MAIOR ACOMPANHADO
ESCOLHA DO ACOMPANHANTE
INTERESSE IMPERIOSO DO BENEFICIÁRIO
Sumário


I- O novo regime jurídico do maior acompanhado, aprovado pela Lei n.º 49/2018, de 14 de Agosto, afastou-se do sistema dualista, até então consagrado, da interdição/inabilitação, demasiado rígido, e veio introduzir um regime monista e flexível norteado pelos princípios da “primazia da autonomia da pessoa, cuja vontade deve ser respeitada e aproveitada até ao limite do possível” e da “subsidiariedade de quaisquer limitações judiciais à sua capacidade, só admissíveis quando o problema não possa ser ultrapassado com recurso aos deveres de proteção e de acompanhamento comuns”, e por um “modelo de acompanhamento e não de substituição, em que a pessoa incapaz é simplesmente apoiada, e não substituída, na formação e exteriorização da sua vontade”.
II- Nos termos do disposto no artigo 143º do CC o acompanhante é escolhido pelo acompanhado ou pelo seu representante legal, sendo designado judicialmente e, na falta de escolha, o acompanhamento é deferido, no respetivo processo, à pessoa cuja designação melhor salvaguarde o interesse imperioso do beneficiário.
III- Ainda que a escolha recaia sobre alguém do círculo familiar do acompanhado, a nomeação do acompanhante deverá ser sempre precedida da realização de diligências que permitam perceber se os mesmos reúnem condições para exercerem o cargo de acompanhante e qual reúne as melhores condições, considerando que no exercício da sua função, o acompanhante deve sempre privilegiar o bem-estar e a recuperação do acompanhado, mantendo um contacto permanente com o mesmo, devendo visitá-lo, no mínimo, com uma periodicidade mensal, ou outra periodicidade que o tribunal considere adequada, e tendo sempre presente o interesse do beneficiário.

Texto Integral


ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

I. Relatório

M. S. intentou a presente ação contra J. G., seu pai, peticionando a aplicação de medidas de acompanhamento ao Requerido, alegando, sumariamente, que este sofre de alzheimer e de amnésia, afigurando-se incapaz de governar a sua pessoa e os seus bens.
V. G., filho do Requerido, veio apresentar requerimento no sentido de ser nomeado acompanhante do mesmo.
Foi proferida sentença em 17/02/2020 decidindo:
“Pelo supra exposto, julga-se a acção procedente e, consequentemente, decide-se:
1) Decretar as seguintes medidas de acompanhamento do beneficiário J. G.:
A) Representação geral;
B) Administração total de bens.
2) Declarar que o beneficiário J. G. não pode exercer livremente os seus direitos pessoais, designadamente, os direitos de casar ou de constituir situações de união, de procriar, de perfilhar ou de adotar, de cuidar e de educar os filhos ou os adotados, de escolher profissão, de se deslocar no país ou no estrangeiro, de fixar domicílio e residência, de testar;
3) Declarar que o beneficiário J. G. não pode celebrar livremente negócios da vida corrente;
4) Designar M. S. a título de acompanhante do beneficiário J. G.;
5) Determinar que a acompanhante mantenha um contacto permanente com o beneficiário, devendo visitá-lo, no mínimo, com uma periodicidade quinzenal;
6) Fixar a periodicidade da revisão das medidas de acompanhamento de cinco em cinco anos (art.º 155.º, do Código Civil);
7) Determinar a publicitação da vertente sentença com a publicação de anúncios no sítio oficial”.
Inconformado veio V. G. interpor o presente recurso.
Pelo tribunal a quo foi proferido despacho que não admitiu o recurso por falta de legitimidade do Recorrente V. G..
V. G. veio apresentar reclamação ao abrigo do disposto no artigo 643º do Código de Processo Civil pugnando pela sua legitimidade e pela admissão do recurso.
Nos autos de reclamação foi proferida decisão que, revogando o despacho reclamado, recebeu o recurso e determinou a requisição do processo principal.

No recurso apresenta V. G. as seguintes conclusões:
“Concluindo
1. Nunca foi a requerente M. S. quem cuidou ou acompanhou o pai;
2. Pelo contrário tem um historial de litígios, inclusive judiciais, como resultará de uma pesquisa ao sistema CITIUS.
3. Resulta do relatório elaborado no processo que o maior, apesar das suas limitações, informou que quem sempre cuidou de si e dos seus interesses foi o filho V. G., nunca a interessada M. S..
4. Em face de tal historial deveria a requerente M. S. estar impedida de ser nomeada acompanhante de seu pai,
5. Quanto mais não fora por aplicação do regime de impedimentos do Instituto da Tutela.
6. Mas, mesmo que assim se não considerasse, sempre o historial de relacionamento conflituoso entre o maior e o requerente, agora nomeada acompanhante, imporia a constituição de Conselho de Família, o que não aconteceu.
7. Assim deveria ter sido nomeado como acompanhante do requerido o seu filho e ora recorrente V. G., que sempre dele cuidou.
8. Deveria ter sido nomeado Conselho de Família.
Considera-se violado o preceito da Lei 49/2018, 900 e 902 do C.P. CIVIL, bem como o art.º 20º da CRP”.
Pugna o Recorrente pela procedência do recurso e consequente alteração da decisão recorrida.
Pela Requerente foram apresentadas contra-alegações concluindo da seguinte forma:
“IV - CONCLUSÕES:
1º O presente recurso carece de total falta de fundamentação legal.
2º Em primeiro lugar, tendo em conta que estamos perante uma ação de acompanhamento de maior, prevista no Código Civil e Código de Processo Civil, designadamente artigos 891º e seguintes do CPC. Estipulando o art.º 901º do CPC que da decisão relativa à medida de acompanhamento cabe recurso de apelação, tendo legitimidade o requerente, o acompanhado e, como assistente, o acompanhante.
3º Carece o Recorrente de legitimidade para a interposição do presente recurso, uma vez que não ocupa nenhuma das qualidades vertidas em tal preceito legal (Requerente, Acompanhado, Acompanhante).
4º Assim sendo, constata-se que o recurso interposto pelo Recorrente não se afigura admissível, pelo que não deve ser admitido, nos termos do art.º 641º do CPC.
5º Ademais, decorre do artigo 640.º N.º 1 do CPC o seguinte:
“1. Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.”
6º Não tendo cumprido o Recorrente com tal obrigatoriedade decorrente de tal preceito legal, uma vez que se limita a manifestar a sua discordância, não elencando quais os concretos meios de prova que teriam imposto decisão diversa.
7º Assim como não elencando, os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, sendo que todos os requisitos supra referidos devem ser observados pontual e rigorosamente.
8º Ora, a convicção do tribunal só pode ser posta em causa de forma consistente em função das regras de experiência comum, ou seja, quando, pelo raciocínio lógico, da razão e do pensamento, baseado naquelas regras, se chega à conclusão de que a convicção do julgador está eivada de erro (erro de julgamento), que suscita dúvidas razoáveis que põem em causa a decisão. O que não se verifica das alegações de recurso apresentadas pelo Recorrente.
9º Desse modo, perante o supra exposto, a Recorrida entende que o recurso de apelação interposto pelo Recorrente deve ser objeto de rejeição imediata, por violação dos requisitos obrigatórios elencados no artigo 640.º do CPC.

Posto Isto,
10º No que concerne à pretensão do Recorrente, este não se conformando com a sentença datada de 07 de Fevereiro de 2020 que decidiu:
1) Decretar as seguintes medidas de acompanhamento do beneficiário J. G.:
A) Representação geral;
B) Administração total de bens.
2) Declarar que o beneficiário J. G. não pode exercer livremente os seus direitos pessoais, designadamente, os direitos de casar ou de constituir situações de união, de procriar, de perfilhar ou de adotar, de cuidar e de educar os filhos ou os adotados, de escolher profissão, de se deslocar no país ou no estrangeiro, de fixar domicílio e residência, de testar;
3) Declarar que o beneficiário J. G. não pode celebrar livremente negócios da vida corrente;
4) Designar M. S. a título de acompanhante do beneficiário J. G.;
5) Determinar que a acompanhante mantenha um contacto permanente com o beneficiário, devendo visitá-lo, no mínimo, com uma periodicidade quinzenal;
6) Fixar a periodicidade da revisão das medidas de acompanhamento de cinco em cinco anos (art.º 155.º, do Código Civil);
7) Determinar a publicitação da vertente sentença com a publicação de anúncios no sítio oficial.
11º Interpôs recurso alegando que nunca foi a Recorrida quem cuidou do Acompanhado, ao invés foi o Recorrente quem sempre cuidou dos interesses do seu pai; assim como que a Recorrida devia estar impedida de ser nomeada acompanhante do seu pai, por aplicação do regime de impedimentos do Instituto da Tutela, e subsidiariamente alega que deveria ter sido constituído o Conselho de Família, o que não aconteceu, devendo ter sido nomeado como Acompanhante o Recorrente, e por isso considera violado os artigos 900º e 902º do CPC bem como o art.º 20º da Constituição da Républica Portuguesa,
13º Sucede que, não pode a Recorrida concordar com tal entendimento, vejamos:
14º O presente processo foi intentado pela Recorrida, na qualidade de Requerente, contra o seu Progenitor J. G., de 81 anos de idade, uma vez que a mãe da Recorrida faleceu em 12 de Junho de 2012, no estado de casada com o pai da Recorrida e tendo em conta que o Requerido sofre de Alzheimer e de amnésia, assim como demência, há pelo menos dois anos,
15º E bem assim pelo facto do Requerido residir em fração autónoma contígua aquela onde reside o seu filho, aqui Recorrente, no entanto este nunca tenha dispensado qualquer atenção ao seu pai, nem cuidados devidos ao nível de alimentação, higiene, vestuário e medicação, necessários em função da idade avançada do Requerido,
16º Foi a Recorrida obrigada a intentar a presente ação, aliado a tais factos, tal decisão de interpor a presente ação, teve o seu culminar no dia 17.01.2019, uma vez que o irmão da Recorrida, como seja o aqui Recorrente, deixou o pai de ambos fechado à chave, e ele, por forma a sair de casa, deitou-se pela janela da cozinha abaixo, tendo sido socorrido no Centro de Saúde de Vila Pouca de Aguiar,
17º Tendo a Recorrida que levar o seu pai no dia 18.01.2019 ao Centro Hospitalar de Trás os Montes e Alto Douro, em Vila Real, onde o mesmo foi consultado de forma a realizar exames complementares,
18º Sendo que desse modo a Recorrida diligenciou para que o seu Progenitor fosse integrado no Hotel Sénior das …, em …, tendo necessitado de lhe comprar roupa e calçado além de pagar a mensalidade de 1.100,00€, para que o seu Pai pudesse ser acompanhado diariamente com supervisão face ao seu débil estado de saúde,
19º Além do supra exposto o Progenitor da Recorrida já não tem capacidade de cálculo, nem noção do valor do dinheiro e dos bens, não sabendo, nem tendo capacidades para gerir o seu património, nem de gerir responsabilidades financeiras perante terceiros,
20º E por isso necessita que seja nomeada uma pessoa que o represente legalmente e supra a incapacidade de reger a sua pessoa e os seus bens,
21º Ora, compulsados os autos verifica-se que a citação pessoal do Requerido, Progenitor da Recorrida, se frustrou, tendo em conta a Certidão Negativa existente nos autos, isto é, não produziu efeitos a citação do Interdito/Acompanhado em virtude de no dia 22.03.2019 após conversação com o Requerido, ter o Sr. Agente verificado que o mesmo não entendia o teor do que lhe seria transmitido,
22º Perante tal facto citou-se o Ministério Público em representação do Requerido, nos termos e para os efeitos do art.º 895º N.º 2 e art.º 21º do CPC, posteriormente foi realizado o exame pericial e procedeu-se à audição do Requerido,
23º Tendo o Tribunal a quo considerado como factos provados, os seguintes que novamente se transcrevem:
1. O Requerido J. G. nasceu em - de fevereiro de 1939 e é filho de A. J. e de A. D..
2. O Requerido J. G. apresenta um quadro de demência tipo Alzheimer e que se iniciou há cerca de dois anos, a qual não é passível de melhoras clínicas ou tratamento que alterem o estado atual.
4. O Requerido J. G. não apresenta capacidade de compreensão e livre autodeterminação do ato de casar, perfilhar, de cuidar e adotar os filhos, nem de exercer plenamente as responsabilidades parentais.
5. O Requerido J. G. não possui capacidade de compreensão e livre autodeterminação para testar, nem para administrar total ou parcialmente o seu património.
Inexistindo factos não provados,
24º Ora, se é certo que o Recorrente também é filho do Acompanhado, também é certo que este teve conhecimento do processo, bem antes de ter sido proferida sentença, uma vez que em Setembro de 2019 deu entrada com um requerimento nos autos, nunca se pronunciando em relação ao pedido da aqui Recorrida,
Ademais,
25º Não merece acolhimento a alegação vertida pelo Recorrente de que o Requerido não sofria de doença que o afete, bastará para isso analisar o Relatório Pericial junto aos autos, de onde facilmente se vislumbra que:
“O examinando apresentou dificuldades em fornecer dados (…)”
“Não sabe dizer o nome completo”
“Não sabe dizer o local onde reside”
“Desorientado no tempo e espaço”
“Alterações muito acentuadas na memória recente e retrógrada. Diz estar viúvo há cerca de ½ ano, não conseguiu inicialmente dizer quantos filhos tinha e o nome dos mesmos, onde mora”.
“Não conseguiu dizer quantos netos tem e nome dos mesmos”
“Nível de conhecimentos muito limitado, mostrando pouca atenção pelo que se passa fora da esfera visual”.
“Não sabe ver as horas no relógio”.
26º Concluindo assim em tal Relatório que o Requerido “apresenta um quadro de Demência de tipo Alzheimer em grau moderado e que se iniciou pelo menos há cerca de 2 anos e agravamento no último ano;
2º. - Tal afetação é crónica e definitiva; 3º - Tal doença não é passível de tratamento ou melhoras clínicas que alterem o estado atual. As medidas de apoio são as necessárias para poder garantir a sua proteção e satisfação das suas necessidades e garantia das atividades de vida diárias; 4 º - Dando resposta ao artigo 145º do Código Civil o Examinando encontra-se impossibilitado para a administração total dos seus bens. 5º - Dando resposta ao enunciado no artigo 147º do Código Civil o Examinando apresente uma incapacidade para poder exercer os seus direitos pessoais na totalidade, nomeadamente para as situações definidas como testar, perfilhar, adotar, cuidar e educar filhos ou adotado, casar constituir união de facto, estabelecer relações com quem entende, escolher profissão, deslocar-se no país e estrangeiro, votar, ser candidato, ou ser eleito para cargos de natureza pública”.
27º Logo, não corresponde à verdade o alegado pelo Recorrente de que o Requerido não sofria ou sofria de forma suave de doença,
28º Assim como não pode a Recorrida aceitar a alegação do Recorrente de que não é a Requerente a pessoa indicada para ser nomeada acompanhante do seu pai, uma vez que conforme muito bem sabe, a Recorrida sempre se preocupou com o seu pai, cuidou dele e zelou pelos seus interesses,
29º Além disso foi a Recorrida quem interpôs a presente ação, uma vez que se preocupa com o Progenitor e tem total conhecimento de que este necessita do Acompanhamento, por já não ser capaz de se cuidar, nem sequer de administrar os seus bens. Ação prevista no Código Civil, nomeadamente no artigo 138º e seguintes do Código Civil,
30º Consagrando o art.º 138º do Código Civil que: o maior impossibilitado, por razões de saúde, deficiência, ou pelo seu comportamento, de exercer, plena, pessoal e conscientemente, os seus direitos ou de, nos mesmos termos, cumprir os seus deveres, beneficia das medidas de acompanhamento previstas neste Código.
31º Assim, prevê o art.º 139º do mesmo Código que: o acompanhamento é decidido pelo tribunal, após audição pessoal e direta do beneficiário, e ponderadas as provas.
32º Ora, in casu, foi assim que aconteceu, isto é, depois de produzidas todas as provas carreadas para os autos , o Tribunal decidiu pelo acompanhamento,
33º Ademais, estipula o artigo 141.º do Código Civil que:
1 - O acompanhamento é requerido pelo próprio ou, mediante autorização deste, pelo cônjuge, pelo unido de facto, por qualquer parente sucessível ou, independentemente de autorização, pelo Ministério Público.
2 - O tribunal pode suprir a autorização do beneficiário quando, em face das circunstâncias, este não a possa livre e conscientemente dar, ou quando para tal considere existir um fundamento atendível.
3 - O pedido de suprimento da autorização do beneficiário pode ser cumulado com o pedido de acompanhamento.
34º No que concerne ao Acompanhante, de acordo com o artigo 143º do Código Civil, este tem de ser maior e no pleno exercício dos seus direitos, sendo escolhido pelo acompanhado ou pelo seu representante legal, sendo designado judicialmente.
35º Sendo que, na falta de escolha, o acompanhamento é deferido, no respetivo processo, à pessoa cuja designação melhor salvaguarde o interesse imperioso do beneficiário, designadamente:
a) Ao cônjuge não separado, judicialmente ou de facto;
b) Ao unido de facto;
c) A qualquer dos pais;
d) À pessoa designada pelos pais ou pela pessoa que exerça as responsabilidades parentais, em testamento ou em documento autêntico ou autenticado;
e) Aos filhos maiores;
f) A qualquer dos avós;
g) À pessoa indicada pela instituição em que o acompanhado esteja integrado;
h) Ao mandatário a quem o acompanhado tenha conferido poderes de representação;
i) A outra pessoa idónea.
36º Tal como sucedeu no caso em apreço,
37º Uma vez que o Tribunal a quo considerou provado, tendo resultado inequivocamente dos autos que o Requerido sofre de anomalia grave, que o impossibilita de exercer plena, pessoal e conscientemente os direitos ou cumprir os seus deveres, sendo que a predita factologia não é suscetível de suprimento em sede de deveres gerais de cooperação e assistência no âmbito familiar.
38º In casu afere-se que a aqui Recorrida filha do Requerido, se prefigura dotada de capacidade de exercício de direitos, inexistindo motivos fáticos passíveis de inquinar a adequação do mesmo, logo, tem a Recorrida legitimidade e capacidade para ser nomeada como Acompanhante do seu pai.
39º Além de que se revela necessário proteger o Requerido mediante acompanhamento por terceiro, de forma a serem acautelados os interesses do Acompanhado, nos termos e para os efeitos do art.º 145º do Código Civil,
40º Ora, a designação judicial do Acompanhante na ausência de escolha, que a magnitude da afeção apresentada pelo Beneficiário inviabiliza que seja efetuada de forma consciente), deve recair sobre a pessoa cuja designação salvaguarde o interesse do Benificiário, critério que no caso concreto reconduz à Recorrida/Requerente,
41º Logo, não merece acolhimento a alegação do Recorrente de que a Recorrida não é a pessoa indicada para desempenhar tal função, sendo certo que existe legislação aplicável, como a supra referida,
42º Quando a figura do acompanhamento de maior se encontra plasmada na lei, inexistindo qualquer lacuna no que concerne à legitimidade e à nomeação do Acompanhante,
43º Ainda, no que concerne à nomeação do Conselho de Família, conforme decorre da fundamentação da sentença proferida pelo Tribunal a quo: No que se refere ao conselho de família, o mesmo é constituído por dois vogais e pelo magistrado do Ministério Público, que preside, sendo que os vogais são escolhidos entre os parentes ou afins da menor, tomando em conta, nomeadamente, a proximidade do grau, as relações de amizade, as aptidões, a idade o lugar de residência e o interesse manifestado pela pessoa do menor (art.º 1952.º/1 do C.C.).
Pertence ao conselho de família vigiar o modo por que são desempenhadas as funções do tutor e exercer as demais atribuições que a lei especialmente lhe confere, nos termos do art.º 1954.º, do Código Civil, sendo que a fiscalização da acção do tutor é exercida com carácter permanente por um dos vogais do conselho de família, denominado protutor (art.º 1955.º/1 do C.C.).
In casu, afere-se que M. S., filha do Requerido, se prefigura dotada de capacidade de exercício de direitos, pelo que, inexistindo motivos fácticos passíveis de inquinar a adequação do mesmo, impõe-se a sua designação como acompanhante.
Acresce que, ante as preditas medidas de acompanhamento, não se impõe a constituição do conselho de família.
44º Entendimento que corrobora a aqui Recorrida,
45º Uma vez que dispõe o artigo 145º N.º 4 do Código Civil que a representação legal segue o regime da tutela, com as adaptações necessárias, podendo o tribunal dispensar a constituição do conselho de família.
46º O que fez no caso em apreço, porquanto tal não se revelou necessário, atendendo a toda a prova produzida e carreada para os autos,
47º Ainda, o Recorrente vem alegar que devia ter sido realizada a sua Audição, o certo é que o Recorrente após ter tido conhecimento dos autos, bem antes de ter sido proferida sentença, não requereu a sua intervenção,
48º Limitou-se a deixar os autos seguir os seus normais trâmites, não se opondo ao peticionado pela Requerente,
49º Logo, não poderá nunca invocar que se encontra violado o direito do contraditório, quando este não exerceu tal direito porque não quis.
50º Por último, caso o Recorrente pretenda invocar a inconstitucionalidade do art.º 901º do CPC, tal deverá ser efetuado em sede própria, designadamente junto do Tribunal Constitucional, não possuindo este Tribunal competência para se pronunciar sobre tal questão, que deverá considerar-se como não escrita.
51º Assim, entende a Recorrida que o recurso deverá ser considerado improcedente, por total falta de fundamento, mantendo-se a decisão proferida pelo Tribunal a quo”.
Pugna a Requerente pela improcedência do recurso e manutenção da decisão recorrida.
Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre apreciar e decidir.

***
II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso (artigo 639º do CPC).

As questões a decidir, tendo em conta o teor das conclusões formuladas pelo Recorrente, são as seguintes:

1) Saber quem deve ser nomeado acompanhante;
2) Saber se deve ser nomeado Conselho de Família.
***
III. FUNDAMENTAÇÃO

3.1.Os factos
Factos considerados provados em Primeira Instância:

1. O Requerido J. G. nasceu em - de fevereiro de 1939 e é filho de A. J. e de A. D..
2. O Requerido J. G. apresenta um quadro de demência tipo Alzheimer e que se iniciou há cerca de dois anos, a qual não é passível de melhoras clínicas ou tratamento que alterem o estado actual.
4. O Requerido J. G. não apresenta capacidade de compreensão e livre autodeterminação do acto de casar, perfilhar, de cuidar e adoptar os filhos, nem de exercer plenamente as responsabilidades parentais.
5. O Requerido J. G. não possui capacidade de compreensão e livre autodeterminação para testar, nem para administrar total ou parcialmente o seu património.
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3.2 O DIREITO

Sustenta o Recorrente que foi quem sempre cuidou do pai e dos seus interesses e nunca a sua irmã M. S., que esta devia estar impedida de ser nomeada acompanhante de seu pai, e que deveria ter sido nomeado como acompanhante o Recorrente; sustenta ainda que, mesmo que assim se não considerasse, sempre o historial de relacionamento conflituoso entre o pai e a Requerente imporia a constituição de Conselho de Família.
Vejamos se lhe assiste razão.
Importa salientar em primeiro lugar (em face das questões suscitadas pela Requerente nas suas contra-alegações) que a questão da legitimidade do Recorrente para interposição do recurso se mostra já definitivamente decidida na Reclamação apensa aos presentes autos.
A Requerente invoca ainda o incumprimento pelo Recorrente dos ónus previstos nos artigos 639º e 640º, ambos do Código de Processo Civil.
O artigo 639º respeita ao ónus de alegar e formular conclusões e dispõe no seu n.º 1 que o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão; versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar: a) As normas jurídicas violadas; b) O sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas; c) Invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada (n.º 2).
Da simples análise das alegações apresentadas concluímos facilmente pelo cumprimento do ónus de alegar e formular conclusões pelo Recorrente.
Quanto ao ónus previsto no artigo 640º n.º 1 do Código de Processo Civil reporta-se à impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
Dispõe este preceito (sob a epigrafe “Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto”) que “1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. 2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes”.
O legislador impõe de forma expressa ao recorrente que impugna a decisão relativa à matéria de facto tal ónus de especificar e o incumprimento do ónus implica a rejeição do recurso, na parte respeitante, sem possibilidade sequer de introdução de despacho de aperfeiçoamento.
Porém, tal ónus não tem aplicação no caso concreto uma vez que o Recorrente não veio impugnar a decisão sobre a matéria de facto.
Por outro lado, cumpre também realçar que nos presentes autos o Recorrente não veio colocar em causa a necessidade de decretar o acompanhamento do Requerido J. G. e nem a medida de acompanhamento decretada de representação geral e administração total de bens.
O Recorrente pretende apenas ver alterada a decisão do Tribunal a quo, relativamente ao acompanhante nomeado e à constituição do Conselho de Família.
De facto, decidiu o Tribunal a quo nomear como acompanhante a Requerente, filha do beneficiário e não proceder à constituição do Conselho de Família.

Na decisão proferida em 1ª Instância foi considerado que:
“(…) In casu, afere-se que M. S., filha do Requerido, se prefigura dotada de capacidade de exercício de direitos, pelo que, inexistindo motivos fácticos passíveis de inquinar a adequação do mesmo, impõe-se a sua designação como acompanhante.
Acresce que, ante as preditas medidas de acompanhamento, não se impõe a constituição do conselho de família”.
Vejamos então.
A Lei n.º 49/2018, de 14 de agosto veio criar, eliminando os institutos da interdição e da inabilitação, previstos no Código Civil (de ora em diante designado apenas por CC), e procedendo à alteração de diversos diplomas, aliás conforme expressamente consignado no seu artigo 1º.
Este regime veio dar concretização a vários princípios internacionais, designadamente consagrados na Convenção das Nações Unidas de 30 de março de 2007 sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, adotada em Nova Iorque (aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 56/2009, de 07 de maio, e ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 71/2009, de 30 de julho) em cujo artigo 1º se estabelece que o seu objecto é “promover, proteger e garantir o pleno e igual gozo de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais por todas as pessoas com deficiência e promover o respeito pela sua dignidade inerente”, comprometendo-se os Estados Partes nos termos do artigo 4º “a assegurar e promover o pleno exercício de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais para todas as pessoas com deficiência sem qualquer discriminação com base na deficiência”.
Conforme se pode ler na Proposta de Lei n.º 110/XIII (disponível em https://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=42175) importava “assegurar o tratamento condigno não só das pessoas idosas mas também das de qualquer idade carecidas de proteção, seja qual for o fundamento dessa necessidade. O Código Civil não pode ficar indiferente ao aumento das limitações naturais da população, determinante de um acréscimo de patologias limitativas, fruto do aumento da esperança de vida, de um melhor diagnóstico, de uma diminuição da capacidade agregadora das famílias e, em certos casos, das próprias condições de vida prevalecentes”, salientando-se a desadequação do regime das interdições e inabilitações até então previsto no Código Civil perante essa realidade, desde logo a sua rigidez que “obsta à maximização dos espaços de capacidade de que a pessoa ainda é portadora; o carácter estigmatizante da denominação dos instrumentos de proteção; o papel da família que ora dá, ao necessitado, todo o apoio no seu seio, ora o desconhece; o tipo de publicidade previsto na lei, com anúncios prévios nos tribunais, nas juntas de freguesia e nos jornais, perturbador do recato e da reserva pessoal e familiar que sempre deveria acompanhar situações deste tipo”.
O novo regime jurídico do maior acompanhado, aprovado pela Lei n.º 49/2018, de 14 de Agosto, afastou-se assim do sistema dualista até então consagrado da interdição/inabilitação, demasiado rígido, e veio introduzir um regime monista e flexível norteado pelos princípios da “primazia da autonomia da pessoa, cuja vontade deve ser respeitada e aproveitada até ao limite do possível” e da “subsidiariedade de quaisquer limitações judiciais à sua capacidade, só admissíveis quando o problema não possa ser ultrapassado com recurso aos deveres de proteção e de acompanhamento comuns”, e por um “modelo de acompanhamento e não de substituição, em que a pessoa incapaz é simplesmente apoiada, e não substituída, na formação e exteriorização da sua vontade” (v. a Proposta de Lei n.º 110/XIII).
Estabeleceu-se, dessa forma, no artigo 140º do CC que o acompanhamento do maior visa assegurar o seu bem-estar, a sua recuperação, o pleno exercício de todos os seus direitos e o cumprimento dos seus deveres, salvo as exceções legais ou determinadas por sentença (n.º 1) e que a medida não tem lugar sempre que o seu objetivo se mostre garantido através dos deveres gerais de cooperação e de assistência que no caso caibam (n.º 2).
E conferiu-se ao futuro acompanhado a escolha do acompanhante, sujeita, no entanto, a confirmação pelo Tribunal, conforme decorre do disposto no n.º 1 do artigo 143º do CC.

Nos termos do disposto neste artigo 143º o acompanhante, maior e no pleno exercício dos seus direitos, é escolhido pelo acompanhado ou pelo seu representante legal, sendo designado judicialmente (n.º 1) e, na falta de escolha, o acompanhamento é deferido, no respetivo processo, à pessoa cuja designação melhor salvaguarde o interesse imperioso do beneficiário, designadamente:
a) Ao cônjuge não separado, judicialmente ou de facto;
b) Ao unido de facto;
c) A qualquer dos pais;
d) À pessoa designada pelos pais ou pela pessoa que exerça as responsabilidades parentais, em testamento ou em documento autêntico ou autenticado;
e) Aos filhos maiores (…).

O n.º 3 deste artigo prevê também a possibilidade de o acompanhado ter vários acompanhantes com diferentes funções, especificando-se as atribuições de cada um.
O artigo 144º do CC prevê ainda a possibilidade de escusa e exoneração, ressalvando que o cônjuge, descendentes e ascendentes não podem escusar-se ou ser exonerados (n.º 1), podendo contudo os descendentes ser exonerados a seu pedido, ao fim de cinco anos, se existirem outros descendentes igualmente idóneos (n.º 2).
E o artigo 146º estabelece que no exercício da sua função, o acompanhante privilegia o bem-estar e a recuperação do acompanhado, com a diligência requerida a um bom pai de família, na concreta situação considerada, mantendo um contacto permanente com o acompanhado, devendo visitá-lo, no mínimo, com uma periodicidade mensal, ou outra periodicidade que o tribunal considere adequada.
Conforme já referimos não vem questionada nos autos a necessidade de decretar o acompanhamento e nem a medida de acompanhamento decretada, mas a nomeação de acompanhante decidida pelo Tribunal a quo.
Entende o Recorrente que devia ter sido nomeado acompanhante e não a sua irmã, a Requerente M. S..
Quid iuris?
Em face do preceituado no referido artigo 143º do CC será de concluir, pelo menos em abstracto, que o cargo de acompanhante poderia ser atribuído a qualquer um dos filhos maiores do Requerido, o Recorrente ou a Requerente (ou a outro filho, na eventualidade da sua existência), devendo ser nomeado, em concreto, aquele que melhor salvaguarde o interesse imperioso do beneficiário.
É este - o interesse imperioso do beneficiário - que deve ter-se como critério para a nomeação de acompanhante.
A este propósito (nomeação da Requerente como acompanhante) o Tribunal a quo limitou-se a consignar que a Requerente M. S., “se prefigura dotada de capacidade de exercício de direitos” e que “inexistindo motivos fácticos passíveis de inquinar a adequação do mesmo” se impõe a sua designação como acompanhante.
Porém, dos factos provados nada resulta quanto a tal matéria que permita concluir que a Requerente é a que melhor salvaguarda o interesse imperioso do beneficiário, em particular quando outro filho do Requerido veio aos autos manifestar a sua pretensão em ser nomeado acompanhante do beneficiário.
Quanto ao Recorrente, também nada consta dos factos provados que permita concluir que existam “motivos fácticos passíveis de inquinar a adequação do mesmo”, inexistindo da fundamentação da decisão recorrida qualquer menção ao mesmo e qualquer justificação que permita perceber qual o critério que presidiu à nomeação da Requerente como acompanhante em detrimento do Recorrente.
E se é certo que a Requerente, respondendo ao requerimento apresentado pelo Recorrente, veio alegar que este se desvinculou dos cuidados que a condição de saúde do pai exigia, tendo-o deixado ao abandono e em risco para a vida; a verdade é que do despacho de arquivamento proferido nos Autos de Inquérito n.º 41/19.4T9VPA, instaurado na sequência da denúncia apresentada pela Requerente contra o Recorrente (queixando-se que o pai “estava a viver com o participado mas este não lhe dispensava a atenção e os cuidados devidos, em função da sua avançada idade e do seu debilitado estado de saúde, nomeadamente quanto a alimentação, higiene, vestuário, calçado e medicação”) consta que “o que os autos demonstram à saciedade são as relações conflituosas entre os intervenientes em que o motivo principal gira à volta do património deixada pela mãe e pertença do pai”.
Por outro lado, invocando o Recorrente a existência de outros processos judiciais a correr termos, intentados pelo Requerente, designadamente ainda o Requerido não sofria ou sofria de forma muito suave da doença que o afeta, para fundamentar que a Requerente se encontra impedida de ser nomeada acompanhante do pai, também não procede à identificação de nenhum.
Temos entendido que, não tendo o beneficiário escolhido o acompanhante, em regra deverá ser nomeado alguém do seu círculo pessoal e familiar que reúna condições para o exercício do cargo, e só nessa impossibilidade, a escolha deverá recair sobre estranhos sem ligação pessoal ou afectiva ao acompanhado.
Porém, ainda que a escolha recaia sobre alguém do círculo familiar do acompanhado, a sua nomeação deverá ser sempre precedida da realização de diligências que permitam perceber se os mesmos reúnem condições para exercerem o cargo de acompanhante e qual dos familiares, designadamente os filhos, reúne as melhores condições para o exercício do cargo, considerando que no exercício da sua função, o acompanhante deve sempre privilegiar o bem-estar e a recuperação do acompanhado, mantendo um contacto permanente com o mesmo, devendo visitá-lo, no mínimo, com uma periodicidade mensal, ou outra periodicidade que o tribunal considere adequada, e tendo sempre presente o interesse do beneficiário.
Entendemos, por isso, que nos presente autos se mostra necessário realizar diligências para determinar se os filhos do beneficiário reúnem condições para o exercício do cargo de acompanhante e qual dos filhos reúne as melhores condições para o exercício desse cargo, salvaguardando-se que a lei permite também a nomeação de mais do que um acompanhante com diferentes funções (cfr. artigo 143º n.º 3).
Do exposto decorre que deve ser revogada a decisão recorrida na parte respeitante à nomeação da Requerente M. S. como acompanhante e devem ser realizadas diligências para determinar qual dos familiares do acompanhado, designadamente dos filhos, deverá ser nomeado acompanhante, ficando prejudicado neste momento o conhecimento da questão da constituição do Conselho de Família.
As custas são da responsabilidade da Requerente atento o seu decaimento (artigo 527º do Código de Processo Civil).
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SUMÁRIO (artigo 663º n.º 7 do Código do Processo Civil)

I – O novo regime jurídico do maior acompanhado, aprovado pela Lei n.º 49/2018, de 14 de Agosto, afastou-se do sistema dualista, até então consagrado, da interdição/inabilitação, demasiado rígido, e veio introduzir um regime monista e flexível norteado pelos princípios da “primazia da autonomia da pessoa, cuja vontade deve ser respeitada e aproveitada até ao limite do possível” e da “subsidiariedade de quaisquer limitações judiciais à sua capacidade, só admissíveis quando o problema não possa ser ultrapassado com recurso aos deveres de proteção e de acompanhamento comuns”, e por um “modelo de acompanhamento e não de substituição, em que a pessoa incapaz é simplesmente apoiada, e não substituída, na formação e exteriorização da sua vontade”.
II – Nos termos do disposto no artigo 143º do CC o acompanhante é escolhido pelo acompanhado ou pelo seu representante legal, sendo designado judicialmente e, na falta de escolha, o acompanhamento é deferido, no respetivo processo, à pessoa cuja designação melhor salvaguarde o interesse imperioso do beneficiário.
III – Ainda que a escolha recaia sobre alguém do círculo familiar do acompanhado, a nomeação do acompanhante deverá ser sempre precedida da realização de diligências que permitam perceber se os mesmos reúnem condições para exercerem o cargo de acompanhante e qual reúne as melhores condições, considerando que no exercício da sua função, o acompanhante deve sempre privilegiar o bem-estar e a recuperação do acompanhado, mantendo um contacto permanente com o mesmo, devendo visitá-lo, no mínimo, com uma periodicidade mensal, ou outra periodicidade que o tribunal considere adequada, e tendo sempre presente o interesse do beneficiário.
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V. Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar procedente a apelação e, em consequência, revogam a decisão recorrida na parte em que nomeou acompanhante a Requerente M. S., determinando que sejam realizadas diligências para designar quem deve ser nomeado acompanhante.
Custas pela Requerente.
Guimarães, 12 de novembro de 2020
Texto elaborado em computador e integralmente revisto pela signatária

Raquel Baptista Tavares (Relatora)
Margarida Almeida Fernandes (1ª Adjunta)
Margarida Sousa (2ª Adjunta)