TRANSMISSÃO EMPRESA OU ESTABELECIMENTO
UNIDADE ECONÓMICA
SERVIÇOS DE VIGILÂNCIA
ADJUDICAÇÃO A OUTRA EMPRESA
Sumário

I - Para se verificar a transmissão de uma empresa ou estabelecimento e, consequentemente, ter aplicação o regime jurídico previsto no artigo 285.º, do Código do Trabalho de 2009, quanto aos seus efeitos, importa verificar se a transmissão operada tem por objeto uma unidade económica, organizada de modo estável, que mantenha a sua identidade e seja dotada de autonomia, com vista à prossecução de uma atividade económica, ou individualizada, na empresa transmissária.
II - Não ocorre uma situação de transmissão de estabelecimento quando uma empresa deixa de prestar serviços de vigilância e segurança junto de determinado cliente, na sequência de adjudicação, por este, de tais serviços de vigilância a outra empresa, sem que se tivesse verificado a assunção de qualquer trabalhador da anterior empresa e tão pouco qualquer transferência de bens ou equipamentos de prossecução da atividade suscetível de consubstanciar uma “unidade económica” do estabelecimento.
III - Em face do referido em I e II, constitui despedimento a comunicação endereçada pela empregadora a cada um dos seus trabalhadores, que, na sequência da adjudicação da prestação de serviços de vigilância privada a outra empresa, os informa que o respetivo contrato de trabalho é automaticamente transmitido para a entidade que lhe irá suceder na referida prestação de serviços.

Texto Integral

Apelação 4094/19.7T8PRT.P1
Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho do Porto
Autores: B…
C…
Rés: D…, S.A.
E…, S.A.
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Relator: Nélson Fernandes
1.ªAdjunta: Des. Teresa Sá Lopes
2.ºAdjunto: Des. António Luís Carvalhão

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

I - Relatório
1. B… e C… intentaram ação declarativa com processo comum, emergente de contrato de trabalho, contra D…, S.A., e E…, S.A.
Formulam a final o pedido de condenação da Ré D…: a) a reconhecer que foi transmitida para si, com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2019, a posição de entidade empregadora no contrato individual de trabalho de cada um dos Autores celebrado com a Ré E… e, por isso, a obrigação de respeitar todos os direitos decorrentes desses contratos, incluindo os de antiguidade e demais condições de trabalho; b) a reintegrar os Autores ao seu serviço, no local de trabalho da F…, atribuindo-lhes as funções correspondentes às suas categorias profissionais de vigilante, nos horários que praticavam; c) a pagar a cada um dos Autores € 906,76 da retribuição correspondente ao mês de janeiro p.p.; d) a pagar a cada um dos Autores as respetivas retribuições que se vencerem, como se estivessem no normal exercício de funções, desde 1 de janeiro de 2019 até à reintegração; e) a pagar a cada um dos Autores a compensação de € 15.000, a título de danos morais; f) a pagar a cada um dos Autores os juros moratórios, à taxa legal de 4%, contados desde o vencimento de cada prestação pedida em c) e d) e desde a citação quanto ao pedido em e);
Sem prescindir, subsidiariamente, pedem a condenação da Ré E… nos mesmos pedidos, no caso de absolvição da Ré D….
Alegam os Autores, em síntese, que, tendo sido admitidos pela Ré E…, respetivamente, a 9 de agosto de 2004 e 8 de agosto de 2006, para exerceram as funções de vigilantes, funções que, respetivamente, desde 1 de janeiro de 2009 e 1 de março de 2015 passaram a exercer no cliente F…, sita na Rua …, com data de 26 de dezembro de 2018, comunicou-lhes essa Ré que se ia verificar a transmissão do estabelecimento, correspondente ao cliente onde prestavam a sua atividade, para a Ré D…, que passaria a ser a sua nova entidade empregadora. Porém, dizem, tendo os Autores comparecido no local de trabalho a 1 de janeiro de 2019, a Ré D…. não os deixou exercer as suas funções, nunca mais lhes dando trabalho, alegando que os contratos de trabalho não lhe foram transmitidos, sendo que também a Ré E… não mais lhes deu trabalho, o que lhes acarretou prejuízos.

1.1Realizada a audiência de partes e porque não foi possível obter o acordo entre as mesmas, foram as Rés notificadas para contestarem.
Na sua contestação veio a Ré D… alegar que a partir de 1 de janeiro de 2019, foi a própria, através dos seus próprios trabalhadores, que passou a assumir a segurança e vigilância da F…, sita na Rua …, sendo que, diz ainda, não foi previamente comunicada, como se impõe, a admissão dos trabalhadores à PSP nem estes procederam à entrega na entidade titular de alvará para o exercício da atividade de segurança privada, cópia de cartão profissional e certificado de registo criminal, mais acrescentando que os Autores não são nem nunca foram seus trabalhadores, uma vez que também não se verificou a transmissão de estabelecimento da E… para a D….
Por sua vez, na contestação, veio a Ré E… alegar que a petição inicial é inepta quanto aos danos de natureza não patrimonial invocados, porquanto os Autores não aduzem quaisquer factos respeitantes aos supostos danos sofridos. Alega ainda de seguida que em consequência da adjudicação a D… assumiu em janeiro de 2019 a posição de empregadora dos vigilantes que até 31 de dezembro de 2018 trabalharam sob as suas ordens e direção no âmbito do contrato de prestação de serviços que esta celebrara com a G…, uma vez que os serviços prestados mantiveram, na sua essência, as mesmas características em relação àqueles.

1.2Responderam os Autores quanto à matéria de exceção invocada pela Ré E…, pugnando pela respetiva improcedência.

1.3Fixado globalmente o valor da ação em €31.812,52 (valor esse correspondente à soma dos pedidos liquidados por cada um dos Autores, assim de €15.906,76), foi depois proferido despacho saneador tabelar, no qual se declarou improcedente a exceção da ineptidão invocada, após o que foram indicados o objeto do litígio e os temas de prova.

2.Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi então proferida sentença, de cujo dispositivo consta:
“Nestes termos julgo parcialmente procedente por provada a ação instaurada por B… e C… contra a D…, SA, e, consequentemente vai a mesma condenada a:
a) a reconhecer que foi transmitida para si, com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2019, a posição de entidade empregadora no contrato individual de trabalho de cada um dos Autores celebrado com a Ré E… e, por isso, a obrigação de respeitar todos os direitos de decorrentes desses contratos, incluindo os de antiguidade e demais condições de trabalho;
b) a reintegrar os Autores ao seu serviço, no local de trabalho da F…, atribuindo-lhes as funções correspondentes às suas categorias profissionais de vigilante, nos horários que praticavam;
c)a pagar a cada um dos Autores € 906,76 da retribuição correspondente ao mês de janeiro de 2019 e as posteriores retribuições que se venceram, como se estivessem no normal exercício de funções até à reintegração;
Sobre as quantias atrás referidas vencem-se juros moratórios, à taxa legal de 4%, contados desde o vencimento de cada prestação pedida.
No demais, vai a Ré D… absolvida do pedido.
Absolvo do pedido a Ré E…, SA.
Custas por Autores e Ré D…, na proporção do decaimento.
Registe e notifique.”

2.1Inconformada com o assim decidido apelou a Ré D….
Apresentou no final das suas alegações as seguintes conclusões:
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2.1.1 Contra-alegaram os Autores, apresentando as seguintes conclusões:
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2.1.2 Também a Ré E… contra-alegou, formulando as seguintes conclusões:
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2.2 O recurso foi admitido em 1.ª instância como apelação, com subida imediata, nos próprios autos e, após prestação de caução, com efeito suspensivo.

3.Subidos os autos a este Tribunal da Relação do Porto, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, no parecer que elaborou, pronunciou-se no sentido do não provimento do recurso.

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Cumpridas as formalidades legais, cumpre decidir:

II- Questões a resolver
Sendo pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso (artigos 635.º, n.º 4, e 639., n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil (CPC) – aplicável “ex vi” do artigo 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho (CPT) –, integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, são as seguintes as únicas questões a decidir: (1) recurso sobre a matéria de facto; (2) dizendo de direito: (2.1) saber se correu transmissão de estabelecimento e por decorrência da posição de empregador; (2.2) saber se ocorreu o despedimento dos Autores.
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III – Fundamentação
A) De facto
1. O Tribunal recorrido considerou como factualidade provada o seguinte:
“1.Os Autores têm a categoria profissional de vigilante.
2.As Rés dedicam-se à atividade de prestação de serviços de segurança privada.
3.As Rés pagam atualmente o salário base mensal de € 694,39 a cada vigilante ao seu serviço, acrescendo o subsídio de alimentação de € 6,00 por cada dia de trabalho efetivo.
4.Quando é praticado horário em período noturno, entre as 20h de um dia e as 7h do dia seguinte, acresce ainda 25% sobre o valor hora.
5.A Ré E… admitiu o Autor B… a 9 de agosto de 2004 e o Autor C… a 8 de agosto de 2006, para as funções de vigilante, e manteve-os a trabalhar, nos seus quadros de pessoal, sob sua autoridade e direção, até ao fim do ano de 2018.
6.Colocou o Autor B…, em 1 de janeiro de 2009, e o Autor C…, em 1 de março de 2015, a desempenhar as funções nas instalações do Cliente F…, situadas na Rua ….
7.Os Autores, juntamente com outros dois, cumpriam aí o horário normal de 40 horas por semana, no regime de turnos rotativos, das 00h00 às 08h00, das 8h00 às 16h00 e das 16h00 às 24h00.
8.Com data de 26 de dezembro de 2018, a Ré E… notificou por escrito cada um dos Autores de que se ia verificar “a transmissão do estabelecimento correspondente ao Cliente F…” e que a Ré D… passava a ser “a nova Entidade Empregadora” deles, tudo nos termos constantes dos documentos juntos aos autos a fls. 75 vº e 76, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
9.No dia 1 de janeiro de 2019, os Autores compareceram nas instalações da F…, mas a Ré D… não os deixou exercer a funções.
10.Os Autores repetiram nos dias seguintes a apresentação nos seus locais de trabalho, mas a Ré D… continuou a recusa, nunca lhes dando trabalho.
11.No dia 10 de janeiro de 2019, foi realizada uma reunião na Direção de Serviços para as Relações Profissionais nas Regiões Norte e Centro (DSRPRNC) da Direção Geral de Emprego e Relações de Trabalho (DGERT), para a qual foram convocadas ambas as Rés e o STAD, sindicato em que os Autores se encontram filiados.
12.Nessa reunião, a Ré E… manteve o seu entendimento de ter existido transmissão para a Ré D…, com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2019, do estabelecimento ou unidade económica correspondente ao “Cliente F….
13.O Sindicato dos Autores, o STAD, também defendeu a mesma posição em relação aos Autores, referindo que “estes têm direito a manter o seu posto de trabalho, independentemente da mudança das empresas que assumam os serviços (à qual são alheios), mantendo todos os direitos e regalias laborais, nomeadamente o vínculo da atividade, a antiguidade e a remuneração”.
14.A Ré D… declarou que não aceitava os trabalhadores, por não ter havido transmissão para si da posição de empregador nos respetivos contratos de trabalho.
15.Com data de 10 de janeiro de 2019, os Autores, juntamente com outros trabalhadores ligados a outro local de trabalho, escreveram e enviaram, sob registo do correio, à Ré D… a carta, junta aos autos a fls. 13 vº e 14, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
16.Com data de 10 de janeiro de 2019, os Autores dirigiram à Ré E… a carta, junta aos autos a fls. 15, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
17.Nenhuma das Rés deu trabalho aos Autores desde 1 de janeiro de 2019.
18.As Rés também não pagaram aos Autores o salário do mês de janeiro de 2019, nem qualquer outra retribuição ou compensação.
19.Os Autores mantiveram e mantêm total disponibilidade para prestarem o seu trabalho a qualquer das Rés.
20.No local de trabalho do “Cliente F…”, os Autores desempenhavam nomeadamente as tarefas:
a.de visionar o sistema de vigilância, designado “CCTV”, composto por 32 câmaras, distribuídas por três monitores, equipamentos que pertencem ao cliente F…;
b.de registar diariamente qualquer anomalia detetada, movimentos estranhos, intrusões ou danificações, o que tinham de reportar ao responsável de segurança do Cliente F…;
c.de controlar os acessos de pessoas na entrada e de viaturas nos parqueamentos, o que igualmente reportavam ao Cliente F…;
d.de atender os telefones fixos do Cliente F…;
e.de atender também um telefone móvel do Cliente F…;
f.de reencaminhar chamadas para pessoas ou serviços do Cliente F…;
g.de prestar informações sobre a F…;
h.de prestar atenção aos detetores de incêndios, que pertencem à Cliente F…, e, no caso deles emitirem sinal sonoro, deslocarem-se ao local para tomarem as providências adequadas, fosse a de recorrer aos extintores, que também pertencem á Cliente F…, fosse a promoção de outra diligência adequada;
i.de efetuarem rondas pelas instalações, verificando as portas, janelas, torneias e instalações sanitárias, luzes…, registando e reportando sempre as anomalias encontradas ao Cliente F….
21.Para o exercício das funções estáticas, os Autores dispunham dum espaço físico, dum balcão e duma cadeira, pertencentes ao Cliente F….
22.Para o exercício da totalidade das tarefas executadas, os Autores não utilizavam quaisquer instalações ou mobiliário pertencentes à Ré E….
23.As Rés recusarem até a passagem da declaração da situação de desemprego (modelo 5044) para poderem requerer o subsídio de desemprego.
24.Os Autores estão filiados no Sindicato dos Trabalhadores dos Serviços de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domésticos e Profissões Similares e Atividades Diversas (STAD), de são os sócios ….. (o B…) e ….. (o C…).
25.A partir do dia 1 de janeiro de 2019 foi a Ré D… quem assumiu a segurança e vigilância da F…, com os seus próprios trabalhadores.
26.A Ré D… não comunicou a admissão dos Autores, com antecedência não inferior a 24 horas relativamente à data de início, à Polícia de Segurança Pública,
27.Os Autores não possuíam, qualquer uniforme da Ré D… para desempenhar as funções de vigilante.
28.A 2 de janeiro de 2019 a D… remeteu à Ré E… a carta junta aos autos a fls. 40, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
29.A 14 de janeiro de 2019 a D… remeteu aos Autores as cartas juntas aos autos a fls. 41 e 42 cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
30.No desempenho das suas funções os Autores utilizavam lanternas e telemóvel e tinham um sistema de rondas instalado pertença da Ré E….
31.Equipamento retirado pela Ré E… aquando da cessação da prestação de serviços nas instalações da F….
32.Na data em que cessou a sua prestação de serviços na F…, a Ré E… retirou o seguinte equipamento que servia de apoio às funções dos Autores: um telemóvel e respectivo carregador, bem como procedeu ao levantamento do sistema de rondas instalado na F….
33.Nenhuma peça de uniforme/fardamento foi cedida pela Ré E… à Ré D….
34.O procedimento de contração pública para a aquisição de serviços de vigilância e segurança humana para a F… foi aberto ao abrigo do Acordo Quadro da ESPAP de Vigilância e Segurança – Lote 2 – Serviços de vigilância e segurança humana na Região Norte (AQ-VS/VIGILÂNCIA E SEGURANÇA -2014), nos termos constantes do documento junto aos autos a fls. 43 a 57, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
35.A Ré E… abandonou as instalações no dia 31 de dezembro de 2018.
36.Para o desempenho das tarefas de vigilância e segurança a Ré D… afetou à prestação de serviços na F…:
a)4 (quatro) trabalhadores com a categoria de vigilante, que integravam os seus quadros, para realização das tarefas de vigilância e segurança;
b)1 (um) trabalhador com a categoria de supervisor, que integrava os seus quadros, para realização de visitas de supervisão;
c)1 (uma) viatura automóvel, distribuída ao supervisor, para realização das visitas à F…;
d)o fardamento;
e)1 (um) sistema de rondas, o qual incluí registadores e chaves de picagem;
f)2 (duas) lanternas recarregáveis para apoio às tarefas de vigilância e segurança;
g)diverso material de escritório (canetas, capas para folhas, impressos)
37.Para o desempenho das tarefas de vigilância e segurança e cumprimento das obrigações previstas nas peças do procedimento, em termos organizativos, a Ré D… teve ainda que:
a)efetuar um reconhecimento prévio às instalações da F… e instruir os seus colaboradores relativamente às particularidades do serviço.
38.A Ré D… presta serviço de vigilância e segurança que compreende um horário das 00h00 às 24h00, em todos os dias do ano,
39.Serviço assegurado por 4 (quatro) trabalhadores com a categoria de vigilante, em regime de turnos rotativos.
40.Nas instalações da F… não existe em permanência qualquer graduado (superior hierárquico) dos trabalhadores ali adstrito.
41.A realização das tarefas dos quatro vigilantes é determinada pelos graduados nas visitas que efetuam ao local de trabalho.
42.A substituição de trabalhadores por motivo de falta é efetuada pelos graduados e restante estrutura organizativa da Ré D….
43.A Ré D… comunicou a cada um dos Autores, em 17 de janeiro de 2019 que se deveriam dirigir à Ré E… para emissão do modelo 5044 da Segurança Social, nos termos constantes do documento junto aos autos a fls. 58 e 59, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
44.A Ré E… é uma empresa de segurança privada cujo objeto societário exclusivo é a prestação de serviços de segurança privada, nomeadamente a vigilância humana e eletrónica.
45.No âmbito dessa atividade, a Ré E… garante a vigilância e segurança de pessoas e bens em locais de acesso ao público; de acesso vedado ou condicionado ao público; vigiando a entrada, a presença e a saída de pessoas e bens nesse local de trabalho.
46.Serviços que assegura aos seus clientes, quer entidades/sociedades privadas quer entes públicos, em vário locais do território nacional, garantindo a segurança de instalações.
47.A Ré E… assegurou à G… serviços de vigilância e segurança que assentaram na disponibilização de uma equipa autónoma de vigilantes, nos exatos termos acordados no caderno de encargo.
48.A Ré E… prestou serviços de vigilância e segurança ininterruptamente nas instalações da G…, nomeadamente nas instalações da F… e H….
49.Era nas mencionadas instalações da F… que os Autores prestavam as suas funções.
50.O serviço de vigilância e segurança prestado pela Ré E… à G…, ao longo do sucessivo ano e até ao termo da sua vigência, em 31 de dezembro de 2018, manteve as mesmas caraterísticas.
51.Os Autores prestavam consecutivamente serviço nas instalações da G…, ao serviço da Ré E… desde praticamente o início da prestação de serviço até ao seu termo.
52.A Ré E…, ao longo do tempo de vigência contratual, foi mantendo um número constante e similar de trabalhadores afeto à prestação do serviço de segurança nas instalações da G….
53.A Ré E… prestou o serviço de segurança e vigilância nas instalações da G… – F… recorrendo a uma equipa estável, fixa, organizada e especializada de trabalhadores na prestação de tais serviços.
54.Ao longo do referido período de prestação dos serviços de vigilância, os trabalhadores da Ré E… desenvolveram a sua atividade naquelas instalações através de uma equipa organizada, com uma estrutura hierárquica devidamente fixada, a qual obedecia, cumpria e fazia cumprir procedimento de segurança e operacionalidade, e com recurso a bens e equipamento destinado a controlar o acesso, permanência e saída das instalações de pessoas e bens, para dar resposta às especificidades e rotinas de segurança exigidas pela G….
55.O serviço de segurança e vigilância prestado pela Ré E… à G… foi integralmente assumido pela Ré D… no dia 1 de janeiro de 2019. 56.Em 1 de janeiro de 2019, a Ré D… manteve os mesmos recursos humanos – quatro vigilantes, os mesmos recursos logísticos.
57.Assumindo a exploração e utilização do equipamento, bens e dispositivos existentes no local afeto ao desempenho do serviço contratado pela G….
58.Recursos esses que foram utilizados pela Ré E… na prestação de serviço até à data da transmissão, isto é, até ao dia 31 de dezembro de 2018.
59.Foi adjudicada à Ré D… a prestação de serviço de segurança privada no espaço, locais e instalações da G…, F… e H….
60.Serviço que se iniciaram em 1 de janeiro de 2019.
61.Para a prestação dos serviços de vigilância que lhe foram adjudicados Ré D… teve de alocar o mesmo número de vigilantes (4) e meios afetos à prestação do serviço assegurado à G… – F….
62.O local da prestação da atividade pela Ré D… é o mesmo onde prestava a atividade a Ré E… e os Autores.
63.O equipamento destinado a controlar o acesso, permanência e saída das instalações de pessoas e bens, afeto o exercício da atividade de segurança das instalações usado pela Ré D… é similar ao usado pela Ré E….
64.A partir de 1 de janeiro de 2019, os vigilantes passaram a estar fardados com o modelo e insígnias da Ré «D…».
65.Durante o ano de 2018 a Ré E… passou a prestar serviços de segurança e vigilância humana e eletrónica nas instalações da F…, cabendo-lhe:
a.controlo de acessos e pessoas e viaturas;
b.atendimento telefónico;
c.fiscalização de entrada e saída de bagagens e/ou embrulhos transportados por pessoas e/ou viaturas;
d.operação e controlo do sistema de videovigilância [monitorização];
e.monitorização dos acessos, sistema de deteção de intrusão e deteção de incêndios;
f.guarda de valores e demais objetos que pelo seu valor económico e patrimonial requeiram proteção, nomeadamente espólio museu;
g. adoção de medidas rápidas em situações de inundações;
h.vigilância interna dos arruamentos da F…;
i.efetuar giros permanente durante a dia e noite;
j.controlar movimentos de pessoas e estacionamento de viaturas;
l.proceder ao registo de todas as pessoas e viaturas que tenham acesso às instalações.
66.A Ré E…, através de carta datada de 26 de dezembro de 2018 informou a empresa “D…” que a partir de 1 de janeiro de 2019, os ora Autores entre outros funcionários, passavam a ser seus trabalhadores, tudo nos termos constantes do documento junto aos autos a fls. 73 vº e 74, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
67.Com data de 26 de dezembro de 2018, a Ré E…, informou o STAD) que a partir de 1 de janeiro de 2019, os Autores passariam a ser trabalhadores da Ré D…, tudo nos termos constantes do documento junto aos autos a fls. 76 vº, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
68.A Ré E… tomou conhecimento a 21 de dezembro de 2019 da decisão do júri, por despacho, onde adjudicou à Ré D… o contrato de prestação de serviços de segurança privada e vigilância humana.
69.A Ré E… prestou serviço até às 24h00 do dia 31 de dezembro de 2018, tendo a Ré D… iniciado funções às 00h00 do dia 1 de janeiro de 2019.”

Por sua vez, considerou-se como sendo “factos não provados” o seguinte:
“a)que os Autores chamaram a PSP, que confirmou a presença deles no seu local de trabalho e o facto de serem impedidos de entrar para trabalhar.
b)que para o exercício da totalidade das tarefas executadas, os Autores não utilizavam quaisquer equipamentos ou meios pertencentes à Ré E….
c)que as atividades desempenhadas pelos Autores e, atualmente, por outros vigilantes que a Ré D… lá colocou, as instalações e os referidos equipamentos e meios usados nas funções desempenhadas, geravam e geram um rendimento mensal, que corresponde ao preço que o Cliente F… paga às Rés (conclusivo).
d)que os referidos fatores produtivos organizados (recursos humanos, instalações, mobiliário, equipamentos e meios organizados em ordem à produção de rendimentos) e o produto gerado (o preço pago pela Cliente F…), constituem indubitavelmente um “estabelecimento” ou unidade económica (conclusivo).
e)que a unidade económica e fonte de rendimento que é transacionável, tem valor próprio de mercado como organização de fatores produtivos (conclusivo).
f)que os Autores sentiram vergonha e constrangimentos de comparecerem nos locais de trabalho e serem impedidos de trabalhar, à vista de quem entrava e saía;
g)que os Autores sentiram o medo de ficarem sem rendimentos para a sua subsistência e a do seu agregado família;
h)que os Autores sentiram o embaraço de não poderem cumprir compromissos de pagamentos a que estavam obrigados;
i)tudo causou e causa a cada um dos Autores dolorosa preocupação, revolta, angústia, tristeza, desespero, perda do sono, irritabilidade, desequilíbrio emocional, necessidade de recorrer a tratamentos médicos e medicamentosos.
j)que nenhum dos Autores se apresentou nas instalações da F… para prestar serviço;
l)que na data em que cessou a sua prestação de serviços na F…, a Ré E… retirou a documentação de apoio à execução dos serviços;
m)que na data em que cessou a sua prestação de serviços na F…, a Ré E… procedeu ainda à eliminação de toda a informação que se encontrava armazenada no computador existente na portaria onde os vigilantes prestam serviço,
n)que a Ré E… eliminou, nomeadamente, os ficheiros que continham a informação respeitante à conta de e-mail com o endereço I…@gmail.com, utilizada pelos vigilantes para comunicar com os responsáveis do Cliente pelo serviço de segurança
o)que a Ré E… eliminou o acesso ao sistema telefónico “J…”, instalado na F…, que permitia aceder à listagem de contactos internos e externos de funcionários, docentes e entidades externas.
p)que a Ré E… eliminou a listagem do chaveiro, onde se encontravam identificadas todas as chaves em uso pelo serviço de vigilância e segurança.
r)que a Ré E… eliminou a listagem das caixas de correio dos docentes e a listagem de cacifos dos alunos.
s)que o serviço de segurança e vigilância prestado pela Ré E…, através do seu corpo de vigilantes, nas sobreditas instalações funcionavam como uma verdadeira unidade económica de serviço de segurança e vigilância (conclusivo).
t)que a Ré D… não é associada da AES – Associação das Empresas de Segurança.
u)que para o desempenho das tarefas de vigilância e segurança a Ré D… afetou à prestação de serviços na F… um agrafador.
v)que para o desempenho das tarefas de vigilância e segurança e cumprimento das obrigações previstas nas peças do procedimento, em termos organizativos, a Ré D… teve ainda que registar no computador da portaria a informação relativa (i) ao sistema telefónico “J…” para acesso à listagem de contactos telefónicos e emails internos e externos de funcionários, docentes e entidades externas; (ii) listagem do chaveiro; (iii) listagem das caixas de correio dos docentes e (iv) listagem de cacifos dos alunos, uma vez que toda aquela informação foi retirada pela 2ª R. aquando da cessação da sua prestação nas instalações da F….
x)que os serviços de vigilância adjudicados à Ré D… mantiveram, na sua essência, as mesmas caraterísticas em relação àqueles que, ao longo do ano, foram prestados e executados pela 2.ª Ré (conclusivo).
y)que incumbia à E… a operação e controlo do radio da Proteção Civil.”
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B) Discussão
1. Recurso sobre a matéria de facto / Ré D…
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Deste modo, não se provando o mais, eliminando-se o ponto 10.º, altera-se a redação do ponto 9.º da factualidade provada, passando a constar o seguinte:
“9.º Os Autores compareceram, no dia 1 de janeiro de 2019, junto da portaria das instalações da F…, onde anteriormente a essa data tinham exercido as suas funções.”

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Em face do exposto, sendo que é como se disse também isso que resulta da prova produzida, a resposta dada aos analisados pontos 57.º e 58.º tem em vista, e apenas, os bens/equipamentos que se fizeram constar dos pontos 20.º e 21.º, pertencentes à cliente F…, do que resulta, em conformidade, afastando-se assim ainda qualquer eventual dúvida, a necessidade de, mantendo-se a redação do ponto 58.º, dar nova redação em conformidade, ao ponto 57.º, o que se decide, passando a constar desse o seguinte:
“57.Assumindo a exploração e utilização do equipamento, bens e dispositivos, pertencentes à G…, a que se alude nos pontos 20.º e 21.º da factualidade, existentes no local afeto ao desempenho do serviço contratado;”

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Deste modo, procedendo nessa medida o recurso, adita-se à factualidade provada os seguintes pontos:
33-A: Quanto aos meios informáticos, assim o computador que era pertença da Cliente, no que diz respeito à informação / dados nesse existente e que foi utilizada e gerida pela Ré E… na prestação dos serviços de vigilância, tal informação, no momento em que essa cessou as suas funções, não ficou disponível e / ou acessível, não tendo, nomeadamente, sido disponibilizada a password de acesso à conta de e-mail com o endereço I…@gmail.com – utilizada pelos vigilantes ao serviço da mesma Ré para comunicar com os responsáveis do Cliente pelo serviço de segurança –, bem como fornecida a senha de acesso ao sistema J… que estava instalado no computador, o que impossibilitava o acesso à informação nesse existente, tendo ainda deixado desorganizada a listagem do chaveiro onde se encontravam identificadas todas as chaves em uso pelo serviço de vigilância e segurança
33-B: Em face do que consta do ponto anterior (33-A), para o desempenho pela Ré D… das tarefas de vigilância e segurança, com a colaboração de técnicos de informática da Cliente no sentido de tentarem recuperar os dados, teve de proceder-se ao registo / inserção no computador da informação em falta.

1.2 Por decorrência do decidido anteriormente a base factual a atender, para dizermos de Direito, é a que como tal foi considerada pelo Tribunal recorrido, mas com as alterações seguintes:

“(...)

“9.º Os Autores compareceram, no dia 1 de janeiro de 2019, junto da portaria das instalações da F…, onde anteriormente a essa data tinham exercido as suas funções. (alterado)
(...)
33-A. Quanto aos meios informáticos, assim o computador que era pertença da Cliente, no que diz respeito à informação / dados nesse existente e que foi utilizada e gerida pela Ré E… na prestação dos serviços de vigilância, tal informação, no momento em que essa cessou as suas funções, não ficou disponível e / ou acessível, não tendo, nomeadamente, sido disponibilizada a password de acesso à conta de e-mail com o endereço I…@gmail.com – utilizada pelos vigilantes ao serviço da mesma Ré para comunicar com os responsáveis do Cliente pelo serviço de segurança –, bem como fornecida a senha de acesso ao sistema J… que estava instalado no computador, o que impossibilitava o acesso à informação nesse existente, tendo ainda deixado desorganizada a listagem do chaveiro onde se encontravam identificadas todas as chaves em uso pelo serviço de vigilância e segurança. (aditado)
33-B. Em face do que consta do ponto anterior (33-A), para o desempenho pela Ré D… das tarefas de vigilância e segurança, com a colaboração de técnicos de informática da Cliente no sentido de tentarem recuperar os dados, teve de proceder-se ao registo / inserção no computador da informação em falta. (aditado)
(...)
57.Assumindo a exploração e utilização do equipamento, bens e dispositivos, pertencentes à G…, a que se alude nos pontos 20.º e 21.º da factualidade, existentes no local afeto ao desempenho do serviço contratado; (alterado)
(...)”

2. O direito do caso.
2.1 Saber se correu transmissão de estabelecimento e por decorrência da posição de empregador
Sustenta a Apelante que ocorre uma errada interpretação e aplicação do direito e consequente erro de julgamento na aplicação do regime que decorre do artigo 285.º do Código do Trabalho, para o que avança, como argumentos, que não estamos perante uma unidade económica com identidade própria, como também não foram transmitidos elementos corpóreos ou incorpóreos da 2ª Ré para a 1.ª Ré que permita concluir que ocorreu de facto uma transmissão de estabelecimento, devendo ter-se nomeadamente presente que a identidade própria de uma unidade económica se verifica essencialmente não só pela manutenção dos elementos corpóreos e não corpóreos, mas também no próprio “modus operandi” de prestar o serviço em causa, sendo que tal identidade, enquanto elemento constitutivo de uma unidade económica, neste tipo de serviço foi alterada com a saída da 2.ª Ré., criando-se uma nova identidade própria com a entrada da 1.ª Ré. Conclui que deve ser dado provimento ao presente recurso e, consequentemente, revogar-se a douta decisão recorrida, absolvendo-se a 1.ª Ré da totalidade do pedido e condenando-se a 2.ª R. naquele.

Pronunciando-se os Apelados pelo acerto do julgado – no caso dos Autores, ainda, em alternativa, na hipótese de se vir a dar provimento ao recurso apresentado pela 1ª Ré (D…, S.A.), “que deve então ser condenada a 2ª Ré (E…, S.A.) nos exatos termos em que foi condenada a Recorrente e 1ª Ré.” –, no que são acompanhados pelo Ministério Público junto desta Relação, cumprindo-nos apreciar e decidir, por o temos por plenamente aplicável ao caso – por similitude do quadro factual entre o decidido nos presentes autos e nesse Acórdão, como ainda das questões de direito levantadas –, limitar-nos-emos, por acompanharmos integralmente o ai decidido, a transcrever de seguida o texto do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 6 de Dezembro e 2017[1], quanto à aplicação do direito, nos termos seguintes:
«1. Resulta dos autos, face aos termos supra equacionados, que a questão essencial a decidir consiste em saber se, no caso sub judice, se verificou ou não a transmissão da titularidade de empresa ou de estabelecimento da 2ª Ré, a Recorrida “SS Portugal”, para a 1ª Ré, a Recorrente “RR”, a partir do momento em que aquela foi substituída por esta na prestação de serviços de vigilância e segurança das instalações pertencentes à sociedade “TT, S.A.”, localizadas em ….
A questão a dilucidar é de natureza complexa e tem merecido da parte das Instâncias o esgrimir de argumentos jurídicos divergentes, com a adopção de soluções não consensuais que, por isso, não têm contribuído para a clarificação desta temática.
Daí que tivesse sido admitida a presente revista excepcional, nos termos da alínea a), do nº 1, do art. 672º, do CPC, por se reconhecer que está em causa nestes autos uma questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, se mostra claramente necessária para a aplicação do Direito. E se tivesse suscitado, “ex officio”, o pedido de reenvio prejudicial para o Tribunal de Justiça da União Europeia com vista à apreciação das questões enunciadas ab initio, no ponto 12) do Relatório. Tendo igualmente as partes dissentido na qualificação jurídica da situação retratada nos autos, com a Recorrente “RR” a defender que, in casu, e ao contrário do que foi decidido pelas Instâncias, não estão reunidos os elementos indiciários de cuja verificação a Doutrina e a Jurisprudência fazem depender a ocorrência de uma transmissão de empresa ou estabelecimento, quer considerados isoladamente quer no seu conjunto. Pelo que, “… a interpretação adoptada pelo Acórdão recorrido incorreu numa petição de princípio, ao atribuir à mera sucessão em uma actividade de prestação de serviços de vigilância e segurança no …(da Recorrente em relação à Recorrida “SS”) os efeitos de uma transmissão de unidade económica– (sublinhado nosso). Acórdão que, em sede de recurso de apelação, convergiu com o entendimento seguido pelo Tribunal da 1.ª Instância, dando como comprovada a ocorrência de tal transmissão nos termos definidos no art. 285º, nº 5, do Código do Trabalho[5], porquanto, e em síntese, os Autores, ao serviço da Ré “SS”, desenvolviam as suas funções através de uma unidade própria, com identidade, com organização específica, com um serviço concreto e perfeitamente delimitado e com um valor comercial relevante”. Concluindo no sentido de que houve a transmissão da exploração desta actividade da Ré “SS” para a Ré “RR” e deu-se, consequentemente, a manutenção desta unidade económica e da sua identidade, formada pelos Autores e pela sua força de trabalho, na prossecução do mesmo objecto,” (…) – (sublinhado nosso).
Cabe-nos agora, em face das discordâncias assinaladas, dirimir este dissídio e aferir se o entendimento assumido, quer pelo Tribunal da 1.ª Instância quer pelo Tribunal da Relação, pode ser sufragado.
O que faremos, naturalmente, à luz da interpretação perfilhada pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, no Acórdão junto a fls. 1026-1037, do 4º Vol., bem como dos normativos cuja aplicação os autos reclamam.
Decidindo.
2. A Transmissão de empresa ou estabelecimento
2.1. É sabido que qualquer empresa, enquanto pessoa singular ou colectiva, pode estar sujeita a modificações de diversa índole com repercussão, na sua organização empresarial, que vão desde a mudança de identidade e titularidade do capital até à concessão de exploração, trespasse, fusão e cisão de sociedades comerciais, com o consequente reflexo na transmissão ou titularidade da empresa ou do estabelecimento e nas relações contratuais laborais do pessoal abrangido por tais alterações.
Qualquer dessas situações acaba por ter implicações no seio das estruturas económicas organizadas com projecção nas relações de trabalho até então constituídas.
Daí a necessidade sentida pelo legislador de fixar os efeitos decorrentes da transmissão de empresa ou estabelecimento de molde a proteger os trabalhadores envolvidos, mas sem coarctar a iniciativa dos empresários ou limitar a vida económica das empresas integradas num sistema de funcionamento de economia do mercado.
É neste balancear de interesses resultante das vicissitudes contratuais sofridas – de acordo com a terminologia utilizada pelo próprio legislador (cf. Capítulo V, Secção I, do Código do Trabalho de 2009, arts. 285º e segts.) – que a lei procura regular e que o intérprete deve, na sua aplicação, atender.
2.2. Em matéria de efeitos de transmissão de empresa ou estabelecimento dispõe o art. 285.º do Código do Trabalho de 2009, no que aqui releva, que:
«1 - Em caso de transmissão, por qualquer título, da titularidade da empresa, ou estabelecimento ou ainda de parte da empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, transmitem-se para o adquirente a posição do empregador nos contratos de trabalho dos respectivos trabalhadores, bem como a responsabilidade pelo pagamento de coima aplicada pela prática de contra-ordenação laboral.
2 - O transmitente responde solidariamente pelas obrigações vencidas até à data da transmissão, durante o ano subsequente a esta.
3 - O disposto nos números anteriores é igualmente aplicável à transmissão, cessão ou reversão da exploração de empresa, estabelecimento ou unidade económica, sendo solidariamente responsável, em caso de cessão ou reversão, quem imediatamente antes tenha exercido a exploração.
4 - …
5 - Considera-se unidade económica o conjunto de meios organizados com o objectivo de exercer uma actividade económica, principal ou acessória.
6 -…»
Em termos conceptuais o tratamento desta temática não constitui nenhuma novidade tanto no ordenamento jurídico Nacional como Comunitário.
Com efeito, já a Lei do Contrato de Trabalho – Decreto-Lei n.º 49408, de 24 de Novembro de 1969 – regulava tal matéria no seu art. 37º, normativo que foi, à época, erigido como pilar fulcral de protecção dos trabalhadores por garantir o direito à manutenção dos seus postos de trabalho nas circunstâncias ali previstas de transmissão do estabelecimento ou da sua exploração.
Esta finalidade foi reconhecida e plasmada nessa norma pelo legislador também com o objectivo de “tutelar o próprio estabelecimento (a continuidade do funcionamento da empresa que é objecto da transmissão)”, segundo o Acórdão desta Secção do STJ, datado de 27/05/2004.[6]
No âmbito da legislação Comunitária destaca-se a Directiva nº 2001/23/CE, do Conselho, de 12 de Março, que foi transposta para o ordenamento jurídico português pelo Código de Trabalho de 2003, conforme decorre da alínea q), do artigo 2.º, da Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, que aprovou o Código do Trabalho de 2003, vindo a matéria em questão a ter assento nos artigos 318.º e seguintes daquele Código.[7]
Directiva essa relativa à aproximação das legislações dos Estados Membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas ou de estabelecimentos, ou de partes de empresas ou de estabelecimentos, que codifica e revoga a Directiva nº 77/187/CEE, do Conselho, de 14 de Fevereiro, com a redacção que lhe foi dada pela Directiva nº 98/50/CE, do Conselho, de 29 de Junho.
Foi com o advento de novas formas na constituição e transmissão das empresas, assistindo-se a mudanças sucessivas na titularidade da exploração dessas empresas, que o legislador sentiu a necessidade de introduzir alterações ao regime jurídico das referidas transmissões, tendo sido então aprovada, num contexto social e económico diferente daquele, a referida Directiva nº 2001/23/CE, do Conselho, de 12 de Março.
Dando, assim, origem ao art. 285º do Código do Trabalho de 2009 que regula os efeitos da transmissão de empresa ou estabelecimento no âmbito do Direito do Trabalho Nacional e define o conceito de “unidade económica” inerente a essa transmissão de empresa.
3. A Directiva nº 2001/23/CE e o conceito de transmissão
3.1. Analisando o conteúdo da mencionada Directiva verifica-se que o seu art. 1.º tem a seguinte redacção:
«1. a) A presente directiva é aplicável à transferência para outra entidade patronal de uma empresa, estabelecimento ou parte de empresa ou estabelecimento, quer essa transferência resulte de uma cessão convencional quer de uma fusão.
b) Sob reserva do disposto na alínea a) e das disposições seguintes do presente artigo, é considerada transferência, na acepção da presente directiva, a transferência de uma entidade económica que mantém a sua identidade, entendida como um conjunto de meios organizados, com o objectivo de prosseguir uma actividade económica, seja ela essencial ou acessória.[8]
c) A presente directiva é aplicável a todas as empresas, públicas ou privadas, que exercem uma actividade económica, com ou sem fins lucrativos. A reorganização administrativa de instituições oficiais ou a transferência de funções administrativas entre instituições oficiais não constituem uma transferência na acepção da presente directiva.
2. (…).
3. (…).»
Por seu turno, o art. 2.º da Directiva estabelece que:
«1. Na acepção da presente directiva, entende-se por:
a) «Cedente»: qualquer pessoa, singular ou colectiva que, em consequência de uma transferência, prevista no nº 1 do art. 1º, perca a qualidade de entidade patronal em relação à empresa ou estabelecimento ou à parte de empresa ou estabelecimento.
b) «Cessionário»: qualquer pessoa singular ou colectiva que, em consequência de uma transferência, prevista no nº 1 do art. 1º, adquira a qualidade de entidade patronal em relação à empresa ou estabelecimento ou à parte de empresa ou estabelecimento.»
Resulta da alínea a), do n.º 1, do artigo 1.º, da Directiva, que o regime estabelecido é aplicável «à transferência para outra entidade patronal de uma empresa, estabelecimento ou parte de empresa ou estabelecimento», quer essa transferência resulte de uma cessão convencional ou de uma fusão.
Por força do disposto na alínea b), do n.º 1, deve entender-se como abrangida pela transferência ali disciplinada, e respeitado «o disposto na alínea a) e das disposições seguintes deste artigo», a «transferência de uma entidade económica que mantém a sua identidade, entendida como um conjunto de meios organizados, com o objectivo de prosseguir uma actividade económica, seja ela essencial ou acessória».
Por conseguinte, a transferência de titularidade dos contratos de trabalho prevista na presente Directiva abrange não apenas a transferência de empresa ou de estabelecimento, mas também a parte de empresa ou de estabelecimento que se constitua como uma «entidade económica», entendida esta nos termos estabelecidos na norma citada, com o objectivo de prosseguir uma actividade económica não restringida ao exercício da actividade principal.
Daqui decorre, da conjugação do regime legal previsto na Directiva nº 2001/23/CE – arts. 1.º, n.º 1, alínea a), e 2.º, n.º 1, alíneas a) e b) – com o art. 285º, nºs 1 e 3, do Código do Trabalho de 2009, que o conceito de transmissão, para efeitos laborais, é especialmente amplo.
A amplitude desse conceito é reconhecida uniformemente, quer pela Doutrina quer pela Jurisprudência, conforme transparece dos excertos que a seguir serão reproduzidos.
3.2. Densificando o conceito, explicita Maria do Rosário Palma Ramalho[9]:
«Quanto ao âmbito do fenómeno transmissivo, é qualificada como transmissão para efeitos da sujeição a este regime legal, não apenas a mudança da titularidade da empresa ou do estabelecimento, por qualquer título (i.e., uma transmissão definitiva, por efeito de trespasse, fusão, cisão ou venda judicial), mas também a transmissão, a cessão ou a reversão da exploração da empresa ou do estabelecimento sem alteração da respectiva titularidade (i.e., uma transmissão das responsabilidades de gestão a título temporário, embora estável) – art. 285º nºs 1 e 3 do CT.
Deste modo, o conceito de transmissão para este efeito é especialmente amplo, abrangendo todas as alterações estáveis (mas não necessariamente definitivas) na gestão do estabelecimento ou da empresa».
Também Joana Vasconcelos[10], a propósito do âmbito lato de aplicação do instituto em análise, enuncia os exemplos clássicos, como a transmissão da propriedade (trespasse, a fusão e a cisão, venda judicial ou a doação) e a transmissão da exploração de empresa ou estabelecimento, assim como as situações abrangidas pelo n.º 3, do citado artigo do Código, como é o caso da cessão ou reversão da exploração de empresa ou estabelecimento, prevendo-se quanto a estas, expressamente nesse normativo, que a responsabilidade solidária recaia sobre “quem imediatamente antes tenha exercido a exploração”.
Por sua vez, a Jurisprudência desta Secção, do Supremo Tribunal de Justiça, reforçou esse entendimento, podendo ler-se no Acórdão datado de 04.05.2011, no que concerne ao regime jurídico que então enformava o art. 318.º do Código do Trabalho, e que “corresponde, sem alterações substanciais”, à disciplina que emerge do actual art. 285º do Código do Trabalho de 2009[11], que se (…) consagrou um conceito amplo de transmissão do estabelecimento, nele estando incluídas todas as situações em que aconteça a passagem, seja a que título for, do complexo jurídico-económico em que o trabalhador esteja integrado».[12]
Esse é também o entendimento do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), que declarou no seu Acórdão de 09.09.2015, Processo C-160/14, disponível em www.curia.europa.eu, que:
«(…) A Directiva 77/187, codificada pela Directiva 2001/23, é aplicável a todas as situações de mudança, no âmbito de relações contratuais, da pessoa singular ou colectiva responsável pela exploração da empresa (…)».
Essencial é que tenha ocorrido, efectivamente, a transmissão de um negócio ou actividade, que constitua uma unidade económica autónoma na esfera do transmitente para a do transmissário, «mantendo a sua identidade» (art. 1.º, n.º 1, da Directiva), e que demonstre o animus translativo da operação pelo facto de o primeiro ter deixado de exercer a actividade correspondente a tal unidade e o segundo passar a exercê-la nos mesmos moldes.
3.3. O conceito nuclear inserido nesta Directiva, conforme resulta da sua análise, não é tanto o de transferência/transmissão de empresa, mas sim o de “transferência de uma entidade económica” – cf. a alínea b), do nº 1, do seu art. 1º.
Conceito que reencontramos explicitado no art. 285.º do Código do Trabalho, no seu n.º 5, com a noção aí consagrada de “unidade económica”, como o conjunto de meios organizados com o objectivo de exercer uma actividade económica, principal ou acessória.
Reproduzindo na nossa ordem jurídica o citado art. 1.º, n.º 1, alínea b), da Directiva nº 2001/23/CE, de 12 de Março, em consonância com o entendimento da Jurisprudência do TJUE, segundo o qual é considerada como tal a transferência de uma unidade económica que mantém a sua identidade, entendida esta nos mesmos termos: “como um conjunto de meios organizados, com o objectivo de prosseguir uma actividade económica, seja ela essencial ou acessória”.
Asserção vertida claramente no atrás citado Acórdão do TJUE, de 09.09.2015, com a seguinte narrativa:
«Segundo jurisprudência constante, a Diretiva 2001/23 tem em vista assegurar a continuidade das relações de trabalho existentes no quadro de uma entidade económica, independentemente da mudança de proprietário. O critério decisivo para demonstrar a existência de uma transferência, na acepção dessa diretiva, consiste na circunstância de a entidade em questão preservar a sua identidade, o que resulta, designadamente, da prossecução efetiva da exploração ou da sua retoma».[13]
Sendo considerado como elemento determinante dessa definição e reconhecimento de unidade económica, pela Jurisprudência Comunitária, a autonomia de parte da empresa ou do estabelecimento transmitidos.
Podendo ler-se, a este propósito, no Acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, exarado no Proc. C-458/05 (Ac. Jouini), de 13/09/2007, que o Tribunal de Justiça acentuou a necessidade de a unidade económica manter a sua própria identidade no seio do transmissário, o que se revela pela prossecução de um objectivo próprio.[14]
Identidade a aferir pelo conjunto de meios organizados com o objectivo de exercer uma actividade económica, principal ou acessória – cf. nº 5, do art. 285º, do Código do Trabalho de 2009.
Importa, assim, avaliar se a unidade económica mantém a sua identidade, se se mostra dotada de autonomia técnico-organizativa própria, constituindo uma unidade produtiva autónoma, com organização específica.
Neste sentido se expressou igualmente o Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão desta Secção, de 26.09.2012[15], quando se sintetizou nos seguintes termos, no final do ponto 3.2.:
«Em suma, a verificação da existência de uma transferência depende da constatação da existência de uma empresa ou estabelecimento (conjunto de meios organizados, com o objectivo de prosseguir uma actividade económica), que se transmitiu (mudou de titular) e manteve a sua identidade.
É, contudo, essencial que a transferência tenha por objecto uma entidade económica organizada de modo estável, ou seja, deve haver um conjunto de elementos que permitam a prossecução, de modo estável, de todas ou de parte das actividades da empresa cedente e deve ser possível identificar essa unidade económica na esfera do transmissário».
É neste fluxo Jurisprudencial que João Reis navega quando tece as seguintes considerações[16]:
«O critério decisivo é, pois, o da preservação da identidade económica transmitida. De acordo com a noção acolhida, para verificar se há transmissão, o primeiro passo é indagar se o objeto transmitido constitui uma unidade económica estável, autónoma e adequadamente estruturada, e o segundo é aferir se tal unidade económica mantém a sua identidade própria, o que deve ser visível no exercício da atividade prosseguida ou retomada. Em primeiro lugar, é necessário averiguar se existe uma unidade económica susceptível de transferência.
Digamos que, à semelhança da pessoa humana, é preciso que tal entidade seja "um ser vivente". Isto implica uma estreita conexão entre dois aspetos: entre a transmissão de um complexo de bens e relações jurídicas e o exercício atual (ou próximo) da empresa. Portanto, a transferência de um estabelecimento que já não esteja em atividade, ainda que seja constituído por um complexo de bens potencialmente capaz para o exercício da empresa, parece não constituir transferência de estabelecimento para efeitos da diretiva
3.4. Aquilatar da subsistência de uma unidade económica exige a ponderação de determinados elementos indiciários, sendo frequentemente enunciados pelo TJUE, como relevantes, os seguintes:
- Avaliar o tipo de empresa ou de estabelecimento de que se trata;
- Apurar se houve a transferência ou não de bens corpóreos, tais como os edifícios e os bens móveis, bem como o valor dos elementos incorpóreos existentes no momento da transmissão;
- Verificar se se operou a reintegração, ou não, por parte do novo empresário, do essencial dos efectivos, v.g., no domínio dos recursos humanos;
- Confirmar se ocorreu a transmissão, entendida enquanto continuidade, da respectiva clientela;
- Comprovar o grau de similitude entre as actividades exercidas antes e depois da transmissão e a duração de uma eventual suspensão dessas actividades.
Elementos parciais indiciários a valorizar numa avaliação de conjunto, enquanto critérios orientadores e coadjuvantes da decisão a proferir, que dependerá da ponderação que se faça desses factores em função de cada caso concreto.
Conclusão corroborada, nesta parte, por Júlio Manuel Vieira Gomes[17] quando refere que:
«Decisiva para o Tribunal de Justiça é sempre a manutenção da entidade económica, e para se verificar se essa entidade continuou a ser a mesma, o tribunal destacou que há que recorrer a múltiplos elementos cuja importância pode, de resto, variar no caso concreto, segundo o tipo de empresa ou estabelecimento, a sua actividade, ou métodos de gestão, sendo que estes elementos devem ser objecto de uma apreciação global, não sendo em princípio decisivo nenhum deles».
E explicita:
«Podem ser relevantes elementos como a transmissão de bens do activo da entidade, designadamente, bens imóveis, ou equipamentos, mas também bens incorpóreos como a transmissão de know-how, a própria manutenção da maioria ou do essencial dos efectivos, a duração de uma eventual interrupção da actividade desenvolvida antes e a actividade desenvolvida depois da transferência».
3.5. Posto isto, vejamos agora quais os efeitos que se produzem no âmbito laboral com a transmissão da titularidade de empresa ou estabelecimento.
4. Efeitos laborais decorrentes da transmissão
4.1. Quanto aos efeitos decorrentes da transmissão da titularidade de empresa ou estabelecimento, no que respeita às relações laborais existentes àquela data, tem sido entendido jurisprudencialmente que essa transmissão não afecta, em regra, a subsistência dos contratos de trabalho, nem o respectivo conteúdo, tudo se passando, em relação aos trabalhadores, como se a transmissão não tivesse tido lugar, mantendo-se inalteráveis os respectivos contratos de trabalho e assumindo o adquirente os direitos e obrigações emergentes dos contratos de trabalho celebrados com o anterior empregador.
Assim, por força da transmissão, o adquirente fica investido na posição da entidade empregadora, relativamente aos contratos de trabalho dos trabalhadores afectos ao estabelecimento transmitido, na data da transmissão, o que implica a subsistência dos contratos de trabalho com o conteúdo que tenham, ou seja, a continuidade dos mesmos como se não tivesse ocorrido qualquer alteração do lado da entidade empregadora.
A transferência dos contratos de trabalho com o mesmo conteúdo implicará para o adquirente a transferência do complexo de obrigações deles decorrentes, que caracterizavam a posição do transmitente, dando continuidade às situações dos trabalhadores.
Entendimento consolidado e que remonta ao regime decorrente do artigo 37.º da LCT, com respaldo doutrinário.
Com efeito, sobre esta matéria, Pedro Romano Martinez[18] considera que:
«Transmitido o estabelecimento, o cessionário adquire a posição jurídica do empregador cedente, obrigando-se a cumprir os contratos de trabalho nos moldes até então vigentes. Isto implica não só o respeito do clausulado de tais negócios jurídicos, incluindo as alterações que se verificaram durante a sua execução, como de regras provenientes de usos, de regulamentos da empresa ou de instrumentos de regulamentação coletiva (…); no fundo, dir-se-á que a transmissão não opera alterações no conteúdo do contrato
Também Maria do Rosário Palma Ramalho[19] conclui, a este propósito:
«O regime legal confirma a transmissão da posição jurídica do empregador que decorre do negócio transmissivo, como um caso de sub-rogação legal, já que o transmissário assume a posição negocial do transmitente junto da contraparte deste no contrato de trabalho, por imposição da lei e independentemente da vontade do outro contraente (no caso, o trabalhador)
E compreende-se que assim seja, pela necessidade de compatibilizar os interesses em causa e aos quais fizemos referência ab initio:
- Por um lado, os interesses do transmitente em concretizar a mudança da titularidade da empresa ou da exploração do estabelecimento para outra entidade/adquirente, para quem se transfere a posição jurídica daquele, e,
- Por outro, a protecção dos trabalhadores envolvidos, sem que essa mudança possa acarretar prejuízos no domínio dos contratos de trabalho celebrados que, nessa medida, se mantêm na sua plenitude.
Trata-se de uma garantia assumida juslaboralmente em consonância com os princípios de Direito Comunitário e Constitucionais, v.g., o da protecção e segurança no emprego e o da livre iniciativa económica.
Pode, assim, concluir-se que:
A transmissão para o adquirente da posição do empregador nos contratos de trabalho dos respectivos trabalhadores, a que se refere o n.º 1, do art. 285.º, do Código do Trabalho de 2009, inclui quaisquer direitos e obrigações do cedente emergentes de um contrato de trabalho ou de uma relação de trabalho existentes antes da data da transferência, conforme precisa o art. 3º, n.º 1, da Directiva.
Ponto é que a transmissão da titularidade de empresa ou estabelecimento constitua uma unidade económica e se mostre concretizada nos termos definidos pelos normativos legais citados e que resultam do Direito Nacional e Comunitário, de acordo com a interpretação que a Jurisprudência deles tem feito.
4.2. Prevê-se, paralelamente, e ao abrigo de uma permissão expressa da Directiva (art. 3.º, n.º 1, in fine), uma responsabilidade solidária do transmitente pelas obrigações assim transmitidas, duplamente limitada às obrigações vencidas até à data da transmissão e ao prazo de um ano subsequente à sua realização.
Princípio vertido, nos mesmos termos, no nº 2, do art. 285º, do Código do Trabalho de 2009.
Assim, por força desta norma, durante o período de um ano subsequente à transmissão, o transmitente responde solidariamente com o transmissário pelas obrigações vencidas até à data da transmissão.
Refira-se, por fim, que a nossa legislação laboral omite qualquer referência à oposição do trabalhador à transmissão do seu contrato de trabalho.
No entanto, a nossa Doutrina admite que caso o trabalhador não queira acompanhar o estabelecimento transmitido poderá opor-se à transmissão do seu contrato de trabalho recorrendo, para o efeito, à resolução do contrato com justa causa com fundamento na alteração substancial e duradoura das condições de trabalho no exercício lícito de poderes do empregador – cf. art. 394.º, n.º 3, alínea b), do Código do Trabalho de 2009[20] – ou com fundamento no disposto no art. 394.º, n.º 2, alíneas b) ou e), do mesmo Código, se demonstrar que a operação de transmissão correspondeu a intuito fraudulento, com direito à indemnização correspondente (cf. art. 396.º, n.º 1), para além de poder, ainda, denunciar o contrato com aviso prévio, nos termos do art. 400.º, n.º 1, do mesmo Código.[21]
É que, de acordo com o entendimento expresso por Júlio Manuel Vieira Gomes, admitir a transmissão automática dos contratos de trabalho, sem que o trabalhador a isso se possa recusar, consistiria «(…) não só numa negação frontal da sua autonomia privada, como mesmo da sua dignidade fundamental enquanto pessoa, convertendo-o, de algum modo, numa coisa, num componente do estabelecimento (…)»[22], pelo que, não sendo o trabalhador «uma mercadoria» não poderá ser «(…) transferido de um empregador para outro sem o seu consenso
4.3. Feito o enquadramento jurídico sobre a matéria objecto da presente revista é altura de incidirmos a nossa análise tendo em conta os factos concretamente provados nos autos.
Assim sendo, temos que:
5. O caso dos autos
5.1. Do cotejo dos autos constata-se que resultou provado, nomeadamente, o seguinte circunstancialismo fáctico:
- Os AA., até ao dia 14 de Julho de 2013, exerceram as suas funções de vigilância, com controlo de entrada e saída de pessoas e mercadorias, com registo de ocorrências, nas portarias das instalações pertencentes a “TT, SA”, localizadas em …: marina, porto, cais – (cf. factos provados e inseridos no ponto n.º 21).
- Exerceram estas funções de acordo com:
a) O horário que lhes era indicado pela 2ª Ré “SS”;
b) O uso de equipamentos fornecidos pela Ré 2ª “SS” (“rádios” transmissores);
c) O uso de indumentária identificativa fornecida pela referida 2ª Ré.
- E fizeram-no ao abrigo de “concessão de serviços de vigilância e segurança” que havia sido ajustada entre tal sociedade (TT, S.A.) e a Ré SS – (factos provados com os nºs 22 e 23).
Ficou igualmente provado que, através de “Anúncio de Procedimento”, publicado no Diário da República, II Série, de 17 de Janeiro de 2013, a sociedade “TT, S.A.”, abriu concurso público para prestação de serviços de vigilância e segurança preventiva das instalações da empresa “TT” – (facto provado com o n.º 24).
- No âmbito desse concurso público foram apresentadas propostas por 8 concorrentes (onde se incluíam ambas as Rés), tendo, a final, a “concessão dos serviços de vigilância e segurança nas instalações de TT, S.A.” sido atribuída à 1ª Ré “RR” mediante comunicação escrita de 17/Abril/2013, que a passou a executar com efeitos a partir de 15-7-2013 – (factos provados com os nºs 28, 29 e 38).
- O caderno de encargos relativo ao referido concurso público, com as respectivas cláusulas nele inseridas, consta da matéria de facto provada nos nºs 25 a 27.
- Em 23 de Maio seguinte, a 1ª Ré “RR” enviou à “TT” “listagem de colaboradores a alocar à DG…” – (facto provado com o n.º 30).
- Em 7 de Junho de 2013, a “TT” comunicou à 1ª Ré “RR”, por escrito, que: “o início da prestação dos vossos serviços no … ocorrerá a partir do próximo dia 15 de Julho de 2013”, “considerando-se aprovada a lista de elementos proposta pela “RR” – (facto provado com o n.º 31).
- No dia 15 de Julho de 2013, na sequência de concurso público realizado para o efeito, a “concessão dos serviços de vigilância e segurança nas instalações de TT, S.A.” foi atribuída e passou a ser executada pela Ré “RR” – (facto provado com o n.º 38).
Provou-se ainda que:
- A 1ª Ré “RR” fornece aos vigilantes afectos à execução dos seus serviços equipamentos de rádio a si pertencentes e uniforme com o modelo e imagem identificativos da sua empresa.
- Em 14 de Julho de 2013, o Autor GG, recebendo instruções nesse sentido de funcionário da 2ª Ré SS, entregou a um funcionário da 1ª Ré “RR” os equipamentos de “rádio” que até então tinha feito uso nas instalações da “TT”.
- A 1ª Ré “RR”, de seguida, entregou estes equipamentos de ‘rádio’ aos serviços da “TT” (segundo indicação desta última) – (factos provados com os nºs 61 a 63).
Estas são, em concreto, as circunstâncias fácticas que importa ponderar tendo em conta o tipo de actividade desenvolvida.
Diga-se porém que, no caso em análise, a questão não se apresenta linear, porquanto somos confrontados com uma situação em que essa actividade aparenta assentar apenas no indício da mão-de-obra humana.
Sendo embora verdadeira essa constatação, tal como salienta Júlio Manuel Vieira Gomes[23] isso não significa que se reduza a transmissão de uma unidade económica à mera actividade.
Terá, assim, de se ponderar os restantes elementos disponíveis nos autos, fazendo apelo, v.g., aos métodos e organização do trabalho, aos meios colocados pela empregadora à disposição dos trabalhadores e a outros indícios que se mostrem relevantes para a aferição de identidade da unidade económica.
Igual conclusão foi vertida em Acórdão desta Secção, do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 24.03.2011[24], onde se pode ler o seguinte:
«…A mera transmissão de uma actividade não é suficiente para configurar uma transmissão de unidade económica, como, aliás o Tribunal de Justiça da União Europeia afirmou no Acórdão de 11 de Março de 1997, Processo C-13/95, em cujo ponto 15 se refere que «uma entidade não pode ser reduzida à actividade de que está encarregada. A sua identidade resulta também de outros elementos, como o pessoal que a compõe, o seu enquadramento, a organização do seu trabalho, os seus métodos de exploração ou, ainda, (…) os meios de exploração à sua disposição».
Matéria que, contudo, no contexto dos autos não se configura fácil.
Daí que tivessem sido suscitadas as referidas questões prejudiciais e solicitado a pronúncia do Tribunal de Justiça da União Europeia.
5.2. A este propósito, o TJUE, no seu Acórdão de 19 de Outubro de 2017, junto a fls. 1026-1037, do 4º Vol., quando colocado perante a factualidade provada no âmbito dos presentes autos e, bem assim, a primeira e segunda questões prejudiciais que lhe foram dirigidas, decidiu quanto a este ponto nos seguintes termos:
«O artigo 1.º, nº 1, alínea a), da Diretiva 2001/23/CE, do Conselho, de 12 de março de 2001, relativa à aproximação das legislações dos Estados Membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas, ou de estabelecimentos, ou de parte de empresas ou de estabelecimentos, deve ser interpretado no sentido de que está abrangida pelo conceito de «transferência […] de uma empresa [ou de um] estabelecimento», na aceção desta disposição, uma situação em que um contratante resolveu o contrato de prestação de serviços de vigilância e de segurança das suas instalações celebrado com uma empresa e, em seguida, para a execução dessa prestação, celebrou um novo contrato com outra empresa, que recusa integrar os trabalhadores da primeira, quando os equipamentos indispensáveis ao exercício da referida prestação foram retomados pela segunda empresa.» - (sublinhado nosso).
Explicitou ainda que, no caso concreto, era necessário averiguar «(…) se a SS transmitiu à RR, direta ou indiretamente, equipamentos ou elementos corpóreos ou incorpóreos para exercer a actividade de vigilância e de segurança nas instalações em causa.» - (sublinhado nosso).
Acrescentando que se deverá verificar «(…) se esses elementos foram postos à disposição da SS e da RR pela TT. A este respeito, há que recordar que a circunstância de os elementos corpóreos indispensáveis ao exercício da atividade em causa no processo principal e retomados pelo novo empresário não pertencerem ao seu antecessor, mas terem sido simplesmente disponibilizados pelo contratante, não pode levar a excluir a existência de uma transferência de empresa ou de estabelecimento na aceção da Diretiva 2001/23 (…). Contudo, só os equipamentos que são efetivamente utilizados para prestar os serviços de vigilância, com exclusão das instalações que são objecto desses serviços, devem, se for caso disso, ser tomados em consideração para determinar a existência de uma transferência de uma entidade com manutenção da sua identidade, na aceção da Diretiva 2001/23 (…)» – (sublinhado nosso).
Ora, reportando-nos ao caso em análise, extrai-se dos factos provados que não ocorreu a transferência, directa ou indirecta, de quaisquer equipamentos ou bens corpóreos da 2.ª Ré “SS” para a 1.ª Ré “RR”.
Por outras palavras, a 1ª Ré “RR” não retomou, nem lhe foram entregues, quaisquer equipamentos da 2ª Ré “SS” indispensáveis ao exercício da prestação de serviços de vigilância e de segurança das instalações para que foi contratada.
Embora se esteja perante uma empresa cuja actividade assenta essencialmente na mão-de-obra prestada por aqueles que exercem a vigilância e segurança ao serviço da respectiva empresa, a mera circunstância de a 2ª Ré “SS” ter “perdido” para outra empresa o cliente junto do qual prestava serviços de vigilância, em virtude deste serviço ter sido adjudicado a uma outra empresa concorrente (a 1ª Ré “RR”), não configura, por si só, uma situação de transmissão de empresa ou estabelecimento.
Essa mudança da empresa que efectuava, in casu, os serviços de vigilância operou-se em consequência de um concurso público aberto pela sociedade “TT, S.A.” no qual ambas as Rés participaram, tendo a proposta apresentada pela 1ª Ré “RR”, logrado obter vencimento.
Constam como requisitos do Caderno de Encargos desse concurso público que, para garantir o bom funcionamento dos postos de segurança e cumprir a totalidade das obrigações exigidas, os trabalhadores ao serviço da Ré devem observar os seguintes requisitos:
- Serem titulares de cartões profissionais emitidos pela Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna, nos termos e para os efeitos do art. 10.º do Decreto-Lei n.º 35/2004, de 21 de Fevereiro e pela Lei n.º 38/2008, de 8 de Agosto;
- Deve usar uniforme conforme modelo aprovado pelo Ministério da Administração Interna e cartão profissional aposto visivelmente – cf. factos provados e inseridos no ponto 27);
- Estando provado que a 1ª Ré “RR” fornece aos vigilantes afectos à execução dos seus serviços equipamentos de rádio a si pertencentes e uniforme com o modelo e imagem identificativos da sua empresa – cf. factos provados e inseridos nos pontos 61) e 26), a).
Equipamentos esses que sendo indispensáveis ao exercício da referida actividade de vigilância não se provou que tivessem sido entregues pela anterior prestadora desses serviços – a 2ª Ré “SS” – nem à 1ª Ré, nem à entidade da Administração dos referidos TT.
Provando-se, isso sim, o contrário: que quem os fornece é a 1ª Ré Recorrente (“RR”).
Tão pouco se provou que a Recorrente tivesse recebido da 2ª Ré “SS” quaisquer outros bens que constituam indício revelador da concretização da transmissão de um estabelecimento que constitua uma unidade económica, como sejam, por exemplo, quaisquer alvarás ou licenças para o exercício específico dessa actividade ou para a organização do seu trabalho.
Igualmente não se provou que a 2ª Ré tivesse transmitido à 1ª Ré o know-how – o conjunto de conhecimentos práticos e os meios materiais e técnicos – indissociáveis à prossecução de uma actividade económica de segurança privada, tendo a cargo os referidos serviços de vigilância e segurança dos portos, cais e marinas dos “TT”.
E não se diga que esse know-how, enquanto conhecimento especializado e assente em procedimentos, informações e experiência da organização concorrente, não releva para essa função.
Tanto mais que uma das exigências do concurso assenta precisamente na obrigatoriedade desses trabalhadores serem titulares de cartões profissionais emitidos pela Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna, nos termos e para os efeitos do art. 10.º, do Decreto-Lei n.º 35/2004, de 21 de Fevereiro e pela Lei n.º 38/2008, de 8 de Agosto.
Ora, esses cartões profissionais para os serviços de segurança privada não são emitidos sem o cumprimento de determinadas formalidades e observância dos requisitos que condicionam a actividade das empresas de segurança.
Actividade regulada pelos citados diplomas e, mais recentemente, pela Lei da Segurança Privada – Lei nº 34/2013, de 16/05.
5.3. Com efeito, de acordo com a Lei da Segurança Privada, aprovada pela Lei n.º 34/2013, de 16-5, os serviços de segurança prestados a terceiros com vista à protecção de pessoas e bens, bem como à prevenção da prática de crimes nos locais para os quais são contratados, incluem, nomeadamente, serviços de vigilância de bens móveis e imóveis, com o controlo de acesso de pessoas ou bens a instalações e serviços de inspecção de cargas, bagagens e pessoas, v.g., em portos (e similares) e aeroportos – cf. seu art. 3.º.
Decorre desta lei uma série de requisitos que condicionam a actividade das empresas de segurança, como sejam a necessidade de obtenção de licenças, alvarás e deveres de prestação de caução, bem como um conjunto de deveres de grande exigência quanto ao modus operandi destas empresas e ainda a sujeição a regras procedimentais estritas no que respeita aos sistemas de controlo e vigilância e aos sistemas de alarmes que utilizem.
Obrigações de que nos dão conta a matéria de facto provada nos autos – cf. pontos 26) e segts. - e que constam do caderno de encargos inserido no concurso público que foi realizado para adjudicação da prestação de serviços na área de vigilância e segurança preventiva das instalações dos “TT”.
O que é revelador das exigências técnicas e materiais imprescindíveis à actividade desenvolvida no âmbito dos serviços de vigilância e segurança.
Exigindo, por isso, o legislador, em relação a estes trabalhadores, uma formação profissional específica e a avaliação das respectivas condições médicas e psicológicas dos mesmos.[25]
A que acresce a obrigatoriedade de deter carteira profissional e a de se sujeitarem a requisitos de aptidão específicos, bem como à utilização de um uniforme que permita a sua identificação.
Ora, a complexidade e as exigências técnicas, materiais e de formação profissional dessa actividade de segurança privada, que são imprescindíveis para o exercício da actividade, nos termos que decorrem do respectivo enquadramento legal e se espraiam nos factos que se provaram nos autos, não permitem, em nosso entender, que se equipare esta actividade a outras exclusivamente assentes em mão de obra/no «capital humano», v.g., os serviços de limpeza de escritórios e casas particulares.
Tão pouco se extrai do quadro factual traçado em juízo que o conjunto de trabalhadores composto pelos aqui Autores tivesse autonomia no seio da empresa de segurança onde prestavam a sua actividade profissional, não se tendo provado que esse conjunto de trabalhadores formasse um complexo humano organizado que conferia, por si só, individualidade à actividade desenvolvida no seio da 2.ª Ré “SS” e que aí tivesse autonomia.
Verifica-se assim que, no caso concreto, os factos provados não preenchem os requisitos indiciadores do “elemento transmissivo” e da autonomia da entidade económica, condição sine qua non para o reconhecimento da transmissão da titularidade ou da exploração de uma unidade económica, para efeitos de aplicação do regime jurídico consagrado no art. 285.º, n.º 1, do Código do Trabalho de 2009.
Termos em que, seguindo a interpretação preconizada pelo Tribunal de Justiça da União Europeia no Acórdão proferido no âmbito deste processo, se conclui que a situação dos autos não está abrangida pelo conceito de «transferência (…) de uma empresa (ou de um) estabelecimento» na acepção do artigo 1.º, nº 1, alínea a), da Directiva 2001/23/CE, do Conselho, de 12 de Março de 2001.
6. Nas questões prejudiciais suscitadas perante o referido Tribunal de Justiça solicitou-se também que se pronunciasse sobre se “é contrária ao Direito Comunitário”, no âmbito da matéria versada nos presentes autos, o nº 2 da Cláusula 13ª do identificado CCT, celebrado entre a AES[26] e a AESIRF[27] e o STAD e outras Associações Sindicais, publicado no BTE n.º 26/2004, de 15/07, sofreu posteriores revisões e modificações nos BTEs nºs 10/2006, de 15/03, 6/2008, de 15/02, 10/2009, de 16/03 e 17/2011, de 09/05, e Portaria de Extensão n.º 131/2012, publicada no BTE n.º 19/2012, de 22/5 e no Diário da República, 1.ª Série, datado de 7/5/2012.
Onde se estabeleceu, de acordo com a redacção introduzida na revisão de 2011, que:
«1 - Em caso de transmissão, por qualquer título, da titularidade de empresa, ou estabelecimento ou ainda de parte da empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, transmite-se para o adquirente a posição do empregador nos contratos de trabalho dos respectivos trabalhadores.
2 - Não se enquadra no conceito de transmissão de empresa ou estabelecimento a perda de cliente por parte de um operador com a adjudicação de serviço a outro operador».[28]
Colocado perante a dúvida o TJUE decidiu no Acórdão junto a estes autos que:
«O artigo 1.º, nº 1, da Diretiva 2001/23 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma disposição nacional, como a que está em causa no processo principal, que prevê que não está abrangida pelo âmbito de aplicação do conceito de «transferência […] de uma empresa [ou de um] estabelecimento», na aceção deste artigo 1.º, n.º 1, a perda de cliente por parte de um operador com a adjudicação de serviço a outro operador.» - (sublinhado nosso).
Fundamentando o assim decidido por estar em causa uma «(…) disposição nacional que exclui de maneira geral do âmbito de aplicação deste conceito [o de transferência de empresa ou de estabelecimento na aceção da Diretiva 2001/23] a perda de cliente por parte de um operador com a adjudicação de serviço a outro operador [o] que não permite tomar em consideração todas as circunstâncias de facto que caracterizam a operação em causa.»
Face a tal decisão emanada do Tribunal de Justiça da União Europeia, e tendo presente o dever dos Tribunais Nacionais de cada Estado Membro interpretar a própria legislação Nacional em conformidade com as Directivas tal como estas têm sido interpretadas pelo TJUE, há que reconhecer e reafirmar que inexistem dúvidas de que a referida Cláusula 13.ª, n.º 2, do aludido CCT, não pode ser aplicada, sendo contrária ao Direito da União Europeia.
Nessa medida, prejudicada fica a questão da sua aplicabilidade ao caso sub judice.
7. Por fim, dir-se-á ainda que:
Não tendo ocorrido transmissão de estabelecimento, por força das normas legais citadas e da interpretação efectuada pelo TJUE, daqui deriva que também não se transmitiram para a 1ª Ré “RR” os contratos de trabalho dos respectivos trabalhadores da 2ª Ré “SS”, porquanto a inexistência de substituição automática da entidade patronal [29] não operou.
Quer isto dizer que os contratos de trabalho dos AA. “não cessaram, nem sofreram descontinuidade”, pelo que os trabalhadores mantêm-se contratualmente ligados à 2ª Ré “SS” e continuam a ser seus trabalhadores, não obstante esta Ré ter perdido a concessão dos serviços de vigilância e segurança nas instalações da TT, S.A. e, consequentemente, os respectivos contratos de trabalho não chegaram a ser transferidos ope legis para a 1ª Ré “RR”.
Não pode, assim, a Ré Recorrente “RR” assumir a posição de entidade empregadora de trabalhadores que não são seus e cujos contratos não se transmitiram para a sua esfera jurídica.
Razão pela qual não se pode manter a condenação da 1ª Ré “RR” por alegado despedimento ilícito dos Autores, impondo-se a revogação do Acórdão recorrido e, por consequência, a absolvição da Ré “RR” com a total improcedência dos pedidos formulados pelos Autores em relação à mesma.
8. Sucede porém que os Autores, em sede de petição inicial, também formularam pedidos em relação à 2ª Ré “SS” para a eventualidade de a 1ª Ré “RR” ser absolvida, como foi o caso.
Tais pedidos, de natureza subsidiária, assentam juridicamente num alegado despedimento ilícito, por inexistência de fundamento legal para tal.
Deste modo, em face da absolvição da 1ª Ré “RR” e tendo-se concluído, como se concluiu, que os Autores continuaram a ser trabalhadores da 2ª Ré “SS” mesmo após esta ter perdido a concessão dos serviços de vigilância e segurança nas instalações da “TT, S.A.”, impõe-se, pois, apreciar e decidir se, atento o quadro factual traçado em juízo, a referida Ré procedeu ao despedimento ilícito daqueles e, na positiva, extrair daí as respectivas consequências jurídicas.»

Como se referiu anteriormente, ocorre evidente similitude entre o quadro factual em que assentou o citado Acórdão e aquele que se provou nos presentes autos, assim quanto a este último a factualidade seguinte:
- No local de trabalho do “Cliente F…”, os Autores desempenhavam nomeadamente as tarefas:
a. de visionar o sistema de vigilância, designado “CCTV”, composto por 32 câmaras, distribuídas por três monitores, equipamentos que pertencem ao cliente F…;
b. de registar diariamente qualquer anomalia detetada, movimentos estranhos, intrusões ou danificações, o que tinham de reportar ao responsável de segurança do Cliente F…;
c. de controlar os acessos de pessoas na entrada e de viaturas nos parqueamentos, o que igualmente reportavam ao Cliente F…;
d. de atender os telefones fixos do Cliente F…;
e. de atender também um telefone móvel do Cliente F…;
f. de reencaminhar chamadas para pessoas ou serviços do Cliente F…;
g. de prestar informações sobre a F…;
h. de prestar atenção aos detetores de incêndios, que pertencem à Cliente F…, e, no caso deles emitirem sinal sonoro, deslocarem-se ao local para tomarem as providências adequadas, fosse a de recorrer aos extintores, que também pertencem á Cliente F…, fosse a promoção de outra diligência adequada;
i. de efetuarem rondas pelas instalações, verificando as portas, janelas, torneias e instalações sanitárias, luzes…, registando e reportando sempre as anomalias encontradas ao Cliente F… (ponto 20.º);
- Para o exercício das funções estáticas, os Autores dispunham dum espaço físico, dum balcão e duma cadeira, pertencentes ao Cliente F… (ponto 21.º);
- Para o exercício da totalidade das tarefas executadas, os Autores não utilizavam quaisquer instalações ou mobiliário pertencentes à Ré E… (ponto 22.º);
- A partir do dia 1 de janeiro de 2019 foi a Ré D… quem assumiu a segurança e vigilância da F…, com os seus próprios trabalhadores (ponto 25.º);
- No desempenho das suas funções os Autores utilizavam lanternas e telemóvel e tinham um sistema de rondas instalado pertença da Ré E…, equipamento retirado pela Ré E… aquando da cessação da prestação de serviços nas instalações da F… (pontos 30.º e 31.º);
- Na data em que cessou a sua prestação de serviços na F…, a Ré E… retirou o seguinte equipamento que servia de apoio às funções dos Autores: um telemóvel e respectivo carregador, bem como procedeu ao levantamento do sistema de rondas instalado na F… (ponto 32.º);
- Nenhuma peça de uniforme/fardamento foi cedida pela Ré E… à Ré D… (ponto 33.º);
- Quanto aos meios informáticos, assim o computador que era pertença da Cliente, no que diz respeito à informação / dados nesse existente e que foi utilizada e gerida pela Ré E… na prestação dos serviços de vigilância, tal informação, no momento em que essa cessou as suas funções, não ficou disponível e / ou acessível, não tendo, nomeadamente, sido disponibilizada a password de acesso à conta de e-mail com o endereço I…@gmail.com – utilizada pelos vigilantes ao serviço da mesma Ré para comunicar com os responsáveis do Cliente pelo serviço de segurança –, bem como fornecida a senha de acesso ao sistema J… que estava instalado no computador, o que impossibilitava o acesso à informação nesse existente, tendo ainda deixado desorganizada a listagem do chaveiro onde se encontravam identificadas todas as chaves em uso pelo serviço de vigilância e segurança, sendo que, em face disso, para o desempenho pela Ré D… das tarefas de vigilância e segurança, com a colaboração de técnicos de informática da Cliente no sentido de tentarem recuperar os dados, teve de proceder-se ao registo / inserção no computador da informação em falta (pontos 33-A e 33-B);
-Em 1 de janeiro de 2019, a Ré D… manteve os mesmos recursos humanos – quatro vigilantes, os mesmos recursos logísticos, assumindo a exploração e utilização do equipamento, bens e dispositivos, pertencentes à G…, existentes no local afeto ao desempenho do serviço contratado (pontos 56.º e 57.º).
Em face da citada factualidade, poderemos também concluir, como no transcrito Acórdão, que não se extrai dos factos provados que tenha ocorrido transferência, direta ou indireta, de quaisquer equipamentos ou bens corpóreos da Ré E… para a Ré D… (por outras palavras, esta última não retomou, nem lhe foram entregues, quaisquer equipamentos da primeira indispensáveis ao exercício da prestação de serviços de vigilância e de segurança das instalações para que foi contratada) – diversamente, provou-se que a primeira retirou aqueles que tinha afeto à prestação desses serviços, sendo que apenas os que eram pertença da Cliente aí se mantiveram e poderam assim ser depois utilizados –, ou seja, não se provou que a Recorrente tivesse recebido daquela quaisquer bens que constituam indício revelador da concretização da transmissão de um estabelecimento que constitua uma unidade económica, tanto mais que, igualmente, não se provando que tivesse sido transmitido o know-how – o conjunto de conhecimentos práticos e os meios materiais e técnicos – indissociáveis à prossecução de uma atividade económica de segurança privada.
Do mesmo modo, embora estejamos perante uma empresa cuja atividade assenta essencialmente na mão-de-obra prestada por aqueles que exercem a vigilância e segurança ao serviço da respetiva empresa, a mera circunstância de a Ré E… ter perdido para a Ré D… o cliente junto do qual prestava serviços de vigilância, em virtude deste serviço ter sido adjudicado a esta, não configura, por si só, uma situação de transmissão de empresa ou estabelecimento. De facto, como se refere no citado Acórdão, “a complexidade e as exigências técnicas, materiais e de formação profissional dessa actividade de segurança privada, que são imprescindíveis para o exercício da actividade, nos termos que decorrem do respectivo enquadramento legal e se espraiam nos factos que se provaram nos autos, não permitem, em nosso entender, que se equipare esta actividade a outras exclusivamente assentes em mão de obra/no «capital humano», v.g., os serviços de limpeza de escritórios e casas particulares”.
Concluindo, tão pouco se extraindo também do quadro factual provado que o conjunto de trabalhadores afetos à prestação do serviço tivesse autonomia no seio da empresa de segurança onde prestavam a sua atividade profissional – citando o mesmo Acórdão, “não se tendo provado que esse conjunto de trabalhadores formasse um complexo humano organizado que conferia, por si só, individualidade à actividade desenvolvida no seio da 2.ª Ré “SS” e que aí tivesse autonomia” –, considera-se que, também no caso concreto que se aprecia, os factos provados «não preenchem os requisitos indiciadores do “elemento transmissivo” e da autonomia da entidade económica, condição sine qua non para o reconhecimento da transmissão da titularidade ou da exploração de uma unidade económica, para efeitos de aplicação do regime jurídico consagrado no art. 285.º, n.º 1, do Código do Trabalho de 2009».

Em face de todo o exposto, temos por aplicável ao caso a solução de direito a que se chegou no citado Acórdão, razão pela qual, em conformidade, não possamos também manter a decisão proferida em 1.ª instância, de condenação da Ré / aqui Recorrente por alegado despedimento ilícito dos Autores, impondo-se assim a revogação dessa sentença, e, por consequência, a absolvição dessa Ré, com a total improcedência dos pedidos formulados pelos Autores em relação à mesma.

2.2 Saber se ocorreu o despedimento dos Autores
Impondo-se-nos então conhecer do pedido subsidiário formulado pelos Autores contra a Ré E… – conhecimento que não ocorreu no Acórdão antes citado pela circunstância de então as 1.ª e 2.ª Instâncias não terem conhecido das questões suscitadas nos mencionados pedidos subsidiários, o que levou a que fosse reenviado o processo para o Tribunal da Relação, por a essa caber conhecer dos aludidos pedidos subsidiários formulados em relação à Ré E…, com as respetivas consequências legais –, diremos o seguinte:
Tendo a referida Ré sido absolvida do pedido em 1.ª instância, diga-se que, confrontada com o recurso interposto para esta Relação pela Ré D…, sequer cuidou de acautelar, através dos meios legais que tinha ao dispor, a possibilidade de aquele recurso vir a proceder e, em consequência, poder vir a ser confrontada com o pedido subsidiário que os Autores contra ela haviam formulado, assim sobre a questão de saber se havia despedido os Autores. De facto, vistas as conclusões das suas contra-alegações, nessas apenas se encontram referências sobre a questão da existência ou não de transmissão, ou seja precisamente aquela que era objeto do recurso interposto pela outra Ré, e não pois qualquer argumento no sentido de tentar demonstrar que, em caso de procedência desse recurso, não estaríamos perante uma situação de despedimento dos Autores.
Neste contexto, cumprindo-nos verificar se a factualidade provada permite concluir que ocorreu um despedimento ilícito dos Autores por parte da Ré E…, a resposta é, sem dúvidas nossas, positiva. É que, em face ao quadro fáctico provado e dos documentos que o complementam, torna-se para nós evidente que a mesma deixou de considerar os Autores como seus trabalhadores, por ter entendido que os mesmos haviam transitado, conjuntamente com as instalações da entidade em que prestou o serviço de vigilância, para a nova empresa, ou seja a Ré D…, o que, como já vimos anteriormente, não aconteceu.
De facto, com direta relevância para a questão a decidir, resultou provado o seguinte:
– “8. Com data de 26 de dezembro de 2018, a Ré E… notificou por escrito cada um dos Autores de que se ia verificar “a transmissão do estabelecimento correspondente ao Cliente F…” e que a Ré D… passava a ser “a nova Entidade Empregadora” deles, tudo nos termos constantes dos documentos juntos aos autos a fls. 75 vº e 76, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.”
- “11. No dia 10 de janeiro de 2019, foi realizada uma reunião na Direção de Serviços para as Relações Profissionais nas Regiões Norte e Centro (DSRPRNC) da Direção Geral de Emprego e Relações de Trabalho (DGERT), para a qual foram convocadas ambas as Rés e o STAD, sindicato em que os Autores se encontram filiados. 12. Nessa reunião, a Ré E… manteve o seu entendimento de ter existido transmissão para a Ré D…, com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2019, do estabelecimento ou unidade económica correspondente ao “Cliente F….”
- “16. Com data de 10 de janeiro de 2019, os Autores dirigiram à Ré E… a carta, junta aos autos a fls. 15, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.”
- “17. Nenhuma das Rés deu trabalho aos Autores desde 1 de janeiro de 2019.”
- “66. A Ré E…, através de carta datada de 26 de dezembro de 2018 informou a empresa “D…” que a partir de 1 de janeiro de 2019, os ora Autores entre outros funcionários, passavam a ser seus trabalhadores, tudo nos termos constantes do documento junto aos autos a fls. 73 vº e 74, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.”
- “Com data de 26 de dezembro de 2018, a Ré E…, informou o STAD) que a partir de 1 de janeiro de 2019, os Autores passariam a ser trabalhadores da Ré D…, tudo nos termos constantes do documento junto aos autos a fls. 76 vº, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.”
Em face da citada factualidade, e desde logo, consideramos que a posição da Ré E…, aliás por mais que uma vez e incluindo por escrito, foi manifestada, de modo uniforme e com conteúdo idêntico, junto de cada um dos Autores e, depois, ainda perante a Ré D… e o Sindicado representativo dos trabalhadores, tendo-se os Autores deparado, em face da situação de impasse que se criou, com uma situação de não aceitação da sua prestação funcional e de não pagamento da retribuição.
Tal posição resultou, esclareça-se em segundo lugar, de modo inequívoco logo na carta referida no ponto 8.º da factualidade provada, pois que essa, em face do seu conteúdo, se reconduz, juridicamente, a uma declaração negocial de cariz unilateral e recetícia que tornou claro para ambos os Autores, para quem tal missiva foi enviada, que a referida Ré considerava findo o contrato que tinha com cada um deles, a partir da data em que deixaria de prestar os serviços para a Cliente F…”, sendo que, acrescente-se, reiterou posteriormente essa sua posição. Deste modo, dado que a Ré E… deixou de considerar os Autores como seus trabalhadores, nunca mais lhes dando trabalho, tal conduta tem de ser qualificada como uma forma de cessação dos respetivos vínculos laborais, que não se reconduz a qualquer uma das modalidades elencadas no artigo 340.º do CT/2009. Do que decorre que deve assim considerar-se que despediu unilateral e ilicitamente os Autores, por não ter invocado qualquer motivo de cariz disciplinar ou objetivo para tal efeito e não ter feito anteceder tal cessação do necessário procedimento formal de despedimento.
À mesma solução, diga-se ainda, chegou o Tribunal da Relação de Lisboa, em cumprimento do decidido pelo Supremo Tribunal de Justiça no Acórdão antes transcrito, e assim (como se disse já) também em face de um quadro factual manifestamente similar ao que aqui apreciamos, proferindo aquele Tribunal Acórdão em que julgou parcialmente procedente a ação, decidindo-se declarar ilícito o despedimento dos aí autores, realizado pela Ré que aí se havia colocado em situação também similar à presente, condenando-a, nomeadamente, a proceder à reintegração dos autores com a mesma categoria e antiguidade, a pagar-lhes, a título de compensação, todas as remunerações vencidas e vincendas (aí se integrando a retribuição de férias, correspondentes subsídios e subsídios de Natal) entre o 30.º dia anterior à propositura de cada uma das ações e o trânsito em julgado do acórdão, tudo a quantificar em incidente de liquidação, nos termos dos artigos 609.º, n.º 2 e 358.º e seguintes do CPC (mas com a dedução das importâncias que os Autores tenham auferido nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 390.º do CT/2009, assim como dos valores recebidos a título de subsídio de desemprego, a serem entregues pela empregadora aos serviços da segurança social, conforme a alínea c) do mesmo número 2 do artigo 390.º). Mais se acrescenta que sobre esse Acórdão da Relação veio também a incidir recurso de revista, sendo que o Supremo Tribunal de Justiça, desse conhecendo, em Acórdão de 19 de dezembro de 2018[2], confirmou o decidido.
Em face das razões e fundamentos antes mencionados, aplicando o regime mencionado antes à presente ação, na consideração apenas da parte do decidido que foi objeto do presente recurso e que delimita o seu objeto, impõe-se-nos revogar a sentença recorrida, que assim é substituída pelo presente acórdão, julgando agora parcialmente procedente por provada a ação instaurada por B… e C… contra a Ré E…, SA., condenando-se esta: a) a reintegrar os Autores ao seu serviço, atribuindo-lhes as funções correspondentes às suas categorias profissionais de vigilante; b) a pagar a cada um dos Autores € 906,76 da retribuição correspondente ao mês de janeiro de 2019, bem como todas as remunerações vencidas e vincendas posteriormente (aí se integrando a retribuição de férias, correspondentes subsídios e subsídios de Natal), estas a quantificar em incidente de liquidação, nos termos dos artigos 609.º, n.º 2 e 358.º e seguintes do CPC (mas com a dedução das importâncias que os Autores tenham auferido nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 390.º do CT/2009, assim como dos valores recebidos a título de subsídio de desemprego, a serem entregues pela empregadora aos serviços da segurança social, conforme a alínea c) do mesmo número 2 do artigo 390.º).

No que se refere a responsabilidade por custas, as do recurso impendem sobre Apelante e Apelados na proporção de 1/6 para a primeira e 5/6 para os segundos, sendo as da ação, por sua vez, da responsabilidade dos Autores e da Ré E…, na proporção de vencimento / decaimento (artigo 527.º do CPC).
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Sumário, da responsabilidade exclusiva do relator:
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IV– DECISÃO:
Acordam os juízes que integram a Secção social do Tribunal da Relação do Porto, declarando parcialmente procedente o recurso quanto à reapreciação da matéria de facto e julgando-o procedente quanto à aplicação do direito, em revogar a sentença recorrida, a qual é substituída pelo presente acórdão, nos termos seguintes:
1. Na procedência parcial da ação instaurada por B… e C…, absolvendo-a no mais, condena-se a Ré E…, S.A.:
a) a reintegrar os Autores ao seu serviço, atribuindo-lhes as funções correspondentes às suas categorias profissionais de vigilantes;
b) a pagar a cada um dos Autores € 906,76 da retribuição correspondente ao mês de janeiro de 2019, bem como todas as remunerações vencidas e vincendas posteriormente (aí se integrando a retribuição de férias, correspondentes subsídios e subsídios de Natal), estas a quantificar em incidente de liquidação, nos termos dos artigos 609.º, n.º 2, e 358.º e seguintes do CPC, mas com a dedução das importâncias a que se alude no dispositivo.
2. Absolve-se a Ré D…, S.A., dos pedidos formulados pelos Autores.

Sendo da responsabilidade de Apelante e Apelados, na proporção de 1/6 para a primeira e 5/6 para os últimos, as custas do presente recurso, no que se refere às da ação impendem essas sobre Autores e Ré E…, na proporção de vencimento / decaimento.

Porto, 21 de outubro de 2020
(acórdão assinado digitalmente)
Nelson Fernandes
Teresa Sá Lopes
António Luís Carvalhão
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[1] Relatora Conselheira Ana Luísa Geraldes, in www.dgsi.pt.
[2] Relator Conselheiro Gonçalves Rocha, disponível também em www.dgsi.pt.