GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS
AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÕES
CRÉDITO RECONHECIDO E NÃO ATENDIDO
Sumário


I - A ausência de impugnação da lista definitiva de créditos não implica sem mais a produção de uma sentença homologatória, antes estando acometidos ao juiz o poder/dever de aferir da conformidade formal e substancial dos créditos constantes da lista apresentada pelo Administrador de Insolvência.
II - Vindo a lista a ser homologada, consignando o juiz que não ocorre erro manifesto, e não versando o recurso sobre esta parte, a lista de créditos tornou-se definitiva tendo-se estabilizado na ordem jurídica, havendo que graduar os créditos em atenção ao que dela consta.

Texto Integral


ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

I - RELATÓRIO

No presente apenso de verificação e graduação de créditos, em que é insolvente A. C., veio o Administrador de Insolvência apresentar a lista de todos os credores por si reconhecidos, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 129.º, nsº 1 e 2 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE).
Não foi deduzida qualquer impugnação à lista dos credores reconhecidos.
Para a massa insolvente foram apreendidos os seguintes bens:
- Estabelecimento de farmácia denominado “Farmácia X”, instalada na Rua …, com Alvará nº 5672 emitido pelo INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, IP
- Prédio urbano sito em Bairro ..., Lote …, Freguesia de ..., concelho de ..., distrito de Bragança, afeto a parcela de terreno para construção urbana, inscrito na matriz predial artº ... e descrito na Conservatória do Registo Predial sob nº ..., com valor patrimonial de € 15.224,71.
- Prédio urbano sito em ..., Rua de ..., Freguesia de ..., concelho de ..., distrito de Bragança, afeto a parcela de terreno para construção urbana, inscrito na matriz predial artº ... e descrito na Conservatória do Registo Predial sob nº ..., com valor patrimonial de € 34.600,00.
- Banco e cadeira de entrada; expositor; móvel de apoio; Balança de pesagem e medição; expositores de madeira branco; expositores de madeira branco e azul com gavetas; balcão de apoio; banco de ferro, escadote de madeira e mesa metálica de apoio; secretária de escritório com banco branco, computador completo com torre teclado e rato; bastidor; prateleira de madeira e móvel com gavetas; armário de gavetas para medicamentos; estantes tipo dexion; central de incêndio e extintores; torre de computador e candeeiro de mesa; impressora a laser; ar condicionado de 8.000Btu; frigorífico vertical para aprovisionamento de medicamentos; computador completo com torre, teclado , monitor e rato; impressora de talões; móvel de Wc; cilindro; secretária branca com cadeira desumidificador; aquecedor; marqueza.

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A final foi proferida sentença, que após retificação, contém o seguinte teor:
«Em face do exposto e nos termos das disposições legais supra citadas:

4.1. Homologo a lista de credores reconhecidos de fls. 5 v a 6 elaborada pelo Administrador da Insolvência, e considero reconhecidos os créditos ali mencionados e que não foram objecto de qualquer impugnação;
4.2. Graduo da seguinte forma os créditos reconhecidos:
4.2.1. DO PENHOR DO ALVARÁ DE FARMÁCIA:
Em primeiro lugar a T. V., habilitada no crédito do Banco ...; Y e a W em paridade.
Em segundo lugar a T. V. que reclama créditos pelo não cumprimento do contrato promessa de trespasse, no valor de 140.297,64 euros.
Em terceiro lugar os trabalhadores.
Em quarto lugar os créditos da AT e da segurança social, sendo os demais comuns.
4.2.2. DOS IMÓVEIS:
4.2.2.1. No que respeita ao a prédio urbano sito em Bairro ..., Lote .., Freguesia de ..., concelho de ..., distrito de Bragança, afeto a parcela de terreno para construção urbana, inscrito na matriz predial art.º ... e descrito na Conservatória do Registo Predial sob nº ...:
Em primeiro lugar a T. V. habilitada no crédito do Banco ...;
Não existe mais nenhum credor garantido por este imóvel, logo a graduação seguirá os moldes convencionados sendo os demais credores todos comuns com exceção da AT no que respeita ao IMI, que é, inclusivamente, credora da massa para as dívidas contraídas após ter sido decretada a insolvência.
4.2.2.2. No que respeita ao Prédio urbano sito em ..., Rua de ..., Freguesia de ..., concelho de ..., distrito de Bragança, afecto a parcela de terreno para construção urbana, inscrito na matriz predial art.º ... e descrito na Conservatória do Registo Predial sob nº ...:
Em primeiro lugar a T. V. habilitada no crédito do Banco ...; Y e a W, em paridade.
Não existe mais nenhum credor garantido por este imóvel, logo a graduação seguirá os moldes convencionados sendo os demais credores todos comuns com exceção da AT no que respeita ao IMI, que é, inclusivamente, credora da massa para as dívidas contraídas após ter sido decretada a insolvência.
4.2.3. DOS TÍTULOS:
No que respeita ao Penhor de 15.000 ações representativas do capital social da W, no valor nominal de 1 euro (a serem apreendidos):
Em primeiro lugar a Y e a W, sociedades de garantia mútua a quem também foi dado o penhor dos títulos.
Não existe mais nenhum credor garantido por estes títulos, logo a graduação seguirá os moldes convencionados sendo os demais credores todos comuns com exceção da AT no que respeita ao IMI, que é, inclusivamente, credora da massa para as dívidas contraídas após ter sido decretada a insolvência.
4.3. Graduação Geral
Através do produto da venda dos restantes bens constante do auto de apreensão de bens, os créditos reclamados deverão ser graduados da seguinte forma:
1.º lugar: As dívidas da massa insolvente, sendo que as custas saem precípuas;
2.º lugar: Dar-se-á pagamento, em pé de igualdade, aos créditos privilegiados dos trabalhadores emergentes do contrato de trabalho, ou da sua violação ou cessação;
3.º lugar: Do remanescente, em paridade, dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado de que goza o Estado/Fazenda Nacional.
4.º lugar: Do remanescente dar-se-á pagamento, em pé de igualdade, aos créditos comuns;
5.º lugar: Do remanescente dar-se-á pagamento aos créditos subordinados, pela ordem que consta do artigo 48.º do CIRE.»
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Inconformada com a sentença veio a credora “T. V., Lda.” interpor recurso, finalizando com as seguintes conclusões (transcrição):

I. Em causa no presente recurso está a sentença proferida no Apenso C – Reclamação de créditos – pela qual o Tribunal a quo Verificou e Graduou os créditos reclamados na presente insolvência, da qual é credora também a aqui Recorrente.
II. De facto, a sentença recorrida contem omissões quanto a alguns dos créditos da ora Recorrente, nos termos expostos, conforme demonstrado, e erra na Graduação de créditos.
III. Foram reclamados e reconhecidos à aqui Recorrente T. V., Lda. os seguintes créditos – atento o teor da lista de créditos reconhecidos pelo senhor administrador que, não tendo merecido impugnação (no que à Recorrente diz respeito) se estabilizou já processualmente: (i) 140.297,64€-crédito garantido – referente a locação do estabelecimento Farmácia X – contrato de locação de estabelecimento comercial e promessa de trespasse; (ii) 280.595,30€ - crédito garantido – referente a cláusula penal pelo incumprimento – valor pago em dobro (contrato promessa não cumprido pela massa); (iii) 150.000,00€ - crédito garantido – referente a cláusula penal por incumprimento – penalização contratual.
IV. Com efeito, todos esses créditos se tornaram definitivos porquanto a massa insolvente na pessoa do seu administrador judicial decidiu não cumprir o contrato, apreendeu o dito bem e já procedeu à sua venda, pelo que tais créditos existem na sua integralidade reconhecidos sem qualquer condição.
V. Total de créditos reconhecidos à T. V., Lda. no pressuposto do incumprimento do contrato de cessão de exploração e promessa de trespasse: 570.892,94€, integralmente garantido por direito de retenção sobre o referido estabelecimento, bens móveis e alvará de farmácia.
VI. A aqui Recorrente T. V., Lda. adquiriu ainda a integralidade dos créditos reclamados na insolvência pelo Banco ..., pelo que lhe foi ainda reconhecido – por via de habilitação já transitada nos autos (apenso E) – um crédito no valor de 259.056,80€, também ele garantido por hipoteca sobre as verbas 1 e 2 do auto de apreensão e penhor sobre a verba 3 (estabelecimento de farmácia).
VII. Pelo que, em face do teor da relação de créditos reconhecidos pelo Senhor Administrador, que não mereceu impugnação por parte seja de quem for, tendo-se estabilizado na ordem jurídica, a aqui Recorrente é credora da Insolvente da integralidade dos créditos que lhe foram reconhecidos - 829.949,74€.
VIII. O Tribunal a quo, bem – e nessa parte a sentença recorrida não merece censura não sendo, essa parte, objeto do presente recurso – homologou e considerou reconhecidos os créditos tal como relacionados pelo senhor Administrador de Insolvência nos termos atrás expostos.
IX. Simplesmente, sendo exata a verificação dos créditos, como é, o que não está aqui em questão, considera a Recorrente que o Tribunal a quo errou na respetiva graduação – pontos 3.2 e seguintes da sentença recorrida, para além de omitir na respetiva graduação dois dos créditos da recorrente, 280.595,30€ e 150.000,00€.
X. Os créditos da Recorrente resultantes do não cumprimento do contrato 140.297,64€ + 280.595,30€ + 150.000,00€ devem ser considerados dívidas da massa e assim ser pagos em primeiro lugar pelo produto da venda de todas as verbas da liquidação da insolvente.
XI. Quanto ao remanescente, deverá concorrer em primeiro lugar ao respetivo pagamento o crédito de € 259.056,80 (duzentos e cinquenta e nove mil cinquenta e seis euros e oitenta cêntimos) em conjunto com os da W e Y¸ na respetiva proporção, porquanto se trata de créditos que beneficiam das mesmas garantias – penhor e hipoteca respetivamente quanto às Verbas 3, 1 e 2.
Sem prescindir
XII. Ainda que se entenda que os créditos da credora ora Recorrente resultantes do não cumprimento pela Massa Insolvente do contrato de cessão de exploração e promessa de trespasse (140.297,64€ + 280.595,30€ + 150.000,00€) não são dívidas da própria massa insolvente, então, nesta hipótese, estes créditos devem ser graduados em primeiro lugar quanto ao produto da venda da verba nº 3 atenta a garantia de que beneficia a Recorrente – direito de Retenção.
XIII. Direito de retenção esse que, tratando-se de um direito real de garantia, prevalece mesmo em relação à hipoteca, como se tem vindo a decidir na nossa jurisprudência mais recente, valendo por todos o acórdão da Relação de Lisboa (Rel. Luís Mendonça), de 10.05.2018, no processo n.º 1159/11.7TYLSB-B.L1.
XIV. Devendo em segundo lugar e quanto ao produto das vendas das verbas 1 e 2, concorrerem o crédito da Recorrente como habilitada nos créditos do Banco … no valor de € 259.056,80 e os créditos das credoras W e Y, por beneficiarem de iguais garantias – penhor sobre a verba 3 e hipoteca sobre as verbas 1 e 2).
XV. Pelo que deve ser a sentença recorrida revogada, nesta parte, e substituída por outra que, mantendo a verificação e homologação da lista de créditos reconhecidos pelo senhor AI, gradue adequadamente e nos termos da lei, a integralidade dos créditos reconhecidos à aqui Recorrente, considerando os seus montantes e respetivas garantias associadas.
XVI. Ao decidir como decidiu o Tribunal a quo violou, por erro de interpretação ou aplicação, além do mais, o disposto nos artigos: 46º, 47º, 51º, 130º, nº 3, 140º, 172º do CIRE, 666 e 750 do Código Civil.
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Não foram apresentadas contra alegações.
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Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre apreciar e decidir.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO

No caso em análise, considerando o teor das alegações de recurso apresentadas pela Recorrente, a única questão a decidir é a de saber se ocorre erro manifesto na graduação de créditos quanto ao crédito da credora T. V., Lda referente a locação do estabelecimento e resultante do incumprimento do contrato de cessão de exploração e promessa de trespasse.
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III - FUNDAMENTAÇÃO

Os factos a considerar são os que constam do relatório que antecede.
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A sentença recorrida começa por identificar, no seu relatório, os bens que foram apreendidos para a massa insolvente, um estabelecimento de farmácia, com Alvará nº 5672, dois bens imóveis, o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial sob nº ... e o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial sob nº ..., e bens móveis.
Aprecia, depois, a questão do reconhecimento dos créditos reclamados.

Diz-se, a propósito, o seguinte:
«De acordo com o disposto no n.º 3 do artigo 130º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, se não houver impugnações, é de imediato proferida sentença de verificação e graduação dos créditos, em que, salvo o caso de erro manifesto, se homologa a lista de credores reconhecidos elaborada pelo administrador da insolvência e se graduam os créditos em atenção ao que conste dessa lista.
No presente caso, não foram deduzidas impugnações e não se vislumbra a existência de erro notório ou manifesto que obste à homologação da lista apresentada pelo Administrador de Insolvência.
Nesse sentido, e em obediência ao disposto no n.º 3 do artigo 130.º do CIRE, homologo a lista de credores reconhecidos, elaborada pelo Administrador de Insolvência, constante de fls. 5v a 6 dos presentes autos, e considero reconhecidos os créditos aí mencionados e que não foram objecto de impugnação e que aqui se dão por integramente reproduzidos.»
Uma vez reconhecidos os créditos, a sentença prossegue na análise dos critérios para a sua graduação.
E nesta parte, refere que a graduação é geral para os bens da massa insolvente e é especial para os bens a que respeitem direitos reais de garantia e privilégios creditórios. Acrescenta que para efeitos de graduação os créditos sobre a insolvência estão hierarquizados e podem assumir a natureza de créditos garantidos, privilegiados, comuns ou subordinados (artigo 47.º, n.º 4 do CIRE). Especifica que, os créditos garantidos são apenas aqueles que beneficiam de uma garantia real, ou de privilégios especiais, sobre os bens da massa insolvente até ao montante correspondente ao valor dos bens a que se reportem, os créditos privilegiados são os que beneficiam de privilégios creditórios gerais (mobiliários ou imobiliários) sobre os bens da massa insolvente até ao montante correspondente ao valor dos privilégios gerais, tendo em conta as onerações prevalecentes, os créditos comuns são os que não beneficiam de garantia real, nem de privilégio geral e não são objeto de subordinação e os créditos subordinados correspondem a uma categoria de créditos enfraquecidos e são satisfeitos depois do integral pagamento de todos os outros créditos.
Afirma-se, ainda, que na sentença de graduação de créditos importa operar a qualificação jurídica dos direitos de crédito existentes ao tempo da declaração de insolvência e que tenham sido reconhecidos, porquanto o Tribunal deve hierarquizar os créditos em conformidade com a prevalência estabelecida na lei. A graduação desdobra-se em duas relações de créditos, cada uma delas organizada hierarquicamente segundo a sua prevalência. Nesse sentido, há uma graduação geral para todos os bens da massa insolvente e uma graduação especial para os bens sobre que recaiam direitos reais de garantia e privilégios creditórios invocáveis na insolvência (art. 140.º, n.º 2 do CIRE). A mais disso, a decisão de graduação de créditos, ao definir a prioridade de satisfação dos direitos de crédito em relação ao produto dos bens do insolvente, serve de instrumento ao respetivo pagamento. Nessa conformidade, sendo vendidos os bens onerados com garantia real e abatidas as correspondentes despesas, é, em primeiro lugar, realizado o pagamento dos credores garantidos, com respeito pela ordem de prioridade que lhes caiba. Porém, no caso de estes credores não ficarem integralmente pagos e perante os quais o devedor responda com a generalidade do seu património, os respetivos saldos são incluídos nos créditos comuns, em substituição dos saldos estimados caso não se verifique coincidência entre eles (artigo 174.º, n.º 1 do CIRE).
Uma vez feito o pagamento dos créditos garantidos, segue-se o pagamento dos créditos privilegiados, por força do produto dos bens não afetos a garantias reais prevalecentes, segundo a respetiva ordem de prioridade no confronto com os créditos igualmente privilegiados, na proporção dos seus montantes (artigo 175.º, n.º 1 do CIRE).
No caso de os credores privilegiados não ficarem integralmente pagos e perante os quais o devedor responda com a generalidade do seu património, os respetivos saldos são incluídos nos créditos comuns, em substituição dos saldos estimados se não coincidirem (artigo 175.º, n.º 2 do CIRE).
Segue-se o pagamento dos créditos comuns, o qual, caso a massa insolvente seja insuficiente para a satisfação integral, será feito na proporção dos respetivos créditos (artigo 176.º do CIRE).
Por fim são pagos os créditos subordinados, os quais só são satisfeitos depois de integralmente pagos os créditos comuns. O pagamento dos créditos subordinados é efetuado pela ordem segundo a qual esses créditos são indicados no artigo 48.º do CIRE, na proporção dos respetivos montantes quanto aos que constem da mesma alínea, se a massa insolvente for insuficiente para o seu pagamento integral (artigo 177.º, n.º 1 do CIRE).
Está a apelante de acordo com a exposição teórica e as considerações à natureza das garantias dos créditos constantes da sentença.
Insurge-se é quanto à sua aplicação prática, ou falta dela.
E com razão.
O presente recurso versa apenas sobre os créditos resultantes do contrato de cessão de exploração e promessa de trespasse e respetivo incumprimento.

O Senhor Administrador Judicial, na lista a que se refere o artigo 129º do CIRE reconheceu à credora T. V., Ldª os seguintes créditos:
• 140.297,64€ - crédito garantido – referente a locação do estabelecimento Farmácia X – contrato de locação de estabelecimento comercial e promessa de trespasse;
• 280.595,30€ - crédito garantido – referente a cláusula penal pelo incumprimento – valor pago em dobro (contrato promessa não cumprido pela massa);
• 150.000,00€ - crédito garantido – referente a penalidade específica contratualmente fixada por incumprimento do contrato por iniciativa ou imputável à massa insolvente.
Resulta dos autos que o Senhor Administrador Judicial decidiu não cumprir o contrato, tendo apreendido o estabelecimento de farmácia que era seu objeto e procedido à sua venda a terceiro.
Os créditos anteriormente reclamados e reconhecidos sob condição, tornaram-se então definitivos uma vez verificado o não cumprimento do contrato de cessão de exploração e promessa de trespasse pelo Administrador.
Estes créditos foram reconhecidos como garantidos, pois que têm como garantia o direito de retenção sobre o estabelecimento da denominada “Farmácia X”.
Sublinha a Recorrente que na parte em que homologou e considerou reconhecidos os créditos tal como relacionados pelo senhor Administrador de Insolvência, a sentença recorrida não merece censura não sendo, essa parte, objeto do presente recurso. A sua impugnação é dirigida tão só à parte da graduação.
Porque assim, apesar de consideramos que a ausência de impugnação da lista definitiva de créditos não implica sem mais a produção de uma sentença homologatória, antes estando acometidos ao juiz o poder dever de aferir da conformidade formal e substancial dos créditos constantes da lista apresentada pelo Administrador de Insolvência, vindo a lista a ser homologada, consignando o juiz que não ocorre erro manifesto, e não versando o recurso sobre esta parte, a lista de créditos tornou-se definitiva tendo-se estabilizado na ordem jurídica, havendo que graduar os créditos em atenção ao que dela consta, apesar do (posterior) AUJ do Supremo Tribunal de Justiça de 27 de Abril de 2021 no sentido de que o sancionamento civilístico do art. 442.º do CC consubstanciado no dobro do sinal prestado pelo promitente-comprador não opera naquele caso de recusa de cumprimento.
Os créditos resultantes do não cumprimento do contrato estão garantidos pelo direito de retenção que, tratando-se de um direito real de garantia, prevalece em relação à hipoteca, incidindo sobre imóvel, e ao lado do penhor, incidindo sobre bem móvel – artigos 666º, nº1 e 2, 749º, e 758º e 759º, do Código Civil.
Assim, o crédito garantido pelo direito de retenção da credora T. V., Lda. e resultante do incumprimento do contrato, deve ser graduado em paridade com os créditos garantidos por penhor e com preferência sobre os demais.
Em face do exposto, impõe-se a alteração da sentença na parte relativa à graduação de créditos quanto ao bem “penhor do alvará de farmácia”, nos seguintes termos:
Em primeiro lugar, em paridade:
- o crédito da T. V. resultante do não cumprimento do contrato cessão e promessa de trespasse, no valor de 570.892,94 euros;
- o crédito da T. V., habilitada no crédito do Banco ...;
- o crédito da Y;
- o crédito da W.
Em segundo lugar os trabalhadores.
Em terceiro lugar os créditos da AT e da segurança social, sendo os demais comuns.
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III - DECISÃO

Pelo exposto, decide-se julgar o recurso procedente e, em conformidade revogar parcialmente a sentença, na parte da graduação de créditos quanto ao bem “penhor do alvará de farmácia”, nos seguintes termos:
«4.2.1. DO PENHOR DO ALVARÁ DE FARMÁCIA:
Em primeiro lugar, em paridade:
- o crédito da T. V. quanto pelo não cumprimento do contrato cessão e promessa de trespasse, no valor de 570.892,94 euros;
- o crédito da T. V., habilitada no crédito do Banco ...;
- o crédito da Y;
- o crédito da W.
Em segundo lugar os trabalhadores.
Em terceiro lugar os créditos da AT e da segurança social, sendo os demais comuns.

Custas pela massa insolvente.
Guimarães, 17 de Novembro de 2022

Assinado digitalmente por:
Rel. – Des. Conceição Sampaio
1º Adj. - Des. Elisabete Coelho de Moura Alves
2º Adj. - Des. Fernanda Proença Fernandes