CRIME DE DESOBEDIÊNCIA
PENA ACESSÓRIA DE PROIBIÇÃO DE CONDUZIR VEÍCULOS COM MOTOR
PRINCÍPIO DA NÃO AUTOMATICIDADE DAS PENAS
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO
Sumário


I – A proibição de conduzir veículos com motor, prevista no artigo 69º do Código Penal, assume a natureza de uma pena acessória e embora dependente da existência de uma pena principal, não decorre imediatamente da aplicação da pena principal, nem da natureza desta, mas sim da prática dos crimes que preveem a aplicação dessa pena acessória.
II – Na aplicação dessa pena acessória, o julgador atende aos critérios previstos no artigo 71º do Código Penal, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, graduando-a dentro dos limites legais existentes, não tendo de ser proporcional à pena principal, estando assim assegurado o princípio constitucional da não automaticidade das penas.
III – Não é possível a suspensão da execução dessa pena acessória, porquanto não existe no Código Penal qualquer norma que o preveja.

Texto Integral


Acordam, em conferência, os Juízes que integram a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães.

I – Relatório

Decisão recorrida
No âmbito do Processo Comum (Tribunal Singular) nº 343/21.0GBBCL, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga – Juízo Local Criminal de Barcelos, foi proferida no dia 11 de maio de 2022, a seguinte sentença, cuja parte decisória se transcreve:
“Pelo exposto, julga-se a acusação procedente e, em consequência, decide-se condenar o arguido P. J. pela prática, na forma consumada de um crime de desobediência, previsto e punido pelos artigos 348.º, n.º 1, alínea a) e 69.º, n.º 1, alínea c), ambos do Código Penal e 152.º, n.º 3, do Código da Estrada:
a) na pena principal de 40 dias de multa, à razão diária de € 7,00, no total de € 280,00 (duzentos e oitenta euros);
b) pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 6 (seis) meses”.

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Recurso apresentado

Inconformado com tal decisão, o arguido P. J. veio interpor o presente recurso e após o motivar, apresentou as seguintes conclusões e petitório, que se reproduzem:
“C - CONCLUSÕES:

1. O arguido/Recorrente não se pode conformar com a sentença proferida, merecendo a mesma censura, pelo que o recurso versará sobre a matéria de direito, no que concerne à determinação da pena acessória, como veremos infra.

I – DA NÃO APLICAÇÃO DA PENA ACESSÓRIA

2. Ao dizer-se no artigo 30º n.º 4 da Constituição que “Nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos”, pretende-se dizer que nenhuma condenação ou sanção envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis (incluindo o de conduzir), profissionais ou políticos.
3. De facto, dizer-se que a norma supra transcrita só se aplica quando a aplicação da pena acessória dependa da gravidade, da espécie ou tipo de pena/sanção principal, salvo o devido respeito, é fazer-se uma interpretação falaciosa da norma em questão.
4. O princípio da não automaticidade dos efeitos das penas acessórias pressupõe, assim, um juízo autónomo, com base em critérios legais, que permita averiguar da necessidade do efeito da pena (a perda de um determinado direito) - cfr. Constituição Portuguesa Anotada, de JORGE MIRANDA e RUI MEDEIROS, Tomo I, pág. 338.
Pelo que, por demasiado onerosa e pelo facto de colocar em causa a vida pessoal e a saúde do Arguido, ficar inibido de conduzir pelo período de 6 meses é excessivo e desproporcional.
5. Com efeito, a lei não faz depender do preenchimento de qualquer pressuposto, a aplicação da pena acessória de “inibição de conduzir”, ou seja, a aplicação da pena acessória decorre necessária e automaticamente da prática do crime, sem que seja aquilatada a sua necessidade no caso concreto, daí a violação dos artigos 18.º n.º 2 e 30.º n.º4 da Constituição.
6. Por todo o exposto, é inconstitucional o entendimento que perfilhe que a pena acessória decorre necessária e automaticamente do sancionamento crime mencionado na douta sentença, sem que seja aquilatada a sua necessidade no caso concreto, por violação do disposto no artigo 18.º, n.º 2 e 30.º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa, que assim expressamente se argui.
7. E, neste caso, deve o Arguido ser absolvido da condenação na pena acessória.

MERAMENTE À CAUTELA, CASO SE ENTENDA QUE DEVE SER APLICADA AO ARGUIDO A PENA ACESSÓRIA DE INIBIÇÃO DE CONDUZIR,

II - DA SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA ACESSÓRIA:

8. Admitindo-se a hipótese de ser de aplicar a pena de inibição de conduzir, deve a mesma ser suspensa da execução no caso de estarem verificados os pressupostos de que a lei penal faz depender a suspensão da execução das penas.
9. Esses pressupostos, nos termos do artigo 50º do Código Penal, são: a personalidade do agente, as condições da sua vida, a sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, e a conclusão que a simples censura do facto realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
10. Na presente situação, e por tudo o anteriormente alegado, quanto à conduta e personalidade do Arguido, parece, salvo melhor opinião, ser esta medida adequada a afastar o Arguido da prática de crimes, simultaneamente, satisfazer as necessidades de reprovação e prevenção do ilícito de mera ordenação social.
11. Atentas todas as circunstâncias descritas e argumentos aduzidos, deverá ser concedida a suspensão da execução da pena acessória.
Porque o Arguido necessita de conduzir para ir trabalhar, pois que exerce a sua atividade profissional fora do seu concelho de residência, para ir às compras, portanto para assegurar os mínimos básicos do seu bem-estar, sendo certo que não detém qualquer outra condenação anterior.
12. Sendo certo que, se lhe for concedida a suspensão da execução da pena acessória de inibição de conduzir, compromete-se a acatá-la rigorosamente, com um grande sentido de responsabilidade e sem qualquer tipo de hesitação.
13. Como tal, o Arguido merece que lhe seja dada uma nova oportunidade, servindo-lhe a suspensão da execução da pena acessória de inibição de conduzir como uma lição de vida, e como um exemplo de que jamais voltará a acontecer uma situação deste tipo.
14. Sendo certo que, quanto à sua personalidade, o Arguido é uma pessoa equilibrada, ponderada, honesta, e extremamente responsável.
15. Quanto às condições de vida, a carta de condução é imprescindível, a nível pessoal e por motivos profissionais.
16. O Arguido é uma pessoa cumpridora da legalidade, máxime do Código da Estrada, sendo que tem vários anos de carta de condução e nunca esteve envolvido em acidente de viação, nem nunca teve qualquer processo crime por estes motivos.
17. Daí que, pelo exposto, o arguido merece que lhe seja dada uma nova oportunidade, até porque o Arguido interiorizará o desvalor da sua conduta.
18. A simples censura do facto realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
19. Pelo que deverá a pena acessória ser suspensa na sua execução.
20. MERAMENTE À CAUTELA, CASO SE ENTENDA QUE DEVE SER APLICADA AO ARGUIDO A PENA ACESSÓRIA DE INIBIÇÃO DE CONDUZIR, E NÃO DEVA A MESMA SER SUSPENSA,

21. III – DA PENA ACESSÓRIA EXCESSIVA

22. No que diz respeito à pena acessória de seis meses afigura-se, também, a mesma, excessiva, desproporcional e desajustada.
23. Na verdade, tendo em conta o já referido quanto à inserção social e profissional do Arguido e ter o seu cadastro rodoviário e cadastro criminal sem ocorrências, nunca tendo estado envolvido em nenhum acidente de viação, nunca a sua conduta estradal tendo sido objeto de qualquer censura, ter demonstrado arrependimento, a sua postura, a sua situação económica e social e o facto de ter uma necessidade absoluta e continuada de conduzir veículos automóveis no âmbito da sua vida pessoal, uma vez que exerce a sua atividade profissional fora do seu concelho de residência, são circunstâncias que militam a favor do arguido, e portanto, a pena acessória deveria ter sido inferior.
24. “A pena acessória visa, tão só, prevenir a perigosidade do agente, muito embora se lhe assinale também um efeito de prevenção geral, enquanto que a pena principal tem em vista a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade” – cfr. Ac. RC, de 07/11/1996, in BMJ, 461, pág. 538.
25. Ora, no confronto entre as circunstâncias que depõem contra o arguido/Recorrente e as que depõem em seu favor, parece-nos que a medida da pena acessória que se nos afigura proporcional e adequada deve situar-se na pena de proibição de conduzir por um período de três meses.
26. Portanto, afigura-se como adequada a proibição de conduzir pelo mínimo estabelecido por lei, por ser a mais ajustada aos fins ressocializadores tidos em vista.
27. Pelo que, perante este circunstancialismo e face ao exposto supra, deveria ter sido aplicado ao arguido a pena acessória de proibição da faculdade de conduzir veículos motorizados pelo período de um mês, o que se considera justa, adequada e proporcional aos fins de prevenção geral e especial que o caso requer.
Não o tendo feito o tribunal recorrido não salvaguardou a reintegração do Recorrente na sociedade, violando o consagrado nos artigos 40.º, 71.º e 69.º al. a) do Código Penal.
28. Assim, deve o recurso ser julgado provado e procedente nos termos supra expostos.

TERMOS EM QUE, deve o presente recurso ser julgado provado e procedente, e, em consequência, ser revogada a sentença recorrida e substituída por outra que:

A) Absolva o Arguido da pena acessória de proibição de conduzir.
B) Caso assim não se entenda, sem prescindir, seja suspensa na sua execução a pena acessória de inibição de conduzir.
C) Caso assim não se entenda, sem prescindir, não seja a pena acessória superior a um mês de inibição de conduzir.
ASSIM FARÃO V.EX.AS INTEIRA JUSTIÇA.
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Resposta ao recurso por parte do Ministério Público.

Na primeira instância, o Ministério Público, apresentou resposta pugnando pela improcedência do recurso e manutenção da sentença recorrida.

Apresenta as seguintes conclusões, que se reproduzem:

I - A pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor foi fixada em 6 meses, tendo por referência a moldura abstrata e segundo os critérios gerais de determinação das penas, previstos nos artigos 40.º e 71.º do CP, não sendo, assim, aplicada de forma automática, como referido pelo recorrente, pelo que não violou os art.ºs 18.º, n.º 2 e 30.º, n.º 4 da CRP.
II – Não existe norma legal, no Código Penal ou no Código de Processo Penal, que permita a suspensão da execução da pena acessória ou sequer o seu cumprimento descontínuo, designadamente aos fins-de-semana, nas férias ou durante o horário de trabalho do condenado, pelo que tal pretensão e legalmente inadmissível.
III – A pena acessória em que o arguido foi condenado revela-se perfeitamente razoável e adequada em função dos critérios gerais de determinação que presidiram à sua aplicação, a qual visa, para além da proteção de bens jurídicos e da reintegração do agente na sociedade, a censura da perigosidade do agente, não sendo claramente pesada, exagerada e desadequada como o recorrente a qualifica, mas sim consentânea com os referidos critérios legais, pelo que será de manter.
IV – Não foram violadas as normas jurídicas invocadas pelo recorrente nem quaisquer outras”.
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Tramitação subsequente

Neste Tribunal da Relação de Guimarães, o processo foi com vista ao Ministério Público, tendo a Exma. Senhora Procurador-Geral Adjunto, emitido parecer aderindo à resposta ao recurso apresentada na 1ª instância pelo Ministério considerando que o recurso seja declarado improcedente.
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Foi cumprido o disposto no artigo 417º nº2 do CPP não tendo sido apresentada qualquer resposta.
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Após ter sido efetuado exame preliminar, foram colhidos os vistos legais e realizou-se a conferência.
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II – Fundamentação.

Cumpre apreciar o objeto do recurso.

O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respetiva motivação, sendo apenas essas questões, as que o tribunal de recurso tem de apreciar, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, designadamente dos vícios previstos no artigo 410º, nº 2, do Código de Processo Penal (1).

As questões que se colocam à apreciação deste tribunal são, por ordem lógica da
sua apreciação, as seguintes:

I – Não aplicação da pena acessória por violação do disposto nos artigos 18.º n.º 2 e 30.º n.º4 da Constituição da República Portuguesa.
II – Suspensão da execução da pena acessória.
III – Medida concreta da pena acessória, reputada de excessiva.
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É a seguinte a matéria de facto dada como provada pelo tribunal “a quo” (transcrição):

“1.No dia - de abril de 2021, pouco antes das 21h30m, na Rua …, em …, neste concelho de Barcelos o arguido P. J. conduzia o veículo automóvel, ligeiro de passageiros, da marca BMW, com a matrícula SM, de sua propriedade, onde lhe foi dada ordem de paragem pelos elementos da patrulha da GNR de Barcelos, R. F. e S. B., que se encontravam devidamente uniformizados e se faziam transportar em veículo caraterizado daquela força policial.
2. Os quais se deslocaram àquele arruamento com o intuito de interpelar o arguido sobre o seu envolvimento num episódio de agressão física a uma mulher de identidade não concretamente indicada, antes ocorrido, na freguesia de … (…), também deste concelho.
3. Após o arguido ter imobilizado o veículo e porquanto apresentasse sinais (hálito e descoordenação motora) de se encontrar alcoolizado, foi-lhe ordenado por aqueles guardas da GNR que efetuasse teste de despistagem de álcool no sangue, pelo método de ar expirado, tendo este recusado prontamente a sua realização.
4. Persistindo nessa recusa, mesmo depois de ter sido advertido pelos mesmos guardas de que tal recusa o faria incorrer na prática de um crime de desobediência.
5. O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente bem sabendo que ao não efetuar o teste de alcoolemia cuja realização lhe fora ordenada pelos guardas da GNR de Barcelos, incumpria uma ordem legítima, que lhe fora regularmente comunicada por agente de autoridade, devidamente identificado e uniformizado e que lhe fez a correspondente cominação legal, o que quis.
6. Sabia ainda que a sua descrita conduta era proibida e punida por lei penal.
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Mais se provou que:

7. O arguido não dispõe de antecedentes criminais.
8. Trabalha como tintureiro, auferindo um vencimento mensal de € 720,00.
9. Vive com a progenitora, em casa desta”.
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Da alegada inconstitucionalidade da pena acessória por violação do disposto nos artigos 18.º n.º 2 e 30.º n.º 4 da Constituição da República Portuguesa.
O arguido P. J. foi condenado pela prática, na forma consumada de um crime de desobediência, previsto e punido pelos artigos 348.º, n.º 1, alínea a) e 69.º, n.º 1, alínea c), ambos do Código Penal e 152.º, n.º 3, do Código da Estrada numa pena de 40 dias de multa, à razão diária de € 7,00 e ainda na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 6 (seis) meses.
É a condenação na pena acessória que está em causa no presente recurso.
Como é sabido “São penas acessórias as penas cuja aplicação pressupõe a fixação na sentença condenatória de uma pena principal ou de substituição, estando previstas quer na parte geral quer na parte especial do CP” (2) Uma dessas penas acessórias está prevista no artigo 69º do Código Penal com a epígrafe “Proibição de conduzir veículos com motor”, sendo que por força do disposto no seu nº 1, alínea c), é condenado na proibição de conduzir veículos com motor por um período fixado entre três meses e três anos quem for punido “por crime de desobediência cometido mediante recusa de submissão às provas legalmente estabelecidas para detecção de condução de veículo sob efeito de álcool, estupefacientes, substâncias psicotrópicas ou produtos com efeito análogo”.

Entende o arguido que se mostram violados os artigos 18.º n.º 2 e 30.º n.º 4 da C.R.P. que têm a seguinte e respetiva redação:

- “A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos”
- “Nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos”.
Na esteira do já defendido por Figueiredo Dias, (3) a proibição de conduzir veículos motorizados assume a natureza de uma verdadeira pena acessória.
As penas acessórias, muito embora sejam sanções dependentes da aplicação de uma pena principal, uma vez que esta é condição necessária daquela, não decorrem directa e imediatamente da aplicação desta, no sentido de que não são seu efeito automático (art.65º nº1, do C. Penal), decorrendo antes da prática de certos crimes a que a lei faz corresponder a proibição do exercício de determinados direitos e profissões (art.65º nº2, do C. Penal).
Ensina Maria da Conceição Cunha (4) que as penas acessórias para serem verdadeiras penas “deverão ter por limite a culpa do agente, e perseguir finalidades preventivas, sendo determinadas, em concreto, pelos mesmos critérios que orientam a determinação das penas principais. Terão um efeito preventivo adjuvante destas, não deixando de ser penas, o que pressupõe, desde logo, a sua intransmissibilidade, a sua ligação à censurabilidade pessoal do agente, e a existência de limites mínimos e máximos para a sua duração, claramente determinados na lei”.
Como bem se refere no recente Acórdão deste Tribunal da Relação de Guimarães de 7 de fevereiro de 2022, Processo: 44/21.9PEBRG.G1 “No que respeita à sua natureza jurídica estamos perante uma verdadeira pena e não perante o mero efeito duma pena, embora a sua aplicação seja feita cumulativamente com uma pena principal de prisão ou multa.
A sanção de inibição de condução não é o efeito de qualquer condenação anterior, integrando ela própria a condenação pela prática de um crime.
É uma sanção de estrita aplicação judicial, indissoluvelmente ligada ao facto praticado e à culpa do agente, dotada de uma moldura penal própria, permitindo e impondo a tarefa judicial de determinação da sua medida concreta em cada caso (vide, efetuando esta caracterização, João Casebre Latas, em “A pena acessória de proibição de conduzir veículos automóveis”, em Sub Iudice, n.º 17, pág. 77).
O facto de não se exigir a demonstração de qualquer outro requisito adicional, além dos elementos do tipo legal de crime para o qual está prevista a aplicação desta sanção, só acentua que estamos perante uma verdadeira pena e não perante um mero efeito automático da aplicação duma pena”.
A propósito da condenação pela prática do crime de desobediência a que se refere a alínea c) do n.º 1 do artigo 69.º do Código Penal, o Tribunal Constitucional, no seu Acórdão nº 145/2021 (5) confrontou o regime de aplicação da pena acessória de proibição de condução de veículos a motor, ali prevista, com a proibição constante do n.º 4 do artigo 30.º da Constituição, nos seguintes termos:
«7. A pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados encontra-se prevista no Título III do Código Penal - respeitante às consequências jurídicas do crime -, mais especificamente no seu Capítulo II, reservado às penas acessórias e efeitos das penas. Foi introduzida pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março, e o regime a que se encontra sujeita conheceu até hoje duas reformulações, tendo resultado, a primeira, das alterações introduzidas pela Lei n.º 77/2001, de 13 de julho, e, a segunda, da revisão operada pela Lei n.º 19/2013, de 21 de fevereiro.

Pressupondo a fixação de uma pena principal na sentença condenatória, a proibição de condução de veículos motorizados prevista no artigo 69.º do Código Penal participa da natureza e finalidade próprias das penas acessórias. Estas, tal como explica Pedro Caeiro, visam «censurar especialmente o arguido pelo circunstancialismo que envolve o crime cometido, circunstancialismo esse que justifica a privação de certo direito, faculdade ou posição privilegiada de algum modo relacionados com a prática do crime. É precisamente a relação (cuja existência só em concreto pode ser estabelecida) entre o cometimento do crime e o abuso (mau uso) do direito ou faculdade que a ele se liga que cria o «espaço» onde vive a censura suplementar contida na pena acessória; é também nessa relação que a pena acessória colhe o fundamento material legitimador da sua aplicação ao lado da pena principal» (“Qualificação da sanção de inibição da faculdade de conduzir prevista no artigo 61º, nº 2, al. d), do Código da Estrada (anotação ao Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de abril de 1992)”, Revista Portuguesa de Ciência Criminal 3 (1993), pp. 543-572).
De acordo com o regime consagrado no artigo 69.º do Código Penal, a possibilidade de aplicação da pena acessória de proibição de condução de veículos com motor tem como pressuposto a condenação do arguido pela prática de um dos crimes contemplados no elenco previsto no respetivo n.º 1, designadamente - no que aqui especialmente releva - do crime de desobediência, nos casos em que a falta à obediência devida se consubstancie na recusa de submissão às provas legalmente estabelecidas para deteção de condução de veículo sob efeito de álcool, estupefacientes, substâncias psicotrópicas ou produtos com efeito análogo [alínea c)]. Trata-se, mais especificamente, do tipo de ilícito resultante da conjugação dos artigos 152.º, n.ºs 1, alínea a), e 3, do Código da Estrada (alterado pela Lei n.º 72/2013, de 3 de setembro, e republicado em anexo) e 348.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, que fazem incorrer na prática de um crime de desobediência os condutores que recusem submeter-se às provas estabelecidas para a deteção do estado de influenciado pelo álcool ou por substâncias psicotrópicas, sempre que a ordem ou mandado forem legítimos e tiverem sido regularmente comunicados e emanados de autoridade ou funcionário competente.
Relativamente à pena cominada a título principal - no caso, trata-se da pena estabelecida no n.º 1 do artigo 348.º do Código Penal -, a proibição de condução de veículos motorizados dispõe de uma moldura legal própria e autónoma, cujos limites mínimo e máximo correspondem, respetivamente, a três meses e três anos, encontrando-se subordinada, como verdadeira pena que é, quer às finalidades que o artigo 40.º do Código Penal assinala às penas em geral, quer aos critérios que relevam na determinação da respetiva medida concreta, tal enunciados no respetivo artigo 71.º. Quer isto significar que, à semelhança do que sucede com a pena principal, o juiz fixará a respetiva medida tendo em conta, dentro do limite consentido pela culpa, a defesa retrospetiva da ordem jurídica e as exigências de ressocialização do condenado, evidenciadas a partir das circunstâncias concretas do caso sub judice, designadamente daquelas que para o efeito se encontram elencadas no n.º 2 do artigo 71.º do Código Penal.
[…]
9. Dispõe o artigo 30.º, n.º 4, da Constituição, que «nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos».
Introduzido na revisão constitucional de 1982, tal preceito tem como principal finalidade retirar às penas quaisquer efeitos estigmatizantes, evitando que a perda de direitos civis, profissionais ou políticos decorra direta e automaticamente da lei aquando da aplicação de uma pena, isto é, seja configurada pelo legislador infraconstitucional como um efeito ope legis, aquando da aplicação de uma dada pena, em detrimento de uma decisão que pondere as circunstâncias concretas de cada caso e que, desse modo, se observe o princípio da culpa e da proporcionalidade na produção desse efeito sancionatório (cf. Acórdão n.º 376/2018).
Como se salienta na doutrina, o sentido do artigo 30.º, n.º 4, da Constituição, em conformidade com a respetiva justificação, é o de «"negar ao legislador ordinário a possibilidade de criar um sistema de punição complexa (...), no seio do qual a lei pode fazer corresponder automaticamente à prática de determinado crime (ou à condenação em certa pena) outras sanções penais para além da pena principal; ao invés, fixou-se o princípio de que a aplicação de qualquer sanção penal requer a mediação do juiz", mesmo que a lei preveja várias sanções para a prática de um só crime (idem, págs. 565-6)» (Acórdão n.º 203/2000).
Quer isto significar que a proibição constitucional contida no n.º 4 do artigo 30.º não veda ao legislador a possibilidade de, ao definir a tipologia das sanções abstratamente aplicáveis a determinado tipo legal de crime, estabelecer penas principais e penas acessórias, desde que subordinadas, estas como aquelas, à mediação judicativa do tribunal, a exercer dentro dos limites consentidos pelo princípio da culpa e de acordo com as exigências, gerais e especiais, da prevenção.
Assim entendeu o Tribunal Constitucional, logo no Acórdão n.º 291/95, que se pronunciou pela não inconstitucionalidade da norma constante da alínea a) do n.º 2 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 124/90, de 14 de abril, diploma que, até à revisão do Código Penal pelo Decreto-Lei n.º 48/95, tipificava o crime de condução de veículo em estado de embriaguez.
Confrontando a sanção acessória de inibição da faculdade de conduzir ali então prevista para este tipo de crime, com a proibição estabelecida no n.º 4 do artigo 30.º da Constituição, escreveu-se no referido aresto o seguinte:
«Só à perda de direitos como efeito automático da pena que o nº 4 do artigo 30º da CR se refere ao dispor que "nenhuma pena envolve, como efeito necessário, a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos".
Na verdade, não é constitucionalmente proibido que à condenação por certos crimes se sigam, necessariamente, certas consequências. O que se veda é que uma certa condenação penal produza automaticamente, por mero efeito da lei, a perda de qualquer um daqueles direitos; já não, como se observa no acórdão nº 143/95, que a sentença condenatória possa decretar essa perda de direitos em função de uma graduação da culpa, feita casuisticamente pelo juiz.
[…]

A este propósito perfilha-se o observado pelo Senhor Procurador-Geral Adjunto, a dado passo das suas alegações:

"O que, na realidade, a decisão recorrida parece pretender extrair do disposto no nº 4 do artigo 30º [...] é algo que já nada tem a ver com a problemática da "automaticidade" dos efeitos da apli­cação de certas penas ou da condenação por certos crimes - e que, em última análise, se traduziria na "discricionariedade judicial" na própria aplicação (ou não aplicação) de determinadas sanções acessórias - como efetivamente ocorrerá, por exemplo, com o invocado artigo 218º do Código Penal - consoante a valoração das circunstâncias do caso".
Esta matéria, no entanto, transcende claramente a problemática em causa - como mais se observa - situando-se na margem da livre regulação do legislador estabelecer a tipo­logia das sanções (principais e acessórias) aplicáveis, em abs­trato, a determinado tipo legal de crime - "tanto podendo optar por devolver ao julgador a própria aplicação (ou não aplicação) de certas sanções, como por, atentos os interesses em causa, cominar, como regra, a aplicação obrigatória de certa sanção pelo juiz, cumprindo-lhe graduar a concreta medida desta"».
Posteriormente, no Acórdão n.º 53/97, que concluiu pela não inconstitucionalidade da norma do artigo 12.º, n.º 2, do mesmo Decreto-Lei n.º 124/90, igualmente relativa à inibição de faculdade de conduzir, lê-se o seguinte:
«Independentemente da questão da adequada qualificação doutrinal da inibição da faculdade de conduzir, e não obstante o legislador a designar como sanção acessória, é da análise da sua conformação legal que há de resultar uma eventual caracterização daquela sanção como efeito automático da pena, em contradição com o artigo 30º, nº 4, da Constituição.
Admitindo que a faculdade de conduzir veículos automóveis é um direito civil, é certo que a perda desse direito é uma medida que o juiz aplica e gradua dentro dos limites mínimo e máximo previstos, em função das circunstâncias do caso concreto e da culpa do agente, segundo os critérios do artigo 71º do Código Penal. Poder-se-á, assim, dizer que o juiz não se limita a declarar a inibição como medida decorrente de forma automática da aplicação da pena, com mero fundamento na lei […].
A circunstância de ter sempre de ser aplicada essa medida, ainda que pelo mínimo da medida legal da pena, desde que seja aplicada a pena principal de prisão ou multa, não implica, ainda assim, neste caso, colisão com a proibição de automaticidade. A adequação da inibição de conduzir a este tipo de ilícitos revela que a medida de inibição de conduzir se configura como uma parte de uma pena compósita, como se de uma pena principal associada à pena de prisão se tratasse, em relação à qual valem os mesmos critérios de graduação previstos para esta última.
Com efeito, a aplicação da inibição de conduzir fundamenta-se, tal como a aplicação da pena de prisão ou multa, na prova da prática do facto típico e ilícito e da respetiva culpa, sem necessidade de se provarem quaisquer factos adicionais».
Tal entendimento foi subsequentemente reiterado no Acórdão n.º 53/97, que se pronunciou pela não inconstitucionalidade da norma que previa idêntica sanção acessória para o crime de recusa a exame de pesquisa de álcool no sangue, então tipificado no artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 124/90.
Depois da revisão do Código Penal operada pelo Decreto-Lei n.º 48/95, a mesma orientação foi afirmada, primeiro no Acórdão n.º 149/01 - que não julgou inconstitucional a norma que, no artigo 69.º, n.º 1, alínea a), do referido Código, passou a cominar com pena acessória de proibição de condução de veículos motorizados o «crime cometido no exercício daquela condução com grave violação das regras de trânsito rodoviário» - bem como nos Acórdãos n.º 79/09, 363/10, 53/11, que não julgaram inconstitucional a norma que, em consequência das alterações levadas cabo pela Lei n.º 77/2001, passou a prever, nos mesmos artigo, número e alínea, a referida pena acessória para a prática de «crimes previstos nos artigos 291.º ou 292.º» (respetivamente condução perigosa de veículo rodoviário e condução de veículo em estado de embriaguez ou sob a influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas).»
Temos deste modo que o princípio da não automaticidade a que se refere o artigo 65º nº 1 do Código Penal, corolário do artigo 30º nº 4 da C.R.P., mostra-se assegurado no caso em apreço, por se tratar de uma pena temporária e variável, cuja aplicação implica uma apreciação judicial em medida certa e determinada.
A pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, deve assim ser graduada dentro dos limites legais, in casu entre 3 meses e 3 anos, atendendo aos critérios previstos no artigo 71.º do Código Penal, ou seja, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, tendo por base “todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele”.
Ora, a ponderação da pena acessória foi efetuada pelo Tribunal a quo na sentença recorrida.
Nele é referido a intensidade do dolo do arguido, que é direto, o tipo de ordem incumprida e o interesse público subjacente a emissão da mesma, funcionando a favor do arguido a ausência de antecedentes criminais, bem como a circunstância de se encontrar a trabalhar e familiarmente inserido, acrescentando ainda ao apreciar em concreto a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados, contida no artigo 69º, n.º 1, al. c), do Código Penal, que “este tipo de comportamentos não podem ser tolerados sob pena de se estar a premiar quem, estando substancialmente etilizado, se recusa a efectuar as provas legais de despistagem para se eximir do cumprimento de um longo período sem conduzir”.
Inexiste assim qualquer violação do disposto no artigo 30º nº 4 da Constituição da República Portuguesa.
E o mesmo também sucede com o preceituado no artigo 18º nº 2 da Constituição da República Portuguesa, que também não se mostra infringido.
A necessidade de conduzir veículos automóveis, quer no âmbito da atividade profissional quer pessoal, é comum a muitos cidadãos nacionais, mas tal não acarreta a que se mostre desproporcional a aplicação de uma pena acessória de proibição de conduzir, temporária, tendo em contraponto a vida e a segurança de quem também circula pelas estradas e que a aplicação dessa pena acessória visa prevenir.
Improcede assim este segmento recursório do arguido.
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Da suspensão da pena de acessória de proibição de conduzir veículos motorizados.
Pretende o arguido que lhe seja concedida a suspensão da execução da pena acessória que lhe foi aplicada.
Argumenta nomeadamente que necessita de conduzir para ir trabalhar, pois que exerce a sua atividade profissional fora do seu concelho de residência, para ir às compras, sendo que não detém qualquer outra condenação anterior.
Ora, como é jurisprudência firmada, não é possível ser suspensa a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor dado se tratar de uma sanção de natureza penal sujeita ao regime decorrente do Código Penal, não existindo neste qualquer norma que preveja a possibilidade da suspensão da sua execução.
Conforme bem se salienta no acórdão desta Relação de Guimarães de 11 de junho de 2019, procº 41246/18.0GBBCL.G1 “A possibilidade de suspensão da inibição de conduzir existe no nosso ordenamento jurídico no Código da Estrada. Aí se prevê, em determinadas circunstâncias, a possibilidade de atenuar especialmente (artigo 140º) ou suspender a sanção, ainda que com sujeição a deveres (artigo 141º).
No entanto, tal possibilidade não existe no Código Penal. E não existe quer porque não está prevista, quer porque não se pode fazer apelo ao instituto geral de suspensão da pena, constante do artigo 50º, uma vez que a possibilidade de suspensão da pena foi pensada pelo legislador apenas para penas privativas de liberdade”.
Também é esse o entendimento na doutrina, defendido por Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código Penal, 4ª edição, anotação 10ª, ao artigo 69.º, pág. 380, ao escrever que não é admissível a suspensão da pena de proibição de conduzir, independentemente do destino da pena principal, uma vez que aquela suspensão penal só está prevista no CE no âmbito do direito contraordenacional.
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Da medida concreta da pena acessória aplicada.
Entende o recorrente ser excessivo o período de 6 (seis) meses de inibição de conduzir pugnando que a mesma não seja superior a um mês. (6)
Considera para tanto ser de atender à sua inserção social e profissional, ter o seu cadastro rodoviário e cadastro criminal sem ocorrências, nunca tendo estado envolvido em nenhum acidente de viação, nunca a sua conduta estradal tendo sido objeto de qualquer censura, ter demonstrado arrependimento, a sua postura, a sua situação económica e social e o facto de ter uma necessidade absoluta e continuada de conduzir veículos automóveis no âmbito da sua vida pessoal, uma vez que exerce a sua atividade profissional fora do seu concelho de residência.
A moldura prevista no artigo 69º nº 1 do Código Penal varia entre três meses e três anos o período de proibição de conduzir veículos com motor.
Conforme bem se refere no Acórdão deste Tribunal da Relação de Guimarães, de 2 de novembro de 2015, procº nº 167/15.3GBBCL “Na determinação da pena acessória é necessário observar os critérios estabelecidos no artº 71º do CP, dando especial importância à prevenção especial, que visa a consciencialização e a socialização do arguido de molde a que futuramente paute as suas condutas de acordo com o prescrito pela lei. Por outro lado, a aplicação da pena acessória não tem de ser proporcional à pena principal, uma vez que os objectivos de política criminal são, também eles, distintos”.
No que respeita à controlabilidade da pena em sede de recurso, nas quais também se incluem as penas acessórias, na determinação do seu quantum, concorda-se com Figueiredo Dias, (7) no que é acompanhado pela generalidade da jurisprudência, quando defende que “a sindicância recursória deverá reservar-se para as hipóteses em que tiveram sido violadas regras de experiência ou se a quantificação se revelar de todo desproporcionada”.

Assim também se pronuncia o Senhor Juiz Desembargador Cruz Bucho, na decisão sumária de 6 de janeiro de 2016, proferida no processo nº 173/16.0GBAVV.G1, deste Tribunal da Relação de Guimarães, nos seguintes termos:
“Conforme decorre da lição da melhor doutrina (Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As consequências Jurídicas do Crime, cit, págs. 196-197, 255) e constitui jurisprudência uniforme do STJ, a intervenção do tribunal de recurso pode incidir na questão do limite ou da moldura da culpa assim como na actuação dos fins das penas no quadro da prevenção; mas já não na determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto da pena, salvo se tiverem sido violadas regras de experiência ou se a quantificação se revelar de todo desproporcionada”.
Salienta-se por sua vez e bem, no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 24 de setembro de 2009, proc. 47/09.1PFSTB, “Para que cumpra a finalidade preventiva a pena acessória de proibição de conduzir tem de importar um qualquer sacrifício para o condenado e uma censura suficiente dos factos”.
O tribunal “a quo” na determinação do “quantum sancionatório” desta pena acessória, teve em consideração por um lado, a intensidade do dolo que é direto,
o tipo de ordem incumprida e o interesse público subjacente a emissão da mesma, considerando como circunstâncias favoráveis ao arguido, a ausência de antecedentes criminais, bem como a circunstância de se encontrar a trabalhar e familiarmente inserido.
Ao contrário do referido pelo arguido, ele não demonstrou arrependimento, antes, como refere a sentença recorrida, defendeu em julgamento a tese de que este processo seria uma espécie de “perseguição” que estava a ser feita contra si.
No que respeita à circunstância de nunca ter estado envolvido em nenhum acidente de viação e de ter uma necessidade absoluta e continuada de conduzir veículos automóveis no âmbito da sua vida pessoal, uma vez que exerce a sua atividade profissional fora do seu concelho de residência, é matéria que não consta dos factos dados como provados, sendo certo que naturalmente, a pena acessória de proibição de conduzir, tem normalmente como destinatários pessoas que habitualmente necessitam de utilizar o automóvel na sua vida profissional, e não apenas aqueles que “pegam no carro ao fim de semana”, em momentos de lazer, para dar um passeio.
Acresce que relativamente à conduta anterior do arguido e como resulta da “Base de Dados da Suspensão Provisória de Processos Crime” (8), já tinha sido aplicada ao arguido a injunção de proibição de conduzir veículos a motor pelo período de 5 (cinco) meses, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, no âmbito do processo de inquérito nº 2/19.3GTBRG, tendo o início da suspensão ocorrido em 13 de janeiro de 2019 e termo em 13 de junho de 2019, circunstância que aliás levou a Magistrada do Ministério Público em sede de inquérito nestes autos a não equacionar a possível aplicação da suspensão provisória do processo, dado o arguido já ter beneficiado da aplicação desse instituto. (9)
Temos deste modo que a pena acessória pena de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 6 (seis) meses, aplicada pelo tribunal “a quo”, não se mostra de modo algum excessiva, nem viola as regras da experiência e como tal é de manter.
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III – Decisão.

Face ao exposto, acordam os Juízes da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar totalmente improcedente o recurso interposto pelo arguido e em consequência, confirmam a douta sentença recorrida.
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Custas pelo recorrente, fixando-se em 3 UC a taxa de justiça - artigos 513.º, n.ºs. 1 e 3, do C.P.P. e 8.º, n.º 9, do R.C.P. e Tabela III anexa.
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Notifique.
Guimarães, 21 de novembro de 2022.
(Decisão elaborada pelo relator com recurso a meios informáticos e integralmente revista pelos subscritores, que assinam digitalmente).

Pedro Freitas Pinto
(Juiz Desembargador Relator)
Fátima Sanches
(Juíza Desembargadora 1º Adjunta)
Anabela Varizo Martins
(Juíza Desembargadora 2ª Adjunta)



1. Cfr. Acórdão de Fixação de Jurisprudência do S.T.J. nº 7/95 de 19/10/1995, publicado no DR, Série I-A, de 28/12/1995 e, na doutrina, Paulo Pinto de Albuquerque, in “Comentário do Código de Processo Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem”, 3ª Edição Atualizada, Universidade Católica Editora, 2009, anot. 3 ao art. 402º, págs. 1027/1028.
2. Cfr. Maria João Antunes, Penas e Medidas de Segurança, Almedina, pág. 20.
3. “Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime”, página 164
4. “As reações criminais no direito português”, Universidade Católica Editora, pág. 274/275
5. Disponível in TC > Jurisprudência > Acordãos > Acórdão 145/2021
6. Certamente por lapso, o recorrente na conclusão 27ª entende que deveria ter sido aplicada a pena acessória de proibição da faculdade de conduzir veículos motorizados pelo período de um mês, quando na conclusão 25ª entende dever ascender a três meses.
7. Direito Penal Português II, As Consequências Jurídicas do Crime, 3.ª Reimpressão, Editorial Notícias, 1993, pág. 197.
8. Junto aos autos no inquérito a fls. 15.
9. Cfr. fls. 63.