APENSAÇÃO DE PROCESSOS
PRESSUPOSTOS
SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA
CAUSA PREJUDICIAL
Sumário

I – São requisitos da apensação de processos:
a) que as acções tenham sido propostas separadamente;
b) que se verifiquem, entre elas, os pressupostos da admissibilidade do litisconsórcio, da coligação, da oposição ou da reconvenção;
c) que o requerente da apensação nela revele um interesse atendível;
d) que o estado do processo ou outra razão especial não torne inconveniente a apensação.                                  
II – Não obsta à apensação o facto de o processo a apensar estar suspenso por pendência de causa prejudicial [correspondendo esta ao processo ao qual será efectuada a apensação], uma vez que, com a junção dos processos, passará a existir uma só acção unificada, cessando o motivo que presidiu à suspensão.

Texto Integral

Acordam na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

RELATÓRIO:
AM…, L.da, intentou acção declarativa, com processo comum, contra V…, L.da, P…, L.da, J… e L…, pedindo que sejam “os Réus, solidariamente, condenados a pagar à Autora:
a) O montante de €6.845.000,00 (seis milhões oitocentos e quarenta e cinco mil euros) acrescido dos juros de mora calculados à taxa legal comercial por danos patrimoniais;
b) O montante de €2.600.000,00 (dois milhões e seiscentos mil euros) acrescido dos juros de mora calculados à taxa legal comercial por danos não patrimoniais;
c) A condenação do Réu L… em responsabilidade extracontratual no pagamento no valor de 1.000.000,00 Milhão por danos Patrimoniais;
d) Bem como a condenação do Réu J… solidariamente com as sociedades Rés pela sua atuação como gerente de direito e de facto das mesmas”.
Alega que celebrou com as RR. P… e V…, representadas pelo R. L… e sendo o R. J… gerente de direito e de facto das mesmas, diversos contratos de subempreitada, em determinado empreendimento em que a A. é empreiteira, pelo valor total de €6.219.810,09, acrescido de IVA. Refere que, a dada altura, as RR. sociedades começaram a sobre-facturar os seus trabalhos, com preços superiores aos acordados e com base em autos de medição não aprovados pela A., além de existir um grande atraso no cumprimento dos prazos estipulados, de os meios utilizados no estaleiro terem sido reduzidos em 50% (apesar de terem sido cobrados a 100%), de ter sido debitada uma quantidade de aço superior à utilizada, e de a obra apresentar diversos defeitos, oportunamente comunicados às RR., mas não eliminados, até que as RR. acabaram por abandonar a obra, para a qual, aliás, não tinham alvará de construção. Conclui que, em face daquele abandono e do incumprimento dos contratos por parte das RR., a A. os declarou resolvidos, sendo as RR. responsáveis pelos prejuízos que causaram, num total de €6.845.000,00, composto pelas seguintes parcelas: “€400.000,00 – Em multas diárias de contrato; €875.000,00 – Reparações ao qual acresce o valor de +25% (previsto em contrato); €400.000,00 – Notas de crédito; €602.000,00 – Defeitos de obra com redução de preço; €2.700.000,00 – Prejuízos com Clientes; €868.000,00 – Estrutura JPS com custos diretos (considerou-se 8 meses); €300.000,00 – Devolução de parte do valor do estaleiro cobrado indevidamente; €700.000,00 - Arranjo das infraestruturas danificadas com a realização das subempreitadas”. Mais alega que àquele valor acrescem €2.600.000,00 de danos não patrimoniais na imagem da A., relativos à sua credibilidade perante os seus clientes.
Os RR. contestaram, invocando a ineptidão da petição inicial, por falta de materialização dos factos concretos que integram a causa de pedir, a ilegitimidade passiva da R. P…, por não constar como parte nos contratos em causa nos autos, e a ilegitimidade passiva dos RR. L… e J…, por terem actuado sempre em nome e representação da 1ª R. e nunca a título pessoal. No mais, alegam que, em 12/3/2018, apenas três dos contratos [relativos aos lotes L1 a L3] foram celebrados entre a A. (como empreiteira) e a 1ª R. (como subempreiteira), enquanto outro [relativo ao lote 402L2] foi celebrado entre esta (como empreiteira) e a sociedade T…, S.A. (como dona da obra), e o último foi celebrado, em 4/1/2019, entre a A., a T… e a R. V…, sendo que tal contrato se dividiu em duas relações autónomas – uma entre a A., como empreiteira, e a 1ª R., como subempreiteira [relativa às Moradias 401 (L1 a L9), 405L4 a 405L8 e Banda 412 a 416, 430 e 431], e outra entre a T…, como dona da obra, e a 1ª R., como empreiteira [relativa aos Lotes 404, 402-L1 e 402-L3 a 402-L5]. Concluem, assim, que só a R. V… se obrigou a efectuar os trabalhos de construção incluídos nos contratos, sendo certo que foram por si realizados trabalhos ainda não pagos, sendo devidos à 1ª R., por referência a facturas emitidas em nome da A., €365.598,45, bem como €153.180,79 relativos a facturas emitidas em nome da T…, e ainda diversos trabalhos constantes de autos de medição enviados à A.. Pretendem que nenhum incumprimento é imputável à R. V…, que nenhuns prejuízos causou, tendo os defeitos existentes sido todos corrigidos, pelo que nada é devido, tanto mais que aquela R. cumpriu todas as suas obrigações até à data da resolução do último contrato, em 16 de Dezembro de 2019, com fundamento na falta de pagamento da A. e da T…. Referem que, considerando que estas não apresentaram qualquer plano que conduzisse à regularização das relações entre as partes, a R. V… apresentou, no Juízo de Comércio de Lisboa, pedido de declaração de insolvência da A. e da T…. Finalizam pedindo a condenação da A., como litigante de má fé, por ter deduzido uma pretensão cuja falta de fundamento bem conhece, alterando a verdade dos factos, em multa e indemnização não inferior a €50.000,00.
A A. pronunciou-se quanto à nulidade e excepções suscitadas e ao pedido da sua condenação como litigante de má fé, pugnando pela sua improcedência.
Veio, entretanto, a A. apresentar articulado superveniente, no qual alega que, após a entrada da acção em Juízo, foram identificados novos defeitos e reparações a realizar na obra, e a A. efectuou, à sua custa, a reparação de todos os defeitos deixados pelas RR. V… e P…, sendo certo que os custos com as reparações e trabalhos acessórios ascendem a €2.599.575,00, a que acresce uma penalização de €649.893,75. Conclui por uma ampliação do pedido em €1.374.468,75, passando o pedido a ter a seguinte redação:
“Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis, deve a presente ação ser julgada totalmente procedente e, em consequência, serem os Réus, solidariamente, condenados a pagar à Autora:
a) O montante de €8.219.468,75 (oito milhões quinhentos e noventa e quatro mil quatrocentos e sessenta e oito euros e setenta e cinco cêntimos) acrescido dos juros de mora calculados à taxa legal comercial por danos patrimoniais;
b) O montante de €2.600.000,00 (dois milhões e seiscentos mil euros) acrescido dos juros de mora calculados à taxa legal comercial por danos não patrimoniais;
c) A condenação do Réu L… em responsabilidade extracontratual no pagamento no valor de €1.000.000,00 (um milhão de euros) por danos Patrimoniais;
d) Bem como a condenação do Réu J… solidariamente com as sociedades Rés pela sua atuação como gerente de direito e de facto das mesmas”.
Tal requerimento foi admitido, tendo os RR. pugnado pela improcedência da ampliação do pedido, alegando que foi a A. quem recusou autorizar o acesso à obra dos representantes da 1ª R., para que estes pudessem proceder à reparação dos defeitos identificados na vistoria, renunciando, assim, ao crédito de reparação desses defeitos.
Foi proferido despacho de convite ao aperfeiçoamento da petição inicial, ao qual a A. correspondeu.
Na sua petição inicial aperfeiçoada precisa a A. que faz parte do mesmo grupo empresarial que a sociedade T…, S.A., sendo a A. empreiteira dos imóveis cuja venda é promovida pela T…. Mais refere que ambas as sociedades desencadearam várias relações contratuais com as RR. V… e P…, mas todos os contactos foram mantidos com esta última, representada pelo R. L…, tendo a R. V… intervindo apenas formalmente em alguns dos contratos celebrados. Nessa sequência, foram assinados, com data de 12/3/2018, três contratos de subempreitada entre a A. e a R. V… [relativos aos Lotes 405-L1 a 405-L3]. Em Junho de 2019, veio a ser celebrado um quarto contrato de subempreitada entre a A. e a R. P…, embora tenha sido a R. V… a figurar, formalmente, nesse contrato [relativo aos edifícios 404, 402L1, 402L3 a 402L5, Banda 401, 405L4 a 405L8, Banda 412 a 416, 430 e 431]. Refere, ainda, que os quatro contratos se mantiveram todos em vigor e foram executados conjuntamente pela R. P…, mas assumindo a R. V… a operação. Nessa execução, ocorreram “atrasos por incumprimento do plano de trabalhos; sobrefaturação por medições incorretas do aço; sobrefaturação por cobrança indevida de estaleiro; inconformidades verificadas na execução da obra, ou seja, erros de execução dos trabalhos contratualizados”, que culminaram com o abandono da obra pelas RR. P… e V…, sem qualquer aviso prévio. Entretanto, o R. J…, em representação das RR. sociedades, informou a A. de que a R. P… não tinha condições para prosseguir com a execução dos trabalhos, atenta a existência de facturas vencidas e alegadamente em dívida e autos de medição que aguardam aprovação da A.. Face a toda esta actuação das RR. sociedades, a A., em 13/9/2019, resolveu todos os contratos de subempreitada que estavam em vigor. Em 16/12/2019, as RR. sociedades invocaram junto da A. a falta de pagamento das facturas vencidas e de aprovação dos autos de medição e, ignorando a declaração de resolução efectuada pela A., declararam elas próprias resolvidos os contratos. Pretende que, com a sua actuação, as RR. sociedades causaram prejuízos à A. no valor provisório de €6.801.042,99, assim discriminado:
“i) €606.042,99 – Em multas diárias de contratos
ii) €875.000,00 – Reparações ao qual acresce o valor de +25% (previsto em
contratos)
iii) €450.000,00 – Notas de crédito;
iv) €602.000,00 – Defeitos de obra com redução de preço;
v) €2.700.000,00 – Prejuízos com Clientes;
vi) €868.000,00 – Estrutura JPS com custos diretos (considerou-se 8 meses)
vii) ------
viii) €700.000,00 – Arranjo das infraestruturas danificadas com a realização das subempreitadas”.
Mais alega que acresce aos prejuízos elencados o valor de €2.600.000,00, referente a danos não patrimoniais sofridos pela A. em termos reputacionais e de credibilidade perante os seus clientes.
Pretende também que o R. L… incorre em responsabilidade extracontratual, por danos patrimoniais, no valor de €1.000.000,00 provocados à A., pelo facto de ter intermediado as negociações entre as partes, actuando de má-fé e de forma dolosa.
Pretende, finalmente, que o R. J… seja condenado solidariamente com as RR. sociedades, “pela sua actuação como gerente de direito e de facto das mesmas, uma vez que não detinha poderes legais representativos para o efeito”, já que assinou os contratos celebrados com a A., quando não era gerente da R. V….
Conclui com o seguinte pedido:
“Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis, deve a presente ação ser julgada totalmente procedente e, em consequência, serem os Réus, solidariamente, condenados a pagar à Autora:
a) O montante de €6.801.042,99 (seis milhões, oitocentos e um mil, quarenta e dois euros e noventa e nove cêntimos), acrescido dos juros de mora calculados à taxa legal comercial por danos patrimoniais;
b) O montante de €2.600.000,00 (dois milhões e seiscentos mil euros) acrescido dos juros de mora calculados à taxa legal comercial por danos não patrimoniais;
c) A condenação do Réu L… em responsabilidade extracontratual no pagamento no valor de €1.000.000,00 Milhão por danos patrimoniais;
d) Bem como a condenação do Réu J… solidariamente com as sociedades Rés pela sua atuação como gerente de direito e de facto das mesmas.
Valores aos quais acrescem os juros moratórios vencidos e vincendos, até efetivo e integral pagamento, calculados à taxa legal aplicável às transações comerciais”.
Os RR. vieram defender a inadmissibilidade da nova petição inicial apresentada e, por cautela, manter o teor da defesa por excepção e por impugnação já deduzida na contestação.
A petição inicial aperfeiçoada veio a ser admitida pelo tribunal.
Em 21/3/2022, os RR. formularam pedido de apensação, ao processo principal, dos autos nº15387/20.0T8LSB, a correrem termos no Juízo Central Cível de Lisboa (Juiz 11). Alegam que tais autos dizem respeito a uma acção que a aqui R. V… instaurou contra a ora A. e contra T…, S.A., peticionando o pagamento de créditos vencidos no âmbito dos contratos que também se discutem no presente processo. Refere que deduziu acção separada, visando “separar as discussões sobre a matéria de facto em causa, tendo em conta a atitude intensamente litigante, ou mesmo beligerante, da aqui Autora”, permitindo que a apreciação dos factos em discussão numa e noutra acção “fosse mais objectiva, sem contaminação entre as causas de pedir”. Porém, naquela outra acção foi proferido despacho de suspensão da instância por pendência de causa prejudicial, pelo que, estando reconhecida a prejudicialidade entre as duas acções, é conveniente a sua apensação.
Junta certidão, extraída daquele processo nº15387/20, de onde resulta que, em 14/2/2022, foi ali proferido o seguinte despacho:
“Da Suspensão da Instância por Causa Prejudicial:
Na sua contestação (art.ºs 1.º a 12.º), as RR. requerem a suspensão da instância, nos termos do disposto no artigo 272.º do CPC, por entenderem existir prejudicialidade entre a presente acção e a que corre termos no Juízo Central Cível de Lisboa – J10, sob o n.º222/20.8T8LSB.
A A. opôs-se à suspensão (art.ºs 1.º a 9.º da resposta de 06.01.2022 – fls. 2212 e segs.), defendendo que a referida prejudicialidade é, meramente, aparente e de pura conveniência, pois que as acções em causa tratam de situações que se tocam e que têm as mesmas relações contratuais como ponto de partida, mas não se confundem.
Cumpre decidir.
Das certidões de fls. 1052 a 1315 e 1316 a 1453 e da consulta electrónica do processo, decorre que:
1. Corre termos pelo Juízo Central Cível de Lisboa – J10, uma acção declarativa comum, registada com o n.º 222/20.8T8LSB, instaurada em 03.01.2020, por AM…, LDA., contra V…, LDA., e OUTROS, onde é pedida, para alem do mais, a condenação dos RR. a pagarem, solidariamente, à A. a quantia de € 6.845.000,00, acrescida de juros de mora, a título de danos patrimoniais, e a quantia de € 2.600.000,00, acrescida de juros de mora, a título de danos não patrimoniais, por incumprimento dos contratos de subempreitada celebrados entre a A. AM… e a R. V… em 12.03.2018 (relativo ao lote 405 L3) e em 04.01.2019 (relativo aos Lotes 404, 402 L1, 402 L3, 403L5, 401, 404L4 a 405L8, 413, 414, 415, 416, 430 e 431);
2. Na referida acção, foi apresentada contestação, em 08.03.2020, onde os RR., para além de arguirem excepções dilatórias, se pronunciam pela improcedência da acção, negando qualquer situação de incumprimento da sua parte, defendendo que a A. AM… deve à R. V… uma determinada quantia relativa a trabalhos por si realizados no âmbito das referidas relações contratuais e invocando o incumprimento da R. por omissão de validação dos autos de medição de trabalhos realizados nos meses de Agosto a Novembro de 2019;
3. Na referida acção foi proferido despacho em 12.10.2021, admitindo um articulado superveniente de ampliação do pedido e ordenando a notificação da aí A. para juntar documentos.
Dispõe o art.º 272.º, n.º 1 do NCPC, que o tribunal pode ordenar a suspensão da instância quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer outro motivo justificado.
Entende-se por causa prejudicial aquela onde se discute e pretende apurar um facto ou situação que é elemento ou pressuposto da pretensão formulada na causa dependente, de tal forma que a resolução da questão que está a ser apreciada e discutida na causa prejudicial irá interferir e influenciar a causa dependente, destruindo ou modificando os fundamentos em que esta se baseia (cfr. Alberto dos Reis, in Comentário ao Código de Processo Civil, vol. 3º, pp. 267 e ss.).
De acordo com a jurisprudência, quanto sabemos, uniforme dos nossos tribunais superiores, uma causa é prejudicial em relação a outra quando aí se esteja a apreciar uma questão cuja resolução possa modificar uma situação jurídica que tem de ser considerada para a decisão de outro pleito ou quando a decisão ali proferida possa destruir o fundamento ou a razão de ser da segunda
É claramente, o que ocorre no caso dos autos.
Nos presentes autos a A. pretende a condenação das RR. a pagarem-lhe o preço de trabalhos realizados no âmbito dos contratos de empreitada/subempreitada celebrados com as RR. em 12.03.2018 e 04.01.2019, obrigação essa que as RR. entendem não ser devida, invocando a excepção de não cumprimento dos referidos contratos por parte da A. Mais: a R. AM… alega ser titular de um crédito sobre a A. relativo a vícios, defeitos e incumprimentos dos contratos de subempreitadas celebrados entre ambas e pagamentos efectuados a mais, deduzindo, subsidiariamente, contra a A. pedido reconvencional, através do qual pretende que se declare extinto o crédito invocado pela A., caso venha a considerar-se existente, por inferior ao da R., e se condene a A. no pagamento do remanescente.
Ora, o fundamento do pedido deduzido na acção n.º 222/20.8T8LB consiste, precisamente, na verificação destes vícios, defeitos e incumprimentos dos contratos de subempreitadas celebrados com a A. (quanto aos prazos, preços e qualidade da obra), causadores de prejuízos patrimoniais e para a sua imagem, bem como a realização de diversos pagamentos a mais e a defesa da aí R., aqui A., nessa acção passa, também, pela invocação do crédito que, na presente acção, pretende fazer valer (embora nessa acção, estranhamente, não deduza pedido reconvencional quanto a esse alegado crédito).
Significa o exposto, que em ambas as acções se discute o (mesmo) incumprimento ou cumprimento defeituoso dos (mesmos) contratos de subempreitada celebrados entre as partes, pelo que terá que concluir-se que o fundamento da presente acção depende do julgamento daquela, sendo indiferente a posição processual que as partes assunem numa e noutra.
Dir-se-á que na referida acção n.º 222/20.8T8LSB não é parte a aqui R. T… e que, aparentemente, não está em causa o contrato celebrado entre esta e a A. em 12.03.2018, relativo ao Lote 402 L2 (documento de fls. 113 a 130).
Mas tal não basta para afastar a referida relação de prejudicialidade.
Na verdade, a A. só demanda a R. T… por entender que do contrato celebrado em 04.01.2019 emergiram “na prática, duas relações contratuais distintas” entre si a a R. AM… e entre si e a R. T…, mas a verdade é que esta R. não subscreveu tal contrato, razão pela qual não interveio, como A., na acção n.º 222/20.8T8LSB (vide art.º 4.º da contestação).
Seja como for, independentemente de a R. T… ser ou não parte no contrato de 04.01.2019, o incumprimento deste é fundamento, quer da acção n.º 222/20.8T8LSB, quer da defesa das RR. na presente acção, sendo, também, a causa de pedir da reconvenção deduzida pela R. AM….
Desta forma, a decisão final que vier a ser proferida na acção que corre termos pelo J10 interfere e afecta, necessária e irremediavelmente, os fundamentos e a razão de ser da presente, que, por força da formação de caso julgado material, terá que ser julgada e decidida em conformidade com o juízo que naquela se vier a fazer sobre o cumprimento ou incumprimento dos mesmos contratos.
Na acção n.º 222/20.8T8LSB, que é a causa prejudicial, estão, pois, a apreciar-se factos e questões que são pressupostos, na presente acção, do pedido deduzido pela A. e da defesa invocada pela RR. e cuja resolução pode modificar a situação jurídica, que tem, necessariamente, que ser considerada para a decisão da presente acção.
E tanto assim é, que a própria A., que na resposta escrita (fls. 2212 e segs.) negou a relação de prejudicialidade, acabou por invocar, na réplica (fls. 2205 e segs), a excepção da litispendência do pedido reconvencional deduzido pela R. AM… relativamente à acção n.º 222/20.8T8LSB, alegando que tal pedido assenta nos mesmos factos em que assenta a referida acção, num claro reconhecimento de que nas duas acções se apreciam questões cuja resolução pode destruir o fundamento ou a razão de ser da instaurada em segundo lugar.
Saliente-se que existe uma diferença entre a excepção da litispendência/caso julgado e a autoridade do caso julgado: a primeira destina-se a evitar uma nova decisão inútil (razões de economia processual) e pressupõe uma total identidade entre ambas as causas; a segunda, importa a aceitação de uma decisão proferida em acção anterior, que se insere, quanto ao seu objecto, no objecto da segunda, visando obstar a que a relação ou situação jurídica material definida por uma sentença possa ser validamente definida de modo diverso por outra sentença (razão de certeza ou segurança jurídica).
Mostra-se, pois, demonstrada a pendência de uma causa prejudicial, por existir evidente relação de prejudicialidade ou dependência entre a presente acção e a que corre termos no J10.
Por todo o exposto, decido suspender a presente instância até à decisão definitiva, transitada em julgado, do Proc. n.º 222/20.8T8LSB do Juízo Central Cível de Lisboa – J10.
Notifique e comunique ao referido processo, solicitando que informe logo que seja proferida decisão final definitiva.
Não obstante, através de consulta electrónica do referido processo, informe a cada 120 dias do respectivo estado”.
A A. opôs-se à apensação, por entender não existir interesse atendível dos RR. na junção dos processos, até porque a acção que se pretende apensar encontra-se suspensa por verificação de causa de prejudicialidade criada pelos próprios RR. que, ao invés de deduzirem uma reconvenção no âmbito dos presentes autos, optaram por intentar uma acção autónoma.
Foi, então, em 11/7/2022, proferido despacho, com o seguinte teor:
“Da requerida apensação, a estes autos, do Procº 15837/20.0T8LSB, pendente no Juiz 11 destes Juízos Centrais Cíveis de Lisboa –
Através do requerimento entrado em juízo em 21.3.2022 vieram os Réus requerer a apensação, a estes autos, do processo supra identificado.
Para tanto alegam:
- que a primeira Ré, V…, instaurou - após a propositura destes autos - acção contra a aqui Autora e a T…, S. A., a qual corre os seus termos sob o nº 15837/20.0T8LSB, no Juiz 11 destes Juízos Centrais Cíveis do Tribunal da Comarca de Lisboa, acção em que pede a condenação das aí Rés no pagamento da quantia de 1.931.736,12 Euros, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento, valores à mesma devidos – e vencidos - por força, em parte, dos contratos também em causa nestes autos, deste Juiz 10, pedido esse único, deduzido contra tais demandadas, por si, em tais autos (demandadas das quais apenas uma é parte nestes autos);
- que (ao que se percebe) a primeira Ré, não deduziu reconvenção nestes autos – que correm termos no Juiz 10 - face à atitude beligerante da aqui demandante, por forma a não haver contaminação entre as causas de pedir;
- que nos autos cuja apensação se requer veio a ser decretada a suspensão de tal instância até à decisão destes autos (Procº 222/20.8T8LSB), por aí ter sido entendido que estes autos constituem causa prejudicial relativamente àquela e,
- que as razões determinantes da suspensão da instância pendente no Juiz 11 determinam a possibilidade da apensação de tal acção a estes autos, pendentes neste Juiz 10, apesar de as partes não serem integralmente coincidentes e por pretensa verificação dos requisitos do litisconsórcio, coligação, oposição ou reconvenção e as acções estarem, no seu entendimento, na mesma fase processual.
Por requerimento entrado em juízo em 4.4.2022 veio a Ré opor-se à requerida apensação, com os fundamentos de tal requerimento constantes.
Cumpre decidir.
Dispõe o art.º 267, nº 1 do C. P. Civil:
“Se forem propostas separadamente acções que, por se verificarem os pressupostos de admissibilidade do litisconsórcio, da coligação, da oposição ou da reconvenção, pudessem ser reunidas num único processo, é ordenada a junção delas, a requerimento de qualquer das partes com interesse atendível na junção, ainda que pendam em tribunais diferentes, a não ser que o estado do processo ou outra razão especial torne inconveniente a apensação.“
Salvo o devido respeito por opinião contrária entende-se que a apensação requerida e ora decidenda não pode ser deferida, por não verificação dos requisitos aludidos no preceito legal parcialmente transcrito.
Com efeito e em primeiro lugar, constata-se que as duas acções não se encontram na mesma fase processual.
Na verdade, no processo cuja apensação se mostra requerida pelos aqui Réus e instaurada pela aqui Ré V… contra a aqui Autora e ainda contra uma outra sociedade - alheia a estes autos ( a T…, Lda. ) -, a instância foi declarada suspensa, por despacho de 14.2.2022, transitado em julgado, em que se considerou que estes autos (Procº 222/20.8T8LSB) constituíam, relativamente a esses autos, causa prejudicial.
De tal facto decorre, desde logo, que a suspensão da instância no aludido Proc.º nº 15837/20.0T8LSB apenas cessa, por força da lei, com o trânsito em julgado da decisão a proferir nestes autos, a cuja apensação se mostra requerida a daqueles - ver art.º 276, nº 1, al. c) do C. P. Civil -.
Ora e antes de mais, há que referir que em caso de apensação de acções, as mesmas mantêm a sua autonomia, apenas havendo lugar a uma instrução, julgamento e decisão (duas) conjunta.
Por outro lado e ainda que o tribunal entendesse que ambos os processos estivessem na mesma fase processual (o que não entende), não poderia este tribunal revogar a aludida decisão de suspensão da instância, sob pena de violação do caso julgado decorrente da prolação de tal despacho de suspensão da instância e sua não impugnação e, logo, não haveria qualquer possibilidade de instrução, julgamento e decisão em conjunto.
Tendo presente o exposto, não se consegue descortinar não só que as duas acções se encontrem na mesma fase processual como, além do mais, qual seria o interesse que a aqui Ré V…, Lda. ou Réus poderia ou poderiam eventualmente ter na apensação requerida por a mesma acção ( Procº 15837/20.0T8LSB ) ter de ficar a aguardar a decisão definitiva destes autos, com o nº 222/20.8T8LSB.
Diga-se ainda que, de qualquer modo, os aqui Réus e, em particular a aqui primeira Ré (Autora no processo cuja apensação os demandados vieram requerer ) não poderia obter a prossecução daqueles autos ( pendentes no Juiz 11 ) mediante a sua apensação a estes e, assim, por essa via, pretender contornar a decisão de suspensão de tal instância, transitada em julgado, que se afigura ser o pretendido.
Por outro lado e em segundo lugar, ainda que se não entendesse que as duas acções se não encontram na mesma fase processual ( que se entende não estarem, como se referiu ), sempre se dirá que não se consegue descortinar que entre estes autos e os que constituem o Procº 15837/20.0T8LSB se possa configurar como demonstrados os pressupostos do litisconsórcio, coligação, oposição e/ou reconvenção, únicas situações em que a apensação seria susceptível de ser deferida.
Com efeito e antes de mais, há que realçar que das aludidas figuras jurídicas referidas, a única relativamente à qual seria possível de se considerar verificados, no caso, os respectivos pressupostos, seria a da reconvenção - ver art.º 266, nºs 1 e 2, als. b) ou c) do C.P. Civil -, sendo que a requerente da apensação nem explicita os termos de tal sua eventual pretensão recovencional, não deduzida nestes autos.
Não obstante, certo é que nem os pressupostos da admissibilidade de dedução de pedido reconvencional se verificam, in casu.
Com efeito e antes de mais, a reconvenção apenas poderia ser deduzida pela aqui Ré contra a aqui Autora e apenas nas situações aludidas no nº 3 do aludido art.º 266 do C. P. Civil poderia deduzi-lo também contra terceira se a mesma se pudesse associar à reconvinda, Autora nestes autos.
Ora, o que está em causa nestes autos é apenas e tão só a pretensa responsabilidade contratual - ou não - das duas primeiras Rés e/ou dos demandados singulares, tal como peticionado, enquanto na acção que se encontra pendente no Juiz 11 sob o nº15837/20.0T8LSB poderia estar em causa - se deduzido pedido reconvencional e suscitada a intervenção da terceira, pela aqui primeira demandada e ali demandante - a eventual responsabilidade da T…, S. A. ( que é parte no processo pendente no Juiz 11, mas não é parte nestes autos afectos ao Juiz 10 ) e da aqui Autora e Ré nos autos cuja apensação se requer.
Ora, a primeira Ré e ora requerente da apensação optou por não deduzir, nestes autos, pedido reconvencional e tal opção só à sua vontade se deve, não podendo agora pretender obter o mesmo resultado por via da apensação das acções, após a suspensão da instância, por causa prejudicial e por despacho transitado em julgado, daquela instância do Procº15837/20.0T8LSB, pendente no Juiz 11.
Por outro lado, salienta-se que no processo cuja apensação se mostra requerida a aqui primeira Ré deduz contra as aí Rés ( das quais apenas a aqui Autora é parte demandada em tais autos ) um único pedido, com base não apenas nos contratos em causa nestes autos, como ainda, ao que se consegue vislumbrar do Viewer do Citius, num outro contrato, celebrado entre a aí Ré T…, S. A. e a aqui primeira demandada, ali Autora.
Do supra referido resulta claro que, a admitir-se a apensação requerida a mesma traduziria a ampliação da matéria factual e jurídica a discutir, por aquela acção abranger também a suposta responsabilidade contratual da T…, S. A. pelo pagamento de valores de trabalhos pela aqui primeira Ré e ali Autora executados, ao abrigo quer dos contratos em causa nestes autos, quer ao abrigo de contrato celebrado ainda por terceira, a aludida T…, S. A..
Daí adviria uma manifesta ampliação da complexidade do litígio, com a necessária dificuldade da sua decisão, no que ao todo se refere e não ser a apensação, por isso, vantajosa para qualquer das partes, por inviabilizar o andamento mais célere possível da lide, aliás já difícil dados os termos vagos em que a p. i. desta acção foi instaurada, necessidade de convite ao seu aperfeiçoamento, satisfeito, mas logrado mediante vários requerimentos.
Em consequência de tudo o supra exposto, entende-se evidente não só as acções em causa na mesma fase processual como ainda não se mostrarem verificados os requisitos de admissibilidade de dedução de pedido reconvencional, por forma a que se possa entender verificado o condicionalismo a que se refere o art.º 267 do C. P. Civil.
Assim e sem necessidade de mais considerações, indefiro a requerida apensação, a estes autos, do Procº 15837/20.0T8LSB, pendente no Juiz 11 destes Juízos Centrais Cíveis do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, com sede nesta cidade.
Custas do incidente pelos Réus, requerentes da apensação – art.º 527 do C. P. Civil”.
Não se conformando com esta decisão, dela apelou a R. V…, L.da, formulando, no final das suas alegações, as seguintes conclusões:
“I. O presente recurso tem por objeto o despacho proferido no dia 11.07.2022, sob a referência 416203778, que julgou improcedente o pedido de apensação aos presentes autos do processo n.º 15387/20.0T8LSB atualmente pendente, após redistribuição, no Juiz 16 dos Juízos Centrais Cíveis de Lisboa, cujo teor, por economia processual, aqui se dá integralmente por reproduzido;
II. Ora, salvo o devido respeito, estamos perante um erro de julgamento de direito quanto à interpretação e aplicação das normas jurídicas relativas à apensação de ações.
III. Como é comummente reconhecido, “[o] objetivo principal da apensação das ações é obter a uniformidade de julgamento e decisão integrada, sem contradições, defendendo a paz social e o crédito da justiça; Visa-se, também, obter a economia na atividade processual; A apensação de ações dá lugar a uma só sentença, precedida de uma só audiência final, cujo objeto, caso tenha tido lugar a seleção da matéria de facto a instruir ou mesmo a elaboração da base instrutória ou questionário, deve ser reunido num só elenco.”
IV. Como é também reconhecido, “[a] [eventual] demora que sobrevirá [ou possa sobrevir] ao processo pela apensação de outros, não constitui fundamento para se reputar inconveniente a apensação.”
V. A apensação de ações implica, pois, a instrução e a apreciação conjuntas das ações apensadas.
VI. O facto da ação a apensar se encontrar suspensa, não importa que os dois processos estejam em fases processuais distintas, nem a suspensão, por si, impede a apensação, em especial quando a decisão de suspensão se fundou no reconhecimento da existência de uma questão prejudicial entre as duas ações, proferida por despacho após a chamada fase dos articulados, ou seja, a fase em que se encontra a presente ação.
VII. A decisão proferida no processo a apensar, que decidiu a suspensão da instância do processo nº 15837/20.0T8LSB, transitada em julgado, não impede a apensação, porquanto a força de tal decisão é intraprocessual, ou seja, apenas tem efeito no processo em que foi proferida, conforme decorre, a contrario, do disposto nos artigos 619.º/1, 580.º e 581.º, todos do CPC.
VIII. Ou seja, aquela decisão, não vincula o Juiz do presente processo, onde foi requerida a apensação, nem tão pouco representa qualquer fuga ao que foi decidido, pois o que importa é saber se estão, ou não, reunidos os pressupostos para a apensação.
IX. As duas ações encontram-se na mesma fase processual, aguardando a prolação do despacho aludido no artigo 591.º, do CPC.
X. A Recorrente tem interesse na apensação, interesse que se tarduz na celeridade processual, ou seja, no direito a uma decisão em prazo razoável, consagrado constitucional no artigo 20º/4 da Constituição da República Portuguesa (CRP) e no artigo 6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, ratificada pela Lei n.º 65/78, de 13/10.
XI. Como decorre da decisão junta aos presentes, correspondente ao despacho proferido sobre a questão prejudicial proferida no processo a apensar, bem como da petição inicial, cuja certidão ora se requer para melhor compreensão da matéria em causa no presente recurso, como terá também constatado o Tribunal “a quo” no momento em que procedeu ao “Viewer do Citius”, pode e deve, retirar-se, desde logo, três conclusões: (i) entre as sociedades AM…, Lda., aqui Autora, e a sociedade T…, S. A., existe uma relação de domínio ou de grupo (vide artigos 8.º a 19.º da petição inicial do processo a apenar); (ii) o título contratual em causa, numa e noutra ação, é único, correspondente ao contrato denominado pelas Partes de “Contrato de Subempreitada”, datado de 04.01.2019, de onde emergiram, na opinião da Recorrente duas relações jurídicas materialmente distintas (um de empreitada e uma outra de subempreitada), posição esta que as sociedades AM…, Lda., aqui Autora, e a sociedade T…, S. A. rejeitam não obstante os indícios existentes (vide artigos 55.º a 64.º da petição inicial do processo a apenar); e (iii) finalmente, o acervo dos factos controvertidos é absolutamente idêntico numa e noutra ação (ou processo).
XII. Em face do que, considerando o disposto no artigo 267.º/1 do CPC, “[s]e forem propostas separadamente acções que, por se verificarem os pressupostos de admissibilidade do litisconsórcio, da coligação, da oposição ou da reconvenção, pudessem ser reunidas num único processo, é ordenada a junção delas, a requerimento de qualquer das partes com interesse atendível na junção, ainda que pendam em tribunais diferentes, a não ser que o estado do processo ou outra razão especial torne inconveniente a apensação.”
XIII. “[…] o litisconsórcio exige uma pluralidade de sujeitos e também, segundo uns, uma única relação jurídica material (artigo 32º do CPC) ou, segundo outros, uma unidade de pedidos (artigo 36º do CPC), neste ponto residindo o critério de distinção da figura jurídica da coligação e, sendo certo que a lei processual civil parece utilizar indistintamente, nos citados normativos, estes dois critérios”;
XIV. “O facto de a relação jurídica material controvertida afectar directamente os interesses de várias pessoas não determina, só por si, a necessidade de intervenção de todos os interessados.”
XV. “A regra é a do litisconsórcio voluntário em que os sujeitos da relação podem intervir ou não em conjunto, tendo carácter excepcional o litisconsórcio necessário, dados os graves embaraços que para a parte representa a sua imposição.”
XVI. “O litisconsórcio é necessário, segundo dispõe o nº 1 do artigo 33º do C.P.C., quando a lei ou o contrato o impuserem ou quando resultar da própria natureza da relação jurídica.”
XVII. Do nº 2 do artigo 33.º do Código de Processo Civil, decorre que "é igualmente necessária a intervenção de todos os interessados quando, pela própria natureza da relação jurídica, ela seja necessária para que a decisão a obter produza o seu efeito útil normal", esclarecendo o nº 3 do mesmo preceito que "a decisão produz o seu efeito útil normal sempre que, não vinculando embora os restantes interessados, possa regular definitivamente a situação concreta das partes relativamente ao pedido formulado".
XVIII. “Prevê o artigo 33º, nº 2 do CPC o chamado litisconsórcio natural, ao expressar ser necessária a intervenção de todos os interessados para que a decisão produza o seu efeito útil normal.”
XIX. “O efeito útil normal da sentença é declarar o direito de modo definitivo, formando caso julgado material - ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil Anotado,I, p. 111.”
XX. “Esclarece ANSELMO DE CASTRO, ob. cit., 203, que “a sentença produzirá o seu efeito normal quando defina uma situação jurídica que não só não poderá mais ser contestada por qualquer das partes, como ainda seja de molde a poder subsistir inalterada, não obstante ser ineficaz em confronto dos outros co- interessados, como quer que uma nova sentença venha a definir a posição ou situação destes últimos”.”
XXI. “Refere ANTUNES VARELA, Revista de Legislação e Jurisprudência, Ano 117, p. 383, que, a parte final do n.º 2 do art.º 28.º [actual artigo 33º com idêntica redacção] “admite claramente a possibilidade de, nas relações plurais, a acção ser instaurada apenas por algum ou alguns dos seus titulares, ou contra algum ou alguns deles. Essencial é que a decisão a proferir em tais circunstâncias possa regular definitivamente as pretensões formuladas pelas partes».
XXII. “Para entender o sentido do conceito de «efeito útil normal» agora consagrada no artigo 33.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, existem duas orientações doutrinárias. Uma tese ampla, que afere o efeito útil normal pela insusceptibilidade de contradição lógica, teórica ou técnica de julgados.”
XXIII. “E, ao invés, uma tese mais restrita, defendida por MANUEL DE ANDRADE, Scientia Juridica, VII, n.º 34, 186, que afere o efeito útil à insusceptibilidade de contradição apenas prática entre julgados, em termos de obstar a decisões que não possam definir estavelmente a situação jurídica sem atingir os diversos interessados na decisão – cfr. também neste sentido ANSELMO DE CASTRO, ob. cit., 204.”
XXIV. O nº 2 do artigo 33º do nCPC (tal como sucedia com o art.º 28.º do aCPC) parece adoptar pela noção mais restrita de efeito útil normal, já que o instituto do litisconsórcio necessário natural visa evitar decisões inconciliáveis sob o ponto de vista prático e, consequentemente, obter segurança e certeza na definição das situações jurídicas.”
XXV. “Como esclarece ANSELMO DE CASTRO, o facto de a lei se limitar a facultar, e não a impor, o litisconsórcio nas relações com pluralidade de interessados, como unidade de causa de pedir (art.º 32º, nº 1, 1ª parte do CPC), leva a concluir que lhe é indiferente a coexistência de decisões divergentes e logicamente contraditórias e, portanto, que a situação a evitar pela obrigatoriedade do litisconsórcio é tão só a de decisões, além de divergentes, praticamente inconciliáveis – ob. cit., loc. cit.”
XXVI. “Sempre que inexista a incompatibilidade dos efeitos produzidos – critério consagrado no nº 2 do artigo 33º do CPC – a decisão produz o seu efeito útil normal, sendo irrelevante a possibilidade de superveniente antagonismo ou conflito teórico de decisões resultantes de os interessados não vinculados ao caso julgado serem partes noutra acção com solução diversa.”
XXVII. “Seguindo ainda ANSELMO DE CASTRO, ob.ci., 208, há que compatibilizar entre o princípio da liberdade – cada um tem o direito de propor a acção, sem ser forçado a tal e contra quem quiser – com o princípio da utilidade – a demanda há-de ter utilidade prática, para se concluir que nas relações com pluralidade de sujeitos, se a lei nada disser, é sempre lícito accionar isoladamente ou demandar só um dos interessados, desde que a acção, pelo facto de ser proposta só por um ou apenas contra um, não perca a utilidade prática.”
XXVIII. Em face do exposto, perante a matéria de facto e causa nas duas ações, a dos autos e aquela outra a apensar, não podem ou devem restar quaisquer dúvida, que se verifica, in casu, uma situação de litisconsórcio necessário, ou caso assim não se entenda, de litisconsórcio voluntário, ou, por fim, e ainda que se entenda não se verificar nenhuma das situações de litisconsórcio, existirá, seguramente, uma situação de coligação, estando, assim reunidos todos os pressupostos para a apensação das duas, de acordo com o disposto no artigo 267.º/1 do CPC.
XXIX. Inexistindo qualquer razão especial que torne inconveniente a apensação, verificando-se in casu que existem sobejamente razões que tornam a apensação absolutamente conveniente, em nome de princípios e valores normativos processuais de economia da atividade processual] e de coerência, ou melhor, uniformidade de julgamento.
Nestes termos e nos demais de Direito que V. Exas. mui doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser julgado procedente, por provado, revogando o despacho recorrido, substituindo por outro que ordene a apensação do processo n.º 15387/20.0T8LSB atualmente pendente, após redistribuição, no Juiz 16 dos Juízos Centrais Cíveis de Lisboa, com as legais consequências, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!”.
Junta, com o seu requerimento de interposição de recurso, certidão emitida em 25/5/2022, extraída do processo nº15387/20.0T8LSB, contendo a petição inicial desse processo.
A A. contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso e defendendo que não deve ser admitido o documento junto com as alegações, por intempestividade da junção.

QUESTÕES A DECIDIR
Conforme resulta dos art.ºs 635º nº 4 e 639º nº1 do Código de Processo Civil, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente, as quais desempenham um papel análogo ao da causa de pedir e do pedido na petição inicial. Ou seja, este Tribunal apenas poderá conhecer da pretensão e das questões [de facto e de direito] formuladas pela recorrente nas conclusões, sem prejuízo da livre qualificação jurídica dos factos ou da apreciação das questões de conhecimento oficioso (garantido que seja o contraditório e desde que o processo contenha os elementos a tanto necessários – art.ºs 3º nº 3 e 5º nº 3 do Código de Processo Civil). Note-se que “as questões que integram o objecto do recurso e que devem ser objecto de apreciação por parte do tribunal ad quem não se confundem com meras considerações, argumentos, motivos ou juízos de valor. Ao tribunal ad quem cumpre apreciar as questões suscitadas, sob pena de omissão de pronúncia, mas não tem o dever de responder, ponto por ponto a cada argumento que seja apresentado para sua sustentação. Argumentos não são questões e é a estes que essencialmente se deve dirigir a actividade judicativa”. Por outro lado, não pode o tribunal de recurso conhecer de questões novas que sejam suscitadas apenas nas alegações / conclusões do recurso – estas apenas podem incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, salvo os já referidos casos de questões de conhecimento oficioso [cfr. António Santos Abrantes Geraldes, “Recursos em Processo Civil”, Almedina, 2022 – 7ª ed., págs. 134 a 142]. Finalmente, cabe, ainda, conhecer das questões suscitadas em sede de contra-alegações, relativas aos pressupostos processuais, conforme resulta do art.º 638º nº5 e 6, também do Código de Processo Civil.
Nessa conformidade, são as seguintes as questões que cumpre apreciar:
- a admissibilidade da junção de documento com o requerimento de interposição de recurso;
- a existência de erro de julgamento no indeferimento da requerida apensação de processos.

QUESTÃO PRÉVIA
Com o requerimento de interposição de recurso, a recorrente junta certidão da petição inicial do processo nº15837/20.0T8LSB, a qual foi emitida em 25/5/2022.
O requerimento de apensação de acções foi formulado em 21/3/2022 e o despacho recorrido foi proferido em 11/7/2022.
Nos termos do art.º 651º nº1 do Código de Processo Civil, as partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excepcionais a que se refere o art.º 425º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1ª instância.
Por seu turno, o mencionado art.º 425º prevê que “depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento”.
Ora, a certidão em causa, datando de 25/5/2022, poderia ter sido junta em momento anterior ao da interposição de recurso (até antes da prolação do despacho recorrido).
No entanto, há que considerar que a junção se tornou necessária em virtude do julgamento proferido na 1ª instância. Com efeito, a junção de documentos às alegações de recurso “poderá ter lugar se a decisão da 1ª instância criar, pela primeira vez, a necessidade de junção de determinado documento, quer quando a decisão se baseie em meio probatório não oferecido pelas partes, quer quando se funde em regra de direito com cuja aplicação ou interpretação as partes não contavam[1]”. No caso dos autos, o tribunal a quo baseou a sua decisão em meio probatório não oferecido pelas partes, já que, no despacho recorrido, alude expressamente ao pedido formulado na acção cuja apensação se pretende, que diz ter visualizado mediante consulta efectuada no “Viewer do Citius” (apesar de não ter procedido à desejável junção de cópia dos elementos obtidos mediante tal consulta). Tornou, pois, tal decisão necessária a junção de certidão da petição inicial daquele processo, caso contrário, o tribunal de segunda instância não estaria sequer habilitado a apreciar integralmente a decisão recorrida (por ausência de acesso ao referido meio de prova utilizado pelo tribunal a quo).
É, assim, de admitir a junção da certidão apresentada com o requerimento de interposição de recurso, o que se decide.

FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Os factos relevantes para a decisão são os constantes do relatório, que aqui se dá por integralmente reproduzido, bem como os que infra se consideram assentes[2]:
A) No processo nº15387/20.0T8LSB, a correr termos no Juízo Central Cível de Lisboa, correspondente a acção declarativa, com processo comum, em que é A. V…, L.da, e são RR. T…, S.A., e AM…, L.da, o pedido formulado é o de que as RR. sejam condenadas a pagar “em conjunto à autora € 1.931,736,12, correspondente às faturas vencidas, valor dos trabalhos executados constantes dos autos de medição acima identificados, devolução das retenções de garantia e juros de mora, com as legais consequências” – documento 1 junto com o requerimento de interposição de recurso, que aqui se dá por integralmente reproduzido.
B) Alega a A., naquela acção, que o valor do pedido emerge do incumprimento, pelas RR., de um contrato de empreitada celebrado entre a A. e a R. T… em 12/3/2018 [Lote 402L2], de três contratos de subempreitada celebrados entre a A. e a R. AM… em 12/3/2018 [Lotes 405L1 a 405L3], e de um contrato, datado de 4/1/2019, do qual emergiram duas relações – uma de empreitada entre a A. e a R. T… [Lotes 404, 402L1 e 402L3 a 402L5] e outra de subempreitada entre a A. e a R. AM… [Lotes 401, 405L4 a 405L8, Banda 412 a 416, 430 e 431].

FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
A única questão que nos ocupa é a de determinar se deve, ou não, ser apensada ao processo principal a acção que corre termos no Juízo Central Cível de Lisboa, sob o nº 15387/10.0T8LSB.
Nos termos do art.º 267º do Código de Processo Civil (na parte que aqui releva):
“1 - Se forem propostas separadamente ações que, por se verificarem os pressupostos de admissibilidade do litisconsórcio, da coligação, da oposição ou da reconvenção, pudessem ser reunidas num único processo, é ordenada a junção delas, a requerimento de qualquer das partes com interesse atendível na junção, ainda que pendam em tribunais diferentes, a não ser que o estado do processo ou outra razão especial torne inconveniente a apensação.
2 - Os processos são apensados ao que tiver sido instaurado em primeiro lugar, salvo se os pedidos forem dependentes uns dos outros, caso em que a apensação é feita na ordem da dependência, ou se alguma das causas pender em instância central, a ela se apensando as que corram em instância local.
3 - A junção deve ser requerida ao tribunal perante o qual penda o processo a que os outros tenham de ser apensados”.
Esta norma, facultando “a apensação de acções que, embora tenham sido propostas separadamente, podiam ter sido reunidas no mesmo processo”, “constitui manifestação do princípio da economia processual”, permitindo “que no mesmo processo se resolva o maior número possível de litígios, impedindo a multiplicação evitável de processos judiciais”[3].
Em conformidade com o citado art.º 267º, são requisitos da apensação de processos:
a) que as acções tenham sido propostas separadamente;
b) que se verifiquem, entre elas, os pressupostos da admissibilidade do litisconsórcio, da coligação, da oposição ou da reconvenção;
c) que o requerente da apensação nela revele um interesse atendível;
d) que o estado do processo ou outra razão especial não torne inconveniente a apensação.
No caso dos autos, não há dúvidas de que estamos perante duas acções (nº222/20 e 15387/20) que foram propostas separadamente e em ambas a causa de pedir é constituída (além do mais) pelo incumprimento de contratos de subempreitada celebrados em 12/3/2018 e 4/1/2019, relativos aos lotes 405L1 a 405L3, 404, 402L1, 402L3 a 402L5, 401, 405L4 a 405L8, 412 a 416, 430 e 431. No caso do processo nº222/20, a A. alega que quem incumpriu tais contratos foram as RR. sociedades, razão pela qual não está obrigada a qualquer pagamento e deve ser indemnizada dos prejuízos que lhe foram causados (cujo ressarcimento peticiona) e, no processo 15387/20, a A. V… alega que quem os incumpriu foram as RR. T… e AM…, pelo que estas devem proceder ao pagamento dos valores em falta, devidos pela prestação dos serviços da A. (cujo pagamento peticiona).
Assim, relativamente ao pedido formulado no processo nº15387/20 pela ali A. V… contra a ali R. (e aqui A. AM…), constata-se que o mesmo poderia ter sido apresentado, em sede de reconvenção, no processo 222/20. Com efeito, de acordo com o art.º 266º nº2 a) do Código de Processo Civil, a reconvenção é admissível quando o pedido do réu emerge do facto jurídico que serve de fundamento à acção ou à defesa. Ora, os aqui RR. baseiam a sua defesa, além do mais, no facto de a A. ter incumprido, por falta de pagamento, os contratos mencionados na petição inicial, pagamento esse que precisamente é pedido no processo nº15387/20.
Por outro lado, é certo que a sociedade T…, S.A., que figura como R. no processo nº15387/20, não é parte no processo nº222/20. Porém, um dos fundamentos deste último é o incumprimento, pelos RR., do contrato celebrado em 4/1/2019. A A. alega que tal contrato foi celebrado entre a A. e as RR. V… e P…, enquanto estas alegam que também a referida T… interveio nesse contrato, como empreiteira, tendo o mesmo sido incumprido (por falta de pagamento) pela A. e pela T…. E tal pagamento vem pedido pela V… (como autora) no processo nº15387/20. Assim, constata-se que, igualmente em relação à T…, na vertente relativa ao contrato celebrado em 4/1/2019, se encontram preenchidos os pressupostos da admissibilidade da reconvenção, já que, dizendo a relação material controvertida respeito também a ela, a mesma poderia associar-se à A. reconvinda e, assim, a sua intervenção poderia ter sido suscitada pelos RR. (cfr. arts. 32º, 33º e 266º nº1 a) e nº4 do Código de Processo Civil).
Apenas o contrato de empreitada alegadamente celebrado, em 12/3/2018, entre a sociedade V… e a sociedade T…, relativo ao Lote 402L2, cujo incumprimento é invocado, como causa de pedir, no processo nº15387/20, não integra a causa de pedir do processo nº 222/20. No entanto, atendendo a que se trata de contrato alegadamente celebrado na mesma ocasião e em conjunto com os restantes contratos celebrados entre as partes (em discussão no processo nº 222/20), dizendo todos os contratos respeito a obras a construir no mesmo empreendimento e sendo semelhantes os factos invocados quanto ao incumprimento de todos esses contratos, o que implicará também a aplicação das mesmas regras de direito e de cláusulas de contratos perfeitamente análogas, encontram-se preenchidos, nesta parte, os pressupostos da coligação, pelo que, também nessa vertente, a R. V… poderia, no processo nº 222/20, ter formulado o correspondente pedido reconvencional, uma vez suscitada a intervenção da T… – cfr. art.ºs 266º nº 4 e 36º nº2 do Código de Processo Civil.
Encontram-se, assim, preenchidos os pressupostos da apensação, supra referidos nas alíneas a) e b).
Quanto ao requisito supra mencionado na alínea c) [que o requerente da apensação nela revele um interesse atendível], temos que a aqui recorrente tem evidente interesse na apensação, porquanto, sendo R. nesta acção nº 222/20 e A. na acção 15387/20, é de toda a conveniência para si (e, aliás, para os restantes intervenientes processuais) que os factos sejam apreciados conjuntamente, de modo uniforme, assim se impedindo a existência de contradição de julgados e garantindo-se o efeito útil de ambas as acções, com economia de meios. Note-se que o facto de a requerente da apensação ter podido evitá-la se tivesse apresentado reconvenção no processo principal não invalida a existência daquele interesse na uniformidade de julgados que, aliás, é objectivo. O único obstáculo que, em nosso entender, deste ponto de vista, se apresentaria à apensação seria, eventualmente, o pedido – invocado pela recorrente na contestação que apresentou no processo 222/20 (cfr. art.º 748º dessa peça) – de declaração da insolvência das sociedades AM… e T…, o qual, a ser procedente, implicaria a inutilidade superveniente da acção nº15387/20 (cfr. AUJ nº1/2014) e, consequentemente, a falta de interesse na apensação. No entanto, decorridos que são quase três anos desde a apresentação daquela contestação, não está sequer demonstrada nos autos [mediante a junção da pertinente certidão] a pendência de tais processos de insolvência, nem que a insolvência tenha sido declarada, pelo que tais factos não podem aqui relevar.
Finalmente, quanto à alínea d) supra [que o estado do processo ou outra razão especial não torne inconveniente a apensação], não vemos que da matéria de faco relevante, supra transcrita, resulte qualquer prejuízo para o andamento da causa.
Com efeito, a apreciação dos factos e contratos em causa no processo 222/20 implica já, necessariamente, a apreciação dos factos e contratos que constituem a causa de pedir no processo nº15387/20 (exceptuando, na sua restrita medida, os factos relativos ao alegado incumprimento do contrato incidente sobre o lote 402L2 que, no entanto, como já se referiu, é em tudo semelhante aos outros).
Por outro lado, em ambos os processos se configura a aplicação das mesmas regras de direito.
Além disso, nenhum deles seguiu ainda para a fase da produção de prova, pelo que nenhum retardará o outro.
Também não obsta à apensação o facto de no processo nº15387/20 ter sido declarada a suspensão da instância, com fundamento na pendência de causa prejudicial. É que, uma vez decretada a apensação, ambos os processos passarão a correr, de forma unificada, no processo nº 222/20 e, portanto, este deixará, por natureza, de constituir causa prejudicial (que apenas subsiste quando existem dois processos a correr separadamente), já que será o único processo pendente, no qual serão tramitados a instrução, julgamento e decisão de ambas as causas assim reunidas[4]. Não haverá, pois, ao contrário do que refere a decisão recorrida, que aplicar o disposto no art.º 276º nº 1 c) do Código de Processo Civil, porque a razão que presidiu à suspensão da instância no processo nº15387/20 cessa com a apensação – como se refere no art.º 267º nº1, do mesmo diploma, ocorre a junção das acções, que passam a ser uma só. Note-se, ainda, que no prosseguimento (integral) da causa não existirá qualquer violação do caso julgado formal relativamente ao despacho que declarou a suspensão da instância no processo nº15387/20, porque é diversa a factualidade subjacente ao prosseguimento da [única] acção pendente (cfr. art.ºs 620º nº1 e 625º, a contrario, do Código de Processo Civil).
Encontram-se, pois, preenchidos todos os requisitos da apensação de processos, pelo que a apelação deverá proceder.
DECISÃO
Pelo exposto, acorda-se em revogar a decisão recorrida, que se substitui por outra que determina, nos termos do art.º 267º do Código de Processo Civil, a apensação, ao processo nº 222/20.8T8LSB, do processo nº15387/20.0T8LSB.
Custas pela A.-recorrida – art.º 527º do Código de Processo Civil.

Lisboa, 24 de janeiro de 2023
Alexandra de Castro Rocha
Maria Amélia Ribeiro
Isabel Salgado

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[1] [1] Cfr. António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, 3ª ed., pág. 848 (sublinhado nosso).
[2] Os quais são aqui fixados nos termos do art.º 662º nº1 do Código de Processo Civil.
[3] Cfr. José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Volume 1º, 4ª ed., pág. 541.
[4] Como se refere no Ac. RG de 21/5/2020, proc. 1773/19, disponível em http://www.dgsi.pt, “a partir da apensação, atenta a unificação das causas para efeitos de tramitação, instrução e julgamento”, tem de se “considerar que as partes que intentaram acções separadas e distintas passam a ser partes numa causa única”.