PROCURAÇÃO
CONTRATO DE MANDATO
CONTEÚDO DAS OBRIGAÇÕES
Sumário


1. Procuração e contrato de mandato são figuras jurídicas distintas. A procuração é um acto unilateral pelo qual alguém confere poderes de representação a outrem (artigo 262º do Cód. Civil), isto é, confere o poder de celebrar um ou vários actos jurídicos em nome de outrem (representado); O mandato é um contrato tipificado no art. 1157º do Código Civil, de natureza consensual, o qual impõe a obrigação de celebrar actos jurídicos por conta de outrem.
2. Uma das obrigações do mandatário no contrato de mandato é “praticar os actos compreendidos no mandato, segundo as instruções do mandante” (cfr. alínea a) do artigo 1161º, do Código Civil), e o mandatário que faltar culposamente ao cumprimento dessa obrigação torna-se responsável pelos prejuízos que causa ao mandante (art. 798º), devendo a culpa ser apreciada nos termos do art. 799º do Cód. Civil. Actuando ao mesmo tempo como procurador, abusa dos poderes de representação nos termos do artigo 269º do Código Civil, “quando o representante, actuando embora dentro dos limites formais dos poderes que lhe foram outorgados, utiliza conscientemente esses poderes em sentido contrário ao seu fim ou às indicações do representado” (cfr. obra citada, Vol I, pág.. 248/249), podendo essa actuação ilícita fazer incorrer em responsabilidade civil aquiliana o procurador pelos prejuízos culposamente causados.
3. Os autos reportam uma situação em que o 1º réu actuou na qualidade de mandatário-representante da demandante no contrato referente à aquisição de 3.000kg, pois celebrou esse contrato em nome da autora no quadro dos poderes que lhe conferia a procuração outorgada em 16 de Março de 2009, e por sua conta a coberto de um mandato
4. A isolada circunstância de o escrito que titula o contrato não especificar que as uvas eram apenas as da parte de cima da quinta conforme as instruções da autora, pode quiçá indiciar incompetência ou negligente do mandatário/procurador, mas não é revelador da sua intenção em se desviar das directrizes recebidas, nem significa sequer que aquela condição não tenha sido efectivamente negociada e acordada.

Texto Integral


Acordam os juízes da 1ª secção cível do tribunal da relação de guimarães

I. A Sociedade Comercial X, Lda, demandou nesta acção declarativa V. F., a Casa Agrícola A. F., Lda, e Y Comercialização de Produtos Agrícolas, Unipessoal, Lda, pedindo a condenação: i) do 1º Réu no pagamento de 7.672,50€ referente ao custo de aquisição pela A. de mais de 11 toneladas de uvas de qualidade inferior, e de 4.000,00€ referente ao valor das prestações vencidas e vincendas a pagar ao Dr. P. S., no quadro de uma avença ruinosa, acordada pelo Primeiro Réu em abuso de representação da A.; ii) da 2ª Ré a pagar 2.513,12€, por custos de replantação na Quinta de ...; a quantia a fixar no decurso da ação ou em execução de sentença, correspondente ao vinho que não será possível vender ao preço que a A. o venderia caso a 2ª Ré cumprisse as suas obrigações; e a restituir à A. o valor da instalação do sistema de frio no montante de 8.868,05€, a título de enriquecimento sem causa; iii) da 3ª Ré a pagar à A. 19.208,91€, de prejuízos directamente causados pela instalação de um sistema de regra inoperante.

No essencial e em síntese, alegou:

A autora tem por objecto a produção de vinhos e bebidas e, dispondo em Portugal apenas de um trabalhador qualificado (Engº Agrónomo/Enólogo), necessitava de uma pessoa com conhecimento no sector vitivinícola. Para esse efeito admitiu o 1º réu como seu trabalhador em 16-02-2009, a quem concedeu uma procuração com os poderes elencados no artigo 6º da p.i., procuração que veio a ser parcialmente revogada em 29-12-2011. Contrariando as instruções da autora, este réu assinou contratos ruinosos com fornecedores de uvas e vinho a granel, designadamente vinculando-a perante a sociedade “A. M. & Filha” a adquirir mais de 11 toneladas de uvas de qualidade inferior àquela que a autora pretendia adquirir, o que se cifrou num prejuízo de 7.672,50€em 2014; e em Março de 2014 contratou um advogado para prestação de acessória jurídica, vinculando a autora a uma avença com a duração mínima de 24 meses com expressa previsão de renovação tácita e pré-aviso de resolução de 365 dias, condições nunca propostas à gerência nem por ela validadas, pelo que deve o réu indemnizar a autora em quantia não inferior ao valor das prestações vencidas e vincendas entre Novembro/2014 (mês subsequente à comunicação da cessação do mandato) e Março de 2016, no montante de 4.000,00€.
A 2ª ré tem por objecto social a gestão de explorações agrícolas, produção e comercialização de produtos agrícolas, hortícolas e frutícolas, bem como de vinho e azeite, oriundos da própria exploração bem como dos adquiridos a terceiros. Em 1.Junho de 2011, a A. celebrou com essa sociedade comercial o contrato de prestação de serviços titulado pelo doc. nº 6 e descrito nos arts 11º a 19º, e 71º da p.i., sendo esta representada pelo 1º Réu, seu sócio gerente. Devido ao incumprimento pela 2ª ré das obrigações assumidas, designadamente as da cláusula contratual 1-1 (acompanhamento dos vinhedo e as execuções dos trabalhos vinícolas), a qualidade do vinho apenas permitiu comercializar em 2015 9.678 garrafas ao preço unitário de 7€, mantendo armazenado o equivalente a 42.666 garrafas. O 1º réu, agindo em representação da autora, encomendou, pagou e mandou instalar nas instalações da 2ª ré um sistema de refrigeração para cubas de vinho no valor de 8.868,05€, não havendo causa justificativa para passar a fazer parte dos seus equipamentos;
Por sua vez, a 3ª ré tem por objecto a comercialização por grosso e a retalho de produtos agrícolas e seus factores de produção, da qual também é único sócio e gerente o primeiro réu, com quem a autora (representada pelo 1º réu) celebrou em 2013 um contrato de empreitada para a instalação de um sistema de rega gota a gota numa propriedade denominada C., mas defeituosamente executado, pelo que a autora tem o direito a ser ressarcida do valor facturado de 19.208.91€.
Os réus contestaram, impugnando a versão dos factos alegada p.i., concluindo pela improcedência da ação; E a 2ª ré deduziu reconvenção, pedindo a condenação da autora: no pagamento de 27.800,95 por violação do contrato de prestação de serviços; na restituição de 102,95€ por despesas feitas pela ré pela emissão de dados da estação meteorológica; na quantia de 7.450,00€ pelos danos ocasionados nas instalações da 2ª ré na Quinta do ..., e a pagar ao 1º réu a quantia que vier a ser fixada no decurso da acção relativa a despesas por ele suportadas em benefício da autora.

O despacho saneador exarado no final dos articulados considerou inadmissível a reconvenção e admitiu a intervenção a título acessório da Companhia de Seguros W, e seguidamente fixou o objecto do processo e enunciou os temas de prova.

A sentença final julgou a acção parcialmente procedente, condenando o Réu, V. F. a pagar à Autora a quantia de € 7.672,50 (sete mil seiscentos e setenta e dois euros e cinquenta cêntimos), referente ao custo de aquisição de mais de 11 toneladas de uvas de qualidade inferior, e absolveu o mesmo réu, bem como a segunda e a terceira rés, dos demais pedidos formulados.

II. O réu interpôs recurso dessa sentença, terminando com as seguintes conclusões:

1ª. No dia 06 de novembro de 2019, foi, no âmbito dos autos em causa, prolatada douta 4 sentença, sentença essa cujo dispositivo tem uma parte que é desfavorável ao réu/recorrente.
2ª. Parte essa que constitui o objeto do presente recurso, e que condenou tal réu a pagar à autora a quantia de 7.672,50 euros, e as custas do processo proporcionais ao decaimento do réu, em virtude de, designadamente, ter considerado provados os 11 factos elencados nos números 6, 7, 21, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 59, 60, 61, 62, 63, 12 64, 65, 66, 69 e 70, e como não provados, os factos constantes das alíneas b), k), l), 13 m), n), o), p), q), r) e aa), todos sob a epigrafeII – Fundamentação de 14 Facto”, de tal sentença.
3ª. O que não pode merecer a concordância do recorrente, que entende que os factos referidos nos números 25, 26 e 63, os três da matéria de facto provada, da douta sentença apelada, não deveriam ter sido dados como provados, enquanto que os 20 factos constantes das alíneas k), l), m), n), o), p), q) r) e aa), todos da mesma sentença, deveriam ter sido dados como provados, o que, só por si, é susceptível de alterar o sentido da sentença sob recurso, o mesmo sucedendo aliás com a impugnação da matéria de direito, que adiante no texto se vai fazer também, da matéria de direito.
4ª. Estando pois no presente recurso o recorrente a impugnar matéria de facto (640.º, do CPC) e matéria de direito (artigo 639.º, do CPC).
5ª. E, quanto ao que a tal matéria de facto tange, especifica-se, em cumprimento do artigo 640.º, do CPC, o seguinte:

A) Os concretos pontos de facto que o recorrente considera que foram 9 incorretamente julgados na sentença sob recurso (art. 640.º-1-a), do CPC), são os factos que, nos números 25, 26 e 63, todos da fundamentação fáctica de tal sentença, foram dados como provados, bem como aqueles que, nas alíneas k), l), 12 m), n), o), p), q) r) e aa), todas da mesma fundamentação fáctica, foram dados como não provados, sendo tais factos, esclareça-se, aqueles que de seguida vão indicados, tendo eles, naturalmente na opinião do recorrente, relevância para a sorte desta ação, na qual, repita-se, e ao contrário daquilo que sucedeu, os três primeiros deviam ter sido dados como não provados, e os nove seguintes como provados: Facto 1 No final de Julho de 2014, um dos técnicos franceses da Maison ..., conjuntamente com o Primeiro Réu, visitou as vinhas da Quinta do ..., propriedade da A. M. e Filha – Construção, Comercialização e 23 Administração de Imóveis Lda, tendo constatado que as vinhas localizadas na parte baixa da propriedade não correspondiam aos critérios de qualidade exigidos pela Autora (Facto 25, da matéria de facto dada como provada). Facto 2 Tendo esta consequentemente estimado que a quantidade de uva a adquirir àquela 4 empresa não deveria exceder as 10 a 15 toneladas (Facto 26, da matéria de facto 5 dada como provada).
Facto 3 Após a visita de um dos técnicos franceses da Autora à vinha da Quinta do …, que ocorreu em final de Julho de 2014, resultou um parecer positivo do 10 técnico para aquisição das uvas, ainda que viessem a ser restringidas à parcela de 11 cima, já que as uvas da parcela de baixo não apresentavam a qualidade pretendida 12 (Facto 63, da matéria de facto dada como provada). Facto 4 As uvas fornecidas pela “A. M.” à Autora, sempre foram 16 supervisionadas pelo 1º Réu, sendo que, se se verificasse que as mesmas não 17 tinham qualidade, eram rejeitadas, sem oposição da “A. M.” (Alínea 18 K), da matéria de facto dada como não provada).
Facto 5 O contrato com a Sociedade A. M. apenas foi celebrado e assinado pelo 1º Réu, após concordância e autorização da Autora para o efeito, tendo a Autora concordado com as suas cláusulas (Alínea L), da matéria de facto dada como não provada). Facto 6 O 1º Réu recomendou à Autora o dia 15 de Setembro de 2014, para dar início à 2 vindima das uvas na Quinta do ..., uma vez que seria esta a altura ideal 3 para a sua colheita, por as uvas apresentarem a qualidade e maturação pretendidas e por estarem previstas chuvas abundantes para os dias seguintes (que vieram efetivamente a ocorrer) e que colocariam em causa a qualidade das uvas (Alínea 6 M), da matéria de facto dada como não provada). Facto 7 A Autora descurou por completo as recomendações e conselhos técnicos do 1º Réu (Alínea N), da matéria de facto dada como não provada). Facto 8 A Autora, sem intervenção do 1º Réu, decidiu adiar a vindima na Quinta do ..., para além da data recomendada por este (Alínea O), da matéria de facto dada como não provada). Facto 9 Tendo-se realizado a vindima apenas em finais de Setembro ou inícios de 19 Outubro de 2014, após terem-se verificado as previstas chuvas abundantes, que nesta altura do ano, dado o estado avançado de maturação das uvas, é condição para causar o seu apodrecimento e degradação da sua qualidade (Alínea P), da matéria de facto dada como não provada). Facto 10 Se a vindima, na Quinta do ..., se tivesse realizado na data agendada pelo 1º Réu, teriam sido colhidas cerca de 30.000Kg de uvas com qualidade, tal como previsto e contratado (Alínea Q), da matéria de facto dada como não provada). Facto 11 A Autora não cuidou de assegurar a qualidade das uvas que adquiriu, no momento da sua colheita, porque se o tivesse feito, teria recusado as uvas degradadas, o que sempre sucedeu em anos anteriores, sem oposição da “A. M.” (Alínea R), da matéria de facto dada como não provada). Facto 12 Relativamente ao fornecedor “A. M. & Filha – Construção, Comercialização e Administração de Imóveis, Lda.”, em 20 de Junho de 2014, assim como até à data recomendada pelo 1º Réu e 2ª Ré para realização da vindima deste fornecedor – 15 de Setembro de 2014 – mostrava-se perfeitamente possível colher uvas com qualidade na quantidade prevista de 30.000 Kg. A única situação que pode ter originado uma redução na quantidade de uvas adquiridas pela Autora, foi a sua própria teimosia, pois, ao invés de realizar a vindima na data recomendada pelos 1º Réu e 2ª Ré, decidiu adiá-la para finais de Setembro ou inícios de Outubro de 2014, quando as uvas já apresentavam um estado demasiado avançado de maturação e depois de verificadas as previstas chuvas abundantes, o que tudo originou certamente o apodrecimento e degradação da qualidade das uvas (Alínea aa) da matéria de facto dada como não provada).
B) Os concretos meios probatórios, constantes do processo, ou de registo ou 1 gravação nele processo realizada, que impunham decisão, sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da recorrida (artigos 640.º-1-b), do CPC), isto é, que impunham que os primeiros três factos, constantes da alínea A) anterior, que, repita-se, são relevantes para a decisão, devessem ter sido 5 considerados como não provados, e que os nove factos restantes, constantes da mesma alínea A), que são também relevantes para a decisão, devessem ter sido considerados como provados, são todos os meios probatórios produzidos nos autos, designadamente a prova documental e a prova testemunhal, meios 9 probatórios esses que, quando a sentença sob recurso foi proferida, se 10 encontravam já todos no processo. C) A decisão que, no entender do recorrente, deveria ter sido proferida sobre as questões de facto impugnadas (640.º-1-c), do CPC), isto é, sobre os doze factos, constantes da alínea A) anterior, era, e é, serem, ao contrário do que sucedeu, desses doze factos, os três primeiros, considerados como não provados, e, os nove restantes, considerados como provados.
6ª. Por fim, e para finalizar esta temática da impugnação da matéria de facto, mencione- se, como se menciona, que, havendo, como há, meios probatórios invocados, como fundamento do erro na apreciação das provas, que foram gravados, meios esses que consistem no depoimento de todas as testemunhas que depuseram, indicam-se, com exatidão, e em cumprimento do comandado no artigo 640.º-2-a), do CPC, as passagens da gravação em que se funda, quanto à alteração da matéria de facto pretendida, o presente recurso.
Passagens essas que, no que toca aos factos que foram considerados provados, e que, na opinião do recorrente, deveriam ter sido considerados não provados, são naturalmente, e porque só assim se pode chegar à conclusão que esses factos não deviam ser considerados provados, a totalidade da gravação em causa, que foi levada a cabo, através do sistema integrado de gravação digital, do Tribunal Judicial da Comarca de Vila Real, indo essas passagens: (…..)
7ª. Depoimentos esses dos quais, cristalinamente resulta, que, ao contrário do que consta da sentença, que, aqui e agora, se está a por em crise, dos doze factos elencados na alínea A) anterior, os três primeiros, não deveriam ter sido considerados provados, e, os nove restantes, deveriam ter sido dados como provados.
8ª. E, não provados que sejam os três primeiros, dos doze factos atrás referidos, e provados os nove restantes, isso não poderá deixar de conduzir à improcedência da ação em causa, com a consequente anulação da parte sob recurso da sentença que tem vindo a ser considerada (artigo 639.º-1, do CPC).
9ª. Improcedência essa que decorre também, e assim entramos na impugnação da matéria de direito, da sentença sob recurso padecer, como, muito embora com a devida vénia, padece, e mesmo que a matéria fáctica não fosse alterada, de erros de julgamento, consistentes em erros de direito, erros de julgamento esses justificativos, igualmente e por si só, da anulação da mesma sentença (artigo 639.º-1, do CPC).
10ª. Na verdade, a sentença sob recurso fundamentou a condenação do recorrente na responsabilidade contratual dele, decorrente do recorrente ter, naturalmente na visão dessa sentença, celebrado com a autora, um contrato, em que ele recorrente se obrigou a praticar um ou mais atos jurídicos por conta da autora, isto é, e tendo em conta a noção que de contrato de mandato nos é dada no artigo 1157.º, do Código Civil, um contrato de mandato, no qual a autora seria mandante, sendo o recorrente, mandatário.
11ª. Sendo certo que a celebração de tal contrato de mandato, entre a autora, como mandante, e o 1.º R, como mandatário, não consta dos factos provados, nem de nenhum documento que se encontre no processo, nem ocorreu efetivamente.
12ª. Tendo até sido pela autora alegada apenas conclusivamente, ou seja, sem a articulação de factos, que, uma vez provados, pudessem levar à conclusão que efetivamente tivesse sido outorgado, entre a autora, como mandante, e o primeiro réu, como mandatário, um contrato de mandato, bem como o respetivo âmbito, ou seja, os atos jurídicos, cuja prática, por banda do mandatário, estavam incluídos em tal mandato.
13ª. Pois que aquilo que consta dos autos, e aconteceu na realidade, é que o recorrente era procurador da recorrida, sendo a responsabilidade do procurador, ao contrário do que sucede com a do mandatário, que é uma responsabilidade contratual, uma responsabilidade extra-contratual, na qual a culpa se não presume, antes tendo que ser provada por aquele que se considere lesado, no caso a X LDA.
14ª. Prova esta que tal sociedade não fez, o que impossibilita, e por faltar um dos pressupostos cumulativos da responsabilidade aquiliana, constantes do artigo 483.º, do CC, que o recorrente pudesse ser responsabilizado, ainda que a conduta dele preenchesse, que não preenchia, os restantes pressupostos de tal responsabilidade.
15ª. Muito embora do contrato celebrado entre a X LDA, por intermédio do recorrente, enquanto procurador dela, e a A. M., não conste efetivamente que as uvas a fornecer, pela A. M., à X LDA, tinham que ter boa qualidade, para o fim que visavam, que era a produção de vinho, o certo é que isso estava naturalmente implícito em tal contrato, como aliás o está em todos os contratos de fornecimento de bens, quaisquer que eles sejam, bens esses que têm naturalmente que ser adequados, nomeadamente em termos de qualidade, ao fim ou fins a que tais bens se destinam.
16ª. Tanto mais que a A. M., que fornecia uvas à X LDA desde 2010 (vide o facto 51, da matéria de facto provada), não podia ignorar, nem ignorava, que essas uvas se destinavam à produção de vinho, de uma reputada marca, e que tinham que ter portanto qualidade suficiente para isso, independentemente disso constar, ou não, expressamente, do contrato de fornecimento em causa.
17ª. Devendo pois a X LDA, quando as uvas em causa lhe foram entregues pela A. M., ter verificado a qualidade dessas uvas, e, se ela não fosse, como, pelos vistos, e no que a uma parte de tais uvas tange, não era, adequada ao fim de produção de bom vinho, a que as mesmas uvas se destinavam, recusá-las, ou então não proceder depois ao respetivo pagamento, pelo menos pelo valor constante do contrato, valor esse que uma parte significativa de tais uvas afinal não tinha.
18ª. E isto tanto mais que, aquando da vindima e entrega, ocorridas em setembro/outubro de 2014, de tais uvas, pela A. M. à X LDA, esta já tinha retirado ao recorrente todas as funções dele em tal sociedade, o que ocorreu em agosto de 2014 (vide o facto 67, da matéria de facto provada), não tendo pois ele recorrente podido assistir à vindima das uvas em causa e à entrega delas, entrega esta que foi aliás feita em local que o 1º réu ignorava qual fosse, pois que desse local não lhe foi dado conhecimento pela autora (vide os factos 69 e 70, da matéria de facto provada).
19ª. Decorrendo do contrato de fornecimento das uvas em causa, pela A. M. à autora, que esta, através de tal contrato, manifestou interesse em adquirir, em 2014, à A. M., cerca de 30.000 kg de uvas, que viessem a ser produzidas na quinta, propriedade da mesma A. M., denominada Quinta do ..., sem especificar se tais uvas deviam ser provenientes das vinhas localizadas na parte baixa de tal Quinta, ou na parte alta da mesma (vide os factos 60, 61 e 62, da matéria de facto provada).
20ª. Constando do facto 64, da matéria de facto provada, que o 1º réu, em 16 de agosto de 2014, elaborou e remeteu à autora um relatório, contendo fotografias da Quinta do ..., onde informa que as uvas da parcela de baixo não tinham, efetivamente, boa qualidade, e, portanto, as uvas a adquirir pela autora à A. M., se cingiriam, nesse ano de 2014, à vinha da parcela de cima.
21ª. Tendo o 1º réu esclarecido à autora, a solicitação desta, que, não obstante a colheita das uvas se vir a restringir, nesse ano de 2014, à parcela de cima da Quinta do …, a mesma tinha capacidade para produzir cerca de 30.000 kg de uvas com qualidade (vide os factos 65 e 66, da matéria de facto provada).
22ª. Pelo que, o 1º réu, no contrato de fornecimento de uvas, que firmou com a A. M., em representação da autora, não contrariou as instruções desta, pois que se reportou apenas às uvas produzidas pelas vinhas situadas na parte de cima da Quinta do ..., embora se tenha enganado na previsão que fez, relativamente à quantidade de uvas que essas vinhas iriam, nesse ano de 2014, produzir, pois que o 1º réu estimou que essa quantidade seria de cerca de 30.000,00 kg, o que não veio a acontecer.
23ª. Sendo isso perfeitamente admissível e aceitável, pois que a estimativa, quer em quantidade, quer em qualidade, de qualquer produção agrícola, nomeadamente uvas, pode ser contrariada, e até em poucos minutos, bastando para isso uma simples trovoada, acompanhada, por exemplo, de granizo, ou quaisquer outras alterações climatéricas, instantâneas ou duradoras, ou doenças, não podendo esse erro de previsão constituir motivo para responsabilizar civilmente o 1º réu.
24ª. Até porque isso não seria suscetível de provocar qualquer prejuízo na X LDA, porque esta, quando as uvas em questão lhe foram entregues pela A. M. podia, ou devia mesmo até, recusar o recebimento daquelas que não se encontrassem em boas condições, tendo para isso total fundamento legal, consistente em se estar, como se estava, em presença, por parte da A. M., de um cumprimento defeituoso do contrato que essa sociedade havia celebrado com a X LDA, representada pelo 1º réu, ou mesmo do incumprimento de tal contrato, ou, se se preferir, o que vai dar ao mesmo, de uma venda defeituosa, ou venda de produto (uvas) com defeito.
25ª. Devendo também a autora, em qualquer circunstância, verificar a qualidade do produto que lhe estava a ser entregue pela A. M., pois que bem poderia suceder que as uvas vindimadas em setembro/outubro de 2014, na Quinta do ..., ainda que provenientes apenas dos talhões de cima de tal quinta, uvas essas que um técnico da própria autora considerou, no final de julho de 2014, serem de qualidade (vide o facto 63, da matéria de facto provada), se tivessem, desde então, e até à vindima, ocorrida, relembre-se, em setembro/outubro de 2014, deteriorado, devido a uma qualquer das circunstâncias atrás referidas, nomeadamente problemas climáticos ou de doenças de produtos vegetais.
26ª. O que não é aceitável é que a autora não tenha permitido que o 1º réu assistisse à vindima em causa, nem à entrega das uvas vindimadas, feita pela A. M. à mesma autora, tenha recebido tais uvas, posto que uma quantidade apreciável delas fosse de má qualidade, para o fim a que se destinavam, e tenha pago essas uvas de má qualidade, como se elas fossem boas, ou seja, ao preço destas, tudo sem pestanejar ou levantar qualquer protesto, nem sequer informar disso o 1º réu, infringindo assim as regras de receção de qualquer produto, e venha, depois, reclamar esse pagamento, que indevidamente fez, e legalmente podia, e devia mesmo até, evitar, ao 1º réu.
27ª. Na verdade, o verdadeiro responsável pelo prejuízo de 7.672,50 euros, que a autora se arroga ter tido, com as uvas que, nesse ano de 2014, lhe foram fornecidas pela A. M., é a pessoa que, após a vindima de tais uvas as rececionou, e/ou aquela que, depois, determinou o pagamento delas à A. M., ainda por cima, por um valor que as mesmas afinal não tinham, não tendo, como dos autos decorre com total 1 clareza nenhum dessas duas pessoas, sido o 1º réu.
28ª. Padecendo pois a sentença sob recurso, além de erro quanto ao julgamento da matéria de facto, também de erros no que toca ao julgamento da matéria de direito, nomeadamente porque violou diversas disposições legais, designadamente, os arts 483.º, 487.º e 1157.º, do CC.
29ª. Deverá pois, pelos motivos atrás expostos, ou seja, por erros, quanto ao julgamento quer da matéria de facto, quer da matéria de direito, traduzindo-se estes na violação de diversas disposições legais, designadamente os artigos 483.º, 487.º e 1157.º, os três do CC, e muito embora sem que isso possa constituir, nem constitua, qualquer demérito, por pequeno, ou mínimo até, que seja, para com a Meritíssima Senhora Doutora Juíza de 1ª instância que a prolatou, até porque, e como é por demais sabido, alli quando dormitat Homerus, ser a parte sob recurso da sentença em causa, posto que mui douta, anulada.
30ª. Prolatando-se, para isso, não menos douto acórdão, que considere que a parte em causa, da douta sentença recorrida, incorreu em erros no julgamento, quer da matéria de facto, quer da matéria de direito, violando, designadamente, os atrás referidos artigos do CC, e que, consequentemente, num sistema cassatório, anule tal parte da sentença em causa (artigo 639.º-1-in fine, do CPC), e, num sistema de substituição, considere a ação em questão, total e completamente improcedente, também quanto ao 1º réu, com a consequente absolvição de tal 1º réu, aqui recorrente, de todos os pedidos contra ele formulados pela autora, bem como do pagamento das custas do processo..

Nas contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso, a recorrida conclui:

A. O Recorrente apresentou alegações que manifestam um incumprimento dos ónus previstos no artigo 640.º, n.º 1 alínea a) do Código do Processo Civil relativamente à impugnação por si deduzida em relação à matéria de facto.
B. As alegações na parte relativa à impugnação da matéria de facto não apresentam os concretos pontos de facto que o Recorrente considera incorretamente julgados, limitando-se a uma mera remissão para os pontos da sentença e sem especificar, concretamente, o conteúdo da decisão que pretendem ver reapreciado ou revogado.
C. O Recorrente apresentou, igualmente, alegações que padecem de insuficiência quanto ao ónus que sobre si recai ao abrigo do artigo 640.º, n.º 1 alínea b) e n.º 2 do Código do Processo Civil relativamente à impugnação da prova testemunhal gravada na audiência de discussão e julgamento.
D. O Recorrente impugna toda a prova testemunhal gravada, apresentando nas alegações o tempo de início e fim de todas as inquirições realizadas.
E. Faltando, assim, as passagens mais relevantes desse depoimento, dos pontos de facto que considera incorretamente julgados, dos meios probatórios que impunham decisão diversa e bem como o sentido da decisão que, no seu entender, deveria ter sido proferida quanto ao factos impugnados.
F. Ao remeter para a totalidade de cada um dos depoimentos gravados na audiência de discussão e julgamento, o Recorrente incumpre de forma manifesta os ónus a seu cargo nos termos da lei processual e dificulta de forma manifesta a defesa da Recorrida e o labor decisional do próprio Tribunal de recurso.
G. Ademais, note-se, quanto ao incumprimento dos ónus recursivos que sobre o Recorrente impendem, que não é a primeira vez que este comete tal erro, bastando consultar a minuta a referência 28292053 constante dos presentes autos, em tudo semelhante à que ora se aprecia.
H. Face a tal minuta, foi decisão do Tribunal ad quem não admitir a apelação por incumprimento dos ónus recursivos em matéria de impugnação de prova testemunhal, por inviabilizar o exercício do contraditório pelo recorrido.
I. Assim, ali como aqui, e perante o reiterado incumprimento dos ónus recursivos em matéria de impugnação de matéria de facto e prova testemunhal conexa, deve manter-se a decisão já proferida pelo Tribunal ad quem pois é a única conforme ao Direito e a que respeita a necessária harmonia de decisões.
J. Ademais, o Recorrente impugna a decisão de Direito tomada pelo Tribunal a quo.
K. Sem qualquer razão, uma vez que o próprio Recorrente confunde a correta qualificação jurídica dos negócios que foram celebrados entre a Recorrida e o Recorrente.
L. Pelo que as normas e o respetivo regime legal aplicado pelo Tribunal foi correto, não padecendo de qualquer deficiência ou incorreção.
M. Por fim, invoca a aplicação, ao caso vertente, e em sede de impugnação de matéria de direito, do instituto da culpa do lesado, quando tal se reconduz a impugnação de matéria de facto, uma vez que não estamos perante impugnação da interpretação e qualificação jurídica que o Tribunal faz dos factos provados e não provados, mas sim perante a alegação de que factos houve que foram dados como provados e outros como não provados quando não o deveriam ter sido, sendo que, de tal apreciação, resulta a culpa do lesado.
N. Porque a Recorrida não compreende, por não cumprimento dos ónus recursivos incumpridos pelo Recorrente, os motivos pelos quais tal matéria de facto carecia de apreciação diversa, também não pode aduzir argumentos que pugnem pela não aplicação, ao caso vertente, do instituto da culpa do lesado, o que só vem reforçar a rejeição das alegações apresentadas pelo Recorrente, limitativas do exercício da defesa pela Recorrida.
O. Ainda que não se entenda que o Recorrente incumpriu os ónus recursivos, resulta dos factos provados e não impugnados pelo Recorrido – factos 4., 8, 9, 11 e 24 que a Recorrida é uma empresa estrangeira que, por não ter pessoal próprio em Portugal, constituiu o Recorrente como seu Procurador, cabendo a este zelar pelos interesses da Recorrida, nomeadamente controlando a qualidade e quantidade da produção de vinho, não se entendendo como poderia ter a Recorrida recusado o recebimento da produção de uvas ou recusar o cumprimento dos contratos celebrados se tal era função do Recorrente.
P. Como tal, não entende, nem aceita a Recorrida que, por confiar na função do Recorrente, se lhe possa imputar a produção do dano, pois tal resultaria no reconhecimento – judicial, diga-se – que os erros do Recorrido em última análise sempre seriam da responsabilidade da Recorrente, o que esvaziaria de conteúdo e sentido os compromissos contratuais assumidos entre as partes.
Q. Não se divisa assim, por um lado, qualquer falta de diligência por parte da Recorrida nem, por outro, qualquer ato seu que haja contribuído causalmente para a verificação ou agravamento dos danos, pelo que não deve ser considerada pelo Tribunal a quo a aplicação do instituto da culpa do lesado, mantendo-se a decisão recorrida

IV. Decisão da matéria de facto proferida em 1ª instância.

Factos considerados provados.

1. A Autora é uma sociedade por quotas, que tem por objeto social a produção de vinhos e bebidas e tem como sócios a Maison ..., SGPS, Lda., M. G. e C. C..
2. A Autora tem como Gerente o Sr. M. G., residente em França e sócio de várias sociedades ligadas à actividade vinícola em França.
3. Em Portugal a Autora dispõe apenas de um trabalhador qualificado (Eng.º Agrónomo/Enólogo) ao seu serviço, recorrendo a fornecedores e prestadores de serviços para garantir a produção de vinhos e outras prestações técnicas e administrativas.
4. Assim, para desenvolver a sua actividade em Portugal, a A. necessitava de uma pessoa com conhecimento no sector vitivinícola. 5. Tendo para esse efeito admitido o Primeiro Réu como seu trabalhador, em 16 de Fevereiro de 2009, cujo contrato de trabalho cessou, por acordo de revogação, em 1 de Junho de 2011.
6. No dia 16 de Março de 2009, a Autora concedeu ao Primeiro Réu uma procuração que lhe conferiu os seguintes poderes:
a) Movimentar e encerrar a conta bancária da sociedade, na Caixa … – Dependência de …, Lisboa, sacando e endossando cheques e praticando o que mais se mostre necessário para esse fim; b) Aceitar, sacar e endossar letras que titulem débitos de clientes ou outros e proceder à sua cobrança ou ao seu desconto bancário; c) Assinar ordens de pagamento e de levantamento ou transferência de fundos sobre contas bancárias; d) Proceder a depósitos na referida conta bancária, sem limitação de montante, e, bem assim, ao endosso ou movimentação de conhecimentos de embarque ou outros documentos que se tornem necessários ao desembaraço alfandegário, carga, descarga ou trânsito de mercadorias; e) Levantar e endossar vales de correio ou quaisquer outros títulos de pagamento; f) Receber quantias, passando recibos e dando quitações; g) Assinar todo o expediente dirigido às Repartições de Finanças, Entidades Alfandegárias, bem como Centros Regionais de Segurança Social, Conservatórias, Notários, Tribunais, Ministérios ou quaisquer serviços destes dependentes, outras entidades e/ou Serviços Públicos e junto destas assinar, de acordo com as exigências destas, termos de fiança, de responsabilidade ou de abonação, se necessários; h) Intervir e obrigar a sociedade em todos os atos e contratos, dentro do objeto social da mesma, dentro dos poderes que lhe estejam conferidos; i) Contrair junto de quaisquer bancos, casas bancárias e instituições de crédito, designadamente na Caixa …, quaisquer empréstimos pelos prazos, juros e demais condições que entender, e deles a confessar devedora, movimentar nas aludidas instituições os montantes dos referidos empréstimos, ou quaisquer contas, à ordem ou a prazo, assinando para o efeito cheques, recibos, ordens de pagamento, títulos ou quaisquer outros documentos representativos dessas operações bancárias; j) Representar a sociedade em diversas instituições, nomeadamente no Instituto Nacional de Intervenção e Garantia Agrícola (INGA), Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas - IFAP I.P. (IFAP), Ministério da Agricultura, Instituto dos Vinhos do Douro e Porto (IVDP); k) Representá-la em juízo e substabelecendo, para o efeito, os mais amplos poderes forenses em direito permitidos e ainda os especiais para confessar, transigir e desistir em quaisquer ações em que seja parte interessada.
7. No dia 29 de Dezembro de 2011, a Autora revogou parcialmente o mandato a favor do Primeiro Réu, tendo-lhe concretamente retirado os poderes elencados nas alíneas a), c) e i).
8. Atento ao facto de o Sr. M. G., gerente da A., ser residente em França, e ter a seu cargo a administração de outras sociedades do universo Maison..., a atuação do Primeiro Réu, enquanto procurador da sociedade, era fundamental para a atividade desta última, sendo as funções por ele exercidas de grande responsabilidade e confiança.
9. O Primeiro Réu bem sabia que – para a Autora – ele era os olhos e os ouvidos do Gerente e dos sócios franceses em Portugal, nas atividades de produção e compra de uva, armazenamento, vinificação e comercialização de vinhos.
10. Por sua vez, a Segunda Ré é uma sociedade por quotas que tem por objeto social a gestão de explorações agrícolas, produção e comercialização de produtos agrícolas, hortícolas e frutícolas, bem como de vinho e azeite, oriundos da própria exploração bem como dos adquiridos a terceiros, da qual é sócio-gerente o Primeiro Réu.
11. Assim, no dia 1 de Junho de 2011, A. e Segunda Ré (estando esta representada pelo Primeiro Réu) celebraram um contrato de prestação de serviços, reconhecendo-se aí que a A. não possuía nem material, nem pessoal em Portugal, tendo como objeto: a) O acompanhamento dos vinhedos e as execuções dos trabalhos vinícolas; b) O sourcing e compra de uvas e vinho a granel; c) O acompanhamento da vinificação; d) O acompanhamento, produção e armazenamento de vinhos; e) O acompanhamento do acondicionamento; f) A gestão de encomendas, expedição e faturação.
12. No que respeita às obrigações da Segunda Ré sobre o acompanhamento dos vinhedos e as execuções dos trabalhos vinícolas (artigo 1.º 1-1 do contrato), o contrato estipula:
- Fica a cargo do Prestador a supervisão, acompanhamento dos trabalhos agrícolas no conjunto dos vinhedos C. sitos na região do Douro (Quinta da ... – 3 ha e Quinta da C. – 5 ha). - A prestação cobre o acompanhamento do conjunto dos trabalhos vinícolas correntes, da poda até à vindima. - Será proposto um itinerário técnico pelo Prestador ao Cliente antes do 31/12/N para a época NN+1. Um orçamento estimativo será estabelecido nesse momento, bem como um calendário estimativo de execução. O Prestador será responsável pela boa execução desse itinerário técnico. Providenciará acompanhamento dos meios humanos e materiais necessários para obter uma colheita qualitativa e quantitativa. - Durante a campanha, os trabalhos não previstos serão submetidos à validação do Cliente antes de este se comprometer. - O Prestador realizará os testes de maturação (analises não incluídas) a fim de determinar a data ideal de vindima em concordância com o Cliente. - O Prestador encarregar-se-á das formalidades administrativas de acordo com as instituições competentes: Instituto dos Vinhos do Douro e Porto, Casa do Douro e Instituto da Vinha e do Vinho (IVV). - A gestão dos processos de subsídios ficará a cargo do Prestador.
- Será organizado pelo Prestador a venda dos benefícios e uvas de acordo com a C..
13. No que respeita às obrigações da Segunda Ré sobre sourcing e compra de uvas e vinhos a granel (artigo 1.º 1-2 do contrato), o contrato estipula: - O Prestador encarregar-se-á do sourcing dos aprovisionamentos das uvas e vinhos a granel por conta do Cliente diretamente com os fornecedores ou através de intermediários. - Os objetivos quantitativos e qualitativos dos aprovisionamentos serão definidos a cada ano pelo Cliente. - O Prestador encarregar-se-á da organização da receção (mercadorias) e da gestão administrativa.
14. No que respeita às obrigações da Segunda Ré sobre vinificação (artigo 1.º 1-3 do contrato), o contrato estipula:
- O Prestador acompanhará a vinificação de todos os vinhos provenientes dos Domínios C. em Portugal e a compra de uvas (negócio).
- Será proposto, antes das vindimas, pelo Prestador, um protocolo técnico de vinificação ao Cliente. O protocolo deverá ser validado antes do início das vindimas. - Os vinhos serão vinificados na adega do Sr. V. F. no limite da capacidade deste, ou seja x litros por ano. Cubas pertencentes ao Cliente serão utilizadas para este efeito. - Para além dessa capacidade máxima, os vinhos serão vinificados numa outra adega cuja escolha será feita pelo Prestador com o acordo do Cliente. A vinificação será supervisionada nesse local pelo Prestador. - O Prestador realizará ou mandará realizar as análises de laboratório necessárias (custos não incluídos). - O Prestador encarregar-se-á das formalidades administrativas ligadas aos institutos competentes: Instituto dos Vinhos do Douro e Porto, Casa do Douro e Instituto da Vinha e do Vinho (IVV), particularmente a Declaração Anual de Produção.
15. No que respeita às obrigações da 2ª Ré sobre produção e armazenamento (artigo 1.º 1-4 do contrato), o contrato estipula:
- O Prestador supervisionará a produção e o armazenamento de todos os vinhos provenientes dos Domínios C. em Portugal e a compra de uvas e de vinhos a granel (negócio). - Antes das vindimas, o Prestador deverá propor um protocolo de acompanhamento dos vinhos em estágio ao Cliente. Este deverá ser validado antes do fim das vinificações. - Os vinhos serão vinificados na adega do Sr. V. F. no limite da capacidade deste, ou seja x litros por ano. Cubas pertencentes ao Cliente serão utilizadas para este efeito. - Para além dessa capacidade máxima, os vinhos serão vinificados numa outra adega cuja escolha será feita pelo Prestador com o acordo do Cliente. A vinificação será supervisionada nesse local pelo Prestador. - O Prestador realizará ou mandará realizar as análises de laboratório necessárias (custos não incluídos). - O Prestador encarregar-se-á das formalidades administrativas ligadas aos institutos competentes: Instituto dos Vinhos do Douro e Porto, Casa do Douro e Instituto da Vinha e do Vinho (IVV), particularmente a Declaração Anual do Inventário no 31 de Dezembro.
16. No que respeita às obrigações da Segunda Ré sobre acondicionamento (artigo 1.º 1-5 do contrato), o contrato estipula:
- O Prestador supervisionará o acondicionamento (engarrafamento e apresentação) dos vinhos provenientes dos Domínios C. em Portugal e a compra de uvas e de vinhos a granel (negócio). - O acondicionamento será efetuado por um ou vários Prestador(es) externos(s). A escolha dos parceiros e as negociações com estes serão efetuadas pelo Prestador de acordo com o Cliente. - O acondicionamento será efetuado no local de armazenamento dos vinhos e supervisionado pelo Prestador. - As datas de engarrafamento serão decididas com o acordo do Cliente. - O protocolo de engarrafamento deverá ser validado pelo Cliente, particularmente as análises prévias ao engarrafamento. - O Prestador supervisionará a receção das matérias secas necessárias. - O Prestador encarregar-se-á das formalidades administrativas necessárias.
17. No que respeita às obrigações da Segunda Ré sobre gestão das encomendas, expedições e faturação (artigo 1.º 1-6 do contrato), o contrato estipula: - O Prestador encarregar-se-á da gestão das encomendas provenientes da C. França ou de clientes terceiros. - O Prestador organizará as expedições das referidas encomendas e terá a seu cargo a faturação (sendo postos à disposição os meios legalmente exigidos). - O Prestador encarregar-se-á das formalidades administrativas necessárias.
18. No que respeita às obrigações da Segunda Ré sobre execução da prestação (artigo 2.º 2-1 do contrato), o contrato estipula: - O Prestador compromete-se a levar a cabo as funções especificadas no artigo 1, de acordo com as regras desse artigo e da melhor forma. Ele deverá solicitar ao Cliente todos os elementos necessários à boa execução da prestação. Com o intuito de informar o Cliente do andamento das suas diferentes tarefas, o Prestador enviar-lhe-á a cada mês um relatório escrito.
19. No que respeita às obrigações da Segunda Ré sobre seguro de responsabilidade civil (artigo 6.º do contrato), o contrato estipula: - O Prestador é responsável das perdas, danos e estragos causados por ele ou pelos seus encarregados aquando da execução do contrato. O Cliente não pode ser tido como responsável pelos atos ou pelas omissões do Prestador ou de um dos seus encarregados aquando da execução do presente contrato. - O Prestador garante ao Cliente que, durante a execução do presente contrato, é titular de uma apólice de seguro com um valor mínimo de 150.000,00€ (cento e cinquenta mil Euros) garantindo as consequências pecuniárias da sua responsabilidade civil para os danos corporais ou materiais causados a terceiros ou ao pessoal do Cliente pela execução do contrato. O comprovativo deverá ser apresentado ao primeiro pedido do Cliente.
20. A Terceira Ré é uma sociedade unipessoal por quotas, que tem por objeto a comercialização por grosso e a retalho de produtos agrícolas e seus fatores de produção, da qual é sócio único e gerente o Primeiro Réu.
21. No dia 25 de Setembro de 2014, a Autora enviou missiva ao réu V. F. e à 2ª ré Casa Agrícola A. F., Lda., comunicando a resolução do contrato de prestação de serviços referido, tendo, nessa mesma comunicação, procedido à revogação integral do mandato conferido ao Primeiro Réu.
22. A Autora procedeu ao registo da revogação integral do mandato.
23. Colaborando, desde 2009, com a Autora, o Primeiro Réu conhecia bem a política e critérios qualitativos da Autora relativamente às compras de uvas, tarefa de extrema relevância para o negócio da empresa e que àquele estava atribuída.
24. O Primeiro Réu, em nome da autora, celebrou com a sociedade A. M. & Filha – Construção, Comercialização e Administração de Imóveis, Lda., o “Contrato de Compra e Venda de Uvas”, junto pela autora como documento nº 10, através do qual declarou o interesse da autora em adquirir cerca de 30.000 kg de uvas, em 2014, sem cuidar de garantir no contrato a estipulação de uma garantia de qualidade mínima por parte do produtor.
25. No final de Julho de 2014, um dos técnicos franceses da Maison ..., conjuntamente com o Primeiro Réu, visitou as vinhas da Quinta do ..., propriedade da referida A. M., tendo constatado que as vinhas localizadas na parte baixa da propriedade não correspondiam aos critérios de qualidade exigidos pela Autora.
26. Tendo esta consequentemente estimado que a quantidade de uva a adquirir àquela empresa não deveria exceder as 10 a 15 toneladas.
27. Tal informação foi oportunamente comunicada ao Primeiro Réu, que, em relatório datado de Agosto de 2014, informou a Autora de que a sociedade A. M. compreendia a posição assim assumida.
28. Não obstante, e como a A. veio a saber no dia 11 de Setembro de 2014, mediante envio da documentação relevante por parte do Primeiro Réu, este assumiu em representação da Autora o interesse de comprar cerca de 30 toneladas de uvas à referida A. M..
29. Tendo a A. M. faturado à Autora 26.566 kg de uvas.
30. Em 3 de Março de 2014, o Primeiro Réu procedeu à contratação de um Advogado, Dr. P. S. (cédula profissional n.º …), para prestação de serviços de assessoria jurídica, designadamente, de patrocínio judiciário e de emissão de pareceres independentes, contratação essa que foi validada pela Autora nas condições em que foi proposta pelo Primeiro Réu e implicava o pagamento de uma quantia mensal de € 250,00 (duzentos e cinquenta euros).
31. No dia 3 de Outubro de 2014, a Autora pôs termo à sobredita contratação, mediante comunicação escrita ao sobredito Advogado.
32. Em Agosto de 2013, um dos técnicos franceses da Maison ... que prestam assistência à Autora interrogou o Primeiro Réu, no âmbito do contrato de prestação de serviços entre a Autora e a Segunda Ré, sobre se esta teria a possibilidade de termorregular as cubas de vinho das suas instalações através de um sistema de frio.
33. Na resposta, o Primeiro Réu informa a Autora que se encontrava em negociações para trocar o seu grupo de frio.
34. Daí que o Primeiro Réu, agindo em nome da Autora, encomendou à Fábrica Metalúrgica ..., Lda. a instalação de um sistema de refrigeração para cubas de vinho, constituído por um vasto conjunto de tubagens, junções, casquilhos, joelhos, filtros, abraçadeiras, uniões, bombas, válvulas, isolamento, etc., ascendendo o valor da compra a € 8.868,05 (oito mil oitocentos e sessenta e oito euros e cinco cêntimos).
35. Os referidos equipamentos de frio foram mandados instalar pelo Primeiro Réu nas instalações da Segunda Ré.
36. Em 27 de Agosto de 2014, o Primeiro Réu interpelou, através de correio eletrónico, o técnico francês da Maison ..., que prestava assistência à Autora, no sentido de o informar de que se a fatura emitida pela Fábrica Metalúrgica ..., Lda. à Autora não fosse paga, a Fábrica Metalúrgica ..., Lda. ameaçava intentar um processo contra a Autora.
37. A Autora, apesar de discordar, mas para evitar o processo judicial, acedeu a pagar a fatura da instalação do sistema de frio fornecido pela Fábrica Metalúrgica ..., Lda. e montado nas instalações da Segunda Ré.
38. Na adega da Segunda Ré encontra-se instalado um sistema de frio que foi pago pela Autora.
39. Interpelada, por carta de 27 de Março de 2015, pelos mandatários da Autora, a Segunda Ré não respondeu à mesma, nem devolveu o valor de € 8.868,05 (oito mil oitocentos sessenta e oito Euros e cinco cêntimos) correspondentes ao sistema de frio mandado instalar pelo Primeiro Réu.
40. Na Quinta da ..., durante a reestruturação da vinha, as superfícies de vinha não foram respeitadas, pelo que foi necessário corrigir o plantio junto das linhas divisórias e caminhos.
41. Verificou-se ainda uma elevada mortandade das plantas naquele ano: a irrigação não foi efetuada segundo as regras da arte nos locais adequados, em detrimento da produção.
42. Os custos de correção das falhas ascenderam a mais de EUR 2.513,12 (dois mil quinhentos e treze euros e doze cêntimos), de custos de replantação.
43. A Segunda Ré enviou à Autora os índices de maturidade que constam do Documento n.º 20, donde se determinou que as vindimas viriam a decorrer a partir do dia 8 de Setembro de 2014.
44. Ao longo da primeira quinzena de Setembro de 2014, diversos e-mails foram enviados pela Autora à Segunda Ré, a fim de organizar as vindimas das parcelas prontas para colheita.
45. No entanto, não foi possível obter resposta, uma vez que o Primeiro Réu se ausentou justamente na altura em que cabia organizar a vindima, entre os dias 4 e 8 de Setembro de 2014.
46. A Cláusula 1-1 do contrato de prestação de serviços previa que a segunda ré ficaria incumbida da gestão dos processos de subsídios, mas ocorreram vários erros, conforme resulta da comunicação de incumprimentos constatados no âmbito da condicionalidade da campanha de 2014, conforme carta registada enviada pelo IFAP à Autora em 2015-02-02.
47. As previsões de produção avançadas pela Segunda Ré em 20 de Junho de 2014 e validadas pela Autora, não vieram a encontrar qualquer amparo na realidade: Quanto à Unidade de Produção …, a Previsão (em kg) era de 10.000 e a Concretização (em kg) foi de 0; Quanto à Unidade de Produção A. M. & Filha – Construção, Comercialização e Administração de Imóveis, Lda., a previsão era de 30.000 kg e a concretização foi de 26.000 kg; Quanto à unidade de produção Sociedade Agrícola ..., Lda., a previsão era de 30.000 kg e a concretização foi de 7.500 kg; Quanto à unidade de produção C., a previsão era de 3.500 kg e a concretização foi de 1.950 kg; Quanto à unidade de produção Sr.ª da …, a previsão era de 7.000 kg e a concretização foi de 0; No total a previsão era de 80.500 kg e a concretização foi de 35.450 kg.
48. Para além do contrato de aprovisionamento assinado pelo Primeiro Réu em nome da Autora com o fornecedor A. M. & Filha – Construção, Comercialização e Administração de Imóveis, Lda. referido, o Primeiro Réu celebrou com a Sociedade Agrícola ..., Lda., em 9 de Setembro de 2014, um contrato promessa de compra e venda para a aquisição de 20 a 30 toneladas de uvas da casta Touriga Nacional localizada num talhão da propriedade Quinta do … ao preço de EUR 500,00 a pipa.
49. Atenta a péssima qualidade das uvas que a Sociedade Agrícola ..., Lda. se propunha entregar à Autora, e face à não assistência da Segunda Ré, os técnicos que prestam assistência à Autora recusaram a receção das uvas por flagrante falta de qualidade.
50. Para uma previsão de abastecimento de 80.500 kg de uvas de qualidade, apenas foi possível angariar 35.450 kg, mas não da qualidade esperada – pelo que teve a Autora de encontrar, sem o apoio do Primeiro Réu e da Segunda Ré, fornecedores complementares, com urgência, a fim de conseguir colmatar, parcialmente esta diferença.
51. No ano de 2014, foi possível à Autora comercializar com a marca ... 37.638 garrafas (equivalente a 28.228,5 litros) ao preço unitário de venda de 7€/a garrafa, o que resultou no montante de € 263.466,00.
52. Em 2015, a autora comercializou com a marca ..., pelo menos, 9.678 garrafas (equivalente a 7.258,50 litros) ao preço unitário de venda de 7€/a garrafa, o que resultou no montante de € 67.746,00.
53. O Contrato de Prestação de Serviços entre a Autora e a Segunda Ré continha na sua Cláusula 6 a obrigação da Segunda Ré contratar uma apólice de seguros com um valor mínimo segurado de 150.000,00 € (cento e cinquenta mil Euros) por perdas e danos por atos ou omissões causados pela Segunda Ré ou os seus encarregados aquando da execução do contrato.
54. Através do Primeiro Réu, em 2013, a Autora e a Terceira Ré celebraram um contrato que previa a instalação de um sistema de rega gota a gota numa propriedade denominada C., localizada na Freguesia e Concelho de Vila Flor, com parcelas de vinha, arrendada pela Autora aos Herdeiros de A. A..
55. O Primeiro Réu contratou para a execução a Terceira Ré, da qual é o único sócio e gerente.
56. Tendo esta empresa faturado os trabalhos de instalação de um sistema de rega, designadamente o fornecimento de tubos, abertura e fecho de valas e mão-de-obra técnica, através da Fatura nº 77, datada de 2-08-2013, no montante total de EUR 19.208,91 (dezanove mil duzentos e oito Euros e noventa e um cêntimos).
57. A Autora não procedeu ao acompanhamento desses trabalhos e não pôde verificar a boa execução dos mesmos, estando convicta de que o seu procurador e a sua prestadora de serviços estariam a cumprir o mandato segundo as indicações e no interesse da mandante.
58. Interpelada a 3ª Ré, por carta de 6 de Março de 2015, pelos mandatários da Autora, aquela respondeu, a 19 de Março, negando que o contrato estabelecido pela 3ª Ré com a Autora fosse um contrato de empreitada, confirmando, no entanto, que forneceu tubos de rega e mão-de-obra técnica necessária à montagem, mais afirmando que os tubos não padeciam de defeito e que são da melhor qualidade e que terão funcionado inúmeras vezes durante os anos de 2013 e 2014.
59. Desde o ano de 2010, pelo menos, que a sociedade “A. M.” fornece uvas à Autora, provenientes da quinta sua propriedade, denominada Quinta do ..., mediante acordo verbal.
60. No ano de 2014, as partes reduziram a escrito o contrato de compra e venda de uvas que em anos anteriores era celebrado sem recurso a contrato escrito.
61. Assim, à semelhança de anos anteriores, com a referida ressalva, em 29 de Agosto de 2014, em representação da Autora, o 1º Réu celebrou com a sociedade “A. M. & Filha – Construção, Comercialização e Administração de Imóveis, Lda.”, um contrato escrito de compra e venda de uvas.
62. Através do qual a Autora manifestou interesse em adquirir à sociedade “A. M.” cerca de 30.000 Kg de uvas que viessem a ser produzidas na quinta propriedade desta, denominada Quinta do ....
63. Após a visita de um dos técnicos franceses da Autora à vinha da Quinta do ..., que ocorreu em final de Julho de 2014, resultou um parecer positivo do técnico para aquisição das uvas, ainda que viessem a ser restringidas à parcela de cima, já que as uvas da parcela de baixo não apresentavam a qualidade pretendida.
64. Em 16. Agosto.2014, o 1º Réu elaborou e remeteu à A. um relatório contendo fotografias da Quinta do ..., onde informa que as uvas da parcela de baixo não tinham, efetivamente, boa qualidade e, portanto, as uvas a adquirir pela Autora cingir-se-iam à vinha da parcela de cima, e que a “A. M.” compreendia tal posição.
65. Uma vez que, tudo apontava para a hipótese de a colheita das uvas ser restringida apenas à parcela de cima, a Autora questionou o 1º Réu no sentido de saber se a quantidade de uvas a colher nessa parcela seria, consequentemente, reduzida para metade - cerca de 10 a 15 toneladas de uvas.
66. Tendo o 1º Réu esclarecido que, não obstante a colheita das uvas se vir a restringir à parcela de cima, a mesma tinha capacidade para produzir na mesma cerca de 30.000 Kg de uvas com qualidade.
67. Desde Agosto de 2014, que o 1º Réu e a 2ª Ré, foram assistindo à retirada, por parte da Autora, de poderes que lhe haviam sido conferidos por esta, tanto mais que, tinham disponíveis os meios técnicos e humanos para realização das prestações a que se obrigaram, quer no âmbito da procuração outorgada ao 1º Réu, quer no âmbito do contrato de prestação de serviços celebrado pela 2ª Ré.
68. De modo que, por meio de carta registada, com aviso de receção, a 2ª Ré solicitou à Autora esclarecimentos sobre esta injustificada retirada de poderes, que limitava o desempenho das suas tarefas, não tendo obtido resposta.
69. A Autora decidiu, unilateralmente, sem prévio acordo do 1º Réu, acompanhar os trabalhos da vindima na Quinta do ..., por meio de um seu colaborador.
70. Além disso, contrariamente ao acordado e habitual nos anos anteriores, as uvas provenientes da colheita das vinhas da Quinta do ..., não foram transportadas para a adega dos Réus, para aí serem vinificadas, nem foi dado conhecimento do local para onde a Autora transportou as uvas.
71. A contratação de advogado - Dr. P. S. - ocorreu com autorização da Autora para o efeito.
72. A autora deu autorização para as condições de pagamento.
73. O advogado em questão, no âmbito dos poderes que lhe foram concedidos, prestou os seus serviços à Autora, com qualidade, rigor e profissionalismo que lhe são característicos.
74. Com data de 1 de Junho de 2011, foi celebrado um contrato de prestação de serviços entre a 2ª Ré “Casa Agrícola A. F., Lda.”, ali designada Prestador e a Autora designada Cliente.
75. Contrato que tem por objeto, entre outros, o “Acompanhamento da vinificação”, prevendo o ponto “1-3 Vinificação (…) Os vinhos serão vinificados na adega do Sr. V. F. no limite da capacidade deste, ou seja x litros por ano. Cubas pertencentes ao Cliente serão utilizadas para este efeito…”.
76. O artigo 3 do contrato estipula os deveres do Cliente, no caso, da Autora, dispondo que: “Artigo 3 – Deveres do Cliente O Cliente colocará à disposição do Prestador os elementos necessários à realização das prestações objeto do presente contrato.”.
77. Ao abrigo do contrato de prestação de serviços referido, nos anos de 2011 e 2012 a vinificação foi feita, por parte da 2ª Ré, em adega pertencente ao 1º Réu, Engº V. F., com recurso a cubas pertença da Autora.
78. Dado o aumento de produção, por parte da Autora, a 2ª Ré teve necessidade de se instalar em outra adega mais espaçosa, sita em Vila Flor, Quinta do ..., para onde deslocou, além de outros equipamentos, as cubas da Autora, o que tudo ocorreu em Janeiro de 2013.
79. Atendendo ao aumento de produção e consequente mudança de instalações para uma adega com melhores condições, a Autora entendeu ser necessário termorregular as cubas para controlar a temperatura do vinho durante a sua fermentação (vinificação).
80. Nesse mesmo ano de 2013, a Autora questionou a 2ª Ré sobre a possibilidade de instalar na sua adega um sistema de frio, que serviria para vinificar as uvas da Autora.
81. A 2ª Ré logo anuiu à instalação do sistema de frio na sua adega, disponibilizando ainda a sua máquina de frio, para o efeito.
82. Na sequência, a Autora incumbiu a 2ª Ré de contratar um terceiro prestador de serviços para instalar o sistema de frio.
83. Pelo que, mediante prévio acordo da Autora, a 2ª Ré encomendou à sociedade “Fábrica Metalúrgica ..., Lda.” a instalação do sistema de frio pretendido pela Autora.
84. A “Fábrica Metalúrgica ..., Lda.” procedeu à instalação do sistema de frio que consistiu na instalação de tubagem de conexão, já que foi aproveitada a máquina de frio da 2ª Ré e as cubas pertencentes à Autora.
85. A “Fábrica Metalúrgica ..., Lda.” faturou o serviço.
86. Por diversas vezes, foram o 1º Réu e a 2ª Ré confrontados com a interpelação da “Fábrica Metalúrgica ..., Lda.” ao pagamento da fatura.
87. Pelo que, por diversas vezes, teve o 1º Réu necessidade de interpelar a Autora ao pagamento das quantias devidas à “Fábrica Metalúrgica ..., Lda.”, uma das quais ocorreu em 27 de Agosto de 2014, por correio eletrónico.
88. Este sistema de frio foi instalado para benefício da Autora.
89. Foi conectado às cubas da Autora, as quais já foram por esta levadas, em Setembro de 2014, para local desconhecido dos Réus, o que desativou o sistema de frio até então instalado.
90. Toda a tubagem do sistema de frio, encontra-se na adega da 2ª Ré à disposição para ser retirada e transportada pela Autora, tal como já lhe transmitiu, o que apenas não fez, porque não quis.
91. A Quinta da ... foi alvo de reestruturação, no ano de 2013.
92. Após a reestruturação da vinha (plantação), o Ministério da Agricultura, devidamente representado, deslocou-se à Quinta da ..., tendo constatado que junto aos caminhos não havia sido feita plantação, pelo que, reduziu a área de plantação.
93. Na sequência da visita do Ministério da Agricultura, a 2ª Ré procedeu à plantação na área dos caminhos, o que foi feito em inícios do ano de 2014.
94. Após, a 2ª Ré solicitou correção da área plantada ao Ministério da Agricultura.
95. A Quinta da ... possuía um sistema de rega gota-a-gota, cujo funcionamento requeria o transporte de água para um depósito, já que a quinta não dispõe de abastecimento próprio de água.
96. O transporte da água para o depósito existente na quinta era assegurado por um terceiro prestador de serviços, “Terras …, Lda.”, contratado pela 2ª Ré, para o efeito, com a concordância da Autora.
97. Acontece que a Autora atrasou os pagamentos acordados, ao referido prestador de serviços, no decorrer do ano de 2013, o que levou a que este suspendesse a prestação do serviço de transporte de água, em final de Julho de 2013, tendo-os retomado apenas em 21 de Setembro de 2013, com consequências nefastas para o vingamento das plantas.
98. A suspensão dos trabalhos de rega originou a morte de diversas plantas, prevendo-se que outras viessem a morrer, como morreram, ainda que viesse a ser retomada a rega, por ser irreversível para a vida das plantas a já verificada falta de rega, no momento adequado.
99. Preocupada com a situação, a 2ª Ré interpelou por várias vezes a Autora, uma das quais ocorreu via e-mail, em 28 de Agosto de 2013, para regularizar os pagamentos ao prestador de serviços, com vista a este poder retomar os trabalhos de rega que se recusava a prestar até que lhe fosse pago o serviço já prestado.
100. Confrontada com as interpelações da 2ª Ré, a Autora respondia que já não havia necessidade de proceder a mais regas, pois já haviam sido efetuadas as previstas no plano de reestruturação, como de facto já haviam sido.
101. Porém, a 2ª Ré advertiu a Autora para o facto de a quantidade de regas previstas no plano não serem suficientes para o vingamento das plantas, dado que o ano de 2013 verificava-se particularmente quente e seco.
102. Pelo que, havia necessidade de se proceder a mais regas do que aquelas que estavam previstas no plano inicial de reestruturação.
103. Perante a posição da Autora, a 2ª Ré solicitou àquela que fizesse deslocar à Quinta da ... um seu técnico, de nome G. D., para, no local, verificar, como verificou, em 19 de Setembro de 2013, a necessidade urgente de rega das plantas, bem como, as consequências irreversíveis que a suspensão da rega já havia provocado em diversas plantas.
104. Na sequência da visita do técnico e das várias interpelações, a Autora deu finalmente instruções à 2ª Ré para contactar o prestador de serviços, a fim de iniciar o transporte de água, com a promessa de que logo lhe pagaria todas as quantias em atraso.
105. Instruções que a 2ª Ré logo transmitiu ao prestador de serviços, que reiniciou o serviço de transporte de água, em 21 de Setembro de 2013.
106. Porém, a rega que veio a ser retomada, já não foi capaz de evitar a mortandade de diversas plantas.
107. A pedido da Autora, em Agosto de 2013, a 2ª Ré procedeu ao levantamento do número de plantas mortas até essa data, cujos custos de replantação ascenderam à quantia de € 2.513,12.
108. Desde Agosto de 2013 até ao final desse ano, outras plantas morreram, pois a suspensão da rega, retomada em 21 de Setembro de 2013, causou danos irreversíveis nas plantas, alguns dos quais apenas se vieram a repercutir depois de já ter sido retomada a rega.
109. Tornando-se necessária a reposição de mais plantas.
110. Na sequência dos testes de maturação que realizou na Quinta de C. (a Quinta da ... foi reestruturada no ano de 2013, não permitindo a vindima no ano de 2014), a 2ª Ré fez uma previsão de realização da vindima para o dia 08 de Setembro de 2014.
111. O 1º Réu deslocou-se a Lisboa durante os dias 4 a 8 de Setembro.
112. No dia 13. Setembro de 2014 (sábado, pelas 07:00 horas), o 1º Réu esteve presente na vindima da Quinta de C..
113. Por sua determinação, a Autora decidiu organizar ela própria a vindima – tarefa que habitualmente incumbia a 2ª Ré de executar - contratando diretamente os trabalhadores que entendeu e o serviço de transporte das uvas, para destino diverso das instalações da 2ª Ré.
114. Em 20 de Junho de 2014, à semelhança dos anos anteriores de vigência do contrato, a 2ª Ré informou a Autora das previsões relativas às quantidades de aquisição de uvas para aquele ano.
115. Relativamente à Quinta de C., foi a Autora que, por decisão unilateral, organizou a respetiva vindima.
116. Os vinhos comercializados no ano de 2014 resultam da vinificação realizada pela 2ª Ré, na sua adega, tendo sido as vindimas devidamente agendadas, organizadas e supervisionadas pela 2ª Ré.
117. Ao passo que, no ano de 2014, a Autora decidiu organizar essas vindimas, vinificando as uvas daí resultantes em local desconhecido da 2ª Ré.
118. A 2ª Ré subscreveu um contrato de seguro, por danos causados a terceiros no exercício da sua atividade, com capital segurado de €150.000,00, cuja apólice nº ......, por força das suas renovações, se encontrava válida à data dos factos.
119. Entre Autora e Ré “Y – Comercialização de Produtos Agrícolas, Unipessoal, Lda.” foi celebrado um contrato de instalação de tubagem, abertura e fecho de valas para colocação da tubagem e mão-de-obra respetiva.
120. Tendo sido estes os produtos e serviços que a 3ª Ré cobrou à Autora e que esta pagou.
121. A tubagem colocada pela 3ª Ré não padecia, nem padece, de qualquer defeito, nem fugas nas suas ligações, sendo os tubos colocados pela 3ª Ré da melhor qualidade.
122. Após a instalação da tubagem, a vinha da Quinta de C. foi regada, inúmeras vezes, durante os anos de 2013 e 2014, através da tubagem instalada pela 3ª Ré, com recurso a um gerador e uma bomba de água, acoplada a um trator pertencente à 2ª Ré, pelo facto de a Quinta não dispor de abastecimento elétrico, o que tudo foi sendo comprovado pela A.
123. Em 25 de Junho de 2014, foi comprovado pelos colaboradores da Autora, nas pessoas de G. D., L. D., V. D. e H. P., na visita que realizaram à Quinta de C., que a 2ª Ré se encontrava a regar a vinha, utilizando a tubagem ali instalada pela 3ª Ré.
124. Em 28/11/2013, a sociedade Casa Agrícola A. F. Lda., 2ª Ré, celebrou com a Chamada Companhia de Seguros W, S.A. o contrato de seguro de responsabilidade civil de exploração, titulado pela apólice nº ......, com as respetivas Condições Particulares, Gerais e Especiais.
125. Por via de tal contrato, foi seguro o risco decorrente da atividade de “Elaboração de Gelados e/ou Bebidas” levada a cabo pela segurada, aqui 2ª Ré – Capítulo I das Condições Particulares da Apólice.
126. Nos termos do disposto no nº 1 da Cláusula 1ª do Capítulo II (Condições Especiais), a Ré obrigou-se a garantir “as indemnizações por danos patrimoniais e não patrimoniais diretamente decorrentes de lesões corporais e/ou materiais que sejam causados a terceiros e a clientes, pelos legítimos representantes ou pessoas ao serviço e pelas quais o Segurado seja civilmente responsável de harmonia com o Capitulo I e II das Condições Particulares e com as Condições Gerais”.
127. Decorre do estabelecido na apólice que “Este contrato tem por objeto a garantia da Responsabilidade Extracontratual que ao abrigo da lei civil seja imputável ao Segurado em consequência da atividade de fabrico, identificada na Parte I das Condições Particulares da Apólice”.
128. O contrato identificado garante, especificada e taxativamente, no âmbito da atividade segura (na cobertura “responsabilidade civil exploração – atividade de fabrico”) a responsabilidade civil extracontratual, os danos causados:
a) Por quaisquer materiais, incluindo mercadorias e embalagens, equipamentos, utensílios e decorações, interiores ou exteriores, incluindo tabuletas ou outros objetos de identificação ou publicidade, existentes nos estabelecimentos do Segurado ou por este ocupado; b) Por operações de carga e descarga de objetos e mercadorias necessárias ao funcionamento normal da atividade dos Segurados; (…) d) Devidos a intoxicação alimentar provocada por alimentos sólidos ou líquidos fornecidos e/ou preparados pelo Segurado afetos à exploração e sob responsabilidade direta do Segurado e consumidos dentro das suas instalações, desde que a manifestação dos danos não ultrapasse o período de 72 horas após o consumo dos referidos alimentos; e) No decurso da participação do segurado em feiras profissionais, exposições, congressos ou outros eventos de natureza similar diretamente ligados ao exercício da atividade segura, que decorram quer em Portugal quer na Europa, e cuja duração do evento não seja superior a uma semana”. - nº 1 da Cláusula 1ª do Capítulo II (Condições Especiais).
129. Nos termos do disposto nos nºs 1 e 2 da Cláusula 2ª do Capítulo II (Condições Especiais), sob a epígrafe “Exclusões”, ficam absolutamente excluídos das garantias deste contrato, entre outros, os danos: a) Decorrentes de atos ou omissões dolosas do Segurado ou de pessoas por quem este seja civilmente responsável ou das pessoas cuja responsabilidade seja garantida por esta Apólice, bem como os atos ou omissões que constituem violação dolosa de normas ou regulamentos e quaisquer multas ou coimas. Entende-se por ato doloso, todo o ato intencional praticado com o intuito de produzir dano ou com representação da possibilidade desse resultado; (…) i) A título de responsabilidade criminal, contra-ordenacional ou disciplinar bem como quaisquer despesas em processo disciplinar, criminal ou contra-ordenacional; (…) k) Resultantes de Responsabilidade de Administradores, diretores, gerentes e membros dos órgãos de fiscalização da empresa segura por erros de gestão (D&O); (…) t) Resultantes de quaisquer reclamações, perdas, custos e despesas que tenham origem, direta ou indiretamente, na existência, inalação ou exposição a qualquer fungo/fungos ou esporos; (…)
2. Ficam excluídos das garantias deste contrato os danos: a) Causados pelas obras, trabalhos, prestação de serviços, produtos e suas embalagens produzidos e/ou armazenados e/ou fornecidos pelo Segurado, se as reclamações forem motivadas por erro, omissão ou vício oculto que se revelem somente após a receção expressa ou tácita dos referidos bens, produtos ou serviços; b) Decorrentes de reclamações baseadas numa responsabilidade do Segurado resultante de acordo ou contrato, na medida em que a mesma exceda a responsabilidade a que o Segurado estaria legalmente obrigado, na ausência de tal acordo ou contrato; (…) h) Decorrentes do não cumprimento de normas legais ou regulamentares, ou dos usos próprios da atividade bem como da não adoção das medidas de segurança aconselháveis; i) Resultantes de exploração de quaisquer atividades alheias e/ou acessórias à atividade principal do Segurado (TAL COMO ESTA SE ENCONTRA DEFINIDA NA APÓLICE). j) Decorrentes de reclamações baseadas em perdas financeiras, nomeadamente, por lucros cessantes, impossibilidade do exercício normal da atividade, suspensão e/ou interrupção, não cumprimento de prazos estabelecidos, redução do volume de vendas, paralisação, redução volume de vendas, perdas de imagem e/ou quotas de mercado; k) Perdas financeiras puras entendendo-se como tal as perdas económicas ou financeiras sem concorrência de danos materiais e/ou corporais, nomeadamente paralisação total ou parcial da atividade, causados a terceiros; l) Causados à mercadoria armazenada, transportada ou manipulada, suas embalagens, contentores e veículos utilizados; m) Causados pelo mau estado de conservação e/ou revisão das instalações ou equipamentos; n) Que tendo-se em consideração a natureza dos trabalhos ou a sua forma de execução, possam razoavelmente prever-se como inevitáveis; o) Resultantes de defeitos ou ineficácia de produtos utilizados pelo Segurado no exercício da sua atividade; p) Decorrentes de reclamações por erro na escolha e entrega dos produtos, assim como qualquer tipo de atraso na entrega dos mesmos. (…) r) Resultantes de deficientes condições higieno-sanitárias na confeção, distribuição ou armazenamento, conservação, guarda ou consumo dos produtos alimentares.
130. De acordo com os nºs 1, 2 e 3 do Artigo Preliminar das Cláusulas Gerais da Apólice nº ……, este contrato de seguro regula-se pelas Condições Gerais, pelas Condições Particulares e, ainda, se contratadas, pelas Condições Especiais.

Factos considerados não provados:

a) A missiva enviada pela autora ao 1º e à 2ª Ré, no dia 25 de Setembro de 2014, foi recebida pelo Primeiro Réu no dia 1 de Outubro de 2014.
b) Devido ao contrato celebrado pelo Primeiro Réu, em nome da autora, com a Sociedade A. M., houve um custo de aquisição, por parte da Autora, de mais de 11 toneladas de uvas de qualidade inferior àquela que a Autora pretendia adquirir, como o Primeiro Réu bem sabia.
c) Apenas no dia 3 de Outubro de 2014, quando a A. pôs termo à contratação do Advogado referido, mediante comunicação escrita, e somente através da resposta do ilustre Advogado à comunicação da Autora, tomou a respetiva gerência conhecimento de que o 1º Réu havia vinculado a Autora a uma avença com a duração mínima de 24 meses, com expressa previsão de renovação tácita e pré-aviso de resolução de 365 dias.
d) Estas condições nunca foram propostas à gerência, nem por esta validadas, não correspondendo à prática habitual.
e) Na Quinta da ..., durante a reestruturação da vinha, as superfícies de vinha não foram respeitadas, devido à falta de supervisão e manutenção, e verificou-se uma mortandade das plantas da ordem de 50%, porque as videiras não continham a quantidade necessária de matéria orgânica. ~
f) No decurso da Primavera de 2014, a Segunda Ré não acompanhou convenientemente a evolução das vinhas, sistematicamente falhando numa resposta atempada aos técnicos franceses da Autora e na entrega dos relatórios que lhe eram solicitados, os quais se restringiam, o mais das vezes, ao envio de fotos.
g) A Segunda Ré não realizava convenientemente os testes de maturação (análises não incluídas) a fim de determinar a data ideal de vindima em concordância com o Cliente.
h) O Primeiro Réu ausentou-se justamente na altura acordada para a vindima, sem assegurar o serviço.
i) A Autora mantém armazenados entre 31.500 litros e 32.000 litros (equivalente a 42.000 garrafas a 42.666 garrafas) que não consegue vender com a marca ... a 7€/garrafa.
j) Apenas conseguirá vender essas 42.000 garrafas a 42.666 garrafas a um preço sensivelmente de metade do que consegue vender com a marca ....
k) As uvas fornecidas pela “A. M.” à Autora, sempre foram supervisionadas pelo 1º Réu, sendo que, se se verificasse que as mesmas não tinham qualidade, eram rejeitadas, sem oposição da “A. M.”.
l) O contrato com a Sociedade A. M. apenas foi celebrado e assinado pelo 1º Réu, após concordância e autorização da Autora para o efeito, tendo a Autora concordado com as suas cláusulas.
m) O 1º Réu recomendou à Autora o dia 15 de Setembro de 2014, para dar início à vindima das uvas na Quinta do ..., uma vez que seria esta a altura ideal para a sua colheita, por as uvas apresentarem a qualidade e maturação pretendidas e por estarem previstas chuvas abundantes para os dias seguintes (que vieram efetivamente a ocorrer) e que colocariam em causa a qualidade das uvas.
n) A Autora descurou por completo as recomendações e conselhos técnicos do 1º Réu.
o) A Autora, sem intervenção do 1º Réu, decidiu adiar a vindima na Quinta do ..., para além da data recomendada por este.
p) Tendo-se realizado a vindima apenas em finais de Setembro ou inícios de Outubro de 2014, após terem-se verificado as previstas chuvas abundantes, que nesta altura do ano, dado o estado avançado de maturação das uvas, é condição para causar o seu apodrecimento e degradação da sua qualidade.
q) Se a vindima, na Quinta do ..., se tivesse realizado na data agendada pelo 1º Réu, teriam sido colhidas cerca de 30.000Kg de uvas com qualidade, tal como previsto e contratado.
r) A Autora não cuidou de assegurar a qualidade das uvas que adquiriu, no momento da sua colheita, porque se o tivesse feito, teria recusado as uvas degradadas, o que sempre sucedeu em anos anteriores, sem oposição da “A. M.”.
s) Houve concordância da parte da autora relativamente à duração de 24 (vinte e quatro) meses do contrato de prestação de serviços jurídicos.
t) O sistema de frio nunca teve qualquer utilidade para os Réus, pois a 2ª Ré apenas vinifica vinho do Porto, em lagares de pedra, que não permite a refrigeração através de sistema de frio.
u) A 2ª Ré nunca retirou qualquer vantagem do sistema de frio instalado na sua adega.
v) Na reestruturação da vinha da Quinta da ... a 2ª Ré aplicou a quantidade de matéria orgânica necessária e prevista no plano de reestruturação aprovado pela Autora.
w) A 2ª Ré efetuou a plantação na vinha da Quinta da ..., de acordo com mapa remetido pela Autora - pelo seu técnico G. D., com quem a Ré se correspondia relativamente a assuntos da Autora, com o conhecimento desta, sendo que este mapa não previa plantação junto aos caminhos.
x) A 2ª Ré alertou a A. para o facto de ser necessária a plantação junto aos caminhos, sob pena de perda de área de vinha e incentivos.
y) A A. descurou a recomendação feita pela 2ª Ré e reiterou que a plantação a fazer na Quinta devia obedecer ao mapa referido, o que a 2ª Ré cumpriu.
z) Relativamente ao fornecedor “…”, estava prevista a compra de 10.000 Kg de uvas, porém, o deficiente acompanhamento das vinhas, por parte do próprio fornecedor, levou a que a qualidade das uvas se degradasse, não atingindo os parâmetros de qualidade defendidos pela 2ª Ré, tendo sido esta que recomendou à Autora que não procedesse à aquisição das uvas degradadas, tendo também o próprio fornecedor reconhecido a falta de qualidade dessas uvas;
aa) Relativamente ao fornecedor “A. M. & Filha – Construção, Comercialização e Administração de Imóveis, Lda.”, em 20 de Junho de 2014, assim como até à data recomendada pelo 1º Réu e 2ª Ré para realização da vindima deste fornecedor – 15 de Setembro de 2014 – mostrava-se perfeitamente possível colher uvas com qualidade na quantidade prevista de 30.000 Kg. A única situação que pode ter originado uma redução na quantidade de uvas adquiridas pela Autora, foi a sua própria teimosia, pois, ao invés de realizar a vindima na data recomendada pelos 1º Réu e 2ª Ré, decidiu adiá-la para finais de Setembro ou inícios de Outubro de 2014, quando as uvas já apresentavam um estado demasiado avançado de maturação e depois de verificadas as previstas chuvas abundantes, o que tudo originou certamente o apodrecimento e degradação da qualidade das uvas.
bb) A Autora decidiu acompanhar e organizar a vindima do fornecedor “Sociedade Agrícola ..., Lda.”, tendo realizado a vindima em data muito tardia face ao grau de maturação das uvas e tendo entretanto, na 2ª quinzena de Setembro, chovido muito, o que poderá ter originado a degradação das uvas e, consequentemente, a aquisição de uvas em quantidade inferior à prevista.
cc) A 2ª Ré remeteu à autora a apólice logo após a celebração do contrato, mantendo-a informada quanto às renovações anuais da apólice.

V. Cumpre apreciar e decidir.

O réu recorre do segmento condenatório da sentença, de facto e de direito.
No segmento de facto impugna a matéria provada inserta na sentença nos pontos 25, 26 e 63, e a matéria não provada dos pontos k), l), m), n), o), p), q) r) e aa);
No segmento de direito as questões suscitadas respeitam à responsabilidade civil imputada ao recorrente, mais concretamente em saber se impende ou não sobre ele a obrigação de indemnizar a autora pela sua actuação no âmbito do contrato de compra e venda de uva celebrado em 2014 com a “A. M.”.

Questão prévia da rejeição do recurso que versa sobre a matéria de facto:

A recorrida pugna pela rejeição da impugnação da decisão de facto por não obedecer às exigências que são impostas pelo art. 640º, nº1, als a) e b), do C. P. C., alegando que o recorrente assinala de forma vaga os factos que considera incorrectamente julgados e a remete de forma genérica para segmentos das gravações.
A recorrida tem razão.
Como esta Relação tem alertado em diversos processos, a impugnação da decisão sobre a matéria de facto não dever ser olhada como um novo julgamento, mas antes como a oportunidade de se obviar a pontuais e concretos erros de julgamento, como sublinha o próprio preâmbulo do diploma que instituiu o duplo grau de julgamento em matéria de facto (Decreto-Lei 329-A/95, de 12.12), ou seja, trata-se de um «recurso de reponderação e não de reexame, visto que o tribunal superior não é chamado a apreciar de novo a acção e a julga-la, como se fosse pela primeira vez, indo antes controlar a correcção da decisão proferida pelo tribunal recorrido» (cfr. José Lebre de Freitas in “Código de Processo Civil, Anotado”, vol. 3º, Tomo I, 2ª ed., 2008, Coimbra Editora, pág. 7/8, e Abrantes Geraldes, Recursos no NCPC, pág. 92/94).
Assim, tal como claramente sucede no caso em apreço, o recurso é inepto e a pretensão do recorrente tem de soçobrar sempre que ele se limita a remeter de forma vaga e genérica para as passagens das gravações, omitindo a indicação dos erros e vícios da decisão, e os fundamentos da sua convicção, ou seja, as razões que justificam uma resposta diversa da exarada pelo juiz.

Pelo exposto, considera-se estabilizada a matéria de facto tal como foi fixada em 1ª instância:

O direito.

Em função dos factos provados, a sentença recorrida concluiu pela responsabilidade civil contratual do 1º réu, consistindo a ilicitude do recorrente na violação das obrigações do contrato de mandato que foi celebrado entre a autora e o 1º réu (artigo 1161º, alínea a/, do CC) – refere que as instruções dadas pela A. foram para a aquisição de uvas apenas da parte de cima da vinha, mas que o réu permitiu que fossem vindimadas uvas da outra parte, sem a qualidade pretendida; presumindo-se a culpa nos termos do nº1 do artigo 799º do Código Civil, e que o dano corresponde ao valor pago pela autora pela aquisição de 11 toneladas de uva de qualidade inferior (7.672,50€).

O recorrente enjeita a obrigação que lhe é assacada. No essencial e em síntese, argumenta que os factos não permitem afirmar a existência de um contrato de mandato, e sendo a responsabilidade extracontratual (a inerente à sua condição de procurador) a sua culpa não se presume, antes deve ser provada nos termos do artigo 483º do Código Civil.

Vejamos

Procuração e contrato de mandato são figuras jurídicas distintas. A procuração é um acto unilateral pelo qual alguém confere poderes de representação a outrem (artigo 262º do Cód. Civil), isto é, confere o poder de celebrar um ou vários actos jurídicos em nome de outrem (representado); O mandato é um contrato tipificado no art. 1157º do Código Civil, de natureza consensual, o qual impõe a obrigação de celebrar actos jurídicos por conta de outrem.
Anotam os Prof. P. de Lima e A. Varela que “em grande número de casos, porém, aparecem associados os dois negócios jurídicos. Ao lado do mandato, que impõe ao mandatário a obrigação de celebrar um acto por conta do mandante, existe a procuração, que, uma vez aceita, obriga o mandatário-procurador, em princípio, a celebrar o acto em nome daquele. Nestes casos, a que poderemos chamar de mandato representativo, são de aplicar as disposições do mandato, e são de aplicar também as disposições relativas à representação” (Código Civil Anotado, 2ª ed., Vol II- pág. 661).

Uma das obrigações do mandatário no contrato de mandato é “praticar os actos compreendidos no mandato, segundo as instruções do mandante” (cfr. alínea a) do artigo 1161º, do Código Civil), e as instruções «podem ser dadas no momento em que o mandato é constituído ou em momento posterior, durante a execução do contrato, v.g. sobre o preço por que haja de ser alienada ou adquirida certa coisa, sobre as cláusulas do negócio em perspectiva, etc.” (cfr. P. de Lima e A. Varela, obra citada, pág. 632), e o mandatário que faltar culposamente ao cumprimento dessa obrigação torna-se responsável pelos prejuízos que causa ao mandante (art. 798º), devendo a culpa ser apreciada nos termos do artigo 799º do Cód. Civil.
Actuando ao mesmo tempo como procurador, abusa dos poderes de representação nos termos do artigo 269º do Código Civil, “quando o representante, actuando embora dentro dos limites formais dos poderes que lhe foram outorgados, utiliza conscientemente esses poderes em sentido contrário ao seu fim ou às indicações do representado” (cfr. obra citada, Vol I, pág.. 248/249), podendo essa actuação ilícita fazer incorrer em responsabilidade civil aquiliana o procurador pelos prejuízos culposamente causados.

Os autos reportam uma situação em que o 1º réu actuou na qualidade de mandatário-representante da demandante no contrato de 29-Agosto-2014 referente à aquisição de 3.000kg de uva à “A. M.”. Como efeito, celebrou esse contrato em nome da autora no quadro dos poderes que lhe conferia a procuração outorgada em 16 de Março de 2009 (cfr. doc. de fls. 52/53 3 teor do item 6º dos factos provados), e por sua conta a coberto de um mandato, contrato anunciado com suficiente evidência pelos factos elencados nos itens 7º, 21º, 25º a 27º, e 63º a 66º.

Foi transmitido ao 1º réu a vontade da A. em adquirir uvas apenas da parte de cima da Quinta do ... pertencente à “A. M.”, e foi-lhe até dado a conhecer o parecer do técnico francês elaborado em final de Julho de 2014 segundo o qual as vinhas da parte de baixa da propriedade não correspondiam aos critérios de qualidade exigidos pela autora (itens 25º 63º), e no subsequente relatório enviado à autora em 16.08.2014, o 1º réu também concede que as uvas da parcela de baixo não tinham boa qualidade e, portanto, as uvas a adquirir cingir-se-iam à vinha da parcela de cima, e refere que a “A. M.” compreendia tal posição (cfr. item 64).

Uma vez que no dito contrato de 29 de Agosto de 2014 é declarado o interesse da autora em adquirir cerca de 30.000 kg de uvas de casta Touriga nacional da Quinta do ..., sem qualquer menção de que a colheita era apenas da parte de cima, é de considerar que o 1º réu incumpriu o contrato de mandato e incorreu em abuso de representação?

A resposta deve ser negativa.

A isolada circunstância de o escrito que titula o contrato não especificar que as uvas eram apenas as da parte de cima da quinta pode quiçá indiciar incompetência ou negligente do mandatário/procurador, mas não é revelador da sua intenção em se desviar das directrizes e interesses da autora, nem significa sequer que aquela condição não tenha sido efectivamente negociada e acordada.
Ademais, em obediência ao princípio geral de boa fé que preside ao cumprimento dos contratos (nº2, do art 762º do Código Civil - ao qual estão ligados os deveres de fidelidade, lealdade e o direito de confiança), sempre seria legítima a recusa das uvas que não correspondessem aos patamares de qualidade habitualmente exigidos pela autora, não se podendo olvidar que as relações comerciais entre as mesmas partes existiam desde 2010 (consta do item 59º que “desde o ano de 2010, pelo menos, que a sociedade “A. M.” fornece uvas à Autora, provenientes da quinta sua propriedade, denominada Quinta do ..., mediante acordo verbal”).

Também não se vislumbra qualquer desvio às instruções da mandante/representada no que diz respeito à quantidade de uva a adquirir. Os factos provados apenas dizem que a autora, depois de informada pelo técnico francês que deveriam ser adquiridas uvas da parte de cima da quinta, questionou o réu “no sentido de saber se a quantidade de uvas a colher nessa parcela seria, consequentemente, reduzida para metade – cerca de 10 a 15 toneladas de uvas” (item 65º), “tendo o réu esclarecido que, não obstante a colheita das uvas se vir a restringir à parte de cima, a mesma tinha capacidade para produzir na mesma cerca de 30.000kg de uvas com qualidade” (item 66º). Ora, considerando que os autos não noticiam que a autora tenha colocado qualquer objecção a essa resposta do réu, este tinha legitimidade para em boa fé pensar que actuava conforme as instruções e vontade da autora ao negociar os 3.000kgs de uva.
Em face das considerações enunciadas, entendemos que não existe ilicitude na actuação do recorrente.

Falta a verificação de um outro pressuposto da responsabilidade civil imputada ao réu: o dano.
O dano constitui “todo o prejuízo, desvantagem ou perda que é causado nos bens jurídicos de carácter patrimonial ou não patrimonial” (Vaz Serra, BMJ nº. 84-pág. 8), resultando do disposto no artigo 564º, nº1, do Código Civil, que tanto pode traduzir-se na afectação do património do lesado já existente (dano emergente), como na frustração de um ganho (lucro cessante).
No cas em apreço, o dano atendido na sentença condenatória corresponde às 11 toneladas de uva de menor qualidade facturadas à autora. Contudo, para além da sua negociação ter sido tacitamente autorizada e não se ter provado que as uvas fornecidas fossem de menor qualidade, a autora também não logrou demonstrar qualquer prejuízo, designadamente a inutilização do excedente de uvas e/ou a diminuição dos lucros em resultado da produção de vinho de menor qualidade.

Decisão.

Acordam os Juízes deste colectivo da Relação em julgar procedente a apelação e, revogando a sentença no segmento recorrido, absolvem o réu/recorrente do pagamento à autora da quantia de €7.672,50 (sete mil seiscentos e setenta e dois euros e cinquenta cêntimos).
Custas pela recorrida.

TRG, 18-06-2020

Heitor Gonçalves
Maria da Conceição Bucho
António Sobrinho