da Costa Pinto, Supervisão do mercado, legalidade da prova e direito de defesa em processo de contra-ordenação (parecer), in AA.VV., Supervisão, direito ao silêncio e legalidade da prova, Coimbra, Almedina, 2009, p. 70-77. Desenvolvidamente em Frederico de Lacerda da Costa Pinto, A supervisão no novo Código dos Valores Mobiliários, in Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários, n.º 7, 2000, pp. 91-101.