EMPREITADA
PAGAMENTO FASEADO
VENCIMENTO
Sumário


I- Num contrato de empreitada em que se convencionou ser o preço pago gradualmente em função da adjudicação, da execução e da conclusão dos trabalhos, e pretendendo o empreiteiro o pagamento do remanescente do preço da obra, cabe-lhe a prova de que concluiu os trabalhos.
II- Ante a demonstração da falta de conclusão dos trabalhos, não se venceu a última prestação do preço acordado, e, por isso, o réu tem o direito de recusar o seu pagamento.

Texto Integral


Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I. Relatório

C. B. apresentou requerimento de injunção contra R. G., pedindo o pagamento da quantia global de € 5.391,07, relativa a capital em dívida, juros, despesas e taxa de justiça.
Para tanto, e em síntese, alegou que, no exercício da sua actividade, entre outras, de instalação de sistemas eléctricos e de canalizações, prestou e forneceu ao requerido os serviços a que se referem as facturas n.ºs 425 e 426, de 2 de Julho de 2018, nos montantes, respectivamente, de € 3.350,00 e € 1.592,00, reclamando, por isso, o respectivo pagamento, acrescido dos juros, vencidos e vincendos, até integral pagamento.
Reclama, ainda, o pagamento de taxa de justiça e dos honorários de advogado, no montante global de € 252,00.

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Notificado, o requerido deduziu oposição à injunção (ref.ª 32422879), pugnando pela apresentação do processo à distribuição nos termos do art. 16º do anexo do DL 269/98, de 1 de setembro, com as devidas consequências.
Além de invocar a ineptidão da petição, por falta de causa de pedir, o requerido sustentou nada dever ao requerente, porquanto, e em síntese, os serviços de instalação de um sistema de rega, de protecção anti-geada e de ferti-rega solicitados ao autor nunca foram concluídos, faltando-lhe elementos que permitiriam o seu funcionamento.
Conclui que, por isso, e porque já entregou cerca de € 10.000,00 para pagamento parcial dos trabalhos, quantia superior à prevista para o estado da obra, lhe assiste o direito de recusar o pagamento do remanescente do preço antes da execução dos trabalhos em falta.
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Exercido o contraditório, o requerente respondeu, refutando a verificação da excepção de ineptidão da petição inicial e impugnando a matéria relativa à falta de conclusão dos trabalhos (ref.ª 32701042).
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Por despacho datado de 17/06/2019, foi julgada improcedente a excepção de ineptidão da petição inicial, tendo sido designada data para audiência de discussão e julgamento (ref.ª 16395627).
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Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento (ref.ª 164773628, 165122295 e 165616629).
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Posteriormente, a Mm.ª Julgadora “a quo” proferiu sentença (ref.ª 165800704), nos termos da qual decidiu julgar a acção improcedente, por não provada, e, consequentemente, absolveu o réu do pedido contra si formulado nos autos.
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Inconformado, o autor interpôs recurso da sentença (ref.ª 34611926) e, a terminar as respectivas alegações, formulou as seguintes conclusões (que se transcrevem):

«I. Entende o Recorrente que foram incorrectamente julgados os itens 1. a 4. Da sentença proferida.
II. Com efeito, da prova produzida nos presentes autos resulta manifesto o erro de julgamento em que incorreu o Tribunal a quo, sendo os seguintes meios de prova em que se basei o inconformismo do Recorrente:
a) Depoimento do Autor prestado na sessão de julgamento de 09.09.2019, gravado digitalmente na aplicação informática em uso, com início às 14:23 e término às 14:56;
b) Depoimento da testemunha M. P. prestado na sessão de julgamento de 09.09.2019, gravado digitalmente na aplicação informática em uso, com início às 15:23 e término às 16:07;
c) Depoimento da testemunha A. R. prestado na sessão de julgamento de 09.09.2019, gravado digitalmente na aplicação informática em uso, com início às 16:07 e término às 14:35;
III. Considerando os referidos meios de prova, devidamente identificados nas Alegações, tem o Recorrente como certo que a resposta dada aos itens 1., 2., 3 e 4. deve ser corrigida para:
«1. No exercício da sua actividade de instalação de sistemas eléctricos e canalizações, o autor aceitou executar os trabalhos de instalação de dois sistemas de rega gota a gota, protecção anti-geada e fertirrigação, que lhe foram solicitados pelo réu, mediante a entrega da contraprestação global de € 13.350,00 (treze mil, trezentos e cinquenta euros), cada um, a satisfazer em prestações; sendo a primeira de 30% a entregar com a adjudicação dos trabalhos, a segunda de 35%, a entregar durante a execução, e a terceira de 35%, a entregar com a conclusão dos trabalhos.
2. Com a aceitação do primeiro acordo descrito em 1., o réu entregou ao autor a quantia de € 4.000,00 (quatro mil euros); Com a aceitação do segundo acordo descrito em 1., o réu entregou ao autor a quantia de € 4.000,00 (quatro mil euros).
3. Durante a execução dos trabalhos referentes ao primeiro acordo, o réu entregou ao autor a quantia de € 2.000,00 (dois mil euros).».
«4. Dos sistemas acordados, não foi totalmente instalado o sistema de protecção de geada e não foi instalado o sistema de ferti-rega.»
IV. Como decorre de tudo quanto acaba de ficar dito, mercê da correcção que se impõe quanto à matéria de facto, a solução jurídica dada à questão sub judice fica naturalmente comprometida, por ser evidente o seu desacerto;
V. Desde logo, dos depoimentos prestados e transcritos supra, os pagamentos realizados pelo Réu foram feitos por conta de:
- € 4.000,00 (quatro mil euros) por conta da adjudicação do primeiro terreno;
- € 4.000,00 (quatro mil euros) por conta da adjudicação do segundo terreno;
- € 2.000,00 (dois mil euros) por conta da execução do primeiro terreno. terrenos distintos, à efectiva execução de trabalhos em dois terrenos diferentes, não pode o Tribunal a quo julgar que o valor pago pelo Réu/Recorrido, pela adjudicação do segundo projecto / terreno simplesmente passe a ser por conta do primeiro projecto / terreno, para que este não ficasse por pagar,
VII.E que nada mais haja a pagar pelo Réu / Recorrido ao Autor / Recorrente, designadamente os trabalhos executados por este.
VIII. Não pode o aqui Recorrente discordar mais deste entendimento uma vez que, conforme ficara demonstrado, foi-lhe adjudicado um segundo terreno, onde este ainda foi colocar os tubos de gota-a-gota, peticionados na factura n.º 426, atempadamente junta aos autos.
IX. Tem, assim, o ora Recorrente como certo que está claramente demonstrado que lhe foi solicitada e adjudicada pelo Recorrido duas prestações de serviços (idênticas) em dois terrenos diferentes,
X. Pelo que deve revogar-se a decisão proferida e substituir-se por outra que julgue a acção totalmente procedente, por provada, e em consequência condene o Réu no pagamento do pedido contra ele formulado.
XI. Mercê da correcção que se impõe quanto à matéria de facto, a solução jurídica dada à questão sub judice fica, naturalmente, comprometida, por ser evidente o seu desacerto.
XII. Nos termos do art. 1.207.º do Código Civil: «Empreitada é o contrato pelo qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar certa obra, mediante um preço.».
XIII. Conforme ficou demonstrado, entre Autor/Recorrente e Réu/Recorrido, existiram dois contratos de empreitada e,
XIV. Pese embora os trabalhos não hajam sido concluídos, o certo é que o Réu/Recorrido apenas procedeu ao pagamento das duas adjudicações (€ 4.000,00 por cada adjudicação de projectos), acrescido do montante de € 2.000,00 (dois mil euros), para execução de trabalhos, cifra muito aquém dos trabalhos realizados pelo Autor / Recorrente.
XV. Assim, em face da alteração da matéria de facto, deve revogar-se a decisão proferida e substituir-se por outra que julgue a acção totalmente procedente, por provada, e em consequência condene o Réu no pagamento do pedido contra ele formulado.
XVI. Ainda que se entenda que improcede a acima invocada impugnação da matéria de facto, o que não se concebe e apenas se equaciona por mera cautela de patrocínio, sempre deverá considerar-se que mesmo com a factualidade dada como assente na sentença recorrida, o Tribunal a quo errou na solução jurídica dada ao caso em análise.
XVII. Porquanto, mesmo que se considerasse ter existido um acordo verbal (cujos contornos a Mm.ª Juiz a quo não acautelou conhecer), em que os pagamentos realizados por conta do segundo projecto / terreno, reverteriam integralmente para os trabalhos executados no primeiro projecto / terreno,
XVIII. O Tribunal a quo tomou tomado conhecimento da adjudicação de um segundo projecto / terreno, e do início de trabalhos nele realizados,
XIX. Julgar que nada mais é devido ao Autor / Recorrente, consubstancia uma verdadeira injustiça, contrária, pois, ao princípio da boa-fé nas relações contratuais e, não menos importante, ao fim último dos Tribunais.
XX. Pelo que se requer se dignem V. Exas. revogar aquela decisão e substituí-la por outra que condene o Réu / Recorrido no pagamento peticionado pelo Autor / Recorrente.

Termos em que, e com o douto suprimento de V. Ex.ªs, deve dar-se provimento ao presente recurso, em conformidade com as conclusões acabadas de alinhar e com todas as legais consequências.
Assim decidindo, farão V.ªs Ex.ªs, como se espera, a habitual JUSTIÇA!»
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Contra-alegou o réu/recorrido, pugnando pelo não provimento do recurso e manutenção da sentença recorrida (Ref.ª 35701347).
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O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (Ref.ª 168529853).
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II. Questões a decidir.

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do(s) recorrente(s), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso e não tenham sido ainda conhecidas com trânsito em julgado [cfr. arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por CPC), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho].

No caso, as questões que se colocam à apreciação deste tribunal, por ordem lógica da sua apreciação, consistem em saber:

1.ª – Da impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto;
2ª – Da reapreciação da matéria de direito.
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III. Fundamentos

I. Fundamentação de Facto.

A. A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos:

1. No exercício da sua actividade de instalação de sistemas eléctricos e canalizações, o autor aceitou executar os trabalhos de instalação de um sistema de rega gota a gota, protecção anti-geada e fertirrigação, que lhe foram solicitados pelo réu, mediante a entrega da contraprestação global de € 13.350,00 (treze mil, trezentos e cinquenta euros), a satisfazer em prestações; sendo a primeira de 30% a entregar com a adjudicação dos trabalhos, a segunda de 35%, a entregar durante a execução, e a terceira de 35%, a entregar com a conclusão dos trabalhos.
2. Com a aceitação do acordo descrito em 1., o réu entregou ao autor a quantia de € 4.000,00 (quatro mil euros).
3. Durante a execução dos trabalhos, o réu entregou ao autor as quantias de € 4.000,00 (quatro mil euros) e de € 2.000,00 (dois mil euros).
4. Dos sistemas acordados, não foi instalado o sistema de protecção de geada nem o sistema de ferti-rega.
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Com relevo e interesse para a decisão da causa, inexistem factos não provados.
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IV. Fundamentação de Direito.

1. Da impugnação da matéria de facto.

1.1. Em sede de recurso, o apelante impugna a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo tribunal de 1.ª instância.

Para que o conhecimento da matéria de facto se consuma, deve previamente o recorrente, que impugne a decisão relativa à matéria de facto, cumprir o (triplo) ónus de impugnação a seu cargo, previsto no artigo 640º do CPC, o qual dispõe que:

1- Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2- No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º».

Aplicando tais critérios ao caso, constata-se que o recorrente indica quais os concretos pontos de factos que pretende que sejam decididos de modo diverso, as respostas que devem ser proferidas sobre as questões de facto impugnadas, como ainda o(s) meio(s) probatório(s) que na sua ótica o impõe(m), incluindo, no que se refere à prova gravada em que faz assentar a sua discordância, a indicação dos elementos que permitem a sua identificação e localização, procedendo inclusivamente à transcrição dos excertos que considera relevantes, pelo que podemos concluir que cumpriu suficientemente o ónus estabelecido no citado art. 640º.
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1.2. Sob a epígrafe “Modificabilidade da decisão de facto”, preceitua o artigo 662.º, n.º 1 do CPC, que «a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa».
Aí se abrangem, naturalmente, as situações em que a reapreciação da prova é suscitada por via da impugnação da decisão sobre a matéria de facto feita pelo recorrente.

O âmbito da apreciação do Tribunal da Relação, em sede de impugnação da matéria de facto, estabelece-se, resumidamente, de acordo com os seguintes parâmetros (1):

- só tem que se pronunciar sobre a matéria de facto impugnada pelo recorrente;
- sobre essa matéria de facto impugnada, tem que realizar um novo julgamento;
- nesse novo julgamento forma a sua convicção de uma forma autónoma, de acordo com o princípio da livre apreciação das provas, mediante a reapreciação de todos os elementos probatórios que se mostrem acessíveis (e não apenas os indicados pelas partes).
- a reapreciação da matéria de facto por parte da Relação tem que ter a mesma amplitude que o julgamento de primeira instância.
- a intervenção da Relação não se pode limitar à correção de erros manifestos de reapreciação da matéria de facto, sendo também insuficiente a menção a eventuais dificuldades decorrentes dos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação das provas.
- ao reapreciar a prova, valorando-a de acordo com o princípio da livre convicção, a que está também sujeita, se conseguir formar, relativamente aos concretos pontos impugnados, uma convicção segura acerca da existência de erro de julgamento da matéria de facto, deve proceder à modificação da decisão.
- se a decisão factual do tribunal da 1ª instância se basear numa livre convicção objetivada numa fundamentação compreensível onde se optou por uma das soluções permitidas pela razão e pelas regras de experiência comum, a fonte de tal convicção - obtida com benefício da imediação e oralidade - apenas poderá ser afastada se ficar demonstrado ser inadmissível a sua utilização pelas mesmas regras da lógica e da experiência comum.
- a demonstração da realidade de factos a que tende a prova (art. 341º do Cód. Civil) não é uma operação lógica, visando uma certeza absoluta. “A prova visa apenas, de acordo com os critérios de razoabilidade essenciais à aplicação prática do Direito, criar no espírito do julgador um estado de convicção assente na certeza relativa do facto” (2). O mesmo é dizer que “não é exigível que a convicção do julgador sobre a realidade dos factos alegados pelas partes equivalha a uma certeza absoluta, raramente atingível pelo conhecimento humano. Basta-lhe assentar num juízo de suficiente probabilidade ou verosimilhança, que o necessário recurso às presunções judiciais (arts. 349 e 351 CC) por natureza implica, mas que não dispensa a máxima investigação para atingir, nesse juízo, o máximo de segurança” (3).
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1.3. Por referência às suas conclusões, extrai-se que o recorrente pretende a alteração/modificação das respostas positivas aos pontos 1 a 4 da matéria de facto provada da sentença recorrida.

Os referidos pontos fácticos objeto de impugnação têm o seguinte teor:

«1. No exercício da sua actividade de instalação de sistemas eléctricos e canalizações, o autor aceitou executar os trabalhos de instalação de um sistema de rega gota a gota, protecção anti-geada e fertirrigação, que lhe foram solicitados pelo réu, mediante a entrega da contraprestação global de € 13.350,00 (treze mil, trezentos e cinquenta euros), a satisfazer em prestações; sendo a primeira de 30% a entregar com a adjudicação dos trabalhos, a segunda de 35%, a entregar durante a execução, e a terceira de 35%, a entregar com a conclusão dos trabalhos.
2. Com a aceitação do acordo descrito em 1., o réu entregou ao autor a quantia de € 4.000,00 (quatro mil euros).
3. Durante a execução dos trabalhos, o réu entregou ao autor as quantias de € 4.000,00 (quatro mil euros) e de € 2.000,00 (dois mil euros).
4. Dos sistemas acordados, não foi instalado o sistema de protecção de geada nem o sistema de ferti-rega».

Resposta pretendida:

«1. No exercício da sua actividade de instalação de sistemas eléctricos e canalizações, o autor aceitou executar os trabalhos de instalação de dois sistemas de rega gota a gota, protecção anti-geada e fertirrigação, que lhe foram solicitados pelo réu, mediante a entrega da contraprestação global de € 13.350,00 (treze mil, trezentos e cinquenta euros), cada um, a satisfazer em prestações; sendo a primeira de 30% a entregar com a adjudicação dos trabalhos, a segunda de 35%, a entregar durante a execução, e a terceira de 35%, a entregar com a conclusão dos trabalhos.
2. Com a aceitação do primeiro acordo descrito em 1., o réu entregou ao autor a quantia de € 4.000,00 (quatro mil euros); Com a aceitação do segundo acordo descrito em 1., o réu entregou ao autor a quantia de € 4.000,00 (quatro mil euros).
3. Durante a execução dos trabalhos referentes ao primeiro acordo, o réu entregou ao autor a quantia de € 2.000,00 (dois mil euros).
4. Dos sistemas acordados, não foi totalmente instalado o sistema de protecção de geada e não foi instalado o sistema de ferti-rega».
No dizer do recorrente, da prova produzida nos autos resulta manifesto o erro de julgamento, na medida em que o Tribunal “a quo” não valorou devidamente as declarações de parte do Autor, nem os depoimentos das testemunhas M. P. e A. R..
Vejamos, pois, se a discussão probatória fundamentadora da decisão corresponde, de facto, à prova realmente obtida.

Começaremos por reproduzir a motivação da matéria de facto da sentença recorrida, cujo teor é o seguinte:

«O Tribunal formou convicção quanto à factualidade apurada e não apurada, relevando, essencialmente, as declarações do autor, C. B., e as declarações do réu, R. G., no seu confronto com os depoimentos das respectivas esposas; M. P. e A. R., e da testemunha B. S., e ainda no confronto com os documentos apresentados, conforme, em concreto, se passa a explanar.
Os trabalhos e preço acordados, conforme descritos no ponto 1., resultam demonstrados das declarações das próprias partes, uma vez que estão, essencialmente, em sintonia, nessa matéria. Relevaram-se, ainda, neste tocante, a proposta/orçamentos e as facturas 424 e 425, juntas em audiências sob os doc. 1, 9 e 10, e que suportam aquelas declarações.
As quantias entregues pelo réu, para satisfação do preço, foram confessadas pelo próprio autor nas suas declarações, corroboradas pela testemunha M. P., sua esposa, que colabora com o marido, tratando-lhe dos assuntos administrativos e contabilísticos, como os pagamentos, relacionados com o exercício daquela actividade profissional.
Outrossim se dirá da falta de execução do sistema anti-geada e ferti-rega, que é confessada pelo autor, embora com a explicação de que estava em falta o pagamento do preço. Ainda que assim não fosse, as declarações do réu, suportadas no depoimento da esposa, A.R., e, sobretudo, no depoimento de B. S., que trabalhou no terreno, confirmando que, porque não havia anti-geada, puseram feno na base das plantas para as proteger, e confirmando ainda que não havia ferti-rega; o que fez de modo distanciado, sereno e circunstanciado, seria o suficiente para contrariar a versão do autor e dar por provada a falta de execução dos trabalhos apontados».
Essencialmente, as razões das discordância do recorrente no tocante à decisão da matéria de facto radicam na existência de dois orçamentos adjudicados (e não de um apenas) relativos à execução dos trabalhos (sistema de rega e sistema de bombagem solar) para dois projetos de jovem agricultor junto do Proder que o requerido tinha em curso em dois terrenos diferentes, sendo que os pagamentos efectuados pelo réu foram-no diferenciadamente por conta de cada um dos orçamentos/projecto/terreno, insurgindo-se quanto ao facto de o Tribunal “a quo” ter considerado que “o valor pago pelo Réu/Recorrido, pela adjudicação do segundo projecto/terreno simplesmente passe a ser por conta do primeiro projecto/terreno, para que este não ficasse por pagar”.
Não oferece dúvidas que, no exercício da sua actividade de instalação de sistemas eléctricos e canalizações, o autor aceitou executar os trabalhos de instalação de um sistema de rega gota a gota, protecção anti-geada e fertirrigação, que lhe foram solicitados pelo réu, mediante a entrega da contraprestação global de € 13.350,00, a satisfazer em prestações, sendo a primeira de 30% a entregar com a adjudicação dos trabalhos, a segunda de 35%, a entregar durante a execução, e a terceira de 35%, a entregar com a conclusão dos trabalhos.
Essa factualidade, além de resultar do documento constante de fls. 38 a 41 (orçamento datado de 5/09/2017), foi unanimemente confirmada, em sede de declarações de parte, quer pelo Autor, quer pelo Réu, bem como pelas testemunhas M. P. (mulher do Autor e titular de 50% da empresa “C. B., Unipessoal”, “colaboradora” dessa empresa, não obstante ter a profissão de enfermeira, sendo ela quem trata da parte administrativa e contabilística da empresa, designadamente dos orçamentos e pagamentos feitos e/ou rececionados) e A. R., mulher do réu, que, não obstante ser professora, foi quem tratou da parte burocrática relativo aos projetos do Proder referentes à plantação de maracujá, sendo ela quem, no fundo, estava à frente da sua execução e tratou da generalidade dos assuntos, nomeadamente acordou as condições contratuais com o Réu (se bem que ulteriormente, por dificuldades de comunicação com este, passou a lidar diretamente com a testemunha M. P.).
No tocante à existência de dois orçamentos para a execução do sistema de rega em dois prédios distintos do réu (um no Campo de … e outro na bouça das …, ambos na União das Freguesias de …), foi essa realidade confirmada quer pelo Autor (em sede de declarações de parte), quer pela testemunha M. P. (mulher do Autor), quer pela testemunha A. R. (mulher do Réu).
Esta última testemunha expressamente reconheceu ter visto o orçamento respeitante ao segundo terreno.
Assim, não obstante não ter sido carreado aos autos documento que ateste a formalização do 2º orçamento, dada o expresso reconhecimento da sua existência pela mulher do Réu não pode o mesmo deixar de ser valorado positivamente. Aliás, o réu, nas declarações de parte, foi taxativo e esclarecedor aos referir que os assuntos relacionados com orçamentos, valores e pagamentos eram da responsabilidade da sua mulher, não detendo ele conhecimentos sobre tais matérias, pelo que sobre as mesmas disse nada saber.
Acresce que o teor do orçamento junto aos autos (cfr. fls. 41 e segs.) evidencia a existência de um segundo orçamento/proposta, quando nele se refere que “a presente proposta só é válida na adjudicação dos 2 sistemas de rega conforme projecto de implantação”.
Ainda a esse propósito, explicou o autor que inicialmente foi elaborado um orçamento para um único terreno, cujo valor inicial orçava em 17.000,00€, sendo que posteriormente a mulher do réu solicitou-lhe um desconto, porque tinha um outro projecto num outro terreno no qual pretendiam também implementar um sistema de rega e de câmara solar, pelo que o autor aceitou reduzir o valor do primitivo orçamento para 13.350,00€.
Assim, resulta da prova produzida a existência de dois orçamentos tendentes à instalação de dois sistemas de rega em dois terrenos distintos, os quais tinham por objeto dois projetos do Proder.
Todavia, já quanto ao valor da adjudicação do segundo orçamento, dado não ter sido junto aos autos cópia do mesmo e porque somente o Autor aludiu ao respectivo valor de adjudicação, entende-se que a prova produzida não é suficiente para que se possa dar como provado que o valor global e as condições prestacionais acordadas deste segundo orçamento eram iguais aos do primeiro.
No tocante às discordâncias apresentadas pelo recorrente relativamente aos pagamentos feitos importa ter presente o seguinte:
É incontroverso que, com a aceitação do acordo de execução dos trabalhos de instalação de um sistema de rega corporizado no orçamento de fls. 38 a 41, o réu entregou ao autor a quantia de € 4.000,00 e durante a execução dos trabalhos o réu entregou-lhe também a quantia de € 2.000,00.
Resulta igualmente das declarações do Autor e do depoimento da testemunha M. P. (mulher do Autor) que, na sequência da aceitação do segundo orçamento/terreno, o réu entregou, ainda, ao autor a quantia de € 4.000,00.
Tais intervenientes acrescentaram, porém, que não obstante esta última quantia ter sido entregue por conta da adjudicação do segundo orçamento/projecto/terreno acordado, as partes acordaram entre si a afectação desse valor ao primeiro orçamento/projecto/terreno (“Isto porque nós pegamos na adjudicação do 2º projecto e transferimos tudo para o projecto inicial”, nas palavras do autor). O mesmo é dizer que o autor reconheceu ter revertido/transferido a quantia paga (€ 4.000,00) por conta do segundo orçamento/terreno a favor do primeiro.
Revelando um conhecimento mais circunstanciado sobre o assunto, por ser ela quem diretamente lidava com tais assuntos, declarou a testemunha M. P. que, “(…) porque a gente conhece um bocadinho do PDR, do Proder e às vezes da demora que é nos pagamentos que efectivamente existe, para poder facilitar, nós juntámos todos os pagamentos feitos, (…), porque havia dois terrenos e cada pagamento corresponde ao trabalho que se faz no respectivo terreno e nós, mais tarde (…)”, “um ano depois, juntámos as facturas, todos os pagamentos, (…), confinados ao primeiro terreno, para terminar o primeiro terreno para que a A. R., a A. R. ou o R. G., neste caso… Para que pudesse submeter ao Proder ou PDR, já não me recordo qual é o quadro de apoio deles para efectivamente irem buscar o dinheiro e podermos liquidar as contas”.
Essa mesma versão foi corroborada pela testemunha A. R. (mulher do Réu), que, depois de dar nota dos sucessivos atrasos do réu na conclusão dos trabalhos referentes ao primeiro terreno (designadamente na automatação do sistema de rega, na instalação do sistema anti-geada, na ferti-rega e na colocação da baixada eléctrica), e de ter deixado de falar com ele, passou a falar diretamente com a mulher do Réu, M. P., tendo alcançado um acordo, nos termos do qual “os pagamentos iriam todos passar para o primeiro terreno, ele [o réu] terminaria os trabalhos do primeiro terreno, e depois eu procederia aos restantes pagamentos para ele avançar para o segundo terreno”.
Nessa conformidade, não obstante resultar da prova produzida que com a aceitação do segundo acordo o réu entregou ao autor a quantia de € 4.000,00, não menos verdade é que, por acordo das partes, essa quantia reverteu por conta do primeiro acordo, pelo que o respetivo pagamento terá de ser considerado e imputado no negócio em discussão nos autos.
Os pagamentos supra aludidos mostram-se, de resto, refletidos no extracto constante de fls. 61, do qual resulta um pagamento, a favor da conta do autor, no valor de 4.000,00€, em 30/06/2017, um segundo pagamento de 4.000,00€, em 30/09/2017 e um terceiro pagamento, no valor de 2.000,00€, em 30/11/2017.
Por fim, impor-se-á dizer que o próprio autor reconheceu não ter completado a instalação do sistema de protecção da geada, faltando-lhe alguns elementos.
Segundo as suas declarações, no sistema de rega falta o sistema anti-geada; o ramal e a rede principal estão feitos, faltando só colocar os expressores.
Também o réu, em sede de declarações de parte, confirmou que o sistema anti-geada, afora a tubagem que havia sido instalada, não tinha os expressores, o que impedia o seu funcionamento.
Igualmente a testemunha A. R. (mulher do Réu) confirmou que, no tocante ao sistema anti-geada, o autor limitou-se a colocar os tubos.
Sobre essa matéria a testemunha B. S., agricultor, que prestou trabalho à jorna por conta do réu na plantação dos maracujás, declarou que era utilizada uma cisterna para regar, porquanto o sistema de rega não estava concluído, e que no período anti-geada tiveram de proteger as plantas com feno, confirmando ainda que não havia ferti-rega.

Em face do supra explicitado, impõe-se a alteração das respostas impugnadas nos termos seguintes:

1. No exercício da sua actividade de instalação de sistemas eléctricos e canalizações, o autor aceitou executar os trabalhos de instalação de dois sistemas de rega gota a gota, protecção anti-geada e fertirrigação, que lhe foram solicitados pelo réu, mediante a entrega da contraprestação global, quanto ao primeiro orçamento, de € 13.350,00 (treze mil, trezentos e cinquenta euros), a satisfazer (relativamente a esse primeiro acordo) em prestações; sendo a primeira de 30% a entregar com a adjudicação dos trabalhos, a segunda de 35%, a entregar durante a execução, e a terceira de 35%, a entregar com a conclusão dos trabalhos.
2. Com a aceitação do primeiro acordo descrito em 1 o réu entregou ao autor a quantia de € 4.000,00 (quatro mil euros) e com a aceitação do segundo acordo descrito em 1 o réu entregou ao autor a quantia de € 4.000,00 (quatro mil euros), sendo que, por acordo posterior das partes, esta quantia reverteu por conta do primeiro acordo.
3. Durante a execução dos trabalhos referentes ao primeiro acordo o réu entregou ao autor a quantia de € 2.000,00 (dois mil euros).
4. Dos sistemas acordados, não foi totalmente instalado o sistema de protecção de geada e não foi instalado o sistema de ferti-rega.
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Procede, por conseguinte, parcialmente a impugnação da matéria de facto (4).
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2. Reapreciação da decisão de mérito.

2.1. – Perante a facticidade provada, a Mm.ª Juíza “a quo”, na sentença recorrida, considerou que se estava perante um contrato de prestação de serviço, na modalidade de contrato de empreitada, e prevendo este que só com a conclusão dos trabalhos o autor teria direito à entrega do remanescente, resultando, pois, provado, que ainda não foram executados os trabalhos de instalação dos sistemas anti-geada e de ferti-rega, concluiu que não se havia vencido a última prestação do preço acordado, e, por isso, o réu tinha, efetivamente, o direito de recusar o seu pagamento, o que determinou a improcedência da acção.
Sem embargo das (ligeiras) correções introduzidas na matéria de facto provada, podemos desde já adiantar que a solução jurídica alcançada na 1ª instância será de manter inalterada.
Vejamos.
Estabelece o art. 1154º do Código Civil (CC) que “contrato de prestação de serviços é aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição”.
Das diversas modalidades de contratos de prestação de serviços destaca-se o contrato de empreitada (art. 1155º do CC).
Dispõe o art. 1207º do CC que “empreitada é o contrato pelo qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar certa obra, mediante um preço”.
O contrato de empreitada caracteriza-se, pois, da seguinte forma: a) pela existência da obrigação de uma das partes proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho que executa com autonomia em relação ao credor; b) que esse resultado se traduza na realização de uma obra em coisa imóvel ou móvel (5); c) que tenha como contrapartida um preço (6).
O empreiteiro está, pois, adstrito a realizar uma obra, a obter certo resultado (art. 1207º do CC) em conformidade com o convencionado e sem vícios (art. 1208º do CC). O contrato deve ser cumprido pontualmente (art. 406º do CC) e de boa fé (art. 762º, n.º 2 do CC). Por sua vez, a obrigação principal do dono da obra é a prestação do preço acordado (arts. 1207 e 1211º do CC).
A empreitada é um contrato nominado, bilateral ou sinalagmático, oneroso, consensual e de execução continuada (7).
Nominado e típico porque previsto nos arts. 1207º e ss. do CC.
Bilateral ou sinalagmático na medida em que dele emergem obrigações recíprocas e interdependentes: a obrigação de realizar a obra que impende sobre o empreiteiro tem como contrapartida o dever de pagar o preço por parte do dono da obra. O empreiteiro deve, pois, executar a obra, pontualmente, em conformidade com o que foi convencionado, e sem vícios que reduzam ou excluam o valor dela, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato (arts. 406º e 1208º do CC). O preço, nos termos do disposto no art. 1211º, n.º 2, do CC, deve ser pago no acto da aceitação da obra, portanto a final, caso não haja convenção em contrário (8).
Oneroso, porque o esforço económico é suportado pelas duas partes, havendo vantagens correlativas para cada uma delas. De entre os contratos onerosos, será classificado como comutativo, por oposição a aleatório, na medida em que as vantagens patrimoniais dele emergentes são conhecidas das partes logo no momento em que é ajustado.
Consensual, porque, não tendo sido estabelecida nenhuma norma cominadora de forma especial para a sua celebração, a validade das declarações depende de mero consenso, nos termos do disposto no art. 219º, do CC.
De execução continuada, porque se destina a instituir uma relação duradoura pela sua própria natureza. O cumprimento das prestações será, pois, ininterrupto.
Em termos processuais, e atento o critério da repartição do ónus da prova – art. 342º, n.º 1, do CC –, “àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado”.
Assim, ao Autor incumbe alegar e provar que celebrou um contrato de empreitada com o Réu, assim como as condições desse negócio, nomeadamente os serviços realizados, o respectivo preço acordado e que a obrigação de pagamento está vencida (9).
Ao Réu compete, por sua vez, fazer a prova do cumprimento da obrigação (neste caso, do pagamento do preço, como facto extintivo) ou de algum facto impeditivo, modificativo ou extintivo que obstasse àquele cumprimento ou, até, provar a impugnação que faça à existência e condições do negócio - art. 342º, n.º 2, do CC (10).

No caso sub júdice está provado que, no exercício da sua actividade de instalação de sistemas eléctricos e canalizações, o autor aceitou executar os trabalhos de instalação de dois sistemas de rega gota a gota, protecção anti-geada e fertirrigação, que lhe foram solicitados pelo réu, mediante a entrega da contraprestação global, quanto ao primeiro orçamento, de € 13.350,00.
Ora, face a esta prova positiva, dúvidas não subsistem de que se mostra provado que o Autor e o Réu celebraram entre si, de livre vontade, dois contratos de empreitada, consistentes na execução por parte daquele dos trabalhos de instalação de dois sistemas de rega gota a gota, protecção anti-geada e fertirrigação
Não obstante terem sido celebrados dois acordos, na presente ação está apenas em causa o primeiro deles, cujos termos contratuais foram já supra explicitados (11).
Das condições contratuais releva aqui a referente ao pagamento do preço da empreitada, que seria a satisfazer em prestações, sendo a primeira de 30% a entregar com a adjudicação dos trabalhos, a segunda de 35%, a entregar durante a execução, e a terceira de 35%, a entregar com a conclusão dos trabalhos.
Ora, resultou provado que, com a aceitação do primeiro acordo descrito em 1 o réu entregou ao autor a quantia de € 4.000,00 e com a aceitação do segundo acordo o réu entregou ao autor a quantia de € 4.000,00, sendo certo que, por acordo posterior das partes, esta última quantia reverteu por conta do primeiro acordo.
Mas se provou que, durante a execução dos trabalhos referentes ao primeiro acordo, o réu entregou ao autor a quantia de € 2.000,00.
Assim sendo, como bem se concluiu na sentença recorrida, resulta que na fase da execução dos trabalhos o réu já satisfez 74,91% do preço acordado, o que equivale a dizer que suportou já uma parcela superior à convencionada de 65%.
Acresce que, segundo o acordo celebrado, apenas com a conclusão dos trabalhos o autor teria direito à entrega do remanescente.
E, quanto a esse ponto, está apurado que dos sistemas acordados não foi totalmente instalado o sistema de protecção de geada e não foi instalado o sistema de ferti-rega.
Por conseguinte, secundando mais uma vez o aduzido na sentença recorrida, ante a falta de conclusão dos trabalhos, não se venceu a última prestação do preço acordado, e, por isso, o réu tem, efectivamente, o direito de recusar o seu pagamento.
Improcede, por isso, a pretensão do autor de condenação do réu no pagamento do remanescente do preço, bem como das demais quantias peticionadas.
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A sentença recorrida merece, assim, plena confirmação, improcedendo as conclusões da apelante.
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As custas do recurso, mercê do princípio da causalidade, são integralmente da responsabilidade do recorrente, atento o seu integral decaimento (art. 527º do CPC).
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Sumário (ao abrigo do disposto no art. 663º, n.º 7 do CPC):

I – Num contrato de empreitada em que se convencionou ser o preço pago gradualmente em função da adjudicação, da execução e da conclusão dos trabalhos, e pretendendo o empreiteiro o pagamento do remanescente do preço da obra, cabe-lhe a prova de que concluiu os trabalhos.
II – Ante a demonstração da falta de conclusão dos trabalhos, não se venceu a última prestação do preço acordado, e, por isso, o réu tem o direito de recusar o seu pagamento.
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V. DECISÃO

Perante o exposto acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente o recurso de apelação, confirmando a sentença recorrida.
Custas da apelação a cargo do apelante (art. 527º do CPC).
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Guimarães, 17 de setembro de 2020

Alcides Rodrigues (relator)
Joaquim Boavida (1º adjunto)
Paulo Reis (2º adjunto)



1. Cfr., na doutrina, Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2017 – 4ª ed., Almedina, pp. 271/300, Luís Filipe Pires de Sousa, Prova testemunhal, 2017 – reimpressão, Almedina, pp. 384 a 396; Miguel Teixeira de Sousa, em anotação ao Ac. do STJ de 24/09/2013, Cadernos de Direito Privado, n.º 44, Outubro/dezembro 2013, p. 33 e Francisco Manuel Lucas Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, Vol. II, 2015, Almedina, pp. 462 a 469; na jurisprudência, Acs. do STJ de 7/09/2017 (relator Tomé Gomes), de 24/09/2013 (relator Azevedo Ramos), de 03/11/2009 (relator Moreira Alves) e de 01/07/2010 (relator Bettencourt de Faria); Acs. da RG de 11/07/2017 (relatora Maria João Matos), de 14/06/2017 (relator Pedro Damião e Cunha) e de 02/11/2017 (relator António Barroca Penha), todos consultáveis em www.dgsi.pt.
2. Cfr. Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio Nora, Manual de Processo Civil, 2ª ed., Coimbra Editora, 1985, pp. 435/436; no mesmo sentido, Manuel A. Domingues de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Reimpressão, Coimbra Editora, Limitada, 1993, pp. 191/192
3. Cfr. Lebre de Freitas, Introdução Ao Processo Civil. Conceito E Princípios Fundamentais À Luz Do Novo Código, 4ª ed., Gestlegal, Coimbra, 2017, p. 202.
4. Por a matéria de facto consolidada ter sido já plenamente reproduzida no final da decisão da impugnação da matéria de facto, dispensamo-nos de a transcrever novamente.
5. A obra, objecto da empreitada, tanto pode consistir na construção ou criação de uma coisa como na sua modificação ou demolição.
6. Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. 2, 3ª ed., Coimbra Editora, pp. 786/790 e Pedro Romano Martinez, Direito das Obrigações, vol. III, 2ª ed., Lições coordenadas pelo Prof. Menezes Cordeiro, AAFDL, 1991, p. 431 e segs. e Direito das Obrigações, (Parte Especial) Contratos, Almedina, pp. 333/336, A. Santos Justo, Manual de Contratos Civis, Vertentes Romana e Portuguesa, Petrony, pp. 466/468.
7. Cfr. Pedro Romano Martinez, Direito das Obrigações, vol. III, (…), p. 432 e segs. e Direito das Obrigações, (Parte Especial), (…), p. 334 e segs. e A. Santos Justo, obra citada, pp. 469/470.
8. Trata-se, todavia, de uma regra supletiva. E nas empreitadas de construção de coisas imóveis é frequente estabelecer-se que o preço seja pago escalonadamente, podendo-se acordar num preço a efetuar em prédios determinados, ou em função do trabalho executado. - Cfr. Pedro Romano Martinez, Direito das Obrigações, (Parte Especial), (…), p. 371.
9. Assim, pretendendo o empreiteiro ser pago pela obra efectuada, esse facto deve considerar-se constitutivo do direito que invoca. Consequentemente, ao alegá-lo, tem que demonstrar que concluiu a obra, só então podendo pedir o respectivo preço - Ac. do STJ de 4/03/2010 (relator Barreto Nunes), in www.dgsi.pt. Como se sumariou no acórdão do STJ de 31/10/1995 (relator Lopes Pinto), in www.dgsi.pt.: “I - Na acção movida pelo empreiteiro contra o dono da obra, para pagamento do preço desta, incumbe àquele alegar e provar que realizou a obra e a entregou”. No mesmo sentido, o acórdão do STJ de 09/12/2004 (relator Moitinho de Almeida), in www.dgsi.pt., nos termos do qual: “Num contrato de empreitada em que se convencionou ser o preço pago gradualmente em função da evolução dos trabalhos, cabe ao empreiteiro o ónus da prova de que a quantia que reclama corresponde ao valor das obras realizadas até ao momento”.
10. É entendimento consensual na doutrina e na jurisprudência de que, em caso de incumprimento defeituoso da prestação, ao dono da obra incumbe a prova da existência do defeito, enquanto ao empreiteiro cabe a prova de que o defeito não deriva de má execução da obra. - Pedro Romano Martinez, Cumprimento Defeituoso, em especial na Compra e Venda e na Empreitada, Coleção Teses, Almedina, pp. 356 a 362; e João Cura Mariano, Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, 7ª ed., Almedina, p. 71 a 74 e Ac. da RC de 24/02/2015 (relatora Maria João Areias), in www.dgsi.pt.
11. Ainda que, porventura, estivesse (também) em causa o segundo contrato – o que se concebe para efeitos meramente argumentativos –, não se mostra provado que o autor tenha executado algum trabalho/serviço por conta do mesmo, pelo que a sua pretensão de reclamar o pagamento de trabalhos executados sempre