ACÇÕES NOMINATIVAS
ACÇÕES AO PORTADOR
SANÇÃO PECUNIÁRIA COMPULSÓRIA
Sumário

1.–A lei 15/2017 de 3 de maio veio proibir a emissão de valores mobiliários ao portador a partir de 4 de maio de 2017, prevendo ainda a criação de um regime transitório destinado à conversão (obrigatória) dos valores mobiliários ao portador existentes, em nominativos (art. 3.º); esse regime foi instituído pelo Dec. Lei 123/2017 de 25 de setembro.

2.–Deixou, pois, de existir a possibilidade de opção entre ações nominativas e ao portador; a alteração de regime é uma das medidas destinadas ao combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo, no âmbito da Diretiva (UE) 2015/849 do Parlamento Europeu e do Conselho de 20 de maio de 2015.

3.–A substituição/alteração dos títulos mobiliários ao portador não integrados em sistema centralizado, tem como pressuposto que os titulares respetivos ou a entidade que os têm na sua posse, os apresente e entregue, para efeitos de conversão, à respetiva sociedade; a falta de conversão até ao fim do período transitório tem as consequências (gravosas) a que aludem os arts. 2.º, nº2 da Lei 15/2017 e o art. 7.º do Decreto-Lei n.º 123/2017.

4.– É sobre a sociedade emitente que recai o dever de emissão e entrega dos títulos aos autores, que os adquiriram aquando da constituição da sociedade, ato no qual tiveram intervenção (subscrição inicial) - art. 304.º, nº3 do CSC e art. 95.º do CVM -, competindo-lhe, pois, o ónus de alegação e prova de que deram cumprimento a essa obrigação, e não aos autores o ónus de prova do facto contrário (isto é, pela negativa).

5.– Provando-se que a ré não procedeu à entrega desses títulos, não colhe a defesa apresentada pela ré, nada obstando a que esta proceda à conversão dos títulos em causa, ao portador, em nominativos.

6.– Tendo sido proferido juízo de condenação da ré a “entregar a cada um dos Autores o título representativo das acções de que cada um deles é titular no capital social da Ré (cada um deles uma acção nominativa, com valor nominal de € 1,00) bem como a proceder ao registo desses títulos a favor dos Autores, junto do Livro de Registo de Acções da sociedade, caso ainda não o tenha feito”, conclui-se que se trata de prestação que só a sociedade ré pode realizar, pelo que tem natureza infungível, justificando a fixação de sanção pecuniária compulsória, prevista no art. 829.°-A, n° 1 , do Cód. Civil, conforme pretensão deduzida pelos autores.

Sumário (da responsabilidade do relator - art. 644.º, nº7 do CPC)

Texto Integral

Acordam os Juízes da 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Lisboa.

  
I.RELATÓRIO:


Ação
Declarativa de condenação, sob a forma comum.

Autores/apelados
JS e MB.

Ré/apelante
MN, S.A.

Pedido
Que a ré seja condenada:
- A entregar a cada um dos autores o título representativo das ações de que cada um deles é titular no capital social da ré (cada um deles uma ação nominativa, com valor nominal de € 1,00) bem como a proceder ao registo desses títulos a favor dos autores, junto do Livro de Registo de Ações da sociedade, caso ainda não o tenha feito;
- A pagar a cada um dos autores, a título de sanção pecuniária compulsória, a fixar de acordo com o prudente arbítrio do Tribunal, mas em montante nunca inferior a 1 (uma) unidade de conta, por cada dia de atraso no cumprimento do peticionado.

Causa de pedir
Os títulos originais das ações de que são titulares junto da ré nunca lhes foram entregues e, aquando da entrada em vigor da Lei 15/2017, de 3 de maio e do Decreto-Lei 123/2017, de 25 de setembro, que obrigou a que as ações representativas do capital social das sociedades anónimas passassem a ser nominativas, solicitaram à ré informação sobre os título de que são titulares e quais as diligências praticadas para efeitos de entrega desses mesmos títulos, sem que tenham obtido qualquer resposta; tendo apurado que a ré havia publicado anúncio relativo ao início do procedimento para conversão das ações representativas do seu capital, isto é das ações ao portador para ações nominativas, os autores solicitaram que a ré procedesse ao registo a seu favor das ações de que são titulares e a substituição dos títulos por novos títulos.
A ré, alegando que os autores não tinham entregado os títulos antigos, isto é, os títulos ao portador, recusou efetuar a aludida conversão

Oposição
Excecionou a ilegitimidade dos autores e o erro na forma do processo.
Por impugnação, alegam que as ações ao portador foram entregues aos autores aquando da sua emissão, tendo estes sempre participado das Assembleias Gerais da ré, munidos desses títulos, pelo que, não lhe sendo entregues os títulos ao portador e desconhecendo se os autores ainda são os legítimos proprietários dos mesmos, não pode legalmente proceder à aludida conversão.
Termina pugnando pela procedência das exceções deduzidas e pela improcedência da ação e, consequentemente pela sua absolvição do pedido.

Resposta
Os autores responderam às exceções deduzidas, pugnando pela sua improcedência.
 
Saneamento
Foi dispensada a realização de audiência prévia e proferiu-se despacho saneador, no qual, conhecendo das exceções deduzidas, se considerou as mesmas improcedentes.
Fixou-se o objeto do processo e selecionou-se os temas da prova.

Julgamento
Realizou-se audiência final e proferiu-se sentença, em 27-11-2020, com o seguinte segmento dispositivo:
“Pelo exposto, julgando procedente a acção, condeno a Ré a:
- entregar a cada um dos Autores o título representativo das acções de que cada um deles é titular no capital social da Ré (cada um deles uma acção nominativa, com valor nominal de € 1,00) bem como a proceder ao registo desses títulos a favor dos Autores, junto do Livro de Registo de Acções da sociedade, caso ainda não o tenha feito;
- a pagar a cada um dos Autores, a título de sanção pecuniária compulsória, ao abrigo do disposto no artigo 829-A, n.° 1, do Código Civil, 1 (uma) unidade de conta, por cada dia de atraso no cumprimento do agora determinado.
Custas pela Ré.
Registe e notifique”.

Recurso
Não se conformando a ré apelou, formulando as seguintes conclusões:
1.- O Tribunal a quo não poderia concluir pela procedência da acção só com base no pedido da entrega de títulos nominativos sem conhecer o pedido da entrega do título ao portador e a sua conversão cujo pedido não foi formulado pelos recorridos.
2.- O pedido de entrega dos títulos nominativos, por natureza não pode proceder por si só. (Da mesma forma que um pedido de despejo tem ser precedido do pedido de resolução do contrato de arrendamento)
3.- De facto, o pedido dos recorridos não é um pedido autónomo, depende do pedido prévio não formulado pelos recorridos, pelo que é inadequado.
4.- O Tribunal a quo ao não se ter pronunciado sobre esta inadequação do pedido cujo conhecimento é oficioso e julgar totalmente procedente a acção, a decisão é nula nos termos do artigo 615.°, n.°l, alínea d), do CPC.
5.- Nos termos do DL 123/2017, no seu artigo 4.°, n.° 1, estabelece que a conversão se opera de duas formas, os títulos que constem no sistema centralizado basta a mera anotação e os títulos que não constem no sistema centralizado implica a entrega dos títulos ao portador ao emitente.
6.- No caso sub judice os títulos em disputa não se encontram registados em sistema centralizado.
7.- De modo que o Tribunal a quo fez errada interpretação e aplicação da lei ao considerar como considerou que os recorridos não têm de exibir os títulos ao portador para obterem os títulos nominativos.
8.- O Tribunal a quo assenta a sua fundamentação em várias fórmulas de raciocínio erradas e insuficientes na análise da prova e sobre os factos.
9.- A primeira formulação do Tribunal a quo limita-se a concluir que sendo os accionistas da mesma família (pai, filhos e irmãos), que se relacionavam em paz até um determinado momento, e as reuniões das assembleias eram informais, logo os títulos ao portador não foram entregues aos recorridos, sem que seja feita alusão a um elemento de prova que sustente o salto de raciocínio para aquela conclusão.
10.- Pois que também é válida a conclusão que devido àquelas circunstâncias (pai, filhos e irmãos, accionistas que durante 10 anos laboraram juntos) se prova que os títulos ao portador foram entregues aos recorridos por força das regras de experiência e o padrão normal do comportamento do homem médio.
11.- O Tribunal a quo desatendeu a circunstância dos recorridos nunca terem feito uma simples menção da falta dos títulos ao portador, à recorrida, aos outros accionistas ou às testemunhas dos recorridos até ao ano de 2017 (ou seja, durante 10 anos)
12.- Não é facto irrelevante o silêncio dos recorridos que nunca fizeram a chamada de atenção na ocasião ou meses depois da emissão e distribuição dos títulos.
13.- Sempre se dirá que os recorridos não lograram, sequer alegar, de que não resultou da sua culpa, nos termos do 815.° do CC, o de não terem na sua posse os títulos ao portador e que permitiram cimentar, inequivocamente, a ideia da entrega de todos os títulos ao portador a todos os accionistas.
14.- A construção da ideia da culpa dos recorridos está sustentada pela circunstância dos títulos ao portador terem sido emitidos no escritório da S. Veja-se a declaração de parte - [00:03:03] NRS: Não sei exatamente a data, mas foi a seguir, portanto, à constituição depois são impressos os títulos, salvo erro até foi no escritório da S que foram impressos, depois foram distribuídos pelos sócios.
15.- Foram emitidos pelo representante da recorrente os títulos ao portador de diversas sociedades anónimas, dos mesmos accionistas (recorridos e outros accionistas) e que foram entregues na mesma altura, a todos os accionistas incluindo os recorridos. Declarações de parte:
a.-[00:01:57] Mandatária (Dra. PL): Mais sociedades anónimas?
b.-[00:01:58] NSs: Sim.
c.-[00:01:59] Mandatária (Dra. PU): Nessa altura também foram criados mais títulos ao portador?
d.-[00:02:01] NS: Também.
16.- Tendo sido emitidos mais títulos ao portador e entregues aos recorridos, este facto não é compatível com a não entrega dos títulos referidos nestes autos porque os recorridos teriam dado pela falta dos mesmos na ocasião do recebimento dos títulos ou em dias mais tarde aquando da verificação dos mesmos.
17.- Logo, o Tribunal devia dar por incongruente e insuficiente o relato dos recorridos que parecem querer fazer crer que deram conta da falta dos títulos aquando da conversão daqueles títulos ao portador em nominativos.
18.-Desta manifesta incongruência e outros factos instrumentais descritos acima o Tribunal tinha de concluir como provada a entrega dos títulos ao portador aos recorridos.
19.-A outra formulação do Tribunal a quo consiste na impossibilidade de considerar que os títulos ao portador foram entregues aos recorridos pelo Livro de Registo de Acções, onde consta a menção de que em 05.02.2010 foram inscritos e entregues as acções aos respectivos accionistas,
20.- A inscrição no Livro de Registo de Acções não é o mesmo que um recibo de entrega, no entanto, o senso comum diz-nos que em 2010, numa época em que não havia ainda desagravos entre os accionistas, aquelas inscrições são a reprodução clara e evidente do que aconteceu de facto, isto é a entrega dos títulos ao portador aos recorridos.
21.- A litigiosidade entre os recorridos e a recorrente também serviu de base para a decisão do Tribunal, mas a litigiosidade na família não explica nem prova a não entrega dos títulos, é que o desagravo é relativamente recente e a emissão e entrega dos referidos títulos ocorreu há 10 anos. Pelo que, o Tribunal a quo não podia, também por aqui, concluir como concluiu ao considerar não provada a entrega dos títulos ao portador.
22.- Quanto aos depoimentos contraditórios, o Tribunal a quo parece ter preferido os depoimentos dos recorridos sendo totalmente omisso sobre os critérios que levaram à preferência.
23.- Os depoimentos do representante legal e da testemunha da recorrente foram prestados com base no conhecimento directo dos factos, com coerência, assertividade e espontaneidade, pelo que não se compreende quais foram os critérios ou os fundamentos da credibilidade que o Tribunal a quo usou na ponderação, (vejam-se os depoimentos do NS 01:38 e seguintes e NJ 01:53 e seguintes)
24.- Sendo certo que o Tribunal a quo sob o princípio da livre apreciação da apreciação da prova pode reconhecer a credibilidade num depoimento em detrimento do outro mas está obrigado a expor os juízos de valoração de prova visando a explicitar as razões em que se baseou e se formou a sua convicção.
25.-O Tribunal a quo é completamente omisso, o que toma incompreensível o seu raciocínio valorativo, revelando-se arbitrário na sua análise da prova e dos factos,
26.-Atente-se a forma lacónica como os recorridos relatam a falta da entrega dos títulos ao portador, no caso de JS responde: [00:02:56] JS: Não. claro que não.
27.-E noutra ocasião sobre o mesmo assunto, declara laconicamente:[00:03:02] JS: Não, nunca nos entregaram nenhum título.
28.- Por declarações de parte MB. diz: [00:02:59] MB: Não, nunca, acho que nunca foram feito ou nunca foram entregues. Nunca os vi.
29.- Ambos os recorridos não desenvolvem o assunto o que contraria o padrão de comportamento comum, isto é, o impulso natural dos recorridos seria eles próprios explicarem o enquadramento dos factos, por exemplo que na entrega de vários títulos estes ficaram esquecidos, que a entrega dos vários títulos aconteceu em reunião familiar. A ideia é de que existe sempre um relato proveniente de quem se sente lesado e silêncio de quem não conta a verdade.
30.- O Tribunal através do depoimento de NS ficou a saber que os recorridos vivem juntos e têm filhos comum: [00:02:55] NS: Vivem juntos, têm filhos em comum., o que devia levar o Tribunal a fundamentar de tal modo que seja compreensível como valorizou o depoimento de MB, de modo que se entenda porque sendo o recorrido companheiro da recorrida não afecta a sua credibilidade e porque tendo o mesmo recorrido demonstrado vacilante e desconhecedor dos factos mereceu ainda, assim, preferência do Julgador sobre os
31.- Por tudo o acima exposto não poderia o tribunal a quo incluir, como o fez, no ponto 9 dos factos provados que: “A Ré nunca procedeu à entrega aos Autores dos títulos representativos das acções que lhes pertencem ", vd ponto 9 dos factos provados.
32.- Razão pela qual deve ser excluído tal ponto 9 dos facto provados e ser incluído nos factos não provados uma nova alínea com o seguinte teor: “ A Ré nunca procedeu à entrega aos Autores dos títulos representativos das acções que lhes pertencem ”
33.- A recorrente foi ainda condenada: “a pagar a cada um dos Autores, a título de sanção pecuniária compulsória, ao abrigo do disposto no artigo 829-A, n.01, do Código Civil, } (uma) unidade de conta, por cada dia de atraso no cumprimento do agora determinado. ”
34.- Nos autos não há lugar a aplicação da sanção pecuniária compulsória porquanto o que está em causa é a entrega de coisa certa - a entrega de títulos representativos das acções aos recorridos,
35.- Não está em causa qualquer obrigação para prestação de facto infungível.
36.- Caso assim se não entenda, o que apenas se admite por mera cautela de patrocínio sempre se dirá que o valor atribuído à sanção - uma unidade de conta para cada um dos autores por cada dia de atraso - é manifestamente desproporcionado.
37.- Nos termos do n° 2 do mesmo dispositivo legal a sanção deverá ser fixada “'segundo critérios de razoabilidade”
38.- E uma unidade de conta - 1026 - por cada dia de atraso, tendo em conta que estamos a falar de uma acção no valor de um euro, é manifestamente exagerado, devendo o seu valor ser diminuído.
39.- Pelo que, deve ser revogada a decisão judicial que errou na interpretação e aplicação da lei no seu artigo 829-A do CC.
Normas violadas:
A conclusão vertida naquela sentença fundamenta-se na errada aplicação da lei violando 2.°, 609.°, n.°l, 615.°, n.° 1, al. d) e e) do CPC” [ [1]  ].

Os autores apresentaram contra-alegações, com as seguintes conclusões:
A.- Ao longo da pendência da presente lide a Recorrente tem vindo a alterar a sua versão dos factos: invocando em contestação que a entrega dos títulos aos legítimos titulares se tinha verificado na data da constituição da sociedade;
B.- Mas, posteriormente, já em sede de julgamento e reiterado agora nas suas Alegações de recurso, passou a sustentar que a mencionada entrega havia ocorrido em data posterior;
C.- A Recorrente nunca procedeu, de facto, à entrega aos Recorridos dos títulos das ações de que os mesmos são titulares, motivo pelo qual tão-pouco logrou fazer qualquer prova da referida entrega, como era seu ónus;
D.- A Recorrente apenas enveredou pela via de ir alterando a sua própria versão, pois apercebeu-se que toda a prova produzida ou a produzir demonstraria uma realidade dos factos contrária àquela que a mesma defendeu em sede de contestação;
E.- É com surpresa que os Recorridos veem agora a Recorrente construir uma tese de recurso assente no pressuposto de que os Recorridos deviam ter peticionado a entrega dos títulos "ao portador" da Recorrente;
F.- Títulos esses que, segundo a Recorrente alegou em sede de contestação, a mesma entregou aos Recorridos em 05.02.2010... ;
G.- Os Recorridos têm alguma dificuldade em vislumbrar lisura neste comportamento da Recorrente, que, em sede de contestação defendeu-se invocando que já tinha entregue aos Recorridos os títulos originalmente representativos do seu capital social, mas, agora, em sede de recurso, sustenta que os Recorridos deviam ter peticionado a entrega desses mesmíssimos títulos;
H.- Estas contradições da Recorrente são evidências claras de alguém que falta à verdade e que, tendo sido apanhado na mentira inicial, vê agora necessidade de nova desculpa para continuar a "fuga para a frente";
I.- Lavra a Recorrente em manifesto erro ao sustentar que a Sentença recorrida não poderia ter sido proferida nos termos em que o foi, sem que o Tribunal a quo conhecesse previamente do pedido de entrega aos Recorridos dos títulos das ações ao portador de que os mesmos são titulares;
J.- Pedido esse que não foi formulado pelos Recorridos, nem tinha de o ser;
K.- Primus, a Recorrente reconheceu que o processo de conversão das ações de ao portador para nominativas se encontrava concluído;
L.- Foi a própria Recorrente que submeteu e instruiu o pedido de registo comercial inerente à conversão dos títulos das ações de ao portador para nominativas - Cfr. documentação que instruiu o mencionado pedido de registo que constitui o Documento n.° 6 da Petição Inicial;
M.- Documentação da qual consta a ata das decisões do Administrador Único da Recorrente de proceder: i.) à publicação do anúncio previsto no artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 123/2017, de 25 de setembro; ii.) à inutilização dos títulos das ações ao portador existentes e iii.) à emissão dos novos títulos das cinquenta mil ações nominativas, representativas da totalidade do capital social;
N.- Com efeito, o artigo 6.°, n.° 4, da Lei n.° 123/2017, de 25 de setembro, prevê que, enquanto não tiver operado a conversão dos valores mobiliários ao portador, deverá constar do registo comercial a menção da pendência do processo de conversão;
O.- Sendo que, no caso da Recorrente, o registo da conversão dos títulos das ações ao portador em nominativas foi lavrado como definitivo, de acordo com o teor das próprias decisões do Administrador Único e do pedido de registo comercial apresentado pela própria Recorrente; 
P.- Assim, foi pela Recorrente reconhecido que o processo de conversão dos títulos das ações ao portador em nominativas se encontrava concluído, constituindo o registo por transcrição em definitivo presunção de que a situação jurídica é verdadeira e existe, naqueles precisos termos, ao abrigo do disposto no artigo 11.° do CRComercial;
Q.- Pelo que, face ao exposto, concluiu acertadamente o Tribunal a quo que o pedido prévio de entrega dos títulos ao portador, tal como sustentado pela Recorrente, configuraria um ato inútil;
R.- Ademais, entendeu a douta Sentença que «No caso, como resulta dos factos provados, os Autores encontram-se, efectivamente, inscritos no Livro de Registo de Ações da Ré enquanto seus accionistas, cada um titular de uma acção no respectivo capital social»;
S.- Ou seja, do Livro de Registo de Ações da Recorrente, documento da exclusiva lavra desta, consta a inscrição a favor de cada um dos Recorridos, da titularidade de uma ação no capital social daquela;
T.- Inscrição essa que, conforme provado documentalmente, não foi objeto de qualquer modificação ou alteração;
U.- A que acresce o próprio teor da versão dos estatutos da Recorrente submetida no âmbito do registo comercial da conversão das ações ao portador em nominativas - outro documento da exclusiva lavra da Recorrente -, e que integra o Documento n.° 6 da petição inicial, cujo artigo 4.°, n.° 1, alíneas b) e e) identifica cada um dos Recorridos como titular de uma ação no capital social da Recorrente;
V.- Assim, nenhuma censura ou reparo merece a douta Sentença recorrida, ao ter determinado que, uma vez operada a conversão - facto dado como provado e assente - é ilegítima e injustificada a recusa, pela Recorrente, de proceder à emissão ou entrega aos Recorridos dos títulos representativos das ações nominativas de que os mesmos são titulares no capital social daquela;
W.- Sendo absolutamente desnecessário e inútil, contrariamente ao sustentado pela Recorrente, a emissão ou entrega de títulos ao portador já convertidos em nominativos - o que apenas se pode conceber como mais um subterfúgio da Recorrente para, de forma ilegítima, prosseguir na sua senda de impedir ou postergar no tempo o exercício de direitos sociais aos Recorridos;
X.- Inexiste, assim, ao contrário do sufragado pela Recorrente, qualquer inadequação do pedido, ou qualquer errada interpretação ou aplicação da lei por parte do Tribunal a quo;
Y.- Um dos princípios basilares do Processo Civil é o Princípio do Dispositivo que vem previsto no artigo 5° do CPC segundo o qual, às partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e/ou os factos em que se baseiam as excepções.;
Z.- Ora, o Tribunal a quo definiu como objecto do litígio: apurar do direito dos Autores a que lhe sejam entregues os títulos originais representativos do seu capital social e ao registo dos mesmos a seu favor;
AA.- E, como Temas de Prova foram definidos os seguintes:
Aferir da factualidade alegada na petição inicial quanto à constituição da sociedade e não entrega dos títulos originais das participações sociais dos Autores;
Aferir da factualidade alegada na contestação quanto à constituição da sociedade e entrega dos títulos originais das participações sociais dos Autores;
BB.- Os Recorridos, para prova do que alegaram, juntaram os seguintes documentos:
Documento 1 da Petição Inicial: - Certidão Permanente da Recorrente
Documento 2 da Petição Inicial: - Contrato de Sociedade da Recorrente
Documento 3 da Petição Inicial: - Comunicações endereçadas pelos Recorridos à Recorrente de 13.11.2017
Documento 4 da Petição Inicial: - Anúncio da conversão das ações no capital social da Recorrente do portador para nominativas
Documento 5 da Petição Inicial: - Comunicações endereçadas pelos Recorridos à Recorrente de 11.01.2018
Documento 6 da Petição Inicial: - Documentação que instruiu o registo comercial da conversão das ações no capital social da Recorrente do portador para nominativas
Documento 7 da Petição Inicial: - Comunicação endereçada pela Recorrente aos Recorridos de 31.01.2018 
Documento 8 da Petição Inicial: - Comunicação endereçada pela Recorrida JS à Recorrente de 02.03.2018
Documento 9 da Petição Inicial: - Ata notarial da Assembleia Geral da Recorrente de 27.06.2018
Documento 10 da Petição Inicial: - Comunicações endereçadas pela Recorrente aos Recorridos de 25.07.2018
Documentos 11,12 e 13 da Petição Inicial: - Comprovativos de transferência de € 95.000,00 dos Recorridos para a Recorrente
Documento 14 da Petição Inicial: - Interpelações endereçadas pelos Recorridos à Recorrente para restituição da quantia de € 95.000,00
Documento 15 da Petição Inicial: - Comprovativo da entrega via Citius da Petição Inicial do processo n. ° 3812/18.5T8CSC, a correr termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste - Juízo Central Cível de Cascais - Juiz 4.
CC.- Através destes documentos os Recorridos provaram a factualidade cujo ónus da prova lhes cabia.
DD.- Toda a prova produzida durante a audiência de discussão e julgamento serviu para contradizer as teses de defesa da Recorrente, bem como para reforçar a prova documental relativa aos factos alegados pelos Recorridos;
EE.- Num clima familiar pacífico e de inexistência de conflitos entes os vários acionistas, é naturalmente expectável e resulta da experiência comum, que não lhes fosse exigida a exibição dos títulos representativos das ações ao portador durante as assembleias gerais, para efeitos do exercício dos respetivos direitos sociais, como efetivamente nunca ocorreu, o que foi corroborado pelas anteriores Presidente e Secretária da Mesa da Assembleia Geral da Recorrente, que desta forma desmascararam a falsidade do alegado em sentido contrário pela Recorrente na contestação - cf. depoimento da testemunha CA, registado no ficheiro áudio "20201021150042_4243310_2871298", minuto 03:33:00 e depoimento da testemunha Isabel Osório, anterior Secretária da Mesa da Assembleia Geral da Recorrente, registado no ficheiro áudio "20201021150711_4243310_2871298", minuto 02:58:00; 
FF.-De acordo com os depoimentos duas mencionadas testemunhas - as quais depuseram de forma perentória e credível - até ao surgimento dos desentendimentos entre os acionistas da Recorrente, todas as assembleias gerais tinham caráter informal, nunca tendo sido exibido qualquer título das ações representativas do capital social da Recorrente;
GG.- Foi após o aparecimento dos dissídios entre os acionistas, que a Recorrente, na pessoa do seu acionista maioritário e Administrador Único, passou a agir de forma contrária ao que sempre havia sido feito;
HH.- O Administrador Único da Recorrente e o seu pai, NS, têm vários conflitos pessoais contra os Recorridos, encontrando-se de relações cortadas com eles;
II.- Lamenta-se que nas Alegações de recurso a Recorrente tenha enveredado pelo caminho de tentar deturpar o teor dos depoimentos destas duas pessoas, na ânsia de os tentar compatibilizar;
JJ.- O que o legal representante da Recorrente, NS, afirmou em sede de declarações de parte, foi que os títulos haviam sido impressos/emitidos no escritório no Porto, posteriormente à data da constituição da sociedade, mas nunca mencionando que a sua alegada entrega aos acionistas ocorreu em São João do Estoril;
KK.- Insolitamente, a testemunha NS, pai do legal representante da Recorrente, afirmou que recebeu o seu título em São João do Estoril;
LL.- Até nisso as versões apresentadas não se compatibilizam: se os títulos foram emitidos e impressos no Porto, porque motivo foram entregues - no mesmo dia, segundo a tese inicialmente defendida da Recorrente - em São João do Estoril?;
MM.- Ainda relativamente a este ponto, atente-se ao depoimento prestado em sede de audiência de julgamento pela testemunha AS, registado sob o ficheiro áudio "20201021144639_4243310_2871298", minuto 07:45:00, a qual esclarece que, apenas no final do ano de 2010, foi ela quem preparou os ficheiros e imprimiu o livro de registo das ações da Recorrente e imprimiu os seus títulos iniciais, tendo-os entregado ao administrador único da Recorrente; 
NN.- Como apanágio das regras do ónus da prova (artigo 342° do Código Civil), era à Recorrente que incumbia a prova de que procedeu a entrega aos Recorridos dos títulos representativos das ações de que os mesmos são titulares no seu capital social;
OO.- Prova essa que a Recorrente nunca logrou fazer e que até era bastante fácil de ser feita, caso fosse verdade!;
PP.- A Recorrente não juntou qualquer comprovativo de entrega dos títulos aos Recorridos;
QQ.- Não há qualquer declaração de recebimento ou quitação de recebimento desses títulos por parte dos Recorridos;
RR.- A Recorrente não junta sequer cópia dos títulos que afirma que entregou aos Recorridos;
SS.- A Recorrente arrolou como testemunha a sua 5ª acionista, MM, mas depois dispensou-a antes de ser ouvida em sede de julgamento;
TT.- A Recorrente arrolou como testemunha o seu Fiscal Único, mas depois dispensou-o antes de ser ouvido em sede de julgamento;
UU.- As anteriores Presidente e da Mesa da Assembleia Geral e Secretária da Mesa da Assembleia Geral da Recorrente nunca viram qualquer título representativo do capital social da Recorrente, apesar da Recorrente ter alegado na contestação o inverso, i.e. que a prova da qualidade dos acionistas sempre tinha sido feita em todas as assembleias gerais;
VV.- O depoimento da testemunha AS corrobora a versão dos factos dos Recorridos;
WW.- Já das declarações de parte dos Recorridos, JS e MB, prestadas de modo que se revelou sério e credível, resultou, de forma absolutamente cristalina, pois ambos foram claros e perentórios ao afirmar que nunca receberam qualquer título representativo das ações no capital social da Recorrente;
XX.-Ao contrário, a Recorrente, ao abrigo do ónus de impugnação (cf. artigo 574° do CPC), não demonstrou, de forma cabal, que a versão dos factos por si apresentada - i.e. de que procedeu à entrega aos Recorridos dos títulos das ações de que os mesmos são titulares no respetivo capital social - é a que corresponde à verdade, não tendo sido junto qualquer documento que afastasse o alegado pelos Recorridos ou que permitisse ao Tribunal a quo, concluir de forma diferente daquela que se encontra plasmada na douta Sentença recorrida;
YY.- Por fim, quanto ao bom andamento da douta Sentença sobre a condenação da Recorrente no pagamento da sanção pecuniária compulsória, não se compreende a Recorrente quanto afirma que nos autos não está em causa uma obrigação para prestação de facto infungível, mas sim uma entrega de coisa certa;
ZZ.- As prestações fungíveis são aquelas que podem ser realizadas, quer pelo devedor quer por terceiro, e as infungíveis aquelas que apenas podem ser realizadas pelo devedor e não por terceiro;
AAA.- Sem necessidade de maiores excogitações, só a Recorrente controla a emissão dos valores mobiliários representativos do seu próprio capital social, pelo que só ela pode entregar aos Recorridos os títulos que lhes pertencem representativos desse mesmo capital social;
BBB.- Já quanto à adequação do valor da sanção pecuniária compulsória, também nenhum reparo merece a sentença recorrida, quer porque o valor nominal das ações não corresponde ao seu valor real e, no caso dos Recorridos, os mesmos têm um investimento financeiro realizado na Recorrente muito superior ao valor nominal das ações que lhes pertencem - cf. Pontos 27 a 29 dos Factos Provados - sendo uma unidade de conta um valor processual mínimo de referência que se afigura adequado;
CCC.- Ademais, a sanção pecuniária compulsória é, como o próprio nome indica uma "sanção", um mecanismo de desvalor e censura perante um comportamento inadimplente e não um mecanismo que visa reparar danos pelo incumprimento;
DDD.- A Recorrente pode cumprir voluntariamente a obrigação em que foi condenada sem necessidade de especial esforço, pelo que qualquer eventual incumprimento da sua parte será sempre devido a dolo ou negligência grave e, portanto, merecedor de juízos de desvalor e censura;
EEE.- A Recorrente já deu mostras, quer antes, quer após a prolação da sentença, que faz intenção de continuar a negar aos Recorridos o exercício dos respetivos direitos sociais, sob o pretexto de que estes não têm consigo os títulos que provam a sua qualidade de acionistas”.

Cumpre apreciar.

II.FUNDAMENTOS DE FACTO

O tribunal de primeira instância deu por provada a seguinte factualidade:
1.- A ré é uma sociedade anónima que se dedica à compra e venda de imóveis e revenda dos adquiridos para o mesmo fim, consultadoria e gestão imobiliária; Investimentos imobiliários, promoção imobiliária, gestão, exploração, administração e arrendamento de imóveis e comercialização de equipamentos informáticos.
2.-O capital social da ré é de € 50.000,00 (cinquenta mil Euros) e encontra-se dividido em 50.000 (cinquenta mil ações) no valor nominal, cada uma, de € 1,00 (um euro).
3.-A ré é uma sociedade constituída “na hora”, em 05.02.2010, junto dos serviços de registo comercial da Loja do Cidadão de Odivelas.
4.- São acionistas da ré:
- NS, que detém 49.996 (quarenta e nove mil e novecentas e noventa e seis) ações;
- A primeira autora, titular de 1 (uma) ação;
- O segundo autor, titular de 1 (uma) ação;
- MM, que detém 1 (uma) ação;
- NS, titular de 1 (uma) ação.
5.-NRS é irmão da Autora JS.
6.-NS é pai da autora JS e de NRS.
7.-MM é amiga de NS.
8.-NRS, além de ser o acionista maioritário da ré, é também o seu Administrador Único desde a sua constituição.
9.-A ré nunca procedeu à entrega aos autores dos títulos representativos das ações que lhes pertencem.
10.-Na sequência da entrada em vigor da Lei n.° 15/2017, de 3 de maio, e do Decreto-Lei n.° 123/2017, de 25 de setembro, que operou a obrigatoriedade das ações representativas do capital social das sociedades anónimas serem nominativas, os autores solicitaram à ré, por comunicação de 13.11.2017 e na pessoa do seu administrador, informação sobre os títulos e/ou quais as diligências já praticadas pela ré para efeitos de entrega desses títulos aos autores.
11.-A ré não respondeu a estas missivas.
12.-Em 04.12.2018, a ré publicou anúncio relativo ao início de procedimento para conversão das ações representativas do seu capital, de ao portador, para nominativas.
13.-Motivo pelo qual os autores solicitaram à ré que procedesse ao registo a seu favor das ações de que são titulares.
14.-Mais solicitaram os autores a substituição dos títulos antigos por novos títulos, devendo os títulos antigos ser objeto de inutilização ou destruição - cf. comunicações dos Autores de 11.01.2018.
15.-Em 11.01.2018, a ré procedeu ao registo de alteração dos seus estatutos, modificados na sequência do referido procedimento de conversão de ações.
16.-Estatutos esses datados de 04.11.2017, que identificam as ações representativas do capital da ré como sendo nominativas e a distribuição do seu capital social nos precisos termos que constam no número 4 dos Factos Provados.
17.-Por carta datada de 31.01.2018, a ré respondeu aos autores que a conversão pretendida não poderia operar sem a apresentação, por parte dos autores, dos títulos físicos das ações que lhes pertencem.
18.-A ré sabe que os autores nunca poderão concretizar, porque nunca lhes entregou os títulos originais.
19.-Nessa mesma carta, de 31.08.2018, a ré afirmou que entregou os títulos aos autores em 05.02.2010, de acordo com o registo efetuado no livro de registo de ações da sociedade.
20.-O registo comercial da ré não consta qualquer menção de que a operação de conversão dos valores mobiliários ao portador se encontra ainda pendente.
21.-A 1ª autora, em 02.03.2018, voltou a solicitar que a ré lhe fizesse chegar os títulos representativos das ações de que é titular, bem como cópia, ou reprodução transcrita, dos registos de ações junto da Sociedade que lhe diga pessoalmente respeito (abrangendo os que constam do “antigo” e do “novo” suporte de registo de ações).
22.-A ré não respondeu a esta carta.
23.-Em 27.06.2018 realizou-se uma assembleia geral da ré, cuja ata foi lavrada por Notário.
24.- NRS, administrador da ré, tentou impedir a participação dos autores nessa assembleia geral, sob o argumento o de que os mesmos não se faziam acompanhar dos títulos representativos do capital social da ré.
25.-Antes dessa assembleia, NRS, administrador da ré, já tinha recusado aos autores o envio ou acesso à informação preparatória de assembleia geral, invocando que os autores não exibiam os títulos das ações de que são titulares - cfr. comunicações da ré de 25.07.2018.
26.-Os autores e os acionistas da ré NRS e NS estão presentemente envolvidos num conflito de natureza familiar/pessoal, existindo um clima generalizado de desconfiança entre aqueles e os autores.
27.-Cada um dos autores depositou em conta da ré em 01.03.2010 a quantia de € 47.500,00 (quarenta e sete mil e quinhentos euros, i.e. o valor global de € 95.000,00 (noventa e cinco mil euros).
28.-Os autores têm vindo a interpelar a ré para pagar as quantias que lhe foram emprestadas.
29.-Inclusivamente intentaram ação judicial para cobrança da referida quantia, a qual com o n. ° 3812/18.5T8CSC, corre presentemente termos junto do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste - Juízo Central Cível de Cascais - Juiz 4.
30.-A ré procedeu à conversão dos títulos conforme decisão do administrador único.
31.-A ré cancelou todos os títulos ao Portador, incluindo os que inicialmente foram emitidos a JS e MS, conforme resulta da inscrição da primeira titularidade previsto no livro de registo de ações da Sociedade.
*

O tribunal consignou ainda como segue:
“Factos Não Provados
Não se provou:
- No acto de constituição da sociedade, em 05.02.2010, a Ré entregou os títulos a todos os accionistas, tal como consta do livro de registo de acções.
- Foi o representante legal da Ré que emprestou € 280.000,00 (duzentos e oitenta mil euros) aos aqui Autores e que estes para amortizarem essa dívida acordaram com aquele que iriam proceder a uma injecção de capital de € 95.000,00 na sociedade Autora (sociedade que, pode-se dizer, é praticamente só do representante legal da mesma que dispõe de 99,9% do seu capital social).
- Os Autores, tal como os demais accionistas, sempre fizeram prova da sua condição de accionistas em todas as assembleias gerais que foram realizadas
- Apesar de terem participado na Assembleia Geral de 27.06.2018, só o fizeram porque a presidência da mesa, à data, era controlada pelos Autores.
- A Senhora CA (presidente da mesa nessa data) trabalha há mais de dez anos para a S ou para empresas por ela participadas sendo sua função executar as tarefas administrativas no escritório/sede social.
- São o os Autores que lidam diariamente com a Senhora CA, que lhe dão ordens e instruções, que lhe pagam o ordenado, tudo em representação das sociedades do grupo S.
- A Senhora CA participou a mando dos Autores, e assessorada pelos mesmos advogados dos Autores nessa Assembleia Geral.
*

Não se fez constar do elenco dos factos provados ou não provados, e o demais alegado por ser conclusivo ou matéria de direito ou não ter relevância para o objecto do litígio”.

III.FUNDAMENTOS DE DIREITO

1.Sendo o objeto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pela apelante e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras – arts. 635.º e 639.º do CPC – salientando-se, no entanto, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito – art.º 5.º, nº3 do mesmo diploma.

No caso, ponderando as conclusões de recurso, impõe-se apreciar:
- Da junção de documentos pelos autores/apelados;
- Da nulidade da sentença por omissão de pronúncia (art. 615.º, nº1, alínea d) do CPC);
- Da impugnação do julgamento de facto;
- Da conversão dos títulos mobiliários ao portador em títulos nominativos: o Dec. Lei 123/2017 de 25 de setembro;
- Da fixação da sanção pecuniária compulsória.

2.Com a resposta ao recurso apresentado pela ré, os apelados peticionam a junção de três documentos, fundamentando a junção, em síntese, com a indicação que que os mesmos foram emitidos posteriormente à prolação da sentença recorrida, pelo que está demonstrada a sua superveniência.
No mais, remetem para os arts. 41.° a 45.° da petição inicial, em que “alegaram, sumariamente, que a recusa da Recorrente em entregar-lhes os títulos representativos do seu capital social se enquadra numa estratégia do seu administrador único, também acionista maioritário, em negar aos Recorridos o exercício de direitos sociais”, “precisamente com recurso ao falso argumento de que os Recorridos não apresentam os títulos representativos das ações que lhes pertencem e que por isso não provam ser acionistas da Recorrente” (arts. 6 a 8 das contra-alegações), invocando ainda como segue:
18.-Os Recorridos entendem que a factualidade acima descrita e a respetiva prova agora junta deve ser admitida, quer para demonstração dos comportamentos imputados à Recorrente na petição inicial, repetidos novamente após a prolação da sentença, quer para aferição do bom andamento da decisão recorrida em condenar a Recorrente no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória.
19.-Pois é manifesto que a Recorrente não revela qualquer intenção de cumprir voluntariamente o ordenado na douta Sentença.
20.-Consequentemente, os documentos cuja junção ora se pretende carreiam para os autos elementos novos, que reforçam os verdadeiros intentos da Recorrente em sucessiva e persistentemente, recusar o exercício de direitos sociais por parte dos Recorridos, sob o falso pretexto de que os mesmos não apresentam os títulos das ações de que são titulares.
21.-Documentos esses que, ademais, apenas foram produzidos após a prolação da Sentença de que se recorre, pelo que é manifesta a sua superveniência”.
Analisando os documentos em causa, constata-se que:
- O doc. nº 1 reporta-se a uma convocatória de 11-12-2020 para a realização de uma assembleia geral da ré para o dia 15-01-2021;
- O doc. nº 2 consubstancia duas comunicações eletrónicas datadas de 30-12-2020, dirigidas por cada um dos autores à ré, a propósito dessa assembleia (“Assunto: Pedido de Informações Preparatórias da Assembleia Geral da MN S.A.”);
- O doc. nº3 consubstancia a resposta da ré, datada de 07-01-2021.
Os critérios a que obedece a junção de documentos na fase de recurso estão explanados no art. 651.º do CPC, sendo que, no caso, atenta a data de prolação da sentença recorrida e a data em que os documentos foram emitidos é evidente que estamos perante elementos de prova (objetivamente) supervenientes.
O ponto é que, ponderando a pretensão formulada e a causa de pedir invocada, temos por juridicamente irrelevante apreciar de factos ocorridos posteriormente à apresentação da ação; os documentos apresentados, enquanto meios de prova, no máximo, têm a virtualidade de evidenciar que o conflito entre as partes se mantém atualmente, o que é irrelevante para a decisão do presente litígio, pelo que os documentos não têm interesse para a decisão da causa (cfr. os arts. 423.º, nº1 e 429.º, nº 2 do CPC), sendo impertinentes [ [2] ].
Termos em que não deve ser admitida a pretendida junção.

3.A apelante sustenta que a sentença é nula por omissão de pronúncia que ocorre, nos termos do art. 615º, nº1, alínea d) do C.P.C. quando o juiz “deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar”, tendo por contraponto o excesso de pronúncia.
“Devendo o juiz conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e exceções invocadas e todas as exceções de que oficiosamente lhe cabe conhecer”, constitui nulidade de sentença quer a falta de apreciação, isto é o “o não conhecimento de pedido, causa de pedir ou excepção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão”, quer a apreciação “de causas de pedir não invocadas” quer de exceções não deduzidas e que estejam na exclusiva disponibilidade das partes” [ [3]  ].
Como acontece relativamente a outros vícios suscetíveis de afetar a sentença e que também são cominados com a nulidade, importa no entanto não confundir a omissão/excesso de conhecimento com as hipóteses em que o juiz se limita a expor o seu raciocínio, efetuando um juízo valorativo e considerando determinadas “linhas de fundamentação jurídica” [ [4] ]; está, então, em causa, eventual erro de julgamento e não qualquer vício de natureza formal que inquina a sentença.
No caso, a apelante invoca a “inadequação” do pedido formulado pelos autores, questão “cujo conhecimento é oficioso, o que gera a nulidade da decisão “nos termos do artigo 615.º, nº1, alínea d) do CPC” (cfr. as conclusões 1 a 4).
O raciocínio expresso nas alegações é feito em círculo vicioso [ [5] ] e decorre do mesmo que a apelante se limita a discordar da fundamentação expressa na sentença, na parte em que aí se refere:
“No caso, como resulta dos factos provados, os Autores encontram-se, efectivamente, inscritos no Livro de Registo de Ações da Ré enquanto seus accionistas, cada um titular de uma acção no respectivo capital social.
Tendo ficado demonstrado que os Autores não detêm consigo, nem nunca detiveram, as acções ao portador, é evidente que será para os mesmos impossível proceder à sua entrega para obter a conversão imposta por lei.
Poder-se-ia equacionar a possibilidade de, como mero formalismo imediatamente prévio à conversão, reformar os títulos originais, nos termos do disposto nos artigos 51.°, n.° 6 do CVM e 484.° do Código Comercial.
Tal solução parece-nos inútil, já que, tendo a própria Ré procedido à conversão dos títulos e inutilizado todos os títulos ao portador, incluindo aqueles que são titularidade dos Autores, não faz sentido e configuraria a prática de um acto inútil, porque sem relevo jurídico, que os Autores viessem pedir a emissão e entrega dos títulos ao portador (já cancelados pela Ré e cuja emissão a lei não permite), para, posteriormente, os entregar de novo à Ré, para efeitos da sua conversão em títulos nominativos.
Assim, no caso, revela-se adequado proceder nos termos requeridos pelos Autores”.
Inexiste, pois, o vício apontado.

4.A apelante impugna o julgamento de facto feito pela primeira instância, pretendendo que:
- Se dê como provada matéria que o tribunal deu como não provada: o tribunal deu como não provado que “[n]o acto de constituição da sociedade, em 05.02.2010, a Ré entregou os títulos a todos os accionistas, tal como consta do livro de registo de acções” e a apelante pretende que se dê como provada que ocorreu “a entrega dos títulos ao portador aos recorridos” – cfr. as conclusões 18 e 19.
- Se dê como não provada a factualidade que o tribunal deu como assente, vertida no número 9 dos factos provados, propugnando, pois, pela eliminação dessa matéria – cfr. as conclusões 31 e 32.
Saliente-se que a apelante não faz qualquer alusão à matéria consignada no número 18 dos factos dados por assentes, nunca peticionando a sua exclusão, limitando-se a referir a matéria consignada no número 9.
A apelante deu cumprimento às exigências expressas no art. 640.º do CPC, pelo que se impõe apreciar da impugnação.
A questão de facto que se coloca é a de saber se a sociedade entregou ou não aos autores os títulos ao portador, representativos da participação social destes, não estando em discussão que os autores adquiriram títulos representativos do capital social, aquando da constituição da ré, ato no qual tiveram intervenção (subscrição inicial), não tendo a ré impugnado a factualidade respetiva [ [6] ].
A motivação expressa na sentença, a esse propósito e que a apelante põe em causa, é a seguinte:
“(…) Ora, quanto à entrega das acções ao portador aos Autores no momento de constituição da sociedade Ré, adiante-se, desde já, que nenhuma prova foi feita pela Ré de que tal tenha sucedido, como lhe competia, nos termos do disposto 342°, n.° 2, do CPC, tendo ao invés, sido produzida prova no sentido da não entrega das mesmas aos Autores.
Senão, vejamos.
Como refere a Ré, no requerimento de 14.01.2020, em resposta ao incidente de falsidade, verifica-se da consulta do Livro de Registo de Ações que em 5 de Fevereiro de 2010 a Ré emitiu 50.000 títulos de acções distribuídos entre cinco accionistas nos seguintes termos (vide “Parte II, Primeiras Inscrições”):
a.-NRS foram atribuídos títulos com as ordens de registo 1 a 29, representativos de um total de 46.996 acções da Ré;
b.-JS foi atribuído o título com a ordem de registo 30, representativo de 1 acção da Ré;
c.-MM foi atribuído o título com a ordem de registo 31, representativo de 1 acção da Ré;
d.-NS foi atribuído o título com a ordem de registo 32, representativo de 1 acção da Ré;
e.-MB foi atribuído o título com a ordem de registo 33, representativo de 1 acção da Ré.
Verifica-se, ainda, que os títulos com as ordens de registo 1 a 33 foram cancelados e emitidos novos títulos a 4.11.2017, por forma a dar cumprimento à Lei 25/2017 e ao Decreto- Lei n.° 123/2017.

Alegaram os Autores a falsidade de tal documento, mas como refere a Ré, nos termos da Portaria n.° 290/2000, de 25 de Maio, o registo da emissão poderá ser emitido em suporte informático ou em suporte de papel e, quando o registo seja feito em suporte papel, como é o caso da Ré, determina aquela portaria que o mesmo é composto por um termo de abertura e outro de encerramento, os quais são assinados por quem vincule o emitente e pelo órgão de fiscalização, tendo cada um desses termos data de assinaturas - cfr. artigo 3.° da referida Portaria.

No caso, verifica-se que o livro de registo de acções está assinado pelo administrador único da Ré e pelo representante do Fiscal Único da Sociedade, a sociedade GLda. e rubricado em todas as suas páginas pelo administrador único da Ré e pela sociedade de auditoria internacional GLda.
De acordo com o disposto no artigo 372.° do Código Civil, um documento é considerado falso se “atesta como tendo sido objecto da percepção da autoridade ou oficial público qualquer facto que na realidade se não verificou, ou como tendo sido praticado pela entidade responsável qualquer acto que na realidade não foi ”:
Estando o documento preparado e assinado pela entidade (a Ré e o seu Fiscal Único) a que a lei atribui competência para preparar e emitir o documento, apenas podendo enfermar de falsidade se as assinaturas e rúbricas que constam do mesmo fossem falsas, facto que os Autores não alegaram, nenhum outro facto ou prova tendo sido feita quanto à sua falsidade, pelo que, competindo-lhe fazer tal prova, nos termos do disposto no artigo 445° do CPC, não a fazendo, improcede tal alegação.
Ora, porque tal documento lograva apenas fazer prova da situação accionista da Ré no momento da sua constituição e da mesma ao dia de hoje, conforme o trato sucessivo que resulta desse documento, admitindo-se o mesmo, igualmente se admitirá o que do mesmo consta no que aos Autores concerne.
Do mesmo, o que resulta é que no dia 05.02.2010 foram inscritas ou entregues as acções aos respectivos accionistas.
Tal menção não é suficiente para lograr demonstrar a entrega das acções ao portador e representativas do capital que cada accionista detinha aos mesmos ou, pelo menos, aos Autores, que negam o seu recebimento, quer nesse momento, quer em qualquer outro momento posterior.
É certo que a testemunha AS, contabilista certificada e que foi contabilista da Ré desde a sua constituição e até Julho de 2017, disse ter sido a mesma a fazer, logo no início de constituição da sociedade, o registo das acções, tendo preparado as minutas, que imprimiu e deu a NRS para serem entregues, sendo que NRS (legal representante da Ré) disse em declarações de parte que as acções foram entregues a todos os accionistas, tal como também NS, outro dos accionistas da Ré, disse ter recebido as acções e terem estes sido entregues aos accionistas.
Sucede, no entanto, que quer NRS (enquanto legal representante da Ré), quer NS (pai da Autora) estão em conflito com os Autores, como as diversas acções que correm nos tribunais patenteiam e pelas partes foi admitido nas suas peças processuais e em depoimento e declarações de parte.
Por outro lado, para além das declarações de NRS e N, no sentido da entrega aos Autores das acções, nenhuma outra prova o corrobora ou sustenta.
É que, estamos perante uma sociedade constituída por accionistas todos de mesma família (pai, filhos e irmãos), onde a informalidade nas relações negociais pareceu imperar até determinado momento, visto ter sido referido pelas testemunhas CA, que foi Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Ré até 2018 e IO, que foi Secretária da Mesa da Assembleia Geral da Ré até 2018, que até 2018 as Assembleias Gerais eram informais, nunca reunindo os accionistas entre si para o efeito, nem nunca tendo estas testemunhas presidido ou secretariado, verdadeiramente, tais Assembleias Gerais, isto é, estando nas mesmas presentes, tendo apenas elaborado as respectivas actas e folhas de presenças, que eram assinadas à posteriori.
Tal significa que em momento algum, até à Assembleia Geral da Ré de 2018, tiveram os Autores necessidade de exibir perante a Ré os títulos ao portador demonstrativos da sua titularidade nas acções da mesma, por forma a exercerem os seus direitos, nomeadamente os de participarem das Assembleias Gerais, as quais nunca tiveram lugar.
Ademais, a testemunha AS apenas pôde atestar a emissão dos títulos e a sua entrega a NRS, nada tendo referido, por desconhecer, quanto à sua entrega aos demais accionistas e, repita-se, tal entrega não resulta de forma cristalina do livro de Registo de Acções, pelas razões já expendidas, ou seja, por do mesmo apenas se retirar que estas foram inscritas a favor dos respectivos accionistas podendo, ou não, ter sido entregues, atenta a alternativa que consta do mesmo (data da 1a inscrição de titularidade ou da entrega dos títulos) e a inexistência de qualquer recibo de entrega.
Acrescente-se, ainda, que o facto de os Autores começarem por apenas solicitar à Ré a conversão dos títulos e a sua entrega, só mais tarde e em resposta, alegarem nunca terem recebido os originais das acções ao portador, releva, em nosso entender, que para os mesmos era tão evidente ser facto assente (entre eles e a Ré) nunca terem recebido tais acções, que nem sequer lhes fazia sentido referi-lo aquando do pedido inicial de conversão e entrega das acções. Assim, a invocação posterior da não entrega das acções encontra justificação no facto de terem sido confrontados com a resposta da Ré de que apenas entregaria as acções convertidas em nominais quando recebesse os originais dos títulos ao portador.
Todas estes factos e circunstâncias, conjugados entre si (falta de prova de entrega das acções, relações familiares entre os accionistas e forma informal como era gerida a vida societária), lograram convencer o Tribunal de que as acções ao portador, tituladas pelos Autores, nunca lhes foram entregues.
Os demais factos dados como provados resultam dos documentos juntos aos autos e da sua alegação e confissão pelas partes.
Os factos não provados e que não são consequência lógica de todo o acima exposto e analisado, resultam da ausência de prova quanto aos mesmos.

Vejamos.

Começando pela prova documental, analisando o livro de registos junto com o requerimento de 06-11-2019 verifica-se que, efetivamente, estão aí indicados como titulares sob o “nº da ordem de registo” 30 a primeira autora e 33 o segundo autor, sendo a “Data da 1ª inscrição ou da entrega dos títulos”, para ambos, a data de 5 de fevereiro de 2010, (cfr. a p. 2 do documento), registando-se a utilização da partícula “ou” e não “e”.

Procedeu-se à audição dos depoimentos a que a apelante alude, sendo que não convenceram os depoimentos da testemunha NS, pai da autora, que se limitou a indicar que os títulos “foram entregues a todos os acionistas” numa reunião em São João do Estoril, indicando um conjunto de pessoas a quem foram entregues, sem qualquer outra explicação ou pormenor, sendo que, paralelamente, a testemunha não soube precisar qualquer assembleia da ré, à exceção de uma realizada em 2010 e nem sequer quanto a esta deu qualquer indicação específica; referiu, a instâncias da mandatária da ré, que os autores “vivem juntos, têm filhos em comum”. Saliente-se que só a instâncias do mandatário dos autores é que a testemunha referiu ser pai da autora, indicando que “não há uma boa relação” com os autores, e referindo ao tribunal, então, não ter percebido corretamente a pergunta inicial da Juiz a propósito do relacionamento existente entre as partes. O depoimento da testemunha, aliás, terminou nesse momento, não tendo sido feitas quaisquer outras perguntas à testemunha.

Quanto às declarações prestadas pelo administrador da ré, NRS, igualmente não convenceram: o aludido representante não tinha qualquer recordação sobre os atos alusivos à constituição da sociedade, dos quais não se recordava mas, inquirido pela mandatária da ré sobre se “esses títulos foram entregues a todos os donos, tem recordação disso?”, respondeu apenas “sim, foram”, nada mais acrescentado; inquirido pela mesma mandatária sobre se “tem alguma noção do que poderá ter acontecido para estarem aqui perdidos dois títulos?” respondeu “não faço ideia”.

Quanto aos autores, prestaram declarações, salientando-se:
- Quanto à autora JS, recordava-se da constituição da sociedade, tendo estado presente nesse ato, na loja do cidadão; a autora prestou declarações de forma muito clara, respondendo sem evidenciar qualquer constrangimento às  perguntas que foram feitas pelo mandatário dos autores,  indicando, de forma linear, que nunca lhe foram entregues os títulos, nem na altura da constituição da sociedade nem posteriormente, explicitando ainda os moldes como eram processadas as assembleias gerais, nos termos indicados pelo tribunal – em bom rigor, durante vários anos e até ao momento em que se iniciou o litígio familiar, não eram realizadas assembleias gerais da ré, limitando-se os acionistas a assinar atas de “presença” –, terminando o seu depoimento a indicar que lhe disseram que, para proceder à conversão das ações em nominativas, tinha que entregar os títulos ao portador “que nunca tive”; acrescente-se que, em audiência de julgamento, a mandatária da ré não fez qualquer pergunta à autora, indicando ao tribunal não ter qualquer esclarecimento a pedir.
- Quanto ao autor MB, esteve igualmente presente aquando da constituição da sociedade, indicando que não recebeu qualquer título - “não, eu só assinei e fomos embora, não foi entregado nada” -, nem posteriormente – não podia entregar títulos “que nunca tive”; também quanto ao autor, dada a instância à mandatária da ré, a mesma indicou nada pretender, não solicitando qualquer esclarecimento.

Do confronto entre esses depoimentos, quanto à matéria ora em causa, conclui-se que estamos perante depoimentos contraditórios, sendo que a convicção desta Relação coincide com a do tribunal de primeira instância; ainda que sem a imediação que carateriza a produção de prova pessoal perante a primeira instância, os autores convenceram esta Relação pela linearidade e clareza dos depoimentos, não evidenciando qualquer constrangimento ou desconforto, ao contrário do que aconteceu com o representante legal da ré e o pai da autora, que prestaram um depoimento que, mesmo sem imediação, insiste-se, afigurou-se comprometido. 
Por outro lado, a crítica que a apelante faz às declarações prestadas pelos autores, indicando que se trata de declarações prestadas de “forma lacónica” e que “[a]mbos os recorridos não desenvolvem o assunto” – cfr. as conclusões 26 a 29 –, não têm fundamento, sendo certo que no momento processual oportuno a ré não inquiriu os autores sobre essa matéria, confrontando-os exatamente com a crítica que (só) agora formula.

Saliente-se que nem a testemunha, nem o referido representante legal, deram nota de que alguém que não os autores tenha reivindicado ser o (atual) titular das ações em causa, ou ter-se apresentado com os referidos títulos ao portador, formulando, a esse propósito, qualquer pedido, mormente com vista à conversão dos mesmos em títulos nominativos; aliás, o que os depoimentos aludidos evidenciam é que, como salientou a primeira instância, o relacionamento entre os vários sócios se processou de forma amistosa e informalmente, inclusive a propósito das assembleias realizadas, pelo que fácil é percecionar que, até ao momento em que os familiares entraram em litígio, em 2018, nunca os autores terão sentido a necessidade de apresentação dos títulos ao portador, desvalorizando, consequentemente, a omissão de entrega.

Em suma, não procede a alegação de que o tribunal não indicou as razões pelas quais deu relevância a determinados depoimentos, não valorizando outros, alcançando-se perfeitamente o raciocínio valorativo feito pela Juiz e as máximas da experiência comum que convocou [ [7] ], o que é evidente em face da motivação exposta na decisão e a que se fez referência, no contexto aí indicado, não se justificando repetir o que já corretamente foi enunciado pela primeira instância.

Improcede a impugnação, mantendo-se o julgamento de facto feito pelo tribunal de primeira instância.

5.Alega a apelante, que“o Tribunal a quo fez errada interpretação e aplicação da lei ao considerar como considerou que os recorridos não têm de exibir os títulos ao portador para obterem os títulos nominativos” – cfr. as conclusões 5 a 7.

Trata-se de afirmação que evidencia uma incorreta interpretação da decisão recorrida.

A lei 15/2017 de 3 de maio veio proibir a emissão de valores mobiliários ao portador a partir de 4 de maio de 2017, data da sua entrada em vigor (arts. 1.º, nº1 e 2.º, nº1), prevendo ainda a criação de um regime transitório destinado à conversão (obrigatória) dos valores mobiliários ao portador existentes, em nominativos (art. 3.º) [ [8] ]. Este regime foi instituído pelo Dec. Lei 123/2017 de 25 de setembro, salientando-se os seguintes passos alusivos ao procedimento instituído, tendo por objeto os títulos mobiliários ao portador, não integrados em sistema centralizado, únicos ora em causa:
- A competência para dar início e concretizar o processo de conversão, é da entidade emitente dos títulos ao portador, ou seja, a sociedade e a expensas desta, o que passa, nomeadamente, pela publicação do anúncio tendo em vista a conversão, a apresentação do pedido de inscrição de alterações ao registo comercial e a atualização do registo da emissão (cfr. o art. 3.º do referido Dec. Lei 123/2017);
- O processo de conversão dos títulos mobiliários ao portador fica concluído com a substituição/alteração desses títulos, pela sociedade; a conversão opera pela “substituição dos títulos ou por alteração das menções deles constantes, realizadas pelo emitente”, devendo o emitente promover “a inutilização ou destruição dos títulos antigos” (art. 4.º, nº 1, alínea b) e nº2 do mesmo diploma);
- A sociedade deve ultimar o processo de conversão até 4 de novembro de 2017 (fim do período transitório) [ [9] ].
Decorre do exposto que a substituição/alteração dos títulos, tem como pressuposto que os titulares respetivos ou a entidade que os têm na sua posse [ [10] ], os apresente e entregue, para efeitos de conversão, à respetiva sociedade [ [11] ].
A falta de conversão tem consequências gravosas. Assim, nos termos do art. 2.º, nº2 da Lei 15/2017, de 3 de maio, a não conversão dos valores mobiliários ao portador até ao fim do período transitório determina que fique proibida a transmissão de valores mobiliários ao portador” (alínea a) e seja suspenso o direito a participar em distribuição de resultados associado a valores mobiliários ao portador (alínea b).

E, nos termos do art. 7.º do Decreto-Lei n.º 123/2017, de 25 de setembro:
-Os valores mobiliários ao portador não convertidos em nominativos até ao fim do período transitório apenas conferem legitimidade para a solicitação do registo a favor dos respetivos titulares, devendo ainda, no caso de valores mobiliários ao portador titulados, ser apresentados junto do emitente os respetivos títulos para substituição ou alteração das respetivas menções, de modo a que opere a conversão (nº1);
- O montante correspondente aos dividendos, juros ou quaisquer outros rendimentos cujo pagamento se encontre suspenso é depositado junto de uma única entidade legalmente habilitada para o efeito, em conta aberta em nome do emitente, e será entregue, com base em instruções do emitente, aos titulares os valores mobiliários aquando da respetiva conversão (nº2), sendo que caso esse montante vença juros, os mesmos revertem para o emitente (nº3) e ao saldo dessa conta apenas pode ser deduzido o valor dos custos de manutenção da conta (nº4).

No caso, os autores alegaram que nunca tiveram na sua posse os títulos em causa, que nunca lhes foram entregues pela sociedade (cfr. os arts. 10.º a 12.º da petição inicial). Ora, tendo a sociedade ré sido constituída em 05-02-2010, nos moldes indicados nos números 2 a 8 da factualidade assente, é sobre a sociedade emitente que recai o dever de emissão e entrega dos títulos aos autores, primeiros titulares (art. 304.º, nº3 do CSC e art. 95.º do CVM), competindo-lhe, pois, o ónus de alegação e prova de que deram cumprimento a essa obrigação, e não aos autores o ónus de prova do facto contrário (isto é, pela negativa).

Tendo-se provado que a ré não procedeu à entrega desses títulos – ou seja, tendo-se provado a versão dos autores e não a versão da ré –, não colhe a defesa apresentada pela ré, nada obstando a que esta proceda à conversão dos títulos em causa, ao portador, em nominativos. A conclusão de que “o Tribunal a quo fez errada interpretação e aplicação da lei ao considerar como considerou que os recorridos não têm de exibir os títulos ao portador para obterem os títulos nominativos” (conclusão 7), pelas razões apontadas, não é correta.

6.A pretensão deduzida pelos autores, que peticionaram a fixação de sanção pecuniária compulsória, foi atendida pelo tribunal, como segue:
“Tendo sido pelos mesmos requerida, ainda, a condenação da Ré em sanção pecuniária compulsória, nos termos do disposto no artigo 829°-A, n° 1 , do Código Civil, estando em cauda uma obrigação não fungível, é a mesma aplicável, considerando-se razoável fixar em 1 unidade de conta diária a referida sanção, por cada dia de atraso no cumprimento do ordenado”.
A apelante questiona a aplicação dessa sanção, alegando que “[n]os autos não há lugar a aplicação da sanção pecuniária compulsória porquanto o que está em causa é a entrega de coisa certa - a entrega de títulos representativos das acções aos recorridos” e “[n]ão está em causa qualquer obrigação para prestação de facto infungível” (conclusões 34 e 35).
Não tem razão.
Dispõe o art. 829.º-A, nº1 do Cód. Civil, sob a epígrafe “sanção pecuniária compulsória” que “[n]as obrigações de prestação de facto infungível, positivo ou negativo, salvo nas que exigem especiais qualidades científicas ou artísticas do obrigado, o tribunal deve, a requerimento do credor, condenar o devedor ao pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento ou por cada infração, conforme for mais conveniente às circunstâncias do caso” [ [12] ].
A prestação deve qualificar-se como fungível quando pode ser realizada por qualquer pessoa para além do devedor, podendo a infungibilidade resultar da natureza da prestação ou ser convencionada entre os contraentes (art. 767.º, nº2 do Cód. Civil), critério este que se aplica quer à prestação de coisa, quer à prestação de facto. “O critério exposto aplica-se mesmo às prestações de coisas, se bem que estas, de ordinário, tenham natureza fungível. Ao credor apenas importa normalmente a entrega da coisa e não a pessoa que a efectue. A coisa em si, objecto da prestação, é que se apresentará fungível ou não fungível, consoante possa ou não ser substituída por outra (art. 207.º) [ [13] ].
Ponderando o juízo condenatório proferido, a saber, a condenação da ré a “entregar a cada um dos Autores o título representativo das acções de que cada um deles é titular no capital social da Ré (cada um deles uma acção nominativa, com valor nominal de € 1,00) bem como a proceder ao registo desses títulos a favor dos Autores, junto do Livro de Registo de Acções da sociedade, caso ainda não o tenha feito”, conclui-se, com linearidade, que se trata de prestação que só a sociedade ré pode realizar pelo que tem natureza infungível.
Em segunda linha, a apelante questiona o valor da sanção, alegando que “o valor atribuído à sanção - uma unidade de conta para cada um dos autores por cada dia de atraso - é manifestamente desproporcionado” e que “uma unidade de conta - 1026 - por cada dia de atraso, tendo em conta que estamos a falar de uma acção no valor de um euro, é manifestamente exagerado, devendo o seu valor ser diminuído” (conclusões 36 e 38).
Nos termos do nº 2 do referido artigo, a sanção pecuniária compulsória “será fixada segundo critérios de razoabilidade, sem prejuízo da indemnização a que houver lugar”. O paralelismo feito pela apelante não tem razão de ser, afigurando-se-nos equilibrada a medida fixada, atendendo a que o litígio entre as partes se arrasta desde 2018, colocando em causa o pleno exercício de direitos sociais por parte dos autores, como resulta do que supra se expôs, justificando-se a fixação de um valor que seja suficientemente dissuasor do incumprimento, sob pena de se comprometer a eficácia da sanção.
Improcedem as conclusões de recurso.

7.Nos termos do artigo 607.º, nº6 do CPC “[n]o final da sentença, deve o juiz condenar os responsáveis pelas custas processuais, indicando a proporção da respetiva responsabilidade”, regra que se aplica ao acórdão proferido em sede de recurso de apelação, por força do disposto no art. 663.º, nº2 do mesmo diploma.

A regra geral em matéria de custas, quanto à delimitação da entidade responsável pelo seu pagamento, mostra-se vertida no art. 527.º do CPC que dispõe que a “decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito” – nº1; nos termos do nº 2 do mesmo preceito, “[e]ntende-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for”.

No caso, a apelante não logrou obter vencimento no recurso, pelo que é responsável pelo pagamento das custas respetivas.

Os autores são, no entanto, responsáveis pelo pagamento das custas do incidente que, sem fundamento, apresentaram e alusivo à pretendida junção de documentos, devendo fixar-se a taxa de justiça devida em 1 (uma) UC, valor que se afigura equilibrado uma vez que a questão a apreciar reveste simplicidade (art. 7.º, nº4 do Regulamento das Custas Processuais e tabela II).
*

Pelo exposto, decide-se:
1.-Indeferir a junção de documentos pelos apelados;
Custas do incidente deduzido pelos apelados, fixando-se a taxa de justiça devida em 1(uma) Unidade de Conta.
2.-Julgar improcedente a apelação interposta pela ré, mantendo-se a sentença recorrida.
Custas do recurso pela apelante.
Notifique.



Lisboa, 25-05-2021


Isabel Fonseca (relatora)
Maria Adelaide Domingos
Fátima Reis Silva


[1]Assinalou-se a 30ª conclusão nos precisos termos em que foi formulada. 
[2]Acrescente-se que, ponderando a factualidade dada por assente e a circunstância de se manter o presente processo, se tem por evidente que se mantém o conflito entre as partes. 
[3]Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, 2017,Código de Processo Civil Anotado, vol. 2º,  Coimbra: Almedina, p.737.
[4]Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, obr. e loc. citados.
[5]Lê-se nas alegações de recurso:
“Os recorridos ao pedirem a entrega dos títulos nominativos olvidam a necessidade de. um pedido prévio, o pressuposto para a entrega dos títulos nominativos, isto é o pressuposto para a procedência do pedido da entrega dos títulos nominativos depende, da emissão dos títulos ao portador, da entrega aos recorridos, e para serem convertidos em títulos nominativos, nos termos do DL.123/2017 de 25 de Setembro, têm de ser entregues ao emitente.
Logo, o Julgador não podia considerar procedente o pedido formulado pelos Recorridos porque a falta de decisão judicial sobre se ocorreu ou não a entrega dos títulos ao portador aos recorridos impede o conhecimento do pedido formulado nos autos, a da entrega dos títulos nominativo aos recorridos.
O pedido da entrega dos títulos nominativos per si é inadequada e insuficiente porque não tem a virtualidade de ser autónomo do pedido de reconhecimento da não entrega dos títulos ao portador e a conversão.
De modo que, sem que o pedido prévio, que poderia consistir na entrega dos títulos ao portador ou no pedido de reconhecimento de que os mesmos estão na posse da recorrente, com pedido ou não da conversão, o pedido de entrega dos títulos nominativos, por natureza não pode proceder por si só. (Da mesma forma que um pedido de despejo tem de ser precedido do pedido de resolução do contrato de arrendamento)
Pelo que, o Tribunal a quo não poderia concluir pela procedência da acção só com base no pedido da entrega de títulos nominativos sem conhecer o pedido da entrega do título ao portador e a sua conversão cujo pedido não foi formulado pelos recorridos.
Ao não ter, o Tribunal a quo, se pronunciado sobre esta inadequação do pedido cujo conhecimento é oficioso, e julgar totalmente improcedente a acção, a decisão é nula nos termos do artigo 615.°, n.°l, alínea d), do CPC”.
[6]Com a celebração do contrato de sociedade os autores adquiriram a qualidade originária de sócios – art. 274.º do Cód. das Sociedades Comerciais (CSC).
[7]Como se referiu no acórdão do STJ de 14-03-2007, afirmação que mantém atualidade pese embora proferida noutro contexto e no âmbito do processo penal, “a credibilidade em concreto de cada meio de prova tem subjacente a aplicação de máximas da experiência comum que enformam a opção do julgador. A sua aplicação está, sem dúvida, fora de qualquer controle, mas a legalidade daquela regra da experiência, como norma geral e abstracta, poderá eventualmente ser questionada caso careça de razoabilidade. Assim, a determinação da credibilidade está condicionada pela aplicação de regras da experiência que têm de ser válidas e legítimas dentro de um determinado contexto histórico e jurídico” (Processo nº 07P21, Relator: Santos Cabral, acessível in www.dgsi.pt)
[8]Dando nova redação aos arts. 272.º, alínea d) e 299.º do CSC e introduzindo alterações ao CVM. Deixou, pois, de existir a possibilidade de opção entre ações nominativas e ao portador sendo que, quanto a estas, uma das vantagens apontadas era o anonimato; a alteração de regime é uma das medidas destinadas ao combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo, no âmbito da Diretiva (UE) 2015/849 do Parlamento Europeu e do Conselho de 20 de maio de 2015 (cfr., nomeadamente, os considerandos (3) e (4) e os arts. 1.º e 30.º), depois alterada pela Diretiva (UE) 2018/843 do Parlamento Europeu e do Conselho de 30 de maio de 2018; a Assembleia da República, pela Resolução n.º 118/2016, DR n.º 121/2016, Série I de 2016-06-27, recomendou ao Governo a adoção de medidas para troca automática de informações fiscais e prevenção do branqueamento de capitais no quadro da transposição de diretivas comunitárias, nomeadamente pela transposição, até 31 de dezembro de 2016, daquela Diretiva (UE) 2015/849.
[9]O Dec. Lei 15/2017 de 3 de maio entrou em vigor no dia 4 de maio (art. 7.º), dispondo o seu art. 2º, nº2, que os “valores mobiliários ao portador são convertidos em nominativos no prazo de seis meses após a entrada em vigor da presente lei”; nos termos do art. 3.º o Governo tinha que proceder à regulamentação respetiva no “prazo de 120 dias a contar da entrada em vigor da presente lei”.
[10]Pode acontecer que o titular das ações ao portador não tenha o título na sua posse como acontece nos casos em que os títulos estão com um depositário, por exemplo, um credor pignoratício ou o depositário judicial na sequência de apreensão; nesses casos, a apresentação dos títulos deve ser feita pelo depositário.
[11]A conversão pode não acontecer em simultâneo uma vez que ocorre em função da disponibilização dos títulos.  
[12]É hoje pacífica a distinção entre a sanção pecuniária compulsória judicial, prevista no número 1 do art. 829ºA do Cód. Civil e a sanção pecuniária compulsória legal, a que alude o nº4, tendo campos de aplicação e funcionamento distintos.
[13]Almeida Costa, 2008, Direito das Obrigações. Coimbra: Almedina, p. 697.