OBRIGAÇÃO SOLIDÁRIA
COMPARTICIPAÇÃO
CREDOR
HERDEIRO
CONTA BANCÁRIA
CONTA SOLIDÁRIA
RESPONSABILIDADE BANCÁRIA
RESPONSABILIDADE CONTRATUAL
Sumário


I. O artigo 516.º do CC determina que nas relações internas entre credores solidários se presume a igualdade de comparticipações.
II. A entrega pelo Banco da totalidade da quantia depositada em conta aberta no Banco em regime de solidariedade aos herdeiros habilitados de um dos titulares dessa conta não configura violação do disposto no artigo 516.º do CC.

Texto Integral


ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA



I. RELATÓRIO


Recorrente: Banco Comercial Português, Sociedade Aberta, S.A.

Recorridos: AA e BB


1. AA e mulher BB instauraram, no Juízo Local Cível ... do Tribunal Judicial da Comarca ..., acção declarativa sob a forma de processo comum contra Banco Comercial Português, Sociedade Aberta, S.A., pedindo que esta seja condenada a restituir/repor na conta de D.O. n.º ...86, titulada por eles, autores, e aberta na sucursal da ré em ..., a quantia de € 42.159,78, acrescida de juros de juros à taxa legal, contados a partir da entrada em juízo desta acção, até integral pagamento.

Para fundamentar a respectiva pretensão alegaram, em resumo, que o autor marido celebrou com a ré um contrato de depósito bancário à ordem, em regime de conta conjunta ou colectiva, no qual figuravam como titulares, para além dele próprio, o Sr. CC, entretanto falecido.

Este CC, apesar de figurar como titular da conta, apenas a movimentava a débito, como procurador ou autorizado, para agilizar pagamentos em nome deles, autores, sendo tal conta sempre movimentada a crédito e provisionada por quantias que eles sucessivamente foram transferindo de ..., onde residiam, quantias essas que, como tal, eram da sua exclusiva propriedade e não também do dito CC.

Tendo-se deslocado em Agosto de 2018 à agência da ré em ..., e solicitado informação sobre o saldo da dita conta bancária, tomaram conhecimento que as quantias que ali tinham depositado, no montante de € 42.159,78, haviam sido levantadas e entregues aos herdeiros do referido CC, na sequência de um procedimento de habilitação de herdeiros promovido por estes, mas sem que eles, autores, tivessem dado à ré qualquer autorização para esse efeito, recusando-se esta, apesar de instada a tal, a repor na referida conta bancária a quantia que, consideram, foi ilegal e abusivamente entregue a quem não era dela proprietário.


2. Citada, contestou a ré, pugnando pela total improcedência da acção.

Em abono da sua defesa alegou, em síntese, que a referida conta bancária tinha sido aberta em nome dos dois referidos titulares, mas no regime de solidariedade, podendo, como tal, ser movimentada a débito e a crédito por qualquer deles, mesmo que desacompanhado do outro.

Se no âmbito das relações entre o autor marido e o referido CC era intenção daquele que este fosse apenas seu procurador ou autorizado, isso nunca lhe foi comunicado, pelo que o desconhecia, assim como desconhecia a origem do dinheiro ou de quem era a propriedade dos fundos creditados na referida conta bancária.

Tendo-lhe sido participado o falecimento do titular CC, os respectivos filhos promoveram e comprovaram a sua habilitação como herdeiros daquele, após o que, já devidamente habilitados, transmitiram à agência bancária instruções para que todos os valores depositados na conta em questão lhes fossem entregues, o que ela, ré, cumpriu.

Mais suscitou a ré o incidente de intervenção acessória de DD e de EE, herdeiros do referido CC.


3. Admitida a requerida intervenção acessória e citados para a causa, os chamados ofereceram contestação, na qual alegaram, em síntese, que, tanto quanto conseguiram apurar, os dinheiros que os autores aqui reclamam pertenciam na totalidade ao seu progenitor, esclarecendo que este, enquanto vivo, elaborava projectos para construção de moradias e, desde 1991, no contexto de uma relação que estabeleceu com o demandante, este último lhe angariava clientes em ..., que lhe pagavam a si parte dos preços dos serviços prestados, transferindo-os depois o autora para a conta solidária em referência nesta causa.

Mais alegaram que, por vontade do seu pai, o finado CC, e na convicção de que o dinheiro depositado na referida conta pertencia àquele, procederam ao levantamento dos fundos, sendo os mesmos entregues, na totalidade, ao chamado DD.


4. Realizadas as diligências devidas e a audiência de julgamento, foi proferida, em 13.03.2021, uma sentença em que se decidiu o seguinte:

Nestes termos e pelos fundamentos expostos, julgando pela total improcedência da demanda, decido absolver do pedido ré Banco Comercial Português, Sociedade Aberta, S.A. e condenar os autores no pagamento das custas do processo”.


6. Inconformados com a sentença, dela interpuseram recurso os autores.


7. Em 13.07.2021 o Tribunal da Relação ... proferiu um Acórdão, em cujo dispositivo pode ler-se:

Perante o exposto acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente a apelação, e, em consequência, revogando parcialmente a sentença recorrida, decidem condenar a ré, Banco Comercial Português, Sociedade Aberta, S.A., a restituir/repor na conta de D.O. nº ...86, titulada pelo 1º autor, a quantia de € 21.079,89 (vinte e um mil e setenta e nove euros e oitenta e nove cêntimos), acrescida de juros, à taxa legal, contados desde a citação e até integral pagamento.

Quanto ao mais, mantém-se a sentença recorrida.

Custas da ação e da apelação a cargo dos Autores/apelantes e da Ré/apelada, na proporção do respetivo decaimento (art. 527º do CPC), sem prejuízo do benefício de apoio judiciário de que goza o recorrente AA”.


8. Desta vez é a ré que, inconformada e pugnando pela revogação do Acórdão, vem interpor recurso de revista.

Termina as suas alegações com as seguintes conclusões:

1ª O presente recurso tem por objecto conhecer da questão de direito que consiste em saber se, por morte de um dos dois titulares de uma conta de depósito bancário, os seus herdeiros podiam movimentar a conta como o podia o titular de quem eram herdeiros ou se, perante o decesso deste, apenas lhes cabia o direito de levantar metade do valor em depósito a coberto da presunção a que se referem os artºs 512º e 516º do Código Civil.

2ª O Recorrente tem para si que à questão de direito colocada, a resposta juridicamente correcta é a que foi dada pela sentença da Primeira Instância, ou seja, a de que o Banco não podia deixar de cumprir a ordem de levantamento comunicada por quem, mesmo que na qualidade de herdeiro, tinha em relação à conta a condição de titular solidário.

3ª Como se diz na sentença da Primeira Instância, o Banco “tendo-lhe sido comunicado o falecimento de um dos titulares da conta e habilitados perante si os seus sucessores, mais não fez (…) do que cumprir as obrigações que para ele decorriam do contrato de abertura de conta quando, em observância da ordem que lhe foi transmitida, entregou aos chamados a totalidade dos fundos que então estavam em depósito”.

4ª A decisão do Banco limitou-se, no respeito das regras de movimentação da conta, a acatar a ordem de quem estava legitimado para o efeito, viesse ela do primitivo titular ou dos seus herdeiros: fazendo-o, o Recorrente cumpriu o contrato de abertura de conta e deixou sem violação a presunção a que se refere o artº 516º do Código Civil.

5ª Decidir o caso como a Relação decidiu é o mesmo que decidi-lo fora dos pressupostos e da configuração jurídica que dá corpo à acção: é que os Autores não agitam na lide o regime da solidariedade, sustentando o seu direito à reposição de todo o dinheiro à conta como consequência necessária de serem, sem o terem provado, donos dele ao nível das relações internas entre cotitulares.

6ª Decidindo como decidiu, o acórdão recorrido violou, por aplicação indevida, o disposto nos artºs 512º e 516º do Código Civil”.


9. Não foram produzidas contra-alegações.


7. Em 9.11.2021, o Exmo. Desembargador do Tribunal da Relação ... proferiu um despacho determinando a subida dos autos.


*


Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente (cfr. artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do CPC), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cfr. artigos 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do CPC), a única questão a decidir, in casu, é a de saber se a ré é responsável perante os autores pela entrega aos herdeiros de um dos co-titulares da conta bancária, na totalidade, dos fundos aí existentes.


*

II. FUNDAMENTAÇÃO

OS FACTOS

São os seguintes os factos que vêm provados no Acórdão recorrido:

1. No dia 24 de Outubro de 1991, na agência de ... do Banco Pinto & Sotto Mayor, foi aberta uma conta bancária de depósitos à ordem, a que coube o nº ...04, em regime de conta solidária, sendo titulares CC (1º titular) e o aqui autor AA (2º titular).

2. Ao longo de vários anos, a referida conta foi movimentada a crédito e a débito, tendo-o sido a crédito pelos autores, com transferências sucessivas de ..., e a débito por CC, para agilizar pagamentos que, em nome dos autores, fossem necessários realizar, nomeadamente conta da água, telefone, impostos e tudo mais que fosse necessário.

3. No ano de 2018, em deslocação à agência bancária onde se encontra domiciliada a referida conta, os autores solicitaram informação do saldo constante da mesma e nesse momento verificaram que não tinham aí qualquer provisão, pois o valor tinha sido levantado na sua globalidade.

4. O valor depositado na identificada conta de depósitos à ordem e numa conta poupança associada, que à data de 16/03/2018 perfazia o montante global de € 42.159,78, tinha sido entregue aos herdeiros do CC.

5. Ao longo de vários anos, nomeadamente entre 8 de Julho de 2005 e 13 de Dezembro 2017, os movimentos a crédito na referida conta de depósitos à ordem foram realizados pelos autores e nunca pelo CC.

6. Ao Banco réu nunca foi comunicado que, ao nível da sua relação com o autor marido, o CC era apenas seu procurador.

7. O Banco réu ignorava, por nunca lhe ter sido dito, a quem pertencia o direito de propriedade dos valores que, ao longo do tempo, foram depositados na referida conta bancária.

8. O titular CC faleceu no dia 19 de Dezembro de 2017.

9. Este óbito foi participado ao Banco pelos seus herdeiros, os filhos DD e EE, que facultaram ao Banco todos os elementos para o efeito de se habilitarem, perante este, como seus únicos herdeiros, designadamente a respectiva escritura de habilitação.

10. Concluído o respectivo processo, o Banco habilitou-os como herdeiros do titular falecido.

11. Já habilitados, aqueles DD e EE transmitiram ao Banco instruções para que todos os valores em depósito lhes fossem entregues, parte por levantamento em numerário à boca de caixa, parte por transferência para diferentes contas bancárias.

12. Esta ordem foi transmitida por documento assinado pelos dois, entrado no Banco no dia 19 de Março de 2018 e no qual se mencionava o valor global sobre que incidia a ordem: € 42.067,53, ou seja, a totalidade dos valores em depósito.

13. O Banco cumpriu esta ordem, entregando aos dois referidos herdeiros o valor em causa.


E são seguintes os factos considerados não provados no Acórdão recorrido:

a) Pelo facto de os autores serem analfabetos, o procurador entendeu excluir da conta a autora esposa e colocar em lugar dela o seu nome.

b) Desde o dia em que a conta foi aberta, não existiram, em momento algum, movimentos a crédito executados por CC, tendo sido por ele sempre realizados a débito, na qualidade de procurador autorizado e não de titular.

c) Por volta do ano de 1991, o autor propôs ao falecido CC arranjar-lhe clientes em ..., nomeadamente emigrantes, para a elaboração de projectos para a construção de moradias.

d) Os clientes que o autor angariava em ... pagavam parte do seu preço a si, que por sua vez o entregava ao finado CC.

e) A fórmula que o autor e o finado CC arranjaram para que esses valores fossem entregues por aquele a este último foi a de criarem a conta bancária identificada em 1.


O DIREITO

A questão suscitada na presente revista é simples de enunciar: saber se a ré podia entregar aos herdeiros de um dos co-titulares da conta bancária, na totalidade, dos fundos aí existentes ou se, pelo contrário, tendo-o feito, incorre em responsabilidade contratual.

O Tribunal de 1.ª instância decidiu que inexistia responsabilidade contratual do Banco, fundamentando a sua decisão nos seguintes termos:

É sabido que, não raras vezes, um titular duma conta não tem qualquer relação material com o dinheiro nela depositado. Não é titular da propriedade económica desse dinheiro, mas sim um titular meramente fiduciário. Será alguém que, por regra no quadro de uma relação de confiança com o titular económico dos fundos, é por ele investido na titularidade da conta, por razões que apenas a ambos e às suas relações dizem respeito.

São situações, mais comuns no caso das contas solidárias, em que o titular proprietário económico do dinheiro, opta por atribuir a um terceiro a qualidade de contitular da conta. São situações em que o proprietário económico do dinheiro se coloca numa posição perigosa, já que fica sujeito a uma eventual situação de abuso por parte do contitular fiduciário.

Acaba por ser uma situação destas a que os autores relatam na petição inicial, invocando que o CC seria, quando muito, um titular fiduciário da conta, sem qualquer relação de propriedade com os fundos aí depositados, sendo-lhe atribuída aquela titularidade formal apenas por razões que se prenderiam a satisfação dos interesses deles, demandantes. Todavia, como assinala o Autor a que vimos fazendo referência, “são razões que o banco não sabe, que não lhe cabe saber e que não deverá querer saber”.

Como se disse já, o titular da conta está legitimado a movimentar o respectivo saldo, sendo, para o efeito, indiferente, no que às relações com o banco concerne, a circunstância eventual de o mesmo não ser o proprietário económico do dinheiro. Ou seja: face ao banco, um eventual carácter fiduciário da titularidade da conta é, em princípio, indiferente, sem prejuízo do relevo que tal carácter tenha nas relações internas entre o fiduciante e o fiduciário. Como se decidiu no Ac. da Relação de Évora de 23/02/2017, “a instituição bancária é alheia à questão da repartição da propriedade do dinheiro depositado nas suas contas, a qual respeita às relações internas dos titulares da conta bancária ou aos respectivos herdeiros, em caso de sucessão mortis causa.”

É sabido que as contas bancárias, quanto ao número dos seus titulares, podem ser individuais ou colectivas, consoante tenham apenas um ou dois ou mais titulares. Por sua vez, nesta última modalidade – colectiva – a conta bancária pode ser solidária, conjunta ou mista.

No caso das contas conjuntas, os fundos nelas depositados apenas podem ser mobilizados com a intervenção de todos os titulares. Já no caso das contas solidárias, qualquer dos titulares tem a faculdade de exigir, por si só e sem autorização dos demais, a prestação integral, ou seja, o reembolso de toda a quantia depositada, acrescida dos respectivos juros, se os houver, não podendo o banco opor-lhe o facto de o depósito pertencer, também, a um outro co-titular, impedindo-o de levantar a totalidade dos fundos. É o que resulta do preceituado no artigo 512º, nº 1 do Código de Processo Civil.

Também nas contas solidárias, a questão da propriedade ou da titularidade económica do dinheiro nelas depositado é assunto que, a priori, apenas interessa no plano das relações internas dos contitulares entre si, e não no âmbito das relações externas, destes com o banco. Como pode ler-se no Ac. da Relação de Lisboa de 26/02/2016, “quando é aberta uma conta conjunta solidária, para a entidade bancária é indiferente a participação que cada um dos titulares tenha na abertura da conta, bem como nos depósitos que eventualmente venham a ser feitos no futuro. A obrigação contratual do banco é apenas a de permitir que a conta seja movimentada nos termos da modalidade acordada quando a conta foi aberta, ou seja, neste caso, facultando a qualquer um dos titulares e em qualquer altura a possibilidade de fazer levantamentos ou outras movimentações, desde que o montante dessas operações não exceda o do valor depositado. (…)

Consequentemente, vale isto por dizer, que qualquer litígio que surja entre os titulares de determinada conta relativamente à propriedade dos valores aí depositados, ou entre os titulares e os herdeiros de um dos falecidos titulares, é uma questão que apenas respeita às relações internas entre estes, situando-se para além da relação contratual estabelecida entre aqueles e o banco, quando procederam à abertura da conta”.

Ora, transpondo estes ensinamentos para o caso vertente, e atendendo à materialidade que ficou provada, era indiferente para a ré Banco Comercial Português, Sociedade Aberta, S.A. - era assunto que não lhe dizia respeito -, a circunstância de o finado CC ser apenas um titular fiduciário da conta em discussão, e não também proprietário, no todo ou em qualquer parte, dos fundos que ao longo do tempo nela foram sendo creditados.

Na perspectiva da ré, o falecido CC era, a par do autor e tanto quanto este, titular da conta bancária em causa neste processo. Tal conta foi aberta em regime de solidariedade e assim se manteve – ou, pelo menos, não há notícia que esse regime se tenha alterado. Donde, tendo-lhe sido comunicado o falecimento de um dos titulares solidários da conta, e habilitados perante si os seus sucessores, mais não fez a ré do que cumprir as obrigações que para ela decorriam do contrato de abertura de conta quando, em observância da ordem que lhe foi transmitida, entregou aos chamados a totalidade dos fundos que então estavam em depósito.

Não se vislumbra, pois, que a ré, ao actuar como actuou, tenha incorrido em qualquer responsabilidade contratual perante o autor que a obrigue a repor na conta bancária a quantia levantada pelos chamados. E, ante a factualidade provada, não se considera também que a ré tenha deixado de observar qualquer regra de conduta ou dever diligência que, como entidade bancária, era expectável que cumprisse, nomeadamente aqueles decorrentes dos artigos 73º a 75º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei nº 298/92, de 31 de Dezembro.

Com efeito, como decorre dos factos provados, se ao nível das relações entre eles o CC seria apenas procurador do autor, ou, dito de outro modo, se a intenção do autor, ao abrir conjuntamente a conta com o CC, era apenas a de lhe atribuir essa qualidade – de “procurador ou autorizado”, como diz na petição inicial – disso nunca foi dado conhecimento à ré. Do mesmo modo, a ré ignorava, por nunca lhe ter sido comunicado, a quem pertencia o direito de propriedade dos valores que, ao longo do tempo, foram depositados na referida conta bancária (cfr. os pontos 6. e 7. dos factos provados).

Sendo assim, necessariamente naufraga esta demanda, não restando aos autores outra alternativa que a de, se assim o entenderem, instaurar outra demanda contra os aqui intervenientes como partes acessórias, na qual os convençam do seu direito de propriedade sobre os montantes que estavam depositados na conta em referência ou, ancorando-se na presunção contida no artigo 516º do Código Civil, obtenham daqueles a restituição do que embolsaram para além do que era efectivamente seu direito”.

Em contrapartida, o Tribunal recorrido decidiu que havia que condenar a ré no pagamento ao autor AA de metade dos valores entregues aos herdeiros de CC, expondo o seguinte raciocínio:

“Perante esta norma [artigo 516.º do CC] não oferecerá dúvidas que a questão da repartição da propriedade do dinheiro respeita às relações internas dos titulares da conta bancária ou aos respectivos herdeiros, em caso de sucessão mortis causa, sendo por isso matéria a que o Banco é alheio.

Mas como compatibilizar aquela obrigação de restituição do Banco, quando instado para tal, com esta obrigação de não interferência desse mesmo Banco em litígio relativo à propriedade dos valores nele depositados? Ou, doutro modo, qual deve ser o comportamento do Banco ao cumprir uma ordem sobre uma conta solidária transmitida, não pelo primitivo co-titular, entretanto falecido, mas pelos herdeiros deste?

Ora, neste ponto releva a interpretação do art. 516º do CC, a qual impõe ao Banco o cumprimento da obrigação de restituição de acordo com o critério supletivo que se inscreve naquela norma: o da presunção de igualdade de comparticipações (ou de contitularidade em partes iguais).

Donde decorre que os herdeiros do co-titular falecido CC apenas poderiam ser autorizados a levantar e a fazer sua a metade dos valores em depósito a coberto da presunção, iuris tantum, derivada de a conta se mostrar aberta em regime de solidariedade e de serem dois os primitivos titulares.

Acontece que, no caso em apreço, ao ser interpelado pelos herdeiros do 1º titular falecido para cumprir a obrigação de restituição a que estava contratualmente vinculado e ao decidir entregar-lhes a totalidade dos valores depositados, e não apenas metade, o Banco afastou a presunção de igualdade de quota na conta comum do art. 516º do CC. Porém, não cabia à entidade bancária decidir quanto à ilisão da referida presunção, pois não podia aquela deixar de aplicar tal presunção quando interpelada para cumprir a obrigação de restituição a que estava contratualmente obrigado e a cujo cumprimento não tinha fundamento legal para se eximir.

Na verdade, nas relações internas, desconhecendo-se o acordo ou a relação jurídica de que resultou a sua abertura (pois não se mostra que tenha sido estipulada qual a quota parte que a cada titular compita), havia que presumir, nos termos do regime definido pelos arts. 512º e 516º do CC, que ambos os titulares da conta participavam no crédito em partes iguais e, nesse contexto, presumindo-se que participavam ambos, em partes iguais, no referido crédito, o procedimento do Banco recorrido, ao atribuir os fundos em exclusivo aos herdeiros do 1º titular, em vez de os repartir por aqueles e pelo 2º titular (ora recorrente), acabou por ilidir a referida presunção de contitularidade.

A sua decisão de restituição da totalidade dos valores depositados traduziu-se, na prática, numa forma de dirimir o litígio entre os herdeiros do 1º titular e o 2º titular da conta, substituindo-se a uma decisão judicial na definição da propriedade do dinheiro depositado, o que lhe estava vedado.

Atento o dissídio sobre a titularidade dos fundos em depósito, não cabia ao Banco recorrido resolver esse conflito, nem sequer antecipar a solução do mesmo, tomando partido por qualquer dos interessados.

O Banco deveria ter, pois, estendido os efeitos da solidariedade ao regime da propriedade dos valores em débito, não obstante esta propriedade respeitar às relações internas entre os titulares, sendo alheia à relação contratual bancária.

Consequentemente, ao invés de proceder ao pagamento da totalidade dos valores em depósito, deveria apenas ter pago aos herdeiros do titular falecido a metade do saldo da conta.

Quer isto dizer que o procedimento adotado pelo Banco recorrido ao proceder ao pagamento, na íntegra, das disponibilidades monetárias aos herdeiros do contitular falecido, e não apenas do valor correspondente à quota-parte daquele contitular, incumpriu o contrato a que estava obrigado. Tal comportamento, além de ilícito e culposo, causou danos ao autor marido, já que este se viu desapossado de metade do valor dos fundos depositados (arts. 562º, 563º, 564º, n.º 1, 762º, 798º, 799º, n.º 1, todos do CC).

Discorda-se, assim, da solução sustentada na decisão recorrida, posto que, em face do incumprimento contratual, se impõe a condenação do Banco Recorrido no pagamento ao autor marido de metade dos valores restituídos aos herdeiros do falecido CC, no valor de 21.079,89€33 (e não na totalidade, como propugnado pelos Autores/recorrentes).

Ao referido montante acrescem juros, à taxa legal, contados desde a citação, e não da propositura da acção (art. 805º, n.º 1, do CC), até efetivo e integral pagamento”.

A ré / ora recorrente insurge-se contra esta última decisão, sustentando, fundamentalmente, que ela não está em conformidade com o regime disposto nos artigos 512.º e 516.º do CC (cfr. conclusão 6.ª).

Quid iuris?

Antes de responder à questão que é objecto do recurso, cumpre deixar duas notas de enquadramento. Serão breves dado que, além de merecerem a convergência das instâncias, são pontos que os dois tribunais trataram com assinável desenvolvimento nas respectivas decisões.

Em primeiro lugar, deve sublinhar-se que o presente litígio opõe os autores / recorridos ao Banco réu / recorrente e não envolve os herdeiros de CC, que são meros intervenientes acessórios. Segundos os autores, ao ter entregado a totalidade dos fundos existentes em determinada conta bancária àqueles herdeiros, o Banco violou deveres a que estava sujeito, ficando constituído em responsabilidade contratual. O pedido dos autores prende-se, portanto, exclusivamente, com a responsabilização do Banco e com a de ninguém mais.

Em segundo lugar, deve esclarecer-se que, de acordo com a factualidade provada, entre o Banco e os titulares da conta bancária foram concluídos dois contratos: um contrato de abertura de conta e um contrato de depósito bancário. Não obstante poderem coincidir ou intersectar-se no tempo, estes dois contratos não se confundem[1].

Como diz António Menezes Cordeiro, o relacionamento bancário inicia-se normalmente pela abertura de conta[2]. É, pois, neste contrato que se definem os termos fundamentais da relação contratual entre o cliente e o Banco, termos estes pelos quais, sendo a relação bancária tendencialmente duradoura[3], se pautarão os sucessivos contratos que, como é normal, vêm a celebrar-se entre as partes[4].

Por sua vez, o contrato de depósito bancário é acessório relativamente ao contrato de abertura de conta e consiste no acordo através do qual o cliente entrega ao Banco uma determinada quantia em dinheiro[5]. É geralmente considerado, na doutrina e na jurisprudência portuguesas, uma figura próxima do depósito irregular, regulado nos arts. 1205.º e 1206.º do CC[6], ou seja um depósito que tem por objecto coisas fungíveis e ao qual é aplicável, dentro do possível, a disciplina do mútuo. Por força deste contrato de depósito, o Banco “adquire a titularidade da quantia que lhe é entregue, sendo o cliente um simples credor [7].

Dito isto, cumpre agora concentrar a atenção nos termos em que foi celebrado o contrato (“acto nuclear[8], contrato “primogénito” ou “matriz[9]) de abertura da conta em causa nos presentes autos.

Um dos factos centrais é o facto provado 1. Consta dele que a “conta bancária de depósitos à ordem [foi constituída] em regime de conta solidária, sendo titulares CC (1.º titular) e o aqui autor AA (2.º titular)”.

CC era, então, um genuíno cotitular da conta solidária, tendo plena legitimidade para a movimentação da conta (i.e., sem restrições de qualquer ordem) e, inclusivamente para mobilizar parte ou a totalidade dos fundos. E isto independentemente do sujeito a quem seja imputável a origem dos depósitos (a crédito) feitos na conta[10].

Tendo a conta sido aberta no regime da solidariedade, é aplicável o regime da solidariedade, designadamente do disposto nos artigos 512.º e s. do CC.

O artigo 512.º do CC é a norma nuclear, sempre incontornável nestes casos, na qual se define a solidariedade. Pode ler-se aí:

1. A obrigação é solidária, quando cada um dos devedores responde pela prestação integral e esta a todos libera, ou quando cada um dos credores tem a faculdade de exigir, por si só, a prestação integral e esta libera o devedor para com todos eles.

2. A obrigação não deixa de ser solidária pelo facto de os devedores estarem obrigados em termos diversos ou com diversas garantias, ou de ser diferente o conteúdo das prestações de cada um deles; igual diversidade se pode verificar quanto à obrigação do devedor relativamente a cada um dos credores solidários”.

Para o caso dos autos adquire ainda relevância, em particular, a norma do artigo 513.º, n.º 1, do CC, onde se diz:

A solidariedade de devedores ou credores só existe quando resulte da lei ou da vontade das partes”.

Comentando esta norma, dizem Pires de Lima e Antunes Varela:

Não se exige uma declaração expressa de vontade para constituir a solidariedade. Basta que a vontade se manifeste tacitamente nos termos admitidos no artigo 217.º. Há fórmulas correntes de estipular a solidariedade, como 'todos por um', 'um por todos' ou 'um por todos'. Um caso muito frequente de solidariedade activa é o dos depósitos bancários feitos em nome de duas ou mais pessoas (vulgarmente designadas contas conjuntas ou colectivas), em que qualquer um dos depositantes fica com a faculdade de fazer levantamentos (…)[11].

E adquire relevância, por fim, a norma do artigo 516.º do CC, com o seguinte teor:

Nas relações entre si, presume-se que os devedores ou credores solidários comparticipam em partes iguais na dívida ou no crédito, sempre que da relação jurídica entre eles existente não resulte que são diferentes as suas partes, ou que um só deles deve suportar o encargo da dívida ou obter o benefício do crédito[12].

É justamente aqui – na interpretação ou na definição do alcance desta última norma – que, como se viu, se localiza o dissenso entre as duas instâncias. Enquanto o Tribunal de 1.ª instância não atribuiu importância à norma para o efeito da questão suscitada nos autos, o Tribunal da Relação encontra nela o fundamento determinante para a sua decisão de condenar o Banco na obrigação de restituir à conta bancária metade da quantia que havia entregado aos herdeiros de CC.

A propósito do artigo 516.º do CC afirmam os autores acima referidos:

Nada resultando da relação jurídica existente entre os credores ou os devedores solidários sobre a medida da comparticipação de cada um no crédito ou na dívida, funciona a presunção estabelecida neste preceito. Se, por exemplo, duas pessoas fizeram um depósito bancário em regime de solidariedade activa (vide a nota ao n.º 1 do artigo 513.º), presume-se, enquanto não se fizer prova noutro sentido, que cada um dos depositantes é titular de metade da conta (…)[13].

Em anotação à mesma norma, afirma Ana Afonso:

Se perante o credor cada um dos devedores está obrigado à realização integral da prestação ou se cada credor solidário pode exigir o cumprimento da totalidade da prestação ao devedor, no âmbito das relações internas será necessário respeitar a medida em que cada um dos devedores se obrigou ou a extensão do direito que cada um tem legitimidade para exercer. A título supletivo e como meio de resolver a duvida que a este respeito se possa suscitar determina o legislador a igualdade da quota de cada devedor e de cada credor. Trata-se apenas de uma presunção ilidível, como por regra o são as presunções legais (artigo 350.º) [14].

Ainda sobre esta norma observa Margarida Lima Rego:

Perante o credor, cada um dos devedores solidários responde pela prestação integral, e cada credor solidário pode exigi-la ao devedor. Se assim é nas relações externas, entre o lado passivo e o lado ativo de uma obrigação solidária, há que apurar o regime a aplicar às respetivas relações internas, entre devedores ou entre credores solidários. Nestas, aplica-se, supletivamente, uma regra de igualdade, que se presume (presunção que é ilidível, nos termos gerais do n.º 1 e da 1.ª parte do n.º 2 do art. 350.º)”.

Como fica confirmado pela leitura destes comentários da doutrina especializada, a lei impõe que num caso como o dos autos (em que existe pluralidade de credores em regime de solidariedade) se distinga de forma clara entre as relações externas e as relações internas. As relações externas são aquelas que se estabelecem entre os credores, de uma parte, e o sujeito obrigado, de outra; as relações internas são aquelas que estabelecem, entre si, os credores e em que já não “entra” o sujeito obrigado.

O Tribunal recorrido apercebe-se desta distinção e começa por imputar a disciplina do artigo 516.º do CC a estas últimas. Mas depois, surpreendentemente, conclui que a presunção nele prevista (igualdade de comparticipações) devia ter sido respeitada pelo Banco, que é estranho àquelas relações (internas).

Ora, com o devido respeito, as coisas não podem passar-se assim.

Como se viu acima, a norma do artigo 516.º regula a hipótese das relações internas, começando, aliás, por referir “[n]as relações entre si (…)”. A consequência lógica é que a presunção (de igualdade nas comparticipações) estabelecida na norma não se aplica ao (não vincula o) sujeito localizado no exterior daquelas relações.

A disciplina aplicável, em especial, à solidariedade entre credores, confirma esta conclusão, estabelecendo que “[é] permitido ao devedor escolher o credor solidário a quem satisfaça a prestação, enquanto não tiver sido judicialmente citado para a respectiva acção por outro credor cujo crédito se ache vencido” (cfr. artigo 528.º, n.º 1, do CC)[15], e que “[a] satisfação do direito de um dos credores, por cumprimento [] produz a extinção, relativamente a todos os credores, da obrigação do devedor”.

Aplicando o raciocínio ao caso dos quantos ao caso dos autos: em contraste com o que é sustentado no Acórdão recorrido, o Banco não tinha obrigação de respeitar a presunção de igualdade, que só vale para as relações internas; por isso, ao entregar aos herdeiros de CC a quantia depositada, não incorreu em qualquer responsabilidade – mais: em face do artigo 512.º do CC, os herdeiros habilitados de CC tinham o poder de exigir aquela entrega ao Banco e não havia maneira de (não havia fundamento para) o Banco se eximir a ela.

Admite-se que aquele “arranjo” das coisas, i.e., a atribuição a CC da qualidade de cotitular da conta em regime de solidariedade (com o mero intuito de “agilizar pagamentos que, em nome dos autores, fossem necessários realizar, nomeadamente conta da água, telefone, impostos e tudo mais que fosse necessário”, como consta no facto provado 2) tenha acabado, a final, por se revelar “um mau negócio” para os autores[16]. Quer dizer: compreende-se a insatisfação dos autores / recorridos.

O certo é que, sendo aquelas as circunstâncias do caso, eles podiam e deviam ter acautelado a situação de outra maneira – de maneira a que os seus interesses pudessem ficar plenamente protegidos à luz do Direito.

Não tendo os autores acautelado a situação de outra maneira, os riscos associados ao facto de (pessoas das quais, como demonstram os factos provados 2 e 5, originavam os depósitos a crédito na conta) terem “facilitado” a CC a qualidade de cotitular, não podem deixar de “correr por conta deles” e não podem agora pretender o Banco seja afectado por aquilo que foi “combinado” à margem do contratualizado com ele. Note-se, aliás, que as circunstâncias em que se desenrolava a relação (interna) entre os cotitulares e que justificavam as movimentações a crédito e a débito não eram sequer do domínio do Banco (cfr. factos 6 e 7).

Dito isto, e como foi apontado pelo Tribunal de 1.ª instância, os autores / recorridos poderão ainda aferir da viabilidade de satisfazer a sua pretensão contra os herdeiros de CC. Contra estes – e só contra estes –, no âmbito da repartição interna regulada no artigo 533.º do CC[17], tem sentido fazer valer o artigo 516.º do CC (a presunção aí prevista ou, como parece ser o caso, o seu carácter relativo ou ilidível), bem como outras normas que regulem as relações internas dos credores solidários[18].


*


III. DECISÃO

Pelo exposto, concede-se provimento à revista e repristina-se a decisão proferida no Tribunal de 1.ª instância.


*

Custas pelos recorridos.

*


Catarina Serra (relatora)

Rijo Ferreira (vencido, com declaração de voto junta)

Cura Mariano


***



DECLARAÇÃO DE VOTO

Processo 4406/19.3T8BRG.G1.S1

Entendo que a posição de titular de uma conta bancária solidária (rectius, de parte, enquanto cliente, num contrato de abertura de conta) tem natureza exclusivamente pessoal não sendo susceptível de transmissão mortis causa, nos termos do art.º 2025º do CCiv.

Com efeito a clausula de solidariedade assenta numa relação de fidúcia entre os diversos titulares da conta, de natureza estritamente pessoal, que não é vislumbrada para permanecer para além dessa relação pessoal. Numa outra perspectiva, a assunção do risco inerente à possibilidade de movimentação unilateral da totalidade do saldo da conta cláusula é apenas vislumbrada relativamente à pessoa da outra parte, e não já relativamente a quem lhe possa vir a suceder.

O que se transmite por via sucessória, porquanto tem uma natureza claramente patrimonial (art.º 2024º do CCiv) é o direito ao montante depositado na conta (rectius, ao saldo da conta). Mas aí, como em qualquer sucessão, aqueles que se arrogam como sucessores têm de proceder à respectiva habilitação, quer quanto à qualidade de sucessor quer quanto à sua medida, no confronto de todos os interessados directos, ou seja, os diversos pretendentes à sucessão e os outros titulares do direito em que pretendem suceder.

Nesse entendimento o Banco Réu aceitou que a conta fosse movimentada por quem, por um lado, não era o titular da conta (os herdeiros do titular solidário defunto não sucederam nessa posição pessoal) e, por outro lado, entregou a totalidade do saldo dessa conta a quem não se mostrava habilitado a esse direito (por a habilitação ter sido feita à revelia do sobrevivo titular da conta); consequentemente, incumpriu as suas obrigações contratuais.

A acção merecia integral provimento, mas atenta a proibição da reformatio in pejus (art.º 635º, nº 5, do CPC), confirmaria a decisão recorrida.

(Rijo Ferreira)

________

[1] Adverte para a necessidade de os contratos não se confundirem, por exemplo, José Engrácia Antunes [Direito dos contratos comerciais, Coimbra, Almedina, 2012 (reimpressão), pp. 485-486].
[2] Cfr. António Menezes Cordeiro, Direito Bancário, Direito Bancário, Coimbra, Almedina, 2014 (5.ª edição), p. 285.
[3] Sobre o carácter duradouro da relação bancária geral cfr., por exemplo, António Menezes Cordeiro, Direito Bancário, cit., pp. 276 e s.
[4] Sobre contrato de abertura de conta bancária cfr. António Menezes Cordeiro, Direito Bancário, cit., pp. 287-289 e pp. 532 e s., e José Engrácia Antunes, Direito dos contratos comerciais, cit, pp. 483 e s.
[5] Sobre contrato de depósito bancário cfr. António Menezes Cordeiro, Direito Bancário, cit., pp. 601 e s., e José Engrácia Antunes, Direito dos contratos comerciais, cit, pp. 492 e s.
[6] Cfr., neste sentido, António Menezes Cordeiro, Direito Bancário, cit., pp. 613-614 (e jurisprudência citada na nota 1151).
[7] Cfr., António Menezes Cordeiro, Direito Bancário, cit., p. 613.
[8] É assim que o qualifica António Menezes Cordeiro (Direito Bancário, cit., p. 532).
[9] É nestes termos que se refere a ele José Engrácia Antunes (Direito dos contratos comerciais, cit, p. 483 e p. 484).
[10] As mesmas ideias são firmadas no sumário do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15.11.2017 (Proc. 879/14.9TBSSB.E1.S1): “I - A conta bancária colectiva solidária é caracterizada pela faculdade conferida a cada um dos seus titulares de exigir a prestação integral, ou seja, o reembolso pelo banco depositário de toda a quantia que lhe foi entregue. II - Tal regime vigora independentemente de quem seja, de facto ou de direito, o dono dos valores ou fundos nela depositados. III - A titularidade da conta não predetermina a propriedade dos fundos nela contidos, que pode pertencer apenas a algum ou alguns dos seus titulares ou mesmo até porventura a um terceiro”.
[11] Cfr. Pires de Lima / Antunes Varela, Código Civil Anotado, volume I, Coimbra, Coimbra Editora, p. 529.
[12] Sublinhados nossos.
[13] Ob. cit., p. 532 (sublinhados nossos).
[14] Cfr. Ana Afonso, in: AAVV, Comentário ao Código Civil – Direito das Obrigações – Obrigações em Geral, Lisboa, Universidade Católica Editora, 2018, p. 439 (sublinhados nossos).
[15] Comentando a norma antecessora desta (o artigo 750.º do CC de 1867) afirma Manuel Domingues de Andrade (Teoria Geral das Obrigações, Coimbra, Almedina, 1966, pp. 122-123): “Resulta, portanto, que qualquer dos credores pode exigir o cumprimento integral da prestação e, do mesmo modo, o devedor pode pagar integralmente a qualquer dos credores, à sua escolha”.
[16] Explica Manuel Domingues de Andrade (Teoria Geral das Obrigações, cit., p. 117), “[e]sta forma de solidariedade [activa] comporta vantagens apreciáveis, tanto pelo lado dos concredores como do lado do devedor. Permite que um só dos credores receba a totalidade do crédito, dispensando os outros de actuarem também por sua parte, o que em dadas circunstâncias (ausência, etc.) lhes poderia ocasionar dificuldades e prejuízos graves. Por outro lado, facilita ao devedor o pagamento, pois pode pagar toda a dívida por uma só vez e àquele dos credores a quem lhe seja mais cómodo. Mas pode a solidariedade activa trazer inconvenientes aos credores. Basta pensar em que o credor que recebe a prestação total pode dissipá-la e não ter bens por onde responda para com os outros pela parte que lhes é devida”. Nesta última parte, o autor refere-se já, obviamente, aos riscos da repartição nas relações internas.
[17] No artigo 533.º do CC dispõe-se: [o] credor cujo direito foi satisfeito além da parte que lhe competia na relação interna entre os credores tem de satisfazer aos outros a parte que lhes cabe no crédito comum”.
[18] Raciocínio idêntico está sintetizado no sumário do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23.03.2021 (Proc. 215/10.3TVPRT.P1.S3), onde se diz: “(…) V - Numa conta bancária solidária, cada cotitular pode proceder ao levantamento da totalidade do depósito, sem que isso signifique que a quantia depositada lhe pertence, nem que lhe pertence por inteiro. VI - Ficando a conta coletiva solidária “a zeros”, será nas relações internas entre os cotitulares da mesma que o eventual cotitular prejudicado pode tentar ressarcimento, e não com terceiros (…)”. Veja-se ainda o sumário do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24.03.2017 (Proc. 1769/12.5TBCTX.E1.S1): “(…) VII - Sendo autor e ré co-titulares de conta bancária solidária, presume-se, nos termos dos art.ºs 512º e 516º do Cód. Civil, que participam no crédito em partes iguais. VII - E tendo a última visto o seu direito satisfeito para além do que lhe cabia na relação interna entre os concredores, terá de satisfazer ao primeiro a parte que lhe pertence no crédito comum (art.º 533º do Cód. Civil), ou seja, metade do que levantou (…)”.